REVISTA F. CULTURA DE MODA #17

Page 45

metodologias, como cantar, varrer, costurar e cozinhar. Enquanto a criança brinca livre o tempo todo, vê adultos ao seu redor realizando estas atividades cotidianas, de acolhimento, dando o aspecto de conforto de casa - não de uma instituição. Pode parecer até um pouco absurdo se levarmos em conta a maneira tradicional de ensinar das escolas e seus conteúdos, mas para a mãe de um aluno inserido nessa perspectiva, é absolutamente libertadora a forma como conduzem o aprendizado. Luiza Miguel é mãe de dois filhos, o mais velho estuda numa escola de me-

todologia Waldorf e ela diz que a escola vai ao encontro das coisas em que acredita, até porque conta com a participação dos pais em sua gestão e suas decisões. Para Luiza, o aprendizado se desenvolve através de uma formação humana completa, respeitando a criança, não invadindo seu espaço. Ela ressalta que isso não significa que as coisas são soltas, pelo contrário. São rigorosos, mas não repressores, tudo tem um sentido na realização de atividades, um horário e uma rotina. Luiza diz que há encantamento, há espaço para o onírico, próprio da infância, para o tempo

de pensar e agir do seu filho. A criança não fica restrita apenas à sala de aula, todo o espaço é para brincar e aprender. Claro que recursos materiais são essenciais para implementar qualquer metodologia educacional, e talvez este seja o argumento maior dos defenestradores de perspectivas pedagógicas mais libertárias, como a sueca. Mas a forma como o professor, na verdade, o educador - o que, em última análise, é um professor – age e pensa suas aulas, sua relação com os alunos e família e seu modo de avaliar e estabelecer objetivos é muito mais importante.

©Maurice Sendak - Onde Vivem os Monstros (Harper Collins)

Nina Veiga diz que mais do que ensinar, referindo-se a conteúdos, segue a orientação de um currículo comum no país: o como ensinar é que faz a diferença. Segundo Nina, a formação humana com relação à diversidade sexual, de gênero e raça dentro da pedagogia Waldorf tem como premissa a singularidade e a multiplicidade do ser, onde o que faz sentido é ser singular. “A tendência é não trazer questões de forma objetiva à experiência da criança, mas tratar de modo inclusivo todo ser singular. Ser singular é a única lei que o rege, a dele mesmo”, pondera. A educadora aponta que, por estar inserido na cultura, o ambiente da escola Waldorf pode

estar, sim, permeado por estas questões, especialmente porque as crianças reproduzem a cultura familiar. “O currículo da escola Waldorf já é por si generalista, não setoriza atividades por gênero, ou necessidades. As meninas, os meninos, as crianças com necessidades especiais, todos eles têm a oportunidade de fazer as suas atividades na possibilidade da sua própria singularidade”, explica. Um exemplo disso são as artes manuais domésticas, predominantemente consideradas femininas no âmbito da cultura e realizadas na sala de aula por meninas e meninos. Meninos e meninas fazem tricô, crochê, costura e bordado, assim como nos anos mais avançados do ensino médio há mecânica e metalurgia.

Paradigmas estão sendo quebrados, estamos vivendo momentos em que o protagonismo dos alunos, sua etnia e gênero estão sendo discutidos e respeitados. E apesar das pauladas diárias que a educação pública no país recebe, com leis que promovem até a “mordaça” no professor, impedindo o livre pensar e o diálogo, é possível uma educação humana e humanista, que ministre conteúdos e conceitos, mas sob uma perspectiva que valorize a diferença, promova a igualdade, crie oportunidades de aprendizado para todos e encoraje o lúdico. Criança é criança em qualquer lugar do mundo, barreiras culturais não impedem isso. A abertura de perspectivas e ações e abraçar o diferente caminham juntos para uma educação que cumpra sua principal função: pensar. 45


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.