Viver 1 - Os Velhos da Raia

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ralidade e da urbanização que inventam muito dos nossos contemporâneos na sua existência diária. Posto isto, a questão convida-nos a prolongar estas tendências e a associá-las antecipando-se às mutações anunciadas da sociedade. Além da questão da articulação das situações locais ao processo de mundialização da economia, quais serão as incidências do desaparecimento das fronteiras europeias, da generalização dos novos valores que são o quadro de vida, o ambiente, a qualidade paisagística? Como e que novas actividades económicas se vão desenvolver com o tele-trabalho, como se vão desenvolverão o fenómeno das duplas residências e o do turismo ? Uma análise rigorosa permitirá, com certeza, identificar melhor a série de desafios e as recomendações que devem ser formuladas. Permite-nos, desde já, dissociar o envelhecimento da população da categoria das pessoas idosas, isto é, distinguir correctamente o conjunto das características da pirâmide dos idosos e uma só das suas secções. Além disso, leva-nos também a diferenciar a categoria das pessoas, mulheres e homens recém-reformados, ainda jovens e com capacidade reais para produzir, serem empreendedores e com capacidades para transmitir, da categoria dos mais idosos que não pára de aumentar o seu peso relativo nas fatias de idade dos mais de 60 anos. Em função de experiências vividas em concreto, estamos à partida em condições para revalorizar o papel e o lugar dos «velhos» e dos «não assim tão velhos». Memórias vivas de saber-ser e de saber-estar, a presença de idosos é determinante para a manutenção dos patrimónios locais, das culturas, das paisagens, da ligação social nas aldeias e simplesmente, por vezes, da vida… Sejam eles activos ou simplesmente grandes consumidores de serviços de proximidade e de apoio à pessoa, os «velhos» no meio rural estão na origem da criação de muitos empregos e, inclusive, capazes de manter, ou mesmo atrair, famílias e de voltar a dinamizar os territórios. Têm também uma incomparável função de acolhimento e todo um papel na implementação de dinâmicas de Educação Popular mais perto dos habitantes. São uma «sorte» e têm que ser considerados como tal no processo de acompanhamento de renascimento do campo. Pertence-nos confirmar este facto pelo nosso envolvimento e as nossas acções. Este encontro permite-nos, e é o segundo ponto que quero referir, reatar com a prática de um dos elementos mais originais e inovadores deste conceito de Universidade Rural Europeia (URE): «Os Itinerários» que constituem o seu real valor acrescentado. Os itinerários são pequenos grupos internacionais que permitem o encontro concreto, as trocas direc-

Vem aí a globalização…

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tas, a reflexão e os debates entre uma comunidade de acolhimento e Europeus do nosso Movimento vindos para descobrir in loco uma sociedade, uma cultura, um território e o seu projecto, mas também para testemunhar as suas experiências levadas a cabo sobre os mesmos temas e, frequentemente, a mesma problemática. Analisar para dizer ao outro, pôr em perspectiva, debater, cruzar o olhar com olhares distanciados e que carregam uma história contribui para dar uma maior visibilidade e, por vezes, dar ainda mais sentido aos esforços dos actores. Tal como estão concebidos, estes itinerários inscrevem-se nas lógicas das políticas incentivadas e apoiadas para favorecer as iniciativas locais dos actores de terreno e valorizar os esforços de desenvolvimento o mais perto possível dos habitantes, em perspectivas de desenvolvimento durável, isto é, auto-sustentável pelas próprias populações. Instituindo-se por vezes em Assembleias Populares largamente abertas, e constituindo momentos fortes para os processos de desenvolvimento local, estes encontros levam e reforçam no coração dos territórios rurais a expressão da Educação Popular que está na base do nosso movimento e favorecem trocas de boas práticas e de colocação em redes temáticas e territoriais que se prolongam e se afirmam no tempo; em qualquer lado as sociedades rurais necessitam realmente disso. Para além disso, estes itinerários preparam colectivamente a participação activa dos actores e actrizes dum território nos trabalhos mais teóricos que são dirigidos ulteriormente por ocasião das sessões das URE e legitimam de fazer voltar em sessões plenárias as análises e as expectativas de terrenos confrontados aos dados da economia globalizada e às directrizes da Política Agrícola e do Desenvolvimento Rural tal como é concebida e negociada pela União Europeia. O nosso movimento nascido da vontade dos actores e actrizes de terrenos pode deste modo voltar a exprimir, ao longo das sessões, a nossa determinação em fazer viver e ter em consideração, na escala europeia, as dinâmicas ascendentes dos terrenos e das empresas locais. Estas trocas têm um papel essencial nas transferências cruzadas de conhecimentos a partilhar e são indispensáveis para pensar-se em modelos inovadores e especificamente adaptados às necessidades de desenvolvimento dos territórios rurais. É a missão da APURE e dos seus parceiros impulsioná-los e contribuir para a construção de uma Europa dos cidadãos. •

Josy Richez Vice-Presidente da APURE Aix-en-Provence, França, Abril de 2006


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