O cabeça chata que virou todo mundo

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ESTE FOLHETO É PARTE INTEGRANTE DO ACERVO DO BEHETÇOHO EM FORMATO DIGITAL, SUA UTILIZAÇÃO É LIMITADA. DIREITOS AUTORAIS PROTEGIDOS.


INFORMAÇÕES SOBRE O PROJETO O Acervo Eletrônico de Cordéis do Behetçoho é uma iniciativa que pretende dar consequências ao conceito de (com)partilhamento dos artefatos artísticos do universo da oralidade, com o qual Behetçoho e Netlli estão profundamente comprometidos.

INFORMAÇÕES SOBRE A EQUIPE A equipe de trabalho que promoveu este primeiro momento de preparação e disponibilização do Acervo foi coordenada por Bilar Gregório e Ruan Kelvin Santos, sob supervisão de Edson Martins.

COMPOSIÇÃO DA EQUIPE Isabelle S. Parente, Fernanda Lima, Poliana Leandro, Joserlândio Costa, Luís André Araújo, Ayanny P. Costa, Manoel Sebastião Filho, Darlan Andrade e Felipe Xenofonte


FRANKLIN MAXADO

O CABEÇA CHATA QUE VIROU TODO MUNDO



Falam que o cearense É bicho que corre mundo Se encontra até na china Sem que seja vagabundo Como o caso deste aqui Chamado Zé Viramundo

Uns dizem que ele é O tal judeu brasileiro Pois só pensa em viração E ganhar muito dinheiro Negocia até a mãe Mas não cumpre o trato inteiro Recebe mas não entrega É fino na sua conversa E Zé Viramundo é Como o poeta que versa A vida do cearense Que do seu chão se dispersa


Outros falam que ele tem A cabeça chata e grande Por causa dos cariris E por onde quer que ande Tem jeito de índio manso Ou de gente lá de Flandre Pois o Ceará já foi Colônia de holandês Até do judeu e luso Pecebeu lá o francês E desse cadinho de raças Saiu o nosso freguês

Se falei do cearense Duma maneira geral Vou falar do Viramundo Um tipo bem natural Cabeça chata legítimo Da cidade de Sobral


Naquele torrão natal A terra é esturricada Sempre há falta de água E vem a seca danada Matando bichos e gente E a vida é flagelada

Por isso, o pai de José Que tinha família enorme Botou-o pra estudar Mas não espera que forme Pois tem de ajudar na feira De onde come e dorme Nessa escola, a professora Um dia, trouxe a peneira E ensinou o que é chuva Botando-a sob a torneira E da água que saiu Cairam pingos pela esteira


E tudo ali é difícil Naquela terra esquecida Há poucas oportunidades Para se ganhar a vida O povo tem de ser forte E sabido para a lida

E todo pai de família Que sente aquela aflição Quando está com os seus filhos Passam-lhe sempre a mão Na cabeça e vão dizendo Naquele tom de amigo irmão: ─ Cresce filho pra sair Por este mundão a fora Trabalhar e negociar Ganhar dinheiro de fora Se não quer ficar nisso É preciso ir-se embora


Assim, as cabeças deles De formas arredondadas Vão ficando como o mundo Com as partes achatadas E estas são seus polos Que lhe guiam nas estradas E o menino cearense Começa na Geografia Tem o mundo na cabeça Aprende a Astronomia Fica no sol, como a terra Entra no quente e na fria Aprende logo as letras Vogais e do abecê Para assinar o nome Aí também vai fazer Os números da tabuada Pra poder enriquecer


De tudo tem que poupar E tem de tirar vantagem Quando já tá crescidinho Já pode fazer viagem Até os ciganos se perdem No saber e na coragem

Uma vez, um desses homens Que ia viajando, olhou Do ônibus para o céu claro E para o vizinho falou: ─ Vai chover daqui a pouco E o outro não acreditou

Não é que a água caiu! Lá no chão riograndense E o freguês abismado Que era um paranaense Perguntou se ele era astrônomo ─ Não, sou apenas cearense!


Por estas e por mais outras É que dizem que o tal Povoou o Amazonas Maranhão e o Canal Piauí, Pará e Acre E todo o Brasil central Se ficar no seu Ceará Tem de disputar seu ganho É cobra engolindo cobra E não pode ser tacanho Pois a concorrência é Muito grande no tamanho Ele pode logo ser Camelô ou maquinista Soldado ou jangadeiro Aviador, motorista Jogador ou marinheiro Violeiro ou artista


No país, no Sul e Leste O cearense aportou Se alastra mais do que praga Porém é trabalhador E onde está o dinheiro Lá tem o seu ganhador

Toca forró em São Paulo E lá no Rio de Janeiro Danças mais do que malando Em Minas, é garimpeiro Poeta, escritor e político Construtor e fazendeiro Engole fogo e ácido Come prego e gilete Alfinete, vidro, grampo Faca, pino, canivete Amolece aço duro Como quem masca chiclete


E não é só no Brasil Onde se encontra cearense Por toda a Sul América Chegando ao chão canadense E no meio dos esquimós No gelo groelandense

Pouco importa que Le chamem Pau-de-arara, chapéu de coro Tabaréu, cabeça chata Ele quer é ver o ouro Ou mesmo, cabra da peste Quando guarda seu tesouro Ele é Marte, deus do comércio E também é deus da guerra E o comércio é batalha E que está em toda terra Por mares, desertos, campos Ares, planícies e serra


Ás vezes você vai à Índia Pra ver faguir ou guru Pensa que pé indiano Mas após toma um chabu É um cearense bem vivo Que está naquele angu

Com trancinha no cabelo Parece um chinês da China Conduzindo cabriolé Enquanto na Argentina Dança e canta o tango Tem cobre na zona andina

No oriente Médio, então É de tapete, mercador Tem caravana no deserto E de petróleo, explorador É garçom na França e Áustria Na Sibéria, é caçador


Na Noruega, é guia É toureiro na Espanha No Japão é relojoeiro É mecânico na Alemanha Minerador na Austrália E nobre na Grã-Bretanha

É cobaia de astronauta Na Rússia, onde ainda é Tocador de balalaika E bailarino de balé Enquanto que na Colômbia Planta banana e café

Nos Alpes, Urais e Andes Ele é pastor montanhês No Peru, cria alpacas O governo é seu freguês E para comerciar Fala até javanês


É petroleiro no Alasca E no cinema americano É índio, bandido e gringo E figurante mexicano E incrementa revoltas No continente africano Na África, ainda é Pai de santo e pirata Palhaço de circo, ator Empresário e acrobata Até no céu já chegou O irmão cabeça chata

Pois quando lá faz luar E Jesus tá meditando Manda chamar o Catulo Pra o sertão ir cantando Numa serena pai d’égua Com os santos escutando


Dizem até que São Jorge Nasceu lá no Ceará Pois correu todo o mundo E na lua foi morar Chegou antes dos ianques Que foram lá lhe cassar

Ele levou seu jumento E sem água ali fica Em chão seco, com poeira Que contém metais e mica E porque ele tem tudo Porisso não enrica Terminei a minha estória Louvando o cearense Cabeça chata e taludo E eu que sou um feirense Baiano e nordestino Escrevo pra que se pense


M- acho forte e sabido A- pesar de ser franzino X-eleléu, ele não é A-vida do nordestino D-o cearense em questão O-viajador sem destino. FIM



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