revista tato

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Projeto editorial:

Manoella Oliveira,Thays Prado e Vanessa Siqueira. Redação:

Manoella Oliveira e Thays Prado Edição:

Manoella Oliveira e Thays Prado Projeto gráfico:

Vanessa Siqueira Ilustração e fotografia:

Vanessa Siqueira Marketing:

Vanessa Siqueira Colaboraram nessa edição:

Laura Guimarães, Joana Alves, Victor Braga, Flávio de Almeida, Ana Lúcia Andrade, Maurício Silva Júnior e Mariana Marques. Modelo da capa:

Luciana da Silva Impressão e montagem:

Aster Gráfica

ABencadernações Os colunistas não expressam necessariamente a opinião de tato.


comtato Tato surge da nossa vontade de fazer uma revista feminina diferente, que não seja mais um manual de comportamentos para que todas as mulheres se tornem boas filhas, mães, esposas, amantes e profissionais, mas que respeite a individualidade e as escolhas de cada uma. Ao mesmo tempo, imaginamos que em um mundo competitivo e cheio de pressa como o nosso, tenha sobrado pouco espaço para manifestarmos e curtirmos nossa feminilidade. Normalmente associado à fragilidade, nosso lado feminino esteve escondido sob as tantas exigências feitas à mulher – para atendê-las era preciso se mostrar muito forte. O que demoramos a perceber é que podemos ser fortes e femininas, emotivas e independentes, acolhedoras e objetivas. Conseguimos nos compreender melhor quando enxergamos, sem medo, os pólos feminino e masculino dentro de nós, não em conflito, mas integrados, ajudando-nos a lidar com as várias situações que requerem posturas diferentes. O que temos para compartilhar não tem pretensão de verdade absoluta, queremos apresentar pontos de vista que nos proporcionem aprendizado e nos estimulem a experimentar a vida com leveza e prazer. Sabemos que esse é um longo caminho, e que cada ser humano faz sua própria trajetória. Convidamos você a ser nossa parceira de jornada. Aos homens, fazemos um convite especial para dar ao menos uma passada pelas próximas páginas. Se yin e yang andam sempre juntos, dentro de cada um de nós, pode ser que muitos se interessem pela feminilidade estampada em texto e imagem. Tato é uma publicação feita para quem gosta de admirar o mundo em suas pequenas coisas, de se doar ao outro e, principalmente, de olhar para dentro de si. Sejam bem vindos! Manoella Oliveira, Thays Prado e Vanessa Siqueira

um sentido para o feminino


66 24 46 06


30

essências 30

Um caminho para o equilíbrio entre feminino e masculino.

papo-bom 06

A terapeuta corporal Rizza D’Ávila fala de espiritualidade e reflete sobre o sentido da vida.

toques

16 curas 16

24

40

Dicas de beleza para você aproveitar a água.

O que dizem os hormônios sobre sua conduta de vida.

umbigo 46

O que será amor de mãe?

gente em projeto

58 na pele 40

66

14

O que as crianças pensam sobre separar brinquedos e esportes entre meninos e meninas.

A questão não é o orgasmo.

eu-tu 58

Encontrar alguém para se relacionar é procurar por qualidades ou aceitar defeitos?

feito à mão 14

As velas proporcionam aconchego ao ambiente. Aprenda os primeiros passos.

ecos 20

Óleo na pia nem pensar! Entenda como descartar gordura sem prejudicar a natureza.

comigo 28

Na loucura do dia-a-dia, tire ao menos alguns minutos para relaxar.

sentidos 52

Livros, filmes e discos para curtir.

a gosto 70

Ingredientes para experimentar e reinventar.

voz 23

História de uma leitora que não se cansa de aprender.

colunas 38 45 54 63 64

Daqui de dentro Thays Prado À flor da pele Diego Cordeiro Letra e Música Rodrigo Ortega Gente é sempre gente Bruno Costoli Elemento Terra Manoella Oliveira


papo bom


Ela confia no universo e na própria intuição para escolher desde a roupa com que vai trabalhar até a trajetória de vida. Com a sabedoria adquirida em seus 50 anos e estampada nos cabelos completamente brancos, a terapeuta corporal Rizza D’Ávila nos fala de suas verdades e sente que ainda tem muito que aprender. Rizza foi à Itália descobrir a origem de seu nome e encontrou algo referente a arroz, mas prefere associá-lo ao riso. E foi sorrindo que ela nos recebeu para esta conversa.

Um

sentido para Rizza

Por Manoella Oliveira e Thays Prado. Fotos: Vanessa Siqueira.

tato: Por que você escolheu o curso de Psicologia? Rizza: Não sei dizer porque. Sinto que as coisas foram acontecendo de forma coincidente. Dei sorte, acho. Na época eu era muito nova, tinha apenas 19 anos, era atleta, jogava basquete, e todo o pessoal que convivia comigo fez Educação Física. No primeiro ano, não entendi muito bem porque estava ali, achei aquilo inadequado para mim e fui conversar com a coordenadora do curso. Ela me disse que existia Psicologia aplicada ao esporte e isso foi o suficiente para eu resolver terminar a graduação. Sinto que os cursos não nos dão muita base. Depois que saímos da faculdade é que começamos a trilhar nosso caminho de conhecimento e reconhecimento.

E qual foi a sua trajetória depois de se formar? Quando saí da faculdade, meu filho mais velho tinha apenas um ano. Como eu morava longe e não tinha empregada, não pude trabalhar. Quatro anos depois, tive duas meninas, gêmeas, e com dois nenéns de uma vez, não havia condição de fazer mais nada. Foram nove anos dedicados aos filhos, mas sempre tive vontade de trabalhar. Depois de 11 anos de casada, resolvi me divorciar, o que foi um grande impulsionador para retomar minha profissão. Como você desenvolveu seu trabalho? Como estava fora do mercado há muito tempo, comecei como co-terapeuta e achei necessário fazer uma reciclagem. Procurei alguns cursos e, depois de trabalhar três anos com a Psicologia,


conheci a Leitura Corporal. Foi aí que me encontrei, porque o corpo sempre me fascinou de alguma forma. Tenho trabalhado nessa perspectiva há quase vinte anos. Foram quinze anos no Núcleo de Terapia Corporal e, há quatro, trabalho no meu espaço, com minha equipe, com uma filosofia que acho adequada. Ainda tenho vontade de cursar Fisioterapia, Medicina, e aliar todo esse conhecimento. Como uma encarnação só é pouco tempo, a gente faz um curso e sai buscando os

ficou pouco vista, vista de um jeito inadequado, não vista, negada... Para nós, todos temos sete corpos. O corpo físico, que é o que podemos ver, e seis corpos mais sutis que trabalham várias energias e formas de movimentação de emoções, comportamentos, atitudes, ações e sentimentos. A matéria é a energia mais concreta. Partimos do físico para entender o sensorial e o sutil, e do sensorial e do sutil, para tratar o físico. Não existe uma via de mão única.

Todo o processo espiritual está fundamentado na possibilidade de se descobrir uma direção que faça sentido para o indivíduo encarnado. outros de algum jeito. Não sou adepta de especialização, acho que temos que aprender dentro de nossa formação e lidar com suas várias frentes. O que te chama a atenção na Leitura Corporal? Sinto que a Psicologia tradicional tem um lado que é o de aprender a analisar e a interpretar, e esse movimento nem sempre me parece libertador. Na Leitura Corporal, entendemos que todas as emoções geram algum tipo de materialização no corpo físico, então toda doença é psicossomática. “Doença” vai desde virar um cílio do olho até fazer um câncer. Nós trabalhamos qualquer manifestação que o corpo demonstre: uma emoção que, de alguma forma,

Como é a sua relação com seus pacientes? Meu paciente é meu espelho, assim como sou o dele. Existe um movimento de troca. Não tenho a obrigação de não envolvimento, de não me colocar junto a ele. Claro que não tomo o tempo dos pacientes falando de mim (risos). Utilizamos a massagem, porque acreditamos que trabalhando o corpo físico liberamos emoções e sentimentos que ficaram impregnados, ajudamos a abrir a psique do paciente, a liberar questões que estejam causando traumas e bloqueios. Trabalhamos também com o verbal, mas a grande possibilidade é o corpo humano. Claro que é preciso

fazer sentido para o paciente, se não fizer, não é daquela direção que ele precisa para se cuidar. Como você vive sua espiritualidade hoje? Acredito que não encarnamos aleatoriamente, temos uma direção, que podemos chamar de destino ou algo assim. Se conseguirmos fazer a tradução do corpo físico, compreender por que um é loiro e outro é moreno, por que um tem olhos azuis e outro tem olhos pretos, entender essa diversidade, vamos dar para cada um uma direção. Todo o processo espiritual está fundamentado na possibilidade da descoberta de uma direção que faça sentido para o indivíduo encarnado. Cada um traz uma referência única e somente ele conhece determinado “segredinho”, que precisa ser compartilhado. Temos como missão desenvolver nosso processo de expressão e contar para cada um, ou para o mundo, aquilo a que viemos, para que possamos juntar os vários “segredinhos” e fazer uma realidade global mais ampla e construtiva. Estamos ligados uns aos outros, e cada um dos nossos semelhantes vai nos auxiliar a colocar nossa verdade de forma suave ou de forma muito difícil. O que determina como será essa forma de expressão? Existe uma dinâmica estimulando os seres humanos do lado positivo e do lado negativo da vida. Como humanidade, não sabemos ler o nível de


estimulação que estamos recebendo. O objetivo maior é a capacidade expressiva, todos os seres vivos encarnados e até os inanimados têm uma vibração. Ao mesmo tempo em que eles são estímulos e carregam uma sabedoria, vêm para aprender com o outro. Por exemplo, as plantas sabem respirar, nós não sabemos. Nós liberamos gás carbônico na superfície da Terra, enquanto elas o transformam em oxigênio para nós. Os minerais nos contam que é possível ter uma forma perfeita sem sair do lugar. Os cristais têm uma vibração muito sensorial e movimentam o mundo. Essa é a vibração yin, a vibração do feminino. Podemos captá-la e utilizá-la para o desenvolvimento da nossa estrutura feminina, por isso, hoje, muita gente faz cura através de cristais. É importante desenvolver uma espiritualidade? A espiritualidade está embutida em todos os processos que são realizados. Não consigo entender a vida sem esse movimento espiritual de reconhecimento de cada vibração que habita um indivíduo, um animal, uma planta, uma situação, uma atitude. As entidades dizem que precisamos desenvolver essa espiritualidade, que é sentir o universo, sentir quem eu sou, estar presente aqui e agora. Nós temos o compromisso de estar no presente e usar o passado e o futuro para nos movimentarmos. Quanto mais presença desenvolvemos, mais estamos desenvolvendo nosso corpo físico.

Como você lida com essas entidades? São seres de vibração muito sutil que transitam conhecimento. Eu sou um dos canais que faz o processo de tradução do que chamamos de verdades cósmicas, vibrações que têm a ver com todos os seres humanos e com cada um de forma específica. Faço um movimento constante de contato com eles, estou sempre ouvindo e colocando o que ouço dentro do meu universo imediato. Procuro

exemplo, tenho um tom de olho esverdeado. O olho é a janela da alma, e a alma tem o conhecimento do que viemos fazer nesta encarnação. O tom de olho verde diz que eu vim para aprender a me amar, a me priorizar. Em outras encarnações, eu devo ter feito mais movimentos para fora, para os outros, agora, a idéia é que eu possa fazer movimentos internalizados. Meu corpo físico traz duas pintas em cima do coração, e isso é sinal de um bloqueio de afeto. O coração é um órgão que

Muito de nós, até pelos condicionamentos que sofremos ao longo do tempo, não acreditamos em nossas capacidades. Principalmente quem escolheu nascer no Brasil, que tem uma menos valia internalizada.

sentir no meu corpo vibrações minhas ou de pessoas ligadas a mim. Quando estou com meus pacientes, tento buscar esses movimentos das entidades, dos guias, dos anjos da guarda, para que eu possa conduzir aquela possibilidade de evolução da melhor forma possível. Mas eles só se manifestam na medida em que há permissão para isso, porque são respeitosos, generosos e não invasivos. Hoje você tem consciência de por que encarnou? Estou o tempo todo fazendo essa busca. Quem sou eu, o que eu quero, qual a contribuição posso dar. Por

trabalha o amor por si. Tem a velha frase “Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”. A gente aprendeu a amar a Deus e ao outro, mas não aprendeu a se amar. Quem tem esse desafio nesta encarnação vem com olho verde. Na medida em que eu desenvolver isso, terei condição de reconhecer em mim a trajetória que me é pedida. E o que você tem feito nesse sentido? Durante 15 anos eu trabalhei de Domingo a Domingo, dava aulas, assistia a aulas, atendia... Mas nos últimos quatro anos, quando eu saí do Núcleo [de Leitura Corporal]


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e fui para o consultório, tenho buscado me cuidar. Hoje em dia sou capaz de ter final de semana e tenho buscado estar mais livre. Estou aprendendo a sair nos feriados para lugares que eu gosto, como cachoeiras, perto de Belo Horizonte, para não ter que ficar dirigindo dez horas. Eu não gosto de dirigir. Gosto de ver o tempo, a paisagem. Quando estou dirigindo tenho que ficar muito focada e isso me cansa. Nessa de sempre fazer um esforço a mais, gastei muita energia renal. Eu sei disso porque comecei a ter cabelo branco aos 35 anos. Por volta dos 44, estimulada também pela Leitura, resolvi parar de pintar. Também não estava dando mais, ou eu escolhia ficar com o cabelo branco, ou ficava sem cabelo, porque, com os químicos, ele estava virando uma palha. Como eu tenho o couro cabeludo rosa, ele ficava tingido também, então era horrível.

Você é muito vaidosa? Eu sou vaidosa. O próprio fato de eu ter cabelo branco é um sinal de vaidade, porque gosto de ter ele assim. E voltei a cuidar mais do meu corpo. Eu era atleta, e depois fiquei parada por muitos anos. Hoje reservo um tempo para fazer ginástica, porque estou com 50 anos e adoro usar salto. Se não fizer ginástica, não agüento. Eu não vejo muito sentido em malhar para ficar com o corpo durinho para o outro, para mim as coisas tem que ter um “pra que”. E eu sinto que o corpo também precisa estar mais mexido para não nos acomodarmos. Como eu tenho muita energia, as entidades me dizem que a possibilidade de longevidade é muito grande no meu caso. Então vou me cuidar, porque não quero me aposentar, quero chegar até os meus 120 anos com muita saúde e disposição para dar continuidade a meu trabalho, a tudo isso que estamos veiculando hoje.

Como foi se casar ainda na faculdade?

Você não pretende se casar de novo?

Eu decidi me casar e não sei muito bem por que. Acho que estava querendo sair de casa, andava meio cansada da dinâmica familiar em que vivia. Aos 19 anos, conheci meu ex-marido, ele era apenas quatro anos mais velho que eu. Nos apaixonamos e resolvemos nos casar, mas éramos muito imaturos.

Eu estou num processo de maturação disso tudo, tentando perceber o que consigo suportar e o que não consigo. Não acho que as pessoas que estão juntas, hoje em dia, tenham o nível de intimidade necessário ou se sintam à vontade o suficiente. É muito isolamento ou muita briga pelo próprio espaço. Por isso, eu tenho optado pelo namoro. Eu vou namorar, porque ainda não sei casar. Como eu sou muito intensa, centralizadora, não gosto de abrir mão do que quero fazer, seja lá pelo que for. E na relação a dois é preciso negociar excessivamente. Sabe aquela coisa de “Ah, eu não quero papo cabeça”, que os homens em geral dizem? Eu fico olhando e penso que então realmente não vai dar pra mim. Sou um ser humano muito emocional e confio nas minhas reações, apesar de me dar mal às vezes. Não deixo de fazer ou falar das coi-

Foi difícil se divorciar? Eu me senti muito mais livre pra fazer a minha história do meu jeito. Voltei a trabalhar, fui impulsionada, segui minha direção. Nós não sabíamos como desenvolver a prática de estar juntos. Compartilhar o mesmo espaço de forma tão próxima entre dois adultos é muito complicado. Dá pra fazer isso com as crianças, porque a gente vai se adaptando às várias fases delas. Mas entre adultos já resolvidos e com demandas tão diferentes na vida não é fácil.


Nunca ficamos sozinhos no universo. Quando morremos, caímos direto nos braços de nossa família cósmica.

sas porque sinto que é inadequado. Muitas vezes, o outro pode não gostar, mas isso é necessário. Assim, ganho alguns inimigos, mas continuo acreditando que precisamos ter inimigos, porque se você só tem amigos, tem algo errado. Não fico presa à obrigação de ter uma vida harmônica, feliz, acredito que a vida é um procedimento dinâmico. Mas a gente ainda busca muita segurança, né? Eu era muito insegura, achava que as coisas tinham que dar certo, que eu tinha que me preparar para a vida. Com a espiritualidade, fui aprendendo que tem hora que não temos segurança nenhuma. Vivemos em cima de uma crosta de terra fininha e construímos uma casa ou um sítio sobre ela, se a Terra balançar, acabou tudo. Na realidade, o processo é de insegurança com momentos de segurança, quando você se vê harmonizada com esse todo.

A vida a dois ainda é de posse. Acho um absurdo alguém querer controlar o outro nesse nível e se impor. Não acredito que o casamento tenha que acabar, mas é preciso ampliar um pouco mais, libertar esse companheiro, essa companheira. Não é fácil, ainda não estamos muito preparados para isso. Como é ser mãe pra você? Ser mãe pra mim é uma das oportunidades mais ricas. Eu sempre fui uma pessoa de cuidar, minha opção profissional, que antecedeu aos meus filhos, já era muito coerente com isso. Sou muito responsável, gosto de orientar. Brigo sim, já tomei decisões muito complicadas na minha vida com meus filhos, tanto que hoje eu tenho uma filha que não mora comigo, porque ela não deu conta de mim. Mas acho uma experiência única. Acredito que as pessoas que não se colocaram à disposição de ter filhos perdem uma gama

muito intensa de estímulos. Não acho que está certo ou errado, mas ter filhos é uma experiência de estimulação muito grande. Principalmente com os bebês e as crianças mais novas, a gente revê muitas coisas que já viveu. Posso não ser essa mãe amorosa, afetiva, porque realmente não sou muito, mas sinto que, na medida do possível, estou junto com eles. Eu amadureci muito depois que me permiti a maternidade. E como você é como mãe? Eu sempre fui muito centralizadora, o meu cuidado é meio de galinha, que coloca os filhotes debaixo das asas, e não dá pra ser assim, principalmente no mundo atual. Estou aprendendo a deixá-los fazer o caminho que considerarem o mais adequado. Não é fácil, mas eu tenho tentado. Acho que eu protejo muito os meninos. Tudo é muito dentro de casa, muito pronto pra eles. Antes eu não saía nos finais de semana sem que os

três estivessem comigo. Hoje eu estou aprendendo a sair sozinha ou só com um deles. Mas sou muito clara em relação a invasão. Eu cuido muito do meu estômago e não quero ser invadida por sapo nenhum. É difícil, porque quem invade pode não perceber; cabe a quem é invadido se colocar. Às vezes a gente faz isso falando alto, xingando, mas eu procuro deixar bem claro da forma o mais harmônica possível. Talvez o maior desafio seja ir se colocando e mantendo o afeto ao mesmo tempo. Também não quero ficar sozinha no mundo. Sua mãe era assim como você é com seus filhos? Minha mãe é uma guerreira, herdei essa energia dela, de lutar pelo que quero, de não abrir mão daquilo que sinto que é importante. Ela é muito afetiva, se preocupa demais com a família e tem muito medo de mudanças. Meus pais fizeram 50 anos de casados, e

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O caos tem uma harmonia que ainda não compreendemos. eu e meus irmãos estávamos pensando em trazê-los para um apartamento próximo ao meu, mas ela fica insegura, quer ficar na casinha dela. Eu sinto que seu maior medo é o medo de morrer. Você tem medo de morrer?

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Tenho. Eu não sei como vai ser. Tenho algumas memórias de morte, de vidas anteriores. Eu entendo que conseguimos filosofar sobre isso, mas para viver realmente o processo, seja com parentes próximos, ou imaginando a própria morte, ainda temos que evoluir muito. Os orientais já têm uma evolução maior nessa direção. Nós, ocidentais, ainda somos muito apegados a essa vida materializada. As entidades ensinam muito, mas esse aprendizado ainda é distante, pelo menos pra mim. Eles vivem falando que o procedimento de morte é mais libertador que o de nascimento. A morte amplia o indivíduo, você faz um movimento de expansão, mas para nascer, é preciso fazer um movimento de

Que mudança?

retração. Além de tudo, nunca ficamos sozinhos no universo, é como se caíssemos direto nos braços de nossa família cósmica. Ninguém morre para ser castigado. A morte sempre vem como uma possibilidade de evolução. Você disse que quer viver até os 120 anos. O que você espera para esses próximos 70 anos ou mais? Espero amadurecer o que ainda não consegui, poder compartilhar, não apenas com um companheiro, mas com uma comunidade, junto com meus filhos, netos, bisnetos – porque com 120 tem que ter até bisneto, né? O processo de aprendizado é o que eu mais valorizo. Eu tenho metas, vontades, projetos, mas eu não quero congelá-los, quero ir sentindo e vivendo de uma forma cada vez mais ampla. Hoje eu tenho um consultório todo estruturado, amanhã pode ser que seja diferente. Aliás, todo o planeta está passando por uma mudança.

A Terra está fazendo a correção de seu eixo em relação aos outros planetas e, com isso, devemos passar por mudanças muito grandes, como vem acontecendo nos últimos dez anos. A natureza está se modificando com o derretimento das geleiras e a camada de ozônio, por exemplo. Atualmente, usamos apenas 12, 13% da nossa capacidade sutil e sensorial, com 14, 15%, somos capazes de levitar. E se levitarmos muda tudo. Não estamos apoiados no chão como a gente imagina, já existe uma diferença mínima entre o nosso toque e a superfície do planeta. Se conseguirmos um pouquinho mais, ficaremos livres do carro, do transporte, e isso pode modificar nosso dia-a-dia de várias formas. Como se preparar para essas transformações? Desenvolvendo nossa capacidade sutil, sensorial, porque paranormais nós somos todos. Só que, muito de nós, até pelos condicionamentos que sofremos ao longo do tempo, não acreditamos em nossas capacidades. Principalmente quem escolheu nascer no Brasil, que tem uma menos valia internalizada. Somos seres de muita capacidade, mas sempre escolhemos o lado da modéstia para falar das nossas

qualidades e potencialidades. As pessoas que chegam ao consultório sempre estão buscando analisar aquilo que não está bom e ficam muito presas nisso. Elas se esquecem de que existem alternativas para se resolver as questões que se colocam em nossas vidas. Só assim vamos desenvolvendo e validando nossa capacidade espiritual. Claro que temos encarnações mil pela frente, e mesmo na destruição existe sempre um objetivo. Como? Eu não acredito que estejamos destruindo por destruir. Existe todo um processo que não compreendemos ainda. Se o planeta, que é a grande entidade, não estivesse de acordo, podem ter certeza de que ninguém estava fazendo. O caos tem uma explicação, tem uma harmonia. O que gera tanta violência? A violência sempre esteve presente na nossa história como seres humanos, mas o que faz com que um ser humano ameace tanto o outro com palavras, com armas e de várias formas? O quê? Quando nos voltamos para o microcosmo, percebemos que somos seres muito violentos. O que significa violência na vida? Você estar com fome e não parar de trabalhar para comer, não buscar um agasalho


quando está com frio, suportar as coisas como a gente faz. São pequenas violências que alimentam as grandes violências que estão lá fora. Muitas pessoas dizem: “Não, eu não participo disso. Violento é o pivete, o criminoso”. A energia vai continuar a mesma até aquela figura ver a violência que existe dentro dela. E isso pode demorar séculos, como tem demorado. À medida que eu foco minha própria violência, estou contribuindo para a paz, que se inicia no micro para se reverberar no macro. Qual é a sua verdade que você quer deixar quando for para um outro plano? A maioria de nós ainda morre do coração, que é o órgão do amor próprio. Claro que o outro é importante, o outro é 50% do nosso caminho, mas se a gente não aprender a fazer os 50% que são nossos, nosso coração vai fazer um enfarto e nos tirar a possibilidade da experimentação através da encarnação. A experiência encarnatória é profunda e não há a necessidade de sofrimento, de um modo geral, isso é só um condicionamento. A idéia de se viver com prazer é o que nos liberta. É muito bom estar vivo, é gostoso trocar, sentir, receber. Minha missão, pelo que consigo entender, é divulgar essa experiência de ampliação e de contato comigo mesma para que eu possa ter contato também com o outro. É aprender a me cuidar, a ficar comigo, a gostar de mim. Isso me faria feliz. t

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Mais

feito a mão

luz

Tradicionalmente marcantes em festividades e rituais de passagem, as velas dão cara nova à decoração de ambientes e conseguem transformar qualquer instante num momento especial.

14 Há 12 anos, o administrador Charles Resende se tornou artesão. Uma tia, recém-chegada da Alemanha, trouxe-lhe algumas velas ornamentais de presente, e nelas, o rapaz viu a oportunidade de abrir o próprio negócio. “Eu ainda não tinha visto nada assim por aqui e decidi fabricá-las”, conta. Ele lembra que, no começo, as velas ainda eram muito associadas à religiosidade. Por causa disso, a alternativa foi trabalhar com tons pastéis e evitar o preto e o vermelho, normalmente ligados à prática de magias. De lá pra cá, o produto ganhou novos sentidos. Além de iluminar jantares, ornamenta e perfuma ambientes e ajuda a criar o clima necessário para recepções mais calorosas. “As velas remetem à idéia de ancestralidade, aconchego, família e interior e, ao mesmo tempo, de sofisticação e modernidade”, diz o artesão. Ultimamente, preto, branco e vermelho estão na moda e compõem decorações orientais. Para Charles, os mineiros constituem um público bastante seletivo e exigente, mas um


Faça suas próprias velas A diversão está em dar ao produto seu toque especial e perceber a marca única que cada um pode deixar na arte que faz com as próprias mãos. Para isso, os ingredientes básicos são criatividade e disposição para experimentar.

tanto tradicional. Cores suaves, linhas retas e formas geométricas regulares ainda são a preferência do consumidor, pois trazem harmonia ao ambiente e podem ficar mais tempo na decoração sem cansar os olhos de quem sempre passa pelo local. E “mineiro que é mineiro”, além de não ser muito dado a mudanças, se preocupa com preço e durabilidade. Por causa disso, o consumo de luminárias (velas ocas com refil interno) é cada vez maior. A peça fica intacta e pode ser reutilizada várias vezes. O refil tem um preço bem acessível e é facilmente reposto. Com essa vantagem, cada vez mais pessoas adquirem o hábito de acender velas em seu dia-a-dia. Há quem crie um laço afetivo com suas velas e não queira queimá-las de jeito nenhum. Nesse caso, elas podem ficar apenas enfeitando, pelo menos até que apareça uma ocasião em que valha a pena acendê-las para celebrar, acolher, perfumar e proporcionar mais luz – ou, convenientemente, menos. Deixe que o fogo faça a energia fluir.

Derreta a parafina – em barra, lentilhas ou pó –, a cera micro (10% da quantidade de parafina) e a estearina (5%), em banhomaria, sempre em fogo baixo. Algumas parafinas já vêm com esses aditivos de fábrica. Gotas de vinagre diluídas na água evitam que as panelas fiquem pretas. Meça a quantidade de água que cabe na fôrma que será utilizada para fazer a vela. Essa é a quantidade de parafina a ser derretida. Se estiver em barras, deve ser quebrada em pedaços pequenos. Cuidado: a parafina é inflamável e o recipiente que a contém não pode ficar em contato direto com o fogo. Ela não deve ser fervida e começa a derreter a 60, 70º, por isso a temperatura não precisa ser muito superior a isso. Fora do fogo, acrescente corantes (1 a 3 gramas por quilo de parafina) e essências (1 colher de sopa por quilo), específicos para bases oleosas. Para verificar se a cor está correta, coloque um pouquinho da parafina colorida sobre uma superfície de mármore ou inox e espere secar. Unte a fôrma com vaselina líquida e centralize o pavio ou barbante encerado. As fôrmas podem ser de alumínio, metal, gesso ou silicone. Dois palitos grandes colocados horizontalmente sobre a fôrma, um de cada lado do pavio, ajudam a segurá-lo e mantê-lo esticado. Despeje a parafina colorida deixando um espaço até a borda. Quando ela começar a endurecer, faça furos de aproximadamente 3 cm de profundidade em volta do pavio para evitar que a vela se deforme. Derreta mais um pouco de parafina a 10º acima da temperatura atingida anteriormente e complete os furos. Para que fique uniforme, o limite da vela não deve ser ultrapassado. Deixe que a parafina endureça completamente para desenformar. O acabamento pode ser feito por meio de raspagem, com uma faca de cozinha, ou utilizando um ferro de passar roupas, em temperatura baixa, para tornar a superfície mais homogênea.

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De dentro para fora toques

Para ter pele bonita e olhar para dentro de si.

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Elemento que compõe

cabelo sedoso, basta

2/3 do nosso corpo, a água não favorece apenas a emoção e a intuição, pode ser também grande uma aliada do seu visual.

Hidratação. Essa é a palavra-chave para muitos profissionais de saúde e de estética quando o assunto é beleza. Os “famosos” dois litros de água que devem ser ingeridos diariamente, de fato, ajudam no funcionamento do organismo e isso reflete diretamente na vitalidade do corpo. Tão importante quanto o volume de água que se consome, é a regularidade dessa prática. “O ideal é tomar 200 ml de água por hora, tendo sede ou não. Isso faz a pele ficar mais bonita, porque hidrata, lubrifica e elimina toxinas. Não adianta tomar tudo de uma vez, porque o estômago não absorve”, afirma a fitoterapeuta Bernadete Parentoni. Ela conta que a ingestão incorreta de água pode resultar na falta de brilho dos cabelos, descamação do couro cabeludo, enfraquecimento e queda dos pêlos, ressecamento da pele – o que provoca envelhecimento – e lesões, como a acne, causadas pela eliminação inadequada de toxinas que acabam se acumulando. Para saber se a hidratação está adequada, a dica é observar a urina. “Ela deve ser incolor. Se estiver amarelada, é porque a ingestão de água está insuficiente”. Esses cuidados são fundamentais. No entanto, o excesso de água não traz benefícios adicionais para a pele, se comparado à ingestão regular. “Dois litros bastam. Beber água de forma exagerada não ajuda no cuidado com a pele, altera, por exemplo, o funcionamento do intestino”, esclarece a dermatologista Patrícia Paturle. Ela diz que frutas, sucos e outros alimentos que


e de fora para dentro Por Manoella Oliveira

possuem percentual de água elevado também são boas fontes de hidratação. Além disso, usar cremes no rosto e no corpo, diariamente, favorece a reposição da umidade da pele, o que deve ser feito após o banho, quando a capacidade de absorção é ainda maior. O mercado apresenta variedade de substâncias que atendem desde a pele seca até as acnéicas. Em função de seu poder de hidratação, os produtos mais indicados são à base de uréia. Outra opção são os óleos, que exercem papel diferente dos cremes e têm sua própria forma de uso. “O óleo retém a umidade da pele, por isso, o ideal é passar durante o banho ou ao final dele, com um último enxágüe rápido para tirar o excesso. Para as pessoas de pele seca, passar óleo no corpo já enxuto não ajuda muito”, explica a dermatologista.

Quando o excesso de água resseca Pensando de forma simplista, o melhor para quem tem pele oleosa seria lavar o rosto várias vezes, retirar a gordura, e resolver de forma mais prática, sem uso de tantos produtos, o problema da acne, certo? Errado! O ideal, mesmo para quem tem pele acnéica, é lavar o rosto entre duas e três vezes ao dia. Ultrapassar esse número pode trazer problemas. O primeiro deles é o ressecamento, que irrita a pele, especialmente enquanto se faz uso de medicamentos, como ácidos. Outra questão é que lavar em demasia

gera rebote da oleosidade, ou seja, o problema piora a longo prazo. Uma tentação que pode prejudicar nossa cútis são os banhos demorados. Para a dermatologia, o correto é tomá-los mais rápidos, mornos e sem bucha. Quanto ao sabonete, o ideal é que seja neutro, sem corantes. “Acredita-se que quanto mais colorido e perfumado, mais agressivo ele é. De forma geral, o sabonete resseca a pele, então deve ser usado em maior quantidade apenas nas axilas, nos pés e na virilha”, explica Patrícia. Ironicamente, o inverno, quando a vontade de ficar embaixo do chuveiro por horas e horas aumenta, é o pior momento para passar tanto tempo no banho. Além de o frio ressecar a pele, a água tende a ser mais quente, o que também contribui para esse desgaste. Apesar dos malefícios, mesmo os especialistas concordam que, se por um lado esse excesso é ruim, por outro, uma ducha forte é relaxante, acalma, e é uma boa maneira de sentir as propriedades terapêuticas da água. Para muitos, e especificamente para praticantes da Hatha Yoga, a chuveirada é mais que a limpeza do corpo físico: pelo ralo descem angústias, cansaço e maus pensamentos, é uma espécie de purificação. Mas isso não é desculpa para fazer do banho demorado um hábito. Para evitar problemas de pele e aproveitar ao máximo tudo que o “segundo elemento” tem a nos oferecer, experimente:

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Banho vital*

Compressas

Assente-se em uma bacia com água fria, até a altura da virilha. Molhe um pano dobrado e, com movimentos regulares, subindo e descendo, massageie desde a virilha até a altura do umbigo, por 20 minutos. Durante o procedimento, os pés devem estar numa bacia com água quente. “É uma das práticas hidroterápicas mais eficazes. Atua nos sistemas nervoso, circulatório e excretor, regulariza a digestão, estimula os rins, combate a insônia e expulsa as toxinas do organismo. Ao eliminá-las, a pele melhora, especialmente a de quem tem problemas com acne”, afirma a fitoterapeuta Bernadete Parentoni.

Gele aproximadamente 300 ml de água e coloque sobre a testa e os olhos, durante 20 minutos, para aliviar as olheiras. É ideal para pré-maquilagem, mas pode ser aplicada sempre que elas estiverem salientes – se forem muito escurecidas, faça três vezes por semana. A compressa também pode ser feita com chá de camomila.

Banho de imersão aliado a aromaterapia

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Encha uma banheira com a água mais quente suportável, e fique apenas com a cabeça para fora. Coloque cinco gotas de essência de camomila, dez de alecrim e dez de lavanda. Permaneça enquanto a água estiver em temperatura agradável e seque-se sem enxágüe. Esse banho combate o cansaço físico e mental, relaxa e revigora as energias.

Escalda-pés* Encha um recipiente com água fria e outro com água bem quente. Durante 5 minutos, coloque seus pés na água quente e depois, por um minuto, na fria. Repita três vezes, de forma a finalizar a prática com os pés na água fria. Quando terminar, seque-se e calce meias. “É uma forma de trabalhar os sistemas circulatório e nervoso. Funciona melhor quando acrescentamos infusão de ervas e sal marinho. A água quente libera os princípios ativos da erva e potencializa os efeitos: descansa e amacia os pés e, indiretamente, tende a aliviar as varizes, enfermidades do sistema circulatório”, explica Bernadete.

Hidratação capilar O vapor d’água potencializa a hidratação, por isso é muito utilizado em salões de beleza. Após lavar o cabelo com xampu adequado para esse tratamento, aplica-se um creme nas madeixas antes de deixá-las no vapor em um aparelho próprio – o que também pode ser feito em casa, com uma touca metalizada.

Águas termais São ricas em sais minerais como cálcio, magnésio e ferro, têm propriedades calmantes e são encontradas em Araxá, Poços de Caldas e Caxambu, para citar poucos exemplos nacionais. A água termal é mais indicada a pacientes que fazem tratamento com ácidos, por ser antiinflamatória, e também para efeito de refrescância e alívio. Nas farmácias pode ser encontrada no formato aerossol. Outra opção é ir às fontes naturais brasileiras e aproveitar a água, em todos os sentidos.


Água e energia

Esportes

Promover o funcionamento do corpo é uma das funções mais importantes da água, no entanto, não é a única. O terapeuta corporal Fábio Oliveira informa que é ela que faz o corpo funcionar e as células se unirem. “Ao ser ingerida, ela limpa os rins e serve também para flexibilizar a estrutura, tais como tendões, ligamentos e articulações, além de fazer a limpeza de todas as nossas mucosas, que precisam estar hidratadas. E quando digo que precisamos ‘tomar água’, digo água pura, não é refrigerante”. Mas seus benefícios não se limitam ao nível físico. Apesar de ser coordenada apenas pelo segundo chakra – que rege o prazer –, ela atua nos sete, em todas as vibrações do corpo. De acordo com a Leitura Corporal, harmonizar esse segundo centro de força, por meio do contato do corpo com a água, estimula todos os sensores da pele, ativa o sentimento de pertencer e integrar-se com o planeta, e faz o indivíduo despertar em direção às vivências que impulsionam prazer. O pesquisador japonês Masaru Emoto foi mais longe. Em seu livro As Mensagens da Água, ele afirma que pensamentos, palavras, idéias, enfim, vibrações, afetam a forma molecular dessa substância. Emoto registrou, fotograficamente, as transformações por que passaram as moléculas influenciadas por energias diferentes. As águas de rios poluídos apresentaram estruturas assimétricas, enquanto as que estavam em um ambiente onde tocava música clássica assemelhavam-se a cristais. O mesmo aconteceu com a água contida em frascos, em que bilhetes contendo palavras como “obrigado” e frases como “você me faz mal” foram amarrados. O estudo demonstra que a água é vulnerável às alterações do ambiente e assimila, facilmente, as vibrações a que é submetida. Pense bem.

Natação

*indicações de Bernadete Parentoni, baseadas no livro O médico da água, de Sebastião Kneipp.

A procura maior é por aqueles que querem aprender a nadar, mas a prática auxilia no emagrecimento e mantém a saúde em dia. “Como é um trabalho aeróbico, melhora a parte cardiorespiratória, a resistência física, a circulação sanguínea e o transporte de oxigênio”, explica a professora de atividades aquáticas, Ivana Gouvêa. Para quem quer perder peso e não gosta de malhar, a natação é uma boa escolha por ser uma atividade prazerosa e sem restrição de idade. Alguns pais já aderiram à natação para bebês, uma oportunidade de curtirem os filhos enquanto se trabalha o contato da criança com a água.

Hidroginástica É uma atividade que não tem impacto, permite maior flexibilidade, é relaxante e oferece menos chances de o aluno sentir dor depois da prática. Os exercícios são aeróbicos, ou seja, visam o conjunto, como a melhora da respiração, da circulação, da força muscular e favorece a perda de peso. “Meus alunos freqüentam as aulas mais para se socializarem, conversarem e trocarem receitas do que por uma questão física”, conta Ivana. A modalidade permite inserção de coreografias e aulas temáticas.

Hidrospinning Versão do spinning indoor (atividade com bicicletas) adaptado para água. É voltado para o fortalecimento das musculaturas inferior e superior e para o sistema circulatório. “A água entra como fator relaxante e de leveza. Com o corpo submerso, o peso diminui, fora da água as pessoas se sentem mais pesadas, mais cansadas”, diz a professora. Outras modalidades vêm sendo adaptadas para a água como o hidrojump e o hidrostep (uso de camas-elásticas ou steps no interior da piscina). “Fora da água o impacto é muito maior, o joelho nem sempre agüenta. As atividades aquáticas dão menos problema para as articulações e são mais agradáveis”, completa. t

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ecos

Bifásicos, não por acaso

20 Que óleo e água não se misturam, você já sabe. Chegou a hora de descobrir por que isso não deve acontecer, especialmente na pia da sua casa.

O que acontece? Após ser usado para fritura uma ou mais vezes, o óleo é descartado em bueiros, vasos sanitários, diretamente no lixo ou, o mais comum, em pias de cozinha.

Que problemas isso causa? Por não se diluir na água, o óleo lançado diretamente na pia e a gordura de utensílios domésticos tendem a formar placas e entupir a tubulação. “O esgoto e as partículas de comida que aos poucos vão se acumulando atraem diversos organismos, como baratas e roedores, que representam um risco para a saúde das pessoas, explica o professor e engenheiro

sanitarista Hiram Sartori. O entupimento pode causar refluxos, mau cheiro e até rompimentos nas redes de coleta. Além disso, a decomposição do óleo retira o oxigênio da água, gás vital à fauna e à flora aquáticas. Outras reações químicas provocam, ainda, a emissão de um dos gases responsáveis pelo aquecimento do planeta, o metano, para a atmosfera. “Óleo de fritura, margarina e manteiga, banha, óleos e graxas provenientes de carnes poluem os corpos receptores e, por serem mais leves que a água, formam uma película na superfície que impede a entrada de oxigênio e luz, necessários à vida aquática. Esses corpos d’água poluídos podem exigir elevado custo para a sua recuperação, consumindo verbas que poderiam ser empregadas para outras ações ambientais”, alerta Hiram. Todos os óleos comestíveis (e isso inclui o azeite) causam os mesmos danos ao meio ambiente e à tubulação – e não adianta jogar água quente pela pia na tentativa de diluí-los.


Os melhores óleos para... Fritar: óleo de soja e de amendoim. Refogar: óleo de soja, de girassol e de milho. Se comer cru: azeite de oliva, óleo de soja, de gergelim,

de girassol, de canola, de algodão, de milho.

21 O que posso fazer? A Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), responsável pela coleta, transporte e destinação final dos resíduos sólidos domiciliares de Belo Horizonte, recomenda que o óleo rançoso seja armazenado em recipientes com tampa rosqueável, como garrafas pet. Quando a reserva atingir volume considerável, o produto deve ser doado a pessoas ou empresas, para reciclagem. A partir do óleo, pode-se produzir sabão, detergente, combustível renovável (biodiesel), ração animal, massa de vidro e resina para tintas, dentre outros. As sobras de óleo vegetal utilizadas em frituras não podem ser dispostas para a coleta pública em Belo Horizonte, segundo a SLU, já que seu aterro sanitário é licenciado para tratamento de resíduos sólidos e não existe regulação específica para gordura. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, também não há normas federais para o tema. Em outros locais do país, no entanto, são muitas as iniciativas Em São Paulo, existe o Programa Estadual de Tratamento e Reciclagem de Óleos e Gorduras de Origem Vegetal ou Animal e Uso Culinário; em Curitiba (PR), a prefeitura recolhe óleo de cozinha nos terminais de ônibus da capital e nos chamados pontos do Câmbio Verde, cujas famílias cadastradas recebem um quilo de hortifrutigranjeiros para cada dois litros de óleo doados;

na cidade do Rio de Janeiro, a prefeitura firmou convênio com a Universidade Federal do Estado (UFRJ), que recebe óleo de fritura para produção de biodiesel, usado nos veículos das duas instituições; em Taquara (RS), as empresas garantem a coleta de seu óleo velho, que é encaminhado para a indústria de tintas. No estado de São Paulo, já existem três usinas de biodiesel: em Sumaré, Campinas e Indaiatuba, esta em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Para saber mais sobre biodiesel e os incentivos do governo federal à sua produção, acesse www.biodiesel.gov.br.

Quem pode me ajudar? A Tele-óleo, de Belo Horizonte, recolhe óleo usado em domicílios, restaurantes, hospitais e lanchonetes, gratuitamente, e encaminha para produção de massa de vidro e ração animal. A empresa coleta volumes acima de 30 litros e doa material de limpeza a seus colaborares. Para solicitar seus serviços, ligue (31) 3386- 5016. Se você não tiver espaço para armazenar sobras de óleo, outra alternativa é transformá-lo em sabão caseiro (ver receita).


De óleo a sabão Material

Preparo

3,5 litros de óleo de fritura vegetal ou gordura animal

Em um recipiente fundo, de plástico (um balde, por exemplo), misture a soda cáustica na água. Depois que a soda estiver totalmente dissolvida, acrescente o óleo e o álcool. Mexa com algum utensílio de madeira por aproximadamente 10 minutos, até a formação de espuma na superfície.

1 litro de água 2 litros de álcool 500 gramas de soda cáustica * receita cedida por Nilza Soares.

Ainda quente, despeje o conteúdo, cuidadosamente, em pequenas vasilhas, como embalagens de margarina,

ou, se preferir, use uma bacia maior e corte o sabão em barras. Deixe o produto “descansar” durante 12h antes de usá-lo. Atenção: Todo o processo deve ser realizado em área aberta ou ventilada. Materiais de alumínio são corroídos pela soda cáustica, por isso, opte por madeira e plástico. Aconselha-se o uso de luvas no manuseio da soda, para evitar lesões na pele.

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Porque não devo reutilizar óleo de fritura Os óleos têm uma propriedade chamada “ponto de fumaça” que, quando atingido, forma um composto tóxico chamado acroleína. “Quanto mais se frita, mais acroleína se forma. Quando se diz que o óleo saturou, não significa que ele virou gordura saturada, aquela que aumenta o nível de colesterol, mas se fala no sentido de que ele está cheio de acroleína. Quanto mais se usa o mesmo óleo, mais ele degrada e, quanto mais degradado, mais fácil é atingir seu ponto de fumaça”, explica a nutricionista Juliana Lauar. A ingestão desse composto prejudica o sistema nervoso, irrita as mucosas gastrointestinal e bucal e pode causar câncer. Por esse motivo, os especialistas recomendam que o óleo de cozinha não seja reutilizado e indicam azeite extra virgem de primeira extração a frio para se comer cru, já que o ponto de fumaça do azeite é baixo. Juliana atenta, ainda, para o fato de que óleos que apresentam espuma no

momento da fritura estão perdendo suas propriedades normais e não devem ser consumidos. Para conservar o óleo, uma dica é guardá-lo em frascos de vidro e alumínio, por serem pouco reagentes, e em ambientes escuros, já que ele se decompõe em contato com luz e oxigênio. “Devemos nos lembrar de que o consumo de óleo, na proporção certa, é saudável. Ele aumenta o colesterol HDL (o bom colesterol), e é antiaterogênico, ou seja, não deixa formar placas de gordura que entopem artérias mais estreitas”, diz. Para executar suas funções normais, o corpo precisa de que entre 20 e 30% das calorias consumidas diariamente sejam provenientes de gordura. Desse percentual, dois terços devem ser do tipo insaturada. Nessa categoria entram os óleos de origem vegetal presentes em castanhas, amêndoas, avelãs, nozes e óleos de fritura. t


Além de cuidar da casa e da família, fazer yoga e terapia em grupo, decidi freqüentar também os cursos do Programa da Maturidade, oferecidos por uma faculdade de Belo Horizonte. Fui convidada por uma vizinha e amiga que encontrou na instituição força para vencer um câncer, recuperar a auto-estima e a alegria de viver. Ela conta que, ao ouvir relatos dos colegas, viu que não era a única que tinha ficado doente e perdido os cabelos.

voz

Retornar à faculdade 33 anos depois é uma experiência fantástica. A primeira sensação foi a de comparar o que vi com minha graduação na década de 1970, quando cursei Geografia e Complementação em História. No auditório da aula inaugural, me deparei com 400 pessoas da minha faixa etária, a maioria de mulheres aposentadas. Alguns casais freqüentam juntos as atividades. É muito bonito. Ao que parece, todos têm em comum o desejo de ocupar bem o tempo, aprendendo mais, fazendo novas amizades, desenvolvendo-se física e mentalmente. É interessante observar a necessidade de se comunicar, a maneira de vestir e a alegria contagiante dos alunos. Andar pelos corredores da faculdade, encontrando pessoas segurando pastas, livros e outros materiais me remonta à adolescência. Muitos estamos com os cabelos grisalhos, mas com uma disposição quase juvenil.

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As salas do café são as mais agitadas. Um verdadeiro desfile de modas, de sorrisos, abraços, beijinhos, troca de merendas, um legítimo recreio escolar. Sinto-me renovada. Até comprei roupas mais leves e descontraídas. A possibilidade de aprender me deixa mais feliz. Muito mais que conhecimento, o curso nos oferece a oportunidade de descobrir talentos, desenvolver atividades e permite um excelente convívio social. À noite, ainda recebo em casa pessoas para tratamento com terapias holísticas. Pratico Reiki associado à Cromoterapia, além de Magnified Healing (Cura Magnificada do Altíssimo Deus do Universo). Descobri essas habilidades quando ainda me preocupava em saber o que eu faria depois de aposentada. Já me perguntaram se vale a pena me empenhar em tantas atividades. Confesso que fico bastante cansada, mas é gratificante. Não tenho tempo para adoecer, nem para a depressão. Gasto tempo e dinheiro fazendo o que gosto, aprendendo, viajando, ajudando as pessoas e celebrando a vida. Para mim, aposentadoria significa apenas mudança de atividade. Mudança essa, para muito melhor.

Cleuza Lúcia Alexandre Perché tem 58 anos, é casada com Adilson Perché e mãe de Leandro(23), Evandro(21) e André(17).

E VOCÊ, O QUE TEM FEITO PARA SE SENTIR BEM CONSIGO MESMA? CONTE PARA A GENTE! voz@revistatato.com

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curas 24

Que eles mexem com a cabeça da gente e influenciam – e muito – nossos comportamentos, quase todo mundo concorda. E quando se trata dos femininos e masculinos, pode-se falar em consenso. O que pouca gente sabe é que eles têm muito a dizer sobre a maneira como vivemos e, melhor ainda, que podemos atuar diretamente sobre seu funcionamento e nos proporcionar saúde física e psíquica com receitas naturais.


A

linguagem dos

hormônios

Por Thays Prado.

Quem são eles Sônia Hirsch, em seu livro Só para Mulheres*, os define assim: “Hormônios são substâncias microminúsculas que as glândulas endócrinas [hipófise, tireóide, paratireóide, pâncreas, adrenais, ovários e testículos] fabricam e enviam através da corrente sanguínea para influenciar outras partes do corpo. Junto com o sistema nervoso, agem sobre todos os processos do organismo e coordenam as respostas a estímulos banais ou extraordinários”. Para a Leitura Corporal, são os produtos finais dos nossos chakras. Os hormônios femininos e masculinos, produzidos pelos ovários e testículos, estão relacionados com o segundo chakra, localizado na região pélvica e ligado a questões de reprodução, sexualidade, intimidade e flexibilidade.

Estrogênio De acordo com a Medicina, é o “hormônio feminino por natureza”. Responsável pelo desenvolvimento das mamas, dos quadris e do útero, interfere na distribuição da gordura no corpo e, junto com o progesterona, comanda o ciclo menstrual. A Leitura Corporal entende que as taxas hormonais podem ser alteradas para expressar algo que está acontecendo conosco mental ou emocionalmente. Assim, se o estrogênio estiver acima da média normal, “o recado é para que a mulher se veja mais exuberante e com valor. É preciso reconhecer e expressar seu brilho, suas qualidades”, explica o homeopata Luiz Celso Ribeiro, que também tem formação em Leitura Corporal. Ele diz que, por outro lado, se o estrogênio estiver baixo, significa que a mulher está concentrada em uma única

qualidade, vivendo-a no “estrelismo” e não no seu reconhecimento verdadeiro. “O pedido é para a redução da vaidade. Ela não precisa de holofotes para que tenha valor. É importante que ela descubra que existem outras formas de aparecer e não fique focada em uma coisa só”. Durante o mês, o estrogênio passa por períodos em que está mais presente no organismo, ou menos, e isso é natural. Essas leituras servem para alterações fora das taxas normais. Para regular esse hormônio, a natureza oferece rosas. Todas as rosas, independente da cor, possuem estrogênio e androgênio. Quando o estrogênio está mais alto no corpo, é bom mastigar três pétalas cruas absorvendo sua essência. Não é necessário engolir as pétalas se não quiser. Se as taxas não estão alteradas, mas você está se sentindo meio “apagada”, pode comer uma pétala de rosa crua com a intenção de se valorizar mais. A rosa vermelha traz a energia da exuberância, da libido e da sedução, não apenas sexual, mas pela vida, e é uma ótima dica para se evitar a depressão. Um banho com rosas vermelhas pode deixá-la mais sedutora. Se a taxa de estrogênio estiver mais baixa, é preciso que as pétalas sejam escaldadas. Basta colocar três em um coador e jogar água fervente por cima. Nesse caso, elas vão ajudá-la a regular o hormônio sem que ele suba muito e acabe estimulando ainda mais sua vaidade. A Leitura ensina que “é preciso sair do ‘estrelismo’ para se virar estrela”. Essas recomendações também valem para os homens em relação às taxas de androgênios – androsterona e testosterona –, hormônios masculinos produzidos nas suprarenais e nos testículos.

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Progesterona

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Também é produzida nos ovários e seu papel fundamental é preparar o organismo para a gravidez. Segundo a Leitura Corporal, serve para entendermos o significado do yin, do feminino, do que é cuidar, manter, acolher e nutrir. “Tem a função de trabalhar para que você tenha uma vida íntima e doméstica, para que seja cuidada e protegida, mantendo seus aspectos femininos, como se fosse um útero mesmo”, completa Luiz Celso. A progesterona, assim como a testosterona no homem, é o hormônio da afinidade e nos ensina a “estar ao lado de”. Quando se tem dificuldades em usufruir o que possui, ou não se acredita que é possível conseguir aquilo que se quer, é preciso trabalhar a progesterona. Se as taxas estiverem muito elevadas, significa que a mulher está muito yin, se colocando muito “atrás de”. Durante a gravidez, a progesterona aumenta naturalmente, mas mesmo nesse caso há um estímulo hormonal para que a mulher se lembre de que ela não é apenas a mãe do bebê. Quando há uma queda no nível de progesterona, o corpo está comunicando o contrário, que a mulher está muito yang, muito à frente. É preciso ficar mais quietinha, se recolher um pouco e entender que o momento não é tanto de produzir, e sim de preservar e aproveitar aquilo que já foi produzido. A canela em pau é a portadora do equilíbrio entre o yin e o yang e nos ajuda a localizar cada uma dessas forças em nós. A receita é colocar dois pauzinhos de canela, de aproximadamente três centímetros, em meio copo de leite fervente. Espere ficar morno e beba. O fio da casca da banana tem a mesma função que a canela e traz a consciência de grupo, de coletividade. Para quem tem problemas sérios com progesterona, é indicado raspar a parte interna branca da casca da banana e comer.

Testosterona Os testículos são os encarregados da produção desse hormônio, que proporciona aos homens os caracteres masculinos secundários, como voz grossa, pêlos e massa muscular, além de estimular a maturação dos espermatozóides. É considerado pela Leitura Corporal como o masculino da progesterona e cobra afetividade dos homens. Pessoas que usam testosterona sintética para ganhar força e músculos e não desenvolvem, ao mesmo tempo, intimidade e afeto podem ter problemas cardíacos – em virtude de uma frustração do organismo, que não está dando espaço para a amorosidade e a busca de relações que realmente completem o indivíduo – e sexuais, já que, com os altos níveis de testosterona, o corpo não admite apenas “transar por transar” e exige afinidade entre os parceiros. A recomendação é que o homem não se dedique somente à musculação, pois a pelve tende a ficar cada vez mais contraída, o que dificulta o processo de troca com o outro. O ideal seria estimulá-la a se soltar com uma dança, por exemplo. Para o equilíbrio desse hormônio, as indicações são as mesmas da progesterona. Se, além disso, o homem quiser obter os efeitos corporais oferecidos pela testosterona sem se agredir, ele pode tomar chá de sálvia ou de malva. A sálvia estimula o envolvimento consigo mesmo e o amor verdadeiro, e a malva, a busca por intimidade. Quanto mais forte o chá, mais testosterona se está ingerindo. Ele pode ser consumido diariamente, mas é preciso esperar que esteja de morno para frio. Com essas ervas, também é possível cuidar dos seios paranasais (seios da face), que trabalham para que estejamos inteiros em nossas relações e sejamos honestos com nossos sentimentos. Para isso, é preciso deixar a água ferver até pulular e, fora do fogo, colocar um galhinho de sálvia ou malva e tampar o recipiente. Assim que houver vapor, deve-se aspirá-lo, prender a respiração por um instante, e expirar. O procedimento deve feito três vezes, e é importante não aspirar o ar sem vapor durante a série. Depois de um tempo respirando


normalmente, repetese o movimento por mais três vezes, e assim por diante até que a água fervida não produza mais vapor. Para se fazer novamente, nem a água, nem as folhas podem ser reutilizadas. Recomenda-se que haja um intervalo mínimo de três horas entre uma dose e outra. Luiz Celso Ribeiro esclarece que tanto as mulheres quanto os homens possuem hormônios femininos e masculinos, mas as dosagens são diferentes. “A progesterona e o estrogênio são os hormônios da feminilidade para a mulher e nela, a testosterona é importante para fazer o equilíbrio entre o yang e o yin. No homem acontece o contrário, a testosterona é o hormônio da masculinidade, e a progesterona e o estrogênio fazem o equilíbrio”.

Hipófise Trata-se de uma glândula – ligada ao hipotálamo e localizada na caixa craniana – que produz vários hormônios. Está relacionada ao sexto chakra, referente à intuição, à síntese e à consciência. Um de seus produtos é o Hormônio Folículo Estimulante (FSH), cujo papel, na mulher, é agir sobre os folículos que contêm os óvulos e amadurecer um deles por mês. No homem, contribui para a produção dos espermatozóides. “Esse hormônio procura viabilizar o acesso ao desejo, é como se ele fabricasse os sonhos”, diz Luiz Celso. Quando a taxa é alta, é sinal de que o indivíduo está buscando conquistar o que deseja. Quando é baixa, significa que se está apenas na idealização.

O Hormônio Luteinizante (LH) é responsável pela liberação do óvulo na mulher e pela estimulação à produção de testosterona no homem. Para a Leitura Corporal, é o hormônio da auto-apreciação. Níveis elevados de LH dizem que a pessoa está se apreciando demais, e baixos, falam que é necessário colocar-se em ação em vez de apenas se admirar. A prolactina “ajuda na organização e nutrição do feminino, age na mama produzindo leite e atua na realização de projetos”, explica o homeopata. Se ela está em maior quantidade no organismo, é necessário que haja mais preparação antes de agir. Se a prolactina estiver baixa, existe excesso de preparação e o corpo pede que o indivíduo parta para a experiência. A ocitocina, sintetizada pelo hipotálamo e liberada pela hipófise, é o hormônio que promove as contrações uterinas na hora do parto, a emissão de leite durante a sucção e as contrações vaginais que facilitam a subida dos espermatozóides. Estudos recentes têm denominado-a “hormônio do amor”, pois atua juntamente com a serotonina no cérebro dos apaixonados. É considerado também o hormônio da confiança e se refere à força de propulsão do movimento, à assertividade e ao empenho. Luiz Celso afirma que, para que nossos hormônios estejam em ordem, é preciso buscar o equilíbrio entre nossa energia feminina e masculina. “Procurar desenvolver autoconhecimento, ter uma vida mais saudável, colocar intenção naquilo que se deseja, ficar disponível para que as coisas aconteçam, buscar o tesão da vida. Tudo isso vai te ajudar a ter os níveis de hormônios mais ou menos equilibrados. A gente luta por isso a vida inteira”. t

* Ed. Prensa Ltda., 1994.


comigo

Diante da pressão diária, muitas vezes nos esquecemos de que corpo e mente precisam de descanso para continuar funcionando bem. Sem tempo para pausas? Técnicas simples ajudam a renovar as energias e aumentar a disposição em poucos minutos. Antes de começar qualquer uma delas, utilize um incenso para harmonizar o ambiente. Lavanda, alecrim, hortelã e eucalipto são ótimos para relaxar. Não se esqueça de fazer um pedido ao acendê-los.

Relaxa!

28 Azul-celeste

Yoga

A cor oferece paz, serenidade e tem propriedades sedativas. Ao chegar em casa, tome um bom banho com um sabonete azul, ou vista uma roupa azul-claro. Sente-se confortavelmente e respire devagar. Feche os olhos, visualize a cor azul e se imagine absorvendo-a pelos pulmões e por todos os poros de seu corpo. Forme uma redoma de luz azul em sua volta e sinta a paz que habita em seu interior. A sugestão é que se faça esse exercício de 5 a 10 minutos, mas o tempo pode ser alterado de acordo com a disposição de cada um. Pessoas que ficam tristes com mais facilidade não devem utilizar muito o azul, principalmente em roupas e na decoração do quarto, porque isso pode deixá-las um pouco “pra baixo”.

Coloque uma música de que você goste. Fique de pé com os braços relaxados. Sinta as tensões pelo seu corpo e deixe que elas se desfaçam. De 3 a 11 minutos, dance graciosamente sentindo cada parte de você. Ainda de pé, com os olhos fechados, toque todas as áreas de seu corpo suavemente e sem julgamentos de 3 a 5 minutos. Cada centímetro seu deve ser tocado. Perceba a sensibilidade nas palmas de suas mãos. Em seguida, curve-se para frente, relaxe os braços e solte a cabeça. Todos os músculos precisam estar relaxados. Deixe sua respiração acontecer normalmente. Fique nessa posição entre 3 e 11 minutos. Volte para a posição ereta e inspire e expire de forma profunda algumas vezes. Curve-se para trás com cuidado e deixe os braços soltos por 1 minuto. Não controle sua respiração e relaxe completamente. O médico norte-americano, Dharma Singh Khalsa, em seu livro Meditation as Medicine: activate the power of your natural healing force*, explica a relação entre o tempo que se permanece em cada posição do Kundalini Yoga e os efeitos alcançados. Segundo ele, a partir de 3 minutos de prática, há um aumento da circulação sanguínea e da distribuição das secreções neuroendócrinas pelo organismo. De 7 minutos em diante, o campo eletromagnético em torno do corpo se expande e há alteração das ondas cerebrais, passando-se do padrão estático de ondas beta para as ondas alfa, mais calmas e, finalmente, para as ondas delta, de relaxamento profundo. Com 11 minutos, consegue-se obter benefícios para os sistemas nervosos simpático e parassimpático.


29 No chão

Respiração lenta e profunda

Deite-se de costas. Deixe os braços ao lado do tronco, com as palmas das mãos viradas para cima. Os calcanhares ficam unidos e os pés inclinam-se naturalmente para os lados. Se for mais confortável, as pernas podem ficar um pouco abertas. Solte todo o peso de seu corpo e relaxe de 5 a 10 minutos. Para se levantar, vá com calma. Inspire profundamente, expire e comece a movimentar as extremidades de seu corpo, girando pés e mãos. Espreguice-se em todas as direções. Faça uma ligeira torção com a coluna, mantendo os ombros no chão e levando as pernas na diagonal para um lado, e depois para o outro. Esfregue as palmas das mãos e as plantas dos pés. Faça um “balancinho” com a coluna até conseguir se sentar ou vire-se de lado e eleve seu tronco. Andar descalça, de preferência na terra, também ajuda a relaxar, além de descarregar energias negativas e receber energias positivas do planeta.

Sente-se confortavelmente, apóie-se sobre os ísquios (ossos do bumbum) e mantenha a coluna bem ereta. Deixe o baixo ventre ligeiramente contraído para sustentar a região lombar. O queixo fica paralelo ao chão e as mãos podem descansar sobre as pernas ou os joelhos. Preste atenção em seu corpo, se houver algum incômodo, procure eliminá-lo. Esqueça qualquer preocupação durante a prática. Comece a fazer uma respiração consciente, lenta e profunda. Leve o ar para a região de seu abdômen deixando que a musculatura e as costelas se expandam em todas as direções. Mantenha essa parte do corpo repleta de ar e continue inspirando lentamente para que ele também ocupe seu peito e chegue até a garganta. Pare um instante e comece a expiração. Deixe que primeiro saia o ar da parte superior do tronco. Ao soltar o ar que está em seu abdômen, contraia o umbigo para cima e para trás, como se ele fosse encostar-se em sua coluna. Após uma pequena pausa, recomece a inspiração. Pratique por aproximadamente 5 minutos. Para terminar, inspire profundamente e expire. Dicas gentilmente cedidas pela terapeuta corporal Bee Pinheiro [(31) 9162 9384/ (31) 3474 1086], e pelas professoras do programa Mulheres Radiantes, da Associação Brasileira de Amigos do Kundalini Yoga (ABAKY) [www.abaky.org.br]. * Ed. Simon e Schusta, ou pocket Book, 2001.


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essĂŞncias


O Sagrado Por Manoella Oliveira e Thays Prado

Ser mãe, sedutora, sensível e frágil, características comumente associadas às mulheres, eram atribuições rejeitadas pelas pioneiras feministas. Para elas, isso não passava de artimanhas masculinas para aprisionar as mulheres dentro de casa e submetê-las ao poder dos homens. Com o intuito de lutar pela igualdade entre os sexos, o movimento feminista pregava a negação explícita de qualquer manifestação de feminilidade. Mas as moças acabaram misturando dois conceitos: ser mulher e ser feminina. Leonardo Boff, em seu livro Feminino e Masculino*, esclarece que o feminino é um conjunto de características, presentes no homem e na mulher, que representam o mistério, a integralidade, “a capacidade de pensar com o próprio corpo, de decifrar mensagens escondidas sob sinais e símbolos, de interioridade, de sentimento de pertença a um todo maior, de receptividade, de guardar no coração, de poder gerador e nutridor, de vitalidade e de espiritualidade”. Da mesma forma, a mulher tem naturalmente seu lado masculino, que “exprime o outro pólo do ser humano, de razão, de objetividade, de ordenação, de poder, de materialidade e, até, de agressividade”. O Taoísmo, na China, e o Tantra, na Índia, se fundamentam na integração do

Feminino Pela cura do planeta e de nossas feridas internas

feminino e do masculino como caminho para o autoconhecimento. Segundo a tradição oriental, o homem só se completa pelo desenvolvimento do feminino dentro de si mesmo. Esse também é o princípio do Yin Yang, símbolo em que a parte escura representa o feminino e a clara, o masculino. Para mostrar que essas energias não estão separadas, em cada metade existe um círculo da cor oposta. Jung propôs o conceito de animus – aspecto masculino, princípio ativo, intelecto – e anima – aspecto feminino, sentimentos, relações, afetividade – e defendeu que ambos estariam presentes em todos os seres humanos e, em certos períodos da vida, nos identificaríamos mais com um ou com outro. A forma como manifestamos nossas características femininas e masculinas, depende, é claro, da história de vida de cada um e dos valores culturais, familiares e pessoais. Também é natural assumir, conscientemente ou não, posturas voltadas mais para um pólo ou para outro dependendo da ocasião em que nos encontramos. Não existem regras, cada um se mostra como pode ou quer. “O inconsciente coletivo não é nem feminino, nem masculino, é toda a realidade psíquica em potencial”, completa o analista junguiano Carlos Alberto Salles.

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A mulher acabou assumindo uma posição masculina, porque só o masculino era valorizado. Ela precisou retirar o arquétipo da guerreira de dentro de si para competir com os homens.

De qualquer maneira, não se pode negar que o movimento feminista foi muito importante para abrir às mulheres um espaço de expressão além do ambiente da casa. A psicoterapeuta Patrícia Cuocolo, fundadora do Núcleo do Feminino do Espaço Integração, em São Paulo, acredita que a história não poderia ter sido diferente. “O movimento foi agressivo, sim, mas foi uma forma de compensação desse aprisionamento. Era preciso fazer alguma coisa ou o feminino se perderia para sempre. No entanto, a mulher acabou assumindo uma posição masculina, porque só o masculino era valorizado. Ela precisou se expressar assim, retirando a guerreira de dentro de si, para competir com os homens. Só que a mulher não luta com armas, e sim com a alma”. Por isso, começaram a surgir pelo mundo várias iniciativas isoladas, como o movimento hippie, a Nova Era e os cultos marianos, com o intuito de resgatar e valorizar a feminilidade, sem que fosse necessário abrir mão das conquistas das últimas décadas. A Quarta Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher, realizada em Beijing, na China, em 1995, foi uma grande oportunidade para que alguns desses grupos percebessem a necessidade de criar um canal de comunicação entre eles com o propósito de garantir a participação das mulheres no mundo, bem como a igualdade de direitos. Na ocasião, cerca de 180 delegações governamentais e 2.500 organizações não-governamentais estiveram reunidas para discutir ações nesse sentido.

A analista junguiana Jean Shinoda Bolen escreveu em seu livro O Milionésimo Círculo sobre a importância de as mulheres se reunirem para a “cura” do feminino. A autora propõe a formação de um milhão de círculos de pessoas que repensem o feminino na vida diária, o que proporcionaria um salto da sociedade patriarcal para uma organização voltada à reconexão com o feminino, em equilíbrio com o masculino. Os círculos poderiam ter os mais variados objetivos, desde uma organização política até rezar um terço, preparar jantares ou dançar. O importante seria manter o caráter de valorização da feminilidade. Essa idéia se baseia na alegoria que fala sobre cientistas que estudavam colônias de macacos em ilhas do Japão e, para atraí-los até a praia, ofereciam-lhes batatas doces. Um dia, uma macaca chamada Imo teria lavado sua batata no mar antes de comê-la. Com o tempo, os outros macacos da ilha começariam a também lavar suas batatas. Essa mudança de comportamento não ocorreria apenas naquela ilha, mas em todo o arquipélago, apesar de as colônias de macacos não terem contato umas com as outras. A teoria é de que quando uma atitude é repetida por um número mítico de vezes, há uma modificação nos padrões do inconsciente coletivo. Inspiradas por essa idéia, oito mulheres fundaram, em Brasília, no ano 2000, o grupo Rodas da Lua. A ONG realiza danças circulares com a intenção de que mulheres e homens se conectem à sua essência sagrada. Eles acreditam que,


através da dança meditativa, é possível pacificar o mundo, exterminar fronteiras e criar um movimento único. “Com esse trabalho, percebemos que se existe o masculino sacralizado na figura de um Deus, seria impossível não pensar em uma contraparte feminina. Na natureza, observamos que onde há um, há outro. Também nas divindades há de ser assim”, conta uma das integrantes do grupo, Karina Guimarães.

Do matriarcado ao patriarcado Acredita-se que as sociedades antigas se organizavam em torno de uma estrutura matriarcal, como registrou o antropólogo e sociólogo suíço Bachofen em O Direito Materno, escrito no século 19. Ele analisou os mitos da Babilônia anteriores aos escritos bíblicos e descobriu que a primeira divindade cultuada havia sido Tiamat, a Grande Mãe que reinava absoluta. Segundo a mitologia, ela teria sido dominada pelo deus Marduk, que a esquartejou e, das partes de seu corpo, fez o Céu e a Terra, e de suas lágrimas, os rios Tigre e Eufrates. A partir de seus estudos, Bachofen inferiu a alternância de períodos matriarcais e patriarcais nas sociedades antigas. Uma outra evidência do culto às deusas são as esculturas da Vênus de Willendorf, de 30 mil anos atrás. Representada com suas formas femininas avantajadas, era, provavelmente, a deusa da fertilidade. Karina Guimarães afirma que o matriarcado cultuava o sagrado feminino e o poder fecundador da fêmea. “O feminino

estaria presente primeiro na Terra, depois na fêmea, na mulher e nas Deusas”. A passagem do matriarcado para o patriarcado tem versões diferentes. O mitólogo Joseph Campbell afirmava que esse evento se deu no Oriente Médio com as invasões dos semitas e dos indo europeus. “Eles eram caçadores e traduziram a mitologia da caça para a do pastoreio, que continua dirigida aos animais e, quando há caçadores, há pessoas que matam. Com isso surgem os deuses guerreiros como Zeus e Jeová”. Campbell acreditava que teriam sido os hebreus o povo a realmente acabar com as deusas. No Velho Testamento usavam a palavra “abominação” para se referir a elas. Uma outra versão é a de que os povos nórdicos invadiram as comunidades matrilineares européias e introduziram ali sua mitologia. Os bárbaros não tinham um modelo feminino de sociedade e cultuavam certos deuses masculinos violentos. Na Idade da Pedra, as sociedades focadas numa linhagem feminina eram cooperativas, não competitivas, baseadas na colheita de alimentos e sementes e na tecelagem, funções desempenhadas pelas mulheres. Os homens ficavam encarregados de caçar e proteger a tribo. Após a Era do Gelo, os rios se tornaram abundantes e o solo, fértil. E as mulheres descobriram que se jogassem as sementes que colhiam na terra, a planta germinaria de novo. Surgia assim a agricultura. Friedrich Engels, em sua obra A Origem da Família, da Propriedade Privada e

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Uma atitude repetida por um número mítico de vezes modifica os padrões do inconsciente coletivo.


Inspirações divinas

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do Estado**, de 1884, alega que a produção de excedente nas comunidades possibilitou a fixação do homem na terra e, com isso, estabeleceu-se a propriedade privada. Dessa forma, a transmissão de posse passou a ser feita de pai para filho e não mais das mulheres a seu clã. Por causa disso, os homens prenderam as mulheres para que elas se relacionassem de forma monogâmica e se tivesse a garantia de que os filhos eram legítimos. Na divisão primitiva do trabalho, as atividades exercidas por homens e mulheres eram consideradas igualmente importantes, mas a partir da instituição do patriarcado, o comércio adquiriu novo status e o trabalho doméstico se tornou desvalorizado. “Depois veio a tecnologia, o maquinário, e a agricultura passou a ser mais masculina. Perdemos a conexão com os ciclos da terra, com a noção de vida, morte e renascimento”, afirma Patrícia Cuocolo. Ela explica que essa mudança gerou uma cultura de apego, em que não mais compreendemos que é preciso que o velho morra para que o novo surja. “A cultura patriarcal está caracterizada por uma maneira de viver na apropriação, desconfiança, controle, domínio, sujeição, na discriminação sexual e na guerra”, afirmam Rose Marie Muraro e Leonardo Boff, em Feminino e Masculino. Carlos Alberto Salles conta que os analistas junguianos acreditam que o mundo externo é reflexo do interno. “Se há machismo no mundo, há também uma discriminação do feminino no meu interior. Se em um relacionamento eu trato a outra pessoa como objeto, significa que o outro aspecto da minha personalidade também está sendo tratado assim”. Patrícia diz que a humanidade carece restituir os valores femininos, como as artes, a intuição, a criatividade, a compaixão, a cooperação, o contato com a alma, a celebração e o silêncio.

Na natureza, observamos que onde há o masculino, há o feminino. Também nas divindades há de ser assim.

De certa forma, as deusas permaneceram presentes em alguns contextos atuais. No Budismo, a tradição Kadampa cultua a Tara Verde, um Buda feminino. Segundo a crença, ela era uma princesa que praticava sua espiritualidade e estava próxima de alcançar a iluminação. Um monge teria dito que ela só poderia completar seu processo quando nascesse como homem. Inconformada, ela continuou sua trajetória espiritual e conseguiu atingir o Nirvana. Então, fez uma promessa a si mesma de que sempre apareceria aos mortais sob a forma de mulher para mostrar que o caminho da iluminação é para todos. “Normalmente, os budas possuem traços andróginos, mas quando aparecem sob uma forma definida, os femininos representam a sabedoria, enquanto os masculinos se referem à compaixão”, explica o professor residente do Centro Budista Maitreya, de Belo Horizonte, Antônio Carlos Pinheiro. E mesmo na tradição católica, que reverencia um Deus Pai, o sagrado feminino se manteve vivo na figura de Maria. Associada ao acolhimento e à compaixão, recorre-se a ela como a uma mãe, que intercede em favor do filho. As primeiras igrejas dedicadas a “Nossa Senhora” foram construídas sobre santuários de deusas ancestrais. No Brasil, Maria é tão reverenciada quanto o Pai e o Filho. Outra entidade muito marcante para o povo brasileiro é Iemanjá. A mitologia iorubá diz que ela se tornou a Rainha do Mar por herança de sua mãe. Até então, as águas marítimas eram calmas, mas com a destruição provocada pelos homens, Iemanjá se uniu a Olorum, o senhor do céu, e criou as ondas e as marés para devolver aos humanos o lixo jogado em suas águas. Segundo O livro das Deusas, organizado pelo grupo Rodas da Lua, ela é a mãe que oferece o mar como colo regenerador e purificador a seus filhos, suavizando suas dores. Iemanjá recebe oferendas na passagem do ano e no dia 2 de fevereiro. Mani é uma deusa brasileira. Sua mãe engravidou virgem e deu à luz uma menina de pele extremamente branca. Um dia, sem qualquer motivo aparente e sem sofrimento, Mani morreu. A mãe da menina chorou dias e noites sobre a cova da filha. No local, nasceu uma planta até então desconhecida, de raiz tão alva quanto sua pele e foi chamada pelos índios de maniva, o primeiro nome da mandioca.


A lenda traz a consciência do desprendimento e da disponibilidade para o coletivo. Karina Guimarães afirma que podemos nos mirar nos arquétipos das deusas para nos orientarmos em nosso dia-a-dia. “São representações sagradas do feminino em várias culturas, que nos guiam ao equilíbrio. Se preciso sair para trabalhar, posso recorrer à Atena e pedir que ela me sirva de escudo para ser assertiva sem perder a minha essência feminina. Ao chegar em casa, tiro minha armadura, agradeço à deusa e invoco Tara, por exemplo, que vai me ajudar a meditar, respirar, silenciar. É importante fazer essa transição”. Em consonância com esse pensamento, o Núcleo do Feminino trabalha, por meio de atividades terapêuticas, com os sete principais arquétipos representados pelas Deusas do Panteão Grego, que simbolizam as características do feminino e ajudam as mulheres a compreender e usar melhor seus poderes internos. Acreditase que “as dores do feminino” são causadas pelo fato de a mulher se concentrar em apenas um de seus aspectos. “Se ela é muito Deméter – aquela que exerce a função materna como algo principal –, ela restringe seu poder criativo à geração dos filhos e pode se ferir quando eles crescerem e saírem de casa. Outras mulheres se identificam com o papel de filhas e querem ser dependentes do pai e da mãe para sempre, são as ‘mulheres meninas’. Elas não querem crescer nem fazer nada sozinhas. Às vezes, a mulher é muito Hera, encontra sua identidade no casamento e não sabe diferenciar quem é quem na relação. Quando acaba, ela acredita que está morrendo, porque se congelou naquele modelo”, exemplifica Patrícia Cuocolo. Além dessas, outras deusas simbolizam traços da personalidade feminina, como Afrodite, que influi na criatividade e na sexualidade, Atena, que rege a profissão e a intelectualidade, Ártemis, responsável pela independência e pela ligação com a natureza, Perséfone, ícone do autoconhecimento e da sensibilidade, e Héstia, provedora do calor humano. Perceber a presença dos vários arquétipos em nossa personalidade e conseguir integrá-los pode ser muito curativo. Para Karina Guimarães, o planeta como um todo precisa de cura neste momento. “Se continuarmos fazendo apenas o movimento masculino de exploração, o desgaste da Terra será cada

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Com o patriarcado, perdemos a conexão com os ciclos da terra, com a noção de vida, morte e renascimento.

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vez maior. É como se apenas conquistássemos, mas não nutríssemos”. Patrícia Cuocolo diz que já iniciamos a busca pela cura do planeta. “Estamos vivendo um momento de resgate do sentir, percebendo que precisamos de mais qualidade de vida, qualidade para a natureza, entendendo que a Terra não pode ser explorada de maneira tão violenta. Mas acredito que a mídia é uma grande sabotadora desse movimento, porque continua a mostrar só violência. Então continuamos a vibrar essa energia perversa, negativa”. Karina concorda que a revalorização do feminino já é uma realidade e se manifesta nas diversas organizações das mulheres, na luta política, na ecologia, na espiritualidade, na arte, na dança e na meditação. Leonardo Boff afirma que os valores femininos são os únicos que poderão salvar a nossa Mãe Terra.

No dia-a-dia A iniciativa para essa reconexão com o feminino começa dentro de cada um. Karina diz que a imagem que lhe vem à cabeça é a da pedra, lançada no centro do lago, que cria ondas que se propagam por toda a água. “Quando participo de algo que me liga a minha essência interior, venho com outro astral, trato melhor as pessoas com quem convivo, procuro melhorar o ambiente em casa e no trabalho. As pessoas à minha volta vão ser contagiadas com aquele estado de espírito e vão passar isso pra frente”.

E é possível dar espaço ao nosso feminino com pequenas atitudes, que passam por perceber o sagrado em nós, nos outros e até nos mínimos detalhes do cotidiano. “É afrouxar a calça, entrar em contato com a terra, aproveitar um banho, reverenciar o próprio corpo, dançar, usar saia, cozinhar, se relacionar com o outro”, enumera Karina. Ela esclarece que não se trata de voltar a “ser Amélia”, mas de se ligar ao simples e perceber o poder de criação que é inerente a nosso ser. É revalorizar os rituais, que dão importância a cada instante e, se a mulher se permite, há inúmeras possibilidades, que vão desde pôr a mesa até elaborar um projeto rebuscado. Leonardo Boff defende que precisamos entender o conceito de feminino como um princípio inerente ao ser humano para que os homens também se sintam incluídos, descubram sua dimensão feminina e transformem suas atitudes competitivas e subordináveis em comportamentos mais cooperativos e igualitários. A estrutura patriarcal não somente oprimiu as mulheres, mas também impediu os homens de manifestarem sua feminilidade. Segundo Boff e Rose Marie Muraro, o homem, ainda hoje, tem dificuldade em integrar o feminino em si, e a mulher pode ajudá-lo nessa tarefa de “auto regeneração”. Dar aos homens condições eficazes de participar da vida privada e de cuidar dos filhos pode ser uma boa saída para se acabar com a relação dominante/dominado, que, de


acordo com os autores, é a origem de toda a violência do patriarcado. Patrícia Cuocolo acredita que a mulher tem uma grande responsabilidade na restituição do Sagrado Feminino, até pela sabedoria de ciclos que carrega no próprio corpo. “Em algum nível, nós escolhemos ser portadoras desse conhecimento. Os homens não têm isso, eles apenas observam. Mas eles também estão carentes dessa restituição, e são capazes de desenvolver seu feminino quando a parceira, por exemplo, faz um movimento de cura do feminino dela”. A psicoterapeuta também diz que, por outro lado, homens que têm o seu feminino bem desenvolvido podem ajudar as mulheres a fazer esse caminho. No entanto, “a mulher, se quiser sobreviver, ter uma profissão, tem que ter seu animus/ masculino diferenciado. Em certos aspectos da vida, ele é mais valorizado, porque a sociedade é competitiva e racional”, alerta Carlos Alberto Salles. “Mas ninguém chega muito longe usando apenas um dos aspectos da personalidade. Como sobreviver sem se socializar, sem ter relacionamentos afetivos, sentimentos?”, questiona. O mestre indiano Osho defendia que o mundo entende a linguagem da matemática e não a do amor, e que são muitas as atrações para seguir apenas o hemisfério esquerdo do cérebro, racional. “Mas nesse momento, você perde algo tremendamente valioso: o contato com seu próprio ser. O hemisfério direito do cé-

rebro está mais interessado em seu ser interior, sua paz, sua bem-aventurança. Ele está mais preocupado com o momento, menos conectado com o futuro; mais preocupado com a poesia da vida, menos com sua aritmética”. Para Patrícia, a reconexão com o feminino passa pela ligação entre os lados esquerdo e direito do cérebro. “É preciso pensar, sim, mas com coração, é preciso ter atitudes, sim, mas com consagração”. Carlos Alberto pensa que a sociedade funciona melhor quando há feminino e masculino em equilíbrio. O analista diz que se a sociedade for só racional, corre o risco de se tornar despótica e seguir a lei friamente, mas se for só emocional, também pode ser destrutiva. Patrícia não acredita que seja necessário resgatar as sociedades matrilineares. A humanidade ganhou em análise, razão, reflexão e tecnologia. “Não é o caso de se retirar isso. O problema é que nos tornamos só isso. A ferida está no fato de o racional ter vindo sem o coração e, sem a conexão com a alma, somos fragmentados. Estamos buscando o equilíbrio para que possamos entrar em contato com nosso Pai Céu e com nossa Mãe Terra. Para mim, não tem cura maior do que essa”. t

* Ed. Sextante, 2002. **Ed.Bertrand do Brasil

O homem ainda tem dificuldade em integrar o feminino em si, e a mulher pode ajudá-lo nessa tarefa.

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Receita do meu homeopata há alguns meses: comer nove pétalas de rosas vermelhas – três, a cada três dias. Ainda não segui a prescrição, mas pelo que entendi, serve para aflorar a feminilidade e a sensualidade da mulher. Colocar salto, se maquilar e

daqui de dentro

usar vestido.

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Ontem resolvi experimentar a última recomendação e ouvi: “Adoro mulher de vestido”. Senti uma mistura de contentamento e rebeldia. Lembrei-me de meu pai, que sempre dizia isso a minha mãe, apesar de ela quase nunca usar. E também me lembrei de que foi meu pai quem me cobrou saber cozinhar aos 11 anos, porque minha avó já o fazia desde os sete para os peões da fazenda onde morava. Prometi a mim mesma que jamais aprenderia sobre culinária. Seguindo o mesmo raciocínio, recusava-me a desempenhar qualquer tarefa doméstica que não fosse feita pelo meu irmão e assim, acabei contribuindo para que minha mãe, que sempre trabalhou fora – e muito – ficasse ainda mais sobrecarregada. Detestei quando tive que começar a usar sutiã, porque quase nunca tinha um que me servia e as vendedoras adoravam justificar: “É que ela tem pouquinho, né?”. E só tive coragem de contar para minha mãe que havia menstruado pela primeira vez, três dias depois. Não era medo das cólicas, do incômodo do absorvente ou dos dias sem piscina. Era vergonha de todo mundo dizer: “Ah, agora ela já é uma mocinha”. Como a boa aluna que sempre fui, sonhava em ser cientista. Minha mãe me disse uma vez que não achava uma boa idéia, porque os cientistas trabalhavam muito e não tinham tempo de cuidar da casa, do marido e dos filhos. Resolvi, então, que casamento e maternidade não estariam no meu destino. Mesmo assim, esperei meu príncipe encantado para dar meu primeiro beijo e, depois da decepção amorosa, cortei o cabelo curto, estilo “joãozinho”. Naquele momento, decidi que os homens não eram dignos de confiança. Minha primeira transa foi sem amor ou fantasia, mas o que mais achei legal foi quando ele me deu o braço antes de irmos dormir. E passei um ano pedindo desculpas a um segundo namorado, que me culpava por não ter “esperado por ele”. Quando acabou o namoro, determinei que amor e sexo eram coisas completamente distintas. E pensando ser uma mulher moderna, acabei por alimentar o machismo e a insensibilidade de alguns homens. Se é que posso chamá-los assim.


Da última vez que fui visitar minha família, percebi que nem tudo é tão rígido quanto costumava me parecer. Atualmente, minha mãe ganha mais do que meu pai, e pela primeira vez a percebi mais vaidosa, comprando roupas, sapatos e acessórios para usar em seu dia-a-dia. Meu pai ainda insiste que não sabe cozinhar, no entanto, foi ajudar minha mãe a fazer o almoço enquanto eu estudava e garantiu que a salada só ficou boa porque foi ele quem picou os legumes. Minha irmã luta Kung-Fu, mas faz as unhas toda semana e sempre se maquila quando vai sair. Meu irmão continua a não ajudar nas atividades de casa, mas sabe fazer uma bela lasanha e até quis aprender sobre incensos e massagens para conquistar as meninas. E eu, além de ter comprado o tal vestido, estou ansiosa para testar as receitas da editoria de culinária (página 92). Não sei até que ponto as diferenças entre homens e mulheres são culturais, frutos de condicionamentos psicológicos, determinações biológicas ou escolhas cósmicas. Nem sei se é possível fazer essas diferenciações. Mas talvez o mais importante seja ficar em paz com o que se é e o que se faz. Não quero abrir mão do meu lado masculino, que me impulsiona a agir, a ser firme, a lutar pelo meu espaço. Mas também não quero mais impedir que meu lado feminino se manifeste, porque ele faz parte de mim e pode me ajudar a descobrir a mulher que sou, ou que me tornei, apesar de tanto negar. E isso não tem nada a ver com perder força ou independência. Está na hora de comer as pétalas.

Thays Prado é uma das editoras da tato e tem mania de refletir sobre tudo

Como a maioria das mulheres, sempre que ouvia uma cantada de um homem na rua, pensava: “Como é que você ousa? Eu sou uma mulher e preciso ser respeitada. Não sou submissa, nem um objeto para você ficar admirando”. E acho que fazia uma cara tão feia que o sujeito devia até mudar de idéia sobre o que tinha dito. Hoje, prefiro entender esses comentários como elogios. Às vezes ainda sinto raiva, mas estou aprendendo a rir. Dos homens, que pensam que precisam de cantadas baratas para provar sua masculinidade, e das mulheres, que só reforçam a teoria deles quando se sentem ofendidas, como se fossem assim tão frágeis.

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Coisa de gente em projeto

menina,

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coisa de

menino. Por Manoella Oliveira.

O burburinho da sala de dança podia ser ouvido de qualquer lugar da escola. Entre as várias meninas de collant e seus risinhos, estava um garoto um pouco constrangido, de short, à espera da professora. Essa bem podia ser uma cena do filme Billy Elliot* – em que o menino pratica balé escondido do pai, que sonha com um filho boxeador –, mas era apenas Dia do Amigo em uma academia de Belo Horizonte. Nessa data, as alunas de dança podem levar colegas para experimentar as movimentações artísticas do corpo. Daniel, 10 anos, foi convidado por sua amiga Maria Clara, 9, a participar da aula que ela freqüenta há um mês. Ele topou. Mal a professora entra na sala, ele se apressa em avisar: “Vim fazer aula de dança, mas sou levado”. A pose não colou. Sem se intimidar pelo garoto assentado no chão, ela aponta para as alunas que corriam e penduravam em tudo quanto podiam e lembra: “Bailarinas, parem de correr! Vocês são meninas!”. Enfim, as crianças se organizam, Daniel entra em fila com as colegas e a professora dá início ao alongamento. A aula é de jazz, estilo mais dinâmico que o balé

clássico e que pode ser dançado com enorme variedade de músicas. Do outro lado da cidade, em outra escola, não há meninos em sala, mas é consenso entre as pequenas bailarinas que “seria legal” ter um garoto por ali. “E menino pode dançar?”, provoco. Ana Luíza, 8 anos, que até então se divertia com pulinhos e estrelinhas, sossega e me diz com ar precoce e mão na cintura: “Claro. Todo mundo tem os mesmos direitos”. Ana fala com a firmeza de quem sabe o que diz, mas será que os meninos concordam? Hugo, uma criança de 6 anos que vive a pular de um lado para o outro, parecia forte candidato a se juntar às bailarinas iniciantes, mas ele diz que balé está fora de seus planos. Só gosta de futebol e basquete. _ Se você diz que não gosta, é porque já experimentou – questiono. _ Já dancei uma vez na escola, sozinho, escondido das pessoas grandes e das pessoas pequenas. Foi quando eu estava no 2º período... Não gostei – retruca. _ Foi escondido porque dançar é coisa de


Quem acha errado pessoas de ambos os sexos praticarem o mesmo esporte são pessoas de visão deformada, o problema está com os adultos, não com as crianças

menina? _ Não... É de quem quiser dançar. _ E se eu te chamar para dançar comigo agora? Hugo ensaia uma cara de impaciência de quem já havia contado que está mais para Buffon do que para Barishnikov**, mas se diverte ao levantar do sofá e dançar comigo algo desengonçado que ele acredita ser balé.

Rosa ou azul? “Homem que é homem tem que ser travesso”, ensina o senso comum e, em certa medida, alguns pais e professores. Os meninos que corram pela rua, gritem bastante e brinquem de socar uns aos outros. As meninas, que gostem de boneca, falem baixo e apresentem modos à mesa. É assim que as crianças desenvolvem, em cada etapa de seu crescimento, a segregação entre os sexos. A primeira delas começa antes mesmo do nascimento, com a preparação do enxoval e do quarto do bebê. Se há algumas décadas rosa e azul eram regra, ultimamente, os enfeites infantis estão mais diversificados, mas ainda são raros os que

compram peça de roupa rosa para um menino ou arriscam um quadro de carrinho em um quarto de menina. Ângela Resende faz parte dessa minoria. Mãe dos gêmeos Bárbara e Daniel, de 5 anos, ela diz que não se preocupa em separar o que é de menino e o que é de menina. O quarto dos filhos é todo pintado de azul e as paredes são enfeitadas com flores, carrinhos e bonecas. Os brinquedos ficam em um cômodo à parte, que mistura fadinhas, navios pirata, casinha de bonecas e super-heróis que parecem conviver bem. Assim como os irmãos. Bárbara fica orgulhosa ao mostrar as novidades. No dia anterior, ela havia ganhado duas bonequinhas de brinde numa rede de fast food, enquanto o irmão ganhou duas Tartarugas Ninja. Ela explica que não foi uma escolha. “A moça da lanchonete já entregou assim. Lá tem um brinde de menino e um de menina”, conta. Mas quando o assunto são os coelhinhos de pelúcia, ela se mostra menos passiva. O pai deu de presente aos filhos dois

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Balé é para quem quiser dançar

Rangers versus Princesas

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coelhinhos envoltos num saquinho colorido. Por fora, o de Bárbara era rosa e o de Daniel, azul. Ao abrir o invólucro, no entanto, as cores eram diferentes: o coelho dela era verde e o dele, rosa. “Ela deu um ‘piti’ porque queria meu coelhinho, mas eu gostei dele assim e não troco”, diz Daniel. “Apesar de os pais, agora, se permitirem mesclar mais cores, mais elementos, outras questões avançaram menos. Quando a criança chega aos quatro anos, por exemplo, ela brinca com crianças do sexo oposto, o que é parte de seu desenvolvimento social, mas as famílias ficam preocupadas se uma menina se integra a um grupo de meninos ou vice-versa. Essa não é uma questão para ser levada a sério”, explica a orientadora educacional e psicopedagoga Mônica de Souza. Segundo a especialista, à medida que a criança cresce, fica cada vez mais claro que a sociedade segrega: homens devem fazer determinadas coisas e mulheres, outras. A partir dos sete anos, a própria criança internaliza essas construções sociais e começa a reproduzir esses conceitos. “É aí que um menino passa a chamar um colega que é mais sensível, por exemplo, de ‘bebê chorão’. Isso pode até acontecer mais cedo, caso as crianças cresçam perto de pessoas que têm visões deformadas da realidade, que não enxergam o masculino e o feminino em cada um de nós”, completa.

Essa falta de percepção, mais comum do que se pensa, induz até mesmo pais que compreendem essa dualidade a tomar atitudes sexistas no intuito de evitar problemas para os filhos. Com Bárbara, o conflito apareceu na festa de aniversário. Ela queria Princesas, o irmão queria Power Rangers e o tema escolhido pelos pais foi circo. Alguma conversa depois, os gêmeos querem definitivamente Power Rangers, mas a festa vai ser mesmo de palhaços. “Eu acho Princesas mais bonito, mas eu gosto de brincar de ‘Power’ com meus amigos na escola e queria a festa deles”, conta Bárbara. O pai, Roberto Dias, explica que não vê problema em enfeitar a festa com o tema dos heróis, mas pensa que a filha se decepcionaria porque a decoração era pobre e não ficaria tão colorido. “Ia ser como no dia de comprar a fantasia da Power Ranger amarela. Quando chegou à loja, ela viu a de Princesas e logo a escolheu. Ela fala que gosta, mas não é tanto assim, ela muda de idéia rápido”, arrisca. Ângela diz que quando os gêmeos eram mais novos, já tiveram festa de Cinderela e de Branca de Neve, mas agora que estão “maiorzinhos” o tema de Power Rangers poderia instigar falatório. Além disso, os enfeites de circo eram mais bonitos. Com Daniel, foi no Dia do Brinquedo. Na ocasião, ele escolheu uma Barbie da irmã para levar para a escola, mas Roberto convenceu o menino a mudar de idéia, preocupado com o que os coleguinhas poderiam dizer. “Dentro de casa não tem problema ele brincar de boneca, ele até tem algumas, mas criança é muito cruel. Se algum menino o vir brincando, pode rir da cara dele. Acho que é nosso papel preservar os filhos”, explica o pai. Já Ângela, pensa diferente. “Eu deixei ele levar, acho que as crianças têm que dar conta das escolhas que fazem e têm seus recursos para se defender, se for preciso. Meu marido é mais protetor, prefere direcionar para evitar que os meninos sofram, afinal, os colegas são importantes para eles. Nem sei o que ele disse para o Daniel, porque não existe uma justificativa. Não pode levar a boneca por quê?”, ri.


Apenas brinquedos Ao escolher um jogo ou brinquedo, a criança está moldando sua personalidade, mas quem coloca contexto de sexualidade são os adultos. É o que diz a psicóloga Maria de Fátima Campos “É responsabilidade dos pais, educadores e familiares encaminhar a criança cultural e moralmente, apenas, no mais têm que aceitar suas escolhas. O brincar não abre espaço para repressão. Se a criança só gosta de um tipo de brincadeira, aí você pode fazer outras propostas”. Daniel também se mostra chateado com a postura de alguns de seus professores que associam, com naturalidade, todos os objetos rosa da sala às meninas. Mas, nem todas as escolas são assim. Na escola onde a professora de educação infantil Bruna D´Carlo trabalha, a dinâmica é diferente. Suas aulas são realizadas em uma sala muito colorida, pintada em temas de natureza. Ela garante que lá não há segregação sexista entre os seus alunos. A maior parte dos brinquedos é pedagógica, lida com números, alfabeto e montagem. Nas sextas-feiras, o Dia do Brinquedo funciona como um dia de troca. “Fazemos uma roda para colocar os brinquedos e eles podem emprestar se quiserem. Algumas meninas gostam de brincar de carrinho, alguns meninos gostam de brincar de panelinha. É natural, é apenas um brinquedo”, conta a professora. Os pais de seus alunos entendem muito bem, assim como os colegas. Tanto que na sala de balé da escola, existem quatro meninos e, na de capoeira, várias meninas, sem que isso tenha trazido críticas. Segundo a educadora, essas atividades são um fator a mais a favorecer a coordenação motora da criança, e os pais as vêem como uma oportunidade de desenvolvimento para seus filhos. Afinal, além de as técnicas de balé serem diferentes para meninos e meninas, assim como as de capoeira, essas práticas não são determinantes para a definição da sexualidade.

Aos sete anos, as crianças percebem as diferenças no mundo como um todo; a menina se vê diferente do menino e vice-versa e a escola muitas vezes reforça essa tendência. As rodas de brinquedo, por exemplo, começam a ser separadas a partir dessa idade. “Acredito que o papel da escola é atuar na formação de caráter, ajudar a formar o cidadão de bem e não encher a criança de preconceitos de que o mundo já está cheio. Se o professor não tiver consciência crítica na formação da criança, ele acaba reproduzindo o preconceito”, opina a professora.

Integração Não é preciso recorrer a pensadores, psicólogos ou esotéricos para enxergar o masculino e o feminino nas crianças – basta olhar para elas. Enquanto conversava com os irmãos Daniel e Bárbara, eles brincavam de jogo da memória, com estampa rosa da Hello Kitty, sem qualquer problema. Ela demonstrou seu lado competitivo até o fim do jogo: “Olha, eu acertei muito mais do que você. Olha o tamanho da minha pilha de cartas!”, comemorava. As meninas do balé, agitadas, levaram um tombo na escada de tanto correr de um lado para o outro e, sensíveis, choraram depois. Hugo brincou de luta durante algum tempo para depois se concentrar em um desenho colorido com direito a árvores e flores. Ana Luíza esbanjava criatividade nas improvisações de dança e se dedicou a um discurso objetivo sobre a sandália nova do pai, que, segundo ela, era coisa de mulher e agora os homens podem usar, o que provaria que os direitos entre os sexos são iguais. Raquel Coelho, mãe do outro Daniel, enxerga esses dois lados, mas ainda assim não gostaria que o filho fizesse aulas de jazz. Por

A partir dos sete anos a criança internaliza as construções sociais e começa a reproduzir (pre)conceitos

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ser divorciada, ela teme que o filho perca a referência masculina. “Deixei ele decidir se iria ou não no Dia do Amigo, mas se ele quisesse se matricular na aula de jazz, eu ficaria estressadíssima. Em casa, ele convive só comigo e com a minha empregada, por isso fico com medo dessa constante de mulheres transformá-lo em uma mocinha”, brinca. De acordo com especialistas, o estresse de Raquel seria infundado. O estímulo ao lado feminino não impede que o masculino se desenvolva. Daniel já fez xadrez, tênis, natação e judô, por sugestão da mãe, do tio, e da tia, mas largou tudo e ultimamente passa as manhãs em casa. “Ele ama futebol, mas eu não deixo fazer porque falam muito palavrão durante o jogo, então deixei ele fazer outras atividades, mas ele sai de tudo. O jazz também foi só por um dia, e ele só foi porque achou importante as meninas ligarem”, conta Raquel. A versão de Daniel, no entanto, é outra. “Fui dançar porque eu acho legal e pedi para ficar, mas minha mãe falou para eu não fazer jazz porque lá é cheio de meninas. Eu falei que não tem nada a ver, mas ela disse que não”. Já Cláudia Andrade e Antônio Brandão incentivaram a filha Laura, 8 anos, a experimentar esportes tidos como coisa de menino, no mundo fantasioso dos adultos, claro. Como a menina não se adaptou às aulas de dança, os pais incentivaram-na a experimentar judô e futebol. Não precisou chegar à segunda opção. Logo na aula experimental de judô, Laura decidiu que praticaria artes marciais. As meninas da sala são apenas duas: ela e a professora, Renata, mas isso não faz com que ela se sinta diferente. “Acho que todos os esportes são unissex. Luto tão bem quanto os meninos, pelo menos, a Renata me elogia muito”, vangloria-se. Laura garante que os meninos a tratam de igual para igual e o fato de ela ser menina nunca gerou qualquer comentário. Ponto para a sabedoria das crianças. A orientadora educacional Mônica de Souza, explica: “Quem vê problemas em abrir as possibilidades de esporte para ambos os sexos são pessoas de visão deformada, o problema está com os pais, não com a criança. Uma menina não vai se tornar mais masculina porque faz judô. Se ela se tornar, é porque é importante para ela naquele momento. Se a criança não tiver essa oportunidade para experimentar, ela vai fazer isso quando?”, questiona. t *Billy Elliot (2000), de Stephen Daldry, é um filme tocante, divertido e altamente recomendável. **Gianluigi Buffon é goleiro de futebol italiano, eleito melhor do mundo em 2006 e novo ídolo da criançada. *Mikhail Barishnikov é bailarino e coreógrafo consagrado como um dos maiores nomes do balé.

Pais, educadores e familiares devem aceitar as escolhas das crianças. O brincar não abre espaço para repressão


Ele se tornou mundialmente conhecido pela habilidade e pela elegância que exibe dentro do campo de futebol. Ela fez fortuna e arrancou suspiros com desfiles de moda e fotos publicitárias. Como todo atleta, ele cuida do corpo, malha 4 horas por dia, mantém uma alimentação balanceada. Como toda modelo, ela é vaidosa, veste-se bem, trata dos cabelos e da pele. Ele já gastou milhões com mansões e luxuosos carros do ano. Ela apóia financeiramente diversas causas humanitárias e mais de 20 instituições de caridade. Ele é freqüentador de requintados restaurantes internacionais. Ela adora cozinhar em casa. De personalidade forte, ele gosta de ouvir hip hop, usa anéis, brincos, exibe diversas tatuagens e pinta as unhas. Ela é muito devotada e adora passar o tempo em sua residência com os três filhos. Ele é David Beckham. E ela? Também. Hein? Calma que eu explico. Homens são homens e mulheres, mulheres, porque nosso criador assim quis ou, para os acadêmicos de plantão, porque a concentração de tal hormônio em tal momento era tal que o resultado foi tal gênero. Que tal? Tudo claro? Mas o importante nos dias atuais não é nascer um rapazinho ou uma mocinha, mas sim, parecer um(a). A culpa, como sempre, é da sociedade. Ah, seu eu pego ela! Nascemos iguais (ou quase), mas desde muito cedo estamos submetidos a normas e padronizações. A roupinha azul e a rosa no berçário dá até pra desculpar, afinal os bebezinhos são todos muito parecidos, quase sem cabelo, sem dente, sempre dormindo, choram por hobby, etc. Rosa é diferente de azul. Tá bom, a gente deixa passar. Mas o que se vê a partir daí são determinadas formas de se comportar, profissões a seguir e até sentimentos tornarem-se uma exclusividade de gênero. Eu quero ao meu lado uma mulher sensível, carinhosa, bem educada, cuidadosa, prestativa, vaidosa. Que homem não quer? Da mesma forma, elas querem identificar em um pretendente essas e outras características, não porque fazem parte de seu universo feminino, mas porque são qualidades inerentes a todo ser humano, que podem estar, por algum motivo, abafadas ou latentes. Mas voltemos a Beckham. Ele é apenas alguém que conseguiu se desviar das tais padronizações, o que não fez dele um mal pai, marido ou profissional. A valorização, aqui, é feita aos desvios de padrão social, não aos de caráter. Consegue conciliar as profissões que tem e o cuidado com seus filhos. Se é perdulário por um lado, mostra-se generoso por outro. Ainda que vaidoso, ainda que se aproxime do que é comumente alocado na prateleira das mulheres, não vejo por que não considerálo um exemplo de homem. Não acredito em um lado feminino e outro masculino: todos nós temos características que nos traduzem como pessoas, sejamos homens ou mulheres. O que existem, de fato, são “personagens” socialmente modelados que interpretamos ou não.

à flor da pele

Diego Cordeiro é muito curioso; e está doido pra saber por que

Uma mesma moeda

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amor Simplesmente

umbigo

Por Thays Prado

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Dizem que amor de mãe é incondicional, que não tem limites, que mãe é mãe, que mãe só tem uma, que ninguém ama tanto quanto mãe e, claro, que ser mãe é padecer no paraíso. Não tenho experiência própria no assunto, mas imagino que deva ser muito difícil conviver com todas essas exigências – feitas pelos filhos, pelos pais, por outras mães, pela maioria de nós. Além de se descobrir grávida, de saber que a vida vai mudar de maneira radical, que o corpo está se transformando e que agora se é responsável pela existência de um outro ser que ainda nem conhece, cobram que o resultado “positivo” do teste de gravidez seja, praticamente, um mecanismo que descarrega os melhores sentimentos no corpo da mulher – evidentemente casada – e que o parto seja o auge da glória, a consagração do amor eterno entre mãe e filho. Repito: não tenho experiência nisso; mas olhando mais de perto e procurando não se deixar levar pelos preconceitos sociais, qualquer um é capaz de perceber que, quando se trata de gente, não há regras. Há amor, mas também há raiva, há carinho e impaciência, doação e egoísmo, preguiça, medo, alegria, dor. Porque ser mãe não exclui, absolutamente, o fato de ser humana.


Diversidade O antropólogo Daniel Simião afirma que a valorização da maternidade é herança da corte medieval e, mesmo naquele período, não havia muita distinção de graus de importância entre pais, mães e crianças nas classes populares. Ainda hoje, esse destaque materno não é universal. Há distinções em função da localização geográfica, da classe social e das convenções culturais. Em algumas sociedades indígenas, por exemplo, o filho é visto como um produto do pai. “Nessas culturas patrilineares, acredita-se que o filho é um espírito ancestral da família do pai, que se aproveita de um descuido da mulher e entra nela. Ele é nutrido pela semente do homem e a mãe é só um invólucro. Após o parto, é o pai quem fica de resguardo e ela vai trabalhar na terra”. Daniel estudou a organização doméstica em Timor Leste para sua tese de mestrado e percebeu que lá o amor materno estaria expresso na imposição de limites às crianças e no disciplinar chegando, inclusive, à violência. No Rio Grande do Sul, uma série de estudos mostra comportamentos que, à primeira impressão, poderiam ser julgados como típicos exemplos de falta de amor e, no entanto, podem significar exatamente o contrário. Entre as camadas populares, é comum os pais doarem os filhos a famílias de renda mais alta. A criança recebe educação, comida e cuidados e acaba fazendo os serviços domésticos. Quando completa os estudos, volta para a família de origem. “Quem vê de fora pode pensar: ‘Como você deu seu filho?’ Mas aquilo é natural, ela também foi dada pelos pais quando era criança”, explica Daniel. O antropólogo ainda lembra que nas periferias das grandes cidades, é muito comum as adolescentes engravidarem cedo de propósito para mudarem do status de criança para o de mãe, que tem mais respeito e valor. “Em Porto Alegre, elas são chamadas de ‘mães novinhas’, e isso é um elogio. As crianças ficam sob os cuidados da avó”. Para o psiquiatra e escritor José Ângelo Gaiarsa, é inegável que exista uma ligação natural entre mães e filhos. “Filhote sem mãe, na natureza, não dura nada. Ela é o eixo da espécie. Eu não duvido que algo disso exista na fêmeamulher. É difícil distinguir o que é amor materno instintivo, convenção social, ou costume de cada família”. Mas a natureza favorece a criação

desse elo desde o nascimento do bebê. Gaiarsa afirma que a Medicina tem feito observações sobre a ocitocina, produzida pela mulher para facilitar as contrações do útero, e acredita que esse é o hormônio do amor entre mãe e filho. O psiquiatra defende que um dos grandes crimes do mundo moderno e das maternidades é a separação dos dois após o parto. “Vários animais se reproduzem em enormes multidões, quando a mãe sai para buscar comida, como acha o filhote de novo naquela bagunça? Se você separá-los durante uma ou duas horas depois do nascimento, ‘tchau e bênção’, eles não vão se achar nunca mais. Eu diria às mães que jamais permitam que façam isso com elas. Não se pode ignorar esses fatos, é questão de cheiro e de presença. O elo básico entre mães e filhos se faz imediatamente após o parto”. Obviamente, não basta aplicar uma injeção de ocitocina na mulher para que ela se apaixone pela criança, mas o psiquiatra brinca que até não seria uma má idéia. Ele diz que a crença de que toda mulher quer ou pode exercer a maternidade precisa ser posta à prova e que, em todas as espécies, há algumas fêmeas que jamais deveriam ser mães. Uma das alternativas, que é também um projeto pessoal de Gaiarsa, seria a existência de uma “escola de família”. “Ninguém teria o direito de ter filhos sem passar por uma formação específica e fazer alguns testes concretos para ver se tem capacidade, gosto, paciência e jeito. Isso seria para o bem da própria mãe, porque crianças são fascinantes, super lindas, encantadoras. Se se dispuser a aprender com elas, você refaz sua vida, mas se a mãe não se entender com o filho, é diabólico, eles se torturam reciprocamente”. O psiquiatra também discute a afirmação consensual de que toda criança precisa de uma ligação forte com a mãe e um ambiente familiar tradicionalmente estruturado para se sentir segura no mundo. Ele acredita que a vida das mães e a própria constituição da família são tão variadas atualmente, que talvez fosse melhor pensar em uma nova forma de organização. “Por que não arrumar várias mães para um filho? Eu digo que quanto mais pessoas adultas, e que gostem de crianças, estiverem por perto, melhor. A desgraça da família, consagrada por Freud no Complexo de Édipo, é uma mãe só para cada filho. É uma ligação muito amarrada, muito densa, muito excessiva entre duas pessoas”.

Papel de mãe seria dar carinho e amor, cuidar. O de pai, prover os valores materiais.

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Pequena pausa

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Como a maioria dos jornalistas faz, minhas perguntas costumavam buscar respostas que pudessem abranger o maior número possível de casos. Minha intenção era, mesmo sem ter total consciência disso, encontrar uma fórmula mágica que resolvesse todos os problemas do “tema da vez”. E foi numa dessas tentativas que Gaiarsa interrompeu a entrevista: “Como é o bom, como é o certo, como é que devia? Essas perguntas não têm o menor sentido em coisas humanas. Me diga quem com quem, de que mãe você está falando e de que filho desta mãe você está falando, senão não há condições de continuarmos esta conversa”. Dei exemplos de depoimentos que tinha ouvido para esta matéria e ele fez alguns comentários, mas sempre acrescentando que era necessário conhecer melhor a vida dessas pessoas para dizer algo mais específico. Por alguns dias, questionei qual seria mesmo o papel de um jornalista que trabalha com comportamentos humanos e redescobri o encantamento de contar histórias. Nas próximas páginas desta matéria, não há nenhum dado científico ou verdade absoluta, apenas relatos que ouvi e que repasso neste momento da forma como me pareceram.

Aprendi a me doar mais, a compartilhar e a sentir que não estou sozinha, existe uma pessoa no mundo que depende de mim.


Luzimar Marcelino casou-se aos 24 anos, engravidou um mês depois e teve uma gestação tranqüila. “Primeiro a gente se apaixona pela idéia de ser mãe e vai sentindo: ‘olha que poder o meu, que coisa linda’. Ao mesmo tempo, eu pensava: ‘Meu Deus, o que eu vou fazer com essa coisinha?’”. Hoje, Maria Carolina tem 22 anos e, no ano passado, ganhou um irmão. Luzimar e o marido estavam há três anos em uma fila de espera para adoção, quando receberam um telefonema para buscarem o bebê. Antes de Luzimar vê-lo, a assistente social informou que ele era negro e ela não precisava ficar se não gostasse. Ela não estava preocupada com isso: “Não estou fazendo uma compra, como não vou gostar? E aí ele te olha e você tem a certeza de que é seu, nasceu para você. É amor à primeira vista”. Luzimar diz que sentiu os mesmos medos de quando teve a filha e se perguntava se ia conseguir correr atrás do menino, ou se seria capaz de cuidar dele. No primeiro banho, teve a confirmação de algo que o coração já sabia: “Vi que Henrique tinha uma manchinha na perna igual à minha e à da Carol. Não tinha o que discutir, era meu filho”. Aos 48 anos, Luzimar tem tranqüilidade para dizer: “Às vezes, sinto raiva da minha filha, fico chateada, acho alguns defeitos dela horríveis. Ela também deve sentir isso em relação a mim. Até hoje, ela acha que pode falar tudo o que a chateia em mim e dizer ‘eu sou sua filha’. Mas se você não se posiciona e bota pra crescer, vai ter um bebê a vida inteira”. Henrique ainda não aborreceu a mãe, ainda assim, ela sabe que os questionamentos vão surgir. “Será que devia ter tido filhos? Será que era esse o filho que eu queria?” E se isso já gerou culpa na mãe de primeira viagem, hoje é encarado como um direito de Luzimar, como ser humano, de expressar o que sente. Cristiane Seabra, 34, estava saindo com uma pessoa, “deu uma vacilada” e ficou grávida. “Quando descobri achei um horror. Tinha uma vida tranqüila, sem filhos, morando com a mãe e, de repente, existia uma pessoa completamente dependente de mim”. Ela diz que o que “pegou” foi o fato de não ter tido um filho com alguém que amava. Além disso, ficar em casa o dia todo, por conta de um bebê, e dormir pouco e picado, foram motivos de irritação. Ela pôde

contar com o apoio da mãe, e com uma enfermeira e uma babá nos primeiros meses. Mesmo assim, no começo foi difícil para a moça trocar tantas fraldas ou distinguir o que era um choro de dor de barriga, de ouvido ou de garganta. Ela se perguntou muitas vezes: “Tudo ele? E eu? Cadê minha vida, o que eu fui fazer com a minha vida? Mas depois a gente se acostuma”. Hoje, “Dudu” tem um ano e meio e consegue expressar melhor para a mãe os seus desejos, mas a fase das birras começou. Cristiane faz questão de almoçar com o filho, já que trabalha perto de casa, mas se sente culpada por ficar dois horários fora, porque o desenvolvimento da criança passa rápido e ela pode perder muita coisa. Ela tem vontade de ter outro filho e acha que “deve ser mais tranqüilo, a gente deve aprender a amar mais rápido. Mas sem casar, nunca mais”. Mesmo com todas as dificuldades de adaptação à nova vida, para ela, ser mãe “é tudo de bom, é um pedacinho seu que tem aí fora. É muito gostoso quando a criança te chama de ‘mamãe’ e começa a apresentar traços físicos e da personalidade que você sabe que são seus. Só tendo mesmo pra saber”. Enquanto Cristiane me explica isso, “Dudu” mostra o umbigo, como se quisesse ilustrar o que a mãe acabava de dizer. Isadora Siqueira, 22, não sabe se a falha foi dela ou da pílula, mas o fato é que a descoberta da gravidez a assustou. Envolvida em um relacionamento instável, sem emprego fixo e apavorada com a provável reação da mãe, viu no aborto a primeira saída. Mas o namorado, que era mais velho e queria muito ser pai, espalhou a notícia da gravidez para evitar que a moça tirasse o bebê. A tática funcionou. Quando a mãe soube da novidade, ficou chocada e passou toda a gravidez da filha conversando com ela apenas o essencial. A futura avó também havia sido mãe muito jovem e não queria ver a história se repetir. Isadora se culpou por não se apegar ao bebê que carregava, principalmente quando via a outra grávida da faculdade ficar o tempo todo alisando a barriga. E ela só se deu conta do amor que sentia por Júlia quando o bebê começou a se comunicar com ela através do olhar. “Depois da fase de adaptação, entra o amor incondicional, que não vai acabar nunca”. Hoje, a menina

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Tudo para o meu filho? E eu? Cadê minha vida? O que eu fui fazer com a minha vida?

Quando estou triste e ouço um ‘pai, eu te amo’, tenho forças para tudo. Minha vida é para os meus filhos.

tem um ano e sete meses e é o xodó da mãe e da avó. “Não me arrependo. A cada dia que passa, sinto que foi a decisão mais certa que tomei na vida”, conta Isadora. Enquanto dá a sopinha de chuchu para Júlia e coloca um DVD sobre bichos, que a filha adora, define: “Amor de mãe é quando você morre por ela. Se tiver que tirar o coração e dar a ela, você faz. E é uma coisa constante, mesmo quando fico com raiva e a repreendo”. Isadora diz que acha lindo cada aprendizado da filha. O que ela aprendeu com Júlia? “Além de trocar fraldas?”, brinca. “A me doar mais, a compartilhar e a sentir que não estou sozinha, existe uma pessoa no mundo que depende de mim”. Geraldo Silva*, 43, tinha clara em sua cabeça a divisão entre o que era responsabilidade de mãe e de pai. “Papel de mãe seria dar carinho e amor, cuidar. O de pai, prover os valores materiais. Existe sentimento de pai, mas a gente não consegue igualar ao da mãe”. Há três anos, sua mulher foi embora para os Estados Unidos e deixou a filha de 12 para ele cuidar. Passado o desespero inicial, o garçom assumiu as tarefas domésticas, arrumou um segundo emprego e acabou descobrindo o grande amor que sentia pela filha. “Procuro entender o que uma mãe dá a um filho e representar isso para ela”. Geraldo

diz que conseguiu construir uma relação de confiança com a adolescente, mas às vezes se pergunta por que precisa criá-la sozinho e critica a atitude da ex-esposa. “Abandonar um filho por valores materiais é imperdoável. Criar por telefone é muito fácil”. Ele pretende encontrar uma mulher com quem possa viver, mas ainda tem medo de magoar a filha com isso e prefere esperar que ela complete 18 anos. Geraldo se preocupa com a garota o tempo todo e quer dar à filha tudo o que não pôde ter. “Não me acho bonzinho, esse é o meu papel de pai mesmo”. Roberto de Oliveira Filho, 27, também ficou responsável pela criação dos três filhos após a separação. A ex-mulher, até então, não trabalhava e se mudou para São Paulo, onde morava a mãe, para refazer sua vida. Roberto fazia Direito e trabalhava como auxiliar administrativo em uma loja de Belo Horizonte, mas decidiu deixar o curso e se dedicar à decoração de festas e serviço de buffet. Há dois anos, o rapaz se interessou por outro homem. A família lidou bem com a nova relação e as crianças, que já tinham contato com ele desde quando era apenas amigo do pai, se deram muito bem com seu novo namorado. A mãe das crianças se casou novamente e tem mais uma filha. No final do ano passado, por causa do excesso de


trabalho de Roberto, Gabriel (9), Camila (6) e Ana Clara (4) foram morar com a mãe. “Ela estava muito ausente e os meninos sentiam falta. Ficarem com a mãe é o melhor para eles neste momento, porque sei que não vão ser maltratados por uma pessoa desconhecida”. Roberto e o namorado sentem falta das crianças e, até o ano que vem, os meninos vão voltar a morar com o pai, que pretende estar com seu serviço de home fest mais estabilizado. “Depois que eles nasceram, nunca mais dormi completamente em paz, estou sempre preocupado. Mas quando estou triste e ouço um ‘pai, eu te amo’, tenho forças para tudo. Minha vida é para os meus filhos”. Lídia Pereira, 25, é mãe de Lucas (8) e Eduardo (5). Os meninos moram com os respectivos pais e ficam com ela nos finais de semana em que não precisa trabalhar. Funcionária de uma loja de departamentos, ela se sente culpada por não poder estar mais presente. “Dizem que o tempo quem faz é a gente, mas não é mesmo. Estou lutando para melhorar”. Lídia sempre gostou de se relacionar com mulheres, mas por pressões familiares, se viu obrigada a se envolver com um homem e foi aí que ela engravidou de Lucas, aos 15 anos. Casou-se e se separou três meses após o nascimento do filho. “Dudu” veio três anos mais tarde, quando a mãe estava sendo nova-

mente pressionada. Depois disso, Lídia resolveu assumir sua orientação para a família e exigiu respeito. E foi Ana Paula, a penúltima namorada, que a despertou para o fato de que ela era mãe e precisava cuidar dos filhos. “Antes eu era muito ‘porra-louca’ e não media as conseqüências do que fazia, queria recuperar minha adolescência perdida. Mas a Ana dizia: ‘não, você vai buscar seus filhos agora’, e seu não ia, ela mesma buscava e me ajudava a cuidar deles”. Hoje, Lígia afirma que seu amor pelos meninos é incondicional. “Se eu tiver que dar o mundo para eles, eu vou dar, eu ultrapasso todos os meus limites”. Ela sonha em morar com os filhos e percebe o olhar de reprovação de outras mães por não fazê-lo, mas sabe que eles estão melhor com os pais e diz que seria egoísta se quisesse ficar com os meninos sem ter condições. Ao ouvir essas histórias, meu objetivo era questionar se o amor de mãe estava realmente acima de todos os outros e se isso poderia ser provado através de atitudes, intenções ou escolhas. A única constatação que tive foi a de que ninguém pode saber exatamente o que vai dentro de cada um. O aprendizado, deixo por conta de quem tiver chegado até o final destas linhas. Afinal, por que estamos aqui, se não para aprendermos uns com os outros? t *nome fictício criado a pedido do entrevistado

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Por Ana Lúcia Andrade

Três personagens femininas imortalizadas pelo cinema em comédias que divertem espectadores há várias gerações Ninotchka

sentidos filmes

EUA, 1939, Warner Home Vídeo Direção: Ernst Lubitsch. Com: Greta Garbo e Melvyn Douglas.

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Lançado no ano que consagrava a chamada “Era de Ouro de Hollywood”, Ninotchka é protagonizado por um verdadeiro mito do cinema, Greta Garbo, em seu primeiro papel cômico, na pele de uma oficial soviética em missão em Paris. A publicidade na época do lançamento anunciava: “Garbo ri!” – chamando atenção para o fato de a atriz ser aclamada apenas por suas personagens dramáticas. A maneira monotônica de Ninotchka falar, assim como sua postura rígida, revelam uma mulher

Sabrina EUA, 1954. Paramount Pictures. Direção: Billy Wilder. Elenco: Audrey Hepburn, Humphrey Bogart e William Holden.

Nesta obra-prima sutil de Wilder sobre diferenças sociais, disfarçada de comédia romântica, encontra-se uma homenagem ao estilo das comédias requintadas de Ernst Lubitsch. Um filme feito sob medida para Audrey Hepburn, mito de sofisticação e beleza, que interpreta a sonhadora filha do motorista de uma família milionária. Desde criança, Sabrina é fascinada por David (William Holden), filho caçula da família Larrabee, que mal nota sua presença na

Tootsie EUA, 1982. Sony Pictures. Direção: Sydney Pollack. Elenco: Dustin Hoffman e Jessica Lange.

Diferente das Ninotchkas, Gildas ou Sabrinas eternizadas pelo cinema clássico hollywoodiano, Tootsie (apelido de Dorothy Michaels) é moderna, independente, decidida e durona, sem deixar de ser feminina. Apenas um detalhe: Tootsie é homem! A ótima comédia de Sydney Pollack, discípulo aplicado de Billy Wilder e Ernst Lubitsch, apresenta um ator talentoso, mas desempregado, Michael Dorsey (numa excelente interpretação de Dustin Hoffman), que se faz passar por uma


dura, com modos de um sargento (o que ela de fato é) e inflexível em seus princípios socialistas – tudo de forma cômica e mordaz, numa crítica a qualquer sistema ou doutrina que impeça a concretização do amor. Entretanto, a sargento acaba se rendendo ao capitalismo e aos encantos da “cidade luz”, quando se apaixona por um playboy (o excelente Melvyn Douglas) que representa tudo que ela repudia. Através da narrativa hábil de Lubitsch, a mulher fria começa a degelar em plena primavera, deixando

de lado sua radical postura política e desvelando sua feminilidade reprimida. Uma das obras mais marcantes do cineasta alemão e uma grande “escola” para Billy Wilder – que co-escreveu o roteiro e que mais tarde se tornaria um diretor consagrado, seguindo os passos do mestre da comédia sofisticada –, Ninotchka foi considerada pelo American Film Institute uma das 100 melhores comédias do século 20.

mansão. Depois de uma temporada em Paris, a garota tristonha transforma-se numa elegante mulher, apaixonada pela vida, mexendo com os hormônios tanto do irresponsável e sedutor David, quanto do irmão Linus (Humphrey Bogart), o frio e austero homem de negócios, que tenta seduzi-la para evitar que um empreendimento milionário seja desfeito. Na década de 1990, Sabrina foi refilmado, com roteiro baseado no de Wilder, pelo diretor

Sydney Pollack. Entretanto, nessa versão, o personagem masculino Linus Larrabee (interpretado por Harrison Ford) é quem mais se destaca, como o príncipe adormecido para a vida e despertado pelo amor da filha do chofer. No filme de Wilder, a personagem feminina personificada por Hepburn é o centro da narrativa, encantando o espectador que acompanha a trajetória da “cinderela” que, apesar de sua condição social, possui mais nobreza e caráter do que os próprios patrões.

atriz, travestindo-se, a fim de conseguir um papel em uma novela. Como um ator que leva muito a sério sua arte de representar, Michael vê em Tootsie não só uma forma de conseguir trabalho, como também um desafio de interpretação. A experiência inusitada torna-o famoso, um exemplo para o público feminino que lhe assiste, além de um homem mais sensível, capaz de compreender melhor as mulheres. Afinal, ele sofre na pele o que elas encaram diariamente, passando a fazer

dieta, a se preocupar mais com sua aparência e a se desesperar na escolha do melhor vestido para usar. Fora ter que aturar as cantadas desagradáveis de homens mais velhos e enfrentar o machismo do diretor da novela em que atua. Pollack conduz a narrativa com humor e sensibilidade, em um roteiro verossímil e muito bem estruturado. Tootsie aparece em segundo lugar na lista das 100 melhores comédias do American Film Institute.

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Letra

Alice

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Um mini-conto e sua trilha sonora, com olhos de menino para histórias de menina.

O jeito comque ela tirou o sapato e sentou no chão, dispensando o sofá, naquele dia, faria corar o rosto de qualquer mãe daquelas que ainda defendem a tradicional família mineira e seus bons modos. De qualquer maneira, Alice tinha um outro planeta dentro dos seus olhos. Mas não era um daqueles lugares frios e distantes. Era uma terra com a cara dela. Dava para saber o caminho só de ver os olhos dela, e nos sentir bem-vindos quando ela via o nosso. De volta à Terra, podemos cortar para alguns meses depois, na cena em que Alice escova o cabelo com força e meu amigo se empenha em ajudá-la. O casal estava sintonizado, como se tivesse se conhecido no dia em que fiz um ano, não 22. Neste mesmo dia, Alice nos explicou que em uma determinada hora do nascer do Sol, as nuvens ficam cor-de-rosa, parecidas com plufes. Não me pergunte (nem a ela) o que são plufes, mas eu concordei totalmente com a comparação, e esta é outra coisa da qual eu não vou me esquecer. O corte final é para o primeiro dia em que vi o casal depois de saber da notícia da gravidez nãoplanejada. Alice estava assim: exatamente a mesma. Exatamente a mesma calma. Normal seria os amigos darem força e dizerem que tudo vai dar certo. Mas foi o contrário: ela acalmou a todos. Parecia que estava preparada para a gravidez há anos. E quem vai dizer que não estava? A criança vai gostar de andar descalça e admirar os plufes no nascer do sol. E vai ter um planeta inteiro para ela. Alice é a primeira mãe na minha geração de amigos. A tradicional família mineira do futuro vai ser bem mais legal.

Lullaby Renditions of Coldplay Coldpaly (Baby Rock Records) Música “Don’t Panic”, da banda inglesa Coldplay, é uma trilha perfeita para a gravidez de Alice. O título da música diz tudo o que ela nos disse sem palavras naquele dia. O refrão ainda confirma: “We live in a beautiful world”. A música pode embalar também as cenas do bebê. “Don´t Panic” é uma das faixas do disco “Lullaby Renditions of Coldplay”. O álbum foi lançado pela gravadora califorinana Baby Rock Records (www. babyrockrecords.com), especializada em transformar discos de bandas de rock em canções pop de ninar. Outras bandas regravadas foram Led Zeppelin, Pink Floyd, Nirvana, Pixies, Beach Boys, Smashing Pumpkins e Metallica. Se a criança aprender a cantar o clássico metaleiro “Enter Sandman” antes dos três anos, aí sim a nova família mineira vai ser a melhor do mundo.

Rodrigo Ortega tem treze letras e seu acorde preferido é lá maior.

letra e música

Três coisas sobre Alice que nunca vou esquecer: ela gosta de andar descalça, ela escova o cabelo com força e ela ficou grávida aos vinte anos. Talvez eu nem me lembrasse de Alice e de que eu a conheci no dia do meu aniversário, se neste mesmo dia ela não tivesse ficado com meu amigo e logo depois começado a namorá-lo.


Noites de gala, samba na rua Mônica Salmaso (Biscoito Fino)

Autófago Makely Ka (independente)

Duos Lanny Gordin (distribuição: Universal Music)

Ao longo das primeiras 15 primaveras – e de forma definitiva –, uma série de compositores antecipa, em nós, ideais, amores e amargores que, mais tarde, reconheceremos – existencial ou musicalmente – como o espaço do aconchego, um certo “estar em casa”. Quando convidada a cantar a última faixa de Carioca (2007), álbum de Chico Buarque, a cantora paulista Mônica Salmaso reencontrou vestígios de seu próprio universo de aconchego. Ao interpretar Imagina, de Chico e Tom, nela avivou-se a idéia de reviver a obra de um de seus “compositores-mestres”, que, ao lado de Dorival Caymmi, lhe ensinara “música e também alma e cultura brasileiras”. Deste rememorar, nasceu Noites de gala, samba na rua, disco em que Mônica interpreta, ao lado do grupo Pau Brasil, 14 clássicos do compositor carioca de 1966 a 1997. As reminiscências musicais da cantora revelam seu poder de reinvenção, mesmo em canções conhecidas. Ressalte-se que, caso a tensão sonora das versões do disco – repletas, ainda, de quebra de ritmos – aborreça ouvidos afeitos à veia sambista de Chico, o cantar técnico e maduro da intérprete atraem para o espetáculo de sons inesperados. O grupo Pau Brasil garante leveza e mistério em texturas próprias à doce voz de Mônica. Se Quem te viu, quem te vê não apresenta novidades, a tensão rítmica de O velho Francisco e o baixo elétrico de Bom tempo transportam o ouvinte a épocas imemoriais. Ou, talvez, ao “tempo da delicadeza”, tão bem descrito pelo próprio Chico. Ao contrário do que se espera, não há defesa anti-pirataria. Preocupe-se, apenas, em ouvir o disco. E que os ouvidos retornem à Grécia, onde os aedos, informa o compositor, doavam conhecimento, sem fins lucrativos. Ou, diz o também poeta, reavivam, do Nordeste, os cantadores que, décadas atrás, entregavam sua arte, com força e leveza, a quem bem lhes aprouvesse. Da Acrópole à Afonso Pena. Do sertão à Praça da Liberdade. “Desliguem os celulares”, ouvintes, e embarquem, hoje, ao território do versejar, espaço de auto-conhecimento, impressões lúdicas, expressões contemporâneas. Nas mãos, o passaporte: Autófago, CD do poeta e compositor Makely Ka, produzido por Renato Villaça. Sigam o que lhes pede o autor – como bem profetizara o filósofo Walter Benjamin: copiem, dissequem, mastiguem, sem culpa, o conteúdo do álbum, peripécia poética, musical, e – por que não?! – cênica de Makely Ka, formada por 13 faixas (atos?), além da bônus o meteoro (assim mesmo: em caixa baixa. Afinal, por que realçar a dimensão física das letras? Mais vale o verso-pensamento que a superfície pouco digerida, nada experimentada). Nesta “ópera” moderna, feita de guitarras, samplers, vozes eletrificadas, Makely Ka poetiza o punk, o RAP, o samba. Tudo bem mastigado, à moda dos primeiros antropofágicos. Ouvir Autófago, pois, é perceber que, para alguns, a poesia nasce de tudo, e sem dor. Ao mesmo tempo, ouvir Autófago é perceber que, ao nascer sem dor, a poesia nada será, se não embriagada de música. Ele está de volta! E, como todo astro de respeito, permanece ladeado de estrelas. Considerado, na década de 1970, “o Jimmi Hendrix brasileiro”, Lanny Gordin, um dos mais importantes guitarristas do país, lança o primeiro disco-solo da carreira. Em Duos (2007), que conta com distribuição da Universal Music, o instrumentista não brilha só, mas acompanhado por vasta constelação da MPB. No disco, a lista de nomes a quem Gordin empresta sua guitarra revela a importância do músico, há pelo menos três décadas distante dos holofotes. Aliás, quem crê não conhecê-lo, não sabe a que grandes empreitadas suas mãos já se entregaram. Principalmente nas décadas de 60 e 70, quando o guitarrista oferece seu talento a alguns dos mais importantes “projetos” e ícones do cancioneiro nacional, da Tropicália – convidado pelo maestro Rogério Duprat –, a nomes como Erasmo Carlos, Tim Maia, Jards Macalé e Eduardo Araújo. Nascido em Xangai (China), em 1951, o guitarrista desembarcou no Brasil aos sete anos. Autodidata, já atraía a atenção de todos aos 16, quando tocava, na boate paulistana Stardust, de seu pai, ao lado de músicos como Hermeto Pascoal e Heraldo do Monte. Afastado dos palcos devido a problemas com drogas, Gordin retorna agora ao “céu” da canção brasileira. E em grande estilo! Duos deve ser ouvido em silêncio: aparte as belas vozes, cada nota da guitarra tem o seu – estelar – porquê.

sentidos música

por Maurício Guilherme Silva Jr.

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por Mariana Marques

Carmen

sentidos livros

Ruy Castro 2005 Editora Companhia das Letras

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Clube dos corações solitários André Takeda 2002 Editora Conrad

Chapeuzinho Vermelho e o Lobo-Guará Ângelo Machado 2002 Editora Melhoramentos

Confesso a minha ignorância: antes de ler Carmen, de Ruy Castro, a única idéia que tinha de Carmen Miranda era a de uma mulher vestida de baiana, com um pomposo turbante de frutas na cabeça, cantando o samba de Caymmi O que é que a baiana tem?. Só sabia que ela não havia nascido no Brasil, mas em Portugal, porque essa é uma das clássicas perguntas-pegadinha em programas de quiz. A biografia de Ruy Castro vem para quebrar esse estigma. Os detalhes da vida de Carmen denotam pesquisa extensa sobre aquela que ficou conhecida como “a pequena notável”.

André Takeda é nome conhecido pelos brasileiros fãs do inglês Nick Hornby e seu romance Alta Fidelidade. Takeda pode ser considerado uma espécie de Hornby brasileiro e contribui para um gênero ainda pouco explorado no país: a literatura pop. Clube dos Corações Solitários é narrado por Spit, um jornalista de 20 e poucos anos que acaba de levar um pé na bunda, e parte dessa angústia para descrever sobre os problemas típicos dessa época da vida: o emprego que não

Muita coisa já foi modificada na história de Chapeuzinho Vermelho, que originalmente vem da tradição oral francesa do século 17. A primeira versão para a literatura infantil é de Perrault, mas a mais consagrada ainda hoje é a dos Irmãos Grimm. Ângelo Machado, formado em Medicina na Universidade Federal de Minas Gerais, é um dos estudiosos da famosa história. Partindo da premissa de que o conto pode deseducar ecologicamente as crianças, o autor transporta a história para o Brasil, e Chapeuz-


No livro, é possível entender como se deu seu estrondoso sucesso, desde o estouro da marchinha de carnaval Taí, em 1930, até a consagração em Hollywood. É surpreendente a trajetória que levou Carmen a se tornar a mulher mais bem paga do mundo em 1944 e que, com todo o sucesso, não realizou seu maior desejo, o de ser mãe. Mesmo com críticas de que estava americanizada, sua a voz ainda era disputada por diversos compositores. Modesta, a cantora chegou a recusar Brasil Pandeiro, de Ary Barroso, por achar que o verso “Anda dizendo que o molho da baiana melhorou seu prato” poderia

soar pretensioso. Talvez, em certos episódios, o autor tenha deixado seu enlevo por Carmen sobressair-se, como quando descreve as atitudes do marido Sebastian. Tal característica acaba sendo relevada perto das qualidades do livro, como a exímia descrição do Rio de Janeiro e de Hollywood no início do século 20. Da euforia dos primeiros carnavais ao final melancólico em Los Angeles, entendi porque aquela mulher de turbante na cabeça foi digna de merecer as mais de 600 páginas dedicadas a sua vida.

é lá grandes coisas, a vontade de sair de casa, a espera por outro relacionamento estável. E aí é fácil abrir um sorriso ao se identificar com clichês como “morar sozinho é o maior barato”. Enquanto Spit narra as festas – sempre, é claro, com diversas referências musicais –, o conflito com a família e os dilemas amorosos, é fácil continuar com o tal sorriso de “sei bem o que é isso aqui”. O problema acontece lá pela metade do livro, quando o romance descamba para um lado hippie, quando Spit e seus amigos vão

para a praia e tentam ganhar dinheiro fazendo shows. Não é que a leitura fique desagradável, mas é que dá vontade de ver Spit encarando seus problemas na cidade, com a possibilidade de esbarrar com sua ex. Afinal, não é mais ou menos assim que funciona com a gente? Acampamentos hippies à parte, Clube dos Corações Solitários é daqueles livros que me deu vontade de escrever, ainda que um romance apoiado em meus dilemas tão clichês. E está aí um elogio que todo escritor deveria gostar de receber.

inho vai visitar a avó pelo caminho do cerrado. O Lobo-Mau não aparece na história, já que havia desistido de praticar suas maldades em terras tupiniquins e voltado para a Europa. É no cerrado que Chapeuzinho encontra o Lobo-Guará e é também nesse ambiente que a história de Ângelo Machado funciona como grande aprendizado para as crianças. A começar, apresenta a região, seus animais e frutas típicas. A preocupação maior é em descrever o Lobo-Guará, espécie ameaçada de extinção.

Chama-se atenção para o fato de o animal gostar de comer frutas, hábito fundamental para o desenrolar da história. Quanto mais versões da história de Chapeuzinho a criança conhecer, melhor. E a leitura da versão de Ângelo deveria ser obrigatória nas escolas. Quem sabe pelo menos mais crianças não poderiam se convencer através de Chapeuzinho e desse novo Lobo de que “fruta é muito legal”?

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Entre o

bom e o perfeito

eu-tu

Por Manoella Oliveira

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Quando olhamos para alguém na rua cujo tipo físico nos chama a atenção, é difícil imaginar que o dono daqueles olhos lindos tenha pés frios que vão nos incomodar durante toda a noite, ou que ele não consiga conversar sobre nada agradável por mais de 15 minutos. Na realidade, fazemos exatamente o contrário. Pensamos que aquela pessoa, que por acaso passou do nosso lado, seja não apenas o ser mais charmoso que já vimos, como deve, também, ser interessante, carinhoso, gostar de boa música e ter formação cultural. Às vezes, o pensamento vai mais longe e começamos o devaneio em torno de como seria o caráter, a ética e o humor do sujeito. O mais provável, no entanto, é que o “bom partido” atravesse a rua e você não o veja mais. Pode acontecer também de você conseguir conhecêlo, e o pretendente ser mesmo simpático, bonito, ter um sorriso lindo e... palitar os dentes à mesa, após as refeições. Isso não se chama pessimismo, mas idealização. Trata-se de uma dinâmica corriqueira que nos leva à construção de uma realidade plena, até que elementos não planejados apareçam e nos conduzam a outra realidade - algumas vezes, também à frustração. Reunimos uma série de conceitos que compõem nossa idéia de perfeição e nos empenhamos na realização do desejo. Nesse sentido, a idealização não se dá somente em relação a pessoas, mas a processos, objetos e situações.


As pessoas se tornaram atores da cena pós-moderna. A sexualidade como esta sendo vivida não é liberdade, é um ato de produção “Idealizar é fantasiar que a vida poderia ser integralmente conforme aquilo que se quer. A frustração advém da constatação de que isso não se realiza, o que é desejado não coincide exatamente com o que se pode encontrar”, explica o professor e psicanalista Guilherme Massara. Para ele, sofrem, no campo amoroso, aqueles que não suportam essa realidade e traduzem as decepções em brigas, afastamentos, traições e disputas. De acordo com o professor e psicólogo Orestes Diniz Neto, podemos editar a realidade nas nossas representações, de forma mais ou menos condizente com o que é real. “Partindo disso e da observação de relacionamentos entre indivíduos que se desejam, o que percebemos é que nossa sociedade constrói estereótipos que se baseiam na pré-suposição de que a satisfação está ligada a você se tornar esse estereótipo ou a você se relacionar com ele”. As imagens construídas são embasadas em experiências reais, geralmente associadas à imagem de uma celebridade. Sua criação passa por instâncias do indivíduo, por suas vivências, mas a consolidação deve créditos à mídia. Maria Emília de Queiroz, 47, que o diga. Quando ela pensa em um tipo ideal, lembra logo do ator Caco Ciocler. Mas para ser perfeitinho mesmo, teria que ser o Caco em uma versão homem trabalhador, sensível e honesto. Será possível? “Claro que é! Só não achei ainda. Em todo homem falta sensibilidade ou, pelo menos, nos homens que já encontrei”, conta. Apesar disso, Emília se considera realista. “Não sou idealizadora. Idealizar é pegar um pouco do

marido da vizinha, do da amiga, do seu próprio marido... Sei que não existe ninguém exatamente do jeito que a gente quer”. Daniel Prado, 27, concorda. Solteiro, ele se diz em busca de uma mulher afetuosa, que goste de receber carinho, inteligente, “antenada”, que tenha um bom papo, que seja companheira, admirável, compreensiva e que goste de sexo. Ele admira as morenas, as loiras, as mulatas e as orientais. Lúcido, o rapaz não tem pretensão de encontrar tudo isso em uma pessoa. “São características que aprecio em uma mulher, mas não precisa unir tudo em uma só. Mesmo porque, seria difícil conseguir uma mulata oriental”, brinca. Daniel joga no time dos que não se consideram idealizadores. “Como sou poeta, sou um sonhador, mas não confundo as coisas. As mulheres me trouxeram grandes alegrias, tristezas e até loucura, mas não pelo que são, e sim porque já estive muito apaixonado e não fui correspondido. Meus relacionamentos não terminaram por frustração, talvez o problema esteja comigo”. Ao contrário de Daniel, que se definiu como um solteiro “no rock”, Rafael Queiroz, 24, só namora pessoas que já conheça há mais tempo. “Isso facilita. A partir do momento que você sabe como é uma pessoa, você já começa um relacionamento sabendo como vai ser”, teoriza. “Mas eu não sou bom para adivinhar”. Na prática, Rafael explica que quando a relação é de amizade, as pessoas demonstram sentimentos de forma diferente do que seria em um relacionamento amoroso, por isso, a estratégia é pouco funcional.

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Num outro mundo

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Espero o melhor da situação. Alguém fica planejando como vai terminar um relacionamento que está na primeira semana? Penso em como será daqui pra frente

Paula Lima, 22, não espera encontrar um namorado em sua roda de amigos. Pelo contrário, busca-os bem longe dali. A veterinária já se relacionou com pessoas de outros estados – o atual namorado é de São Paulo – e diversos países. Ela espera fidelidade, cumplicidade, amizade e amor por parte do outro. Fisicamente, diz não fazer exigências. Para ela, a Internet não incentiva a “enfeitar” a realidade. “Acho até que no início do relacionamento eu idealizo, mas em pouco tempo eu ‘coloco o pé no chão’. Como você não vê a pessoa todo dia, a conversa precisa ser mais aberta e aí você a conhece de verdade”. Ela admite que virtualmente os processos de conhecer o outro e tornar a relação concreta são mais demorados, mas depois desse tempo, é como um relacionamento “normal” com encontros menos freqüentes. Paula conta que no namoro à distância passa-se pouco tempo juntos, por isso a expectativa de como vão ser esses momentos é enorme, mesmo que seja um simples fim de semana. “Fico muito frustrada quando acontece alguma briga, ou qualquer evento que estrague esses dias, como quando planejo um jantar e ele quer fazer outra coisa”, afirma. Mariana Fernandes*, 21, também opta pelo mundo virtual para encontrar pretendentes, mas confessa que já se decepcionou várias vezes. “Depois que a gente ficava, eu descobria que ela não era nada daquilo. No meu último namoro foi assim. Ela saía escondido, bebia, ficava com outras pessoas e mentia. Não admito mentira, perco a confiança”. Moradora de Uberaba, Mariana diz só se interessar por belo-horizontinas. Dos quatro relacionamentos que teve, três foram com meninas da capital. “Acho que relacionamento à distância não dura, mas não é uma regra. É uma relação trabalhosa porque você fica com saudade e não pode estar sempre perto. Não é a questão de idealizar que interfere. Dá pra fantasiar se a pessoa estiver a duas quadras de casa ou do outro lado do mundo”. Mesmo assim, Mariana está comprometida e afirma que pretende se casar. “Não tive boas experiências, mas espero, e acho que não é difícil, que um relacionamento dure até eu ir para ‘minha covinha’. Tenho avós com casamento destinado ao sucesso. Quando se trata de pessoas do mesmo sexo, não vejo muitos relacionamentos dura-

douros, não sei se é porque é menos difundido ou se a pressão social acaba dificultando”. Rodrigo Ávila*, também acredita no “para sempre”. “Ironicamente, isso me dá preguiça: sinto que estou perdendo tempo procurando minha alma gêmea aos 19 anos, porque os poucos relacionamentos que dão certo são entre pessoas que se conheceram adultas. Ninguém diz nas ‘bodas de ouro branco’ que se conheceram quando ainda eram jovenzinhos. Sempre é depois de outras experiências”, afirma. O estudante é um dos raros idealizadores assumidos. “Crio expectativas, aliás, esse é meu problema. Adoro sair, beber ‘pra caramba’, dançar e ficar com várias meninas e meninos. Não acho baixo, acho divertido. Mas monogamia e fidelidade também são rock’n’roll”, diz. “Quando me vejo num terceiro encontro com alguém que fiquei só por diversão, acho que poderá vir a ser sério e espero que a outra pessoa sinta o mesmo. Sempre me frustro”.


Casamento é uma bela forma de tornar público o que um sente pelo outro. E como muitas mulheres idealizam isso, acho que me casaria. Casamento pressupõe festinha e eu adoro festinha Pos(s)es O estereótipo construído da mulher desejável pressupõe que ela tenha determinada forma física e um jeito de ser. Quanto aos homens, a expectativa é em relação ao status e aos bens que possuem. Apesar de em menor intensidade, se comparado ao sexo oposto, seu aspecto estético também vem sendo explorado. E tais padrões induzem ao consumo. Algumas pessoas passam a comprar não apenas um produto, mas um objeto que dê a elas qualidades que os tornem tipos ideais – o que não passa de ilusão. Nenhuma etiqueta nos faz mais bonitos, certos carros não tornam um homem mais viril e um tênis não faz de um adolescente mais cool. “Vão se criando termos para a sociedade de consumo e destruindo o planeta pela maneira como se cultua ‘o ter’. As relações são vividas superficialmente e agenciadas por esses meios que definem a qualidade da relação”, diz o psicólogo Orestes Neto. Sua crítica é a de que uma relação, para ser considerada bem sucedida, tenha que seguir rituais e

configurar os participantes em papéis. “Assim, o outro se torna um meio para me produzir. Você não é, você só é enquanto possui o outro. As relações são superficiais e demandam pouco investimento: são como relações de consumo”. Ele acredita que muitas dessas características fazem parte da produção e alienação de si. As pessoas não são assim, mas agem assim. Elas são produtoras de uma forma de ser. “Digo que a sexualidade como está sendo vivida não é liberdade, é um ato de produção, se produz uma forma de ser e não de se viver. Por exemplo, cito a disputa que as adolescentes fazem por quantas bocas beijaram em uma noite. Elas não estão interessadas em nenhuma boca em si. Se houvesse interesse, elas ficariam só com aquela. Elas querem ser vistas como alguém que possui muitas bocas, mas para isso elas têm que se deixar possuir por muitas bocas. Você não se entrega a quem você escolhe se entregar, mas a quem te possui, porque você escolheu possuir”.


No mesmo barco

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Nenhum de nós está livre de idealizar e ser idealizado. De acordo com Orestes, a cultura reforça esse processo ao aproveitar nossa capacidade de construir imagens que são, a princípio, valorizadas em nossa família e em nosso meio. Uma dessas idealizações clássicas aparece nas histórias infantis. “Quando eu pergunto como terminam os contos de fada, as pessoas respondem ‘felizes para sempre’, mas eles terminam com ‘casaram-se e foram felizes para sempre’. Aí está a idéia de que o casamento é a felicidade eterna, desde que se encontre a pessoa certa. Isso é uma imagem chapada, como toda idealização. Não tem o lado escuro, não tem os pratos a serem lavados no dia seguinte”. Além do universo das crianças, existe também a literatura romântica do século 19. “Nessa narrativa, a mulher era exaltada numa gama de virtudes e dons que a tornavam, por assim dizer, uma musa. Uma mulher tão perfeita e inatingível não alimenta mais que a fantasia, as aspirações e a poética desses autores. A condição para que ela exista é, paradoxalmente, a de que ela não possa ser encontrada”, esclarece Guilherme Massara. Nos romances, no cinema e nas novelas, a idealização é representada, basicamente, nas situações em que o individuo é rejeitado por não ser tão perfeito. “Essas dezenas de comé-

dias adolescentes, nas quais jovens não são aceitos por não serem populares, exploram o tema à exaustão”, lembra Orestes. As mídias e as artes criam esses estereótipos, e levam os indivíduos a idealizar tanto do ponto de vista positivo, incentivando os indivíduos ao desejo, quanto do ponto de vista de se iludir, o que obscurece as relações. Mas a idealização não é, em si, boa ou má. Especialistas afirmam que a humanidade sempre idealizou, mas isso tem sido agenciado pela modernidade e usado como modo de produção de uma certa forma de cultura e de determinada maneira de ser. Esse tipo de apropriação social se baseia, por um lado, no alcance dessa fantasia, que faz com que o indivíduo crie o que for necessário para realizá-la. Nessa dinâmica, todos sofrem, mas algumas pessoas sofrem mais. São aquelas que tendem a se identificar com os imperativos sociais, que encontram menos referências na sua história de vida e refletem menos sobre o que é proposto como ideal. “Uma pessoa que passou a adolescência rejeitada tende a buscar um padrão de aceitação e, com isso, se equivocar; além da frustração de perder o bom na vida e no outro por causa do perfeito inatingível”, resume Orestes. t * Nomes fictícios criados a pedido dos entrevistados.

Na verdade é só um planejamento exagerado. A gente vai ao cinema, o filme vai ser ótimo, vai virar o nosso favorito, sempre lembraremos desse dia.


Em defesa dos trogloditas Antes de qualquer coisa, me perdoem pelas generalizações. Seria extremamente chato ficar o tempo todo dizendo “é claro que não são todos (as), mas...”, então conto com o bom senso dos leitores. Por mais que contar com o bom senso das pessoas não seja algo de que eu me orgulhe. Não posso falar por todos os homens, mas terei que defendê-los. Por mais que de fato acredite que, no geral, as mulheres tenham motivos para reclamar deles. Ou de “nós”, melhor dizendo. Ou pelo menos dos delas, com certeza. Com quem será que está o problema dos relacionamentos, afinal? Com esses insensíveis tipos masculinos que só pensam em si, ou com as delicadas donzelas que fazem igual e não notam? Porque em geral, as mesmas coisas das quais as mulheres reclamam, os homens também poderiam. Seja da falta de “tato”, da minimização dos problemas alheios, do machismo, da falsidade... É só uma questão de inverter a situação. Bom exemplo disso é que tudo sempre fica pior quando é o cara quem fala. As mesmas palavras na boca de uma mulher são vistas como menos agressivas, mais bonitas. Mesmo quando ela é feia. Se “ela” me chamar de idiota, tudo bem. Mas se chamá-la de vaca, aí eu peguei pesado. Inverter a situação serve também para as coisas das quais não se abre mão num relacionamento. Suponhamos que uma mulher diga ao seu parceiro que “sexo, só depois do casamento”. Bom, se o cara a ama de verdade, ele que espere, não é mesmo? Talvez até seja. Mas agora vamos pensar o contrário. E se o homem disser que “namoro, só depois do sexo”? Será que o discurso feminino permanecerá coerente, e ela, se gostar de verdade dele, então tem mais é que aceitar? Não tenho como saber qual seria a reação exata de uma mulher a uma condição como essa, porque infelizmente não tinha pensado nisso até o meu último relacionamento. Mas garanto que as amigas da escolhida me chamariam de idiota por muito menos. Ambos disseram a mesma coisa, ainda que opostos: “não abro mão disso”. Ou será que perdi algum detalhe? Infelizmente não posso ver, mas essa cara de “e não é que eu discordo mas só pra não admitir” que vocês provavelmente fizeram, valeria minha semana. Certo, meu mês.

gente é sempre gente

Bruno Costoli é alguém mais legal por escrito do que ao vivo. E bonito também.

Porque tudo é uma questão de ponto de vista

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elemento terra

Nosso conceito de evolução

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Não me arriscaria a definir o que é evolução. Ouvi falar do tema pela primeira vez há alguns anos, em um banco de escola, no mesmo dia em que ouvi falar de Darwin e sua teoria famosa. Lembro-me também de que conhecê-la me trouxe algum esclarecimento e uma dúvida crucial.

Confesso que o ambiente ao redor não colaborou. Conhecer sobre a evolução da espécie cercada por tipos infames de colégio particular que só faziam lixar as unhas e contar piadas me fez aumentar o questionamento. Pensei durante horas até que ponto iria esse sagrado e científico “evoluir” e concluí que a conversa do moço era meio furada, ou meio incompleta. Sinceramente, a mim não cabe entender qual a origem da vida: agora que ela se fez, não tem mais volta. Digo mais, acredito que a explicação seja grandiosa a ponto de ser incompreensível ao ser humano. O que me interessava, e ainda importa, é saber se a evolução da espécie era só isso, se a glória da evolução é o ser humano. Esse que eu vejo todos os dias falando alto pelas ruas, sem o menor respeito pelo outro, elegendo corruptos e reelegendo Bush, dando audiência a porcarias alienantes na tevê e, pior, pensando que assim está bom, com o perdão das honrosas e raras exceções. Não ousaria dizer que as pessoas não evoluem, porque o conceito de evolução é muito amplo, ou que o ser humano não faz por merecer o título de espécie evoluída concedida por Darwin, mas, a mim, parece que as pessoas não melhoram. Acho que o termo é esse. Os assuntos se repetem com freqüência tediosa. As publicações falam sobre relacionamento com uma roupagem atualíssima daquilo que já se via há centenas de anos, insistem em ensinar uma mulher a se comportar. Mudou, sim. Antes ensinavam como era importante saber cozinhar para prender um homem e, hoje, ensinam como agir na cama para...ahn...prender um homem. Moderno, não? Os programas humorísticos televisivos inventam formas de recriar preconceitos regionais, classistas, sexistas, homofóbicos e outro sem-fim de maneiras de firmar estereótipos ridículos que não contribuem nem com a educação do povo, nem com um simples fim de semana em frente à tevê. As pessoas vibram com a igualdade entre os sexos, enquanto no restaurante da esquina de casa ainda existe diferença de salário entre homens e mulheres que executam a mesma função - moro ao lado de um clichê. E demos “viva” ao poder de andar pela rua falando o que quisermos, nos termos que bem entendemos, e fazermos o que nos vier à cabeça, porque isso, agora, é chamado liberdade - pergunto a meus botões o que será “limite”.


Copiemos. Repito que não ouso dizer da complexidade do processo de evolução, mas sei que melhorar não deve ser tão complicado assim. Penso, sem a pretensão de estar certa, que melhorar é fazer o que nosso coração indica, com respeito pelo outro. É ouvir as músicas que nos fazem bem sem obrigar o vizinho a ouvir, é comer o que gostamos sem querer que todos gostem, é respeitar as escolhas dos outros, orientando apenas quando nos pedirem por isso, é questionar se você não estamos gastando energias com certas coisas só porque sempre foi assim. Com ou sem Darwin, e independente de teorias, acredito em nossa essência divina, obscurecida por pequenos hábitos mundanos que merecem ser revistos. Revisemo-nos.

Manoella Oliveira é uma das editoras da tato e ainda não descobriu o que é sentimento de pertença

Parece que nos tornamos reféns da nossa própria mediocridade. E como é cansativo ver o mundo se repetir porque as pessoas se repetem, porque pensam que evolução é, talvez, espiritual demais para a era do consumo. Ou espiritual demais para isso que nos tornamos. Compra-se depois um espacinho qualquer, onde quer que seja, para passar a eternidade, se ela existir. Enquanto a hora não chega, fiquemos aqui nesse descaso conosco, comendo junk food porque é mais rápido e gostoso, sem se importar com o que nosso corpo absorve. Comer alimentos saudáveis é se render à ditadura da beleza e, conviemos, picar legumes dá um trabalho danado. Fiquemos aqui reproduzindo neuroses, ensinando às meninas que carrinho é coisa de menino para depois cobrá-las que saibam e gostem de dirigir. Falemos também aos meninos que boneca é brinquedo de menina e cobremos deles, quando adultos, o hábito de cuidar de crianças. Vamos assistir a reality shows e ligar desesperadamente para tirar ou colocar fulano em uma casa, porque disso depende estar ou não inserido na conversa nossa de cada dia. Estamos terrivelmente pautados. E como é edificante saber como se portam indivíduos trancafiados com desconhecidos e aceitar aquilo como exemplo de comportamento. Claro, afinal quem está na tevê é famoso e todo sucesso é legítimo.

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na pele

Foi bom

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pra você? Por Thays Prado

Sejamos honestos, quando o assunto é sexo quase todo mundo conta suas “mentirinhas”. E não adianta dizer que são só os homens, porque as mulheres também gostam de criar uma imagem, qualquer coisa entre virgens santas e personagens saídas de um legítimo filme pornô. Não, não vou condená-las por isso nessa matéria. Se a proposta é sermos honestas, confesso que fiz questão de me apresentar como editora de uma revista feminina a todos os profissionais que entrevistei e de usar o famoso “as pessoas” nas perguntas que fiz. E o medo de eles acharem que as dúvidas também eram minhas, ou que eu também (não) fazia isso ou aquilo? Senti na pele como é mais confortável manter a pose de bem resolvida. Fato é que, atualmente, vivemos uma grande confusão com nossa sexualidade. “Existe uma discrepância muito grande entre o que é propagado e o que as pessoas estão realmente vivendo”, afirma a sexóloga Cida Lopes. E parece que a ordem do momento é gozar. “Hoje isso é super idealizado. As pessoas pensam: ‘O que ela vai falar de mim se eu disser que não tive um orgasmo?’, ‘Como eu vou dizer que só tenho um, se minha amiga diz que tem três, quatro?’”, observa o terapeuta corporal especializado em sexualidade, Fábio Oliveira. Por causa disso, “as pessoas” têm se sentido na obrigação de sempre chegar ao orgasmo, como se fosse garantia para se dizer que a relação sexual foi “ma-ra-vi-lho-sa”. A psicanalista Miriam Moreira acredita que vivemos na cultura do gozo, o que significa que precisamos passar a todo mundo a impressão de que estamos felizes e, nesse sentido, seria uma vergonha não gozar. Na verdade, a situação já foi bem pior.


Passado presente Durante a Idade Média, muitas mulheres foram mortas por terem orgasmos. Entendia-se que elas eram bruxas e estavam tendo relações com o demônio. “É lógico que era uma forma de eliminar a mulher do poder. Como aconteciam muitas guerras, as viúvas começaram a se tornar donas das propriedades, e isso era inconcebível. A questão era política, mas o que estava colocado como argumento era a sexualidade e, principalmente, o orgasmo, proibido nessa época”, explica Cida Lopes. Fábio Oliveira volta ainda mais no tempo e afirma que nas sociedades matriarcais o prazer era sagrado e o orgasmo era entendido como algo natural, a que todos tinham direito. E mesmo nas sociedades gregas e romanas, a sexualidade era vivida sem censura. Cida esclarece que é na Idade Média, com o cristianismo, que se separa corpo e espírito e se determina que a relação sexual era um ato exclusivo para a reprodução. Se pensarmos bem, há poucas décadas, mulheres “direitas” não podiam sentir prazer. Em certa medida, ainda hoje crescemos cheios de tabus em torno da questão. O terapeuta corporal assegura que a energia de prazer é inerente ao ser humano e pulsa dentro de nós o tempo todo, por toda a vida. No entanto, em função dos condicionamentos sociais sofridos durante nossa trajetória, vamos nos afastando de uma vivência prazerosa e perdendo a consciência de nosso próprio corpo. “No consultório a gente percebe que, para muitas pessoas, ainda é assustador falar sobre isso. Quando uma pessoa reclama de algo do ponto de vista sexual, podese perceber que a história dela foi toda construída em uma base de não prazeres. Nossa educação propicia muitos estímulos assim: a gente não se sente no direito, é pecado, engorda, dá neném, só pode depois de casar, só pode um homem com uma mulher, ou uma mulher com um homem”. A sexóloga atenta que os pais ainda têm muita dificuldade em falar com as crianças sobre sexo. “No momento em que elas mais perguntam e estão livres de preconceitos, não obtêm respostas. Quando sentem vergonha, já não perguntam. E quando o adolescente chega à relação sexual, ele já se cobra saber e não se permite errar”. Para ela, a sexualidade traz um contexto de poder, em que se controla o outro pela culpa, pela punição, pela falta de liberdade sobre o próprio corpo.

Fábio afirma que a pílula anticoncepcional foi um grande avanço para que a mulher recuperasse a soberania sobre seu corpo e desvinculasse sexo de procriação, abrindo possibilidades para a vivência plena de sua sexualidade. Cida atribui o ganho na qualidade das relações sexuais de hoje à luta das mulheres por igualdade. Ela conta que a ejaculação precoce, uma das consideradas disfunções sexuais, era um atestado de virilidade para os homens há alguns anos. “A mulher não tinha prazer mesmo, ela fazia sexo por obrigação. Então, muitas vezes, o homem contava como vantagem: ‘Nossa, eu gozei antes de penetrar, antes da minha mulher tirar a roupa. Olha quanto tesão eu tenho’. E hoje a mulher pergunta: ‘Já foi? Você não vai me esperar?’”. No entanto, Cida diz que “é muito difícil sair de um padrão de ‘não pode’, para um em que a gente ‘tem’ que ter orgasmos inesquecíveis”. Assim, muitas vezes o foco se mantém no resultado e não no prazer. “Fixa-se o olhar no ‘eu tenho que gozar, quando vai ser?’ e isso gera tensão. Orgasmo é uma conseqüência, uma explosão de prazer, não um lugar a ser atingido”, esclarece Fábio. Miriam Moreira observa que relações adoecidas são construídas a partir dessa exigência. “Nas relações de casal, pode se estabelecer uma disputa fálica sobre quem vai gozar, quem vai conquistar a felicidade”.

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Orgasmos “Seja com masturbação, preliminares, sexo oral, anal, durante ou depois da penetração, ou com alguém falando um monte de coisas no seu ouvido, orgasmo é orgasmo”, garante a sexóloga. Depois das denominações de Freud de orgasmo clitoriano e vaginal, instituiu-se uma crença de que mulheres sexualmente maduras seriam capazes de atingir o último, enquanto aquelas que não superaram a tão falada inveja do pênis, proposta pelo pai da Psicanálise, ficariam presas ao primeiro. Miriam diz que é como se tivéssemos duas condições de gozar. “O gozo masculino seria o gozo fálico, e o feminino, para além do falo. Este traz uma dimensão erótica, de troca com o outro, seria uma forma simbólica de lidarmos com a falta. Dizendo de uma forma bastante reducionista, um orgasmo clitoriano seria como o orgasmo fálico e o vaginal, algo que

Muitas mulheres começam a procurar orgasmo e se esquecem do prazer, que pode começar ao se tomar um sorvete, se alimentar, sentir o vento, ouvir, olhar, cheirar...


Fantasias

Todo mundo é capaz de ter orgasmo. Pode ser que a pessoa não perceba, mas a energia de prazer está pulsando dentro de nós o tempo todo, é ela que nos mantém vivos.

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não tem nem localização, uma experiência da mulher enquanto sexo feminino”. A psicanalista afirma que homens e mulheres podem acessar tanto o orgasmo masculino quanto o feminino, mas, para os homens, seria mais difícil alcançar o segundo pela própria cultura de valorização do pênis. Biologicamente falando, o que se sabe hoje é que a maioria das mulheres consegue chegar ao orgasmo pela estimulação do clitóris porque ele tem uma concentração maior de terminações nervosas. Fábio Oliveira diz que “os dois são órgãos de prazer, não tem diferença. O clitóris é o pênis da mulher reduzido. O ideal seria que ela tivesse orgasmo com uma dupla estimulação, porque isso aumentaria muito a qualidade do prazer”. Ele explica que a mulher tem a possibilidade de ter mais orgasmos do que o homem porque o prazer dele é mais concentrado e o dela, mais disperso. “A cada ejaculação o homem libera milhões de espermatozóides, o que gera uma perda de energia renal, que se repõe posteriormente, mas a mulher não perde nada, ela produz apenas um óvulo por mês e pode ter quantos orgasmos quiser”. Por causa disso, os orientais dizem que a cada 100 relações sexuais, o homem deveria ejacular uma vez. O terapeuta explica a diferença entre se viver relações de genitalidade – quando se gera uma tensão e se quer gozar logo para acabar com ela – e de sexualidade – em que o casal pode ficar namorando sem querer chegar a lugar nenhum. “A questão é você querer gozar várias vezes numa noite ou gozar uma vez durante a noite inteira”. Fábio afirma que é possível viver prazeres orgásticos sem ejaculação e mesmo sem sexo. Assim, fazer uma viagem sozinho, pintar um quadro ou se masturbar sem culpa pode ser orgástico. Segundo ele, temos potencial para viver prazeres que levam a estados de iluminação de consciência. “Nós, mortais, estamos caminhando nesse sentido, algumas pessoas já conseguem fazê-lo. Independente da crença, todo orgasmo é um contato com níveis superiores de consciência e isso é uma forma de espiritualidade”.

Talvez a sexualidade seja o terreno onde elas mais existam. E não me refiro àquelas que se compram em sex shops, mas às que nos levam a inevitáveis comparações, duras cobranças e muitos conflitos internos. A começar pela imagem que fazemos de orgasmo. Estamos cansados de assistir a filmes e novelas em que os personagens gritam, gemem, viram os olhos, contorcem o corpo, gozam juntos e terminam a cena abraçadinhos, com um sorriso de dar inveja a qualquer um. Não que isso não possa acontecer, mas o problema está na rigidez de quem pensa que sempre tem que ser assim e só vai ser bom se for desse jeito. “Se nos apegamos demais a esse padrão que é veiculado, acabamos não validando o que vivemos”, orienta Cida Lopes. A sexóloga também diz que o fato de um dos parceiros, eventualmente, não chegar ao orgasmo não deveria ter tanto peso. Segundo a especialista, é raríssimo o casal gozar ao mesmo tempo, e ficar procurando por isso pode gerar frustração. “Temos a ilusão de que na relação sexual deveríamos estar mais juntos, mas é a hora em que estamos mais separados. O orgasmo é individual, normalmente as pessoas estão de olhos fechados, acontece no momento em que você se cala”. Uma crença muito comum é a de que o outro é responsável por nos fazer gozar ou não. Fábio Oliveira explica que “o grande orgasmo é aquele que eu posso viver comigo. Eu sou o responsável pelo meu prazer e preciso aprender a me dar prazer, a descobrir onde ele está inserido no meu corpo. Se eu posso partilhar isso com o outro, está perfeito, mas se eu não puder, está perfeito também”. Outro comportamento comum é alimentar o próprio ego com a visível satisfação do(a) parceiro(a) ou simular satisfação para agradar ao outro. “A maioria dos homens hoje acredita que a prova de sua masculinidade é a quantidade de prazer que ele consegue proporcionar à mulher e muitas delas fingem orgasmos. Várias patologias sexuais têm a ver com essas mentiras. A candidíase é a doença do teatro, de quem aumenta sobre o prazer que está


Lidar com prazer é lidar com liberdade.

Autonomia e intimidade sentindo. A pessoa não está realmente presente naquele momento. Prazer tem a ver com presença, com entrega”, diz Fábio. Cida Lopes atribui essas atitudes aos tipos de relacionamentos que vivemos atualmente. “Nós estamos no momento do ‘eu posso parecer, não preciso ser’. Se eu encenar e der certo, tudo bem. Eu finjo para provar que eu sou ótima e, ao mesmo tempo, dou o atestado de que o outro também é ótimo. Eu não sei se ele vai me ligar mesmo, se ela vai me encontrar de novo, eu quero é fazer bonito”. Além disso, a sexóloga acredita que há uma exigência muito grande para o primeiro encontro e isso gera tensão; se as expectativas não forem correspondidas, não vai haver uma outra chance. Assim, o foco continua voltado para o resultado. “Abraçar, beijar, confidenciar, ficar junto, fazer brincadeiras, tudo isso pode ser muito gostoso. O orgasmo em si é a resposta reflexa que o corpo dá e dura segundos, uma transa demora muito mais que isso. Ele é conseqüência do tipo de relação. Quanto mais tempo e entrosamento tiver, quanto mais a pessoa se conhecer e mais clara ela for para o outro, mais ela se permite e maiores são as chances de ter uma boa relação sexual”.

Essas são duas palavras-chaves para se viver prazer. E é possível praticá-las desde o começo de um envolvimento sexual ou afetivo. Basta se sentir à vontade para se mostrar ao outro sem máscaras ou armaduras. No entanto, o mais comum, de acordo com a sexóloga, é a pessoa criar uma imagem do que ela gostaria de ser. Cida diz que sempre se corre o risco de o outro não dar contar de viver algo com intimidade e ir embora. Ainda assim, parece que esse é o caminho para a construção de relações mais significativas. Fábio alerta para a importância de se ampliar cada vez mais a consciência e a aceitação do próprio corpo: “Este é o melhor corpo que posso ter neste momento”. Além disso, respeito e carinho conosco podem favorecer o mesmo posicionamento diante do outro. Cida acredita que assim fica mais fácil se perceber e se colocar. “Até que ponto temos uma relação pelo próprio desejo, ou para mostrar para a turma, para provar isso ou aquilo, por causa do outro, para ser aceito? Ter intimidade é, independente de eu ser homem ou mulher, dizer o que eu quero ali. É eu poder falar sim e poder falar não”. t

Orgasmo é importante, sim, mas não pode ser considerado um atestado de que valeu a pena ou não.

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Doces

As sobremesas são o melhor laboratório para transformar ingredientes “sem graça”, como a farinha, em doces deliciosos. À base de frutas, calóricos, naturais ou feitos com o tradicional chocolate, os quitutes podem ser reinventados para agradar aos mais diferentes paladares. Aproveite nossas idéias, experimente mesclar sabores e mostre que criatividade põe mesa, literalmente.

cassata

crocante

Crocante 1 xícara de açúcar 1 xícara de castanha-do-pará

Rendimento: 8 porções

Sugestão de Íris Maria Campos

Leve o açúcar ao fogo até que derreta e vire uma calda dourada. Acrescente a castanha, mexa bem, e despeje em uma superfície de mármore, normalmente a pia da nossa cozinha é ideal. Deixe o crocante esfriar e passe o rolo de massa por cima dele várias vezes até que o doce se quebre e fiquei moído.

Cobertura 300 g de chocolate ao leite, ralado

Dissolva o chocolate em banho-maria e reserve.

Sorvete Crocante já preparado 3 gemas 1 lata de leite condensado 1 lata de leite de vaca 1 colher (sopa) de rum 1 lata de creme de leite

Coloque as gemas, o leite condensado, o leite de vaca, o rum e o creme de leite em uma tigela e mexa até formar uma mistura homogênea. Acrescente o crocante, mexa novamente e despeje o conteúdo numa fôrma alta forrada com papel alumínio. Leve ao congelador por 3 horas. Desenforme o sorvete e jogue a calda de chocolate em cima, com ajuda de uma espátula. Leve de volta ao congelador até o momento de servir.


torta de

ricota

DIC

A: rir, substitua as passas rejas. por ce Se prefe

banana

Sugestão de Fátima Morais Rendimento: 8 a 10 porções

Massa 150 g de manteiga ou margarina 2 ovos 1 colher (sopa) de açúcar refinado 1 colher (chá) de fermento químico em pó 2 xícaras de farinha de trigo

Junte a manteiga, os ovos, o açúcar, a farinha e o fermento. Misture até o ponto em que solte das mãos. Abra a massa bem fina num pirex e reserve.

Recheio 400 g de ricota amassada 1 lata de creme de leite 2 xícaras de açúcar refinado 3 ovos 100 g de uva-passa preta 150 g de uva-passa branca 1 colher (chá) de essência de baunilha

Bata as claras de 3 ovos em neve com uma pitada de sal e reserve. Misture a gema de 3 ovos, o açúcar, a essência, o creme de leite, a ricota e as passas. Acrescente as claras e mexa. Coloque o recheio no pirex e leve ao forno a 180º, por cerca de 20 minutos, ou até “começar a dourar as beiradinhas”.

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caramelada Sugestão de Rita de Cássia Campos

Ex

sub te

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: Em uma panela, coloque a água, o açúcar e o óleo e deixe no fogo até formar uma calda espessa e dourada. Desligue o fogo, passe a banana empanada na calda e reserve em um tabuleiro untado com óleo. Para servir, polvilhe canela.

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stitu

CA

Calda de açúcar ¼ de copo de água 1 copo de açúcar refinado 1 colher (sopa) de óleo

Misture a farinha, o amido de milho, o ovo e o óleo. Adicione água até adquirir consistência mais firme que a de mingau. Acrescente o fermento, mexa e leve à geladeira por 5 horas. Corte as bananas em 3 pedaços, empane com a massa já gelada e frite em óleo bem quente até dourar.

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Massa 12 bananas caturra 2 xícaras de farinha de trigo 2 ½ xícaras de amido de milho 1 xícara de óleo 1 ovo inteiro 1 colher (chá) de fermento químico em pó

ana

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por maçã ou pêra.


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