Jornal da ABI 342

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Direitos humanos

A ABI renuncia à Comissão Especial de Reparação O órgão é meramente simbólico: suas decisões não são acatadas e geram infundadas expectativas entre as vítimas do regime militar. A ABI declinou da indicação de um de seus membros para integrar a Comissão Especial de Reparação, incumbida de analisar os requerimentos de vítimas de prisão e tortura durante o regime militar, conforme disposto na Lei nº 3.744/2001, como solicitara a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro. Considerou a ABI, para adotar esta decisão, que essa Comissão tem existência meramente simbólica, porquanto, segundo os dados tornados públicos, apenas 140 dos 900 requerimentos de reparação (no valor de R$ 20 mil) foram pagos, os últimos em junho de 2006.

“Ofício ABI.PRES. n° 729/2009 Rio de Janeiro, 3 de junho de 2009 Ilustre Subsecretária Betânia Freitas, Em atenção ao seu Ofício SSDPDH/SEASDH n° 027/2009, de 19 de maio passado, informo-lhe que a ABI declina da indicação de representante para integrar a Comissão Especial de Reparação instituída pelo Decreto nº 41.851, de 5 de maio corrente, por entender que essa Comissão tem existência meramente simbólica, já que as decisões que emite não são acatadas nem consideradas pelo Governo do Estado. Decorre essa conclusão da ABI da experiência de Comissão precedente, instituída no Governo Rosinha Garotinho, a qual apreciou mais de um milhar de processos e opinou favoravelmente acerca de 900, dos quais apenas 140 ensejaram o pagamento da reparação moral às vítimas de prisão e torturas pela ditadura militar. O último desses pagamentos, salvo engano, foi efetuado em junho de 2006 – há quase três anos, portanto. A ABI não quer associar-se a qualquer iniciativa oficial que gere nas vítimas do regime militar expectativas e esperanças que não se concretizam. Estamos dando ciência desta nossa posição à Ordem dos Advogados do Brasil / Seção do Estado do Rio de Janeiro, ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio-CRM-RJ e ao Grupo Tortura Nunca Mais, que integraram a Comissão anterior e que agora são, como a ABI, novamente convidados a integrar um

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No ofício que encaminhou à Secretaria, em 3 de junho, a ABI diz que não quer associar-se a qualquer iniciativa oficial que gere, nas vítimas do regime militar, expectativas e esperanças que não se concretizam. A solicitação da Secretaria de Direitos Humanos foi feita em expediente encaminhado à ABI pela Subsecretária de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos, Betânia Freitas. A seguir a íntegra dos ofícios que a ABI enviou à Subsecretária de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos, expondo os motivos pela não aceitação do convite para integrar a Comissão de Reparação.

órgão que o Governo do Estado desconsidera. Com os protestos de nossa consideração, firmo-me atenciosamente, (a) Maurício Azêdo, Presidente.”

“Ofício ABI.PRES. nº 784/2009 Ilma. Senhora Dra. Betânia Freitas Rio de Janeiro, 10 de junho de 2009 Digníssima Subsecretária da Subsecretaria de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos Senhora Subsecretária, Agradeço a gentileza de seu Ofício SSDP/ SEASDH Nº 46/2009, de 9 de junho corrente, no qual Vossa Excelência acusou o recebimento do expediente (Ofício ABI. PRES. nº 729/2009) em que a ABI comunicou sua decisão de declinar de participação na Comissão Especial de Reparação a ser novamente constituída, agora no âmbito dessa Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos. Em relação às questões expostas por Vossa Excelência, cabe-nos observar: 1. A ABI não tem dúvida de que os processos julgados na gestão anterior continuam válidos, até porque seria estranho, para dizer o mínimo, que tais documentos administrativos tivessem perdido validade sem ato formal previsto em lei. 2. A ABI discorda do entendimento e da afirmação de que os pagamentos, devidos por força de lei, estão sendo realizados.

3. Quando se afirma que os últimos pagamentos se deram em junho de 2006, tal decorre da falta de informação divulgada a esse respeito por essa Secretaria, como seria sua obrigação em face da disposição constitucional que institui a publicidade (ou transparência, como é corrente dizer-se agora) como um dos princípios que regem a administração pública (art. 37, caput, da CF). 4. Se os pagamentos estão sendo realizados, é dever dessa Secretaria informar às entidades que colaboraram com o Poder Público, como a ABI, quais foram os destinatários desses pagamentos e quais os números dos processos respectivos. Fala-se que teriam sido sete esses pagamentos, os quais se teriam somado aos 140 efetuados no Governo Rosinha Garotinho. É preciso que, por obediência ao art. 37 da Constituição, essa Secretaria informe a quem fez esses pagamentos e por que foram estes, e não outros, os seus destinatários. 5. É confortador saber que o Governo do Estado se empenha na apreciação dos processos que ainda necessitam de julgamento e que considera isso um compromisso, como referido em seu expediente. Apreciar para jazer, como os demais, no limbo dos processos desconsiderados? 6. Não nos parece adequado nem justo o critério de realização dos pagamentos considerando a ordem numérica dos processos. Há requerentes muito idosos, outros muito doentes, que não terão como aguardar em vida a chegada do número de seu processo para obter a reparação pecuniária que esperam há anos pelo que sofreram há mais de quatro décadas. 7. Concordamos em que a participação da ABI seria importante para a consolidação do processo democrático brasileiro, mas esta depende de atos concretos, como a retomada do pagamento da reparação devida às vítimas da ditadura militar. Peço-lhe que aceite as expressões do nosso elevado apreço. Atenciosamente (a) Maurício Azêdo, Presidente.” cc. Dr. Wadih Damous / OAB-RJ Cecília Maria Bouças Coimbra / Grupo Tortura Nunca Mais Luís Fernando Soares Moraes / Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro


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