O ESTADO COMO AGENTE DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA COORDENAÇÃO DE ARQUITETURA E URBANISMO

O Estado como agente de produção do espaço urbano: análise comparativa de dois Conjuntos Habitacionais de João Pessoa-PB

WALESKA KAROLINE SANTANA SILVA

JOÃO PESSOA 2018

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O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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WALESKA KAROLINE SANTANA SILVA

O Estado como agente de produção do espaço urbano: análise comparativa de dois Conjuntos Habitacionais de João Pessoa-PB

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitáriode João Pessoa – UNIPÊ, em cumprimento as exigências da disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, 10º período, como requisito acadêmico para obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. Sob orientação do Prof.

Bruno Moreira, M.s.

JOÃO PESSOA 2018

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

S586e

Silva, Waleska Karoline Santana.

O Estado como agente de produção do espaço urbano: análise comparativa de dois Conjuntos Habitacionais de João Pessoa - PB / Waleska Karoline Santana Silva. - João Pessoa, 2018.

119f.

Orientador (a): Prof Bruno Moreira.

Monografia (Curso de Arquitetura e Urbanismo) – Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ.

1. Estado. 2. Espaço Urbano. 3. Conjuntos Habitacionais. 4.Castelo Branco. 5. Gervásio Maia.

UNIPÊ / BC

I. Título.

CDU – 728

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WALESKA KAROLINE SANTANA SILVA

O ESTADO COMO AGENTE DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO: análise comparativa de dois conjuntos habitacionais em João Pessoa- PB

Relatório final, apresentado ao Centro Universitário de João Pessoa - Unipê, como parte das exigências para a obtenção do título de bacharel em Arquitetura e urbanismo.

João Pessoa,

de

BANCA EXAMINADORA

yrol Bruno Moreira -^Orientador-UNIPÊ

/^rof. Marcela Dinienstein Examinadora Interna - UNIPÊ

'rof. Pedro Rossi Examinador Externo - lESP

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de ílQlê .

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RESUMO O Estado é um dos principais agentes de produção do espaço urbano, sua influência não acontece de forma neutra, mas a fim de privilegiar os interesses da classe dominante. Ao longo dos anos este agente passou a incorporar novas formas de intervir na malha urbana, dentre as quais se encontram a produção habitacional.

Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é analisar a influência do Estado sobre o processo de produção do tecido urbano na cidade de João Pessoa. O principal foco da investigação aqui realizada é a análise de dois conjuntos habitacionais produzidos pelo Estado em períodos distintos – o Estado enquanto Ditadura Militar e o Estado Democrático, ou seja, Poder Central e Poder Local. Sendo assim, optou-se por analisar o processo de produção do conjunto habitacional Castelo Branco e do conjunto habitacional Gervásio Maia. Para realização do trabalho foram utilizadas as seguintes estratégias metodológicas: pesquisa bibliográfica e documental, visitas in loco, entrevistas semi- estruturadas, e a análise da produção do espaço – a qual exigiu outros subcritérios de análise como a análise da morfologia, tipologia, localização da área do conjunto, infraestrutura e equipamentos, entre outros. Este estudo busca contribuir com pesquisas relacionadas à temática da produção habitacional realizada pelo Estado que ocorreu na cidade de João Pessoa. Desta forma, através da análise comparativa foi possível verificar as diferenças e as semelhanças na forma em que o Estado produz o espaço urbano.

Palavras-Chave: Estado. Espaço Urbano. Conjuntos Habitacionais. Castelo Branco.

Gervásio Maia.

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ABSTRACT The state is one of the main agents of production of urban space, its influence does not happen in a neutral way, but an aim to privilege the interests of the ruling class.

Over the years this agent started to incorporate new ways of intervening in the urban space, among which are the housing production. In this sense, the goal of this work is to analyze the State influence on the space production in the city of João Pessoa, Brazil. The research’s focus carried out here is the analysis of two housing estates produced by the State in different periods - the State as Military Dictatorship and the Democratic State, that is, Central Power and Local Power. Therefore, it was decided to analyze the production process of the Castelo Branco housing estate and the Gervásio Maia housing estate. In order to carry out the work, the following methodological strategies were used: bibliographical and documentary research, onsite visits, semi-structured interviews, and space production analysis - which required other sub criteria of analysis such as analysis of morphology, typology, area of the complex, infrastructure and equipment, among others. This study seeks to contribute with researches related to the thematic of housing production carried out by the State that occurred in the city of João Pessoa. In this way, through the comparative analysis it was possible to verify the differences and similarities in the way in which the State produces the urban space.

Key words: State. Urban Space. Housing Estate. Castelo Branco. Gervásio Maia.

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LISTA DE FIGURAS Figura 01: Localização do Bairro do Castelo Branco. .............................................. 50 Figura 02: Evolução urbana de João Pessoa até 1970. .......................................... 51 Figura 03: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, Código de Obras,1971. ................................................................................................................................. 53 Figura 04: Construção da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968. .................................................................................................................. 55 Figura 05: Construção da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968. .................................................................................................................. 55 Figura 06: Primeiras habitações construídas na primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968. ................................................................... 56 Figura 07: Implantação da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco. ................................................................................................................................. 57 Figura 08: Implantação da segunda fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco. ................................................................................................................................. 57 Figura 09: Planta das etapas de construção do Conjunto Habitacional Castelo Branco, fornecido pela CEHAP. ............................................................................... 58 Figura 10: Implantação do Conjunto Habitacional Castelo Branco. ......................... 59 Figura 11: Planta Topográfica do Conjunto Habitacional Castelo Branco. ............... 61 Figura 12: População atenta aos discursos das autoridades no evento realizado para entrega das habitações, ao fundo é possível observar as tipologias construídas, além dos postes de iluminação e da falta de calçamento nas ruas. ......................... 62 Figura 13: Mercado Público do Castelo Branco. ...................................................... 64 Figura 14: Posto Policial no Castelo Branco. .......................................................... 64 Figura 15: Associação de moradores do Castelo Branco. ....................................... 64 Figura 16: Sorteio das tipologias habitacionais do conjunto Castelo Branco. .......... 65 Figura 17: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04. .................................. 67 Figura 18: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04. .................................. 68 Figura 19: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04. .................................. 69 Figura 20: Cortes e Fachada Tipo das unidades habitacionais do Conjunto Habitacional Castelo Branco. ................................................................................... 70 Figura 21: Maquete física de habitação proposto pela CEHAP para o Castelo Branco em desfile pelas ruas da cidade de João Pessoa. ....................................... 71 Figura 22: Planta de locação e coberta esquemática, tipo PB 04, PB 02, PB 03..... 71 Figura 23: Vista aérea do conjunto habitacional Castelo Branco, com foco nas primeiras quadras da primeira fase do conjunto. ...................................................... 73 Figura 24: Vista aérea do conjunto habitacional Castelo Branco, com foco nas quadras próximas ao mercado municipal. ................................................................ 73 Figura 25: Cheios e Vazios Ocupação Inicial do Conjunto Habitacional Castelo Branco. .................................................................................................................... 76

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Figura 26: Cheios e Vazios atual do Conjunto Habitacional Castelo Branco. .......... 77 Figura 27: Praça Abdon Milanez, à esquerda situação proposta no projeto e a à direita situação atual, com a ocupação por unidades habitacional de parte de sua área. ........................................................................................................................ 78 Figura 28: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, com ênfase no zoneamento do Castelo Branco. .............................................................................. 81 Figura 29: Uso e Ocupação real Conjunto Habitacional Castelo Branco. ................ 82 Figura 30: Localização do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. ........................... 84 Figura 31: Foto panorâmica do CHGM em 2009. .................................................... 86 Figura 32: Implantação do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. .......................... 89 Figura 33: Divisão dos Programas Financiadores do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. ........................................................................................................................ 92 Figura 34: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, com ênfase no Gervásio Maia. ........................................................................................................................ 93 Figura 35: Uso e Ocupação real Conjunto Habitacional Gervásio Mais. .................. 94 Figura 36: Planta de locação e coberta esquemática das tipologias projetadas para o Gervásio Maia. ...................................................................................................... 97 Figura 37: Planta baixa da unidade habitacional unifamiliar. ................................... 98 Figura 38: Planta baixa da unidade habitacional de uso misto. ............................... 99 Figura 39: Cortes e fachada tipo das unidades habitacionais do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. .................................................................................. 100 Figura 40: Unidade Habitacional do Gervásio Maia, quando entregue em 2007. .. 101 Figura 41: Praça da Esperança-Gervásio Maia. ................................................... 102 Figura 42: Centro Unificado de Cultura e Arte Adailton Pereira Gomes. ............... 102 Figura 43: Terminal de Integração Colinas do Sul. ................................................ 103 Figura 44: Centro de Recreação Infantil- CREI- Luíza da Taipa. ........................... 103 Figura 45: Cozinha Comunitária do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. ........... 103 Figura 46: Cheios e Vazios Ocupação Inicial do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. ...................................................................................................................... 105 Figura 47: Cheios e Vazios atual do Conjunto Habitacional Gervásio Maia. .......... 106

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01: Porcentagem de cheios e vazios da ocupação original do conjunto Castelo Branco. ...................................................................................................................... 75 Gráfico 02: Porcentagem de cheios e vazios da ocupação original do conjunto Castelo Branco. ......................................................................................................................75 Gráfico 03: Idade populacional do bairro Castelo Branco. .........................................80 Gráfico 04: Renda Nominal Mensal do Chefe do Domicílio do bairro Castelo Branco. ............................................................................................................................. .......80 Gráfico 05: Renda por família residente no Gervásio Maia. .......................................95 Gráfico 06: Nível de escolaridade do responsável familiar. .......................................96 Gráfico 07: Porcentagem de cheios e vazios da ocupação original do conjunto Gervásio Maia. .........................................................................................................104 Gráfico 08: Porcentagem de cheios e vazios atual do conjunto Gervásio Maia. ......108

LISTA DE TABELAS

Tabela 01: Produção ou financiamento estatal de habitação (excluindo a produção realizada por estados e municípios). ........................................................................ 32 Tabela 02: Área das unidades habitacionais tipo PB 04. ........................................ 67 Tabela 03: Área das unidades habitacionais tipo PB 02. ......................................... 68 Tabela 04: Área das unidades habitacionais tipo PB 03. ......................................... 69 Tabela 05: Área das unidades habitacionais tipo unifamiliar.................................... 98 Tabela 06: Área das unidades habitacionais tipo misto. .......................................... 99

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LISTA DE ABREVIAÇÕES

APE....................................................Associações de Poupança e Empréstimos BNH....................................................................... Banco Nacional da Habitação CEF ............................................................................ Caixa Econômica Federal CEHAP..............................................Companhia Estadual de Habitação Popular CF.........................................................................................Constituição Federal CHGM.........................................................Conjunto Habitacional Gervásio Maia COHAB............................................................Companhia de Habitação Popular FCP............................................................................Fundação da Casa Popular FCVS...................................... Fundo de Compensação das Variações Salariais FGTS.................................................. Fundo de Garantia por Tempo do Serviço IAPs......................................................... Instituto de Aposentadorias e Pensões IBH .....................................................................Instituto Brasileiro de Habitação IHGP................................................. Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba INOCOOP ...................... Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais IPHAN.................................Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional OGU........................................................................... Orçamento Geral da União PAC..................................................... Programa de Aceleração do Crescimento PlanHab ..................................................................Plano Nacional de Habitação PMCMV ........................................................ Programa Minha Casa, Minha Vida PMJP.......................................................... Prefeitura Municipal de João Pessoa PNH......................................................................Política Nacional de Habitação PPGAU ................... Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo PPGG ..............................................Programa de Pós-Graduação em Geografia SBPE ......................................... Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo SCI ....................................................................Sociedade de Crédito Imobiliário SFH ................................................................ Sistema Financeiro de Habitação

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SEMHAB..............................................Secretaria Municipal de Habitação Social UFPB............................................................... Universidade Federal da Paraíba

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 14 1.

REFERENCIAL TEÓRICO................................................................................................................. 20 1.1.

1.1.1.

O Estado brasileiro e suas especificidades.............................................................. 23

1.1.2.

O Estado enquanto agente de produção do Espaço Urbano .............................. 26

1.1.3.

A influência do Estado na produção habitacional do Brasil ............................... 28

1.2.

2.

O CONCEITO DE ESTADO...................................................................................................... 21

CONCEITO DE BAIRRO E DE CONJUNTO HABITACIONAL ......................................... 43

ANÁLISE COMPARATIVA ................................................................................................................ 48 2.1.

ANÁLISE DO CONJUNTO HABITACIONAL CASTELO BRANCO ................................ 50

2.2.

ANÁLISE DO CONJUNTO HABITACIONAL GERVÁSIO MAIA ..................................... 84

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................................... 108 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 114

INTRODUÇÃO

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O Estado desde o início da história do urbanismo nacional interferiu na escolha dos sítios estendendo-se essa influência à natureza dos traçados e à morfologia urbana que daí resultou. Só desta forma se pode explicar a escolha coerente por sítios de topografia acidentada na confluência de rios com o oceano, rios esses que permitiam penetrar pelo interior da colônia brasileira e exportar as matérias primas para a Metrópole (PORTAS, 2005).

Ao longo da história do urbanismo nacional, o Estado durante as várias fases da sua evolução veio a incorporar novas formas de influenciar no processo de produção do espaço, dentre as quais podemos destacar: a desapropriação da propriedade privada, a elaboração de legislações que regulamente a produção e o uso do espaço, o controle dos preços das terras, os impostos fundiários e imobiliários, o investimento público no processo de urbanização, a organização de programas de crédito ou incentivo à habitação, entre outros (CORREA, 2003).

Logo pode-se constatar que o Estado é um agente de produção que historicamente teve à sua disposição os instrumentos e a capacidade para modelar a malha urbana. Tal capacidade de ação teve repercussões complexas ao longo do tempo, variando conforme a região e o jogo de interesses dos diversos agentes envolvidos nas ações de construção/transformação do espaço. Essa complexidade, leva-nos a abordar esta problemática com extrema precaução. Para não cair em pesquisas demasiado extensas, que inviabilizem uma análise rigorosa, optou-se por efetuar um recorte preciso das diversas possibilidades de abordagem que foram surgindo ao longo do tempo. Para o efeito, pareceu pertinente aprofundar o tema da produção dos conjuntos habitacionais no Brasil.

De acordo com Bonduki (2004), o Estado só passou a intervir na questão habitacional a partir da década de 1930, durante o Governo de Getúlio Vargas, quando foram criadas as cartas prediais dos Institutos de Aposentadorias e Pensões- IAPs. Nesse momento começaram a ser produzidas habitações em larga escala, surgindo os primeiros conjuntos habitacionais do país.

Em 1946 foi criada a Fundação da Casa Popular - FCP, que diferentemente dos IAPs, tinha como único objetivo a produção de habitações para os trabalhadores de menor renda. A FCP e os IAPs, eram neste momento os únicos programas estatais que objetivavam a produção de moradias populares.

Em 1964, no início da ditadura militar, foi criado o Banco Nacional de Habitação – BNH. De acordo com Veiga (2009 apud Maia, 2014) o Estado por meio do BNH foi

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responsável pela produção cerca de 4 milhões de moradias em seu período de atuação entre 1964 e 1986.

Com a extinção do BNH em 1986, as atividades relacionadas a produção habitacional pelo Estado brasileiro foram delegadas à diversos órgãos, como a Caixa Econômica Federal, secretarias e ministérios responsáveis pela elaboração de políticas habitacionais no país.

Segundo Maia (2014), entre os anos de 1988 e 2001, a criação de algumas políticas estatais relacionadas com a habitação popular e a construção de conjuntos habitacionais não causaram grandes modificações morfológicas nas cidades brasileiras, quando comparadas ao que aconteceu na época do BNH. No entanto essa situação seria mudada a partir de 2001, quando foi aprovada a Lei 10.257, que passou a regulamentar o Estatuto da Cidade e posteriormente com a criação do Ministério das Cidades, em 2003. A partir desse momento, passaram a ser criados programas que fomentavam a produção de habitações de interesse social para a população de baixa renda. Alguns desses programas objetivavam a remoção de pessoas residentes em favelas ou locais considerados inadequados e insalubres.

A escolha do tema da pesquisa, deu-se após constatar que o Estado enquanto agente de produção/transformação do espaço urbano de João Pessoa não tem sido estudado com a atenção que merece. Através da busca de dissertações e teses sobre a problemática em análise na base de dados do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo1 - PPGAU/UFPB, no sítio do Programa de Pós-graduação em Geografia – PPGG/UFPB e de monografias de conclusão de curso, na biblioteca central da UNIPÊ, verificou-se que o assunto até ao momento tem sido pouco explorado.

A partir disso e com o intuito de desenvolver o trabalho, seguiu-se a sugestão de David Harvey (2005), segundo a qual, para se entender a influência do Estado nas diversas áreas da sociedade capitalista, é necessário recorrer a casos concretos para que se tenha uma interpretação correta da realidade. Sendo assim, pretendemos utilizar as bases conceituais e teóricas adequadas para compreender o “comportamento do Estado sob diversas circunstâncias econômicas, sociais e

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Wilma Lucena (2014), analisa a produção do espaço na cidade de Patos, desde o BNH até o Programa Minha Casa, Minha Vida; Maria Andreína Fernandes analisa a [re] produção do espaço urbano no bairro do Altiplano Cabo Branco; Luciana Araújo (2006), analisa a produção do espaço no bairro de Mangabeira.

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políticas” (Harvey, 2005, p. 78), complementando a percepção dos fatos com a análise de um período histórico específico e de um recorte geográfico bem delimitado. Tal abordagem, já foi testada por Harvey (2005), tendo sido considerada um recurso útil para o correto entendimento do processo construtivo que ocorreu no tecido urbano das cidades.

Considerando que o Estado é um dos principais agentes da produção/ transformação do espaço urbano, e que exerce uma grande influência sobre as formas da cidade, a pesquisa ora apresentada tem como objetivo geral analisar a sua influência sobre o processo de produção do tecido urbano na capital paraibana, João Pessoa. Optou-se por analisar comparativamente dois períodos de produção habitacional realizada pelo Estado, ou seja, o Estado enquanto ditadura militar - Poder Central e o Estado democrático, representado pela produção realizada pela Prefeitura Municipal de João Pessoa – Poder Local. Nesse sentido, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: analisar o processo de produção dos conjuntos habitacionais edificados pelo poder central durante as décadas de 1960 a 1980 e pelo poder local entre 2006 e 2011; e analisar as alterações morfológicas que ocorreram nesses conjuntos ao longo do tempo.

Com o intuito de atingir os objetivos propostos, optou-se por analisar o conjunto habitacional Castelo Branco, por ter sido um dos primeiros conjuntos produzidos durante o período da ditadura militar, entre os anos de 1968 a 1974, e pelo conjunto Gervásio Maia, por ter sido produzido mais recentemente, entre os anos de 2006 a 2011. O primeiro foi edificado sob responsabilidade do Poder Central (governo militar), com investimentos provenientes do mesmo, e o segundo a partir do Poder Local (Prefeitura Municipal de João Pessoa), com investimentos do Estado e do Município.

Para atender os objetivos supracitados, foram utilizados os seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica e documental, visitas in loco e entrevistas semiestruturadas. Além destes procedimentos, para realizar a análise dos conjuntos foram estabelecidos alguns critérios que serão explicados adiante 2.

A pesquisa bibliográfica foi necessária para a obtenção de um embasamento teórico e conceitual a respeito dos principais temas abordados nesta monografia. A partir disso, foi construído um guia bibliográfico, a fim de reunir os principais autores que pudessem fornecer informações necessárias para a construção de uma base

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Os critérios utilizados podem ser encontrados no Capítulo 2 – Análise comparativa.

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teórica sobre a temática estudada. Para compreensão do processo de produção e transformação do espaço urbano se fez necessário uma leitura multidisciplinar, que inclui estudos feitos por sociólogos, geógrafos, historiadores, arquitetos e urbanistas, a exemplo de David Harvey (2005), Ana Fani Carlos (2016), Roberto Lobato Corrêa (2003), Henri Lefebvre (2006), José Garcia Lamas (2004), Nabil Bonduki (1994, 2008,2009, 2017), Milton Santos (2013) e outros.

A pesquisa documental assim como a revisão bibliográfica foi uma das primeiras ações realizadas, porém foi onde encontramos as maiores dificuldades, devido à burocracia encontrada nos órgãos públicos. Com o objetivo de obter informações oficiais a respeito da configuração formal dos conjuntos habitacionais objeto de estudo desta monografia, e sobre a sua produção foram feitas visitas à Prefeitura Municipal de João Pessoa, ao Instituto Histórico e Geográfico Paraibano (IHGP), ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico - IPHAN, à Companhia Estadual de Habitação Popular, à Secretaria de Habitação do Município, à biblioteca do Centro Universitário de João Pessoa, assim como aos departamentos de História, Geografia e Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Paraíba, a fim de estabelecer uma base documental referente ao recorte temporal estabelecido neste trabalho.

Além disso, foram realizadas consultas à legislação atualmente em vigor na cidade, através do Plano Diretor (2009) e Código de Obras (2001) encontrados na base de dados virtual da Prefeitura Municipal de João Pessoa comparando-os com a legislação – Plano Diretor (1975) e Código de Obras (1971) que incidia sobre a cidade anteriormente.

Compreende-se que as visitas realizadas aos dois conjuntos habitacionais objeto de estudo deste trabalho representam um dos mais importantes procedimentos desta pesquisa, pois a partir delas foi possível a realização do reconhecimento da área, a constatação de sua situação atual em relação à tipologia e à configuração formal. Também foi possível a coleta de fotografias para observação das mudanças que ocorreram ao longo dos anos, contribuindo de forma significativa para a formação do perfil morfológico da área. Além disso, elaboramos entrevistas semiestruturadas que serviram como guia nas conversas realizadas com os moradores mais antigos dos conjuntos. Ainda estabelecemos um guia para entrevistar os funcionários dos órgãos responsáveis pela produção dos conjuntos.

A partir dos critérios estabelecidos para a realização das análises dos conjuntos foi possível realizar uma comparação entre os dois, a fim de encontrar diferenças e

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semelhanças na forma de produção habitacional por parte do Estado. Além de analisarmos a produção do espaço, também voltamos nosso olhar para as transformações tipológicas e morfológicas que ocorreram nos conjuntos, desde o momento de sua entrega até os dias atuais.

Desse modo, este trabalho de conclusão de curso, para além da introdução e das considerações finais foi estruturado em dois capítulos, apresentados a seguir: Capítulo 1 – REFERENCIAL TEÓRICO Neste capítulo, pretende-se de maneira rápida e compreensível, explicar os principais conceitos que nortearam este trabalho. Em um primeiro momento trazemos a definição conceitual do termo Estado relacionando-o com as especificidades locais, explicando o tipo de mecanismos que podem ser utilizados para organizar o território e a cidade, além da influência deste agente na produção habitacional brasileira.

Posteriormente apresentamos o conceito de bairro, quais as formas de apreende-lo e a partir de quais elementos poderá ser definido. Por fim apresentamos o conceito de conjunto habitacional e as suas particularidades.

Capítulo 2 – ANÁLISE COMPARATIVA Após a definição e o entendimento dos conceitos acima citados, iniciamos as análises do objeto de estudo. Neste capítulo tem-se a análise do conjunto habitacional Castelo Branco, construído pelo Estado, durante a ditadura militar - Poder Central, e a análise do conjunto habitacional Gervásio Maia construído pelo Estado, durante o Governo Lula - Poder Local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Após apresentar o referencial teórico que norteou a construção do trabalho e as análises dos conjuntos realizadas separadamente seguindo critérios préestabelecidos, trazemos neste capítulo a análise comparativa assim como nossas reflexões acerca do tema, expondo os resultados obtidos, com o intuito de finalizar o estudo, deixando assim a nossa contribuição para possíveis investigações futuras.

1.

REFERENCIAL TEÓRICO

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1.1. O CONCEITO DE ESTADO Para entendermos a capacidade de intervenção do Estado 3 na produção do espaço urbano, e consequentemente dos dois conjuntos habitacionais aqui analisados, numa primeira fase, optou-se por aprofundar o seu conceito. Segundo Azambuja (1984) a palavra Estado ganhou seu atual significado na idade média a partir da expressão status reipublicae que era utilizada em referência à situação dos bens públicos. Ao longo do tempo, o termo caiu em desuso e os escritores medievais passaram a utilizar apenas o termo status, atribuindo-lhe a significação atualmente conhecida - modo de estar, situação, condição. Foi apenas a partir do século XVI, que o termo Estado passou a fazer parte da terminologia política do ocidente.

Assim como Azambuja (1984), Maluf (2013) também reforça a ideia de que a palavra Estado evoluiu ao longo dos anos. Segundo Maluf, na antiguidade o conceito de Estado estava associado à Polis grega e à Civitas romana, sendo utilizados até o início da Idade Média, termos como rich, imperium, land terrae, etc. O primeiro país a empregar a palavra Stato foi a Itália, ainda com um significado muito vago. A Inglaterra passou a utilizá-lo no século XV, seguido da França e Alemanha no século XVI. Estes últimos passaram a utilizar o termo Estado em referência a ordem pública constituída.

A expressão foi inserida definitivamente na literatura científica por Nicolau Maquiavel, criador do direito público moderno ao escrever o príncipe em 1532.

No entanto, segundo Maluf (2013) não existe uma definição de Estado que seja universalmente aceita. Existem várias definições, que expressam o ponto de vista que cada autor tem sobre o conceito. Apesar disso, todas as definições convergem a um ponto importante, o Estado é um produto criado pela sociedade, com o objetivo de organizar e governar um determinado território (MOREIRA, 2017).

Nesse sentido, para que o Estado passe a existir é necessário que se sustente no tripé: população, território e governo. Para que um Estado seja considerado “perfeito”, segundo Maluf (2013, p.23), deverá ainda ter uma população homogênea,

Com base em Moreira (2017), nesta monografia utilizaremos o vocábulo escrito com “E” maiúsculo em referência ao Estado-nação. O termo escrito com “e” minúsculo será utilizado quando nos referirmos a uma província ou uma subdivisão de um determinado país.

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um território bem definido e inalienável, além de um governo soberano e independente4.

Assim, “o Estado não é de modo algum, um poder de fora imposto sobre a sociedade”, ele é “um produto da sociedade num estágio específico do seu desenvolvimento” (ENGELS apud HARVEY, 2005, p.79 e 80), criado para compatibilizar os antagonismos sociais de classes com interesses econômicos conflitantes. Trata-se de um poder nascido da sociedade e que se coloca acima desta para moderar os seus conflitos e mantê-los nos limites do aceitável, impedindo a sua destruição (ENGELS apud HARVEY, 2005). Também para Marx (apud HARVEY, 2005), a origem do Estado é justificada a partir da contradição existente entre os interesses privados e os da sociedade como um todo, acrescentando que para atingir tal objetivo tem que assumir uma postura aparentemente parcial e independente. É através desses interesses supostamente universais, que se procede à implementação dos interesses da classe dirigente (MARX E ENGELS, 1941 apud HARVEY, 2005, p.80).

Por esse motivo, Marx afirma que o Estado é uma ferramenta utilizada pela classe dominante como forma de expressar seus interesses particulares. Note-se que com o passar do tempo o Estado passou por diversas mudanças na sua nomenclatura, de Absolutista evoluiu para Liberal, depois para Autoritário chegando aos dias atuais com a designação de Democrata. Tais mudanças não são mais do que reflexo da ideologia dominante que utiliza o Estado como instrumento de expressão (MOREIRA, 2017).

Apesar da relevância desses fatos, a discussão do papel do Estado na produção do espaço urbano, de acordo com Harvey (2005), só passou a ser tratada de forma consistente a partir da década de 1970. Nesse momento verificou-se que desde a constituição do Estado moderno, poucos aspectos do processo de produção e consumo ficam de fora da influência de suas políticas. Sendo assim, segundo Harvey (2005) seria um equívoco afirmar que só nos últimos anos o Estado passou a atuar de forma mais notória na produção do espaço urbano e no funcionamento da sociedade, pois ele sempre esteve presente, tendo apenas as suas formas e modos

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Segundo Moreira (2017), nos Estados- nação modernos o governo se apresenta como transitório, pois na maioria das vezes é eleito através do voto (exceto em ditaduras e em governos absolutistas).

No entanto o Estado se apresenta como uma estrutura de organização política e territorial permanente.

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de funcionamento sido alterados ao longo do percurso de amadurecimento do capitalismo. No entanto: apesar dos Estados-nação dos diversos países utilizarem os mesmos princípios para a formação das suas estruturas e instituições, e possuírem ferramentas similares de interferência sobre a produção do espaço urbano e as suas formas, verifica-se frequentemente divergências nas relações que estabelecem com os agentes privados ao longo do espaço e do tempo (CORRÊA apud MOREIRA, 2017, p.13).

Assim, é necessário proceder à análise de casos concretos para que se tenha uma leitura correta sobre o processo de produção do espaço urbano. É a partir desse entendimento, que se propõe nesta monografia de conclusão de curso, no tópico 1.1.1., compreender as especificidades do Estado brasileiro, procedendo-se numa fase posterior, a análise e materialização dessas especificidades/particularidades no espaço urbano.

1.1.1.

O Estado brasileiro e suas especificidades

O Estado Brasileiro em muitos aspectos é um reflexo do modelo de Estado moderno Europeu, incorporando na sua estrutura princípios de funcionamento muito idênticos aos dos países ocidentais. No entanto, apesar dessa nítida influência sobre o território nacional, os fatores externos interlaçaram-se com fatores internos, dando lugar a uma realidade em muitos aspetos distinta da que se observa no continente Europeu.

Desde a sua independência, o Estado Brasileiro teve 7 Constituições Federais, a de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988. Podemos ainda acrescentar a Emenda Constitucional nº1, outorgada pela junta militar em 1969, devido a quantidade de alterações realizadas na Constituição de 1967. (VILLA, 2011) Três delas encontram-se dentro do recorte temporal aqui analisado, são elas a Constituição de 1946, 1967 e a de 1988.

A constituição dos Estados Unidos do Brasil foi promulgada em 18 de setembro de 1946, após o fim do regime ditatorial do Estado Novo, marcando assim o restabelecimento da democracia no país.

De acordo com Vainer (2010), era

considerada por muitos doutrinadores como a melhor Constituição do Brasil até os dias atuais, consagrando os princípios do Estado liberal e os do Estado social. Em comparação a Constituição anterior, esta estabelecia proteção aos direitos individuais - a partir do amplo acesso ao Poder Judiciário, o direito à greve, a extinção da pena

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de morte entre outras novidades. Mesmo tendo apresentado inúmeros avanços, o período que se seguiu à aprovação da Constituição foi marcado por uma crise política de grandes proporções, que resultou no suicídio de Getúlio Vargas e posteriormente à ascensão dos militares ao poder.

Apesar de não ter sido totalmente cancelada, em 1964, a Constituição dos Estados Unidos do Brasil passou a sofrer inúmeras emendas 5, mais conhecidas como Atos Institucionais. Fato este que levou os militares a outorgarem em 24 de janeiro de 1967, a Constituição do Brasil. Sob o argumento de preservar a segurança nacional, essa nova Constituição conferia plenos poderes ao Executivo, representado pelo Presidente da República, permitindo que o mesmo pudesse realizar o fechamento do Congresso Nacional, cassar mandatos, suspender os direitos políticos

de

parlamentares opostos ao regime, suspender o habeas corpus em casos de crimes políticos, entre outros (VAINER, 2010).

Assim como a Constituição de 1946, a de 1988 marca o fim – em termos legais - de um governo ditatorial, propondo a democracia como um dos princípios do Estado brasileiro. Atualmente o país é regido pela Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, que conta com a adoção do presidencialismo como forma de governo, além da divisão dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário.

O Artigo 1º da Constituição Federal de 1988 (CF), define que o Brasil é uma República Federativa, isso implica dizer que o Estado brasileiro é formado pela associação de unidades territoriais dotadas de autonomia política, ou seja, os estados, o distrito federal e os municípios. Tais unidades se vinculam e se expressam nacionalmente através da União, “que é a entidade jurídico política representativa da unidade nacional e exerce com exclusividade a soberania diante dos atores internacionais” (VIEIRA, s.d., s.p.). Os estados, o distrito federal, os municípios juntamente com a União compõem a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil (VIEIRA, s.d.).

De acordo com Vieira (s.d.) outro critério de divisão do poder político está no Artigo 2º, e é conhecido como princípio da separação de poderes. Este princípio tem sua origem fundamentada nas teorias do Iluminismo, onde segundo ele “o poder do Estado não deverá ser exercido por uma só pessoa ou instituição, o que poderia levar 5

De acordo com Vainer (2010), até 1961 a Constituição tinha sofrido apenas três emendas, enquanto que de 1961 a 1966 esse número ultrapassava a casa dos vinte.

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a abusos e colocar em risco os direitos dos cidadãos” (VIEIRA, s.d.). Surge então a separação dos poderes do Estado em Legislativo, Executivo e Judiciário. O Poder Legislativo tem como objetivo a elaboração de leis que expressem os valores e a vontade popular, o Executivo aplica essas leis e desenvolve atividades necessárias para atingir os objetivos da sociedade, e o Judiciário resolve com base na lei, os conflitos que surgirem nas relações sociais sejam elas públicas ou privadas.

A nova Constituição é considerada um marco no quesito do direito cidadão, visto que anteriormente estes direitos foram limitados pela ditadura militar. Dentre as principais novidades trazidas pela Constituição atual, encontram-se o direito ao voto para os analfabetos, o voto facultativo para jovens de 16 a 18 anos, o restabelecimento de eleições diretas para presidente, governadores e prefeitos, o fim da censura dos meios de comunicação, além de uma série de direitos trabalhistas como a redução da carga horária semanal de 48 horas para 44 horas (JÚNIOR,2012).

Além disso, a partir da nova CF, foram implantados dois artigos que tratam da Política Urbana do país - artigo 182 e 183, que mais tarde foram regulamentados pela Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da Cidade.

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 1o O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2o A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. § 3o As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4o É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I – parcelamento ou edificação compulsórios; II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2o Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

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§ 3o Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião (BRASIL, 2016, p.112 e 113).

A partir dos dois artigos expostos acima, podemos entender um pouco a respeito das ações do Estado brasileiro que influenciam a produção e a transformação do espaço citadino. Para entender um pouco acerca do assunto citado, trazemos no tópico 1.1.2. informações a cerca dos agentes que assim como o Estado tem o poder de intervir nas cidades.

1.1.2.

O Estado enquanto agente de produção do Espaço Urbano

A cidade é considerada por Correa (2003) em um primeiro momento como um complexo conjunto de diferentes usos atribuídos à terra. Este conjunto de usos diferentes é a organização espacial da cidade que nada mais é do que o próprio espaço urbano fragmentado. Este espaço fragmentado é ao mesmo tempo articulado, pois cada uma de suas partes irão manter relações espaciais com as demais, variando apenas a sua intensidade. Tais relações são baseadas na sociedade de classes. Por ser produto da sociedade capitalista, o espaço urbano reflete as desigualdades desse modo de produção além de ser campo de lutas por direitos iguais e palco das relações sociais.

Para Fernandes (2013), os processos econômicos, sociais e políticos que acontecem na cidade coexistem em uma dinâmica contínua, renovando e transformando seu espaço através da ação de agentes produtores do espaço urbano.

Tais agentes adotam diferentes estratégias de intervenção que podem gerar conflitos ao expressar os interesses daqueles que a produziram. Ainda segundo Fernandes (2013, p.20), “identificar os agentes produtores do espaço intra urbano brasileiro configura-se como uma tarefa relativamente difícil, uma vez que os agentes podem se misturar e se confundir no tempo e no espaço.”

Sendo assim, nos baseamos no estudo feito por Roberto Lobato Correa (2003) em que divide os agentes produtores e reprodutores do espaço em cinco grupos: •

Os proprietários dos meios de produção, ou seja, os grandes

proprietários industriais e das grandes empresas comerciais que devido à dimensão de suas atividades são grandes consumidores do espaço, necessitando assim, de

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terrenos extensos e baratos e que tenham fácil acesso para escoamento das mercadorias.

•

Os proprietários fundiários são aqueles que detém a posse da terra

seja por herança familiar ou por ter sido adquirida para determinados fins. Estes agentes se caracterizam por estarem mais interessados no valor de troca da terra do que em seu valor de uso.

•

Os promotores imobiliários são aqueles que criam o espaço vertical.

Eles atuam em todo o processo, parcialmente ou totalmente desempenhando as seguintes funções: incorporação, financiamento, estudo técnico, construção ou produção física do imóvel, e comercialização ou transformação do capital-mercadoria em capital – dinheiro, agora acrescido de lucro.

•

O Estado, é aquele que administra o espaço urbano, por ter controle

sobre a regulamentação das leis que incidem na cidade, determina a direção de seu desenvolvimento. Sua atuação tem sido complexa e variável tanto no tempo quanto no espaço pois reflete a dinâmica da sociedade a qual faz parte.

•

Os agentes sociais excluídos, são a população menos favorecida

financeiramente, que não possuem acesso aos bens e serviços produzidos e que por falta de políticas públicas por parte do Estado, irão fazer parte do espaço urbano segregado, morando muitas vezes em condições insalubres e ocupando áreas de risco.

De acordo com Lefebvre (2006), a cidade é o produto de um processo que envolve não apenas a materialidade, mas também as funções, formas, espaço e tempo, sendo o Estado um dos agentes capazes de produzir e transformar as formas urbanas. O Estado tem uma grande capacidade de influência sobre as formas da cidade, segundo Samson (1980 apud Corrêa, 2003) nesse sentido existe uma grande quantidade de ações que podem ser exercidas por ele, entre as quais se encontram: desapropriar a propriedade privada e em caso de interesse, precedência na compra da mesma, elaborar legislação a ser adotada para regular o uso e a ocupação do solo, autorizar a construção, autorizar a demolição, autorizar ou negar o uso do espaço, aplicar taxas diferenciadas (impostos), financiar, construir, estimular a produção do espaço através da construção de infraestrutura, entre outros.

A atuação do Estado se faz, fundamentalmente e em última análise, visando criar condições de realização e reprodução da sociedade capitalista, isto é, condições que viabilizem o processo de acumulação e a reprodução das classes sociais e suas frações (CORRÊA, 2003, p.26).

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Para Cunha e Smolka (1980 apud Medeiros,2015, p. 67), a interferência do Estado, além de ser “decisiva na estruturação da planta urbana, promove o processo de acumulação e afeta o ritmo de depreciação e reconstrução do ambiente construído”. Além disso, em momentos de crise urbana, a atuação do Estado se torna necessária para a resolução em curto prazo de problemas considerados sem solução pelos agentes capitalistas individuais (LOJKINE,1981 apud MEDEIROS,2007).

1.1.3. A influência do Estado na produção habitacional do Brasil No Art. 25 da Declaração Universal de 1948 o direito à moradia6 passou a fazer parte dos direitos humanos reconhecidos internacionalmente como universais. No âmbito nacional, em 2000, este direito passou a fazer parte da atual Constituição (1988), através da Emenda Constitucional nº 26/00, assim como o direito à educação, saúde, alimentação, entre outros considerados como Direitos Sociais.

Apesar de ser uma necessidade básica e um direito de todo cidadão, “a habitação é uma mercadoria inserida na lógica capitalista de produção” (BONATES, 2007, p.28). Assim como acontece com outras mercadorias, o produtor imobiliário objetiva o lucro. A produção capitalista de moradias está gerida pela lei da oferta e da procura. De acordo com Bonates (2007), isso significa que ao produzir habitações orientadas pela lógica do capital cria-se um problema difícil de ser solucionado. Pois, mesmo havendo uma grande oferta da mercadoria habitação, poucos possuem o recurso necessário para adquiri-la, visto que tal mercadoria apresenta um alto valor agregado, impossibilitando sua aquisição por meio da população de menor renda.

Conforme apresentado anteriormente, o Estado é capaz de intervir no meio urbano através de várias ações, seja de forma mais indireta com a elaboração de legislações que regulamentem o uso e a ocupação do solo ou através de investimentos na produção do espaço.

Posto isto, neste item buscamos investigar, através de um breve histórico, a influência exercida pelo Estado brasileiro na produção habitacional que resultou em um crescimento urbano desordenado e desarticulado.

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A moradia não é vista apenas como um local que oferece proteção contra variações climáticas. Mas, àquela com condição de salubridade, de segurança, infraestrutura e com dimensões adequadas para que possa ser considerada habitável.

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Sendo assim, iniciaremos com a análise do período que compreende a República Velha (1889-1930), onde de acordo com Bonduki (1994) a produção estatal de moradia foi praticamente nula. Durante este período era privilegiada a produção habitacional por meio do setor privado e as ações do Estado podiam ser vistas nas questões relacionadas ao controle de salubridade das edificações 7.

Durante a República Velha (1889-1930), a construção de casas e cortiços realizada pelos promotores imobiliários supriu, do ponto de vista quantitativo, as necessidades da população, que a partir desse momento passou a ter problemas com o valor da locação das habitações. Pois, não havia por parte do Estado nenhuma interferência nos valores dos aluguéis, estando esses quase sempre entregues à livre negociação entre o locador e o locatário (BONDUKI,1994). Em resumo, “o Estado não assumia a responsabilidade de prover moradias nem a sociedade lhe atribuía esta função” (BONDUKI,1994, p. 714).

A revolução de 1930 é considerada um marco, pois a partir dela surge um novo tipo de Estado, que segundo Fausto (1995) se diferenciava do Estado oligárquico não apenas pela centralização do poder e pelo maior grau de autonomia, como também pela atuação econômica, voltada para a promoção da industrialização; atuação social que tendia a dar uma certa proteção aos trabalhadores urbanos 8; e pela importância cedida às Forças Armadas - com destaque para o Exército.

Sendo assim, durante o início da Era Vargas, o Estado brasileiro pôde “formular uma política econômica e social que, apesar de às vezes ser contraditória e descontínua, apresenta certas características bem definidas” (Bonduki, 1994, p. 716).

Ainda segundo o autor, como exemplo destas características podemos destacar as políticas voltadas aos trabalhadores, que objetivava firmar um compromisso com as massas. O governo de Vargas é marcado por uma série de intervenções no campo trabalhista como a instituição de leis voltadas a garantir os direitos dos trabalhadores, a criação dos Institutos de Previdência e Pensões e a extinção da liberdade sindical (BONDUKI,1994).

Foi nesse contexto que o Estado passou a intervir na questão habitacional, através de um programa de produção de moradias e de uma política de proteção ao 7 8

Planejamento urbano sanitarista.

Segundo Bonduki, durante os primeiros anos da Era Vergas surgiu um novo personagem da história brasileira – as massas populares urbanas- que passaram a garantir a legitimidade do novo Estado brasileiro.

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inquilinato. Tais programas tinham ampla aceitação das massas que até o momento tinham a habitação como um dos problemas mais graves a ser resolvido, visto que cerca de 20% da renda familiar era gasta com o aluguel. Nesse momento as questões relacionadas ao sanitarismo passaram para segundo plano e a habitação passa então a ser vista a partir de dois olhares (BONDUKI,1994). (...) primeiro, como condição básica de reprodução da força de trabalho e, portanto, como fator econômico na estratégia de industrialização do país; segundo a habitação como elemento na formação ideológica, política e moral do trabalhador, e, portanto, decisiva na criação do “homem novo” e do trabalhador- padrão que o regime queria forjar, como sua principal base de sustentação política (BONDUKI, 2017, p.81).

Em 1937 ocorreu o golpe civil militar9 que resultou no Estado Novo, tal regime se caracterizou pela ditadura pessoal de Vargas, que passou a ser o mediador da ordem social, tornando possível a articulação de vários setores da sociedade (FINEPGAP,1983 apud Baron, 2011). Ainda neste mesmo ano, foram criadas as carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) 10 que como veremos adiante terão um importante papel no financiamento dos primeiros conjuntos habitacionais

com

intervenção

do

Estado

brasileiro

(BONDUKI,1994;

NOGUEIRA,1998 apud BARON,2011).

Os recursos destinados à construção habitacional eram provenientes das carteiras prediais dos IAPs. O Estado passou a autorizar que 50% da receita acumulada pelos institutos fossem destinados ao financiamento não só da construção de habitação social, mas também à incorporação imobiliária para setores médios (BONDUKI,1994; NOGUEIRA,1998 apud BARON,2011).

Em 1945 o Estado Novo chegou ao fim, como resultado de um jogo político complexo, Vargas foi forçado a renunciar. Essa alteração política não representou uma ruptura com o passado, mas apenas uma mudança de rumos, mantendo em alguns aspectos uma certa continuidade do regime anterior. Nesse momento de transição, o Brasil dava os primeiros passos a caminho da industrialização acentuada durante os anos de 1950 e 1960. Tal processo, estimulou a migração campo-cidade,

9

O golpe foi considerado civil militar por ter contado com apoio das Forças Armadas - em especial do Exército - e com ao apoio da classe dominante.

10

Existiam Institutos de Aposentadoria e Pensão para diversas camadas da sociedade, dentre as quais destacam-se os industriários, comerciários, bancários, entre outros. Suas atividades estavam voltadas apenas para uma pequena camada de associados.

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gerando inúmeros problemas nos centros urbanos, como veremos adiante (FAUSTO,1995).

Em 1946, com o apoio de Getúlio Vargas, chegou à presidência o general Eurico Gaspar Dutra. Em setembro desse ano foi promulgada a nova Constituição brasileira (FAUSTO,1995). Ainda em 1946, dando continuidade à produção em larga escala de conjuntos habitacionais com financiamento estatal, iniciada pelos IAPs, foi criada a Fundação da Casa Popular (FCP), que em termos gerais propunha: financiamento de habitações na zona rural e em áreas urbanas, pela iniciativa privada ou pública destinadas à venda ou locação a trabalhadores, sem objetivos de lucro; financiamento de obras urbanísticas para melhoria das condições de vida dos trabalhadores; estudos de habitações classificadas como populares, desde as tipologias até os sistemas construtivos; financiamento ao setor da construção civil para racionalização das construções, bem como, para a indústria de materiais de construção e assessoria as prefeituras que não possuíssem pessoal técnico habilitado.

(FINEP-GAP,1983 apud BARON,2011, p.112)

As tarefas propostas pela FCP tornaram-se impossíveis de serem postas em prática devido à escassez de recursos, influência e maturidade da Fundação. Além de haver conflitos de interesse no campo político, que se traduzia na falta de respaldo político, apoio dos estados ou legislação. Para que seu funcionamento fosse possível, foi necessário que uma nova legislação limitasse seu campo de atuação (ANDRADE; AZEVEDO, 1982).

Nesse momento havia no país dois programas estatais que tinham como objetivo a construção de moradias populares, a Fundação da Casa Popular e as carteiras prediais dos Institutos de Pensão e Aposentadoria. Embora tivessem a mesma finalidade, o objetivo principal dos IAPs era garantir aposentadoria e pensões aos seus associados enquanto que na FCP seu único e exclusivo objetivo era a produção habitacional para a população de menor poder aquisitivo (BONDUKI,1994).

A produção habitacional realizada pelos IAPs, representou um marco na difusão de novas tipologias de habitação social no país, principalmente durante os anos de 1940 e 1950. Influenciados pela produção de habitação pública na Europa, muitos arquitetos da época encontraram nesses conjuntos a oportunidade ideal de aplicar os conceitos difundidos pela arquitetura modernista, através da introdução de novos hábitos e um modo de vida “moderno”. Lúcio Costa, tido como um dos principais arquitetos da época, defendia que a mudança no modo de morar a partir dos preceitos modernistas teria forte impacto na sociedade, pois para ele “a casa moderna seria um

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instrumento de libertação dos trabalhadores” (CAVALCANTI,1987 apud BONDUKI, 2017, p. 147).

Os conjuntos residenciais tiveram grande impacto nas cidades brasileiras nos anos de 1940 e 1950, não só pela área construída, mas sobretudo pelos seus programas inovadores, em que se associavam edifícios de moradia com equipamentos sociais e recreativos, áreas verdes e de lazer, sistema viário etc. Nesses verdadeiros núcleos urbanos procurou-se criar um espaço capaz de propiciar o surgimento de um novo modo de vida operário, moderno, coletivo, adequado ao modelo de desenvolvimento promovido pelo Estado.

Nas suas origens, portanto, a habitação social no Brasil articulou-se com o embrião de um projeto de sociedade e de desenvolvimento nacional e sua arquitetura refletia tal preocupação (BONDUKI, 2017, p.171).

Desse modo, a influência dessa vanguarda arquitetônica nesses conjuntos habitacionais, contribuiu para que houvesse algumas mudanças no modo de construir habitação popular no país. Dentre essas mudanças encontram-se as que são relacionadas à tipologia das habitações, ao processo construtivo, a implantação dos conjuntos na cidade, aos programas habitacionais e ao modo de morar, através do modo de morar mínimo. Apesar das novidades trazidas pelo modernismo, o modelo da casa unifamiliar e isolada, em loteamentos afastados dos núcleos urbanos, não foi deixado de lado, pelo contrário, uma quantidade considerável dos conjuntos produzidos tanto pelos IAPs quanto pela FCP refletiam esse modelo, que também foi executado massivamente pelo BNH e continua até os dias atuais (BONDUKI,2017).

Segundo Azevedo; Andrade (1982) ao comparar a produção da FCP com a dos IAPs, a primeira teve um desempenho pouco expressivo, contribuindo com pouco mais de 10% do total de moradias construídas pelo Estado em seu período de atuação (Tabela 01).

IAPs 124.025

FCP

Total

16.964

140.989

Tabela 01: Produção ou financiamento estatal de habitação (excluindo a produção realizada por estados e municípios).

Fonte: Bonduki, 1994. Editado pela autora, 2018.

Mesmo com a criação dos programas citados, seria um equívoco, segundo Bonduki (1994), afirmar que o governo Vargas e os que lhe sucederam chegaram a criar uma política habitacional articulada e coerente. Pode-se dizer que só houve uma mudança na política habitacional brasileira a partir da criação do BNH, em 1964.

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Durante os anos de 1950 e 196011, acentuou-se o processo de abandono da área rural por parte de sua população, atraída pela perspectiva de emprego nas indústrias e pelo acesso à serviços e bens, benefícios estes que lhes eram negados no ambiente rural. A partir do impulso provocado por esse processo, em 1970, a população brasileira passou a ser em sua maioria urbana (SANTOS, 2013; NAPOLITANO, 2014).

Nesse contexto passaram a surgir com maior frequência uma significativa quantidade de problemas nas cidades, como falta de infraestrutura e déficit de habitação. Tendo em vista que, os programas citados não foram capazes de resolver tais questões. Em 1964, o governo federal através do Ministério de Planejamento, instituiu o Plano Nacional de Habitação e Planejamento Territorial, a partir da Lei nº 4.380, que criava o Banco Nacional de Habitação (BNH) e o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (MEDEIROS,2015).

O BNH iniciou suas atividades ainda em 1964, com o intuito de estimular a construção e a aquisição da casa própria, em especial para os trabalhadores de baixa renda. Ainda no mesmo ano, também foi criado o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) que se propunha a captar os recursos necessários para as ações desenvolvidas pelo BNH (ANDRADE; AZEVEDO, 1982; MEDEIROS, s.d., 2015). De acordo com Rolnik (2015), o SHF era composto por alguns instrumentos financeiros, a exemplo das sociedades de crédito imobiliário e as letras imobiliárias.

Diferentemente das políticas de habitação criadas anteriormente, onde a atuação do Estado ocorria de forma descentralizada, a partir do Plano Nacional suas ações passam a acontecer de modo unificado, com a padronização das normas e políticas (ANDRADE; AZEVEDO, 1982). O Plano Nacional de Habitação e consequentemente o BNH, pretendiam criar “uma política permanente de financiamento capaz de estruturar em moldes capitalistas o setor da construção civil habitacional” (BONDUKI, s.d., p.72).

De acordo com uma pesquisa realizada pelo Institute for International Social Research, no início dos anos 1960, a casa própria era considerada como o anseio principal dos trabalhadores urbanos. Nesse sentido, o novo governo precisava mostrar que era capaz de enfrentar os problemas sociais, e que estaria pronto para agir em favor dos trabalhadores (MEDEIROS,s.d.).

11

Devido à rápida industrialização do país, iniciada no final dos anos 40.

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Além de buscar junto às massas populares a legitimação do novo regime político, a criação do BNH previa vários efeitos benéficos na esfera econômica como: o estímulo à poupança; absorção de mão de obra não qualificada pelo mercado de trabalho da construção civil; expansão da indústria de material de construção; fortalecimento das empresas e das atividades associadas à construção civil. Porém, com o caráter cada vez mais repressor do regime militar, a política de habitação passa a perder gradualmente o teor social e político em que se inspirara em detrimento do teor econômico e empresarial, que passa a prevalecer 12 (ANDRADE; AZEVEDO, 1982; MEDEIROS, s.d.).

O Estado, por meio do SFH, passou a atuar na captação dos recursos necessários através das poupanças compulsórias provenientes do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS13 e das voluntárias - originárias das cadernetas de poupança e da colocação de letras imobiliárias. Para o financiamento, o BNH destinava um agente específico para cada um de seus segmentos. Ou seja, para o mercado popular14 o financiamento era de responsabilidade das Companhias de Habitação – COHABs, que podiam ser estaduais ou municipais, e dos Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais - INOCOOPs. Para o mercado médio15 e alto os financiamentos eram feitos a partir dos agentes privados, que contavam com recursos provenientes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo – SBPE composto pela Sociedade de Crédito Imobiliário – SCIs, Associações de Poupança e Empréstimos - APEs e pelas Caixas Econômicas Federais - CEF. Além dos órgãos citados, haviam outros agentes públicos envolvidos na produção habitacional, que atuavam na escala estadual como os institutos de

12

De acordo com Medeiros (2015), ao ser criado o BNH era vinculado ao Ministério da Fazenda, porém em 1967 passou a integrar o Ministério do Interior, juntamente com outros bancos – a exemplo do Banco da Amazônia S.A. e o Banco do Nordeste do Brasil – e outros departamentos – como o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e o Departamento Nacional de Obras e Saneamento. Tal mudança está relacionada ao enfraquecimento das relações com as massas populares urbanas.

13

Segundo Rolnik (2015), o FGTS é formado pela contribuição mensal de 8% dos salários pagos pelo empregador aos seus empregados. A partir de 1967 este fundo passou a ser o principal financiador do BNH e até hoje configura-se como uma fonte de recursos para a política habitacional.

14

Inicialmente faziam parte do mercado popular as famílias com rendimento mensal de um a três salários mínimos, posteriormente esse limite foi ampliado para cinco salários mínimos.

15

O mercado médio era composto por famílias de renda mensal mínima de seis salários mínios.

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previdência estaduais e algumas fundações. Na Paraíba16 destacaram-se o Montepio, a Companhia Estadual de Habitação Popular - CEHAP17, o Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais – INOOCOP, o Instituto de Pensões e Aposentadorias dos Servidores do Estado – IPASE e o Instituto de Previdência do Estado da Paraíba IPEP (ANDRADE; AZEVEDO, 1982; BONATES, 2007).

Como dito anteriormente, no momento de sua criação o BNH buscava tanto o apoio dos trabalhadores urbanos quanto o fortalecimento da economia que se encontrava em crise, com o passar do tempo notou-se que esses dois interesses eram contraditórios.

Desse modo, os objetivos sociais perderam espaço dentro das políticas habitacionais, devido a sua incompatibilidade com a “lógica financeira” do BNH. Para melhorar a atuação do Banco junto aos setores de baixa renda, foi criado o Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) cujos objetivos eram: “cobrir os possíveis saldos devedores dos adquirentes ao fim do período de financiamento, a ampliação do prazo para amortização da casa própria e a diminuição das taxas de juros nos contratos de aquisição de moradias populares” (AZEVEDO, 1988, p.112).

Apesar da tentativa de melhorar sua atuação, o Banco não conseguiu, atingir a camada da população de renda mais baixa – que recebiam entre 1 a 3 salários mínimos. No entanto, esse resultado não era apenas responsabilidade das políticas falhas do BNH. Para tentar resolver os problemas da crise econômica da época, os militares adotaram a política de “arrocho salarial” que diminuía progressivamente os salários dos trabalhadores de baixa renda18 (ANDRADE; AZEVEDO,1982; AZEVEDO,1988).

Além do problema econômico, outros fatores contribuíram para que houvesse uma grave crise nas COHABs, nos primeiros cinco anos de atuação do BNH, dentre

16

A política habitacional na Paraíba foi intensificada no período pós-1968.

De acordo com Bonates (2007), inicialmente o Montepio dos Funcionários Públicos foi criado com o intuito de estimular a previdência social para os funcionários estaduais, em 1942 foi alterado e passou a ser o Montepio do Estado da Paraíba, mantido inalterado até 1970 quando transformou-se em IPEP. Em 2003, o IPEP foi desarticulado e sua carteira de habitação foi totalmente transferida para a CEHAP. A CEHAP foi instituída em 1965, e durante os governos militares atuava no financiamento das habitações produzidas pelo BNH, continua em vigor atualmente, porém em menor proporção.

17

De acordo com Singer (1975 apud Azevedo e Andrade, 1982), a partir da política de “arrocho salarial” o salário mínimo de quem possuía pouca ou nenhuma qualificação foi diminuído, em relação ao salário dos trabalhadores que possuíam algum tipo de qualificação. Isso gerou nos anos de 1960, uma redistribuição de renda, que beneficiava as camadas de maior poder aquisitivo e a classe média urbana em detrimento da classe de menor renda.

18

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os quais se destacam: o fato da população estar acostumada com uma política paternalista; a falta de conhecimento sobre a política de financiamento do banco; e a má qualidade das moradias aliada a falta de infraestrutura básica (rede de água, esgoto e energia elétrica) dos conjuntos. Para tentar resolver a crise das COHABs, a política habitacional do país passou por uma completa reformulação. Entre os anos de 1970 e 197419, buscou-se reduzir os investimentos em moradias para as famílias de menor poder aquisitivo e privilegiar as famílias com renda mensal acima de três salários mínimos, também se passou a investir em obras de infraestrutura, saneamento e etc. A partir de 197520, como efeito das medidas adotadas anteriormente, a crise começou a ser resolvida, e os investimentos no mercado popular voltaram a acontecer (ANDRADE; AZEVEDO,1982; AZEVEDO,1988). É importante deixar claro que apesar do teor social em que o BNH se inspirara, ainda nesse momento a habitação é vista sob a óptica capitalista. De certa forma, isso explica a escolha da localização dos conjuntos habitacionais criados pelo BNH. Fuentes (2008), afirma que a localização destes empreendimentos fazia parte de uma política que incentivava a aquisição de grandes áreas com baixo custo, “devendo possuir um potencial para futura valorização.” Desse modo, “a terra deveria representar a menor percentagem possível no custo final da habitação e proporcionar um descongestionamento dos centros urbanos” (FUENTES, 2008, p.48).

A produção desses conjuntos habitacionais resultou na formação das periferias mal construídas, cujas unidades apresentavam-se com péssima qualidade construtiva, configurando o modelo de periferização marcado pela precariedade e pela exclusão social (VALE, 2012, p.27).

Desse modo, podemos inferir que houve um declínio em termos qualitativos da produção realizada pelos IAPs em relação a produção realizada pelo BNH. Apesar de haver a construção de unidades habitacionais unifamiliar, os conjuntos produzidos pelos IAPs caracterizam-se pela boa qualidade tanto arquitetônica quanto urbanística, através da construção de blocos de apartamentos localizados próximos aos centros urbanos. Enquanto que os conjuntos produzidos pelo BNH, caracterizavam-se pela má qualidade arquitetônica e urbanística, localizavam-se nas periferias, possuíam

19

Do ponto de vista político, no início dos anos de 1970, o país se encontrava nos anos de maior repressão popular – governo Médici, nesse momento os militares não estavam preocupados com o apoio popular para pôr em prática suas ações. (AZEVEDO e ANDRADE,1982; AZEVEDO,1988) 20

Nesse ano o país começava a dar os primeiros sinais de uma abertura política, no governo do General Ernesto Geisel.

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grandes dimensões, eram compostos por casas unifamiliares pequenas e apresentavam carência de infraestrutura.

No início da década de 1980, o país se encontrava em clima de luta pela volta das eleições diretas para Presidente e pela Constituinte. Ainda durante a primeira metade da década citada, com a crise do modelo econômico colocado em prática pelo regime militar, houve uma redução na capacidade de investimentos do SFH, devido à diminuição dos saldos do FGTS e da poupança (ANDRADE; AZEVEDO,1982; AZEVEDO,1988; BONDUKI, 2008).

Diante desta conjuntura, a população insatisfeita com a forma de gerir a política habitacional realizada pelo BNH, passou a organizar-se em movimentos e a articularse com a luta pela democracia21. Para tentar amenizar as críticas, os militares adotaram uma diminuição significativa do valor das prestações dos imóveis financiados pelo BNH, fato que gerou um imenso buraco nas contas do Sistema Financeiro com futuras consequências, e não resolveu o problema das críticas dirigidas ao Banco (BONDUKI, 2008).

Em 1985, depois de um pouco mais de vinte anos chega ao fim a ditadura militar. Com o fim do regime, era de se esperar que todo o Sistema Financeiro da Habitação – incluindo o BNH, as COHABs e todos os seus agentes – passassem por mudanças. Porém no ano seguinte, para alívio de grande parte da população o BNH foi extinto22. Após sua extinção, a Caixa Econômica Federal - CEF passou a assumir as principais atribuições relacionadas à habitação popular, assim como boa parte dos antigos funcionários do BNH. A CEF tornou-se o principal agente financeiro e operador dos recursos provenientes do FGTS (BONDUKI, 2008; MEDEIROS,2015).

Com o fim do BNH, “perdeu-se uma estrutura de caráter nacional que, mal ou bem, tinha acumulado enorme experiência na área, formado técnicos e financiado a maior produção habitacional da história do país

23”.

Diferentemente do que acontecia

durante os governos populistas, a política habitacional do regime militar “era articulada e coerente”, embora que equivocada (BONDUKI, 2008 p.75).

21

O fato do BNH estar diretamente associado ao regime autoritário facilitou essa articulação.

O banco “havia se tornado uma das instituições mais odiadas do país.” (BONDUKI, s.d., p.75) Além disso, sua imagem estava diretamente ligada ao período de atuação dos militares.

22

23

Durante os anos de atuação do BNH foram construídas quatro milhões de habitações, que correspondem a 25% do parque imobiliário do Brasil. (VEIGA,2009 apud MAIA,2014)

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Com a redemocratização, esperava-se que houvesse uma transformação drástica na política habitacional do país, porém nota-se que entre a dissolução do BNH, em 1986, e a aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001, a política habitacional praticamente parou de existir, devido a uma certa “descontinuidade e ausência de estratégia para enfrentar o problema 24” (BONDUKI, 2008).

Valença (2014 apud Medeiros, 2015) afirma que é importante notar que após a extinção do BNH, o formato operacional existente não foi alterado, ou seja, as principais fontes de recursos para o investimento em habitações continuavam a ser das poupanças compulsórias do FGTS e das cadernetas de poupança. Com isso, os governos municipais e estaduais continuam sendo dependentes do governo federal.

Nesse meio tempo, a União, os estados e municípios, passaram a lançar “programas habitacionais financiados com fontes alternativas, em particular recursos orçamentários, adotando princípios e pressupostos diversos dos adotados anteriormente” (BONDUKI, 2008 p.77). Marcando o início de uma nova fase na política habitacional brasileira, denominada de pós BNH Esta fase pode ser caracterizada como um período de transição, momento em que deixou de existir uma estratégia nacional para enfrentar a questão da habitação, vazio que foi ocupado de forma fragmentária, mas criativa, por Municípios e Estados. Em particular, os municípios administrados pelo PT, [...] passaram a desenvolver programas habitacionais alternativos ao modelo adotado pelo BNH, utilizando recursos orçamentários, adotando uma perspectiva mais social e utilizando práticas tradicionais da população mais pobre, como o mutirão (BONDUKI, 2008, p.77).

Desse modo, a partir da Constituição de 198825, passa a ocorrer uma transferência gradual de atribuições para os estados e municípios. Por estar em contato direto com a população, foi atribuído ao poder local a responsabilidade de tentar solucionar os problemas habitacionais. Diferentemente do que acontecia na época do BNH, as intervenções na política habitacional passaram a acontecer de forma descentralizada e heterogenia, “marcada pela diversidade de iniciativas, mas pouco articuladas em decorrência da ausência de uma política nacional” (BONDUKI, 2008, p. 77). Dentre as iniciativas adotadas pelas gestões municipais encontram-se a urbanização de favelas e assentamentos precários, a construção de novas unidades habitacionais através de mutirões, apoio à autoconstrução, intervenções em áreas Durante esse tempo, “o setor do governo federal responsável pela gestão da política habitacional esteve subordinado a sete ministérios ou estruturas diferentes” (BONDUKI, s.d. p.76) 24

25

Diferentemente do que acontecia até os governos militares, com a nova Constituição, a moradia passa a ser responsabilidade das três esferas governamentais- federal, estadual e municipal.

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centrais, entre outras. Tais políticas habitacionais não tiveram grande impacto nas cidades, como acontecia anteriormente no período de atuação do BNH, nem tampouco resolveram os problemas habitacionais do país (BONDUKI, 2008 MAIA, 2014).

No ano 2000, a demanda por novas moradias chegava a 6,6 milhões, sendo 5,4 milhões em áreas urbanas e 1,2 milhão nas áreas rurais 26. A situação mais grave era a de famílias com renda mensal até três salários mínimos, por estarem “abaixo da linha de financiamento”, e que para conseguir obter a casa própria, dependiam diretamente dos auxílios fornecidos pelos programas habitacionais do Estado. Apesar dos programas criados pela União, pelos estados e municípios, após o fechamento do BNH, o acesso à moradia através do “mercado imobiliário formal” ficou cada vez mais difícil por parte dos trabalhadores que recebiam até três salários mínimos, que para sobreviver passaram a morar em locais insalubres e irregulares, como: favelas, morros, palafitas, locais próximos as linhas de água, morros, edifícios públicos e/ou particulares, entre outros (BONDUKI, 2008; COSTA, 2014).

Devido a proporção da deficiência de habitações, na disputa eleitoral para a Presidência, em 2002, o até então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, apresentou um programa de cunho intervencionista no problema habitacional, denominado de Projeto Moradia. Tal projeto foi de extrema importância para a criação do Ministério das Cidades e parte dele foi inserido no Plano Nacional de Habitação – PlanHab (MEDEIROS, 2015; COSTA, 2014).

De acordo com o Projeto Moradia, era necessário ações na política habitacional que resultasse na produção de moradias dignas, localizadas em áreas urbanizadas e que seus moradores tivessem acesso aos bens públicos essenciais, para isso o Estado deveria desenvolver programas que gerassem trabalho e renda (MEDEIROS, 2015; COSTA, 2014). Segundo Bonduki (2009), para atender aos objetivos traçados pelo Projeto Moradia, estava prevista uma política de subsídios que contava com um “mix de recursos não onerosos” advindos do Orçamento Geral da União – OGU e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Tais recursos seriam retornáveis para tornar viável o crédito e o acesso à moradia digna para a população de baixa renda. O Projeto Moradia destacava a importância da Lei Federal 10.257, denominada de Estatuto da Cidade, pois só a partir dela seria possível

26

Informações obtidas através do Censo de 2000 realizado pelo IBGE (BONDUKI, s.d., p.82)

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“facilitar e baratear o acesso à terra, combatendo a especulação com imóveis ociosos” (BONDUKI, 2009, p.2).

O Estatuto da Cidade foi aprovado em 2001, no final do governo de FHC e em 2003, no início do governo Lula, foi criado o Ministério das Cidades. A partir da conjugação desse instrumento legal com o órgão citado, foram concebidos diversos programas voltados para a população de baixa renda, alguns deles objetivavam a remoção da população que morava em favelas e em assentamentos precários.

Apesar do Ministério das Cidades ser considerado o responsável por gerir a política habitacional do país, na prática é a Caixa Econômica Federal quem aprova os pedidos de financiamento e quem faz o acompanhamento do processo de construção dos empreendimentos (BONDUKI, 2008).

A criação do Ministério das cidades marcou o início da política habitacional desenvolvida durante os governos Lula (2003 - 2011) e Dilma (2011- 2016). É considerado o mais importante órgão responsável pela política habitacional do país, desde a extinção do BNH. Foi criado para tratar a questão urbana de forma integrada, diferente do que ocorria anteriormente na época dos militares (BONDUKI, 2008).

O Ministério das Cidades foi criado com o caráter de órgão coordenador, gestor e formulador da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, envolvendo, de forma integrada, as políticas ligadas à cidade, ocupando um vazio institucional e resgatando para si a coordenação política e técnica das questões urbanas. Coube-lhe, ainda, a incumbência de articular e qualificar os diferentes entes federativos na montagem de uma estratégia nacional para equacionar os problemas urbanos das cidades brasileiras, alavancando mudanças com o apoio dos instrumentos legais estabelecidos pelo Estatuto das Cidades (BONDUKI, 2008, p.96).

Em 2004, ainda no início do governo Lula, com o intuito de estabelecer uma correlação entre a Constituição Federal (1988), e com os recém-criados Estatuto da Cidade e Ministério das Cidades, é aprovada a Política Nacional de Habitação - PNH. Dentre os órgãos que tornam possível a viabilização da nova política habitacional encontra-se o Sistema Nacional da Habitação – SFH e o Plano Nacional de Habitação - PlanHab (COSTA, 2014; OLIVEIRA,2014).

O SFH atua no mercado habitacional desde a época de atuação do BNH, e a partir da nova política passou a ser dividido em Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, que tem como público alvo as famílias com renda entre 0 a 5 salários mínimos e em Sistema de Habitação de Mercado, que prioritariamente atende as famílias com rendimentos mensais entre 5 a 10 salários mínimos (COSTA, 2014; OLIVEIRA,2014). A partir da institucionalização do SNHIS, passou a ser exigido

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dos “estados e municípios a criação de uma estrutura institucional, com fundo, conselho e plano de habitação, para que tivessem acesso aos recursos federais” (BONDUKI, 2009, p.3).

No momento de sua criação o PlanHab foi considerado um dos instrumentos mais importantes para a implementação da nova política habitacional. Instituído a partir da Lei Federal 11.124/05, que previa a estruturação do Sistema Nacional de Habitação de Interesse social, foi elaborado sob a coordenação da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades. O PlanHab foi o primeiro plano voltado para a habitação desde a extinção do BNH, e se propunha a traçar planos de ação a longo prazo para acabar com o déficit habitacional do país, suas ações dividiam-se em quatro eixos estruturais: “modelo de financiamento e subsídio; política urbana e fundiária; arranjos institucionais e cadeia produtiva da construção civil.” Seu principal objetivo é “universalizar o acesso à moradia digna para todo cidadão brasileiro” (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2009, p.09).

Até o governo Lula a moradia era tratada como mercadoria, pois para o Estado capitalista a terra é vista como capital, sendo assim, para alcançar o principal objetivo do PlanHab, a PNH deveria passar a considerar a moradia como um direito, assim como já estava previsto na Constituição Federal, desde 2000. Para isso, além do critério de renda familiar, o PlanHab criou outros cinco parâmetros para tornar possível o acesso ao financiamento da moradia por parte de todos cidadãos brasileiros: o primeiro grupo, era formado por famílias sem rendimentos ou “abaixo da linha da linha de financiamento”; no segundo grupo, encontravam-se as famílias com rendimentos informais ou reduzidas e que mesmo tendo alguma renda não podem se comprometer a pagar o financiamento; o terceiro era destinado a famílias cujo rendimento mensal permite o pagamento de um financiamento, porém o valor não é suficiente para a obtenção de “uma moradia adequada”; o penúltimo é composto por famílias que possuem “rendas estáveis e que podem oferecer garantias reais” para o pagamento dos financiamentos; o último grupo é formado por famílias sujos rendimentos mensais dão “plena capacidade de acesso a um imóvel adequado às suas necessidades, por meio de esquema de financiamento de mercado” (COSTA, 2014, p.4).

Entre os anos de 2005 a 2008, foram lançados novos programas habitacionais cujos recursos eram provenientes do FNHIS, e eram voltados principalmente para a população que possuía rendimentos mensais até três salários mínimos. Nesse período também foram lançados programas que movimentavam os recursos do FGTS

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e que eram destinados a famílias que possuíam rendimentos entre três e doze salários mínimos. Em 2007, foi criado o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, que tinha como objetivo principal “aquecer a economia nacional com foco voltado para o social.” O PAC contempla investimentos setoriais em infraestrutura energética, logística e urbana, além de ampliar a transferência de recursos para a habitação social.

A inclusão do eixo “urbanização de assentamentos precários” visava extrapolar as políticas de cunho apenas compensatório, voltadas para o campo da habitação, reforçando o direito à cidade e à moradia digna. São ações que procuram promover uma “melhoria do ambiente de investimentos” e definir no país uma carteira de projetos de infraestruturas (COSTA, 2014, p.5).

Em 2009, foi lançada a primeira fase do programa Minha Casa Minha Vida PMCMV, com o intuito de auxiliar o PAC no campo da habitação. De acordo com o Art. 1º, da Lei Federal 12.424/11, o PMCMV “tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais”. O programa dividese por faixa de renda mensal, na área urbana, em sua primeira fase, a faixa 01 era composta por famílias cujos rendimentos chegavam até R$ 1.600; a faixa 02 até R$ 3.100 e a faixa 3 até R$ 5.000. Diferentemente da área urbana, na rural os rendimentos são anuais. Na faixa 01 se encontram as famílias que ganham até 15 mil ao ano; na faixa 02 até 30 mil e na faixa 03 até 60 mil (SECRETARA NACIONAL DA HABITAÇÃO, 2017).

Atualmente, o PMCMV continua em vigor, segundo informações encontradas no sítio da Secretaria Nacional de Habitação, na área urbana, a faixa 01 é formada por famílias com renda de até R$1.800; a faixa 1,5 é destinada a famílias com renda mensal de até R$2.350; a faixa 02 até R$ 3.600 e a faixa 03 até R$6.500. No caso dos trabalhadores rurais, a renda continua a ser anual, podendo chegar até R$ 78 mil ao ano. Além do PMCMV, existem diversos outros programas e ações geridas pela Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, dentre os quais podemos destacar o Programa Moradia Digna (Apoio à Urbanização de Assentamentos Precários); o Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social – PSH; Ação de Apoio à Produção Social de Moradias Dignas, entre outros 27 (SECRETARA NACIONAL DA HABITAÇÃO, 2017).

27

Para mais informações a respeito dos programas habitacionais que estão em vigor, consultar o sítio da Secretaria Nacional de Habitação.

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1.2.

43

CONCEITO DE BAIRRO E DE CONJUNTO HABITACIONAL

Para melhor apreensão do objeto de estudo que será analisado adiante, partimos da conceituação dos termos Bairro e Conjunto Habitacional. O estudo do conceito de bairro é de extrema importância, pois através dele “podemos conhecer o passado e o presente da cidade, além de podermos pressentir o seu futuro” (SOARES,1987 apud SILVA, 2016).

Ao realizarmos pesquisas a respeito do conceito de bairro, é comum encontrarmos que a sua definição está diretamente ligada a uma simples divisão territorial de uma cidade. A exemplo de Ferreira (2004, p. 252) que o apresenta como “Cada uma das partes em que se costuma dividir uma cidade ou vila, para mais precisa orientação das pessoas e mais fácil controle administrativos dos serviços públicos.” Porém sua definição não poderá estar restrita a simples divisão territorial de uma cidade, visto que além de ser um território, o bairro se caracteriza pelo “sentimento de localidade” presente em seus moradores (SOUSA,1987 apud BEZERRA, 2011). É importante deixar claro que a definição de bairro não é comum a todos os países, a exemplo de Portugal, onde a definição do vocáculo está ligada “a um conjunto de freguesias que forma uma região político-administrativa espacialmente maior do que é observado no Brasil” (BEZERRA, 2011, p. 23). A divisão administrativa da cidade de Lisboa se dá a partir de quatro grandes bairros (Lisboa Oriental, Lisboa Ocidental, Bairro Alto e Bairro Baixo), que são importantes apenas por abrigar as funções da Câmara Administrativa da cidade. Os habitantes apreendem a cidade através das 43 freguesias geradas pelos quatro bairros (BARROS, 2004; BEZERRA,2011).

De acordo com Barros (2004) existem diferentes formas de se apreender o conceito de bairro dentre as quais se encontram o ponto de vista morfológico – dimensional, político – administrativo e o histórico – social.

Sob o ponto de vista morfológico-dimensional, o bairro se apresenta como um aspecto físico, é considerado um pedaço urbano que cresce segundo direções pré estabelecidas, apresentando uma determinada área e um traçado que obedece a uma

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lógica espaço-social, geralmente estabelecida por um agente produtor do espaço urbano.

O bairro torna-se, pois um momento, um setor da forma da cidade, intimamente ligado à sua evolução e à sua natureza, constituído por partes e à sua imagem. Para a morfologia social, o bairro é uma unidade morfológica e estrutural; é caracterizado por uma certa paisagem urbana, por um certo conteúdo social e por uma função; portanto, uma mudança num desses elementos é suficiente para alterar o limite do bairro (ROSSI, 1995 apud BARROS,2004, p.60).

Para Lamas (2004), os indivíduos de modo geral vivem em uma “continuidade ambiental, e as formas urbanas ou territoriais são constituídas pela composição de diferentes unidades espaciais e elementos morfológicos” (LAMAS, 2004, p.73). Para isso, o autor estabelece três escalas que tornam possível a apreensão das formas urbanas. A escala da rua é a menor parcela do espaço urbano e pode ser representada por uma rua ou por uma praça. Para sua compreensão não é necessário muitos movimentos ou percursos, podendo ser apreendida apenas por um pequeno deslocamento ou em circuito fechado. Acima desta, se encontra a escala do bairro onde é possível identificar a existência de uma área urbana, de uma cidade ou de parte dela. Esta escala compreende um conjunto de ruas, praças e outras escalas menores. Nela, a análise da forma necessita de movimentos e diferentes percursos.

Na escala da cidade, a forma é estruturada a partir da articulação de diversos bairros e é definida a partir da distribuição de elementos primários ou estruturantes, ou seja, do conjunto formado pelas ruas, bairros, zonas habitacionais que se articulam entre si ou com o suporte do meio geográfico onde se inserem. Conhecer a forma das cidades é um tanto quanto complexo pois necessita de movimentos mais rápidos e de percursos mais longos do que os que eram necessários nas escalas anteriormente citadas.

De acordo com Barros (2004) e Bezerra (2011) para um determinado espaço ser considerado como um bairro, faz-se necessária a análise dos seguintes critérios: extensão territorial, número de habitantes, de moradias, de quadras e de lotes. Os critérios citados acima referem-se aos bairros franceses do pós-guerra, desse modo “[...] um bairro agruparia entre 2.000 e 3.000 moradias (em torno de um centro secundário) teria uma população entre 5.000 e 10.000 habitantes; e uma extensão de 3 a 5 km de perímetro” (SOUZA, 1989 APUD BARROS, 2004, p.60).

Por ser a escala intermediária de apreensão do espaço urbano, o bairro é considerado sob o ponto de vista político-administrativo como a “dimensão de território

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ideal para a reivindicação coletiva. Essa especificidade do bairro torna-o uma unidade politicamente importante” (BARROS, 2004, p.61).

Além disso, o bairro é capaz de definir “territorialmente a base social de um ativismo, de uma organização, aglutinando grupos e por vezes classes diferentes (em níveis variáveis de acomodação ou tensão) [...]” (BARROS, 2004, p.61 e 62).

A territorialidade de um bairro está associada a uma estrutura socioespacial, onde a definição de seus limites está condicionada à critérios físicos e sociais. Os limites físicos/formais são os delimitadores da área do bairro, ou seja, é o espaço físico onde o bairro está circunscrito, podendo ser claros ou não. Já os limites sociais estão associados ao fato de que indivíduos socialmente e economicamente parecidos acabam buscando áreas similares para intervir, reforçando o caráter social e físico do espaço. A partir dos limites administrativos tem-se a identificação oficial do bairro, é a partir disso que ele é planejado e subsidiado pelo Estado. Quando bairro ou uma área menor da cidade não é reconhecida oficialmente muitas vezes acabam se tornando esquecidas pelo poder público, esse esquecimento pode gerar uma série de problemas físicos e sociais (BARROS, 2004). Os limites subjetivos são necessários pois “é a partir de sua definição coletiva que a base social se instaura, as reivindicações tomam corpo e o suporte físico o faz único” (BARROS, 2004, p.63).

Além de possuir uma forma e uma delimitação político-administrativa, o bairro possui uma história social, podendo ser interpretado como uma unidade de base da vida urbana assim como o fez o geógrafo Pierre George (1983 apud Bezerra, 2011).

Para ele, o indivíduo se refere ao bairro quando tem a intensão de situar-se na cidade, exprimindo a sensação de ultrapassar limites quando se desloca para outra área da cidade. Seguindo o mesmo raciocínio de George (1983), Silva (2016) afirma que o bairro é uma construção histórica e simbólica, caracterizada por uma conotação afetiva que é interiorizada por seus moradores. É um fator de identidade entre morador e lugar e de identificação entre os membros da comunidade. Além disso, sua construção desperta um sentimento quase “patriótico” por essa porção delimitada (SILVA, 2016, p.28).

Além das definições citadas, para Pacheco (s.d.), o bairro deverá possuir uma certa “autonomia- funcional” que não o impeça de estabelecer relações integradas com o espaço urbano total, ou seja, o bairro não deverá estar totalmente desconectado do tecido urbano, sem possuir proximidade com alguma centralidade.

O bairro ou a área central que sirva de apoio a ele deverá ser possuir

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[...] vias pavimentadas, energia elétrica e abastecimento de água de qualidade, esgoto, telefonia fixa e móvel, lojas de departamente, bancos, hotéis, serviços de utilidade pública, radiodifusão e similar, cinemas e videolocadoras, postos de gasolina, oficinas diversas, supermercados,academias, escritórios, escolas, hospitais ou postos médicos e odontológicos,clínicas médicas e estéticas, farmácias, áreas e equipamentos coletivos de lazer, mercados, feiras, restaurantes, delegacias de polícia e de direito ao consumidor, e amplo poder reivindicatório da população. Corresponderia à estrutura de uma pequena a média cidade, caso se encontrasse regionalmente disperso (PACHECO, s.d, s.p.).

Vale ressaltar que a estrutura de bairro citada acima não está presente em sua totalidade na maioria dos bairros das cidades brasileiras. Diferentemente do que se define para os bairros, no Brasil, os conjuntos habitacionais em sua maioria são construídos desconectados do tecido urbano, levando a cidade a crescer de forma espraiada pelo território. Desse modo, é comum observarmos que devido ao processo de conurbação e consolidação do tecido urbano, algumas cidades brasileiras tiveram seus bairros originados de conjuntos habitacionais, com destaque para os que foram produzidos pela política habitacional do Banco Nacional de Habitação (BNH) 28. Como exemplo do que foi dito, temos o bairro do Castelo Branco, objeto desse estudo.

O Dicionário Aurélio refere-se à conjunto residencial como sendo um: “Agrupamento organizado e ordenado de casas ou edifícios de habitação que constituem uma unidade, ou por haverem sido projetadas em conjunto ou porque formam

uma

unidade

de

vizinhança”

(DICIONÁRIO

AURÉLIO,1986

apud

MEDEIROS,2007).

Como visto anteriormente, a exceção dos conjuntos construídos pelos IAPs – que em grande parte possuíam qualidade arquitetônica e urbanística, a produção habitacional voltada para a população de menor renda, principalmente na época de atuação do BNH, foi direcionada para a implantação de conjuntos localizados nas periferias das cidades.

De acordo com Maricato (1987), geralmente esses conjuntos são construídos distantes do centro da cidade, dos locais de trabalho, de abastecimento e de serviços.

Por se localizarem distantes das áreas urbanizadas, a solução de moradia proposta pelos conjuntos habitacionais geralmente exige dos moradores um desperdício de muitas horas, para a realização de percursos muitas vezes diários e que ao somar

28

Ver item 1.1.3. que aborda as questões referentes a política habitacional produzida pelo Estado brasileiro.

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com o precário sistema de transporte coletivo disponível, torna a jornada de trabalho extremamente exaustiva.

O Estado caracteriza-se como um dos principais agentes responsáveis pela produção destes conjuntos, através de suas políticas nacionais de habitação que buscava resolver os problemas do déficit habitacional existentes nos centros urbanos, acentuados com a difusão da industrialização do país (INOUYE e SOUZA, 2004; MEDEIROS,2007).

Do ponto de vista arquitetônico, os conjuntos podem ser horizontais e verticais.

Os horizontais são formados por unidades habitacionais unifamiliares térreas, isoladas, agrupadas, geminadas ou superpostas, mas sempre em conjunto. Os verticais geralmente são compostos por um ou mais blocos de apartamentos.

Medeiros (2007, p. 31 e 32) afirma que o termo “refere-se a um aglomerado de unidades habitacionais planejadas e dispostas de forma integrada” e que geralmente são “dotadas de serviços urbanos, sistema viário, infraestrutura, áreas verdes ou livres, como também de serviços como educação, comércio, serviços assistenciais e de saúde, etc” Diante do exposto, chegamos à conclusão de que o conceito de conjunto habitacional é um tanto quanto subjetivo. Desse modo, supõe-se que os conjuntos habitacionais se caracterizam pela produção em massa de habitações, concebidos por um único agente, geralmente para a população de menor renda. Podendo estar inseridos ou não na malha urbana, mas não poderão deixar de ser dotados das condições mínimas necessárias para o desenvolvimento das atividades humanas de seus moradores.

Diferentemente dos bairros, sua definição não está ligada à divisão da cidade, os conjuntos são caracterizados pelo uso residencial e por uma população socialmente homogênea. Geralmente é possível notar uma diferença na paisagem, na tipologia, no traçado, entre os conjuntos habitacionais29 e o bairro ou a cidade onde está inserido.

29

Principalmente os que foram construídos mais recentemente e que se encontram dentro de outros bairros, como é o caso do Gervásio Maia, que estudaremos adiante.

2.

ANÁLISE COMPARATIVA

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49

A partir da definição e do entendimento do referencial teórico, sentiu-se a necessidade de estabelecer critérios para efetuar a análise comparativa dos dois conjuntos habitacionais - Castelo Branco e Gervásio Maia. Tais critérios foram de extrema importância para nortear a pesquisa, a fim de gerar conteúdo para efetuarmos a comparação dos dois conjuntos. Além disso, esses critérios foram importantes para entendermos como o Estado produziu citadino através da política de construção de conjuntos habitacionais e como este agente influenciou e influencia nas formas da cidade através dos conjuntos analisados.

Dentre os critérios estabelecidos encontram-se: • Análise do contexto histórico do período de construção do conjunto; •

Análise morfológica;

• •

Análise tipológica; Análise do porte do conjunto

•

Análise da localização da área onde o conjunto foi implantado.

• • •

Análise da infraestrutura e equipamentos; Análise da origem dos recursos financeiros; Análise dos agentes que materializaram a construção;

• • •

Análise das fases de construção dos conjuntos; Análise do público-alvo a ser atendido com a construção dos conjuntos; Análise dos aspectos sociais e econômicos.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

2.1.

ANÁLISE DO CONJUNTO HABITACIONAL CASTELO BRANCO

Brasil Paraíba

João Pessoa

Figura 01: Localização do Bairro do Castelo Branco.

Fonte: Datum Sirgas 2000 UTM 25s. Base de dados PMJP-2018. Elaborado pela autora (2018).

50

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

51

Desde a fundação da cidade de João Pessoa até a década de 1950, pode-se dizer a grosso modo, que não tinham ocorrido mudanças bruscas na paisagem e na morfologia urbana da capital paraibana. O crescimento era lento, compacto, e em torno do núcleo de origem30. No entanto, com o calçamento da Av. Epitácio Pessoa em 1952, iniciou-se um processo acelerado de espraiamento da cidade31 em direção ao Oceano Atlântico.

N

Legenda: Tecido urbano consolidado até 1960

Tecido urbano em 1960

Tecido urbano em 1970 Figura 02: Evolução urbana de João Pessoa até 1970.

Fonte: Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP). Editado pela autora, 2017.

30

Atual Centro Histórico e suas adjacências.

31

A Avenida Epitácio Pessoa foi construída com o objetivo de ligar o Centro (área central e o núcleo histórico) e a orla marítima. Desde o início de sua abertura, na década de 1910, ainda como uma estrada, a avenida tem passado por diversas mudanças em relação à sua ocupação, aos usos e a paisagem. A partir de investimentos federais, durante a década de 1960, foram instalados alguns conjuntos habitacionais em sua extensão como é o caso do 13 de Maio, Ipês e Pedro Gondim. A construção de tais conjuntos marcou a expansão urbana no sentido nordeste, fora do núcleo original da cidade, em direção à orla marítima (figura 02). (MARTINS; MAIA, 2015)

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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De acordo com os dados fornecidos pela PMJP, durante a década de 1960, aconteceu o acréscimo dos bairros localizados próximos à Av. Epitácio Pessoa, a implantação da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, o início da ocupação do Distrito Industrial, além de um maior adensamento no bairro do Cabo Branco. Enquanto que em 1970 ocorreu a implantação das duas últimas fases do Castelo Branco, o acréscimo dos bairros: Tambauzinho, Altiplano Cabo Branco, início do Portal do Sol, Cristo Redentor e Jardim Veneza (Fig.02).

A partir desse momento passaram a existir duas tendências de crescimento da malha urbana. A primeira voltada para a população de maior poder aquisitivo, que passou a ocupar a orla marítima no sentido de sul a norte. A segunda estava voltada para a ocupação da porção sudeste da cidade, através da implantação de habitações, destinadas à classe-média e à classe média baixa (LAVIERI; LAVIERI, 1999).

Com isso, a cidade passou a se desenvolver de forma rápida e fragmentada pelo território, alterando completamente a morfologia, a escala e as estratégias de produção do espaço urbano (LAVIERI; LAVIERI, 1999). Relativamente a este processo de fragmentação, o Estado teve uma grande influência. Foi a partir do financiamento de recursos federais que começaram a ocorrer as intervenções públicas que até à atualidade são consideradas de referência em termos de estruturação do crescimento urbano. Como exemplo do que foi dito, podem ser citados equipamentos urbanos como a Universidade Federal da Paraíba - UFPB (afastado da malha consolidada) e a construção de infraestrutura como a BR-230, que pela facilidade de deslocação que proporcionava, acabava indiretamente, por promover a construção em zonas menos valorizadas e mais afastadas das áreas consolidadas.

Outro fator a ter em conta na pulverização e dispersão do crescimento urbano pela paisagem, era a política habitacional que estava ocorrendo no Brasil durante os Governos Militares (1964-1985). Nessa altura, optava-se estrategicamente pela escolha de locais periféricos nas grandes e médias cidades para a produção em massa de conjuntos habitacionais.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

N

Legenda: Zona Urbana - ZU

Zona Suburbana

1- Treze de Maio

2-

Pedro Gondim

4- Castelo Branco

5- Bancários

7- José Américo

8- Costa e Silva

Zona Rural - ZR 3- João Agripino 6-

Mangabeira

Figura 03: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, Código de Obras,1971.

Fonte: CASTOR, D., 2010. Editado pela autora,2018

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O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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Consultando o Zoneamento da década de 1971, verifica-se que o mesmo fenômeno ocorreu na cidade de João Pessoa. Dividida administrativamente por três grandes zonas: Zona Urbana (ZU), Zona Suburbana (Z) e a Zona Rural (ZR), conforme se pode constatar na Figura 03, a maior parte dos conjuntos habitacionais que foram edificados no período de atuação do BNH, foram construídos fora da área urbana: Jardim 13 de Maio, Costa e Silva, João Agripino, Bancários, e o Castelo Branco, que foi o primeiro a ultrapassar o anel rodoviário e o Vale do Jaguaribe.

Mangabeira e José Américo, eram os conjuntos habitacionais mais distantes, ficando parcialmente inseridos na Zona Rural, um fato curioso que não impediu a sua edificação.

Dos conjuntos analisados, o único conjunto habitacional que estava

parcialmente inserido na zona urbana da cidade era o Pedro Gondim.

Como se pode verificar, a localização dos conjuntos habitacionais não era feita de modo aleatório. A coerência na escolha estava diretamente relacionada com questões de rentabilidade financeira, uma vez que se “incentivava a aquisição de grandes glebas de baixo valor econômico” (FUENTES, 2008, p.48). Ou seja, os conjuntos

habitacionais

eram

edificados

em

áreas

que

até

então

eram

desinteressantes ao mercado imobiliário.

Foi nesse contexto que surgiu o Conjunto Habitacional Castelo Branco32, incentivando o processo de expansão urbana no sentido sudeste (Fig.03). A primeira parte de sua construção foi inaugurada em 196833, e contava com investimentos federais provenientes do SFH. O acompanhamento e a gestão da obra estavam a cargo da Companhia Estadual de Habitação popular - CEHAP 34. O Conjunto Castelo Branco foi o primeiro a ser construído por tal órgão na Paraíba.

32

Inicialmente o Conjunto se chamaria Conjunto São Rafael, por existir no local de sua implantação uma granja de mesmo nome.

33

Ao pesquisarmos sobre as etapas de construção do bairro nos arquivos da CEHAP, encontramos que a inauguração da primeira fase do conjunto foi realizada em 7 de fevereiro de 1968.

34

De acordo com Lavieri; Lavieri (1999), a primeira fase do conjunto foi construída pela Companhia Metropolitana de Habitação – COHAB, e a segunda e a terceira pela CEHAP. Não obtivemos confirmação desses dados pela CEHAP, que além do depoimento de funcionários, apresentou fotografias da época afirmando que todas as três etapas foram construídas pelo referido órgão.

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Figura 04: Construção da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968.

Fonte: CEHAP, 1968.

Figura 05: Construção da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968.

Fonte: CEHAP, 1968.

55

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

56

Figura 06: Primeiras habitações construídas na primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco, em 1968.

Fonte: Rede Social Facebook, 2018.

Segundo informações obtidas na CEHAP, a área onde estão inseridas as duas primeiras fases de construção do conjunto habitacional foi adquirida a partir da negociação dos terrenos e da sua compra junto a proprietários privados. Já o terreno onde está localizada a terceira fase de sua implantação era de propriedade do governo estadual, que foi doado à CEHAP para a construção do conjunto.

Na primeira fase foram construídas 630 unidades habitacionais concedendo ao bairro o título de maior conjunto habitacional construído na cidade até o momento; a segunda etapa foi inaugurada em 1970 e contava com 561 habitações, e a terceira etapa em 1974 quando foram construídas mais 600 moradias (LAVIERI; LAVIERI, 1999). Além das três etapas, foram construídos dois subconjuntos de menores dimensões, um com 24 e o outro com 135 casas35.

35

Não foram encontradas informações a respeito da data de construção dos pequenos conjuntos. Além disso, esses pequenos conjuntos possuíam características tipológicas e morfológicas diferentes das demais unidades habitacionais inseridas no conjunto. Tais características serão vistas adiante.

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Figura 07: Implantação da primeira fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: PEREIRA, F. T. B., 2008.

Figura 08: Implantação da segunda fase do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: Rede Social Facebook, 2018.

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N

Legenda: Castelo Branco

1- Castelo Branco 01

Tecido Urbano

2 - Castelo Branco 02 3 - Castelo Branco 03

Figura 09: Planta das etapas de construção do Conjunto Habitacional Castelo Branco, fornecido pela CEHAP. Fonte: CEHAP, 1968. Editado pela autora, 2017.

59

‘

Figura 10: Implantação do Conjunto Habitacional Castelo Branco2.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018 2

O arquivo original encontra-se sem escala.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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Ao confrontar as informações encontradas na bibliografia consultada e na planta de implantação do conjunto, concedido pela CEHAP, com as plantas fornecidas pelo departamento de Geoprocessamento, da Secretaria de Planejamento Urbano, da PMJP, verificou-se a existência de contradições a respeito da data e das áreas onde estão localizadas as três fases de implantação do Conjunto. De acordo com as plantas da cidade fornecidas pela PMJP, as três etapas de construção do bairro foram realizadas ainda durante a década de 1960. Além disso, esta planta não fornece uma divisão precisa das etapas de construção do conjunto.

Não podemos afirmar quais informações são verídicas, sendo assim, neste trabalho, consideraremos as informações encontradas na bibliografia consultada e que foram confirmadas por funcionários e documentação fornecida pela CEHAP (Figura 09).

Relativamente à implantação do conjunto é possível observar que a forma como as quadras e os lotes estão inseridos no território por si só indicam que a construção foi realizadas em momentos distintos seguindo diferentes tipos de traçado.

Em um primeiro momento havia um traçado mais flexível e orgânico, que ainda pode ser verificado na segunda fase, enquanto que na terceira é predominante o traçado mais rígido e racional com quadrículas bem definidas (Figura 09).

Ainda em relação à implantação do conjunto, podemos constatar que a inserção dos lotes, privilegiava a topografia como o elemento dominante na sua organização. É interessante verificar que existe uma relação direta entre o tipo de construção e a topografia. A UFPB está localizada na área mais plana do conjunto, enquanto que as unidades habitacionais produzidas pelo Estado, incluindo os pequenos conjuntos, localizam-se em zonas em declive. Mais tarde, nas zonas remanescentes e de menor interesse, próximas ao leito do Rio Jaguaribe, surgiram as comunidades- São Rafael e Santa Clara, localizadas na periferia do conjunto. Devido à topografia o conjunto possui seus limites bem delimitados, ao Norte encontra-se delimitado pelo Rio Jaguaribe, à Leste pela Mata do Buraquinho, à Oeste pelo Rio Timbó e ao Sul pela BR- 230.

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Figura 11: Planta Topográfica do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: Datum Sirgas 2000 UTM 25s, 2018.

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N

Quanto a dimensão, os conjuntos construídos eram classificados em pequeno, médio e grande porte. Os de pequeno porte possuíam até 500 habitações, enquanto que os de médio porte tinham entre 500 a 1000 casas e os de grande porte caracterizavam-se por possuir acima de 1000 unidades (VIEIRA,2002 apud VALE,2012). Segundo esses critérios de classificação, o Conjunto Habitacional do Castelo Branco caracteriza-se como um conjunto de grande porte, uma vez que após a conclusão das três etapas de construção possuía 1950 unidades habitacionais36.

Relativamente ao projeto das unidades habitacionais, este era feito pela equipe técnica da CEHAP (segundo informações coletadas junto aos funcionários do órgão), que por sua vez terceirizava a execução da obra 37. Os recursos financeiros para a elaboração do projeto e para a execução da obra eram provenientes do SFH e cabia a CEHAP o seu gerenciamento.

Quanto ao projeto e à execução da infraestrutura e dos equipamentos coletivos, eram de responsabilidade do poder local e do poder estadual uma vez que de acordo 36

Esse resultado é referente à soma das três etapas de construção do conjunto juntamente com os dois subconjuntos localizados dentro do perímetro do Castelo Branco.

37

Não foram encontradas informações a respeito da(s) empresa(s) que realizava(m) a execução dos projetos habitacionais na época de construção do conjunto.

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com Vale (2012), o Estado atribuía às instituições habitacionais da época38 apenas a responsabilidade de construir as unidades habitacionais. Enquanto que a elaboração e a execução da infraestrutura e dos equipamentos coletivos eram de responsabilidade do poder local e do poder estadual.

Figura 12: População atenta aos discursos das autoridades no evento realizado para entrega das habitações, ao fundo é possível observar as tipologias construídas, além dos postes de iluminação e da falta de calçamento nas ruas.

Fonte: CEHAP, 1968.

No caso específico do Castelo Branco, segundo os moradores mais antigos do bairro, quando inaugurado, só foram entregues as unidades habitacionais. Os equipamentos39 que estavam previstos no projeto, assim como toda a rede de infraestrutura40 – exceto rede elétrica e a rede de iluminação pública, foram 38

CEHAP, COHAB, IPASE, IPEP, INOCOOPs.

39

De acordo com a planta urbanística do Castelo Branco, inicialmente estava previsto para o bairro a instalação de um mercado público, um grupo escolar, um posto policial, um ginásio polivalente, um centro comunal, uma comunidade social, uma escola, uma igreja e 04 praças, e 15 áreas verdes.

40

Pavimentação das vias, rede de abastecimento de água, rede de esgoto, calçadas.

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construídas posteriormente à entrega da primeira fase. Por não possuir uma rede de abastecimento, a água chegava ao conjunto por meio de caminhões-pipa que abasteciam caixas d’águas que eram localizadas em pontos estratégicos do conjunto.

Por sua vez os moradores tinham que se deslocar até essas caixas d’águas para ter acesso a água potável. Tal estratégia (ou falta dela) iria criar uma série de problemas em relação à qualidade do espaço urbano, uma situação visível até os dias de hoje.

Quando se questionou os moradores mais antigos 41 sobre o problema da falta de infraestrutura e equipamentos no momento da entrega da primeira fase do conjunto, uma das reclamações mais recorrentes, era a inexistência de transporte coletivo devido à ligação precária do bairro às zonas consolidadas da cidade. Essa prática de entrega de habitações sem a existência de infraestrutura básica e de equipamentos, era considerada normal, um fato confirmado por Cavalcanti (1999, apud BONATES, 2009), que afirma que nos conjuntos habitacionais construídos em João Pessoa nessa época, era comum a ausência e/ou a precariedade de infraestrutura básica, citando exemplos como o da falta de pavimentação, saneamento básico, serviço de abastecimento de água e transporte coletivo.

Quanto ao acesso a bens e serviços de primeira necessidade, estava projetada a implantação de um mercado para dar suporte aos moradores do novo conjunto, no entanto, este equipamento só seria construído em 1972, após a entrega da segunda fase do conjunto, obrigando os primeiros moradores a percorrer longas distâncias para ter acesso a este tipo de serviço.

Atualmente podemos encontrar os seguintes equipamentos: Unidade de Saúde Castelo Branco – USF, Mercado Público, Posto Policial, Escolas, Ginásio Esportivo, Centro de Recreação Infantil, Associação de Moradores do Castelo Branco, Secretaria de Estado da Juventude, Esporte e Lazer; que estão localizados dentro do perímetro interno do conjunto

Foram entrevistados os seguintes moradores: Lindenberg – atual presidente da Associação de Moradores do bairro, Prof. Parreira e o Antônio Carlos Barbosa, que residem no Castelo Branco desde o início de sua construção.

41

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Figura 13: Mercado Público do Castelo Branco.

Fonte: Maykhow Douglas Silva, 2018.

Figura 14: Posto Policial no Castelo Branco.

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Figura 15: Associação de moradores do Castelo Branco.

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

64

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

65

Apesar de todos os problemas associados ao surgimento do conjunto habitacional, o Castelo Branco desempenhou um papel importante na política oficial de resolução da falta de habitação.

Segundo Lavieri; Lavieri (1999), o conjunto teria sido construído com o intuito de se proceder à remoção de favelas localizadas na cidade de João Pessoa, concretamente, para abrigar parte da população que foi deslocada das áreas onde atualmente está localizada a Av. Beira Rio. No entanto, tais informações entram em direta contradição com o que foi dito pelos funcionários da CEHAP, que afirmam que o público alvo do conjunto era qualquer pessoa que realizasse inscrição no órgão e que tivesse renda entre 0 a 3 salários mínimos. No ato da inscrição os futuros beneficiários deveriam informar além da renda a quantidade de pessoas que compunha sua família, para que pudesse ser definida a tipologia adequada. A escolha dos beneficiários era realizada através de sorteios.

Figura 16: Sorteio das tipologias habitacionais do conjunto Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968.

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Em relação ao modelo urbanístico adotados, os conjuntos habitacionais construídos pelo BNH caracterizavam-se pela exaustiva repetição de “casas unifamiliares, que eram construídas em lotes individuais e casa unifamiliares em fita construídas nos limites do lote” 42 (VALE,2012, p.27).

Para o Conjunto Habitacional Castelo Branco, foram projetadas três tipologias de habitação – PB tipo 4, PB tipo 2.37, PB tipo 3.39. As habitações PB tipo 4 possuíam um quarto, uma sala, uma cozinha, um w.c. e uma pequena área de serviço externa, distribuídos em uma área de 23,95 metros quadrados. As habitações PB tipo 2.37 tinham dois quartos, uma sala, uma cozinha, um w.c. e uma pequena área de serviço externa, distribuídos em uma área de 35,84 metros quadrados. Já as habitações PB tipo 3.39 contam com três quartos, uma sala, uma cozinha, um w.c. e uma pequena área de serviço externa, em uma área de 36,69 metros quadrados. A diferença entre as três tipologias adotadas para o conjunto basicamente está na quantidade de quartos.

De acordo com funcionários da CEHAP e com antigos moradores do bairro, as unidades habitacionais que possuíam apenas um quarto não foram executadas, em seu lugar foram implantadas casas de quatro quartos, que eram destinadas a famílias com uma grande quantidade de filhos. Essas casas possuíam quatro quartos, uma sala, uma cozinha, um w.c. e uma pequena área de serviço externa à edificação, assim como as outras tipologias. Não nos foi fornecido o projeto dessa tipologia, desse modo para realização da análise tipológica, utilizaremos os dados que nos foram fornecidos pela CEHAP, ou seja, as três tipologias anteriormente citadas- PB 04, PB 02 e PB 03. O projeto previa a construção de 141 casas do tipo PB 443, 1181 PB 2.37 e 469 do tipo PB 3.39.

42

Tal modelo urbanístico continua a ser reproduzido nos dias atuais, como veremos adiante.

43

Foram substituídas pela tipologia de quatro quartos.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

Figura 17: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04.

Fonte: CEHAP, 1968

Tipo: PB 04 – 141 unidades habitacionais CÔMODO

ÁREA

Sala

8,80 m²

Cozinha

4,94 m²

Quarto

6,00 m²

W.C.

1,90 m²

Área Útil Total de área construída da tipologia PB-04 Tabela 02: Área das unidades habitacionais tipo PB 04.

Fonte: CEHAP,1968. Elaborado pela autora, 2018.

21,64 m² 3.051,24 m²

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O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

Figura 18: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04.

Fonte: CEHAP, 1968.

Tipo: PB 02 – 1.181 unidades habitacionais CÔMODO

ÁREA

Sala

12,80 m²

Cozinha

3,84 m²

Quarto 01

7,68 m²

Quarto 02

7,68 m²

W.C.

3,84 m²

Área Útil Total de área construída da tipologia PB- 02 Tabela 03: Área das unidades habitacionais tipo PB 02.

Fonte: CEHAP,1968. Elaborado pela autora, 2018.

35,84 m² 42.327,04 m²

68

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

Figura 19: Planta baixa da unidade habitacional tipo PB- 04.

Fonte: CEHAP, 1968.

Tipo: PB 03- 469 unidades habitacionais CÔMODO

ÁREA

Sala

10,83 m²

Cozinha

3,23 m²

Quarto 01

6,70 m²

Quarto 02

6,70 m²

Quarto 03

6,70 m²

W.C.

2,30 m²

Área Útil Total de área construída da tipologia PB- 03 Tabela 04: Área das unidades habitacionais tipo PB 03.

Fonte: CEHAP,1968. Elaborado pela autora, 2018.

36,46 m² 17.099,74 m²

69

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Figura 20: Cortes e Fachada Tipo das unidades habitacionais do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968.

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Figura 21: Maquete física de habitação proposto pela CEHAP para o Castelo Branco em desfile pelas ruas da cidade de João Pessoa.

Fonte: CEHAP, 2018.

De acordo com o projeto, as casas de dois quartos eram geminadas de um lado, enquanto que as de um e três quartos se encontravam soltas no lote. Não estava previsto no projeto a possibilidade de expansão para nenhuma das habitações. Devido ao desenho urbano proposto para o conjunto, nota-se que as medidas dos lotes possuem algumas variações, porém as medidas padrão são de 10 x 20 metros.

Figura 22: Planta de locação e coberta esquemática, tipo PB 04, PB 02, PB 03.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018.

As casas geminadas possuíam recuo frontal de 4,75 metros, recuo em uma das laterais de 4,40 metros e recuo de fundo de 8,85 metros. As casas de um quarto por

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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estarem soltas no lote, possuíam recuo frontal de 4,00 metros, recuo lateral de 2,50 metros e recuo de fundo de 9,95 metros. Já as casas de três quartos, também estavam soltas no lote e possuíam os seguintes recuos: frontal de 4,85 metros lateral de 1,25 e 1,20 metros e de fundos 9,45 metros.

Em relação aos subconjuntos, estes eram destinados a um público de maior poder aquisitivo, geralmente funcionários públicos, e por este motivo apresentavam características distintas, como o tamanho dos lotes e tipologias habitacionais, em relação ao conjunto como um todo. Nos pequenos conjuntos os lotes mediam 14 x 28 metros, e as tipologias apresentavam maiores dimensões e melhores materiais construtivos44.

Ainda segundo os moradores mais antigos do bairro, quando entregues, as habitações possuíam as seguintes características: paredes em alvenaria, pintura à cal, piso em cimento, cobertura em telha cerâmica sobre madeiramento. O pé direito das unidades habitacionais variava de acordo com sua tipologia, as casas que possuíam apenas um quarto tinham pé direito de 2,40 metros, enquanto que as unidades do tipo PB 02 e PB 03, tinham pé direito de 2,60 metros. Em relação às esquadrias, de acordo com o projeto as portas (internas e externas) eram de madeira 45 e as janelas também possuíam o mesmo material. Porém de acordo com os moradores antigos do bairro, algumas casas possuíam janelas do tipo basculante.

Nesse sentido pode-se afirmar que as casas construídas pelo Estado46 eram de pequenas dimensões e constituídas por materiais de fraca qualidade ou de segunda linha (BONATES,2009; VALE,2012). Na prática não correspondiam minimamente às expectativas e às necessidades da população. Tais características ajudam a explicar o alto índice de construção informal que surgiu após a sua entrega, e explicam a intensiva descaracterização tipológica a que ficou sujeito o conjunto durante as últimas décadas, inviabilizando qualquer tentativa de realizar uma análise tipológica através das visitas efetuadas in loco.

44

Tais informações nos foram fornecidas por moradores antigos do bairro, funcionários da CEHAP e foram comprovadas através de visitas in loco.

45

Não foi especificado se eram de madeira maciça ou não. Os moradores também não souberam responder tal questão.

46

Tais dados referem-se as tipologias PB 02, PB 03 e PB 04, não podemos afirmar o mesmo em relação aos subconjuntos visto que não foram encontradas informações suficientes que comprovassem tais afirmações.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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Figura 23: Vista aérea do conjunto habitacional Castelo Branco, com foco nas primeiras quadras da primeira fase do conjunto.

Fonte: PMJP, 2008.

Figura 24: Vista aérea do conjunto habitacional Castelo Branco, com foco nas quadras próximas ao mercado municipal.

Fonte: PMJP, 2008.

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Comparando a tipologia original com a realidade atual, as habitações na sua maioria sofreram grandes alterações, e em muitos casos é impossível observar vestígios da tipologia que originalmente foi entregue. Dentre as alterações que mais se destacam, podemos observar a construção de muros, a ampliação da área construída para abrigar terraços e outros cômodos - muitas vezes sem respeitar os recuos, construção em altura através da implantação de vários pavimentos, construção de outras habitações dentro de um único lote, acréscimo de áreas cobertas dentro dos recuos destinadas a garagens, mudanças nos revestimentos, entre outras.

Além disso, muitas casas transformaram-se em comércios e em alguns casos suas fachadas encontram-se parcialmente ou totalmente cobertas por placas e letreiros.

Estas alterações tornam-se extremamente visíveis a partir da análise dos cheios e vazios, onde podemos observar que em sua ocupação original, apenas 9% da área total do conjunto era destinada ao uso habitacional. Para análise da situação atual elegemos 01 quadra para analisarmos a descaracterização ocorrida. Ao considerarmos como original a planta com a localização das tipologias a serem construídas no conjunto, fornecida pela CEHAP, sabíamos que seriam encontradas divergências, pois na planta consideram como construídas as tipologias PB 04 – 01 quarto. Porém através da visita in loco e de fotografias via satélite vimos que o que foi construídos não seguiu rigorosamente o que estava estabelecido no projeto. Não sabemos se houve uma nova versão da planta que nos foi cedida pela CEHAP, ou se no momento da execução o projeto foi ignorado.

De acordo com a planta do conjunto fornecida pela CEHAP e com o gráfico 01, inicialmente a maior área do Castelo Branco era composta pelos vazios públicos, ou seja, pelas vias, calçadas praças e áreas verdes. As residências só ocupavam cerca de 9% da área total do conjunto enquanto que a menor porcentagem era destinada aos equipamentos que viriam a ser implantados no decorrer do tempo. Os vazios privados são compostos correspondem a 41% do conjunto e correspondem as áreas dos lotes que não foram ocupadas pela habitação e que posteriormente daria lugar as áreas acrescentadas.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

2%

75

9%

Vazio Público - 344.025,83 m² 48%

41%

Vazio Privado - 295.288,40 m² Institucional -

10.333,32 m²

Residencial -

62.911,60 m²

Gráfico 01: Porcentagem de cheios e vazios da ocupação original do conjunto Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018.

A partir da análise da quadra na situação atual, é possível observar no gráfico 02 que a maior área ocupada da quadra corresponde as áreas construídas pelos moradores ao longo dos anos - 45%. A menor ocupação corresponde a área ocupada pelas habitações em seu estado original – 24%. Apesar dos vazios corresponderem a uma área considerável da quadra é perceptível o alto grau de impermeabilização que ocorreu no decorrer dos anos.

24% 31% Ocupação Original - 1.914,30 Acréscimos

- 3.607,74

Vazio

- 2.477,96

45%

Gráfico 02: Porcentagem de cheios e vazios atual do conjunto Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018.

76

Legenda:

Cheios

Vazios

Perímetro Analisado

Figura 25: Cheios e Vazios Ocupação Inicial do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018

Quadra Analisada

77

Figura 26: Cheios e Vazios atual do Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: CEHAP, 1968. Elaborado pela autora, 2018.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

78

Além das alterações tipológicas, ao longo do tempo os moradores passaram a se apropriar de áreas destinadas a praças e áreas verdes do conjunto. Assim como os demais equipamentos, as praças e áreas verdes foram construídas ao longo do tempo. No momento da entrega das unidades habitacionais só existiam os espaços vazios, com placas sinalizando o uso que aquele espaço deveria ter no futuro. 47 Por se tratarem de espaços vazios e pela falta de fiscalização por parte do Estado, a população passou a construir dentro dos limites dessas praças, que foram descaracterizadas pelo novo uso, sendo em alguns casos impossível perceber que naquele espaço estava previsto a construção de uma praça. A exemplo disso, tem-se a praça Alves de Souza, parte da Praça Abdon Milanez48 e duas áreas verdes49. No projeto também estava previsto a implantação de um Centro Comunal, localizado na Av. Presidente Castelo Branco, e que atualmente funciona a Secretaria de Estado da Juventude, Esporte e Lazer.

Figura 27: Praça Abdon Milanez, à esquerda situação proposta no projeto e a à direita situação atual, com a ocupação por unidades habitacional de parte de sua área.

Fonte: CEHAP, 2018/ Google Earth, 2018.

47

Atualmente alguns desses espaços ainda encontram-se vazios, sem nenhum tipo de uso e sem nenhum tratamento paisagístico, ou seja, não cumprem a função a que foram destinados inicialmente.

48 49

Por trás do Mercado Público do Castelo Branco.

A primeira localizada no Castelo Branco II, na Rua Hermenegildo de Almeida e a segunda localizada em um dos pequenos conjuntos, no Castelo Branco III, na Rua José Serrano Navarro.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

79

Devido ao processo de crescimento da cidade, atualmente o conjunto, ora citado, conurbou-se com o tecido consolidado, sendo na atualidade um bairro em termos funcionais completamente integrado50 ao resto da malha urbana, fazendo parte dos 64 bairros que compõem a cidade. O mesmo fenômeno de conurbação ainda não aconteceu nos conjuntos habitacionais que foram produzidos na última década pelo poder público, como exemplo do que foi dito temos o Gervásio Maia, o conjunto habitacional que será analisado no tópico 2.2.

Quanto a sua relação espacial, o bairro do Castelo Branco faz fronteira com os bairros de: Tambauzinho e Miramar a Norte, Bancários a Sul, Altiplano Cabo Branco a Leste, e com a Mata do Buraquinho a Oeste. A sua extensão territorial é de cerca de 3,70 Km² e segundo dados do Censo Demográfico de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o apresenta uma população de 11.642 habitantes, distribuídos em 3.655 domicílios, correspondendo a cerca de 1,609% da população total da cidade, sendo a sua densidade demográfica de aproximadamente 3.146,48 hab/km². De acordo com o Censo Demográfico do IBGE de 2000 51, cerca de 79,4% das unidades habitacionais possuíam rede de esgotamento sanitário.

Em relação à faixa etária da população cerca de 28% dos moradores possuíam em 2010, quando foi realizado o último Censo Demográfico do IBGE, idade superior a 45 anos, ou seja, essa parcela da população é formada por pessoas que residem no bairro desde a sua construção. Ainda segundo o Censo, cerca de 38% da população residente no Castelo Branco é formada por jovens com faixa etária entre 15 e 34 anos, supõe-se que a presença destes seja justificada pelo fácil acesso à Universidade Federal da Paraíba, localizada dentro do perímetro do bairro.

50

Essa integração não acontece em relação ao tecido urbano, visto que devido a topografia da área o bairro possui seus limites bem delimitados.

51

Foram utilizados os dados do Censo Demográfico de 2000 por até o final dessa pesquisa não ter sido encontrados estes mesmos dados no Censo Demográfico de 2010.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

80

De 0 à 14 anos 6%

4%

De 15 à 24 anos

19%

7%

De 25 à 34 anos De 35 à 44 anos

11% 20%

De 45 à 54 anos De 55 à 64 anos

15%

De 65 à 74 anos

18%

Acima de 75 anos

Gráfico 03: Idade populacional do bairro Castelo Branco.

Fonte: IBGE, 2010. Editado pela autora.

Em relação à renda mensal do chefe familiar em 2000, quando foi realizado o penúltimo Censo Demográfico do IBGE, cerca de 31% dos moradores recebiam entre 1 a 3 salários mínimos. Aproximadamente 42% dos moradores do bairro possuem rendimentos superiores a 3 salários mínimos. Nota-se, portanto, que em termos de rendimentos mensais houve uma evolução no perfil econômico dos moradores ao longo do tempo.

6%

5% Sem Renda ( 588 moradores)

20%

22%

Até 1 s.m. (2.432 moradores) De 1 à 3 s.m. (3.470 moradores) De 3 à 5 s.m. (1.752 moradores) De 5 à 10 s.m. (2.190 moradores)

16%

Acima de 10 s.m. (678 moradores) 31%

Gráfico 04: Renda Nominal Mensal do Chefe do Domicílio do bairro Castelo Branco.

Fonte: IBGE, 2000. Editado pela autora.

Em relação à arborização, o projeto urbanístico do Castelo Branco previa a construção de 05 praças e 15 áreas verdes. Com o passar dos anos, por continuarem vazias e sem uso algumas praças e áreas verdes foram ocupadas. Atualmente a maior parte das árvores estão localizadas nas praças, nas áreas verdes e nos

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81

canteiros centrais. Não houve um planejamento paisagístico para o bairro e parte das árvores existentes na atualidade foram plantadas pelos próprios moradores ao longo dos anos.

Uma das práticas utilizadas pelo Estado para intervir no espaço público é através de Leis e Regulamentos, que objetivam o controle do Uso e a Ocupação do Solo. No caso do Castelo Branco, o Zoneamento atual, divide o bairro em cinco zonas: Zona Residencial 2- ZR2, pela Zona Comercial de Bairro- ZB, pelo Setor de Amenização Ambiental- SAA, pela Zona Especial de Preservação 2- ZEP2 e pela Zona de Grandes Equipamentos - ZGE – onde está localizada a UFPB (Figura 28).

De acordo com o Mapa de Uso e Ocupação elaborado para este trabalho podemos verificar que na prática os usos que acontecem no bairro não são muito diferentes dos usos estabelecidos pelo Estado. Em sua maioria o Castelo Branco é residencial, com a incidência de pequenos comércios localizados em algumas casas, que passaram por intervenções arquitetônicas para abrigar o novo uso, e em alguns casos esses comércios estão localizados na própria residência do proprietário, caracterizando o uso misto.

Figura 28: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, com ênfase no zoneamento do Castelo Branco.

Fonte: Secretaria de Planejamento, desenvolvimento urbano e meio ambiente, PMJP, 2007. Editado pela autora,2018.

82

Legenda:

Residencial

Institucional

Comercial

Misto

Áreas vazias

Praças e Áreas Verdes

Figura 28: Uso e Ocupação real Conjunto Habitacional Castelo Branco.

Fonte: Datum Sirgas 2000 UTM 25s. Base de dados PMJP-2018. Elaborado por RIBEIRO, A. et. al, 2018 1. Editado pela autora, 2018.

1

Mapa de uso e ocupação elaborado pelos alunos Amália Helena Ribeiro, Felipe Andrade, José Matheus Moura e Rafaela Carvalho para a disciplina de Projeto Urbano e Ambiental I do curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

83

O Castelo Branco possui uma malha densa. O atual Macrozoneamento estabelece que a área onde o bairro está localizado é de adensamento prioritário, ou seja, o índice de aproveitamento do solo no Castelo Branco é 4, o que significa dizer que no Castelo Branco é possível construir até 4 vezes a área do terreno. Em alguns casos este índice funciona como um estímulo à especulação imobiliária visto que, os terrenos ficam mais atrativos para os promotores imobiliários que pretendem obter grandes lucros através da verticalização do solo. Apesar disso, no Castelo Branco o índice de verticalização ainda é bastante baixo ao compararmos com outros bairros da cidade, a exemplo dos Bancários.

No momento de construção do conjunto não existia nenhuma comunidade dentro de seus limites, as comunidades que existem atualmente – São Rafael e Santa Clara - surgiram depois que o conjunto já havia sido construído, nas áreas remanescentes, próximo ao leito do Rio Jaguaribe. Quando o conjunto foi construído já haviam pessoas ocupando essas áreas próximas ao rio, porém, não era considerada uma comunidade por se tratar de ocupações dispersas. Em relação à implantação dessas comunidades nota-se que surgiram de forma desordenada, sem possuir nenhum planejamento (CEHAP, 2018).

De acordo com o Censo Demográfico do IBGE, em 2000 havia um total 695 domicílios localizados nestas comunidades, onde 350 pertenciam a comunidade Santa Clara e 345 a comunidade São Rafael.

A população residente nesses

aglomerados era de aproximadamente 3.550 pessoas, dentre elas aproximadamente 1.800 residiam na comunidade São Rafael e 1750 na comunidade Santa Clara.

Quando o conjunto foi construído a legislação incidente na cidade não permitia que fossem construídas unidades habitacionais muito próximas à área de preservação permanente do Rio Jaguaribe, desse modo, com o intuito de rentabilizar financeiramente ainda mais o solo, tais áreas foram loteadas como pequenas granjas53.

53

Segundo informações de funcionários da CEHAP foram loteadas e vendidas 21 granjas, algumas delas já foram regularizadas e outras estão prestes a ser. Atualmente tal medida não poderia ser tomada devido ao aumento das restrições dos órgãos ambientais.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

2.2.

ANÁLISE DO CONJUNTO HABITACIONAL GERVÁSIO MAIA

João Pessoa

Gramame

Figura 30: Localização do Conjunto Habitacional Gervásio Maia .

Fonte: Datum Sirgas 2000 UTM 25s. Base de dados PMJP-2018. Elaborado pela autora (2018).

84

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

85

No decorrer do trabalho foi visto que o processo de produção habitacional por parte do Estado acontece de forma centralizada nos governos ditatoriais (Estado Novo, Ditadura Militar) e que a partir da abertura à democracia passa a acontecer de forma descentralizada (período pós- BNH). Também foi visto que com a Constituição Federal de 1988, a responsabilidade de produzir habitações passa a ser das três esferas de poder – União, estados e municípios. A partir desse momento, tanto os estados quanto os municípios passam a criar programas de acesso à casa própria para a população de menor renda. Apesar da criação de programas habitacionais por parte das três esferas, houve uma diminuição no ritmo de produção dos conjuntos habitacionais por parte do Estado, aumentando o déficit habitacional do país. Neste período houve uma maior construção de favelas e outros padrões de moradias precárias. De acordo com Lima (2010) em 2006, 18,76% da população pessoense não tinha acesso à moradia digna, havia a necessidade tanto de novas moradias quanto de melhoria das existentes.

Essa realidade começou a ser mudada após a aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001, quando as ações do Estado passaram a priorizar os aglomerados subnormais e as questões relacionadas à irregularidade fundiária. Desse modo, passaram a ser elaborados programas que tinham como objetivo a relocação de pessoas residentes em favelas para os conjuntos habitacionais que seriam criados.

Entre 2002 e 2010, foram elaborados, a nível nacional, um número expressivo de programas habitacionais destinados ao público de baixa renda, que em sua maioria eram gerenciados pelo Sistema Nacional de Habitação - SNH e pelo Fundo Nacional da Habitação de Interesse Social - FNHIS. A nível estadual, o principal órgão responsável por criar e pôr em prática os programas habitacionais já existentes é a CEHAP, que atua nesse mercado desde os anos de 1960, quando o BNH ainda existia. A nível municipal, a elaboração e a implementação dos programas habitacionais e a regularização fundiária é coordenada pela SEMHAB, criada em 2006 com intuito de suprir a demanda existente de moradias. Ao tentar suprir tal demanda, desde o momento de sua criação até os dias atuais a SEMHAB construiu cerca de 40 conjuntos habitacionais dentre os quais encontram-se: o Gervásio Maia, o Residencial Monte Cassino, o Terra do Nunca, o Residencial Sérgio Queiroz, o Residencial Araçá, entre outros. Assim como o Conjunto Habitacional Gervásio Maia - CHGM, estes

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conjuntos eram destinados a trabalhadores de baixa renda e que moravam em aglomerados subnormais54 e/ou em áreas de risco (SEMHAB, 2018).

Figura 31: Foto panorâmica do CHGM em 2009.

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação- PMJP, 2018.

O CHGM é fruto da política habitacional nacional anteriormente citada, que foi realizada durante o segundo mandato do Governo Lula (2007-2011) em parceria com a Prefeitura Municipal de João Pessoa. Quando construído, foi considerado pelo Ministério das Cidades como um dos melhores conjuntos habitacionais populares do país, devido a infraestrutura que estava prevista para ser implantada no conjunto55.

Além disso, este conjunto obteve grande notoriedade na cidade devido a sua dimensão e pelos equipamentos que estavam previstos para ser construídos dentro de seus limites. O principal objetivo de sua construção foi a remoção de 959 famílias

54

Conjunto constituído por no mínimo 51 habitações, onde os moradores não possuem o título de propriedade do imóvel e pelo menos uma das seguintes características: irregularidade das vias de circulação, tamanho e/ou forma dos lotes; e/ou ausência ou deficiência de infraestrutura básica (coleta de lixo, rede de esgoto, abastecimento de água, energia elétrica e iluminação pública). Este termo passou a ser utilizado pelo IBGE, a partir do Censo de 2010, para se referir a áreas conhecidas ao longo do país por diversas nomenclaturas, como favela, comunidade, vila, mocambo, entre outros.

(IBGE, 2010) 55

Informações a respeito da infraestrutura implantada no conjunto serão vistas adiante.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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que residiam em favelas e em habitações irregulares 56 e trazê-los para a legalidade fundiária. Porém fornecer moradia não foi suficiente para resolver o problema de exclusão social e segregação socioespacial, imposta pelo mercado, que atinge essa parcela da população pessoense (MAIA, 2014).

Ao tomarmos como exemplo a cidade de João Pessoa, vimos de forma bastante clara que através das ações do mercado imobiliário a população mais pobre passa a ser cada vez mais excluída do tecido urbano consolidado da capital, restandolhes apenas as terras distantes da área central e que em alguns casos não fazem parte da área urbana. A implantação dos conjuntos habitacionais, desde a época de atuação do BNH, privilegia as regiões sul e sudeste.

O CHGM está localizado no bairro de Gramame, na região Sudoeste de João Pessoa – nomeada popularmente de “cidades dos conjuntos habitacionais”. A cidade ganhou este título devido à quantidade de conjuntos implantados em sua periferia, entre o final da década de 1960 a 1980, estimulando assim a expansão da cidade em direção sul. Esse processo iniciou-se a partir da construção de conjuntos localizados na porção sul- sudeste da cidade a exemplo do Conjunto Castelo Branco (em três fases: 1968, 1970, 1974), do Conjunto dos Bancários (1980), do Conjunto Mangabeira (em oito etapas, sendo a primeira em 1983 e a oitava em 1998), e pelo Conjunto Valentina Figueiredo (1985). Na zona sul- sudoeste, foram implantados os conjuntos Costa e Silva (1971), o Ernani Sátyro (1977), o José Américo (1978), o Ernesto Geisel (1978), o Cristo Redentor (1981) e o Bairro das Indústrias (1983), posteriormente em 2006, foi construído o conjunto Gervásio Maia (MAIA,2014).

O conjunto habitacional Gervásio Maia caracteriza-se como um conjunto de grande porte por possuir acima de 1.000 unidades habitacionais. Para construir um empreendimento deste porte seria necessária uma área de grandes dimensões, por 56

De acordo com Leite (2011), foram removidas as seguintes comunidades: 17 famílias da comunidade Cibrazem, localizada na Ilha do Bispo; 99 famílias que moravam no Prédio do INSS, no Centro; 26 famílias que moravam no Prédio do Matadouro, nas Trincheiras; 09 famílias do Distrito Mecânico (Trincheiras), 20 famílias do Prédio da LBA, em Cruz das Armas; 22 famílias da comunidade Titanic, no Bessa; 08 famílias da Fábrica de Gelo, no Varadouro; 20 famílias da comunidade Asa Branca, no Róger; 208 famílias do Acampamento Jorge Luis, em Valentina; 30 famílias do Acampamento Vila Vitória, no Bairro dos Novais; 35 famílias do Acampamento Pedro Teixeira, no Bairro das Indústrias; 25 famílias do Acampamento Chico Mendes, no Bairro das Indústrias; 25 famílias do Acampamento Margarida Maria Alves, no Bairro das Indústrias; 73 famílias do Acampamento Monte das Oliveiras, no Cristo e 108 famílias do Acampamento 19 de Maio, no Alto do Mateus. Além dessas famílias também foram beneficiadas algumas que recebiam auxílio moradia, dentre as quais se encontram: 25 que residiam em vários bairros e que foram relocadas através da Defesa Civil; 48 do Condomínio Cristo; 39 do Condomínio Vitória; 53 famílias de agentes da Autarquia Especial Municipal de Limpeza Urbana (Emlur) e 35 do Balcão de Direitos 7.

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88

se tratar de um conjunto habitacional voltado para a população de baixa renda, o preço da terra deveria ser o menor custo a se ter no processo de construção do empreendimento.

A construção do Residencial Gervásio Maia teve início em 06 de março de 2006 e inicialmente se chamaria Loteamento Parque Sul, porém após o falecimento do antigo secretário de Finanças do município, passou a chamar-se Residencial Gervásio Maia57. Os acessos ao conjunto acontecem pelo bairro Costa e Silva à Oeste, pelo bairro do Grotão ao Norte e pelo bairro Valentina Figueiredo à Sudeste.

A área onde está localizado o conjunto possui topografia relativamente plana, possuindo poucos declives. Ao analisarmos este aspecto não encontramos nenhuma relação entre a implantação das unidades habitacionais e a topografia.

De acordo com o projeto, o CHGM conta com 1.336 unidades habitacionais e 09 lotes comerciais, totalizando 1.345 edificações, distribuídas em uma área de aproximadamente 0,3 km². De acordo com informações coletadas na SEMHAB, as edificações destinadas à comércios não foram executadas, e os espaços foram deixados sem uso58.

O fornecimento da rede de infraestrutura do conjunto -

saneamento básico, abastecimento de água, pavimentação das principais vias veiculares, energia elétrica e telefone – é de responsabilidade da Prefeitura Municipal de João Pessoa. Além disso, o projeto do conjunto prevê uma série de equipamentos para dar suporte à população como uma creche, uma escola, um posto de saúde, uma praça e um ginásio de esportes coberto (LEITE, 2011; MAIA,2014).

Segundo Leite (2011) a infraestrutura e os equipamentos implantados no Gervásio Maia foi uma estratégia utilizada pelo Estado para minimizar o problema relacionado à localização do conjunto. Apesar da tentativa, “a infraestrutura não solucionou o problema da pobreza local, do desemprego e nem valorizou o preço da terra” (LEITE, 2011, P.60).

57

De acordo com Leite (2011) no momento da entrega das primeiras unidades habitacionais em 2007, o loteamento possuía o nome de Loteamento Colinas do Sul, a nomenclatura do conjunto só foi mudada após a entrega de todas as unidades habitacionais, passando a se chamar Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

58

Os funcionários da SEMHAB não souberam nos informar o motivo das edificações comerciais não terem sido executadas.

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N

Legenda: 1 USF 2 Escola 3 CREI

4 Praça Esperança 5 “Gervasão” 6 Cozinha Comunitária

7 Centro de Cultura 8 Terminal de Integração

Figura 32: Implantação do Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Editado pela autora, 2018.

89

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90

Ainda segundo a autora, na maioria das grandes cidades brasileiras, assim como em João Pessoa, existe uma relação entre a distribuição da localização das zonas residenciais e a condição social dos indivíduos, ou seja, fatores como renda, status profissional, nível de instrução influenciam diretamente na localização da moradia dos indivíduos. A melhor localização – aquelas próximas ao Centro, dentro da área urbana da cidade, com maior acesso à infraestrutura e equipamentos, são destinadas a quem pode pagar pelo valor do solo. Para a parcela da população que não pode, só restam as áreas distantes, segregadas da malha urbana. “A estratificação social, nesse caso, ainda corresponde à estratificação urbana, cuja distância social se expressa, especialmente, através da segregação urbana” (LEITE, 2011).

Para sua construção a obra contou com recursos provenientes da Prefeitura Municipal de João Pessoa - Poder Local – que doou o terreno e se responsabilizou em oferecer a infraestrutura básica necessária à implantação do conjunto (abastecimento de água, energia elétrica, rede de esgoto, pavimentação de quatro vias principais e a construção de equipamentos coletivos), totalizando cerca de 36% do valor total destinado à construção do conjunto. E com recursos do Estado, por meio da Caixa Econômica Federal que investiu cerca de 64% do valor total, na construção das unidades habitacionais (LEITE, 2011; MAIA, 2014).

Segundo a SEMHAB, o acesso às habitações acontecia por meio de cadastro no programa de auxílio à moradia da PMJP, cadastro na Defesa Civil e seleção realizada pelo Movimento Nacional de Luta por moradia. A demanda gerada através desses cadastros era composta por pessoas que residiam em várias ocupações irregulares. Os cadastros serviram de base para a definição da quantidade de unidades habitacionais a serem construídas no Gervásio Maia59 (LEITE, 2011; VALE, 2012).

A construção das unidades habitacionais contou com subsídios de três programas de financiamento: Programa Carta de Crédito/ Resolução 460, pelo Programa de Crédito Solidário e pelo Orçamento Geral da União – OGU60 (LEITE, 59

Ainda segundo a SEMHAB, a demanda que não pôde ser atendida pela construção do Gervásio Maia, foi relocada para um novo empreendimento localizado no bairro de Mangabeira.

60

O Programa Carta de Crédito/ Resolução 460, é um programa de financiamento cujos recursos utilizados são advindos do FGTS. O principal público alvo deste programa são famílias de baixa renda, organizadas por meio de cooperativas e associações. O agente operador e financeiro deste programa é a Caixa econômica federal, e no caso específico do Gervásio Maia, a PMJP atuou como entidade organizadora, assumindo a responsabilidade de

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2011; VALE, 2012, MAIA, 2014). A divisão da localização das habitações será vista adiante na figura 33.

Ainda de acordo com informações disponibilizadas pela SEMHAB, as casas que foram subsidiadas pelo Programa Carta de Crédito/ Resolução 460 e pela OGU, foram repassadas aos beneficiários através de doação da PMJP. Já as unidades que tiveram o subsídio para sua construção advindo do Programa de Crédito Solidário, foram repassadas por meio de financiamento da Caixa Econômica Federal. No caso do Programa Carta de Crédito/ Resolução 460, o beneficiário adquire a posse formal do imóvel. As casas que foram subsidiadas pela OGU, o beneficiário recebeu uma concessão de uso por 90 anos, podendo ser renovada por mais 90 anos. Nesse caso o beneficiário não recebe a posse formal do imóvel, que continua sendo posse do poder público, sendo proibido qualquer tipo de negociação ou uso que não seja residencial do beneficiário oficial.

A entrega das habitações não aconteceu de forma simultânea. Devido ao prazo estabelecido pelos agentes financeiros, a primeira entrega ocorreu em 2006, para os beneficiários do Programa de Crédito Solidário, enquanto que as famílias que foram beneficiadas pelo Programa de Carta de Crédito e pelo Orçamento Geral da União começaram a receber suas habitações em 2007, a entrega só foi totalmente concluída em 2009 (LEITE, 2011; VALE, 2012; MAIA, 2014).

organizar o grupo que se beneficiaria do programa e produzir as habitações. Já o Programa de Crédito Solidário, é uma linha de crédito que faz uso dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Social. Tem como objetivo viabilizar o acesso à casa própria para famílias de menor poder aquisitivo. Tais famílias são selecionadas por uma Entidade Organizadora, no caso do Gervásio Maia, a PMJP. O financiamento é concedido diretamente ao beneficiário. No caso do Orçamento Geral da União, a verba foi doada pelo Estado e as famílias beneficiados por este programa tiveram acesso à moradia através de sorteios. (LEITE,2011)

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N

Legenda: Programa Carta de Crédito/ Res. 460 – 959 unidades habitacionais Programa de Crédito Solidário - 300 unidades habitacionais Orçamento Geral da União – 77 unidades habitacionais Figura 33: Divisão dos Programas Financiadores do Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Editado pela autora, 2018.

92

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

93

De acordo com Leite (2011) e com relatos de funcionários da SEMHAB (2018) a área destinada a construção do conjunto era de propriedade da Prefeitura Municipal de João Pessoa e fazia parte da Zona Rural da cidade, posteriormente foi transformada em uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) para atender aos prérequisitos estabelecidos pela Caixa Econômica Federal para a construção de um conjunto habitacional. Porém ao analisar o atual Zoneamento Urbano de João Pessoa61, constatou-se que o conjunto está inserido em uma Zona Residencial 2 – ZR2, anteriormente no Zoneamento de 2007, a área era considerada sem zoneamento.

Figura 34: Planta de Zoneamento Urbano de João Pessoa, com ênfase no Gervásio Maia.

Fonte: Secretaria de Planejamento, desenvolvimento urbano e meio ambiente, PMJP, 2012. Editado pela autora, 2018.

Estava previsto no projeto do Conjunto Gervásio Maia uma zona de serviços e comércios no interior do conjunto - lotes destinados ao uso apenas comercial e algumas unidades de uso misto62. Atualmente os comércios e serviços mais próximos estão localizados no Colinas do Sul.

61 62

Zoneamento atualizado em maio de 2012.

Não nos foi fornecida a quantidade de residências de uso misto que estavam previstas para serem implantadas no conjunto.

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N

Legenda:

Residencial

Comercial

Institucional

Misto

Figura 35: Uso e Ocupação real Conjunto Habitacional Gervásio Mais.

Fonte: SEMHAB,2012. Elaborado pela autora, 2018.

Praças e Áreas Verdes

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

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Porém, segundo moradores a zona comercial existente não atende a todas as suas necessidades, obrigando-os muitas vezes a se deslocar para outros bairros para ter acesso a este tipo de serviço. Ao compararmos o Zoneamento definido pelo Estado com o zoneamento real que acontece no conjunto, podemos observar que não há grandes alterações, ou seja, em sua maioria o conjunto continua a ter o uso residencial com a incidência de pequenos comércios e igrejas.

De acordo com dados do Programa de Regularização Fundiária da SEMHAB63, em 2012, o público-alvo a ser beneficiado com a construção do conjunto Gervásio Maia, eram famílias que possuíam rendimentos de 0 a 3 salários mínimos. Devido a este fato, a renda familiar da maioria dos moradores era de até um salário mínimo – cerca de 72%, a menor parcela da população – cerca de 1%, possuía renda familiar entre 3 a 5 salários mínimos, nenhuma família tinha rendimentos acima de 5 salários mínimos (gráfico 05).

1% 3% 24%

Sem Resposta - 37 famílias Até 1 s.m. -

744 famílias

De 1 a 3 s.m. - 245 famílias De 3 a 5 s.m. - 10 famílias 72%

Gráfico 05: Renda por família residente no Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

Em relação ao nível de escolaridade, em 2012, a maior parte da população residente no Gervásio Maia possuía apenas o primeiro grau incompleto – cerca de 51%, enquanto que a menor parte – cerca de 1% possuía o ensino superior (gráfico 06).

63

Foram analisados pelo Programa de Regularização Fundiária da SEMHAB, apenas as unidades habitacionais que foram financiadas pela Resolução 460 do Programa Carta de Crédito- 959 unidades e pelo Orçamento Geral da União – 77 unidades. As que obtiveram financiamento do Programa Crédito Solidário não foram analisadas. Não nos foram fornecidas informações a respeito do motivo pelo qual estas últimas não foram analisadas.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

1%

1% 3%

13%

96

10%

Sem resposta Não Alfabetizado

1º Grau Incompleto

10%

1º Grau Completo 2º Grau Incompleto 11%

2º Grau Completo 51%

Superior Incompleto Superior Completo

Gráfico 06: Nível de escolaridade do responsável familiar.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

A paisagem do Gervásio Maia é caracterizada pela adoção de uma malha ortogonal com a exaustiva repetição da tipologia habitacional adotada, que acaba por produzir uma paisagem monótona. Jacques (2003 apud Leite, 2011) se refere a este tipo de paisagem como um labirinto projetado, ou seja, “com a reprodução sempre igual, tudo acaba se passando como se estivéssemos sempre no mesmo lugar e no mesmo instante, dentro de um espaço infinitamente repetido” (LEITE, 2011, p. 79).

No projeto estava prevista a construção de seis praças, atualmente apenas duas encontram-se construídas. Em relação a arborização, a maior parte das árvores encontram-se nas praças já construídas e nas áreas onde está prevista a construção das outras quatro praças, além disso, existem algumas árvores de pequeno porte localizadas nas calçadas, a fim de garantir um sombreamento para as edificações.

Nota-se que não houve um planejamento paisagístico para o conjunto, as árvores e vegetação parecem ter sido locadas de modo aleatório.

De acordo com informações fornecidas pela SEMHAB, o projeto das unidades habitacionais foi concebido pela equipe técnica do órgão, porém o programa de necessidades e o dimensionamento do imóvel foi estabelecido pela Caixa Econômica Federal. Apesar de ter recebido subsídios de fontes distintas, as unidades habitacionais construídas no Gervásio Maia, no momento da entrega, apresentavam o mesmo padrão tipológico, a mesma área construída e a mesma área do lote. Os equipamentos instalados, seguiam o projeto padrão definido pela prefeitura. A

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97

execução do projeto foi realizada através da contratação de uma empresa terceirizada.

Para o Gervásio Maia, foram projetadas duas tipologias habitacionais, a primeira consiste em habitação unifamiliar, de uso apenas residencial e a segunda consiste em habitação também unifamiliar, com uso misto, ou seja, também abriga a possibilidade de um pequeno comércio. As habitações de uso apenas residencial possuem uma área de 37,60 metros quadrados com possibilidade de ampliação para 52,60 metros quadrados e conta com dois quartos – com possibilidade de ampliação para mais dois, uma sala de jantar/ estar, cozinha integrada, um banheiro e uma pequena área de serviço externa à edificação. As edificações de uso misto, possuem dois quartos – com possibilidade de ampliação para mais um, uma sala de jantar/estar, cozinha integrada, um banheiro e uma pequena área de serviço externa à edificação, distribuídos em uma área de 45,24 metros quadrados com possibilidade de ampliação para 52,60 metros quadrados. Segundo informações da SEMHAB só foram executadas as edificações de uso residencial

64.

Figura 36: Planta de locação e coberta esquemática das tipologias projetadas para o Gervásio Maia.

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação- PMJP. Editado pela autora, 2018.

64

Quando questionados a respeito do motivo das unidades de uso misto não terem sido executadas, os funcionários da SEMHAB não souberam fornecer tais informações.

O Estado como agente de produção do espaço urbano á ã

Figura 37: Planta baixa da unidade habitacional unifamiliar.

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação- PMJP. Editado pela autora, 2018.

Tipo: unifamiliar – 1.336 unidades habitacionais CÔMODO

ÁREA

Sala de Estar/ Jantar

10,01 m²

Cozinha

6,00 m²

Quarto 01

6,42 m²

Quarto 02

6,43 m²

W.C.

2,49 m²

Área Útil Total de área construída da tipologia PB-04 Tabela 05: Área das unidades habitacionais tipo unifamiliar.

Fonte: SEMHAB,2012. Elaborado pela autora, 2018.

31,35 m² 41.883,60 m²

98

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Figura 38: Planta baixa da unidade habitacional de uso misto.

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação- PMJP. Editado pela autora, 2018.

Tipo: Misto – 0 unidades habitacionais CÔMODO

ÁREA

Sala de Estar/ Jantar

10,01 m²

Cozinha

6,00 m²

Quarto 01

6,43 m²

Quarto 02

6,47 m²

W.C.

2,49 m²

Comércio

6,42 m²

Área Útil

37,82 m²

Total de área construída da tipologia PB-04 Tabela 06: Área das unidades habitacionais tipo misto.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

0 m²

99

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100

Figura 39: Cortes e fachada tipo das unidades habitacionais do Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

Fonte: Secretaria Municipal de Habitação- PMJP. Editado pela autora, 2018.

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101

De acordo com o projeto e com informações coletadas na SEMHAB, quando entregues, as unidades habitacionais do Gervásio Maia, possuíam as seguintes características: paredes de alvenaria, pintura à cal, piso em cimento queimado, coberta em telha cerâmica, do tipo canal, sobre madeiramento com inclinação de 25%, e pé direito de 2,4 m.

Figura 40: Unidade Habitacional do Gervásio Maia, quando entregue em 2007.

Fonte: PMJP, 2009 apud Leite, 2011.

Em relação às esquadrias, as portas de acesso social e de serviço eram de madeira maciça enquanto que as demais são do tipo semi – oca, as janelas da sala e dos quartos, são de madeira, de abrir com veneziana fixa, enquanto que as da cozinha e banheiro são também de madeira só que pivotante e com vidro. Além disso, todas as casas possuem uma caixa d’água de 500 litros, na cor azul, localizadas na laje de cobertura do banheiro.

Devido ao desenho urbano idealizado para o conjunto, alguns lotes possuem medidas distintas, desse modo para fins de análise adotaremos as medidas padrão que são 7,5m x 15m, totalizando uma área de 112,5 m² por lote. Em relação ao modelo urbanístico adotado pelo projeto do CHGM, nota-se que há uma continuidade do modelo reproduzido incansavelmente anos atrás pelo BNH – repetidas casas térreas individuais, em filas, com grande homogeneidade no padrão construtivo e com um

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102

aproveitamento do solo reduzido, distribuídas em um conjunto de grande porte. Tal modelo urbanístico acaba por produzir “favelas projetadas” nas palavras de Lima (2010).

Os equipamentos que existem atualmente65 foram entregues posteriormente à entrega das habitações, ou seja, no momento da entrega das unidades habitacionais não havia nenhum equipamento executado. Tais equipamentos estão localizados no perímetro externo do Conjunto – diferentemente do Castelo Branco que os poucos equipamentos previstos no projeto, localizavam-se dentro de seu limite interno.

Figura 41: Praça da Esperança-Gervásio Maia.

Fonte: Arquivo Pessoal, 2018.

Figura 42: Centro Unificado de Cultura e Arte Adailton Pereira Gomes.

Fonte: Arquivo Pessoal, 2018.

65

Terminal de Integração Colinas do Sul, Escola Municipal Jornalista Raimundo Nonato, Unidade de Saúde da Família – USF- Mudando de Vida, Centro de Recreação Infantil – CREI – Luzia da Taipa, Centro de Referência Escola Municipal de Ensino Fundamental Antenor Navarro, Cozinha Comunitária, a Praça da Esperança, a Praça Gervásio Maia, o Centro Unificado de Cultura e Arte Adailton Pereira Gomes, um Ginásio Poliesportivo, uma quadra de futebol conhecida como “Gervasão”.

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Figura 43: Terminal de Integração Colinas do Sul. Fonte: Arquivo Pessoal, 2018.

Figura 44: Centro de Recreação Infantil- CREI- Luíza da Taipa.

Fonte: Arquivo Pessoal, 2018.

Figura 45: Cozinha Comunitária do Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

Fonte: Arquivo Pessoal, 2018.

103

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104

Assim como aconteceu no Conjunto Habitacional Castelo Branco, as casas construídas pelo Estado possuíam pequenas dimensões, além de serem construídas por materiais de baixa qualidade, não correspondendo às expectativas e às necessidades dos moradores. Que por sua vez, passaram a realizar intervenções arquitetônicas informais nas habitações, descaracterizando-as, a fim de adequá-las as suas reais necessidades, sejam elas em relação ao número de moradores ou em relação as condições de conforto. Essas alterações podem ser vistas nas fachadas e tornam-se ainda mais visíveis quando fazemos uma comparação entre a proporção entre os cheios e vazios existentes na atualidade com a proporção existente na ocupação inicial do conjunto.

Para realizar esta comparação inserimos na planta do conjunto todas as unidades habitacionais com as características iniciais, devido ao curto tempo para a conclusão deste trabalho elegemos apenas uma quadra como exemplo das alterações tipológicas e morfológicas que ocorreram nos últimos anos no Gervásio Maia. Para melhor compreensão dividimos o conjunto em quatro: vazios públicos, vazios privados, institucional e residencial. As áreas vazias públicas consistem nas vias, calçadas, áreas verdes e praças. Enquanto que as áreas vazias privadas são as áreas do lote que ficaram vazias para possíveis ampliações ou devido aos recuos estabelecidos para a área. A porção do conjunto ocupada pelo equipamentos foi definida como institucional enquanto que as habitações foram definidas como residencial.

17% 2% Vazio Público - 145.200,0 m² 48%

Vazio Privado - 100.066,40 m² Institucional -

4.500,0 m²

Residencial -

50.233,60 m²

33%

Gráfico 07: Porcentagem de cheios e vazios da ocupação original do conjunto Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

105

N

Legenda:

Cheios

Vazios

Perímetro Analisado

Figura 46: Cheios e Vazios Ocupação Inicial do Conjunto Habitacional Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

Quadra Analisada

106

Figura 47: Cheios e Vazios atual do Conjunto Habitacional Gervรกsio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012. Elaborado pela autora, 2018.

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107

24%

39%

Ocupação Inicial - 2.357,28 m² Acréscimos -

2.236,36 m²

Vazio -

1.427,74 m²

37%

Gráfico 08: Porcentagem de cheios e vazios atual do conjunto Gervásio Maia.

Fonte: SEMHAB, 2012/ Google Earth, 2018. Elaborado pela autora, 2018.

Em muitos casos chega a ser impossível observar vestígios da tipologia original, tornando inviável a análise tipo-morfológica apenas através de visitas in loco.

Tais intervenções vão desde a construção de muros, mudança nos revestimentos externos, acréscimo de grades nas esquadrias externas, construção de garagem, varanda, ampliação dos ambientes construídos até a construção de novos cômodos como quartos e banheiros e de outros pavimentos. Na maioria dos casos, os moradores se apropriam dos recuos para abrigar as novas áreas construídas. Além disso, algumas unidades foram reformadas para a inserção de pequenos comércios, já que não foi executada uma zona de comércios e serviços dentro dos limites do conjunto. As casas que passaram por pouca intervenção, segundo os moradores, não foram feitas devido à limitação financeira.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Como foi visto, ao longo da análise efetuada observou-se que o Estado teve uma grande influência na produção e transformação do tecido urbano de João Pessoa. Entre o recorte de tempo analisado (1964-2018), ao ser reforçada a infraestrutura rodoviária (BR 230), a implantação de equipamentos em zonas consideradas na altura como periféricas (temos como exemplo a UFPB) e ao se impulsionar a construção de grandes conjuntos habitacionais distantes da área consolidada da cidade, estimulou-se um novo tipo de crescimento urbano fragmentado e disperso pela paisagem e pelo território. Nesse sentido, existiu uma clara ruptura com o crescimento urbano que ocorria até então, lento e compacto em torno do núcleo original da cidade, tal fato acabaria por transformar a morfologia da cidade de forma radical e irreversível.

Em relação ao fenômeno de fragmentação e descontinuidade do tecido urbano produzido através da política de construção dos conjuntos habitacionais, tema central desta monografia, esse fenômeno pode ser facilmente constatado pelos primeiros anos de atuação do BNH na capital paraibana. Entre 1968 e 1969, o BNH produziu cerca de 2.333 habitações, sendo o conjunto Castelo Branco o exemplo de maior representatividade em termos quantitativos, um local considerado na altura distante e com acessos viários precários.

Tal tendência iria manter-se até 1986, altura em que o BNH foi extinto e passou a haver uma diminuição considerável no ritmo da produção habitacional para a população de baixa-renda (entre 0 e 3 salários mínimos nacionais).

Com a diminuição no ritmo da produção habitacional pós-BNH, até 2011 foram produzidas cerca de 10.000 moradias para a população de baixa-renda, sendo o conjunto Gervásio Maia o maior aglomerado habitacional produzido nesse período.

Desta vez, no caso do Gervásio Maia, ao contrário do que ocorreu no conjunto habitacional do Castelo Branco, coube ao Poder Local a função de captar os recursos financeiros e organizar a edificação das habitações. Quanto à localização escolhida para a sua construção, o conjunto habitacional foi edificado numa área considerada rural, transformada por meio de instrumentos legislativos em zona urbana.

Mais uma vez, foram utilizadas as zonas rurais de menor valor econômico localizadas nas periferias da cidade consolidada, seguindo-se as mesmas práticas adotadas pela política habitacional do Poder Central, implementadas décadas atrás através da atuação do BNH e dos militares. No entanto, no caso do conjunto Castelo Branco não se pode esquecer que o conjunto habitacional foi construído ao lado de

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um equipamento urbano de referência para a capital paraibana e para a sua área metropolitana, a UFPB. Essa proximidade viria a ser determinante para a valorização do Castelo Branco em vários aspectos, uma vez que passou a beneficiar funcionalmente, socialmente e economicamente o conjunto, consolidando a sua relação com a universidade. Na atualidade no conjunto habitacional é perceptível uma grande variedade de pessoas provenientes de classes sociais distintas, que utilizam o comércio e os serviços que estão localizados no conjunto, também é perceptível a movimentação permanente de estudantes, que alugam habitações e quartos pela sua proximidade em relação à universidade.

Já no caso da escolha da localização do Gervásio Maia, Maia (2014) afirma que é notória uma descontinuidade territorial do conjunto tanto em relação a área urbanizada da cidade quanto em relação à equipamentos importantes para a cidade e aos demais conjuntos habitacionais localizados em sua proximidade, verificando-se no caso do Gervásio Maia uma segregação social e espacial bastante acentuada.

Quando comparada a localização do conjunto habitacional do Castelo Branco com a do Gervásio Maia, observa-se um recuo em relação à qualidade na escolha da área de implantação do conjunto mais recente, que ficou isolado e com o acesso dificultado a equipamentos de referência da cidade. Ou seja, em termos de desempenho urbano se utilizarmos critérios como a acessibilidade urbana, mobilidade urbana e centralidade, verifica-se uma degradação qualitativa ao longo do tempo.

Em termos tipológicos, morfológicos e de infraestrutura, não se verificou grandes avanços qualitativos entre os dois casos de estudo. Embora exista um espaçamento temporal de quase quarenta anos entre a construção dos conjuntos habitacionais Castelo Branco e Gervásio Maia, e apesar de terem sofrido influências de realidades políticas, técnicas, sociais e econômicas completamente distintas, ambos apresentam surpreendentemente bastante características em comum. Entre as semelhanças encontradas, verifica-se um número de habitações construídas muito próximo entre os dois conjuntos, 1.950 no Castelo Branco e 1.336 no Gervásio Maia.

Além do número de habitações entregues ser semelhante, pôde-se verificar que nos dois casos quando se procedeu à entrega parcial das primeiras unidades, existia uma grande ausência de infraestrutura e equipamentos, aspetos foram sendo corrigidos de forma deficiente e improvisada ao longo do tempo. Comparativamente, a situação mais grave em relação à infraestrutura aconteceu no conjunto Castelo Branco, que não possuía rede de abastecimento de água, rede de esgoto, calçadas e

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ruas pavimentadas. Relativamente à rede de esgoto, segundo informação dos moradores do Castelo Branco, na atualidade ainda existem três ruas do conjunto que não possuem ligação à rede de esgoto. Quanto ao conjunto Gervásio Maia a infraestrutura como rede de abastecimento de água, rede elétrica e de iluminação pública, rede de esgoto foram construídas simultaneamente à entrega das habitações, embora os moradores reclamem da sua qualidade, verifica-se uma evolução em relação ao conjunto do Castelo Branco.

Quanto à pavimentação das ruas do Castelo Branco, verifica-se que a qualidade construtiva não foi uma prioridade, ocorrendo o mesmo com a quantidade de ruas pavimentadas, 50 anos depois da inauguração do conjunto habitacional podemos encontrar ruas sem nenhum tipo de pavimentação. No caso do Gervásio Maia, a qualidade construtiva das vias de circulação de automóvel é em tudo idêntica à do Castelo Branco, verificando-se desde o momento de entrega das habitações até os dias atuais a pavimentação de apenas quatro ruas, coincidentemente as que são utilizadas pelos ônibus.

Sobre o tópico calçadas, os problemas verificados nos dois conjuntos habitacionais são exatamente os mesmos. Tendo em consideração as atuais discussões tidas em torno da acessibilidade, mobilidade urbana e tendo em conta a legislação (NBR 9050) e a quantidade de estudos efetuados, a única opinião que se pode ter sobre o assunto é que são inexistentes ou de fraquíssima qualidade, transformando o ato de caminhar sobre elas num exercício penoso para quem não tem nenhum tipo de deficiência física e num exercício impraticável para pessoas com mobilidade reduzida.

As calçadas tanto no Gervásio Maia quanto no Castelo Branco foram construídas pelos próprios moradores, assim como acontece em outras partes da capital paraibana e em outras cidades brasileiras, o poder público não as trata como espaços públicos de sua responsabilidade deixando a cargo do morador que toma para si tal tarefa. Por conta disso, é comum encontrarmos nos conjuntos habitacionais analisados calçadas com diferentes revestimentos e níveis distintos que muitas vezes não acompanham a inclinação da via, ou que foram construídas com diferentes alturas em relação às vias de circulação de automóvel. Tal descaso do poder público pelas calçadas, justifica a grande quantidade de descontinuidades existentes num elemento do espaço urbano que deveria ser contínuo questões óbvias de coerência de imagem, facilidade de acesso e mobilidade por parte dos pedestres.

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Relativamente aos transportes coletivos, quando o conjunto Castelo Branco foi entregue não existiam transportes que atendessem o novo conjunto, uma vez que nessa altura não existiam vias que o conectassem eficientemente ao resto da malha urbana. Atualmente o conjunto conta com uma rede de transporte coletivo que o liga à diversas áreas da cidade e que segundo os moradores é bastante satisfatória.

Comparativamente, o conjunto habitacional Gervásio Maia contava inicialmente com uma rede de transporte coletivo para conectá-lo às demais áreas da cidade. Com a inauguração do Terminal de Integração Colinas do Sul a mobilidade ficou ainda mais facilitada. O equipamento passou a permitir a integração física dos passageiros, através do sistema de bilhetagem eletrônica, que garantia o ingresso gratuito em um outro ônibus. De acordo com relatos de moradores, atualmente o sistema de integração foi descontinuado. Uma das reclamações mais frequentes é em relação ao tempo de espera nas paradas de ônibus e ao tempo de viagem até chegar a outras áreas da cidade.

Se analisarmos os dois conjuntos habitacionais do ponto de vista da morfologia, observa-se nos dois casos uma opção pela utilização de malhas ortogonais para posicionar as habitações em relação ao solo, contribuiu determinantemente para o reforço do aspecto monótono da paisagem inicialmente construída. Quanto à tipologia, ambos os conjuntos foram construídos a partir de projetos arquitetônicos padronizados de fraca qualidade formal e construtiva, que proporcionam um péssimo desempenho em termos de conforto ambiental. Nota-se nos dois exemplos que tipologicamente quase nada mudou, repetindo-se solução projetuais muito semelhantes ao longo dos dois loteamentos até à exaustão. Trata-se de unidades habitacionais unifamiliares térreas, com telhado de duas águas, coberto por telha canal assentada numa estrutura de madeira tradicional, que abriga uma área útil mínima, muito abaixo do que é necessário para se poder viver com conforto e dignidade. Tal fato ajuda a explicar as grandes diferenças morfológicas do bairro e as grandes diferenças registadas nas habitações entre a sua entrega e a situação em que se encontram atualmente (com a sua forma original completamente desvirtuada).

Tal fato para além de confirmar a falta de sincronia entre as reais necessidades da população e o projeto, também denuncia uma total falta de fiscalização, assistência pós ocupação e controle por parte do poder público. Bonduki (2017), afirma que nesses casos não basta apenas entregar as unidades habitacionais, mas é necessário um acompanhamento pós ocupação para conscientizar a população a manter e

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conservar os espaços públicos. Nos dois conjuntos as alterações mais frequentes passam pela construção de muros, seguidos da mudança dos revestimentos e o acréscimo da área construída, seja ele na parte frontal, na lateral ou nos fundos das casas.

Apesar das alterações à tipologia inicialmente construída ter sido generalizada nos dois conjuntos habitacionais, foi interessante verificar que no caso do Gervásio Maia existe uma relação direta entre a renda das famílias e a quantidades de alterações que foram efetuadas. As habitações pertencentes às famílias de maior renda apresentavam intervenções como ampliação da área coberta, a construção de muros altos e a instalação de portões de alumínio. Já nas habitações pertencentes à parcela da população com menor renda não se verificaram alterações significativas.

Além do baixo padrão tipológico construído, vimos que houve um certo descaso em relação ao espaço livre público nos dois conjuntos. Algumas áreas destinadas à praças e áreas verdes encontram-se vazias, sem uso, sem nenhum tratamento paisagístico. No caso do Castelo Branco alguns desses espaços foram ocupados de forma irregular pela população.

Diante do exposto pudemos perceber que pouco mudou na produção de habitação social na capital paraibana nos últimos quase quarenta anos, e quando mudou, foi para pior. Apesar de estudos comprovarem desde o final dos anos 60 que o modelo arquitetônico e urbanístico proposto nos dois conjuntos é falho e que na prática não funciona, continuam a ser amplamente executados como a única solução para resolver o déficit habitacional existente.

Nesse sentido, após o termino da presente análise, temos que concordar com os estudos efetuados por Parlman (1976) que demostraram a falência dos conjuntos habitacionais no Brasil, uma vez que não conseguem resolver a incompatibilidade entre os interesses da população e os planos que são executados.

Sendo assim, talvez esteja na hora de mudarmos de paradigma e testarmos as sugestões de Mangin (1967) e Turner (1976), que propunham soluções como a autoconstrução e os processos de mutirão dirigidos e apoiados pelo Estado.

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