Revista Partilhar N.º 88 Maio de 2021

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PARTILHAR

A nossa reunião impressa

"Gratidão progressiva"

"A importância da partilha" "Ao encontro da felicidade"

OS DOZE PASSOS DE ALCOÓLICOS ANÓNIMOS

Estes são os Passos que seguimos, sugeridos como um programa de recuperação:

1.º Admitimos que éramos impotentes perante o álcool – que as nossas vidas se tinham tornado ingovernáveis;

2.º Viemos a acreditar que um Poder Superior a nós mesmos nos poderia restituir a sanidade;

3.º Decidimos entregar a nossa vontade e a nossa vida aos cuidados de Deus, como O concebíamos;

4.º Fizemos, sem medo, um minucioso inventário moral de nós mesmos;

5.º Admitimos perante Deus, perante nós próprios e perante outro ser humano a natureza exacta dos nossos erros;

6.º Dispusemo -nos inteiramente a aceitar que Deus nos libertasse de todos estes defeitos de carácter;

7.º Humildemente Lhe pedimos que nos livrasse das nossas imperfeições;

8.º Fizemos uma lista de todas as pessoas a quem tínhamos causado danos e dispusemo -nos a fazer reparações a todas elas;

9.º Fizemos reparações directas a tais pessoas sempre que possível, excepto quando fazê -lo implicasse prejudicá -las ou a outras;

10.º Continuámos a fazer o inventário pessoal e quando estávamos errados admitíamo -lo imediatamente;

11.º Procurámos através da oração e da meditação melhorar o nosso contacto consciente com Deus, como O concebíamos, pedindo apenas o conhecimento da Sua vontade em relação a nós e a força para a realizar;

12.º Tendo tido um despertar espiritual como resultado destes passos, procurámos levar esta mensagem a outros alcoólicos e praticar estes princípios em todos os aspectos da nossa vida.

(Copyright – Alcoholics Anonymous World

PREÂMBULO

Alcoólicos Anónimos © é uma comunidade de homens e mulheres que partilham entre si a sua experiência, força e esperança para resolverem o seu problema comum e ajudarem outros a se recuperarem do alcoolismo. O único requisito para ser membro é o desejo de parar de beber. Para ser membro de AA não é necessário pagar taxas de admissão nem quotas. Somos auto-suficientes pelas nossas próprias contribuições. AA não está ligado a nenhuma seita, religião, instituição política ou organização; não se envolve em qualquer controvérsia, não subscreve nem combate quaisquer causas. O nosso propósito primordial é mantermo-nos sóbrios e ajudar outros alcoólicos a alcançar a sobriedade.

Copyright © "The AA Grapevine, Inc."; reproduzido com autorização

DECLARAÇÃO DE PROPÓSITO

“Partilhar” é a revista de Alcoólicos Anónimos de Portugal. Escrita, ilustrada, editada e lida por membros de AA e outros interessados no programa de recuperação do alcoolismo, é uma linha de vida que une um alcoólico a outro e um veículo para levar a mensagem de AA.

“Partilhar” é também uma reunião impressa. Transmite experiência, força e esperança e as participações devem reflectir as várias sensibilidades de AA.

“Partilhar” deve ser economicamente auto-suficiente.

“Partilhar” considera bem-vinda a experiência de qualquer membro sempre que se enquadre nos princípios de AA, pois é o caminho que cada um escolheu para trabalhar o programa.

“Partilhar” em particular ou AA como um todo rejeitam qualquer endosso referente às opiniões expressas nos materiais publicados; estes reflectem somente a posição individual de quem os subscreve.

“Partilhar” será a única reunião impressa de Alcoólicos Anónimos de Portugal. No seu propósito de transmitir a mensagem de esperança de AA deve ser também um factor de Unidade.

EU SOU RESPONSÁVEL

Sempre que alguém, onde quer que seja, peça ajuda, eu quero que a mão de AA esteja sempre presente. E, para tal, eu sou responsável.

PARTILHAR

Revista de AA - Portugal - N.º 88 - Quadrimestral Maio de 2021

Envia a tua colaboração para: Praça D. Miguel I, n.º 3 C 2660-310 Santo António dos Cavaleiros

Ou através de e-mail para: publicamos@aaportugal.org

Telefone: (Ajuda) 217 162 969

Telefone: (Serviço) 217 167 840

ser

ao processo de aprovação em Conferência, esta reconhece-a como a Revista de Alcoólicos Anónimos de Portugal.

SERÁ QUE AA É PARA SI?

1. Alguma vez tentou parar de beber por uma semana ou mais, mas só conseguiu por alguns dias?

2. Acha que as pessoas se deviam meter na sua própria vida no que diz respeito à sua maneira de beber – deviam deixar de dizer o que você tem de fazer?

3. Alguma vez tentou mudar de um tipo de bebida para outro na esperança de que isso o impedisse de se embebedar?

4. Alguma vez bebeu de manhã durante o último ano?

5. Sente inveja das pessoas que conseguem beber sem arranjarem problemas?

6. Tem tido problemas relacionados com a bebida durante o último ano?

7. A sua maneira de beber causou problemas em casa?

8. Alguma vez tentou arranjar “mais” bebidas em festas porque não lhe davam o suficiente?

9. Alguma vez se convenceu de que conseguia parar de beber quando quisesse, apesar de continuar a embebedar-se sem querer?

10. Alguma vez faltou ao trabalho por causa da bebida?

11. Tem “apagamentos”?

12. Alguma vez sentiu que a sua vida seria melhor se não bebesse?

Respondeu SIM quatro vezes ou mais? Se assim foi, tem provavelmente um problema com álcool. Porque é que nós dizemos isso? Porque milhares de pessoas em AA o disseram durante muitos anos. Descobriram a verdade sobre si mesmas da maneira mais dura.

Prontificamo-nos a mostrar-lhe como nós próprios parámos de beber. Entre em contacto connosco. Procure Alcoólicos Anónimos através do telefone 217 162 969 ou do e-mail ajuda@aaportugal.org

NOTA DE ABERTURA

A VIDA RENASCE

Agora que a Humanidade começa a ter já mais certezas sobre os próximos tempos, agora que já começamos todos a sorrir, é tempo de a nossa Comunidade voltar a olhar para ela própria e, com a prudência e a segurança necessárias, retomar as reuniões presenciais, caso seja essa a vontade das Consciências de Grupo plenamente informadas e esclarecidas.

É também o momento de todos percebermos a verdadeira dimensão do “nosso AA”, após um longo tempo em que apenas pudemos contar, e bem, com as reuniões virtuais para continuarmos a cumprir o nosso único propósito: Levar a mensagem de AA. Antes da pandemia, contávamos quase 90 Grupos listados no nosso directório; durante este período complicado e difícil, cerca de 35 Grupos tinham reuniões virtuais regulares.

Agora que a vida recomeça a florir, é importante perceber qual a dimensão que temos, entre Grupos com reuniões presenciais e Grupos com reuniões virtuais, sempre com a certeza de que, quer sejamos muitos Grupos quer sejamos poucos Grupos, estamos todos a sair deste momento muito mais fortalecidos e resilientes.

Temos também, todos nós, a responsabilidade dos compromissos assumidos, quer connosco, quer com a sociedade em que nos integramos. Para continuarmos a levar a mensagem, há também uma altura em que o “material se transforma em espiritual”. Assim, não é de mais lembrar que são necessárias as contribuições de todos para prosseguirmos o nosso trabalho e cumprirmos aquilo que de nós é esperado.

Também o nosso “sítio na internet” continua a ser o “pivot” neste processo de vos mantermos actualizados, e informamos que as Comissões e os Serviços do Conselho continuam dinâmicos e a trabalhar para o nosso propósito. É lá que a informação mais actualizada está disponível para todos, sem excepção.

Por fim, sendo certo que todos nós ansiamos pelo reencontro físico, pelo abraço, pelo calor humano único que encontramos nas reuniões presenciais, a prudência e o bom senso que a sobriedade nos ensina devem continuar a pautar as nossas acções

A mensagem que vos deixamos continua a ser de Força, Esperança e Fé: a vida continua, e a nossa vida já está, efectivamente, a melhorar!

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GRATIDÃO PROGRESSIVA

"A gratidão deve progredir em vez de retroceder."

Na Opinião de Bill, pág. 29

Estou muito grata ao meu Poder Superior por me ter dado uma segunda oportunidade de viver uma vida digna. Através de Alcoólicos Anónimos, recuperei a minha sanidade. As promessas estão a ser cumpridas na minha vida. Estou grata por estar livre da escravidão do álcool. Estou grata pela paz de espírito e pela oportunidade de crescer, mas a minha gratidão deve progredir e não regredir. Não posso manter-me sóbria com as reuniões ou com Décimos Segundos de ontem. Tenho de pôr a minha gratidão em acção hoje.

O nosso co-fundador disse que a melhor maneira de demonstrar a gratidão é levar a mensagem a outros. Sem acção, a minha gratidão não passa de uma emoção agradável. Preciso de a pôr em acção, trabalhando o Décimo Segundo Passo, levando a mensagem e praticando os Princípios em todos os aspectos da minha vida. Estou grata pela oportunidade de levar a mensagem hoje!

As reuniões são uma forma de levar a mensagem, mas há outras. O comportamento que temos em relação aos outros e que, com certeza, temos vindo a modificar para melhor, é também uma forma de levar a mensagem. A Informação Pública está a começar a querer crescer aqui no Norte, na Área 2, porque tem havido pouca. Para já, houve uma reunião com os representantes do ESG e os representantes dos Grupos. Não estiveram todos presentes, mas vê-se que a acção está a mexer.

Outra forma de gratidão é a gratidão propriamente dita, que é eu sentir-me grata, sempre, mesmo que esteja com neura, ou com desânimo, ou que me tenha aborrecido, preocupado com doenças, confinamentos, etc. Apesar de tudo, devemos estar gratos, sempre. Nunca sabemos o benefício que vamos recolher da desgraça que agora nos acontece. Só esperando para ver. Neste “esperar” estão a esperança e a confiança, que são duas coisas que devem estar sempre juntas com a gratidão: estar grato e confiar, tendo esperança.

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CINCO ANOS, SETE MESES, QUINZE DIAS E

ALGUMAS HORAS

Hoje sei, sem sombra de dúvida, que já nasci com a doença do alcoolismo. Latente, passiva, podia nunca ter acordado e tornar-se uma doença activa, mas tornou-se E, enquanto se manteve activa, fez-me a vida num inferno, causou-me danos, uns reparáveis e outros não, e fez-me causar danos à minha família, também estes uns reparáveis e outros não.

Presentemente, graças ao meu Poder Superior, a AA, ao Programa dos Doze Passos, à preciosa ajuda da minha madrinha e dos meus companheiros, tenho cinco anos, sete meses, quinze dias e mais algumas horas de recuperação.

Durante esta caminhada, aprendi a reconhecer e a aceitar que sou alcoólica e a viver em paz com a minha doença, a ser responsável por mantê-la inactiva 24 horas de cada vez, seguindo o Programa, fazendo reuniões regulares (nesta fase, online), mantendo a relação de apadrinhamento com a minha madrinha, mantendo o meu envolvimento em serviço em AA –embora, nesta fase de pandemia, mais reduzido em resultado da mesma –e estando disponível para levar a mensagem e ajudar quem precisar e quiser a minha ajuda para alcançar a sobriedade e manter-se em recuperação, 24 horas de cada vez.

Hoje, não me sinto uma vítima do meu alcoolismo nem culpada de uma doença pela qual não sou nem ninguém é responsável. Já me vitimizei e culpabilizei muito e culpei também muito o meu Poder Superior e muita gente pelo meu alcoolismo. Hoje, compreendo genuinamente, e não apenas racionalmente, que esse não é o caminho que quero para mim. Nem o alcoolismo activo, nem a vitimização, nem a culpabilização, a minha ou seja de quem for.

Do álcool, aprendi que, tendo eu uma doença alcoólica, a primeira gota conduz à destruição.

Da vitimização e da culpabilização, aprendi que não vem nada de positivo nem de construtivo. Sou doente alcoólica como podia ser cardíaca, invisual, surda ou ter qualquer outra doença, e ninguém é culpado por isso. Mas

também aprendi que é responsabilidade minha manter a minha doença inactiva. E aprendi que essa é uma responsabilidade de todos os dias, porque ignorá-la arrastar-me-ia de novo ao activo, à autodestruição e à destruição dos que amo.

Aprendi que, sozinha, nunca conseguiria dominar esta doença e inactivá-la em cada dia. Mas também aprendi que, com a humildade de entender que, com a ajuda dos outros, consigo o que sozinha me é impossível, mantenhome neste caminho, convosco, de mãos dadas e feliz com as promessas que, como diz a nossa Literatura, se vão cumprindo, “umas vezes depressa, outras mais devagar, (...) se trabalharmos para isso.”

Hoje, posso dizer que estou serena e feliz. E posso dizê-lo não sendo a minha vida o que sonhei, nem imaginando que se vá tornar em tal, mas porque aprendi a aceitar a vida tal como se me apresenta em cada dia e a estar grata por ela com o que me traz de bonito, com o que me faz sorrir e com o que me traz de sombrio e me faz crescer. Claro que a segunda parte é a mais dura e, muitas vezes, em cima do momento não se consegue estar grato.

O luto faz parte de qualquer dor, mesmo das dores de crescimento que nos fazem deixar para trás o que tem de ficar para trás, por muito que nos custe; mesmo reconhecendo que pode ser tarde demais para realizar sonhos que são já fora de tempo porque, nos momentos em que surgiram as oportunidades de os realizar, não soubemos ver que era por ali o caminho, ou vimos, mas não tivemos recursos interiores para o percorrer.

Hoje estou em paz com o que sou. Aceito-me, respeito-me e gosto de mim assim.

Hoje, sei que é normal que haja quem não me respeite e não permito que isso aconteça. Sei que é normal que haja quem não goste de mim: isso eu respeito, ainda me custa a aceitar, mas já não me destrói.

Lembro-me de achar que era humilde, mas hoje vejo que estava cheia de arrogância interior, de orgulho e de inveja pelos que conseguiam o que eu não conseguia. Não via os meus defeitos porque tinha necessidade de ser agradadora e por isso me esforçava até à exaustão por ser perfeita, até chegar a acreditar que o era e que o que de mau me acontecia era sempre culpa dos outros. Não permitia que os meus defeitos se mostrassem, nem a mim própria, por isso não os conseguia ver.

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Foi convosco que descobri o meu "lado-sombra". Ainda não o consigo ver nem reconhecer sempre mas, quanto mais o vejo, melhor aprendo a ser humilde, a ser tolerante com o "lado-sombra" dos outros e até a gostar deles, apesar desses nossos traços de imperfeição que nada mais são que um lado inevitável da nossa dimensão humana.

Hoje trabalho para limar arestas desse "lado-sombra". Já não tenho a veleidade de achar que ele não existe ou que o posso eliminar, mas sei que, se não lhe limar as arestas, alguém se vai ferir nelas, eu própria, aqueles que amo, seja quem for. Quero trabalhar para que os laços sejam de afecto e compreensão e não de agressões que empurram ou de paredes que impedem o contacto.

Hoje, e só por hoje, porque só por hoje posso falar, estou em recuperação, serena e grata, certa de que a minha vida é exactamente aquilo que devia ser, pois foi aqui que cheguei com tudo o que fui e sou, com a ajuda do meu Poder Superior e de todas as pessoas com quem me cruzei e partiram, e daquelas com quem me cruzei e ainda estão presentes na minha vida.

Sobre o amanhã, nem uma só palavra posso dizer, a não ser que aceito o que vier, grata, e que pedirei ajuda para o que vier a precisar. AA tem sempre a mão estendida para mim e para ti, que lês esta partilha.

Célia C

Hoje estou em paz com o que sou.

Aceito-me, respeito-me e gosto de mim assim.

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DEVO TUDO A ALCOÓLICOS ANÓNIMOS

Chamo-me Zé e sou alcoólico em recuperação. O meu alcoolismo fez com que eu fosse uma pessoa infeliz e estragasse o ambiente familiar que existia em minha casa.

Aos onze anos, entrei para uma oficina de carpintaria. Rapidamente os colegas deram-me álcool a provar e comecei a beber para me tornar “homem”.

Aos vinte e dois anos, tive uma filha. Passados dois anos, nasceu a segunda filha e ainda corria tudo mais ou menos bem lá em casa. Passaram-se os anos, elas entraram para a escola e, nessa altura, já eu começava a dar sinais de não conseguir controlar a bebida e de necessitar de beber logo de manhã. A minha esposa procurava obter alguma informação em revistas ou jornais mas, naquela altura, não havia tanta divulgação do Programa como hoje. O ambiente em casa tornava-se cada vez mais difícil. Através de um familiar, soube que a minha esposa se preparava para ir embora com as filhas. Comecei a pensar que, se já era difícil viver assim, então, sozinho, seria ainda pior: eu vinha bêbado para casa todos dias, por vezes deixava a mota nos cafés e, muitas vezes, um dos meus irmãos ia à minha procura para me trazer para casa.

Toquei trompete durante 39 anos e fui músico militar num Regimento de Infantaria. Uma vez, num concerto de uma outra banda, eu estava a fazer um solo completamente bêbado, comecei a perder o controlo e foi a maior “barraca” de todos os tempos... A seguir, triste e envergonhado pelo que tinha acontecido, estive três semanas sem ir aos ensaios, com vergonha de enfrentar os colegas. Finalmente, lá ganhei coragem para voltar e, de pé, pedi desculpas a todos, incluindo o maestro. Numa outra vez, em Fontanelas, num conjunto onde eu tocava órgão eléctrico, toquei três músicas completamente bêbado, desmaiei em coma alcoólico e tiveram de me levar ao hospital, em Sintra.

Queria muito deixar de beber, mas não sabia o que fazer para o conseguir. Concordei, então, que iria a um especialista em alcoolismo, e foi a partir daí que conheci as salas de Alcoólicos Anónimos. No dia 10 de Junho de 1995, comecei a recuperação e, passados 25 anos, continuo sóbrio e tenho sido muito feliz junto da esposa, filhas e agora duas netas, uma de cada filha. Desde aquele 10 de Junho, já tirei, inclusive, carta de condução. Actualmente, toco sax-tenor, órgão e bandolim. E também sou escultor popular, faço trabalhos em madeira e já fiz algumas exposições que têm corrido muito bem.

Reformei-me em Julho de 2020 e sou feliz. Devo tudo a Alcoólicos Anónimos.

José G

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A IMPORTÂNCIA DA PARTILHA

Na minha maneira de ver, a partilha tem uma enorme importância na recuperação de todo o alcoólico e contribui para a continuidade desta Comunidade desde há muitos anos. Foi partilhando as suas dificuldades que dois alcoólicos deram início a esta grande obra que é Alcoólicos Anónimos. Naquele tempo, não havia Literatura, os Passos não existiam e só anos mais tarde surgiram as Tradições. O nosso Livro Azul foi uma das primeiras formas de levar a nossa mensagem de Recuperação, sendo constituído por partilhas de membros já em recuperação, além dos textos sobre AA, aprovados pelos alcoólicos do tempo de Bill e de Bob. Durante alguns anos, a maneira de levar a mensagem era “de boca a orelha”, partilhando uns com os outros aquilo com que as pessoas se identificavam, iniciando, assim, a sua Recuperação.

No Livro Azul, Bill descreve muito bem a partilha. Quando ia com Bob aos hospitais para tentar ajudar um alcoólico em sofrimento, a sua conversa com quem estava a ajudar consistia em partilhar a sua experiência em sobriedade e mostrar a enorme diferença entre estar bêbado e estar sóbrio. Tratava-se um alcoólico a falar com outro! Só um alcoólico compreende o sofrimento e a dor que o álcool provoca e até onde este o pode levar.

Partilhar numa reunião é fazer parte dela e de um todo, que é a Comunidade de AA. É dar aos outros pedaços da minha vida, parte de mim mesmo, coisa que só ali me sinto à vontade para fazer, sabendo que ninguém me vai julgar ou criticar, e que posso libertar-me dos meus medos e incertezas. É partilhando que, pouco a pouco, me liberto do mal-estar que me causa o meu passado e também que partilho as alegrias que a sobriedade me traz. É partilhando e ouvindo os companheiros que faço a escolha do que quero ou não quero para mim, aproveitando o que me pode ajudar e pondo de parte aquilo com que não me identifico, mas não esquecendo nunca que o Programa de Alcoólicos Anónimos é a prática dos Passos e o respeito pelas Tradições e Conceitos

Numa reunião, quando há um recém-chegado, é através da partilha que se passa a mensagem de AA. Quando se faz um Décimo Segundo Passo, é ao ouvir a nossa experiência que o doente alcoólico encontra identificação. Partilhar é fortalecer o elo que nos liga, é aumentar a confiança que depositamos uns nos outros, é fomentar as amizades que se criam através da identificação, é dar amor e receber um amor incondicional que não espera nada em troca: apenas calor humano que, por vezes, tanta falta me faz.

Cândido C.

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ENTREVISTA

Como e quando chegaste a Alcoólicos Anónimos?

Foi no seguimento de um tratamento que fiz, motivado pelo abuso do consumo de álcool, e que aconteceu em Maio de 1997.

Podes referir, em poucas palavras, o que te cativou quando chegaste a AA?

O que mais me cativou foi a serenidade e a paz que me foram transmitidas pelos companheiros que encontrei. Além disso, a vontade colectiva de ajudar também me atraiu.

Que tipo de dificuldades realçarias desses primeiros dias num Grupo de AA?

Realço principalmente a minha dificuldade de partilhar para uma plateia de "desconhecidos".

O que pensas do Programa de Recuperação de AA?

Não conheço outro mas, para mim, foi, é e será a maneira de voltar a ter uma vida saudável, quer física quer mental, e "fácil" de concretizar pois é "só por hoje".

Por regra, a vida dos membros começa a alterar-se após a sua chegada a AA. Quais as mudanças mais significativas da tua vida em recuperação?

As mudanças foram tantas que dá vontade de citar um saudoso companheiro que dizia que, da anterior pessoa que ele era, só restava o nome. Mas posso indicar o desaparecer da angústia que me atormentava, o desaparecer dos medos e o regresso progressivo da vontade e alegria de viver e da auto-estima.

Como fazes para aplicar os Doze Passos de AA na tua vida?

Apesar de já terem passado algumas vinte e quatro horas desde que estou em recuperação (mais de 23 anos), tenho sempre presente a Oração da Serenidade e devo agir de acordo com ela.

Tens alguma dificuldade particular em relação a um ou mais Passos do Programa?

Por vezes, ao pensar no Décimo Passo, ainda sinto o abrir de feridas antigas e isso dói. Mas logo passa e lembro-me de que o que realmente me é difícil fazer é o Décimo Segundo Passo a uma pessoa que esteja alcoolizada, principalmente se for mulher.

Que dificuldades podes salientar nesta tua nova vida?

Em termos da doença, não sinto qualquer dificuldade Tenho apenas algumas dúvidas relativamente ao que consigo transmitir nas minhas partilhas e se faço tudo para ajudar o alcoólico que sofre.

O que te motivou a aceitar fazer serviço em AA?

Neste caso, fui quase um "voluntário à força", ou seja, no início do Grupo onde faço a minha recuperação éramos poucos (dois ou três) e, durante algum tempo, fomos mesmo só dois. Por isso, foi "fácil" assumir esse compromisso. Com o passar das vinte e quatro horas, tornou-se um hábito e hoje faz parte da minha recuperação.

O que fazes quando chega um recém-chegado à reunião? Há algum procedimento diferente quando isso acontece?

Tento sempre que haja alguém disponível para fazer uma partilha principal (muitas das vezes faço-a eu mesmo) e tento lembrar-me de como cheguei e não encher a cabeça do recém-chegado com o Programa todo. Só o Primeiro Passo é que tem de ser feito, todos os outros são para ir fazendo. E lembro sempre que isto é para quem quer e não para quem precisa.

Em relação à Literatura de AA, queres referir alguma obra em particular?

Pela importância que tiveram (e continuam a ter), destaco o cartão com a Oração da Serenidade e o "Só por Hoje" (têm ambos o mesmo tempo na minha carteira que o tempo que eu tenho de recuperação). Destaco também, pela ajuda na compreensão da doença, o "Livro Azul".

Que significado têm para ti a Revista “Partilhar” e o Boletim “Os Três Legados”?

A Revista "Partilhar" é a oportunidade de cada membro transmitir para o exterior o que AA fez e continua a fazer pelos alcoólicos em recuperação. O Boletim "Os Três Legados", por se destinar só a membros, é a forma de se dar a conhecer os eventos de serviço ao companheiro que não tem a possibilidade de se deslocar a outros Grupos. As nossas publicações

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recordam que os Legados da Unidade, Recuperação e Serviço fazem parte da nossa recuperação.

Na tua opinião, o que falta à Revista e/ou ao Boletim para atrair mais membros, quer para participarem com partilhas quer para subscreverem a própria Revista/ Boletim?

Talvez seja de fazer um apelo mais frequente durante as reuniões para que a Revista e o Boletim sejam lidos. Quanto à subscrição destas publicações, além da lembrança nas reuniões, deve fazer-se chegar atempadamente a Ficha de Subscrição e um companheiro ficar com o compromisso da recolha (e até do preenchimento) das mesmas e do seu envio ao ESG (Escritório de Serviços Gerais).

Queres expressar uma ideia geral sobre AA?

Como diz a nossa Literatura e disse o nosso companheiro Zé C. na primeira Conferência de Serviços Gerais, somos uma Comunidade de (é duro!) exbêbados que, graças a um Programa de vinte e quatro horas, conseguiram não só manter-se sóbrios como ajudar outros a romperem com a praga que é o seu alcoolismo.

Que mensagem queres deixar a um alcoólico que ainda esteja a beber?

Nem que seja só por curiosidade, "perca" um pouco do seu tempo e assista (não precisa de participar, é só ver e ouvir) a uma reunião de AA. Verá que somos pessoas iguais a todas as outras, apenas temos uma doença incurável mas fácil de lidar, basta não tomar o primeiro copo. É difícil, mas é mais fácil do que imagina, e nunca é tarde para começar.

Francisco C.

Apesar de já terem passado algumas vinte e quatro horas desde que estou em recuperação, tenho sempre presente

a Oração da Serenidade e devo agir de acordo com ela.

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PART ILHA DO BRASIL

N OVA ROTA

Ele rodou desgovernado durante anos até decidir

tomar

a estrada de AA, pela qual tem chegado a lugares jamais sonhados !

Sempre fui um competente motorista de caminhão, mas tenho que consultar uma lista para contar, um por um, os processos e boletins de ocorrências das vezes em que fui autuado por uso indevido de bebida alcoólica. Sem contar propinas que paguei para não ser fichado em batidas policiais e os acidentes causados pela minha embriaguez.

Olho para o passado e vejo um tortuoso caminho de desgoverno, violência e desequilíbrio. Atrasos, discussões e brigas com colegas de trabalho, insubordinação e vergonha para minha família. Uma dessas situações foi quando fui expulso da festa de confraternização da empresa, no Natal de 2008. A regra era consumir só cerveja, mas eu e alguns colegas levamos bebidas destiladas. Já cheguei embriagado. Um dos diretores abordou-me e disse que eu deveria retirar-me do ambiente. Depois de muita confusão, saí da festa com minha família humilhada.

Numa abordagem policial, de madrugada, tentei fugir. Depois de duas horas, fui detido e autuado por embriaguez, fuga, desacato à autoridade e agressão aos policiais. Na delegacia, descontrolado, agredi um escrivão. Para conter-me, os policiais usaram força moderada - o que me deixou quinze dias de cama. Quando voltei ao trabalho, deram-me férias que já estavam vencidas. O supervisor, meu amigo, emprestou-me uma casa no litoral para eu levar minha família. Na primeira noite, fomos jantar na orla, pedi uma dose para relaxar e, quando vi, lá estava eu, envolvido em mais uma briga de bar, que me custou a noite na prisão. Minha família voltou para casa assustada e sozinha.

Na empresa, minha situação ficou insustentável e fui encaminhado para internação psiquiátrica. O médico que me atendeu pediu, educadamente, que eu fechasse a porta e, sem rodeios, disse que meu problema era outro: senhor Manoel, o senhor é um doente alcoólico. Sei disso porque eu também sou. Poderia ficar aqui falando com o senhor durante horas, mas vou usar somente dez minutos para contar-lhe um pouco da minha vida e dizer que o senhor deve procurar Alcoólicos Anônimos. Não existe nenhum remédio que eu possa oferecer-lhe, a não ser este: noventa reuniões de A.A. Depois disso, o senhor decide o que quer da sua vida: continuar nas

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reuniões, ou beber e se matar. Procure uma reunião hoje mesmo, amanhã pode ser tarde demais. Mas o senhor é quem deve tomar a decisão.

Saí do consultório aturdido. Meu irmão, que me acompanhava, já tinha em mãos o endereço do grupo mais próximo e o telefone do plantão 24 horas. Eu detestava falar ao telefone. Nas viagens, quando ligava para empresas pedindo orientação, sempre era mal atendido. As pessoas pareciam não gostar do meu jeito de falar. Mas telefonei e, ao contrário do que esperava, fui muito bem tratado e orientado.

No dia 27 de maio de 2009, ingressei no grupo Renascer, do bairro dos Pimentas. Assisti às noventa reuniões e soube, afinal, o que queria da minha vida.

Depois de ser bem recebido no grupo, logo fui integrado ao serviço. Acompanhei uma divulgação na igreja da comunidade, e, vendo meu interesse, os companheiros convidaram-me para a reunião do Comitê Trabalhando com os Outros (CTO) do distrito. Mesmo acanhado, pois sempre tive receio de expor minha pouca instrução escolar, fui. Lá, fiquei sabendo de um simpósio sobre CTO. Não perdi a oportunidade, pois já estava há cinco meses na irmandade. No simpósio, depois de uma temática sobre o plantão telefônico, não tive dúvida e me candidatei a plantonista. Queria atender as pessoas como fui atendido em A.A., como sempre quis que me atendessem.

No primeiro dia de plantão, não toquei no computador. Sempre tive dificuldades com a escrita. Lia até de forma razoável - mas escrever - E agora - Cheguei em casa e falei com minha filha. Rapidamente, ela abriu seu computador e disse: é fácil, pai, o senhor vai ver. No segundo plantão, eu já sabia abrir arquivos e fazer pesquisas no Google. Acabou meu medo, assumi serviços no grupo, no distrito e no plantão telefônico. Hoje, somos cinco plantonistas: minha ação incentivou outros companheiros a participarem do plantão.

Na empresa, minha vida também mudou. Reconheceram minha boa vontade e não estou mais na estrada. Hoje, faço supervisão logística das cargas. Acompanho problemas, quebras de caminhões, correções nos trajetos e até cálculos de planilhas de custos; coisas que, pela minha experiência, posso solucionar ou pedir orientações. Isso tudo por aplicativos que manuseio do meu celular, na palma da mão.

Às vezes, lembro-me de que, antes de entrar em A.A., eu nunca tinha tocado num teclado de computador, nem sonhava em ter uma presença tão efetiva na empresa como tenho hoje. Não consigo medir o quanto devo à Irmandade - e ao serviço - pela sobriedade e serenidade concedidas à minha vida. Sou pai de família e emocionome quando penso na direção que tomei ao ingressar no programa dos Doze Passos. Obrigado aos companheiros, por me permitirem fazer parte dessa dádiva do Poder Superior.

Manoel, Guarulhos/SP

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Revista Vivência n.º 180

PARTILHA NO ÚLTIMO DIA DE 2020 :

MAIS UM ANO DE

GRATIDÃO

E EM SOBRIEDADE

Esta partilha foi mais um exemplo do que AA fez por mim em 2020. Ao preparar esta partilha, tive a oportunidade de passar em retrospectiva o que me aconteceu neste ano, que foi maravilhoso. Começo por agradecer, do fundo do coração, ao Grupo Recuperação Online por me ter convidado para partilhar neste dia 31 de Dezembro, que me é muito especial. Agradecer a todos os que, naquela reunião, quiseram ocupar um pouco do seu tempo de festa de Fim de Ano para estarem a ouvir-me e a todos vocês que estão a ler a Revista Partilhar.

Este dia foi muito especial, por ser o último dia de um ano que foi excelente nas várias vertentes da minha vida: desde logo, na minha recuperação, na minha relação familiar, nas relações de amizade e também no meu caminho profissional. A excelência deste ano para a minha vida que, devido à pandemia, foi pelo contrário um ano muito doloroso e triste para muitas pessoas, deve-se ao facto de me ter mantido em sobriedade, e esse facto é uma conquista sem preço. Também o considero muito bom porque consegui concretizar os objectivos que tinha traçado. Objectivos estes que foram muito exigentes e desafiantes, mas só passíveis de serem conquistados porque o álcool não esteve e não está na minha vida. Nesta partilha, vou procurar transmitir a minha experiência, força e esperança da melhor forma que posso e sei.

Ao contrário do que foram as minhas partilhas anteriores, vou tentar não falar tanto do passado alcoólico – que, claro, não quero nem posso deixar no esquecimento – porque, para mim, o mais importante é partilhar agora convosco a minha nova vida em sobriedade. Vou resumidamente falar-vos de como era, o que me aconteceu e, de uma forma mais alargada, como é o Jorge agora.

Não poderia deixar de começar a minha partilha com o agradecimento ao meu Poder Superior por me ter dado uma segunda oportunidade de viver uma vida digna. Através de Alcoólicos Anónimos, foi-me possível recuperar tudo aquilo em que já tinha deixado de acreditar. E, na realidade, eu tinha deixado de acreditar que algum dia poderia vir a ser feliz.

Agora, um pedacinho da minha história com o álcool.

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Iniciei o consumo de bebidas alcoólicas muito novo, por volta dos 15 anos, com a primeira bebedeira aos 16 anos, para comemorar a passagem do nono ano, que acabou no hospital, em coma alcoólico. Nasci numa pequena e bonita cidade do Norte muito perto ao Rio Douro, onde o álcool estava e está sempre muito presente. Naqueles anos oitenta, quase todos os momentos se viviam com a presença constante do álcool. As festas de Verão das aldeias mais próximas, a matança do porco e o trabalho no campo (as sementeiras, as vindimas, etc.) eram para mim momentos de diversão, felicidade e de muita bebida à mistura.

Ter um pai alcoólico não me impediu de fazer tudo aquilo que eu não queria para mim. Mas, agora, compreendo perfeitamente os seus comportamentos e as suas atitudes, pois foram muito idênticos aos meus. Ele, infelizmente, não teve a sorte que eu tive, não chegou a saber que tinha uma doença e não teve a oportunidade de conhecer e ser apoiado por AA. A minha juventude, talvez por esta vivência, foi acompanhada de muita rebeldia, muita insanidade e bebida em excesso.

Vim para Lisboa aos 20 anos viver sozinho, para o meio académico e já com a doença activa. Claro que estavam assim reunidos todos os ingredientes para o início de anos de muito álcool e de uma vida alcoólica no activo. Não me recordo de um dia sem beber em todos estes anos de excessos, também de divertimento, bebedeiras, ressacas, muitas asneiras e um indescritível caminho de sofrimento. Fiz de tudo: festas estragadas, acidentes de carro, problemas no trabalho, casamento preso por um fio e vida familiar num verdadeiro pesadelo.

Durante estes anos todos, tentei centenas de vezes beber normalmente, beber só às refeições e parar de beber, mas nunca fui capaz. Curiosamente, o dia 1 de Janeiro, “amanhã”, foi vezes sem conta o dia em que eu pensava e dizia, honesta e sinceramente, que ia parar de beber. Foi uma vida inteira a lutar, sem saber que, sozinho, era impossível. No final do meu alcoolismo activo, bebia desde que acordava até que adormecia. A minha vida era comandada pela necessidade de beber e bebia para fazer tudo. Vivia para beber e bebia para sobreviver!

Completamente impotente para resolver o problema sozinho, falei com o meu chefe para o colocar a par da minha situação e, estranhamente, verifiquei que ficou surpreendido pela minha sinceridade e, sem qualquer problema, deu-me todo o apoio para eu pedir ajuda. Nessa altura, não sabia bem o que fazer mas, depois de falar com um amigo psicólogo, encontrei um local para tratamento e, três dias depois, estava a ir a uma consulta e a

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marcar internamento. Com o meu estado debilitado e com necessidade de tratamento médico, tive de fazer uma desintoxicação que demorou 15 dias, a que se seguiu a entrada no centro de tratamento por um mês e onde estive até 22 de Dezembro de 2017.

E assim terminou uma caminhada de 35 anos de alcoolismo no activo e de muito sofrimento. Muita gratidão é o que sinto por todas as pessoas que participaram no início de um novo caminho da minha vida. Ainda esta semana, porque vou estar ausente por algum tempo, fui falar com a minha psicóloga para agradecer, recordar e rever com ela como foi a minha caminhada até agora e dizer-lhe como está o Jorge actualmente.

E agora, como prometido, vou partilhar convosco como é o Jorge hoje em recuperação e, principalmente, sóbrio.

Não tenho palavras para descrever a minha vida actual. Hoje em dia, os sentimentos que preenchem a minha vida são os de gratidão pelo que tenho, liberdade para escolher o que faço, orgulho pelo que me tornei, motivação para poder ser melhor, amor pela vida que tenho e – fundamental – muito amor-próprio.

A minha vida, como todas as outras, tem dias maus, menos bons, bons, outros muito bons e outros ainda melhores. Sim! Tenho dias maus, mas mesmo esses quase sempre me têm ajudado e impulsionado a aprender e a melhorar. Procuro todos os dias, sem excepção, eliminar, e muitas vezes apenas suavizar, o que não gosto em mim e os meus defeitos, como sejam: a falta de humildade, a teimosia, a grandiosidade e o egocentrismo.

Uma ferramenta fundamental que aprendi aqui em AA é utilizar a Oração da Serenidade para todos os aspectos da minha vida. Ter a Serenidade para aceitar aquilo que não está ao meu alcance mudar, ter a Coragem para alterar o que está ao meu alcance, mesmo que não seja fácil e cómodo, e ter a Sabedoria para, nos momentos de incerteza, saber distinguir o que posso do que não posso modificar.

Só temos um momento para viver e esse momento é o hoje, o agora, este momento. No entanto, temos – e eu tenho com alguma frequência – a tendência para viver muito no passado e no futuro. Foi por isso que tive sempre dificuldade em reparar e pensar no que está a surgir no presente. Tenho procurado, umas vezes depressa, outras mais devagar, dominar e corrigir alguns dos meus pontos fracos através da libertação do medo, do sofrimento, da sensação de culpa, dos pensamentos compulsivos, da

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insaciável necessidade de viver no passado e da procura fantasiosa do meu precioso futuro.

A nossa Literatura diz para colocar acção na recuperação e eu sigo à risca o colocar de muita acção no meu Programa de Recuperação e na minha vida. Penso e acredito que o “segredo” está na utilização do pensamento como uma arma a meu favor. Procuro inundar todos os meus dias com energia e pensamentos positivos, o que me tem trazido de volta energia positiva e um bem-estar cada vez maior. Evitar os pensamentos negativos e a autopiedade tem sido um caminho difícil mas, sem dúvida, o caminho certo para mim. No entanto, a verdade é que só tem sido possível porque procuro preencher o lugar da negatividade com pensamentos e acção positivos.

As relações pessoais e o atrair novos amigos tem sido a minha “galinha dos ovos de ouro” e mais uma ferramenta para trilhar o meu caminho. Descobri, aos 52 anos, que as relações pessoais e a felicidade com que as vivemos têm influência na nossa vida e na nossa saúde. A empatia com os outros é muito boa, traz-nos felicidade, protege o nosso cérebro e faz-nos felizes. Só por hoje, vou ser feliz! A felicidade está dentro de nós, não é uma questão exterior.

A cada um de vós, um grande e sincero bem-haja por estar a ler esta partilha, feita no final de 2020. Desejo-vos um Ano muito feliz. Que 2021 seja um ano repleto de luz, amor, saúde e em sobriedade.

Jorge P.

E assim terminou uma caminhada de 35 anos de alcoolismo no activo e de muito sofrimento. Muita gratidão é o que sinto por todas as pessoas que participaram no início de um novo caminho da minha vida.

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A O ENCONTRO DA FELICIDADE

Escrever o Quarto Passo é um desafio! Um desafio para a minha mente e para a minha memória. Episódios escondidos de uma vida de sofrimento, esquecidos e fechados dentro das gavetas da minha memória.

O alívio que tem sido poder partilhá-los com o meu padrinho, fazendo diminuir a dor e a vergonha que estes me causavam! Não existe comparação entre o que muitos destes episódios significaram no passado e o que significam hoje.

Nada se compara à vontade que tenho hoje de viver a minha vida, sabendo que vou chegar a casa e ser recebido com um sorriso, um beijo, um abraço e, principalmente, de poder retribuir o amor que recebo. Que contraste com o meu passado, em que todos os dias adiava o meu regresso a casa a fim de evitar perguntas, mentiras e discussões. Que bom que é saber que voltei a ter sentimentos, que voltei a ter a família de volta e amigos presentes.

Não consigo quantificar o peso que tirei de cima de mim ao descobrir que o mundo, as pessoas e a responsabilidade da minha vida não dependem exclusivamente de mim.

Perdi anos na procura da felicidade, da sobriedade emocional, da sanidade e da paz interior, sem nunca as ter encontrado, acabando por descobrir que isto é possível seguindo um Programa já experimentado por muitos e com excelentes resultados!

Fui uma alegria ter encontrado finalmente algo superior a mim, que está cá para mim, para toda e qualquer circunstância. Hoje posso dizer com total franqueza que é aqui que me sinto seguro, é aqui que quero estar e é por aqui que quero continuar.

Aqui sei que vou encontrar a esperança de poder vir a enfrentar os meus piores medos, a minha ansiedade, as depressões que me assolaram durante anos, a minha falta de auto-estima e as minhas raivas, sem precisar de me mascarar, de fugir, de esconder, de agradar e, muito em especial, de beber.

Hoje tenho um compromisso com a Comunidade de AA, para comigo e para com os outros. Tenho a responsabilidade de dar aos outros o que também me foi dado de graça.

Tenho esperança de que o melhor ainda está para vir, de cada vez que avanço ainda mais nos Passos.

N.

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L INHAS DE O RIENTAÇÃO PARA A R

EVISTA “P ARTILHAR "

A “PARTILHAR” é a nossa revista e grande parte de cada número é escrita por membros de AA que nunca escreveram antes. Sem a nossa opinião e experiência escritas, não pode continuar a ser um instrumento eficaz da nossa sobriedade nem dar uma imagem vital e fiel de AA como um todo. Podemos achar que não somos capazes de escrever, ou que não temos assunto. No entanto, todos temos uma experiência a partilhar! Porque não arriscar e darmos a nós próprios a oportunidade de fazer parte da reunião impressa de AA? Ao planear o artigo e tendo sempre presente a unicidade de propósito, é importante dar uma vista de olhos a outros números para se ficar com uma ideia geral do que publicamos. Importa escrever o que se pensa e sente e não o que se acha que queremos publicar. No que se relaciona com a experiência em AA, estamos sempre abertos a novas ideias.

FORMATO: Se for possível, os originais poderão ser dactilografados, entregues em CD ou, ainda melhor, enviados por e-mail para o endereço que se indica no final desta página. Se não puder ser, pedimos que escrevam de uma forma legível. Se for citada Literatura AA, devem ser mencionados o nome correcto do livro, folheto ou outra fonte, bem como a data da edição e o número da página.

EXTENSÃO: Uma frase ouvida numa reunião, um episódio curto mas significativo, um tema que interesse em particular partilhar, uma fotografia, uma anedota, não importa a extensão. A participação geralmente varia entre uma frase e três páginas.

ACORDO: Os materiais remetidos à "PARTILHAR" não são devolvidos e passam a ser propriedade da Revista por abdicação dos "direitos de autor". Quando a Redacção entender ser necessário reduzir ou modificar substancialmente parte dos textos, os autores serão contactados para a obtenção prévia da sua concordância. Nem todos os materiais serão publicados no número a seguir, mesmo alguns não o serão se: não servirem minimamente o nosso propósito primordial; sempre que não se enquadrem nos padrões de bom senso normalmente aceites ou ponham em causa o bom nome de AA. O mesmo se aplica a anedotas, desenhos, etc.

NÃO PUBLICAMOS: Textos que desvirtuem o espírito de partilha e o seu propósito em AA (experiência, força e esperança no nosso programa), orações pessoais, tributos a indivíduos em AA, drama, ficção nem qualquer matéria que não esteja relacionada com AA (por exemplo: artigos sobre tratamentos para o alcoolismo, legislação, avanços da medicina, etc.).

Agradecemos que nos enviem a morada, de preferência o endereço electrónico, para a qual possamos contactar caso seja necessário.

PARA ONDE ENVIAR: - “PARTILHAR”, Praça D. Miguel I, 3 C, 2660-310 Santo António dos Cavaleiros –

Email: publicamos@aaportugal.org

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AS DOZE TRADIÇÕES DE ALCOÓLICOS ANÓNIMOS

1.ª O nosso bem-estar comum deverá estar em primeiro lugar; a recuperação pessoal depende da unidade de AA.

2.ª Para o propósito do nosso grupo existe apenas uma autoridade fundamental: um Deus de amor tal como Ele se expressa na nossa consciência de grupo. Os nossos líderes são apenas servidores de confiança; eles não governam.

3.ª O único requisito para ser membro de AA é o desejo de parar de beber.

4.ª Cada grupo deverá ser autónomo, excepto em assuntos que afectem outros grupos ou AA como um todo.

5.ª Cada grupo tem apenas um propósito primordial - levar a sua mensagem ao alcoólico que ainda sofre.

6.ª Um grupo de AA nunca deverá endossar, financiar ou emprestar o nome de AA a nenhuma entidade parecida ou empreendimento alheio, para evitar que problemas de dinheiro, propriedade e prestígio nos afastem do nosso propósito primordial.

7.ª Todos os grupos de AA deverão ser inteiramente auto-suficientes, recusando contribuições de fora.

8.ª Alcoólicos Anónimos jamais deverá ter um carácter profissional, mas os nossos centros de serviço podem empregar pessoal especializado.

9.ª Alcoólicos Anónimos, como tal, nunca deverá organizar-se, mas podemos criar juntas ou comissões de serviço directamente responsáveis perante aqueles que servem.

10.ª Alcoólicos Anónimos não emite opinião sobre assuntos alheios à Comunidade; portanto o nome de AA nunca deverá aparecer em controvérsias públicas.

11.ª A nossa política de relações públicas baseia-se na atracção em vez da promoção; precisamos de manter sempre o anonimato pessoal na imprensa, na rádio e no cinema.

12.ª O anonimato é o alicerce espiritual de todas as nossas Tradições, lembrandonos sempre de colocar os princípios acima das personalidades.

(Copyright – Alcoholics Anonymous World Services Inc.)

NOTA: Chama-se a atenção para o facto de que a Terceira Tradição tem saído nas últimas Revistas com um erro agora detectado e emendado.

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Revista Partilhar N.º 88 Maio de 2021 by aaportugal - Issuu