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EXECU\u00C7\u00C3O P\u00DABLICA: QUAL O LIMITE?

EMPREGO NÃO AUTORIZADO DE FONOGRAMAS EM VÍDEOS DE GRIFES DE MODA E REPRODUÇÃO DE PROGRAMAÇÃO DE RÁDIO NA WEB SEM PAGAMENTO MOSTRAM QUE ALGUNS USUÁRIOS PARECEM NÃO ENTENDER BEM ATÉ ONDE VAI A UTILIZAÇÃO CORRETA DE OBRAS MUSICAIS

Do Rio

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Em tempos de crise, usuários de músicas país afora decidiram empregar – por conta própria e sem consulta a titulares, administradores, editores e Ecad – a lógica do pague 1, leve 2. Dois casos de uso indevido de fonogramas envolvem titulares que tiveram canções usadas irregularmente por grifes em desfiles de moda e vídeos promocionais. O compositor Rômulo Fróes recorreu à Justiça depois que cinco de suas criações foram “adulteradas e remixadas” num desfile e, pior, publicadas nos canais da marca no YouTube e no SoundCloud sem autorização. Tanto a grife quanto a semana de moda alegam ter pagado pela “execução pública”, o que julgam que lhes daria cobertura para qualquer tipo de uso. O mesmo ocorreu com o DJ Dolores, que teve duas músicas inteiras anexadas a um vídeo promocional de uma grife, sem pagamento e com o crédito atribuído a outro DJ.

Somados à disputa judicial entre o Ecad e uma rádio que repete sua programação via webcasting (transmissão na internet com possibilidade de escolha do repertório pelo ouvinte) mas alega não ser obrigada a pagar por isso, os casos dos dois mostram que muitos usuários de músicas parecem não entender bem os limites do que é considerado execução pública.

“Não foi execução pública. Mexeram nas músicas do (álbum) 'Um Labirinto Em Cada Pé'. Alegaram que tinha pagado ao Ecad, mas fizeram peça publicitária no canal da marca no YouTube, em que sincronizavam canção minha com a marca deles. E ainda subiram tudo para o SoundCloud deles. Além de sequer ter recebido do Ecad, o que supõe que não pagaram, eu não posso considerar como simples execução pública o uso de uma música minha para vender roupa. Eu tenho o direito de escolher onde meu trabalho vai ser usado. É tão difícil assim de entender?”, indaga Fróes.

Para o Ecad, o uso simples de uma música durante um desfile de moda de fato está contemplado pela categoria execução pública. O que não dá, no entanto, ao usuário o direito de manipular a canção nem de publicá-la em canais publicitários na internet. “Nos desfiles, que geralmente ocorrem num mesmo local, o pagamento deve ser realizado pela organização do evento. Caso haja execução pública em outros espaços, como estandes de marcas, é necessário um novo recolhimento com base no artigo 31 da lei 9.610/98”, explica a superintendente executiva do escritório, Glória Braga. “Os valores são calculados com base em um percentual sobre a receita bruta, quando há venda de ingressos ou qualquer outra forma de cobrança de entrada, considerando também a atividade do usuário e o tipo de utilização da música, se ao vivo ou mecânico. Quando não houver receita, o valor é calculado em quantidade de UDAs (unidades de direito autoral), de acordo com o parâmetro físico da área sonorizada e a região socioeconômica onde ocorre o evento”, ela detalha.

O DJ Dolores não recebeu nada pela inserção das suas músicas num vídeo publicitário. Por ora, limitou-se a pedir correção à grife, mas não descarta acionar a Justiça: “Quando é produção pequena, não me importo, até estimulo o uso. O que me chateia é quando tem coisa grande, que envolve dinheiro. Mas, de um modo geral, tenho política de produção independente, underground, desde que deem o crédito, pelo menos. Nem isso fizeram.”

O caso da rádio que reproduz sua programação na internet, sem pagar nada além da execução pública da transmissão original, por FM, foi parar em Brasília. Depois de condenada em primeira instância, a rádio recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que lhe deu ganho de causa ao julgar que webcasting (quando há possibilidade de escolha do repertório pelo internauta) não se caracteriza como execução pública, o que a desobrigaria de pagamentos ao Ecad. O escritório central foi ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) por discordar da avaliação dos desembargadores fluminenses.

Em sua fundamentação, o Ecad lembra que o Tribunal de Justiça da União Europeia, ao julgar casos semelhantes, unificou seu entendimento de que webcasting é uma comunicação dirigida a um número indeterminado de destinatários potenciais, o que caracteriza a execução pública. Por isso, na avaliação da mais alta instância judiciária europeia, seria devida a cobrança por um órgão como o Ecad. “As diversas modalidades de utilização das músicas são independentes entre si, e a autorização concedida para uma delas não se estende às demais. Isso quer dizer que, se uma rádio disponibiliza a sua programação pelo sistema convencional e pela internet, está se utilizando de duas modalidades de execução pública distintas”, avalia Glória Braga.

Espera-se para este ano a decisão em Brasília que poderá estabelecer jurisprudência sobre tema de vital importância numa era de acelerada expansão da distribuição digital.

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