1_9786559086658

Page 1

DIREITO ANIMAL

o bem-jurídico no crime de maus-tratos

Volume 8

Nadia Espina

Copyright© Tirant lo Blanch Brasil

Editor Responsável: Aline Gostinski

Assistente Editorial: Izabela Eid

Capa e diagramação: Jessica Razia

Imagem da capa: “Endosymbiosis, tribute to Lynn Margulis”, Shoshanah Dubiner, 2012.

CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO:

Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot

Presidente da Corte Interamericana de direitos humanos. Investigador do Instituto de Investigações Jurídicas da UNAM - México

Juarez Tavares

Catedrático de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Brasil

Luis López Guerra

Ex Magistrado do Tribunal Europeu de direitos humanos. Catedrático de Direito Constitucional da Universidade Carlos III de Madrid - Espanha

Owen M. Fiss

Catedrático Emérito de Teoria de Direito da Universidade de Yale - EUA

Tomás S. Vives Antón

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO

Catedrático de Direito Penal da Universidade de Valência - Espanha

SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

E74d

Espina, Nadia

Direito animal [recurso eletrônico] : o bem-jurídico no crime de maus-tratos / Nadia Espina ; traduçãoRodrigo Murad do Prado ; revisão técnica Eduardo Baldissera C Salles, [e coordenador da coleção] Augusto Jobim do Amaral ; coordenadores da coleção Ricardo Jacobsen Gloeckner, Clarice Beatriz da Costa Sohngen - 1 ed - São

Paulo : Tirant Lo Blanch, 2023 recurso digital ; 1 MB

Tradução de: Derecho animal : el bien jurídico en los delitos de maltrato

Formato: ebook

Modo de acesso: world wide web

ISBN 978-65-5908-665-8 (recurso eletrônico)

1 Direitos dos animais - Brasil 2 Direitos dos animais - Aspectos morais e éticos 3 Animais - Proteção - Legislação - Brasil 4 Livros eletrônicos I Prado, Rodrigo Murad do II Salles, Eduardo Baldissera C III Amaral, Augusto Jobim do IV Gloeckner, Ricardo Jacobsen V Sohngen, Clarice Beatriz da Costa VI Série

23-86418

CDU: 343 58(81)

Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária - CRB-7/6439

DOI: 10.53071/boo-2023-09-21-650ccd5d3bcaf

21/09/2023 28/09/2023

É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto às características gráficas e/ ou editoriais. A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art.184 e §§, Lei n° 10.695, de 01/07/2003), sujeitando-se à busca e apreensão e indenizações diversas (Lei n°9.610/98).

Todos os direitos desta edição reservados à Tirant lo Blanch.

Fone: 11 2894 7330 / Email: editoratirantbrasil@tirant.com / atendimento@tirant.com

tirant.com/br - editorial.tirant.com/br/ Impresso

no Brasil / Printed in Brazil

Nadia Espina

DIREITO ANIMAL

o bem-jurídico no crime de maus-tratos

Volume 8

Tradução

Rodrigo Murad do Prado

Revisão Técnica

Eduardo Baldissera C. Salles

Augusto Jobim do Amaral

COORDENADORES DA SÉRIE

Augusto Jobim do Amaral

Clarice Beatriz da Costa Sohngen

Ricardo Jacobsen Gloeckner

APRESENTAÇÃO DA SÉRIE CIÊNCIAS CRIMINAIS

Indescritível a honra de podermos disponibilizar ao público, com o apoio da Editora Tirant Lo Blanch, um espaço singular para as ciências criminais. Uma Série disposta sobre um campo de saber interdisciplinar por excelência, politicamente enraizado, e que concerne à responsabilidade de encontros frutíferos para a decisão sempre urgente de transformar a crise em crítica.

A condição atual de normalização da barbárie punitiva historicamente fixada e seus permanentes e violentos desdobramentos necessitam de um pensamento agudo que tenha primordialmente a responsabilidade de questionar este estado de crise. Diante de tamanha relevância temática, abre-se um espaço para investigação interdisciplinar crítica que represente uma ruptura aos esquemas legitimantes postos pelos discursos tradicionais e que demonstre empenho na desconstrução do caldo cultural difuso notadamente com traços autoritários. As inúmeras dinâmicas em matéria de violência punitiva – respaldadas por práticas ardilosamente racionalizadas jurídica e politicamente – em algum sentido, indicam uma biopolítica preocupada com uma governabilidade forjada por narrativas de exclusão/morte e funcionalizada pelas rotinas penais.

Às pulsões totalizantes de um poder punitivo, aos afetos de medo que o monopoliza, bem como às suas técnicas securitárias em escala global, requer-se um enfrentamento que não pode se furtar ao aporte interdisciplinar. Assim, para interrogar as tendências e contornos de uma cultura punitiva e estarmos à altura de tempos urgentes, é que as ciências criminais devem fundar seu limiar radicalmente. Afinal, mais diretamente, o que haveria de decisivamente contemporâneo e radical senão o profundamente impossível e necessário traço de convocação ética que a “questão criminal” possa se debruçar? Na fragilidade densa da resistência contra os blocos maciços de sentidos e racionalidades bem pensantes, diante das tendências justificantes da imposição violenta de supostos fins “justos”, talvez reste ainda pulsares, como instantes outros que excedam toda de presença ensimesmada.

Para tanto, como desafio ímpar, a Série Ciências Criminais foi pensada como abertura fértil a uma qualificada resistência na seara do conhecimento pasteurizado sempre pronto a colonizar o saber nas ciências criminais. Prima-se por garantir o acesso a obras fundamentais nas mais diversas dimensões dos debates relativos à naturalização da violência punitiva.

Baseada nesta premissa, a Série possui linhas editoriais plurais. Sua primeira direção tem como princípio fundamental ser um canal de acesso às atuais problematizações nos assuntos de interesse às ciências criminais em ampla escala, no Brasil e no exterior. De um lado, aproximar pesquisas no âmbito nacional, dispondo interfaces entre suas produções e experiências, por outro, construir traduções e possibilitar o diálogo, pontes profícuas a privilegiar a diferença. Permitir que se desenhe o caleidoscópio brasileiro neste campo, juntamente com suas aproximações e distensões ao pensamento alienígena, é contribuir para o encontro com sua própria singularidade e a possibilidade de fazermo-nos outros a nós mesmos.

Uma segunda vertente possui acento na reedição de obras clássicas do pensamento das ciências criminais. A dificuldade em se encontrar obras esgotadas, vindas do Brasil e do exterior, que ainda hoje são merecedoras de atenção crítica, encontra-se na base desta linha preocupada com a genealogia do pensamento crítico nas ciências criminais. Emergências estas que, quiçá, acabaram se desviando das principais trajetórias editoriais, habitando injustificável espaço restrito às discussões de pós-graduação, ou um número pequeno de leitores.

Nas frestas de uma memória reverberam outros futuros possíveis. Revigorar o debate científico nas ciências criminais certamente passa por aí. Por fim, uma terceira linha a ser contemplada na presente Série cuida de apresentar ao público brasileiro jovens pesquisadores, com obras de vanguarda que procuram oxigenar a atmosfera neste campo. Muitas vezes, o mercado editorial se encontra fechado para autores iniciantes e a tarefa desta linha é a de ajudar que o público tenha acesso a um rico material, represado em virtude da conjuntura do mercado editorial brasileiro.

Portanto, em tempos sombrios de naturalização da violência, sobretudo dos dispositivos de punição, em que o embrutecimento do pensamento toma protagonismo, orientado pelos auspícios neoliberais, a urgência radical de alguma inteligência disposta a enfrentar a burrice do

6 SÉRIE CIÊNCIAS
- VOL 8 - DIREITO ANIMAL - O BEM-JURÍDICO
CRIMINAIS
NO CRIME DE MAUS-TRATOS

fanatismo mobilizado pelos fascismos como modo de vida atrofiado pelo terror se impõe. O vazio reflexivo ganha eco, matraqueado pelo senso comum que, em matéria penal, concretamente, não apenas franquia a morte em escala industrial operada pelo sistema penal, mas forja uma expansiva e permanente tecnologia de governo hábil à eliminação da diferença. Responsabilidade diante este estado de coisas é mais que mera questão de engajamento e luta, atualmente trata-se de ponto nevrálgico de sobre-vivência.

Porto Alegre, maio de 2017.

Augusto Jobim do Amaral Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia, ambos da PUCRS

Pós-Doutor em Filosofia Política pela Università Degli Studi di Padova/ITA Pós-Doutor em Filosofia do Direito pela Universidad de Málaga/ESP

NADIA ESPINA 7
SUMÁRIO PRÓLOGO .......................................................................................... 10 E. Raúl Zaffaroni INTRODUÇÃO ................................................................................... 14 Nadia Espina 1. A QUESTÃO ANIMAL E O MAU-TRATO ........................................ 17 1.1. Ética humana........................................................................................................ 21 1.2. Ética animal ........................................................................................................ 24 1.2.1. Utilitarismo 24 1.2.2. Direitos dos animais ......................................................................................... 26 1.2.2.1. A individualidade de Henry Salt ......................................................................27 1.2.2.2. O enfoque de direitos de Tom Regan ............................................................. 28 1.2.2.3. O enfoque das capacidades e seu florescimento ........................................... 30 1.3. Uma teoria sociológica dos diretos dos animais 34 1.4. Uma teoria política dos direitos dos animais .................................................... 35 1.5. Abolicionismo animal ........................................................................................ 37 2. A PROTEÇÃO LEGAL DO ANIMAL NÃO HUMANO .................. 39 2.1. Na legislação penal argentina .............................................................................41 2.1.1. A “Ley Sarmiento” N°2.786 42 2.1.2. A “Ley Benítez” Nº 14.346 .................................................................................. 43 2.1.3. Lei de Proibição de Corrida de Cães Nº27.330 46 2.2. No Direito Internacional ................................................................................... 48 2.2.1. A Declaração Universal dos Direitos dos Animais .......................................... 48 2.2.2. A Declaração Universal sobre o Bem estar Animal 49 2.3. No Direito comparado ....................................................................................... 50 2.3.1. Chile ................................................................................................................... 50 2.3.2. Brasil 51 2.3.3. México ................................................................................................................52 2.3.4. Colômbia 53 2.3.5. Bolívia ............................................................................................................... 54 2.3.6. Equador .............................................................................................................55 2.3.7. Uruguai ..............................................................................................................57 2.3.8. Alemanha.......................................................................................................... 58
2.3.9. Espanha ............................................................................................................ 59 2.3.10. Itália.................................................................................................................. 61 2.3.11. França 63 3. BEM JURÍDICO NOS CRIMES DE MAUS-TRATOS .................... 64 3.1. Alguns esclarecimentos sobre o conceito de bem jurídico............................... 64 3.2. Uma visão antropocêntrica ...............................................................................69 3.2.1. A moral pública ou os bons costumes 69 3.2.2. Interesse moral da comunidade ........................................................................75 3.2.3. Meio ambiente .................................................................................................. 77 3.3. ‘Deslegitimantes’ 80 3.4. Os animais como sujeitos de direitos ............................................................... 80 3.5. Evolução na jurisprudência ............................................................................... 82 3.5.1. A orangotango fêmea “Sandra” 82 3.5.2. Superlotação e abandono de 68 cães ............................................................... 84 3.5.3. Bestialismo ....................................................................................................... 85 3.5.4. Parachoque traseiro ......................................................................................... 86 4. EM DIREÇÃO A UM NOVO ESTATUTO JURÍDICO DO ANIMAL NÃO HUMANO .................................................................................. 88 4.1. No Direito civil ................................................................................................... 88 4.2. No Direito constitucional latino-americano.................................................... 90 4.3. ‘Neoconstitucionalismo’ latino-americano 92 4.4. ‘Ecocídio’ ............................................................................................................ 94 5. AS JAULAS VAZIAS ......................................................................... 98 5.1. O Habeas Corpus como um mecanismo constitucionalmente válido ............99 5.2. Legítima defesa dos animais não humanos..................................................... 105 5.2.1. A legítima defesa no Código Penal argentino ................................................. 108 5.2.1.1. A racionalidade como limite para a defesa necessária ................................. 109 5.2.2. Bens defendíveis. Pode considerar-se defendível a vida ou a integridade física ou psíquica dos animais não humanos? ................................................................... 112 6. CONCLUSÕES ............................................................................... 115 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................. 118

Em 1888, a princesa Isabel, encarregada da regência no Brasil, publicou a Lei Áurea que aboliu a escravidão. Um ano depois, culminou o longo processo de abolição da escravatura em Cuba. Meus avós eram crianças ou adolescentes.

Quando minha mãe nasceu, minha avó não podia se desfazer de seus bens sem a assinatura de meu avô e, quando eu nasci, minha mãe não podia votar. Enquanto eu desenhava minhas primeiras letras, milhões de pessoas na Europa civilizada eram assassinadas em câmaras de gás, e quando em 1948 comecei a ler e escrever na escola primária, a assembleia da ONU declarou que todo ser humano é uma pessoa, ou seja: sujeito de direitos. A propósito, eu era bastante adulto quando, em 1981, a Mauritânia foi o último país do mundo a abolir a escravidão, pelo menos formalmente, mas ao mesmo tempo dezenas de milhares de pessoas foram mortas na guerra da América Central e outras acabaram desaparecendo na Argentina.

Os humanos são muito particulares, entre outras coisas porque não nos reconhecemos bem como animais da mesma espécie. Quando a parte mais pobre em melanina de nossa espécie se assustou, porque o que eles estavam fazendo com a mais rica em melanina, de repente o fizeram contra outros iguais a eles, nossos líderes de matilha concordaram em declarar que pertencemos à mesma espécie, mas isso não significa que todos nós o experimentamos - longe disso. Se o experimentássemos, não permitiríamos que a riqueza se concentrasse em 1% da espécie, enquanto um terço dela tem necessidades elementares, o Mediterrâneo não ficaria cheio de cadáveres, nem a migração americana deixaria tantos pelo caminho.

Um livro no qual os direitos dos animais não humanos são defendidos certamente será criticado como uma delicadeza irrespondível de sentimentalismo. Outros vão olhar para ele com o ceticismo daqueles que observam que não faz sentido falar desses direitos quando nem mesmo reconhecemos os dos animais humanos. Também não faltarão aqueles que explodem no riso gratuito dos tolos.

PRÓLOGO

Como também são animais e vocês têm direitos, reservamos para estes o sorriso piedoso que o escasso uso da inteligência sempre merece, passando a tratar das duas primeiras variáveis de possíveis críticas, que merecem reflexão.

Com referência à piedade para com os animais não humanos, é verdade que foi demonstrada como um refinamento sentimental. Na história de nosso conhecimento sempre duvidoso sobre a questão criminal, essa posição foi assumida por Rafael Garofalo em sua famosa Criminologia, que é uma síntese interessante de todas as racionalizações possíveis das piores violações de direitos humanos, escritas quando ainda não eram conhecidas. Ele deu-lhes esse nome, três anos antes da Lei Aurea.

O Barão Garofalo - um aristocrata do positivismo penal racista ‘spenceriano’ - sustentou a existência de um alegado crime natural que identificou como a violação dos sentimentos médios de piedade e probidade em cada sociedade. É claro que, para este autor, esses sentimentos atingiram seu maior desenvolvimento nas sociedades com os seres humanos mais evoluídos, pois ele se considerava o colonialista europeu, e neles o sentimento de piedade havia sido tão refinado que se espalhou até mesmo pelos animais não humanos.

É claro que para Garofalo isso não acontecia nas sociedades colonizadas, que ele considerava equivalentes aos criminais natos no concerto dos povos do mundo. Portanto, esses refinamentos foram reservados para sua sociedade e, portanto, os demais poderiam ser tratados como criminosos natos, ou seja, colonizados no estilo do neocolonialismo, com seus genocídios africanos e latino-americanos. Enquanto Garofalo escreveria esta obra horrível, Leopold II assassinava milhares para obter borracha na África Central.

Mas, agora não é sobre o sentimento de uma elite colonialista - como nos tempos do positivismo racista - mas sobre os direitos dos animais não humanos. É verdade que esses direitos são falados quando os dos animais humanos são desconhecidos no planeta. Mas o problema é que os ignoramos da mesma forma que fazemos com os animais não humanos.

Existem duas maneiras de racionalizar as violações dos direitos humanos. A primeira é o que poderíamos chamar de metafísica, segundo a qual somos obrigados a reconhecer os direitos humanos porque corres -

NADIA ESPINA 11

pondem a seres racionais. Consequentemente, o não-racional são coisas ou - como dizia Descartes - máquinas.

Mas, ao longo desse caminho, vai se observando gradativamente que existem animais humanos que não são racionais segundo as diretrizes etnocêntricas ou valores dos dominadores da época e, portanto, são menos humanos, ou seja, não têm direitos ou têm em menor medida. Esta é a racionalização idealista do racismo e do colonialismo, senão de toda discriminação.

O outro caminho - o do nosso ilustre criminologista citado - responde ao reducionismo biológico, segundo o qual os direitos humanos pertencem aos racionais civilizados, que são os mais evoluídos, enquanto outros deveriam ser tratados como menos humanos ou não humanos.

Friedrich von Hayek - um dos ideólogos do atual reducionismo econômico do autodenominado neoliberalismo - afirma que ninguém tem direitos pelo simples fato de nascer, o que coincide com os resultados alcançados pelas duas variáveis mencionadas acima. Posteriormente, o mesmo autor afirma que já se fez o suficiente por quem não entende que o caminho da liberdade é o mercado e, portanto, afirma que eles devem ser deixados à própria sorte. Gostaria que essa premissa fosse cumprida, mas eles não são deixados por conta própria, pois continuam sendo explorados e roubados de seus recursos naturais.

Se pretendemos fundar direitos humanos para todos os animais humanos, devemos partir do fato de que esses direitos nos correspondem porque nascemos, porque estamos vivos e porque somos seres sencientes, produto da mesma energia cósmica – se quere atribuir a um Deus pessoal ou impessoal, um problema reservado à consciência de cada pessoa - e que, portanto, somos irmãos de tudo o que é vivo e sensível.

Neste ponto da nossa civilização esta não é uma posição fantasiosa, mas, devido a qualquer uma das outras variáveis, chegamos a um ponto onde, se não reconhecermos a irmandade com os seres vivos do planeta, não seremos apenas incapazes de nos reconhecermos como animais humanos entre nós, mas nos extinguiremos como espécie.

Não estamos sozinhos e nunca estivemos na superfície deste planeta - outro habitável e ao alcance não conhecemos - e, consequentemente, a negação dessa irmandade com a biosfera planetária nos leva a uma arrogância etnocêntrica que nos impede de reconhecer o outro da mesma

12 SÉRIE CIÊNCIAS CRIMINAIS - VOL 8 - DIREITO ANIMAL - O BEM-JURÍDICO NO CRIME DE MAUS-TRATOS

espécie, para saltar daí para uma onipotência antropocêntrica que está levando à extinção de nossas condições de vida como espécie.

Escrevemos essas linhas em um momento de emergência causado pela destruição irresponsável dos equilíbrios da biosfera construídos ao longo de milhões de anos, cujo resultado é a produção em série de mutações de vírus fatais nas últimas décadas.

Antropomorfizamos a biosfera dizendo que a natureza se defende, o que não é verdade: a natureza procede de acordo com suas regras naturais. Somos nós que colocamos os dedos no ventilador ou na tomada, não somos nós que nos defendemos. A única solução é respeitar a ventoinha e a tomada e não colocar os dedos dentro.

Reconhecer os direitos dos animais não humanos e de toda a biosfera em geral, não é uma questão mística, ideológica, religiosa, idealista, sentimental, muito menos secundária, pois não é nada menos que nossa sobrevivência específica.

É hora de provar nossa suposta racionalidade: até agora temos sido a espécie animal mais agressiva, tanto ‘intraespecificamente’ quanto em relação às outras espécies. Será uma questão de saber se somos capazes de usar a razão para novas e piores agressões que, aliás, não são independentes. Ainda temos tempo para sobreviver.

NADIA ESPINA 13

INTRODUÇÃO

“Essa Coisa que não é uma coisa, essa Coisa invisível entre suas aparições, tampouco é vista em carne e osso quando reaparece. Essa Coisa, no entanto, nos olha e nos vê não vê-la inclusive quando está aí.”.

O crime de maus-tratos ou crueldade contra animais gera uma discussão na dogmática jurídica criminal sobre a titularidade do bem legal. Enquanto o setor majoritário da doutrina tenta justificar a classificação da conduta de maus-tratos ou crueldade aos animais como crime contra o homem, a doutrina da minoria propõe considerá-la como crime contra o animal não humano.

Para esse debate, é imprescindível a consideração da situação jurídica do animal, que historicamente é concebido como uma coisa ou objeto de propriedade do homem. Reconhecer que os animais não humanos são os verdadeiros donos do direito legal no crime de maus-tratos ou crueldade, implica introduzir a ideia de que estão sujeitos a direitos.

Em nosso país, poucos autores abordam a questão animal e, em particular, que analisam quais podem ser consideradas as verdadeiras vítimas dos crimes previstos na Lei 14.346. Uma luz de esperança representa a jurisprudência dos últimos anos, que coloca em crise a visão antropocêntrica tradicional e capacita os animais não humanos como detentores de certos direitos básicos.

Em qualquer caso, o movimento em favor do reconhecimento dos direitos dos animais não humanos não é amplamente aceito e é até desqualificado por aqueles que assumem posições radicalmente opostas. O mesmo aconteceu quando foi afirmado pela primeira vez que todos os humanos têm direitos invioláveis. É importante destacar que, até o século XIX, a Suprema Corte dos Estados Unidos defendia a inferioridade do negro, na medida em que ele não tinha nenhum direito que o branco fosse obrigado a respeitar.

As lutas contra o racismo e o sexismo constituem o prelúdio da luta contra o ‘especismo’, que, com base em discursos éticos e legais, nega que os animais não humanos tenham direitos. Essa luta começou há mais de dois séculos no campo da filosofia, quando alguns autores levantaram a possibilidade de considerar os animais moralmente, algo impensável em tempos de racionalismo.

Traduzidas para o campo jurídico, as diferentes posições éticas na consideração dos animais deram origem, no século XIX, às primeiras leis de proteção aos animais. A partir daí, serão analisadas as diferentes visões sobre o bem jurídico lesado nos crimes de abuso ou crueldade animal, para se concluir que a postura que mais convém, é reconhecer que o bem jurídico é direito do próprio animal de não ser objeto da crueldade humana, o que implica necessariamente reconhecê-lo como sujeito de direitos.

Esta conclusão pode ser subestimada e até mesmo encorajar a polêmica na dogmática jurídica criminal a respeito da origem da legítima defesa de animais não humanos. Em todo caso, a discussão transcende a questão penal, pois é necessário que, juntamente com os demais ramos do direito, como civil, constitucional e administrativo, se avance nas reformas legislativas de acordo com um novo regime jurídico do animal não humano. Mais precisamente, o norte deve ser aquele que é canalizado para a perspetiva emergente do Direito Animal como um ramo autônomo a fim de garantir certos direitos aos animais não humanos em todo o sistema jurídico.

Nesse sentido, as contribuições da ciência jurídica, filosófica, sociológica e política são uma contribuição essencial no momento da construção de uma visão integral que permita afirmar a titularidade dos direitos à vida, integridade física e mental e liberdade em favor dos animais não humanos.

No percurso destas páginas perceber-se-á que é esta a proposta que inspira esta pesquisa, mas que também não perde de vista a titularidade de direitos de outros sujeitos de outra vida como a Natureza ou a Pachamama. É que o segundo momento da discussão sobre os direitos dos animais não humanos surge a partir da Conferência de Estocolmo de 1972 devido à preocupação existente com o meio ambiente. Desde aquele momento até os dias atuais, avanços importantes foram alcançados em matéria constitucional em sintonia com a corrente denominada ambien-

NADIA ESPINA 15

talismo profundo a partir do reconhecimento expresso dos direitos da natureza nas Constituições do Equador e da Bolívia.

Porém, o espírito dos padrões ambientais nem sempre coincidirá com os interesses dos animais não humanos em particular, concebidos como seres sencientes do utilitarismo clássico representado por Bentham. Enquanto, para o direito animal, cada ser senciente é importante em sua capacidade como tal, para o direito ambiental, o importante são as espécies animais e vegetais em todas as suas formas.

Os últimos acontecimentos ocorridos em função dos incêndios florestais na Amazônia e na Austrália, com graves consequências que preocupam tantos ambientalistas quanto animalistas, nos convidam a refletir sobre o mundo em que queremos viver e desafiar os limites do tradicional estado moderno com propostas para a sua reformulação. Qualquer pessoa que se atrever a ler os capítulos deste livro pensará que o autor é um advogado criminal não convencional, e certamente essa afirmação contém alguma verdade. Convidamo-lo, através da sua leitura, a um dos debates que nos próximos tempos ganhará ainda mais força.

O livro publicado reproduz, com algumas modificações no conteúdo, minha pesquisa intitulada Direito Animal. O direito legal no crime de maus-tratos ou crueldade contra os animais, resulta de dois anos de estudos após a conclusão do curso de Mestrado em Direito Penal pela Universidade Austral.

Meus agradecimentos pela realização deste volume tanto ao Editorial Ediar quanto ao meu professor, Prof. Dr. Dr. h.c. mult. E. Raúl Zaffaroni, que como diretor da investigação, me entusiasmou e orientou na tarefa de construir diretrizes em favor do direito animal.

16 SÉRIE CIÊNCIAS CRIMINAIS - VOL 8 - DIREITO ANIMAL - O BEM-JURÍDICO NO
DE
CRIME
MAUS-TRATOS
Nadia Espina

1. A QUESTÃO ANIMAL E O MAU-TRATO

Na história humana, as relações entre humanos e animais não humanos levantam a questão constante de como devemos tratar os últimos. De nossas origens até o presente, as respostas a essa pergunta variam entre aqueles que propõem alguma consideração sobre os animais não humanos e aqueles que a negam.

As exigências éticas de não matar outros seres vivos ou causar-lhes sofrimento começaram quando no jainismo o aspecto religioso foi incorporado por meio do conceito de Ahimsā, entendido como o amor universal a todos os seres vivos capazes de sentir1.

No mundo grego, os pitagóricos e alguns pré-socráticos atribuíam uma alma aos animais não humanos, mas foi Aristóteles quem fundou, do ponto de vista metafísico, a necessidade da alma animal. Esse filósofo distinguiu três tipos de alma: a alma vegetativa com seus processos de crescimento, nutrição, visual, sabor; a alma sensível capaz de sensações de dor e prazer, e a alma intelectual capaz de deliberar e pensar. Destas três categorias, o autor reconhecia nos animais não humanos uma alma sensível, mas negava-lhes a alma intelectual própria da alma humana2, o que os excluía de toda proteção ética.

Isso não acontecia com os pitagóricos, uma vez que sua crença na transmigração das almas, de um corpo para outro, entre todos os seres vivos, influenciou na época a favor do tratamento dispensado aos animais não humanos. Em todo caso, a regra desde a antiguidade até o século XVIII tem sido antes os abusos e os maus tratos devido à exploração e ao domínio exercido sobre seres considerados inferiores.

A convicção equívoca sobre a superioridade dos humanos em relação aos animais não humanos vem da confluência das duas tradições
1 Chakravarty, A., “La filosofía giainistica” em Storia Della Filosofía Orientale, T.I., Feltrinelli Económica, Milano, 1978, p. 163. Ver também o tomo II de op.cit.; Pániker, Agustín, El Jainismo, Historia, sociedad, filosofía y práctica, Kairós, Barcelona, 2001; Suttam, Saman, Il canone del jainismo, Mondadori, Milano, 2001. 2 Cfr. Aristóteles, Acerca da alma - De anima-, Marcelo D. Boeri (trad.), 1ª ed., 1ª reimp., Ediciones Colihue, Buenos Aires, 2015.

ocidentais: a grega com o mito de Prometeu3 e a bíblica com o Gênesis4, onde se encontra uma falha no humano que o autoriza para reivindicar a propriedade da vida animal. Desde então, com exceções, essa lógica grega e abraâmica permanece invariavel.

No Direito Romano dos tempos pré-cristãos, os animais não humanos eram considerados coisas com o mesmo status legal de qualquer objeto ou sujeito sem personalidade jurídica, assim como escravos, mulheres ou crianças em seu tempo: animais não humanos eram comidos vivos ou mortos como nos chamados jogos romanos, à custa da diversão dos espectadores. A situação diferente para animais não humanos se materializa com a influência de Ulpiano quando são reconhecidos como sujeitos de direito natural no Corpus Juris Civilis de Justiniano5.

Durante a Idade Média e até a Renascença - séculos 13 a 17 - os tribunais não apenas julgaram e condenaram humanos, mas também acusaram publicamente, condenaram e executaram animais não humanos. Naquela época, eram frequentes os julgamentos de porcos e galos pela suposta prática de crimes; bem como contra as diversas pragas que assolaram as lavouras, caso em que foram instaurados processos criminais que culminaram em advertências ou na própria excomunhão6.

Animais não humanos foram detidos, processados, levados a tribunal e até tiveram advogados de defesa. Então, poderia uma penalidade ser aplicada a eles? Pelas várias sentenças da época, parece comum os tribunais considerarem que animais não humanos eram capazes de cometer crimes pelos quais deveriam ser responsabilizados criminalmente. Conhecido é o julgamento do Tribunal de Savigny, onde em 10 de janeiro de 1497, uma porca foi condenada e executada pelo crime de homicídio:

3 Na tradição judaica, como no caso dos gregos, a culpa, o defeito e a nudez estão na origen da história humana. Este é o caso da Bíblia com Adão e Eva, logo Caim; também é o caso dos mitos de Epimeteo e Prometeo (o homem que recebe o fogo e a técnica para compesar sua nudez) e Hermes. É esta culpa originada no homem a que determina sua saída da natureza, sua sociabilidade, seu acesso ao conhecimento e a tecnología. Se se considera superior ao animal não humana é apra compensar este defeito.

4 Há duas histórias da criação na Bíblia (Gênesis 1 e Gênesis 2). Na primeira narrativa, Deus cria juntos, ao mesmo tempo, homem e mulher, e lhes dis que crescçam sobre a terra, a dominem e submetam todos os seres vivos. Na segunda história, começa por criar o homem, e somente a ele lhe encomenda a tarefa de nomear aos animais não humanos, libera a linguagem neles (é uma maneira de domesticá-los). Depois disso, cria a mulher de uma de suas costelas.

5 Brage Cendan, Santiago B., Los delitos de maltrato y abandono de animales, Tirant lo Blanch, 1ª ed., Valencia, 2017, p. 16

6 Ver Evans, Edward Payson, The Criminal Prosecution and Capital Punishment of animals, W. Heinemann, London, 1906; Woodburit Hyde, Walter, “The Prosecution and Punishment of Animals and Lifeless Things in the Middle Ages and Modern Times”, em University of Pennsylvania Law Review, 1916.

18 SÉRIE CIÊNCIAS CRIMINAIS - VOL 8 - DIREITO ANIMAL - O BEM-JURÍDICO NO CRIME DE MAUS-TRATOS

“[...] Foi dito e proposto que na terça-feira antes do Natal, uma porca e seus seis leitões, hoje presos, apanhados em flagrante delito, cometeram e perpetraram o homicídio na pessoa de Jehan Martin [ ]

[...] Dizemos e pronunciamos que a porca, em razão de assassinato e homicídio cometido e perpetrado contra a pessoa de Jehan Martin, seja punida e condenada à última tortura e enforcada pelas patas traseiras de uma árvore [ ]

[…] Quanto aos leitões da porca, como não foi comprovado que comeram do dito Jehan Martin, contentamo-nos em devolvê-los ao dono, com garantia de entrega caso se verifique que comeram do dito Jehan Martin [ …] ”7

Outra sentença é a de 18 de abril de 1499, onde após um julgamento criminal contra um porco, detido na comuna de Séves, perto de Chartres, foi condenado à forca e execução por matar um bebê. Os donos do animal não humano, os pais adotivos da criança, foram multados em 18 francos por negligência:

“Considerando o processo criminal que nos foi feito [...] contra Jehan Delalande e sua esposa, presos pela presente causa, em razão da morte ocorrida na pessoa de uma criança pequena, chamada Gilon, de aproximadamente um ano e meio; que a criança havia sido criada pela mãe para cuidar dele: o referido assassinato ocorreu e foi cometido por um porco de aproximadamente três meses; das confissões de Delalande e sua esposa; as informações que nós e o secretário da jurisdição obtivemos a pedido do Procurador; Tudo visto e neste conselho, condenamos Jehan Delalande e sua esposa à multa de dezoito francos [...]

[...] E o porco, pelos motivos expostos e pelo julgamento estabelecido, o condenamos ao enforcamento e execução pela justiça [...]”8.

Entre outros, a expulsão de uma família de ratos de campos cultivados para terras selvagens também é lembrada em 1519 por considerá-los culpados de comer a colheita dos camponeses de Glurns, na Suíça. A frase oferece uma peculiaridade curiosa: a camundongo fêmea grávida e seus filhotes tiveram mais tempo do que o pai de família para sair da roça9 .

Como ensina Zaffaroni, costuma-se entender que naquele período existia uma relação ambivalente entre o animal humano e o animal não humano, visto que de alguma forma a este era reconhecido algum tipo de dignidade e responsabilidade, embora isso não significasse a existência de qualquer direito, na forma como o entendemos hoje, porque a ideia atual de direito subjetivo foi formalizada antes do poder do Estado no século XVIII. No sentido moderno, eles não tinham direitos naquela épo -

7 Evans, Edward Payson, op. cit, p. 346.

8 Ibidem, pp. 352-353.

9 Salisbury, Joyce. E., The Beast Within. Animals in the Middle Ages, Routledge, New York/London, 1994.

NADIA ESPINA 19

ca, nem animais não humanos nem humanos10. Quando ratos ou pragas eram excomungados, o ato formal e público mostrava que o poder fazia todo o possível para punir os responsáveis e, desta forma, evitava o desconforto das colheitas destruídas e a consequente fome. É derivado contra o senhor ou príncipes. Estes reafirmaram sua autoridade até mesmo sobre os animais não humanos e, ao mesmo tempo, evitaram o perigo de que a vingança se abatesse sobre eles. Já quando a porca que havia matado uma criança foi executada, a pena foi impedida de recair sobre a mãe negligente que havia deixado a criança ao alcance da porca e que já tinha castigo natural suficiente com o horror que tinha de viver11 .

Esses processos são geralmente considerados como uma prova de que desde o século XIII até o Iluminismo, os animais não humanos são reconhecidos como humanos ou pelo menos responsáveis, de modo que alguns analistas da discussão atual se perguntam o que é que produziu uma mudança tão marcante no século 1812.

A partir do século XVIII, os animais não humanos perdem as características que os tornavam bodes expiatórios para as possíveis responsabilidades criminosas dos humanos, pois na época do reconhecimento dos direitos destes últimos, os direitos dos primeiros eram negados, e por isso mesmo era preciso parar de puni-los, evitar contradições.

A chegada do racionalismo - séculos 17 e 18 - com o filósofo francês René Descartes, marcou uma nítida distinção entre o animal não humano e o humano. Segundo essa linha de pensamento, o ser humano difere do animal não humano por ser dotado de alma, razão e compreensão que lhe permite diferenciar o bem do mal, em comparação com os animais não humanos, considerados máquinas, autômatos, despojados de toda alma13.

Zaffaroni,

11 Ibidem, p. 31.

12 Ibidem, p. 29.

Ciudad Autónoma de Buenos Aires, 2011, pp. 29-30.

13 Descartes, René, Discurso del método, V Parte, Manuel García Morente (trad.), Colecciones Austral-Espasa Calpe, Madrid, 2010, pp. 71 e ss.. Nas páginas 80-81, Descartes expressa: “...Se houvesse máquinas tais que tivessem órgãos e a figura exterior de um macaco ou de outro animal, desprovido de razão, não haveria meio algum que nos permitiría conhecer que não são de igual natureza que estes animais; enquanto que se houvesse algo semelhante aos nossos corpos que imitassem nossas ações, quando fosse moralmente possivel, sempre teríamos dois meios muito certos para reconhecer que não são homens verdadeiros; o primeiro é que nunca poderiam fazer uso da palabra e de outros signos, compondo-os, como nós fazemos, para declarar nossos pensamentos aos demais, pois se bem se pode conceber que uma máquina esteja de tal modo feita que profira palavras, e até que as profira a propósito de ações corporais que causem alguna alteração de seus órgãos, como por exemplo, se se a toca em alguma parte, que pergunte o que quer dizer, e se em outra, que grite se a machuca, e outras coisas de mesmo estilo, entretanto, não se concebe que ordene as palavras para contestar o sentido de tudo o que em sua presença seja dito, como podem fazer ainda os mais estúpidos entre os homens; e o segundo motivo é que ainda quando fizessem as coisas tão bem e mesmo melhor que algum de nós, não deixariam de falhar em outras, por onde se descubiria que não agem por conhecimento, senão somente pela disposição de seus órgãos, pois enquanto que a razão é um instrumento universal, que pode servir em todas as conjunturas, estes órgãos, ao contrário, necessitam de uma

20 SÉRIE CIÊNCIAS CRIMINAIS - VOL 8 - DIREITO ANIMAL - O BEM-JURÍDICO NO CRIME DE MAUS-TRATOS
10 Eugenio R., La Pachamama y el Humano, Colihue,

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.