Paz e guerra entre as nações

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RAymoNd ARoN

PAZ E GUERRA ENTRE AS NAÇÕES

TRAdUÇão dE SE R G IO BAT H

SÃO PAULO 2018


Esta obra foi publicada originalmente em francês com o título PAIX ET GUERRE ENTRE LES NATIONS. Copyright © 2014, Raymond Aron © Calmann-Lévy, 1962-1984 Copyright © 2018, Editora WMF Martins Fontes Ltda. / Editora Universidade de Brasília, para a presente edição. Todos os direitos reservados. Este livro não pode ser reproduzido, no todo ou em parte, armazenado em sistemas eletrônicos recuperáveis nem transmitido por nenhuma forma ou meio eletrônico, mecânico ou outros, sem a prévia autorização por escrito do editor. 1.ª edição 2018 Tradução Sergio Bath Acompanhamento editorial Sorel Silva Revisão de tradução Rosemary Costhek Abílio e Fernando Santos Revisões Maria Fernanda Alvares, Samanta Lopes e Glauco Hernandes Produção gráfica Geraldo Alves

Reitora Márcia Abrahão Moura

Paginação Studio 3 Desenvolvimento Editorial

Vice-reitor Enrique Huelva

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Aron, Raymond Paz e guerra entre as nações / Raymond Aron ; tradução de Sergio Bath. – São Paulo : Editora WMF Martins Fontes/Editora Universidade de Brasília, 2018. Título original: Paix et guerre entre les nations. ISBN 978-85-469-0113-5 (WMF Martins Fontes) ISBN 978-85-230-1189-5 (Editora UnB) 1. Diplomacia 2. Estratégia 3. Guerra 4. Relações internacionais I. Título. 18-12760 Índices para catálogo sistemático: 1. Paz e guerra : Sociologia política 303.66

Editora WMF Martins Fontes Ltda. Rua Prof. Laerte Ramos de Carvalho, 133 01325-030 São Paulo SP Brasil Tel. (11) 3293-8150 Fax (11) 3101-1042 e-mail: info@wmfmartinsfontes.com.br http://www.wmfmartinsfontes.com.br

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Diretora Germana Henriques Pereira Conselho Editorial Germana Henriques Pereira (Presidente) Beatriz Vargas Ramos Gonçalves de Rezende Carlos José Souza de Alvarenga Estevão Chaves de Rezende Martins Fernando César Lima Leite Jorge Madeira Nogueira Lourdes Maria Bandeira Rafael Sanzio Araújo dos Anjos Sérgio Antonio Andrade de Freitas Verônica Moreira Almeida Castro Editora Universidade de Brasília SCS, Quadra 2, bloco C, nº 78, edifício OK, 2º andar, CEP 70302-907, Brasília, DF Telefone: (61) 3035-4200 Site: www.editora.unb.br E-mail: contatoeditora@unb.br


SUmáRio

Apresentação à 8 a edição francesa, vii Prefácio à 4a edição francesa, xliii Prefácio à 1a edição brasileira, li Paz e guerra entre as nações: uma Apresentação, lxxiii Introdução, 1

PARTE I . TEoRIA – CoNCEiToS E SiSTEmAS i. ii. iii. iV. V. Vi.

Estratégia e diplomacia ou a unidade da política externa, 25 O poder e a força ou meios da política externa, 57 O poder, a glória e a ideia ou objetivos da política externa, 87 Os sistemas internacionais, 115 Sistemas pluripolares e sistemas bipolares, 153 Dialética da paz e da guerra, 183

PARTE 2 . SocIologIA – dETERmiNANTES E REGUlARidAdES Vii. Viii. ix. x. xi. xii.

INTRodUÇão, 215 O espaço, 219 O número, 255 Os recursos, 295 Nações e regimes, 339 Em busca de uma ordem do devir, 373 As raízes da guerra como instituição, 411

PARTE 3 . HISTóRIA – o SiSTEmA UNiVERSAl NA ERA TERmoNUClEAR INTRodUÇão, 447 xiii. O mundo finito ou a heterogeneidade do sistema universal, 453


xiV. xV. xVi. xVii. xViii.

A estratégia da dissuasão, 491 Os irmãos mais velhos ou a diplomacia no interior dos blocos, 537 Jogo empatado na Europa ou a diplomacia entre os blocos, 579 Persuasão e subversão ou os dois blocos e os não alinhados, 617 Os irmãos inimigos, 653

PARTE 4 . PRAxIologIA – AS ANTiNomiAS dA AÇão diPlomáTiCA ESTRATéGiCA xix. xx. xxi. xxii. xxiii. xxiV.

INTRodUÇão, 697 Em busca de uma moral – i. Idealismo e Realismo, 701 Em busca de uma moral – ii. Convicção e responsabilidade, 739 Em busca de uma estratégia – i. Armar-se ou desarmar-se?, 771 Em busca de uma estratégia – ii. Sobreviver é vencer, 811 Além da política de poder – i. A paz pela lei, 853 Além da política de poder – ii. A paz imperial, 893 APêNdiCE: Estratégia racional e política razoável, 929


INTRODUÇÃO Os NíveIs cONceITUaIs Da cOmpReeNsÃO “O direito das gentes baseia-se naturalmente neste princípio: as várias nações devem fazer-se mutuamente o maior bem possível em tempo de paz e o menor mal possível em tempo de guerra, sem prejudicarem seus genuínos interesses.” (Montesquieu, O espírito das leis, I, 3)

Os tempos tumultuosos convidam à meditação. A crise da cidade-estado grega legou-nos a República, de Platão, e a Política, de Aristóteles. Os conflitos religiosos que dilaceravam a Europa do século XVII fizeram surgir, com o Leviatã e o Tratado político, a teoria do Estado neutro – necessariamente absoluto, segundo Hobbes; liberal pelo menos com relação aos filósofos, segundo Spinoza. No século da Revolução Inglesa, Locke defendeu e ilustrou as liberdades civis. Na época em que os franceses preparavam, sem o saber, a Revolução, Montesquieu e Rousseau definiram a essência dos dois regimes que nasceriam da decomposição, súbita ou progressiva, das monarquias tradicionais: governos representativos e moderados, graças ao equilíbrio dos poderes; governos alegadamente democráticos, invocando a vontade popular mas rejeitando todo e qualquer limite à sua autoridade. Terminada a Segunda Grande Guerra, os Estados Unidos, cujo sonho histórico tinha sido manter-se à margem dos negócios do Velho Continente, tornaram-se responsáveis pela paz, prosperidade e até pela própria existência de metade do mundo. Havia soldados norte-americanos estacionados em Tóquio e Seul, a oeste, e em Berlim, no leste. O Ocidente não tinha visto nada parecido desde o Império Romano. Os Estados Unidos eram a primeira potência autenticamente mundial, pois a unificação mundial da cena diplomática não tinha precedentes. Em comparação com a massa eurasiática, o continente americano ocupava uma posição igual à das ilhas britânicas com relação à Europa: os Estados Unidos retomavam a tradição de Estado insular, empenhando-se em construir uma


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barreira contra a expansão do Estado terrestre dominante, no centro da Alemanha e no meio da Coreia. Nenhuma grande obra – comparável às que mencionamos – nasceu da conjuntura criada pela vitória em comum dos Estados Unidos e da União Soviética. Contudo, as relações internacionais tornaram-se objeto de uma disciplina universitária. As cátedras dedicadas à nova disciplina multiplicaram-se. O número de livros e de manuais cresceu proporcionalmente. Tiveram êxito esses esforços? Antes de responder à pergunta, é necessário precisar o que os professores norte-americanos, seguindo os estadistas e a opinião pública, se propunham a descobrir e a elaborar. Já antes da ascensão dos Estados Unidos ao primeiro plano da cena mundial, os historiadores puseram-se a estudar as “relações internacionais”. Mas se limitaram à descrição e à narrativa, sem chegarem à análise e à explicação. Ora, nenhuma ciência pode limitar-se à descrição e à narrativa. Além disso, que benefício os estadistas atuais ou os diplomatas poderiam tirar do conhecimento histórico dos séculos passados? As armas de destruição generalizada, as técnicas de subversão, a ubiquidade da força militar – graças à aviação e à eletrônica – introduzem novidades materiais e humanas que tornam no mínimo duvidosas as lições dos séculos passados. Ou, pelo menos, a validade dessas lições não pode ser mantida se elas não forem inseridas numa teoria que abranja o antigo e o novo, identificando os elementos constantes para elaborar o inédito, em vez de eliminá-lo. Essa era a questão decisiva. Os especialistas em relações internacionais não queriam simplesmente seguir os passos dos historiadores; desejavam, como todos os estudiosos, formular proposições de caráter geral, criar um corpo de doutrina. Só a geopolítica se interessava pelas relações internacionais com a preocupação de abstrair e explicar. Mas a geopolítica alemã tinha deixado má lembrança e, de qualquer modo, a referência ao quadro espacial não poderia constituir o objetivo de uma teoria cuja função era apreender a multiplicidade de causas que agem sobre o curso das relações entre os Estados. Era fácil caracterizar de modo grosseiro a teoria das relações internacionais. “Em primeiro lugar, ela torna possível a ordenação dos dados. É um instrumento útil à compreensão.”1 Em seguida, “a teoria implica que se identifiquem expli1

Kenneth W. Thompson, “Toward a Theory of International Politics”, American Political Science Review, vol. XLIX, no 3, set. 1955.


INTRODUÇÃO . 3

citamente os critérios de seleção dos problemas a serem analisados em profundidade. Nem sempre se leva em conta que, toda vez que um problema particular é selecionado para estudo e análise em determinado contexto, há sempre, na prática, uma teoria subjacente à seleção feita”. Por fim, “a teoria pode ser um instrumento para a compreensão não só das uniformidades e regularidades, mas também dos fatos contingentes ou irracionais”. Ninguém objetaria a essas fórmulas. Organização dos dados, seleção dos problemas, determinação das regularidades e dos acidentes: qualquer teoria, no campo das ciências sociais, deve cumprir essas três funções. Os problemas colocam-se mais além dessas proposições incontestáveis. O especialista teórico tem sempre a tendência de simplificar a realidade, de interpretar os comportamentos ressaltando a lógica implícita dos atores. Hans J. Morgenthau escreve: “Uma teoria das relações internacionais é um resumo racionalmente ordenado de todos os elementos racionais que o observador encontrou no objeto de estudo (subject matter). É uma espécie de esboço racional das relações internacionais, um mapa do cenário internacional.”2 A diferença entre uma interpretação empírica e uma interpretação teórica das relações internacionais é comparável à que existe entre uma fotografia e um retrato pintado: “A fotografia mostra tudo o que pode ser visto pelo olho nu; o retrato não mostra tudo o que pode ser visto pelo olho nu, mas mostra algo que o olho não pode ver: a essência humana da pessoa que serve de modelo.” A isso outro especialista responde fazendo as seguintes indagações: Quais são os “elementos racionais” da política internacional? Bastará considerar unicamente os elementos racionais para desenhar um esboço ou pintar um retrato de acordo com a essência do modelo? Se o especialista teórico responder negativamente a essas duas perguntas, precisará trilhar outro caminho, o da sociologia. Admitido o objetivo – fazer um mapa do cenário internacional –, o teórico procurará reter todos os elementos, em vez de fixar sua atenção exclusivamente sobre os elementos racionais. A esse diálogo entre o defensor do “esquematismo racional” e o defensor da “análise sociológica” – diálogo cuja natureza e cujas implicações os interlocutores nem sempre perceberam – acrescenta-se muitas vezes uma controvérsia de tradição propriamente norte-americana: entre o idealismo e o realismo. O rea2

De um relatório de H. J. Morgenthau, intitulado: “A importância teórica e prática de uma teoria das relações internacionais”.


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lismo (hoje chamado de maquiavelismo) dos diplomatas europeus passava, no outro lado do Atlântico, por típico do Velho Mundo, marca de uma corrupção da qual se quisera fugir emigrando para o Novo Mundo, para o país das possibilidades indefinidas. Ora, transformados em potência dominante pelo desmoronamento da ordem europeia e por sua vitória militar, os Estados Unidos descobriam pouco a pouco, não sem problema de consciência, que sua diplomacia se assemelhava cada vez menos ao antigo ideal e cada vez mais à prática de seus inimigos e de seus aliados, até há pouco julgada com severidade. Era moralmente aceitável comprar a intervenção soviética na guerra contra o Japão a preço de concessões feitas às custas da China? Tornou-se claro, a posteriori, que a operação não foi lucrativa; que, do ponto de vista racional, em vez disso Roosevelt deveria ter comprado a não intervenção da União Soviética. Mas, se o cálculo tivesse sido racional, teria sido mais moral? Roosevelt teria feito bem ou mal em abandonar os europeus do Leste ao domínio soviético? Alegar a força dos fatos era retomar o argumento clássico dos europeus, que os norte-americanos, confiantes em sua virtude e em sua posição geográfica, durante tanto tempo tinham rejeitado com desprezo ou indignação. O comandante-chefe é responsável perante o povo por seus atos, pelas vitórias e pelas derrotas. Não importam as boas intenções e o respeito às virtudes individuais: é outra a lei da diplomacia e da estratégia. Mas, nessas condições, o que acontece com a oposição entre realismo e idealismo, entre o maquiavélico e o kantiano, entre a Europa corrompida e a América virtuosa? Este livro pretende primeiro esclarecer e depois superar esses debates. As duas concepções teóricas não são contraditórias, mas complementares: o esquematismo racional e as proposições sociológicas constituem momentos sucessivos na elaboração conceitual de um universo social. A compreensão de um âmbito de ação não é suficiente para decidir sobre as antinomias da ação. Só a história poderá resolver, algum dia, o eterno debate entre o maquiavelismo e o moralismo. Contudo, passando da teoria formal para a determinação das causas e, depois, para a análise de uma conjuntura singular, espero poder demonstrar um método que é aplicável a outros objetos, indicando ao mesmo tempo os limites de nosso saber e as condições que determinam as escolhas históricas. Para pôr em evidência, nesta introdução, a estrutura do livro, preciso antes de mais nada definir as relações internacionais, para depois especificar as características dos quatro níveis conceituais, que denominaremos teoria, sociologia, história e praxiologia.


INTRODUÇÃO . 5

1 Recentemente um historiador holandês3, nomeado para a primeira cátedra de relações internacionais criada em seu país, em Leyde, tentou, em aula inaugural, definir a disciplina que deveria ensinar. Sua conclusão representava uma confissão de derrota: em vão tinha procurado os limites de seu campo de estudo. O insucesso é instrutivo porque é definitivo e, por assim dizer, evidente. As “relações internacionais” não têm fronteiras reais; não são e não podem ser materialmente separáveis dos outros fenômenos sociais. Mas o mesmo se poderia dizer a respeito da economia e da política. Se é verdade que “falhou a tentativa de desenvolver o estudo das relações internacionais como um sistema isolado”, a questão verdadeira coloca-se além desse insucesso e diz respeito justamente ao sentido deste. Afinal, a tentativa de fazer do estudo da economia um sistema fechado em si mesmo também falhou; isso não impediu de existir, fundamentadamente, uma ciência econômica, cuja realidade própria e cujo possível isolamento estão fora de qualquer dúvida. Mas o estudo das relações internacionais comporta um foco específico de interesse? Procura compreender fenômenos coletivos, aspectos do comportamento humano cuja especificidade seja perceptível? Esse sentido específico das relações internacionais se presta à elaboração teórica? As relações internacionais parecem ser, por definição, relações entre nações. Mas, nesse caso, o termo nação não é tomado no sentido histórico que recebeu depois da Revolução Francesa; não designa uma espécie particular de comunidade política, aquela na qual os indivíduos têm, em grande número, uma consciência de cidadania e onde o Estado parece a expressão de uma nacionalidade preexistente. Na fórmula “relações internacionais”, a nação equivale a qualquer coletividade política, organizada territorialmente. Admitamos portanto, em caráter provisório, que as relações internacionais são relações entre unidades políticas, conceito que abrange as cidades gregas, o império romano e o egípcio tanto quanto as monarquias europeias, as repúblicas burguesas e as democracias populares. Essa definição apresenta uma dupla dificuldade. Será preciso incluir nas relações entre as unidades políticas as relações entre os indivíduos que pertencem a tais unidades? Onde começam e onde terminam essas unidades políticas, isto é, essas coletividades políticas organizadas territorialmente? 3

B. H. M. Vlekke, On the study of international political science. Londres, The David Davies Memorial Institute of International Studies (s. d.).


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O fato de jovens europeus irem passar férias além das fronteiras de seu país interessa ao especialista em relações internacionais? Quando compro numa loja francesa um artigo alemão, quando um importador francês negocia com um fabricante de outro país, esses exemplos de intercâmbio econômico pertencem ao campo de estudo das “relações internacionais”? Parece quase tão difícil responder afirmativamente como negativamente. As relações entre Estados – as relações propriamente interestatais – constituem o campo por excelência das relações internacionais. Os tratados são um exemplo indiscutível dessas relações. Vamos supor que os intercâmbios econômicos entre países sejam integralmente regulamentados por um acordo entre Estados; nessa hipótese, recairão sem exceção no campo de estudo das relações internacionais. Mas suponhamos, ao contrário, que os intercâmbios econômicos internacionais sejam liberados de toda regulamentação estrita, passando a reinar o livre-comércio. Imediatamente as compras de mercadorias alemãs na França e as vendas na Alemanha de produtos franceses serão atos individuais, sem as características das relações interestatais. Essa é uma dificuldade real, mas me parece que seria errôneo atribuir-lhe uma importância exagerada. Nenhuma disciplina científica tem fronteiras traçadas com exatidão. Não importa muito saber onde começam e onde terminam as relações internacionais, em que momento as relações interindividuais deixam de ser relações internacionais. O importante é determinar o centro de interesse, a significação própria do fenômeno ou dos comportamentos que constituem o núcleo desse âmbito específico. Ora, o centro das relações internacionais está situado no que chamamos de “relações interestatais”, as que engajam as unidades políticas. Essas relações se manifestam em e por meio de comportamentos específicos, os dos personagens que chamarei de simbólicos: o diplomata e o soldado. Dois homens, e somente eles, agem plenamente não mais como membros quaisquer, mas como representantes das coletividades a que pertencem: o diplomata no exercício de suas funções é a unidade política em nome da qual fala; no campo de batalha, o soldado é a unidade política em nome da qual mata seu semelhante. Foi porque atingiu um embaixador que o golpe de leque do soberano de Argel teve valor de acontecimento histórico. É por estar fardado e agindo por dever que o cidadão de um Estado civilizado mata sem problema de consciência.


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O diplomata4 e o soldado vivem e simbolizam as relações internacionais que, enquanto interestatais, reduzem-se à diplomacia e à guerra. As relações interestatais apresentam uma característica original que as distingue de todas as outras relações sociais: desenrolam-se à sombra da guerra ou, para empregar uma expressão mais rigorosa, as relações entre Estados comportam, essencialmente, a alternativa entre a guerra e a paz. Enquanto cada Estado tende a reservar para si o monopólio da violência, no curso da história os Estados, ao se reconhecerem reciprocamente, reconheceram ao mesmo tempo a legitimidade das guerras que faziam entre si. Em certas circunstâncias, o reconhecimento mútuo de Estados inimigos foi lógico até as últimas consequências: cada Estado usava na guerra somente forças regulares, recusando-se a provocar rebelião no interior do Estado com o qual combatia – rebelião que enfraqueceria o inimigo, mas ao mesmo tempo quebraria o monopólio de violência legítima que ele pretendia salvaguardar. Ciência da paz e ciência da guerra, a ciência das relações internacionais pode servir como base para as artes da diplomacia e da estratégia – os dois métodos complementares e opostos com que os Estados se interrelacionam. “A guerra não pertence ao âmbito das artes e das ciências, mas ao da existência social. É um conflito de grandes interesses resolvido pelo derramamento de sangue, e somente nisso difere dos outros conflitos. Seria mais apropriado compará-la antes ao comércio, que é também um conflito de interesses e de atividades humanas, do que a uma arte qualquer. Assemelha-se ainda mais à política, que por sua vez pode ser considerada, pelo menos em parte, uma espécie de comércio em larga escala. Além disso, a política é a matéria na qual a guerra se desenvolve: seus contornos já rudimentarmente formados se escondem nela, como as propriedades das criaturas vivas se escondem em seus embriões.”5 Partindo disso, compreendemos ao mesmo tempo por que as relações internacionais oferecem um centro de interesse para uma disciplina especial e por que escapam a qualquer delimitação precisa. Os historiadores nunca isolaram o relato dos acontecimentos referentes às relações entre Estados – isolamento que teria sido de fato impossível, pois as peripécias das campanhas militares e das 4

Está claro que, nesse plano abstrato, o estadista, o ministro das Relações Exteriores, o primeiro-ministro, o chefe de Estado, em alguns de seus comportamentos, também são embaixadores. Representam a unidade política enquanto tal. 5 Karl von Clausewitz, De la Guerre, livro II, cap. IV, p. 45. As referências são da edição francesa publicada pelas Éditions de Minuit, Paris, 1950.


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combinações diplomáticas se prendem de muitos modos às vicissitudes dos destinos nacionais, às rivalidades dinásticas e de classes sociais. A ciência das relações internacionais, da mesma forma que a história diplomática, não pode ignorar os múltiplos vínculos entre o que ocorre no cenário diplomático e os acontecimentos de cada país. Tampouco pode separar rigorosamente as relações interestatais das relações interindividuais que interessam a mais de uma unidade política. Contudo, enquanto a humanidade não tiver se unido num Estado universal, subsistirá uma diferença essencial entre política interna e política externa. A primeira tende a reservar o monopólio da violência para os detentores da autoridade legítima; a segunda admite a pluralidade de centros de poder armado. Na medida em que diz respeito à organização interna das coletividades, a política tem como objetivo imanente a submissão dos homens ao império da lei. Na medida em que diz respeito às relações entre Estados, a política parece significar – simultaneamente como ideal e como objetivo – a simples sobrevivência dos Estados diante da ameaça virtual criada pela existência dos outros Estados. Procede daí a oposição corrente na filosofia clássica: a arte política ensina os homens a viver em paz no interior das coletividades, e ensina as coletividades a viver em paz ou em guerra. Em suas relações mútuas, os Estados não deixaram ainda o estado de natureza. Só por isso existe ainda uma teoria das relações internacionais. Objetarão que tal oposição, clara no nível das ideias, deixa de sê-lo no nível dos fatos. Efetivamente, ela pressupõe que as unidades políticas sejam circunscritas, identificáveis. Esse é o caso, sem dúvida, quando tais unidades são representadas por diplomatas e soldados fardados, isto é, quando exercem efetivamente o monopólio da violência legítima, e se reconhecem reciprocamente. Na ausência de nações conscientes de si mesmas e de Estados juridicamente organizados, política interna e política externa tendem a confundir-se, deixando aquela de ser essencialmente pacífica e esta de ser radicalmente belicosa. Sob que título classificaremos as relações entre soberano e vassalos na Idade Média, quando o rei ou o imperador não contavam com forças armadas que lhes obedecessem incondicionalmente e os barões prestavam juramento de fidelidade, mas não de disciplina? Por definição, as fases de soberania difusa e de poder armado disperso parecem rebeldes à conceituação, enquanto esta é apropriada para as unidades políticas, delimitadas no espaço e separadas umas das outras pela consciência dos homens e pelo rigor das ideias. A incerteza da distinção entre conflitos entre unidades políticas e conflitos dentro de uma dessas unidades às vezes fica evidente, mesmo nos períodos de


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soberania concentrada e legalmente reconhecida. Basta que numa província, parte integrante do território de um Estado, uma parcela da população se recuse a submeter-se ao poder central e empreenda luta armada contra esse poder, para que os combates – guerra civil, de acordo com o direito internacional – sejam considerados guerra estrangeira pelos que veem os rebeldes como intérpretes de uma nação existente ou em vias de nascimento. Se a Confederação americana tivesse tido melhor sorte, os Estados Unidos teriam se dividido em dois Estados e a Guerra da Secessão, que começou como guerra civil, teria terminado como guerra estrangeira. Imagine-se agora um futuro Estado universal englobando toda a humanidade. Em teoria, não haveria mais exército (o soldado não é um policial nem um carrasco, arrisca a vida enfrentando outro soldado) e sim apenas polícia. Se uma província ou um partido se levantassem em armas, o Estado único e mundial iria declará-los rebeldes e tratá-los como tais. Mas essa guerra civil, episódio da política interna do mundo, retrospectivamente pareceria o retorno à política internacional, se a vitória dos rebeldes levasse à desagregação do Estado universal. Esse equívoco a respeito do objeto “relações internacionais” não deve ser atribuído à insuficiência de nossos conceitos: tem raízes na própria realidade. Lembra-nos uma vez mais (se fosse necessário) que o curso das relações entre unidades políticas é influenciado, de muitas maneiras, pelos acontecimentos no interior das unidades. Lembra-nos também que o propósito das guerras é a existência, a criação ou a eliminação de Estados. À força de estudar o intercâmbio entre Estados organizados, os especialistas frequentemente acabam esquecendo que o excesso de fraqueza não é menos comprometedor para a paz do que o excesso de força. As regiões que servem de causa para conflitos armados são muitas vezes áreas de decomposição das unidades políticas. Os Estados que sabem ou julgam estar condenados à desaparição despertam ambições rivais ou então, numa tentativa desesperada de se salvarem, provocam a explosão que os consumirá. Por estender-se do nascimento à morte dos Estados, o estudo das relações internacionais perde sua originalidade, os limites do seu campo específico? Os que imaginavam antecipadamente que as relações internacionais são separáveis concretamente ficarão decepcionados com esta análise. Uma decepção que não se justifica. Tendo como tema principal o significado específico das relações internacionais – isto é, sua característica de alternativa e de alternância entre paz e guerra –, esta disciplina não pode abstrair as diversas modalidades de intercâm-


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bio existentes entre as nações e os impérios, os múltiplos determinantes da diplomacia mundial nem as circunstâncias em que os Estados aparecem e desaparecem. Uma ciência ou filosofia total da política englobaria as relações internacionais como um de seus capítulos, mas esse capítulo guardaria sua originalidade, porque trataria de relações entre unidades políticas das quais cada uma reivindica o direito de ela mesma fazer justiça e de ser a única a decidir entre a paz e a guerra.

2 Procuraremos estudar as relações internacionais em três níveis conceituais, para examinar em seguida os problemas éticos e pragmáticos que se colocam diante do homem de ação. Antes, porém, de caracterizar esses três níveis, queremos demonstrar que dois outros campos onde se exerce a ação humana – uma atividade esportiva e a economia – se prestam a uma distinção semelhante entre os modos de conceituação. Consideremos o futebol. Sua teoria explica aos leigos a natureza do jogo e suas regras. Quantos jogadores se defrontam de cada lado do meio de campo? Que recursos são permitidos aos jogadores? (Por exemplo, é permitido tocar a bola com a cabeça, mas não com a mão.) Como se distribuem os jogadores no campo (atacantes, meias, zagueiros)? De que modo combinam seus esforços e driblam os dos adversários? Essa teoria abstrata é bem conhecida dos praticantes e dos torcedores. O treinador não precisa lembrá-la aos jogadores de seu time. Contudo, dentro do quadro geral traçado pelas regras do futebol, surgem múltiplas situações concretas, intencionais ou não, que os jogadores precisam enfrentar. Antes de cada jogo, o treinador prepara um sistema tático, define a atuação de cada um (este volante marcará aquele atacante adversário), determina suas obrigações e responsabilidades em certas circunstâncias típicas ou previsíveis. Nesta segunda etapa, a teoria se decompõe em discursos dirigidos de modo particular a cada um dos atores em cena: existe uma teoria do comportamento eficaz do volante, do centroavante, do zagueiro, bem como uma teoria do comportamento eficaz da totalidade ou parte da equipe em circunstâncias definidas. Na etapa seguinte, o especialista em teoria do futebol não é mais professor ou treinador, mas sociólogo: como se desenvolvem os jogos, não no quadro-negro, mas no campo? Quais são as características dos métodos adotados pelos jogadores deste ou daquele país? Existe um futebol latino, inglês, americano? Qual


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a importância relativa do virtuosismo técnico e da qualidade moral no rendimento das equipes? São perguntas que não é possível responder sem o estudo da história. É necessário assistir a muitos jogos, observar a evolução dos métodos, a diversidade de técnicas e de temperamentos. O sociólogo do futebol poderia investigar, por exemplo, o que explica as vitórias frequentes de determinado país (jogadores excepcionais? importância nacional do futebol? apoio do Estado?). O sociólogo é tributário ao mesmo tempo do teórico e do historiador. Se não compreender a lógica do jogo, não conseguirá acompanhar a evolução dos jogadores no campo, descobrir o sentido das táticas adotadas, da marcação individual ou por zona. Mas as proposições teóricas gerais sobre os fatores da eficácia dos times e as causas das vitórias não bastam para explicar a derrota da Hungria no jogo final de certa Copa do Mundo, nem para satisfazer plenamente nossa curiosidade. O desenvolvimento de uma partida isolada nunca é determinado apenas pela lógica do jogo ou pelas causas gerais do êxito futebolístico; certas partidas – como certas guerras exemplares – são dignas do relato que os historiadores consagram às proezas heroicas. Depois do pensador abstrato, do sociólogo e do historiador, há uma quarta figura, inseparável dos atores do futebol : o árbitro. As regras do jogo estão consignadas em textos; mas, como interpretá-las? O fato que é condição para uma penalidade (um toque de mão, por exemplo) ocorreu efetivamente? A decisão do árbitro não admite apelo, mas os jogadores e os espectadores julgam inevitavelmente o juiz, em silêncio ou com vaias. O esporte coletivo, confrontação de equipes, suscita uma onda de julgamentos, laudatórios ou críticos, que os jogadores fazem uns a respeito dos outros, os parceiros a respeito dos parceiros, uma equipe a respeito da equipe adversária, os jogadores a respeito do árbitro, os espectadores a respeito dos jogadores e do árbitro. Todos esses julgamentos oscilam entre a apreciação da eficiência (“jogou bem”), da correção (“respeitou as regras”) e da moralidade esportiva (“manteve-se dentro do espírito do jogo”). Mesmo no esporte, tudo o que não é estritamente proibido nem por isso é moralmente defensável. Enfim, a teoria do futebol pode conceber essa atividade desportiva isoladamente, com relação aos homens que a praticam, ou no contexto de toda a sociedade (“trata-se de um esporte favorável à saúde física e moral dos jogadores?”; “deve o governo favorecê-lo?”). Reencontramos assim os quatro níveis de conceituação que já distinguimos – esquematização dos conceitos e sistemas, causas gerais dos acontecimentos, evo-


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lução do esporte ou de uma partida isolada, julgamentos pragmáticos ou éticos – referentes ou aos tipos de comportamento dentro da esfera de ação analisada ou a essa esfera de ação vista como um todo. O comportamento diplomático ou estratégico apresenta certas analogias com a conduta esportiva: também envolve simultaneamente cooperação a competição. Toda coletividade está cercada de inimigos, de amigos, de atores neutros ou indiferentes. Não há um terreno diplomático precisamente delimitado, mas há um campo diplomático no qual aparecem todos os atores que poderão intervir no caso de um conflito generalizado. A posição dos jogadores não está fixada em caráter definitivo pelas regras e táticas costumeiras, mas há certos agrupamentos característicos dos atores, que constituem situações traçadas esquematicamente. Cooperativa e competitiva, a conduta política externa tem também, por sua natureza, algo de aventura. O diplomata e o estrategista tomam decisões e agem antes de reunir todos os conhecimentos desejáveis, de ter certeza dos fatos. Sua ação fundamenta-se em probabilidades: deixaria de ser razoável se recusasse o risco; é razoável na medida em que calcula esse risco. Mas nunca será possível eliminar a incerteza que decorre da imprevisibilidade das reações humanas (“o que fará o outro, general ou estadista, Hitler ou Stálin?”), do segredo de que se revestem os Estados, da impossibilidade de saber tudo o que é relevante antes de agir. A “incerteza gloriosa do esporte” tem seu equivalente na ação política, violenta ou não. Não devemos imitar os historiadores que julgam que o passado sempre foi fatal e suprimem a dimensão humana dos acontecimentos. As expressões que empregamos aqui para caracterizar a sociologia (causas do êxito, características nacionais da prática) e a história do futebol (ou de uma partida) aplicam-se igualmente à sociologia e à história das relações internacionais. É na teoria racional e na praxiologia que os dois campos diferem essencialmente. Comparada ao futebol, a política externa parece singularmente indeterminada: o objetivo dos atores não é simples, como levar a bola ao gol adversário. As regras do jogo diplomático não estão perfeitamente codificadas e alguns jogadores as violam, quando isso lhes traz vantagem. Não há um árbitro e, mesmo quando o conjunto de atores (as Nações Unidas) pretende fazer um julgamento, os atores nacionais não se submetem às decisões desse árbitro coletivo cuja imparcialidade é discutível. Se a rivalidade das nações faz lembrar um esporte, é a luta livre – um autêntico catch.


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De maneira mais geral, o comportamento esportivo apresenta três características peculiares; o objetivo e as regras do jogo estão claramente definidos: a partida é disputada dentro de um espaço determinado e o número de participantes é fixo; o sistema é limitado externamente e estruturado por si mesmo; o comportamento dos atores é submetido a regras de eficácia e às decisões do árbitro, de modo que os julgamentos morais ou semimorais dizem respeito ao espírito com que os jogadores praticam o jogo. Quanto às ciências sociais, é lícito perguntar se e em que medida suas regras e objetivo são definidos, se e em que medida os atores se organizam num sistema, se e em que medida o comportamento individual se submete a obrigações de eficácia ou de moralidade. Passemos do esporte à economia. Toda sociedade vive um problema econômico – tenha ou não consciência dele – que resolve de determinado modo: toda sociedade precisa atender às necessidades de seus membros e dispõe para isso de recursos limitados. A desproporção entre necessidades e bens disponíveis nem sempre é sentida como tal. Uma coletividade pode aceitar como normal, tradicional, um modo de vida que não a faça aspirar a mais do que já tem: será uma coletividade intrinsecamente pobre. As sociedades nunca foram tão conscientes de sua pobreza como em nossos dias, a despeito do crescimento prodigioso da riqueza – o que só aparentemente é um paradoxo. De fato, as “necessidades” cresceram mais depressa do que os recursos, cuja limitação parece escandalosa a partir do momento em que a capacidade de produzir passa – equivocadamente – por ilimitada. A categoria econômica é uma categoria fundamental do pensamento, uma dimensão da existência individual e coletiva. Não se confunde com a escassez ou a pobreza (desproporção entre desejos ou necessidades e recursos). A economia como problema pressupõe apenas escassez ou pobreza; a economia como solução implica que os homens possam vencer a pobreza de diversas maneiras; que tenham a possibilidade de escolher entre os vários modos de utilizar os recursos existentes. Em outras palavras, pressupõe a necessidade de escolher – que o próprio Robinson Crusoe, em sua ilha, tinha de enfrentar. Robinson era dono de seu tempo e podia distribuí-lo entre o trabalho e o lazer, entre o trabalho dirigido para produzir bens de consumo (recolher alimentos) e para investir (construir sua casa). O que é verdadeiro a respeito do indivíduo é ainda mais verdadeiro com relação à coletividade. Como a força de trabalho é o recurso fundamental das sociedades humanas, a multiplicidade de usos possíveis dos


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recursos já está originalmente assente. À medida que a economia se torna mais complexa, as possibilidades de escolha se multiplicam e os bens se tornam cada vez mais substituíveis: o mesmo objeto pode ter várias utilidades e vários objetos podem ter a mesma utilidade. Pobreza e escolha definem a dimensão econômica da vida humana; a pobreza é o problema enfrentado pelas coletividades; determinada escolha representa uma solução adotada efetivamente. Os homens que ignoram a pobreza porque ignoram o desejo de aquisição não têm consciência da dimensão econômica; vivem como seus ancestrais. O costume é tão forte que exclui os sonhos, a insatisfação, a vontade de progresso. Haveria uma fase pós-econômica se a obrigação da escolha e do trabalho árduo desaparecesse junto com a escassez. Trótski escreveu que a abundância já era visível no horizonte da história, e que só os pequenos-burgueses se recusavam a crer nesse futuro radioso e consideravam a maldição do Evangelho eterna. Um período pós-econômico é perfeitamente concebível: a capacidade de produção cresceria de tal forma que todos poderiam consumir de acordo com sua fantasia e retirariam do caldeirão apenas sua justa parte, por respeito aos outros. Os jogadores de futebol querem levar a bola até o gol adversário. Enquanto sujeitos econômicos, os homens desejam fazer o melhor uso de recursos que são insuficientes, utilizando-os de maneira que lhes deem satisfação máxima. Os economistas reconstruíram e elaboraram de diversos modos a lógica dessa escolha individual. A teoria marginalista é ainda hoje a versão mais corrente dessa racionalização dos comportamentos econômicos a partir do indivíduo e de sua escala de preferências. Embora a teoria percorra o itinerário que vai das escolhas individuais ao equilíbrio global, parece-me preferível – tanto do ponto de vista lógico como do filosófico – partir da coletividade. De fato, as características específicas da realidade econômica só podem ser vistas no conjunto social. As escalas individuais de preferências não diferem fundamentalmente dentro de uma sociedade dada, porque todos os indivíduos aderem mais ou menos a um sistema comum de valores. Contudo, as atividades destinadas à maximização das satisfações individuais seriam mal definidas se a moeda não trouxesse a possibilidade de uma medida rigorosa e universalmente reconhecível. Os negros da costa africana agiam racionalmente quando trocavam marfim por quinquilharias, mas só enquanto essas mercadorias pertenciam a mercados diferentes e não tinham seu preço definido em dinheiro.


INTRODUÇÃO . 15

A quantificação monetária permite reconhecer as igualdades contábeis da economia total. Essas igualdades – do tableau fisiocrático aos estudos contemporâneos de contabilidade nacional – não explicam as alterações dentro do sistema econômico, mas constituem as evidências a partir das quais a ciência econômica procura identificar variáveis primárias e secundárias, determinantes e determinadas. Ao mesmo tempo, impõe-se ao observador a solidariedade recíproca dessas variáveis, a interdependência dos elementos da economia. Modificar um preço é, indiretamente, modificar todos os preços. Reduzir ou aumentar o investimento, diminuir ou aumentar a taxa de juros, é agir sobre o produto nacional e sobre sua distribuição entre as categorias. Todas as teorias econômicas, sejam microscópicas ou macroscópicas, de inspiração socialista ou liberal, enfatizam a interdependência das variáveis econômicas. A teoria do equilíbrio, no estilo de Walras ou de Pareto, reconstrói toda a economia a partir das decisões individuais, definindo um ponto de equilíbrio que seria também o ponto de maximização da produção e das satisfações (dada determinada distribuição de renda no ponto de partida). A teoria de Keynes e as outras teorias macroscópicas focalizam diretamente a unidade total do sistema e procuram definir as variáveis determinantes sobre as quais é preciso agir para evitar o subemprego, aumentar ao máximo o produto nacional etc. O fim da atividade econômica, à primeira vista, pode ser assim definido: maximização da satisfação para o indivíduo que escolhe racionalmente, maximização dos recursos monetários na fase posterior, quando a moeda serve como intermediário universal entre os bens. Mas essa definição deixa lugar a algumas incertezas: a partir de que momento, por exemplo, o indivíduo passa a preferir o lazer, desprezando o aumento de sua renda? Mais ainda, essa incerteza ou indeterminação se torna essencial quando se considera a coletividade. O “problema econômico” impõe-se a uma coletividade: é ela que vai escolher uma solução, por meio de determinado modo de organizar a produção, as trocas e a distribuição de renda. Essa solução implica ao mesmo tempo cooperação e competição entre os indivíduos. Nem a coletividade tomada em conjunto nem os sujeitos econômicos se encontram jamais em situações que imponham como racional uma única decisão. Maximizar o produto nacional ou reduzir as desigualdades; maximizar o crescimento ou manter um nível elevado de consumo; maximizar a cooperação imposta autoritariamente pelo poder público ou dar livre curso à competição –


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essas três alternativas são resolvidas de fato por todas as sociedades, mas a solução encontrada não é uma consequência logicamente deduzível de um objetivo imanente da atividade econômica. Dada a pluralidade de objetivos das sociedades, até hoje qualquer solução econômica comporta um passivo e um ativo. Basta que se considere o tempo (que sacrifícios devem fazer os que estão vivos, em favor dos que virão depois?) e a diversidade dos grupos sociais (que distribuição da renda vai resultar de certa organização da produção?) para que se recuse o caráter de obrigatoriedade racional a qualquer solução determinada do problema econômico. O objetivo imanente da atividade econômica não determina de forma unívoca a escolha dos sujeitos tomados individualmente nem das coletividades tomadas globalmente. Em função dessa análise, quais são as modalidades da teoria de tipo racional da economia? Como o problema econômico é fundamental, o especialista teórico procura antes de mais nada elaborar os principais conceitos econômicos (produção, troca, distribuição, consumo, moeda), entre a fase da inconsciência e a possível fase de abundância futura. O segundo capítulo, que é o mais importante, diz respeito à análise, elaboração ou reconstrução dos sistemas econômicos. As teorias marginalista, keynesiana, dos jogos, a contabilidade nacional, quaisquer que sejam suas diferenças, procuram igualmente (com igual êxito) apreender a textura inteligível do conjunto econômico, as relações recíprocas entre as variáveis. As controvérsias que surgem não se referem a essa textura, expressa por igualdades contábeis. Ninguém põe em dúvida, por exemplo, a igualdade contábil entre poupança e investimento, mas ela é um resultado estatístico ex post, que implica mecanismos complexos, muitas vezes obscuros. O problema é saber se e em que circunstâncias o excesso de poupança pode provocar o subemprego, se e em que circunstâncias a poupança não origina reações que eliminem o subemprego, se e em que circunstâncias é possível um equilíbrio sem o pleno emprego. Em outros termos, nem o esquema walrasiano de equilíbrio nem os esquemas modernos de contabilidade nacional se prestam à refutação enquanto simples esquemas. Por outro lado, os modelos de subemprego ou de crise extraídos das teorias podem ser contestáveis na medida em que explicam ou preveem acontecimentos. Os “modelos de crise” – relações determinadas entre as diversas variáveis do sistema – são comparáveis aos “esquemas de situação” dos jogos, com a diferença de que os sujeitos econômicos se arriscam a não conhecer


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a situação exata criada pelo relacionamento entre variáveis, enquanto os jogadores de futebol podem ver a posição exata de seus parceiros e rivais. A teoria econômica, tal como a esboçamos aqui, procura isolar o conjunto econômico – o conjunto de comportamentos que resolvem de fato, bem ou mal, o problema da pobreza – e enfatizar a racionalidade desses comportamentos, isto é, as escolhas no emprego de recursos limitados diante de uma multiplicidade de usos possíveis. Toda teoria, qualquer que seja sua inspiração, substitui os homens reais por sujeitos econômicos, cuja conduta é simplificada e racionalizada: reduz as numerosas circunstâncias que influem na atividade econômica a um pequeno número de determinantes. A teoria considera certas causas exógenas, mas a distinção entre os fatores endógenos e os fatores exógenos não é constante de uma época para outra ou de um autor para outro. A sociologia é um intermediário indispensável entre a teoria e o acontecimento, e a progressão da teoria para a sociologia pode fazer-se de diversos modos. A conduta dos sujeitos econômicos (empresários, trabalhadores, consumidores) nunca é determinada de forma unívoca pela noção de um máximo; a escolha entre o aumento da renda e a diminuição do esforço aplicado à produção depende de elementos psicológicos, irredutíveis a uma fórmula genérica. De modo geral, o comportamento efetivo dos empresários e dos consumidores é influenciado pelos modos de vida, pelas concepções morais e metafísicas, pela ideologia ou pelos valores da coletividade. Existe assim uma sociologia ou uma psicossociologia da economia, cujo objetivo é compreender a conduta dos sujeitos econômicos, comparando-a com os esquemas da teoria ou precisando as escolhas efetivamente feitas entre os diversos tipos de maximização elaborados pela teoria. A sociologia pode também adotar como finalidade a compreensão do sistema econômico dentro do conjunto social: o acompanhamento da ação recíproca que os diversos âmbitos de ação exercem uns sobre os outros. Por fim, a sociologia pode ter como objeto uma tipologia histórica das economias. A teoria determina as funções que devem ser exercidas em todas as economias. Medida dos valores, sua conservação, distribuição dos recursos coletivos pelos vários empregos possíveis, adequação dos produtos aos desejos dos consumidores – todas essas funções são sempre preenchidas, bem ou mal. Cada regime é caracterizado pela forma como as funções indispensáveis são exercidas. De modo especial, para nos atermos à época atual, cada regime atribui uma importância maior ou menor à planificação central ou aos mecanismos do


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mercado: aquela representa a ação cooperativa submetida a uma autoridade superior, estes são uma forma de ação competitiva (a competição, de acordo com as regras, assegura a função de distribuição da renda entre os indivíduos e chega a resultados que não foram concebidos, decididos ou pretendidos por ninguém). O historiador da economia é tributário do especialista teórico, que lhe fornece os instrumentos de compreensão (conceitos, funções, modelos), e do sociólogo, que lhe indica o contexto no qual se desenrolam os acontecimentos e ajuda-o a perceber a diferença entre os tipos sociais. Já o técnico, o ministro e o filósofo, isto é, aqueles que aconselham, decidem e agem, precisam conhecer os esquemas racionais, os determinantes do sistema e as regularidades da conjuntura. Além disso, para tomar partido favorável ou contrário a um regime (e não contra ou a favor de uma medida determinada, dentro de um regime), é preciso antes de mais nada conhecer os méritos e os deméritos prováveis de cada regime e o que se pede, em cada caso, à economia: qual é a boa sociedade e que influência as instituições econômicas exercem sobre a existência. A praxiologia, que se segue necessariamente à teoria, à sociologia e à história, questiona as premissas dessa compreensão progressiva: qual é o sentido humano da dimensão econômica? O objetivo da ação econômica não é tão simples quanto o da atividade esportiva; mas, embora haja uma variedade de noções de máximo, as teorias podem reconstruir o comportamento dos sujeitos econômicos definindo de certo modo o máximo visado e, em seguida, as implicações da racionalidade. O sistema econômico estrutura-se menos rigorosamente do que o sistema constituído por uma partida de futebol: nem os limites físicos nem os jogadores do sistema econômico são determinados com tanta precisão, mas a solidariedade recíproca de suas variáveis e as igualdades contábeis permitem, desde que se admita a hipótese da racionalidade, perceber a textura do conjunto a partir dos elementos que o compõem. Quanto aos preceitos relativos à ação, devem ser racionais no nível da teoria e razoáveis no nível concreto. Consagram a eficácia quando se propõe um objetivo unívoco, a moralidade quando se trata de respeitar as regras da competição, os valores últimos quando se indaga sobre a dimensão econômica da vida, sobre o trabalho e o lazer, a abundância e o poder.

3 Retornemos à política externa, para indagar como podem ser caracterizados, nesse âmbito, os níveis de conceituação.


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Todo comportamento humano pode ser compreendido, na medida em que não for um simples reflexo ou uma alienação. Mas há diferentes modos de entendê-lo. O comportamento do estudante que assiste a uma aula porque faz frio lá fora, ou porque não tem o que fazer entre duas aulas, é compreensível e pode mesmo ser qualificado de “lógico” (segundo a expressão de Pareto) ou de “racional” (segundo a terminologia de Max Weber), se seu objetivo for evitar o frio ou preencher agradavelmente uma hora vaga. Mas esse comportamento não tem as mesmas características da conduta do estudante que acompanha um curso porque acha que poderá ser interrogado, no exame final, sobre a matéria desenvolvida pelo professor; ou da conduta do empresário que toma todas suas decisões tendo como referência o balanço anual da firma; ou ainda do centroavante que recua para desconcertar o meia adversário que o está marcando. Quais são as características comuns a esses três atores: o estudante, o empresário, o jogador de futebol? Não se trata de uma determinação psicológica: o empresário pode ser pessoalmente ávido de lucro ou, ao contrário, indiferente a ele; o estudante que escolhe seus cursos em função do tempo disponível e da probabilidade de ser examinado pode gostar dos assuntos estudados ou detestá-los, pretender um diploma por amor-próprio ou por necessidade profissional. Do mesmo modo, o jogador de futebol pode ser amador ou profissional, sonhar com a fama ou com a riqueza, mas está preso às exigências de eficiência que resultam do próprio jogo. Em outras palavras, os comportamentos descritos implicam um cálculo mais ou menos consciente, uma combinação de meios e fins, a aceitação de um risco em função de probabilidades. Esse cálculo é ditado por uma hierarquia de preferências e pela conjuntura; e esta tem, no jogo e na economia, uma textura inteligível. O comportamento do diplomata e do estrategista apresenta algumas dessas características, embora – de acordo com nossa definição – seu objetivo não seja tão determinado quanto o dos jogadores de futebol, nem mesmo, em certas condições, seja um objetivo que possa ser expresso de forma racional por um máximo, como o dos sujeitos econômicos. A conduta do diplomata-estrategista, de fato, tem como sentido específico ser dominada pelo risco da guerra, enfrentar adversários numa rivalidade incessante na qual cada um se reserva o direito de recorrer à razão última, isto é, à violência. A teoria de um esporte desenvolve-se a partir da finalidade (por exemplo, marcar um gol). A teoria econômica também se refere a uma finalidade, por meio da noção de maximização (embora


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seja possível conceber várias modalidades desse máximo). Mas a teoria das relações internacionais toma como ponto de partida a pluralidade dos centros autônomos de decisão e, portanto, o risco de guerra; e desse risco deduz a necessidade de calcular os meios. Certos teóricos procuraram encontrar o equivalente, no campo das relações internacionais, do objetivo racional do esporte e da economia. O general ingênuo estabelece um objetivo exclusivo, a vitória, esquecendo que a vitória militar nem sempre traz vantagens políticas, embora sempre convenha ao amor-próprio. Um especialista teórico, quase tão ingênuo quanto o general, proclama solenemente um só imperativo, o interesse nacional, como se bastasse ligar o adjetivo “nacional” ao conceito de “interesse” para torná-lo unívoco. A política entre os Estados é uma luta pelo poder e pela segurança, afirma outro teórico, como se nunca houvesse contradição entre o poder e a segurança, como se as pessoas coletivas, diferentemente das pessoas individuais, estivessem racionalmente obrigadas a preferir a vida às razões de viver. Teremos oportunidade, mais adiante, de examinar essas tentativas teóricas. Inicialmente, limitemo-nos a postular que o comportamento diplomático-estratégico não tem um fim evidente, mas que o risco de guerra obriga a calcular as forças e os meios disponíveis. Como procuraremos mostrar na primeira parte deste livro, a alternativa entre a paz e a guerra permite elaborar os conceitos fundamentais das relações internacionais. A alternativa permite-nos também colocar “o problema da política externa” da mesma forma como colocamos o problema da economia. Durante milênios, os homens viveram em sociedades fechadas, que nunca se submeteram plenamente a uma autoridade superior. Para sobreviver, cada coletividade precisava contar principalmente consigo mesma; mas também devia participar da luta geral das cidades inimigas entre si, ameaçadas de perecer juntas à força de se combaterem. O duplo problema, da sobrevivência individual e da sobrevivência coletiva, não foi resolvido de forma duradoura por nenhuma civilização, e só poderia sê-lo em caráter definitivo pelo império do direito internacional ou por um Estado universal. Pode-se chamar de pré-diplomática a época em que as coletividades não mantinham ainda relações regulares; de pós-diplomática, a futura era do Estado universal, onde só haverá lugar para as lutas intestinas. Enquanto cada coletividade tiver de pensar em sua própria salvação e, ao mesmo tempo, na


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sobrevivência do sistema diplomático e da espécie humana, o comportamento diplomático-estratégico não será determinado racionalmente, mesmo em teoria. Essa relativa indeterminação não nos impede de elaborar, na primeira parte deste livro, uma teoria de tipo racional, indo dos conceitos fundamentais (estratégia e diplomacia; meios e fins; poder e força; força, glória e ideia) para os sistemas e tipos de sistemas. Os sistemas diplomáticos não apresentam um contorno nítido, como um campo de futebol, nem são unificados por igualdades contábeis e pela interdependência das variáveis, como os sistemas econômicos; mas cada ator sabe bem, de modo geral, como situar-se com relação aos adversários e aos parceiros. A teoria, ao extrair modelos de sistemas diplomáticos e distinguir as linhas gerais de situações típicas, imita a teoria econômica, que elabora modelos de crise ou de subemprego. Contudo, à falta de um objetivo unívoco para a conduta diplomática, a análise racional das relações internacionais não tem condições de desenvolver-se como uma teoria global. O Capítulo VI, que trata de uma tipologia da paz e das guerras, serve de transição entre a primeira e a segunda partes, entre a interpretação imanente dos comportamentos de política externa e a explicação sociológica – através de causas materiais ou sociais – do curso dos acontecimentos. A sociologia procura descobrir as circunstâncias que influenciam os motivos de conflito entre os Estados, os objetivos dos atores em cena, a sorte das nações e dos impérios. A teoria põe em relevo a textura inteligível do conjunto social. A sociologia mostra a variação dos determinantes das situações (espaço, número, recursos) e dos sujeitos (nações, regimes, civilizações) das relações internacionais. A terceira parte do livro, dedicada à conjuntura atual, procura primeiramente pôr à prova o tipo de análise proposto pelas duas primeiras partes. Mas, sob certos pontos de vista, devido à extensão mundial do campo diplomático e ao aperfeiçoamento das armas termonucleares, a conjuntura atual é única, sem precedentes, e comporta situações que se prestam à análise por meio de “modelos”. Nesse sentido, a terceira parte, com um nível de abstração menos elevado, contém ao mesmo tempo uma teoria racionalizante e uma teoria sociológica da diplomacia de nossa era mundial e termonuclear. Ao mesmo tempo, constitui uma introdução necessária à última parte, normativa e filosófica, que reexamina as hipóteses iniciais. À medida que a escassez diminui, a economia desaparece. A abundância deixaria subsistirem problemas de organização, mas não cálculos econômicos.


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Do mesmo modo, a guerra deixaria de ser um instrumento da política no dia em que levasse ao suicídio conjunto dos beligerantes. A capacidade de produção industrial dá plausibilidade à utopia da abundância e a capacidade destrutiva das armas modernas reaviva os sonhos de paz eterna. Todas as sociedades já viveram o “problema das relações internacionais”; muitas culturas arruinaram-se porque não puderam limitar as guerras. Em nossos dias, não só uma cultura mas a humanidade inteira seria ameaçada por uma guerra hiperbólica. A prevenção dessa guerra tornou-se para todos os atores do jogo diplomático um objetivo tão evidente quanto a defesa dos interesses puramente nacionais. De acordo com a profunda e talvez profética visão de Kant, a humanidade deve percorrer o caminho sangrento das guerras para chegar um dia à paz. É através da história que se realiza a repressão da violência natural, a educação do homem para a razão.




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