Jornal da ABI 370

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o motivo, mas envolvia romances... essas coisas. Só sei que o programa degringolou e chegou um dia em que eles gravaram e foram embora. Deixaram gravado naquele dia com antecedência. No dia seguinte, o técnico trocou e botou a gravação do jornal do dia anterior. Aí o negócio explodiu e eles resolveram encerrar o jornal. Botaram o Humberto Filho para segurar uns 15 dias, um mês mais ou menos, enquanto contratavam alguém. Eu entrei junto com uma mocinha chamada Liliana Rodrigues. Depois entrou no lugar dela a Leilane Neubarth, que está lá até hoje, na Globo News. A Globo tem isso, de fidelidade. Mantém a pessoa. Acho isso legal na Globo. Só saí da Globo porque eu quis. A gente podia estar lá até hoje. Nós pedimos para sair, porque não estávamos felizes lá, por causa daquele ano eleitoral, 1989, do Brizola com o Collor.

não diria muitos amigos. Quando você sai, as pessoas não querem mais se aproximar, sobretudo porque a gente saiu em 1989, houve os atritos de que falei, mas a gente sentia que houve uma certa maldade; eu e a Leila (Cordeiro) sentimos isso. Quando nós começamos a ficar juntos, Armando e Alice foram contra. “Isso não é bom”, diziam. Porque na época eram determinados: dois no Jornal da Globo, dois no Jornal Nacional, dois no Hoje e um no Fantástico. Havia sete profissionais, só. Para ser um desses sete, tinha que ir chegando devagar. Era difícil. Então começamos a reunir os locutores lá em casa; os sete, para discutir por que a gente não tinha um retorno da direção. Nós trabalhamos mecanicamente todos os dias, anos e anos, e ninguém dizia: “Olha, você está ótimo”, “Você precisa melhorar nisso”. Esse foi o mote que levei para essa reunião com a direção.

JORNAL DA ABI – NÃO FOI O LULA?

Eliakim Araujo – O Brizola foi candidato em 1989. Podia ter ido para a final com o Collor, mas perdeu em São Paulo, por um décimo. Essa história eu sei toda. O Brizola ganhou em várias capitais. Era o Collor, Lula, Brizolla, Covas, não sei se o Maluf estava, era um grupo grande. O Brizola tinha tudo para disputar com o Collor a final. O Brizola teve 0,5% no colégio eleitoral de São Paulo. Se tivesse tido 1% – pode ver as estatísticas – ele ganhava do Lula e ia para a final com o Collor, e aí a história seria outra. Eu fiz o debate, seria outra história. O Collor acabou com o Lula no debate da Globo; Lula foi péssimo. Eu falei isso para o Lula. JORNAL DA ABI – ENTÃO VOCÊ TEVE, JÁ NA GLOBO, A EXPERIÊNCIA DE DIVIDIR A BANCADA COM UMA JORNALISTA?

Eliakim Araujo – Digo os nomes deles: do Hoje, Leda Nagle e Marcos Hummel. Do Jornal Nacional, Celso Freitas e o Cid. Do Jornal da Globo, eu e Leila. E do Fantástico, o Sérgio Chapelin. Fomos lá para casa, tomamos muito uísque, eu morava numa cobertura ali na Fonte da Saudade. E começamos a conversar, e fui ouvindo as coisas de cada um. Alguns reclamavam que não tinham camarim para botar um espelho, e a minha reivindicação era não ter mais que ler os editoriais da Globo, que quando botasse o editorial que descesse alguém da administração para ler, por causa daquele incidente de que falei. Ninguém acreditava que aquilo fosse em frente. Todo mundo foi para suas casas. Eu sentei e, numa máquina Olivetti, bati um tratado de três ou quatro páginas, com o resumo daquela reunião. Passei para todos lerem; todos concordaram e assinaram. JORNAL DA ABI – ASSINARAM OS SETE?

Eliakim Araujo – Os sete assinaram. Um dia de semana, quando acabou o Jornal Nacional, subimos todos para uma reunião que já estava previamente marcada com a Direção de jornalismo. Armando não apareceu. Fomos recebidos por Alice Maria e pelo Alberico. Eles ouviram, surpresos. Acabamos de ler aquilo; Alice não falou nada, Alberico falou “Tudo bem, está entregue”. “Não vamos discutir?” “Não, deixe aí o papel, nós vamos ler”. “Mas nós queríamos dialogar sobre isso”. “Deixe aí, que está entregue”.

JORNAL DA ABI – COMO ERA SUA RELAÇÃO COM O CID MOREIRA?

JORNAL DA ABI – QUAIS FORAM AS REIVINDICAÇÕES?

Eliakim Araujo – Era muito boa. O Cid era uma figura interessante. Estava acima do bem e do mal. Era amicíssimo de Armando, jogava tênis com ele. O Cid é uma figura muito engraçada.

Eliakim Araujo – Eram várias coisas. Uns queriam aumento de salário, mais conforto, na época não tinha camarim, nem maquiadora; cada um passava seu pó no rosto. Pois bem, esse papel ficou lá com eles e nós descemos frustrados, mas depois começou a retaliação. Me tiraram de junto da Leila do Jornal da Globo. Eles souberam que foi feito lá

JORNAL DA ABI – VOCÊ DEIXOU GLOBO?

MUITOS

AMIGOS NA

Eliakim Araujo – Deixei, mas eu

em casa, souberam que fui eu que escrevi e botaram a Leila para o jornal Hoje, e eu fiquei no Jornal da Globo. Armando chamou nós dois e disse “Eu não quero dois talentos como vocês superpostos. Vou separar vocês. Nós vamos treinar pessoas novas e vocês vão passar a experiência que têm”. E separou a gente, que já estava casado há uns quatro, cinco anos. Botou Fátima Bernardes para trabalhar comigo, e a Márcia Peltier para trabalhar com a Leila no Hoje. Afastou Marcos Hummel; Leda foi colocada no Bom Dia Rio às seis da manhã, o Celso perdeu o Jornal Nacional, foi para o Fantástico com o Sérgio. Isso durou exatamente um mês. Nessa altura, fizemos saber à Rede Manchete que estávamos insatisfeitos. Daí a Manchete levou a gente. Fomos fazer o principal jornal na Manchete. JORNAL

DA

ABI – A MANCHETE

ESTAVA

COMEÇANDO?

Eliakim Araujo – Não. A Manchete estava no pico. Ela começou em 1983. Estava dando a grande virada com Pantanal e A História de Ana Raio & Zé Trovão. O jornal dava dois dígitos de audiência, porque pegava uma carona no Pantanal, que entrava em seguida, chamava audiência de expectativa. Esse foi o motivo da nossa saída, a retaliação interna na Globo. Todos os sete foram retaliados. Eu soube depois que o Armando chamou o Cid e disse “Como é que você assina um negócio desses?” “Eu assinei porque todo mundo assinou”. “Você vai tirar o seu nome daqui”. “Não tem problema”, e riscou o nome dele. Isso eu soube, eu nunca vi esse papel riscado. Nós outros fomos para a casa de Leda Nagle e comemoramos ali o desfecho daquilo. Nós fomos para a Manchete, a Leda foi no nosso vácuo e saiu junto para apresentar o Jornal da Tarde.

to. O Dr. Bloch movimentava os bancos, cada vez era um banco que pagava, foram se atolando em dívidas, até que venderam para um aventureiro chamado Amilton Lucas, que era um parceiro do Collor. Ele chamou a gente para conversar, “Eu quero que vocês continuem” e tal, mas nessa altura fizemos saber ao Sílvio Santos que a gente não estava feliz, e o Sílvio ligou para a gente num dia à meia-noite. “Vocês estão querendo sair da Manchete? Mas o SBT é aqui em São Paulo... vocês são cariocas...” “Não, tudo bem, a gente está a fim”. “Então passa lá na segunda-feira. Compra a passagem que eu te reembolso na segunda-feira”. O Sílvio é assim. Compramos a passagem numa sexta-feira, pegamos a reunião na segunda. Primeira coisa quando começa a reunião: “Fulano!”. Aí vem um cara com um pacote de dinheiro. Era o dinheiro da passagem, e dá em notas, em cédulas. O Sílvio é assim, cumpriu a palavra. Então, em 1993, estávamos desembarcando em São Paulo. JORNAL DA ABI – VOCÊ PAULO?

CONHECIA

SÃO

Eliakim Araujo – Não. Mas São Paulo era uma cidade hostil, uma cidade difícil. A mudança foi dura. É verdade que a gente foi morar em Alphaville, que era um lugar de sonhos. O Sílvio pagou pra gente o aluguel de uma casa lá. Era gostoso. Alphaville é um oásis. E a gente trabalhava na Vila Guilherme. Eram enchentes fantásticas na Marginal, foi muito duro. Depois o SBT mudou para a Anhanguera e melhorou. Mas foi pouco tempo. No SBT ficamos de janeiro de 1993 até 1997. JORNAL DA ABI – COMO ERA TRABALHAR NUMA EMPRESA EM QUE O TELEJORNALISMO É TÃO INSTÁVEL?

Eliakim Araujo – Na época não era não, esteve muito bem. O Boris Casoy estava dando bem, o Aqui

Agora era um sucesso de mídia, dava audiências altas. Por causa do Aqui Agora a Globo mudou um pouco sua linha editorial, passou a ser mais policialesca. E nós tínhamos o Jornal do SBT, que entrava depois do Jô, que era muito bom, muito bem redigido, muito criativo, tinha um bloco de dez minutos que entrava antes do Jô e um de 20 minutos depois do Jô. Era uma equipe muito boa, Alberto Vilas era o editor. Foi uma boa casa para trabalhar. O Sílvio jamais se meteu, jamais houve censura, nós tínhamos liberdade total para trabalhar, e era um jornal muito de comportamento. Para o fim de noite não havia coisa melhor, linguagem leve. Mas, de repente, o Sílvio começou a enlouquecer. Porque quando o jornal principal não dá dois dígitos ele acha que é um desastre. O Boris começou a despencar... JORNAL DA ABI – POR QUÊ?

Eliakim Araujo – O Boris é uma figura meio controvertida, é um cara de linha conhecida, criou aqueles chavões; alguns nem foram criados por ele, mas ele copiou, como o “Temos que passar o Brasil a limpo”. Essa frase não é dele, é do Brizola, falada num debate. Ele copiou e a imprensa achou que era dele, e passou a ser dele. Só dizia o que interessava, mas o público custa, às vezes, a sacar. Ele só criticava o que interessava, jamais criticou certas coisas. Batia no PT sem dó nem piedade e não tinha o mesmo tipo de tratamento com os demais partidos. Acho que foi uma figura que cansou, não diria que foi uma coisa específica. Ele fez muito sucesso na época, era considerado um justiceiro, mas era tudo um jogo. Aqueles comentários que fazia era tudo escrito; nada era improvisado. Os editores faziam os textos e ele fazia os comentários. Isso agradou muito na época. Chegamos no SBT, ele já estava lá, foi muito gentil conosco, mas havia sempre uma rivalidaJOSÉ LUIZ DA CONCEIÇÃO/AGÊNCIA O GLOBO

Eliakim Araujo – No Jornal Nacional era só homem. Eu dividia a bancada, aos sábados, com o (Fernando) Vanucci e com o Léo (Batista). E eventualmente fazia nos dias de semana com o Cid e o Sérgio. Só dividi a bancada com mulheres bem depois. A Valéria foi a primeira que sentou na bancada. Hoje há ótimas profissionais, principalmente essa nova geração da Globo News. A Globo hoje não precisa mais buscar ninguém de fora, ela tem o seu laboratório. Hoje ela forma os rapazes e moças. Naquela época, ela teve de buscar o Sérgio fora, teve que me buscar fora, todos vieram de fora. Começou com o Cid, que é o pai de todos. O Cid entrou em 1969.

JORNAL DA ABI – VOCÊ REUNIU OS SETE?

“Esse papel ficou lá com eles e nós descemos frustrados, mas depois começou a retaliação. Me tiraram de junto da Leila do Jornal da Globo.”

JORNAL DA ABI – E QUANTO TEMPO VOCÊ MANCHETE?

FICOU NA

Eliakim Araujo – Fiquei três anos. A Manchete teve uma fase muito boa, mas sempre lutou com grandes dificuldades financeiras. O pagamento era sempre um sofrimen-

Eliakim Araujo e Leila Cordeiro na época em que assumiram a apresentação do Jornal do SBT.

Jornal da ABI 370 Setembro de 2011

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