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4.1. A escrita de origem popular
4.1. A escrita de origem popular
Dentro do território da escrita, pode-se observar que, de maneira geral, a escrita popular é desconsiderada ou menosprezada por cidadãos de todos os níveis culturais (GUIMARÃES M., 2007), é olhada como algo de pouco valor. Mesmo assim, o valor do popular, o design não culto e a comunicação informal no final das contas fazem parte do espaço público, dos lugares que pertencem à comunidade. Nos últimos anos, pensadores e pesquisadores têm observado a escrita popular com maior atenção, e as formas em que se encontra na rua, valorizando sua aparência e composição, junto com sua inserção fora do seu contexto original, uma estética que passou “do lixo ao luxo” em algumas ocasiões.No campo do design, o estudo destas manifestações se apresenta tanto como uma forma de aproximação da linguagem popular, quanto a observação do espaço urbano, para um melhor entendimento e aplicação de propostas e soluções, visando este material como recurso válido para a criação.
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Na arquitetura, existe o termo vernacular, que foi adotado para representar as construções realizadas com técnicas e materiais originários de uma região específica, um conhecimento que geralmente passa de geração a geração entre uma comunidade. Vernacular refere-se então às formas de construção que não tem um estudo formal das estruturas e fachadas, e que são realizadas de forma intuitiva. Outras áreas, entre elas o design, têm usado também este vocábulo, como uma forma de classificar a gráfica popular e a forma como a população contribui com imagens e objetos na construção da paisagem urbana, à sua maneira, sem necessariamente ter estudos específicos para aquilo. Na linguagem, vernacular é uma forma de designar o idioma puro, utilizado na fala e na escrita, sem o uso de palavras de idiomas estrangeiros. O termo vem do latim vernaculum, ou seja, proveniente de verna, na antiga Roma, vernáculo era o escravo nascido na casa do seu patrão28 .
No caso do grafite, a escrita foi a primeira forma de expressão irreverente que foi aos muros das cidades. Segundo Paulo Heitlinger (2010, p.565): “Os graffiti urbanos terão sido os primeiros tipos a caber na categoria das Letras vernáculas.
28 http://portal.estacio.br/instituto/o-que-%C3%A9-vern%C3%A1culo/
Depois veio o Lettering de origem popular”. A elaboração das letras nesta forma de intervenção urbana foi evoluindo, desde as simples formas escritas com uma linha só, que apresentavam um pensamento de forma explícita, até o desenvolvimento de sofisticadas e elaboradas formas que se podem considerar formas de ilustração. No Brasil, há uma marcada divisão dentro do que no mundo todo chama-se de graffiti: existe a pichação, que é a prática de escrever em muros, edifícios, monumentos e vias públicas, de forma rápida e sem autorização, realizados com uma paleta limitada a uma ou duas cores e com ferramentas que permitam traços ligeiros e fluidos; e existe o grafite, que é considerado como uma prática artística, que tem mais elaboração e diversidade de cores e elementos, em alguns casos realizada em muros autorizados e sendo mais bem aceitos dependendo do lugar e circunstância em que são elaborados.
Cabe esclarecer que nesta pesquisa consideramosa pichação como uma forma de escrita simbólica29 que faz parte da classificação realizada no contexto das intervenções urbanas, de maneira tangencial e sem aprofundar exaustivamente em outros aspectos relativos ao campo antropológico, dentro do extenso território que representam seus valores e pretensões. Essa prática, considerada uma forma de expressão cultural popular ilegítima pela sociedade em geral, é uma demonstração de presença e marcação de território, original e diferenciada de outras formas de intervenção, em especial pelos desafios para a execução da prática, pelo seu espírito vandálico e pelas formas de execução apresentadas, como, por exemplo, o desafio que encaram alguns pichadores ao alcançar lugares de difícil acesso para realizar as pichações, enfrentando riscos e perigos sem nenhuma proteção ou segurança.
Muitos são os textos que encontramos nas ruas e o grafite com sua espontaneidade é uma das formas que mais participa para a construção da paisagem urbana. A palavra escrita, além de ser um conjunto ordenado de caracteres ou vocábulos, para o entendimento de um conceito que seja compreensível pelo observador, oferece em sua composição muita informação fora do conteúdo pragmático do puro significado da linguagem. O próprio visual das letras, a ortografia, a composição das silabas, o uso de caixa alta e caixa baixa, as cores e as
29 Nos referimos com isto à utilização de símbolos, que são desenhados e compostos por cada pichador