Jornal da ABI 361 - 60 Anos da TV no Brasil

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ARQUIVO PESSOAL TV GLOBO/CEDOC

O jovem Chico Anysio em início de carreira e, ao lado, num de seus quadros mais tocantes junto com Castrinho: Meu paipai!

Chico Anysio: O humor é ‘irmão de sangue’ do jornalismo Ele dispensa apresentação. Até porque, para ser justa ou completa, ela levaria algumas boas horas. Ocuparia páginas e páginas. Alberto Roberto, Azambuja, Painho, Bozó, Coalhada, Salomé, Coronel Limoeiro, Cascata, Neide Taubaté, Tim Tones, Bento Carneiro, Pantaleão, Tavares, Deputado Justo Veríssimo, Haroldo, Jovem, Zé Tamborim, Nazareno... Chico Anysio é todos eles. São 209 personagens. E, repare bem, falamos até aqui só da carreira de humorista. Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho é também ator, escritor, radialista, compositor, diretor e pintor. Em entrevista ao Jornal da ABI, este cearense de Maranguape, nascido no dia 12 de abril de 1931, conta o momento em que percebeu ser um humorista de talento: “Foi quando escrevi um número com piadas, imitando 32 pessoas famosas do rádio, do teatro e do cinema daquela época. Com ele, ganhei todos os programas de calouros do Rio e de São Paulo”, relembra. “Meu começo na televisão ocorreu sem estardalhaço. Fui parar na extinta TV Rio, onde fiz um papel no programa Aí vem Dona Isaura, de Haroldo Barbosa, que era estrelado pela Ema D´Ávila. Na época, além deste, havia somente mais um programa de humor, na TV Tupi, escrito pelo Max Nunes e dirigido pelo Maurício Sherman.” Chico Anysio, que aponta o mesmo Haroldo Barbosa como seu grande mestre e influência no início de carreira, destaca o vasto elenco da Escolinha do Professor Raimundo como os representantes da época de ouro do humor na tv brasileira. Um programa que, aliás, já tinha toda uma trajetória de sucesso no rádio. “Essa adaptação de veículo ocorreu sem maiores problemas. Não houve dificuldades para mim, e nem mesmo para o elenco. A questão foi somente de como enquadrar professores e alunos diante das câmeras”, recorda. Em 1990, o programa foi premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte

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Humoristas afiados fazem denúncias e críticas ao poder e nisso têm parentesco com o jornalismo, diz o mais fecundo criador de personagens da tv, que concebeu e interpretou nada menos de 209 tipos. Chico Anysio lamenta a falta da claque nos programas humorísticos atuais e garante: O povo quer mais programas de humor!

(APCA). Em 1994, recebeu o Diploma de Honra ao Mérito no Festival Internacional de Filme e TV de Nova York. Humoristas afiados, tal como Chico, fazem de seus esquetes e personagens uma válvula de denúncias e críticas ao poder. Nesse aspecto, acredita ele, o humor é ‘irmão de sangue’ do jornalismo: “Na época da ditadura militar era complicado fazer qualquer coisa na televisão e em especial o humor. E era difícil driblar a censura. Na verdade, eu a contornava... Ao mesmo tempo era impossível escapar da realidade. No meu processo de criação, a fonte de inspiração era a vida. Isto é, incluía o cotidiano e o noticiário.”

UM MISTÉRIO Reconhecido pelos mais renomados colegas e por gerações e gerações de humoristas, Chico diz não entender quais motivos levaram o gênero a perder espaço nas grades das principais emissoras, sobretudo no final dos anos 1990 e no início dos 2000.

“Isso é o que nós humoristas mais antigos sempre nos perguntamos. É mentira que o público perdeu o interesse pela graça. Os programas de humor são sempre os de maiores índices em todas as emissoras. Mas, felizmente, nesta década temos assistido à abertura de novos espaços e formatos de humorísticos. Vejo isso com grande alegria. O povo quer mais programas de humor! Só me chama a atenção, e lamento, a falta daquela gravação de riso nos programas mais novos. O riso é importantíssimo, pois ele é a sonoplastia do humor”, defende. Na opinião de Chico Anysio, não há humor velho, antiquado, ou humor novo. “Só há duas formas de humor: engraçado e sem graça. Existe a piada bem contada. E a mal contada”, diz ele, que, apesar do talento e da disposição para o trabalho, lamenta ser pouco aproveitado na emissora que ajudou a construir. Faz participações especiais no Zorra Total e um especial a cada final de ano. A situação chamou a atenção até mesmo de colegas de outros canais. Em 2008, o Pânico na TV fez, durante diversas semanas, a campanha ‘Volta Chico’. “Assisti a essa campanha com a maior simpatia, apesar de saber que em nada resultaria. Acho que a Globo quer me dar um descanso”, conclui o mestre do riso da tv brasileira. Evidentemente, sem achar graça alguma da situação. (Paulo Chico)

a TV Globo no ano de 1968, na qual foi exibido até dezembro de 1971. Inicialmente, era apresentado ao vivo por Augusto César Vannucci. Em 1972, passou a ser exibido na TV Tupi, e só retornaria à Globo em 1975, lá permanecendo até 1983, com a apresentação de Paulo Silvino. O quadro mais importante era ‘Primo Rico e Primo Pobre’, estrelado por Paulo Gracindo e Brandão Filho. No elenco fixo, artistas como Lúcio Mauro, Sônia Mamede, Costinha, Tutuca, Berta Loran, Ferrugem e Tião Macalé.

AS MATRIZES: O RÁDIO E O TEATRO DE REVISTA Até o final da década de 1960, os humorísticos eram basicamente adaptações de formatos inventados e consagrados no rádio ou no teatro de revista. Faça Humor, Não Faça Guerra, com supervisão do mesmo Vannucci e direção-geral de João Loredo, Marlos Andreucci e Carlos Alberto Loffler, quebrou essa estrutura, tanto que é apontado por muitos, como o ex-Diretor de Operações da Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, o primeiro programa de humor moderno da televisão brasileira. Nele eram exploradas criativamente todas as possibilidades da linguagem da televisão. O programa, que estreou em junho de 1970, tinha um dinamismo raro na época, o que exigia muito esforço das equipes de criação e de produção. No lugar dos personagens fixos, de comicidade repetitiva e quase previsível, apresentava vários quadros curtos, alinhavados por piadas rápidas e uma edição ágil, com o objetivo de não ‘cansar’ os telespectadores. No numeroso elenco, estrelas como Miéle, José Vasconcelos, Sandra Bréa, Eliezer Motta e Carlos Leite. Revolucionário, o formato de Faça Humor, Não Faça Guerra foi criado pelos veteranos Haroldo Barbosa e Max Nunes, responsáveis por diversas transposições do humor radiofônico para a televisão, como Bairro Feliz (1965), Riso Sinal Aberto (1966) e o próprio Balança, Mas Não Cai (1968). Inicialmente, os textos eram escritos por Jô Soares e Renato Corte Real, que também costumavam contracenar no quadro ‘Lelé & Dakuca’, no qual viviam malucos que cavalgavam cavalinhos de pau, vestidos de Napoleão e travando um hilário diálogos nonsense. Nomes como Geraldo Alves, Luís Orione, Hugo Bidet e Leon Eliachar juntaram-se à equipe de redatores do programa, que saiu do ar em 1973 para dar lugar ao Satiricom.

A ERA DE RENATO ARAGÃO, O DIDI, E OS TRAPALHÕES A estréia de Os Trapalhões na TV Globo, em 1977, representaria a possibilidade de maior visibilidade e incremento na proJornal da ABI 361 Dezembro de 2010

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