rastros entre um documento

1 rastros entre um documento

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esta publicação digital contém a pesquisa e os processos relativos à execução do projeto “rastros entre um corpo” patrocinado pela lei de incentivo à cultura (lic) pelo edital 010/2022 lic prêmio / execução 2023.

(williany print) balneário camboriú - 2023

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agradeço a todes que estão envolvides na minha vida e demonstram carinho e apoio. aqui deixo a não identificação por nomes mas o espaço desses. o projeto, meu trabalho e meu corpo existem a partir das trocas com vocês. obrigade. (símbolo de coração)

4 índice 1. corpo do texto / 2. para publicar testes / 3. aquilo que aconteceu / 4. cenas do vídeo / 5. território / 6. links / 7. documento de mediação

5 resumo este trabalho foi composto a partir das buscas de textos (largados), arquivos de backups (não tão organizados) e postagens (quase) em anonimato para publicar testes. registros da construção de uma identidade sendo um corpo que vive em coletivo, com outros corpos que procuram entender suas transições junto de outres. para mostrar meu processo de criação, apresento junto ao texto outros textos de um registro como diário e frames do vídeo e imagens da publicação. trata-se de uma pessoa que procura comentar o processo da construção da sua pesquisa em torno dos procedimentos artísticos e sociais realizados em espaços de mudanças constantes. participo numa interdependência de criação existindo também como espectador.

palavras-chave: processo artístico; escrita; vídeo; corpo; identidade; fábula; território; entre.

6 (eu) queria contar alguma coisa, mas tenho muito de querer esconder coisas.

escrevo o eu entre parêntesis para esconder/comer a palavra/sujeito.

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8 1. corpo do texto questiono como em encontros iniciais os corpos estão em uma vulnerabilidade e são identificados em uma base de estereótipos. pessoas que não se limitam a categorias fixas de sexualidade, gênero e estética tem as suas relações definidas por outros através de comportamentos ou são apontadas pelas suas características discordantes da maioria da sociedade. aqui é bloqueada essa existência olhada dessa forma, procurando fazer junto de uma expressão artística a exploração por meio do diálogo, contaminação e apropriação de situações cotidianas, ampliando os limites para uma ação, incluindo e modificando questões como duração, memória, narração e ritmo. o processo se inicia quando busco em meu acervo documentos e arquivos imagéticos relacionados ao meu corpo, com um entendimento de que produzo pensando em insistência, seja de uma palavra, de um estilo, de um equipamento, de um gesto, de deslocamentos, de um objeto entre outros. desloco-me pelos métodos das linguagens que produzo nas artes visuais. “rastros entre um documento” é como eu nomeio esse caderno de processos. começo ele quando penso no que quero fazer do meu trabalho e de mim, uso de registros e faço a curadoria desse acervo onde entre esses momentos descubro uma não binariedade e investigo sobre as formas de identidade dentro de um coletivo e como as linguagens e conteúdo das redes sociais intervêm no trabalho e nas relações. minha pesquisa é escrita toda em letras minúsculas e, com exceção de momentos em caps lock. sou um corpo explorando modos de existência e escrevo em forma de relato, partindo de registros desde 2007 onde esse corpo era gravado no estado do pará, lugar que nasceu. essas gravações foram encontradas por esse corpo mais de uma década depois guardadas em um hd e vistas no estado de santa catarina, onde mora (2012-2023). eu assisto enquanto busco me entender dentro de outras representações e escrevo sendo a primeira e terceira pessoa. começo a entender que trabalho com insistência em 2021 quando escrevo uma frase sobre ter uma teimosia de querer me manter por perto e então acesso marília garcia escrevendo sobre a repetição e insistência de gertrude stein. gertrude stein diz que não existe repetição, existe insistência e vejo que teimosia é sinônimo de insistência. em um dos meus trabalhos feitos enquanto estava fazendo “rastros entre um corpo” escrevo um trecho de marília garcia sobre giorgio agamben “[...] no cinema/ a montagem é feita de dois processos corte/ e repetição”. então, durante esse trabalho escrevo sobre essas pessoas que falam das palavras repetição e insistência e incluo no texto a palavra ocupação pensando no meu corpo se ocupando várias vezes em um mesmo espaço e transitando desse espaço para outros. segundo a internet ocupação pode significar como o ato de executar um trabalho, e vejo a execução dos meus trabalhos em uma transferência de dados, sendo dados binários de códigos de computador traduzidos para a existência de imagens e movimentos, a transferência do meu corpo para outros corpos e vice versa, e a transferência de linguagens como é feito nesse trabalho: uma publicação sendo feita a partir de um vídeo ou um vídeo sendo feito a partir de um acervo.

9 2. para publicar testes (eu) não posto nada em minha conta principal no instagram, tenho dificuldades em me sentir confortável com postagens relacionadas ao que faço/vivo/construo sendo observadas por pessoas conhecidas ou que me acompanham. por isso, tenho outro instagram que chamo de “corpo que anda para publicar testes”. em uma das postagens neste escrevo: “tentando escrever sobre o que eu não quero escrever. ser falante comigo fora da cabeça. ler em voz alta tudo que escrevo para observar a entonação intercalando”. dito pelo nome o propósito desse instagram, compartilho nele algumas seleções importantes para o projeto.

10 print de um documento que estava escrevendo sobre como começar um projeto e só tinham questionamentos ali. por onde começar um projeto? qual o recorte da minha produção? na legenda conto como durante essas duas perguntas comecei a entrar em sites aleatórios e um dos sites era um avaliador de senhas, então escrevi meu nome completo de registro para saber qual seria a resposta. o site retorna falando que é uma senha forte, mas depois começo a questionar sobre esses vários nomes e que nomes são esses.

11 legenda de outra postagem: acho que eu sempre quis contar ou ao menos fazer um rótulo em letras miúdas das possíveis coisas que contaria. se eu fizesse uma tabela com informação nutricional indicaria ler no máximo 20 porções de páginas por dia*. *valores diários de referência com base em palavras. seus valores diários podem ser maiores ou menores dependendo de suas necessidades energéticas.

12 compartilho um vídeo quando criança e no vídeo do projeto compartilho uma imagem no mesmo local, a quadra de esportes da escola que era utilizada para os eventos festivos. no vídeo postado tem eu (provavelmente no carnaval da escola que estudava em icoaraci-pa) vestindo uma fantasia que me lembra uma das personagens do filme barbie lago dos cisnes, a que era um cisne bebê. no vídeo do projeto tem eu (provavelmente na festa junina da mesma escola) vestindo uma fantasia de bailarina com uma expressão facial fazendo bico e segurando um estalinho que adorava jogar no pé das pessoas ou bater com ele na minha testa para estourar porque vi uma vez meu irmão fazendo.

13 em “rastros entre um corpo” existe outro vídeo meu fazendo algo após ver meu irmão fazendo. estamos indo para a praia de joanes, na ilha do marajó-pa, minha mãe começa a filmar a família e meu irmão vira de costas e começa a caminhar assim para a câmera porque não gosta de que seu rosto apareça em registros, logo em seguida, repito seu gesto.

14 textos que escrevi e depois criei coragem para imprimir eles em forma de prints e zines para serem vendidos. “(...) não-condições deste fazer de nomear a si. trata-se de variações. se tornou mutável ou sempre foi (...) será que fala dormindo em códigos”.

15 uma foto que foi tirada como teste no celular para procurar o melhor enquadramento para o registro em filme analógico. recortei uma parte desse teste e coloquei no vídeo, a parte de cima do meu corpo é avistada em um espelho e ele está deitado com outro espelho por cima.

16 print da galeria do celular e do computador sobre um evento em itajaí-sc. evento de manifestação política-artística em defesa e celebração ao mês da visibilidade lésbica no brasil. quando pensei no projeto “rastros entre um corpo”, os registros em vídeo desse evento foram os primeiros que pensei. gravação de uma pessoa de costas e a lente da câmera a deixa desfocada / a mesma pessoa fala para câmera enquanto sorri / corpo com luvas sem dedo nas mãos é visto desenhando e pintando a bandeira labrys enquanto alguém filma.

17 print da galeria do celular com “tudo em dia volte amanhã para mais recordações”.

18 print de uma playlist criada durante o projeto. nomeio como “ao que se faz de rastros indo em direção que eu não sei dizer”.

19 imagem em texto. “consumir corte e repetição desenvolvendo a pesquisa diante do uso da repetição do corpo como forma de linguagem, por borrões, reflexos e espelhos. na insistência de presenciar um corpo sendo vários dentro do campo da fotografia, vídeo ou escrita dessas mesmas palavras citadas anteriormente (corpo, espelho e reflexo). é uma análise sobre o porquê desse corpo sendo colocado incessantemente através de ferramentas para que esteja representado e procurar o que nele constitui, como se fosse uma narrativa, um espetáculo ou uma imagem dentro de outras imagens”.

20 imagem de um documento e legenda. corpo como sujeito no corpo das palavras, no corpo das imagens, no corpo da performance.

21 imagem de palavras “questionar/aparecimento/acúmulo”. vídeo sendo editado com título “figuras vistas de costas”. print do mapa do celular com o trajeto sendo guiado por um caminhão. imagem de uma panela com adesivo escrito “exposição”. vídeo de uma gravação que era para ser uma imagem. print de áudio titulado como “áudio sobre texto sendo lido”. imagem de uma frase de um livro que não termina. “esses registros foram

22 3. aquilo que aconteceu os textos que escolhi para fazerem parte do projeto foram editados, mas os tenho desde 2021. a pesquisa do projeto começa com a vontade em explorar meios de excesso dos deslocamentos pelos quais me interesso. escrevo como se estivesse participando de uma conversa e esses fossem os relatos do que ocorreu. de certa forma as coisas que passam pela minha cabeça permeiam no meu trabalho por causa das relações que convivo, e me encontro no lugar de ser a pessoa que organiza esses desejos do que gostaria de escutar. existe uma prática comum para mim, que é o ato de falar para ninguém. nesse documento escrevo em primeira e terceira pessoa, às vezes sinto que preciso compartilhar algo sem que pareça que é uma memória pessoal minha, mas que eu estou escutando essa memória, ocultando a verdadeira identidade de quem viveu isso e de querer criar essa linguagem de duas pessoas se compreendendo separadamente, mas que ao mesmo tempo fazem parte de uma coisa só. esses textos antigos foram difíceis de entender que eram textos prontos, que poderiam ser utilizados para um trabalho porque realmente pareciam notas de um diário. o que não deixam de ser, mas existia uma dificuldade em levar isso à público. inicialmente não compreendia como um texto redigido como um diário poderia ser apresentado ao público como uma obra, sendo que parecia que eu ainda estava organizando meus pensamentos e que precisava reformulá-los de maneira mais precisa. no entanto, nesse projeto notei que essa é a forma como escrevo, essa percepção foi fortalecida ou necessitou que eu acessasse os processos do trabalho de marília garcia em que aborda o desenvolvimento de textos que são para serem lidos em voz alta. comecei a compreender que a repetição presente em meus textos espelham os pensamentos que permeiam minha mente, a prática de falar sozinha e o fluxo de pensamentos internos tem uma parte importante na minha abordagem, aqui coloco um dos textos que narrei para compor o vídeo.

23 antes de escrever um texto procuro me gravar falando sobre o que vou escrever. gosto de fechar os olhos (e procurar palavras). garimpo palavras de conversas e vejo a mente como um depósito sendo constantemente revisitado. abro o microfone e inicio uma transcrição para depois editar esse texto.

24 esse documento é um processo em aberto.

25 entre meu movimento de transcrever e acompanhar os ruídos das palavras faladas e entendidas erradas, edito o texto que saiu da minha própria voz. aqui nesse documento as vezes falo e transcrevo. antes usava um grupo no whatsapp onde só tinha eu de participante, comigo me mandando áudios contando sonhos. para facilitar a catalogação e encontrá-los buscando na área onde se pesquisa as conversas, passei a transcrever. transcrevi muitas coisas que queria falar mas não sabia como explicar digitando. geralmente digito em forma de lista. nesse projeto digitei em forma de lista palavras que utilizo, me chamam a atenção sonoramente, penso constantemente, palavras que de alguma forma me atravessam.

26 abreviação / arisco / anônimo / apropriação / arquivo / áudio / borrão / camada / careta / choro / circulação / colagem / comportamento / conjunto / contorno / conversa / corpo / corte / deslocamento / dispositivo / distorção / diversão / espaço / espetáculo / expressão / fábula / figura / figurinha / forma / formato / fragmento / gênero / gesto / gif / gíria / grotesco / hoje / identidade / imagem / insistência / invenção / interação / impressão / jogo / leitura / ligação / lista / localização / mecanismo / memória / montagem / movimento / mp4 / msg / objeto / ontem / pdf / personagem / playlist / print / publicação / quando / rastro / reflexo / registro / rejunte / ruído / rumor / shitpost / símbolo / sobreposição / tempo / território / teste / textura / txt / vertigem / vídeo / vidro / visagem / vulto

27 aqui deixo os outros textos que estão no vídeo.

28 alguém uma vez escreveu “a ideia de estar em um espaço que não é exatamente um lugar também me assombra.” tenho dois meses para escrever uma carta. tinha dois meses para escrever uma carta. tenho dois meses para pensar no que me assombra. pensei muito sobre o que me assombra. essa carta me assombra. morei em uma casa assombrada e fui assombrade por visagens. via como uma forma de ter o que contar em rodinhas. mas a minha memória me assombra. ali estão os fantasmas das relações que passaram pela minha vida e me acompanham. sou testemunha de ficar ouvindo sair da minha boca o choro do fim do que eu nunca tive. e que existia uma mínima possibilidade de poder ter. sei que nunca correrei o risco de ser despejade da minha própria cabeça. que também é um espaço que não é exatamente um lugar.

29 duas noites atrás haviam zumbidos criando deslocamentos entre uma pessoa um corpo e o nome ou mais identificações que se espalharam. acontecimento que lembra essas pessoas esquecidas/apagadas na história da sociedade. quando todos sentirem que podem dizer seus nomes em voz alta... quando sair na rua não for um confronto constante… me chamam por vários nomes mas eu não tenho nome nenhum. quem tem nome? somos criaturas em anonimato. somos as vozes que sentam junto. o som de uma pessoa. o som que sai de um corpo. o som que soa um nome. o som de várias pessoas. o som que sai de vários corpos. o som que soa um nome coletivo. mas ainda caímos e caímos sem nome. e nem todo mundo esquece. eu lembro e procuro esses corpos. e quero que esses corpos que andam para serem ouvidos possam ocupar espaços compostos por outres.

30 (objeto escondido na caixa de ar condicionado) eu procuro por algo e então vejo que não está mais ali. eu estou diante de você, eu falo, e você responde que consegue escutar o barulho de cadeados dos diários de crianças fáceis de estragar e abrir, mas que para as crianças parecia um lugar seguro. você me diz que lembra como observava as coleguinhas da escola ou a tua prima andar com ele pela casa da vó. fala como isso também te lembra o receio em não escrever nada sobre você ou escrever o mínimo possível, que se tirasse dos seus pensamentos e escrevesse sobre eles haveria a chance de alguém descobrir. você nunca pediu por um diário quando criança.. você me conta como não tinha um diário porque não confiava nas páginas e não se compartilhava em escritos porque preferia esconder coisas. objetos. palavras. sentimentos. você gostava da sensação de guardar até o mínimo. e eu ainda tenho muito de querer esconder coisas. você criava histórias que ficariam guardadas apenas na memória e as palavras não tinham sonoridade enquanto não saíam da mente, não se ouvia um rombo e se houvesse acabaria se servindo como prato para que alguém pudesse ler partes de você e então tomar/comer/engolir para si. uma vez encontrei uma chave de plástico preta na rua, era semelhante a chave de um diário de criança e eu ficava com ela por perto. lembro que foi a última coisa que escondi antes de me mudar (e agora estou te contando isso). queria esconder algo e ter essa informação, mesmo que ninguém fosse procurar. escalei a janela para conseguir esconder na parte de cima da caixa de ar condicionado e depois me mudei dessa casa onde eu escondia coisas que provavelmente se foram (ou) deveriam ter ido embora. esse conto é o começo do porque eu geralmente não escrevo - ou escrevia - coisas para mostrar.

31 gosto de escrever ontem e hoje e depois ficar pensando em quando foi ontem ou hoje. ontem tinha alguém se escutando pelo travesseiro respirando/vibrando/espalhando rumores sobre o corpo pro corpo. era um incorporar de sons com a barriga pra baixo (parecendo oco). quando você pensa em uma palavra geralmente associa ela a uma lembrança de onde você viu ou algo que a represente, nesse caso o significado de oco está junto da memória de lajotas cor de terracota de uma antiga casa que uma criança ficava arrastando batendo com moedas essas lajotas para saber qual parte era oca e porque era oca (acreditava que tinha algo lá dentro escondido).

32 crio personagens dentro de mim como se eu fosse uma peça de teatro, com cenas que fazem de mim uma fábula (ou uma pessoa que fala sozinha). as vezes me imagino sendo paredes de um prédio localizado em uma rua estreita que se as pessoas cruzarem e percorrerem por essa rua conversando podem escutar o eco da voz transitando entre os outros prédios.

33 fico pensando em seres inconclusos e multifacetados. ultimamente penso que talvez a identidade seja uma construção do imaginário que somos e o que podemos fazer com isso. faço da minha identidade uma não identidade buscando caminhos entre

34 os vídeos/imagens que acompanham a narração eram praticamente todos existentes, houve seleções para a montagem da ordem dos vídeos e depois os áudios foram inseridos, com momentos em que existe a adição de ruídos entre a voz ou música entre o ruído. em um dos textos falo junto de uma imagem/movimento que gosto de não estar especificado a data do registro, ou no caso do que escrevi: gosto de não saber quando foi o ontem ou o hoje. nos vídeos também não existe exatamente uma temporalidade porque não digo de quem é o corpo sendo gravado, ele faz parte de uma transição de modos de se entender. é uma ficção/não ficção onde não existe uma linha cronológica. existe um corpo entre ruídos e devaneios que procura se prolongar entre outros corpos que estão ao redor dele, o entendimento sobre ser assombrado além de ter vivido em um lugar que era assombrado e fazer dessa assombração uma provocação de gestos/sentimentos/materializações. tento destruir a relação do tempo quando digo hoje mas não se sabe quando foi o hoje que eu quis dizer ou se quero dizer sobre todo(s) o(s) hoje(s). a concepção do tempo é indefinida quando trago em meus vídeos gravações poluídas e distanciadas da qualidade digital de atualmente, com falta de nitidez, efeitos de distorção, erros de filmagem, zooms, utilização de câmeras antigas, câmera de celular, webcam do computador, gravação da tela do computador e tudo menos que uma câmera profissional. procurei utilizar essas falhas ou ruídos em uma possibilidade de novos modos de existência da imagem, trazendo um contágio de porosidade. na pesquisa para chegar nessa estética, a referência mais próxima que acessei foi limítrofe television. outra parte da identidade foi buscada durante os registros de imagens em um estúdio fotográfico onde fazia faculdade: a fotografia contida no vídeo é de um corpo deitado no chão com um espelho e tochas de luzes do estúdio no enquadramento, feito para trabalho performático onde não existia um público no momento da concepção. quando produzi pensei na imagem em forma de vídeo. sendo aquele um ensaio fotográfico feito durante quase oito meses, agora esse sendo um filme ensaio entre o documental, o experimental e a fabulação.

35 citação de citação [o filme ensaio] remete, se apropria, atravessa, opera passagens entre o documentário e o experimental, como também com a ficção, não se confundindo com eles; que não se constitui como representação, mas reflexão do mundo histórico; que investe num ponto de vista encarnado, numa visão subjetiva de fundo onírico, imaginativo, memorial, com forte tom de auto reflexividade; que procede pela via do impreciso, incerto, duvidoso, provisório, inconcluso, inacabado e fragmentário; que constrói narrativas não lineares, com múltiplos níveis de sentido e, enfim, que se apropria e opera com diferentes meios e formas, compondo estilísticas eminentemente híbridas, abertas, avessas às construções sistemáticas, às unidades lógicas e às totalidades orgânicas. (teixeira, f.e., 2015, p. 359). retirado de: performance [entre] cinema: passagens e atravessamentos entre artes em busca das poéticas da presença. (veiga, luana marchiori, 2016, p. 58).

36 4. cenas do vídeo imagens são colocadas em um quadro e o cursor do mouse as movimenta. a primeira mostra uma colagem feita pelo aplicativo da galeria do celular, com título abaixo “câmera” e subtítulo “imagens”. ao lado uma criança está usando vestimentas de formatura “abc”. frases em formato de imagem “o que desliza pelas ruas/ em cada rosto o meu rosto/ em cada pele a minha pele”. pela ferramenta laço poligonal do photoshop é feito um recorte de uma foto tirada pela câmera do celular. essas quatro imagens se juntam num plano. / fundo preto é colocado para anteceder uma sequência de vídeos. / pessoa desfocada é vista quase saindo do enquadramento e dois vídeos surgem por cima. vídeo um ou vídeo que está sendo sobreposto, movimentos rápidos acontecem (não é possível notar mas é uma pessoa andando de skate). vídeo dois ou vídeo que está atrás são palavras recortadas de um livro e deixadas no chão. quando o vídeo um desaparece a frase pode ser lida por completo “tirando o corpo fora”. / pessoa aparece falando para câmera e por cima do vídeo 2, com captura de tela do premiere ao lado “português (brasil)/ editar marcações de tempo/ insira as palavras que são faladas no vídeo”. / pessoa continua falando enquanto vídeo de viagem de família aparece. criança dá as costas para não mostrar o rosto. outra criança espelha o gesto. / alguém caminha segurando um guarda chuva e tenta dar zoom em seus pés, em outra cena alguém desfocado desenha uma bandeira no inverno. / duas placas com “local seguro/ patrimonial” estão entre um espelho convexo que balança por causa do , motos, bicicletas e carros são vistos dentro e fora do espelho. / vídeo pixelizado de crianças vestindo uniforme escolar enquanto um adulto ensina como fazer papel reciclável. / duas pessoas de bicicleta são gravadas saindo de um bazar e voltando para casa, a pessoa com cabelo descolorido carrega uma boneca com tatuagens de caneta azul nas costas segurada por uma mochila quadriculada. / fundo preto. / pessoas estão andando no ar e o vídeo é congelado. / fundo preto. / o vídeo volta a rodar e um corte é feito antes de uma pessoa pular no chão. / zoom de vídeo de um dia de banho de mangueira com vídeo por cima de uma vestimenta completamente vermelha. / pessoa de vestimenta vermelha é gravada com receio de cair ao sentar em uma cadeira vermelha e bamba encontrada na rua. / um vídeo deixado em velocidade lenta que parece que era para ser uma foto do carro carregando a berlinda em icoaraci. a filmagem sai da vertical para horizontal. / vídeo de frase de um filme que não se sabe o nome, “em paralelo a um filme de imagens descartadas…/ filme puramente vocal…/ desacompanhado de imagens. / captura de tela de uma foto no computador. uma criança segura um estalinho e faz bico enquanto olha para baixo. / captura de tela “não há nada para mostrar aqui”. / díptico de imagem de corte de cabelo, pessoa de costas com os cabelos cortados no pescoço e ao lado captura de tela de vídeo escrito “pegadas”. / zoom da textura dos dedos. / imagem da webcam com uma pessoa segurando um papel espelho acima da boca, o papel reflete a visão da webcam. / registro da imagem da webcam em zoom. / filmagem de macarrão de letras formando a palavra “distantes”. / parte de um rosto lendo um texto. / fundo preto. / parte de um rosto continua lendo um texto. / pessoa se grava pelo espelho enquanto espera outra pessoa abrir a porta e voltar para o quarto. / imagem recortada de uma criança ao lado de uma árvore de natal e com um desenho feito por ela. / vídeo de fundo. a sombra de um corpo. / imagem de uma mão segurando a mão de uma boneca. / vídeo de um objeto vermelho descascando. / fundo preto. / mão desenhando uma bandeira. / com um estilete verde, mão retira restos de fitas deixados na parede. / uma imagem sendo gravada. na imagem há um corpo deitado com um espelho por cima, outros três espelhos menores e uma tocha de luz está ao lado. / aparelho eletrônico antigo (jukebox) é avistado em um bar e pessoas decidem escolher uma música. / fundo preto. / díptico de vídeos filmando a água, em um vídeo luzes roxas aparecem refletidas e no outro um erro da câmera capta linhas roxas quando ela é colocada com a lente para o sol. / o vídeo esquerdo muda para uma televisão antiga com videogame conectado mostrando jogo de futebol. / vídeo de um rosto surge por cima do díptico anterior. / o vídeo direito muda para uma pessoa arrumando suas jóias após furar a orelha. / palavras surgem e desaparecem durante os dípticos.

37 5. território o projeto foi efetuado em balneário camboriú, santa catarina. os vídeos, áudios e imagens que compõem as obras foram realizados em belém, icoaraci e ilha do marajó, no estado do pará, e itajaí, balneário camboriú, florianópolis, em santa catarina.

38 6. links vídeo: https://youtu.be/D8Z9ws4KCls publicação: https://drive.google.com/file/d/1qWCXsH0EvuiDSGZ7RcnfxmLtfojCd8xe/view?usp=drive_link

39 7. documento de mediação por bicha rata essa folha é uma ferramenta para aproximar pessoas à produção artística rastros entre um corpo, de williany print através da coleta de impressões, registro e construção de conexões entre elementos, podendo ser utilizada tanto num processo consigo mesmo de assimilação da obra quanto em proposições coletivas, como em escolas, organizações não governamentais e instituições culturais.

40 rastros entre um corpo é um projeto de lei de incentivo de 2022 de balneário camboriú, santa catarina, que gerou uma obra audiovisual, uma publicação e uma pesquisa resultados da revisitação e edição do acervo pessoal da artista, de imagens, áudios e textos, e da pesquisa, leitura e escrita sobre imagem, indivíduo, não-identidade como identidade, comunidade e corpo coletivo. o projeto permeia questões do corpo, fragmentos do corpo e a repetição ou insistência do mesmo, dentro do privado para o público e corpo-performance, e deu continuidade à sua pesquisa e procedimentos de reformulações de si mesma através de escrita, vídeo, captura de tela, fotografia, áudio, gif e autorretrato.

41 coletando impressões sobre a obra quais são as tuas primeiras impressões ao acessar rastros entre um corpo? quais as sensações, pensamentos, lembranças, ideias que essa obra te evoca? e quais elementos formais identificas nessa obra, como materiais, processos, cores, formas, modo como artista explora o espaço e tempo?

42 conhecendo o artista williany print, 2000 artista visual não binário de belém-pa, residente em balneário camboriú-sc desde 2012. com formação no curso de tecnologia em fotografia na univali (2019-2021). atualmente é titular da câmara setorial de fotografia gestão 2023-2024 do conselho municipal de políticas culturais de balneário camboriú. trabalha com registro, montagem, produção, recorte, criação, tratamento, edição e diagramação dentro da fotografia, performance, design gráfico e audiovisual. pesquisa sobre fragmentos do corpo, identidade não-identidade, reflexo, espelho, repetição, retrato, glitch, ruído, colagem, sobreposição, imagem, gif, captura de tela, frames de vídeo, vídeo e escrita. publica sobre testes onde procura nomear e se apropriar de si.

43 testando produzir sentido > feche os olhos e recolha a primeira palavra que virá na tua mente > escreva essa palavra em um suporte destacável > pense se essa palavra te leva à alguma memória ou alguma ideia > escolha um lugar pra guardar a palavra escrita no suporte destacável > guarde a palavra e dê atenção pra forma que tu guardará > grave um áudio ou um vídeo expressando a memória ou ideia que a palavra escolhida te conduz, omitindo ou não a palavra escolhida, escrita e guardada. se expresse também no áudio ou vídeo sobre o lugar e a forma como tu guardou a palavra > se no áudio ou vídeo tu se expressou falando, transcreva o que falou. se tu se expressou com uma linguagem diferente de fala, descreva escrevendo o que tu fez > mostre pra alguém

44 referências veiga, luana marchiori. performance [entre] cinema: passagens e atravessamentos entre artes em busca das poéticas da presença. campinas, 2016. bento, rafael barroso. a estética do ruído na imagem: da videoarte dos anos 1960 às novas manifestações da imagem contemporânea. rio de janeiro, 2018. maffeis, juliana. catálogo de ideias abandonadas: o descarte como procedimento. porto alegre, 2020. péret, flávia helena santos. vozes e escritas dissidentes. belo horizonte, 2022.

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