3
FORTALEZA - CEARÁ - BRASIL Quinta-feira, 26 de dezembro de 2013
DIREITO & JUSTIÇA
DORI BOUCAULT
O
“Mulheres lutam mais pelo seus direitos no Procon”
entrevistado deste mês, do Caderno Direito & Justiça, do jonal o Estado, é o especialista em direito do consumidor e do fornecedor, Dori Boucault. Além de advogado, ele é consultor em relação de consumo e coordenador do Procon da Prefeitura de Mogi das Cruzes (SP), há 25 anos. Através do estilo Stand Up, transmite informações e conta casos engraçados das relações de consumo para todo tipo de público e idade. Segundo ele, apesar do modo formal em que apresenta-se, com o uso de bigode, terno e gravata, em pouco tempo o bom humor e a diversão conquistam a plateia e suas palestras fazem sucesso. Ao Direito & Justiça, o advogado comenta sobre os principais problemas que atingem os consumidores, como os cuidados na hora da compra e de reclamar seus direitos, e ainda conta um pouco sobre como começou a desenvolver essa forma diferenciada para transmitir conteúdos sobre códigos, direitos e deveres.
[Direito & Justiça]: Uma pesquisa da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, divulgada em novembro último, aponta que 91% dos consumidores têm conhecimento de seus direitos, mas não os buscam. Como o senhor avalia esse resultado? O consumidor, hoje não crê na garantia, não crê na garantia de seus direitos e a que se deve isso? [Dori Boucault]: É um resultado muito ruim e mostra que ainda é necessário trabalhar muito para a educação do consumidor. Tanto é que já existe um projeto de lei para fortalecer os Procons e que poderia contribuir para aumentar a procura dos consumidores por seus direitos. O que ocorre é que o sistema ainda é burocrático e demora muito tempo para se decidir, efetivamente, por uma solução satisfatória para o reclamante. Mas, uma pesquisa feita pela Fundação Procon mostra que 70% das reclamações são feitas pelas mulheres. Elas reclamam por elas, pelos maridos, pelos pais, pelos filhos. Elas estão mais atentas, buscam seus direitos e defendem-se dos erros cometidos pelas empresas, quando não entregam produtos, não realizam os serviços, enfim. As mulheres se preocupam mais, estão à frente desse processo, mas o número de reclamações ainda é muito pequeno tendo em vista o número de problemas que os consumidores enfrentam com os fornecedores irregulares ou que não cumprem o que prometem. [D&J]: Muitos consumidores procuram resolver os problemas diretamente com as empresas, no entanto, há casos que necessitam recorrer ao Judiciário como alternativa. Por que há tanta dificuldade das empresas solucionarem um problema que sabem ser de direito do cliente? [DB]: Ainda se espera muito por uma decisão em torno de um direito do consumidor. Os Pro-
VECCOMM
site que oferece a promoção, para saber se há como encontrá-lo, caso não sejam cumpridas as promessas da venda. Portanto, o consumidor deve evitar de clicar em comprar na hora em que enxerga a promoção, pois assim evita dores de cabeça futuras. Na Fundação Procon, já existe uma lista com 325 sites não recomendados, bem como o ranking das empresas com maior número de reclamações. Se o consumidor suspeitar de algo, deve entrar na página da Fundação Procon para saber detalhes do site ou da empresa.
[D&J]: Outra grande evolução são as compras coletivas, tanto clientes como empresas devem ter cuidados? Quais os problemas mais recorrentes? [DB]: Os problemas mais recorrentes são aqueles em que é necessária a formação de grupos de pessoas para a promoção ser ativada. Quando não se atinge o número mínimo de interessados na compra, a venda não é efetuada e o consumidor se sente frustrado. Por outro lado, quando a venda é ativada e atinge um número excessivo de interessados e a empresa que fez a promoção não atende a todos, deixa de enviar produtos por falta de estoque ou de entregar os serviços prometidos. Grandes lojas anunciam produtos cujos preços não contêm desconto algum ou depois de efetuar a venda informam ao consumidor que o estoque acabou e ele deve escolher outro produto. Frustra a expectativa de quem comprou. Há uma queda no número de estabelecimentos que fazem promoções de compra coletiva, em razão das várias reclamações sobre este serviço nos órgãos de defesa do consumidor e pelo descrédito que algumas lojas causaram para aquelas que trabalham de acordo com as normas de relação de consumo.
cons atuam na área administrativa. Podemos atuar apenas na comunicação da reclamação, exigindo a troca, a entrega, orientando as partes para uma solução do problema. Mas, em casos mais extremos, onde a empresa se recusa a cumprir sua obrigação e causa perdas para o consumidor, ele tem de acionar o Judiciário que vai fazer valer a decisão de reparo ao dano causado. Se a empresa não cumpre e causa um dano moral, econômico ou material ao consumidor ela será punida por isso e o Judiciário faz valer isso. Mas, tenho de ressaltar, que a maioria das empresas prefere que o consumidor procure por elas para tentar uma solução. O empresário sabe que é melhor para ele e para o cliente que a solução seja encontrada antes de uma reclamação ao Procon ou ao Judiciário. Apenas quando se é impossível chegar a um acordo é que se deve recorrer aos órgãos de defesa do consumidor.
tação do serviço? Pode-se falar em falta de estrutura para suportar mais novos clientes? [DB]: Vendem muito mais que a capacidade de instalação ou de entrega dos produtos e, por essa razão, são os que possuem mais reclamações nos órgãos de defesa do consumidor. Não há uma sintonia entre os departamentos dessas empresas e, por isso, os problemas surgem. O departamento comercial, marketing, por exemplo, vende muito mais que a capacidade técnica da empresa de instalar os produtos ou serviços. O descompasso é tão grande que, em muitos casos, elas não entregam os produtos e serviços pelos quais receberam e a solução dos consumidores é reclamar ao Procon ou abrir um processo judicial para reverter os danos ou prejuízos sofridos. Se de um lado as áreas de vendas são fortes, por outro as áreas de engenharia ou técnica são fracas e as empresas terceirizam o serviço, piorando ainda mais a situação. Se as empresas tem interesse apenas em vender, investe em treinamento de vendedores, mas não investe no pós-venda, na área técnica e isso deixa o sistema deformado.
[D&J]: Quantas palestras o senhor já realizou e quando se iniciou essa vontade em transmitir ao público um conteúdo sobre leis e direitos de forma diferenciada através do Stand Up? [DB]: Mais de 300. Começou quando eu era professor na Universidade Brás Cubas, em 1988, nas aulas de Direito. Percebi que o modelo de aula não agradava aos alunos e comecei então a usar exemplos do cotidiano sobre problemas de ordem comercial, quando uma pessoa reclama de um estabelecimento que não cumpriu sua parte no acordo. Levava exemplos de casos comuns, mas que transmitia informações importantes sobre as questões de Direito. Os alunos gostaram e passaram a lembrar, mais facilmente, dos artigos e dos códigos, sempre se baseando nas histórias reais contadas por mim sobre as reclamações de consumidores contra fornecedores, lojas, empresas. Ao final, entregavam seus trabalhos sobre processos judiciais, faziam suas apresentações e interpretavam conforme tinham aprendido, era muito interessante. Percebi que a orientação dada com diversão ficava gravada para a vida toda. Hoje, aplico isso nas minhas palestras. Ao falar sobre direitos do consumidor e do fornecedor uso a mesma metodologia: informações e orientações dadas com um pouco de humor e diversão servem de exemplo para ambas as partes conhecerem seus direitos e deveres. Por isso, as palestras fazem muito sucesso.
[ ] [ ] “O sistema de tabalho dos Procons ainda é muito burocrático”
[D&J]: Os órgãos de proteção ao consumidor, tendo mais autonomia e poder para aplicar penalidades, como refletiriam na garantia dos direitos do consumidor? [DB]: Os órgãos de defesa do consumidor com mais autonomia significa menor tempo de espera do consumidor por uma solução que possa contemplá-lo diante das faltas cometidas pelos fornecedores. Isso implica positivamente para ambos os lados. Se o consumidor tem seus direitos garantidos, ele comprará mais e o fornecedor se comprometerá a atender adequadamente para evitar ser punido. As empresas que atuam corretamente sabem como o cliente satisfeito retorna ao seu estabelecimento e quanta dor de cabeça têm, quando deixa de cumprir com sua promessa de entrega de produto ou serviço. [D&J]: Os serviços de telefonia, energia elétrica e planos de saúde ainda são os que mais somam reclamações e que mais aderem novos clientes. Esse aumento na demanda causa impacto na pres-
[D&J]: O resultado de suas palestras também é diferenciado; o público aceita melhor e tem uma compreensão mais extensa para aplicar o conteúdo no dia a dia? [DB]: Nas últimas palestras, tenho observado que o público aceita melhor esse tipo de orientação. Às vezes, isso parece uma contradição, porque as palestras são sobre assuntos que causam mal-estar nas pessoas, que muitas vezes foram frustradas numa compra ou numa tentativa de solucionar o problema de um produto ou serviço que não foi entregue e ainda tem minhas características físicas e pessoais. De certa forma, pareço muito formal para um palestrante que fala sobre direitos do consumidor. Numa recente palestra, uma moça na audiência comentou: “ele usa terno, gravata e o bigode o deixam com cara de mau. Mas apenas dois minutos de palestra já são suficientes para conhecer o Dori e o que ele quer passar. E a gente não esquece jamais”.
“Quando a vantagem é muito grande o consumidor, desconfie”
[D&J]: Acompanhamos uma grande evolução no comércio eletrônico. As facilidades e vantagens podem ser atraentes para os consumidores, mas quais cuidados devem ter para a garantia de que estarão fazendo um bom negócio? [DB]: Quando a vantagem é grande desconfie. Não há vantagens na relação de consumo, pois o consumidor pagará pelo serviço. Ele pode obter descontos interessantes ou a promessa de desconto, como já ficou caracterizado em algumas promoções como o Black Friday, que eu chamo de Black fraude. Os cuidados para evitar cair em uma promoção falsa são: jamais acreditar em preços muito baixos e pesquisar sempre e mais. Também é fundamental que levante as informações do