Cirino dos Santos
AS RAÍZES DO CRIME
Um Estudo Sobre as Estruturas e as Instituições da Violência
2ª Edição
Copyright© Tirant lo Blanch Brasil
Editor Responsável: Aline Gostinski Assistente Editorial: Izabela Eid Capa e diagramação: Analu Brettas
CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO:
Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot
Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Investigador do Instituto de Investigações Jurídicas da UNAM - México Juarez Tavares
Catedrático de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Brasil Luis López Guerra
Ex Magistrado do Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Catedrático de Direito Cons titucional da Universidade Carlos III de Madrid - Espanha Owen M. Fiss
Catedrático Emérito de Teoria de Direito da Universidade de Yale - EUA Tomás S. Vives Antón
Catedrático de Direito Penal da Universidade de Valência - Espanha
S235 Santos, Juarez Cirino dos
As raízes do crime : um estudo sobre as estruturas e as instituições da violência [livro eletrônico] / Juarez Cirino dos Santos. - 2.ed. – São Paulo : Tirant lo Blanch, 2022. 2.092Kb; livro digital
ISBN: 978-65-5908-397-8
1.Direito penal. 2. Criminologia. 3. Raízes do crime. I. Título.
CDU: 343.9(81)
Bibliotecária responsável: Elisabete Cândida da Silva CRB-8/6778 DOI: 10.53071/boo-2022-07-17-62d44646b8bfd
É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto às caracte rísticas gráficas e/ou editoriais. A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art.184 e §§, Lei n° 10.695, de 01/07/2003), sujeitando-se à busca e apreensão e indenizações diversas (Lei n°9.610/98).
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Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Juarez Cirino dos Santos
Doutor em Direito Penal (UFRJ)
Mestre em Ciências Jurídicas (PUCRJ)
Pós-doutorado no Institut für Rechts- und Sozialphilosophie (Universidade do Saarland, Alemanha)
AS RAÍZES DO CRIME
Um Estudo Sobre as Estruturas e as Instituições da Violência
2ª Edição
SuMáRIO
DO AutOR pARA
EDIçãO..................................
modelos
crime
Durkheim
Merton
crime
estrutural-funcionalismo
sociologia de Merton:
Sutherland
Teorias
a teoria da organização
Cloward e Ohlin
Pinatel:
etiologia
4.2. Denis Szabo: a etiologia macrossociológica da violência
71
5. MARC ANCEl E O MOvIMENtO DE DEfESA SOCIAl ........ 75
5.1. A formação da Defesa Social
75
5.2. A ideologia da defesa social.............................. 79
6. AS tEORIAS fENOMENOlógICAS
6.1. O Naturalismo de David Matza
85
85
6.2. O labeling approach de Howard Becker e Edwin Lemert
pARtE II
88
I. A quEStãO CRIMINAl E O CENáRIO INtERNACIONAl ...... 94
II. IMpERIAlISMO E DEpENDêNCIA: A RElAçãO CENtRO/ pERIfERIA DO CApItAlISMO NEOlIbERAl........................ 103
1. O processo de internacionalização do capital
A hegemonia do capital monopolista
103
105
3. Uma tese inovadora: punição para espoliação salarial
III. A vIOlêNCIA NA AMéRICA lAtINA
IV. A vIOlêNCIA NO bRASIl
1. Gênese do capitalismo brasileiro
108
112
120
120
2. Expansão imperialista: formação de monopólios ... 122
3. A estrutura de classes no Brasil
127
v. A vIOlêNCIA DO MODO DE pRODuçãO CApItAlIStA .... 133
1. A violência estrutural no Brasil
133
2. A violência estrutural comum sobre o bloco dominado: violência econômica e financeira ............ 134
3. A violência institucional no Brasil ....................... 146
3.1. A violência das instituições jurídicas do Estado .... 149 3.1.1. A violência das matrizes legais do sistema penal ................................................................. 151
3.1.2. O processo de criminalização como produção de criminosos: o criminoso como “mercadoria” e como “produtor” ............................................... 164
3.2. O processo de criminalização: a violência dos aparelhos de repressão criminal............................. 171 3.2.1. A violência institucional do aparelho policial........................................................... 171 3.2.2. A violência institucional da justiça criminal ... 183 3.2.3. A violência institucional do aparelho carcerário .......................................................... 202 3.2.3.1. Teorias tradicionais da pena .................. 204 3.2.3.2. Teorias críticas da pena criminal ........... 211 3.2.3.3. Conclusão crítica.................................. 230 bIblIOgRAfIA ........................................................... 238
NOtA DO AutOR pARA A 2ª EDIçãO
O propósito de As Raízes do Crime foi mostrar as estruturas e as instituições da violência no Brasil e na América Latina, revelando as raízes violentas das relações sociais de produção e dos sistemas jurídicos e políticos do modo de produção capitalista, conforme resumido na II Parte do livro. A ideia condutora do projeto é o conceito de homem como conjunto das relações sociais (definido na 6ª Tese sobre Feuerbach, de Marx), cuja natureza é forjada pelas contradições reais da vida humana, em que a privação de meios materiais de subsistência animal determina as alternativas: ou a vida miserável de subordinação ao trabalho assalariado, ou a trágica submissão à violência da polícia e da justiça criminal, na hipótese de opção forçada por meios de sobrevivência considerados ilegais pelo sistema penal. Estruturas de relações materiais violentas, garantidas por instituições políticas e jurídicas violentas, produzem indivíduos igualmente violentos, determinados pela necessária adaptação pessoal às condições sociais adversas, insuportáveis e insuperáveis por meios legítimos. Essa é a origem histórica da tragédia social da vida humana na sociedade capitalista, em especial na época da dominação imperialista sobre os povos subdesenvolvidos e dependentes da periferia do sistema neoliberal globalizado.
2ª edição
Considerações didáticas aconselharam uma breve descrição das teorias criminológicas sobre violência criminal, desde as concepções clássicas, passando pelos modelos positivistas até as elaborações críticas da sociologia política contemporânea, apresentadas na I Parte do livro, com o objetivo de oferecer ao leitor um referencial mínimo das explicações do comportamento criminoso e das estruturas e instituições violentas das sociedades capitalistas. Por essa razão, a semelhança do conteúdo dessa parte do livro com o conteúdo de alguns capítulos de A Criminologia da Repressão, escrito em 1979 e utilizado para a redação original do texto, ou com o livro recente Criminologia: contribuição para crítica da economia da punição, utilizado para modernizar algumas abordagens mais antigas. Não obstante, essas referências teóricas não substituem a leitura daqueles livros, muito mais completos e abrangentes. Por fim, convém dizer que As raízes do crime: um estudo sobre as estruturas e as instituições da violência constitui, em conjunto com A Criminologia da Repressão e A Criminologia Radical, a assim chamada Trilogia criminológica, publicada pela Tirant lo Blanch, sob a competente direção editorial de Aline Gostinski, no Brasil.
Curitiba e Rio de Janeiro, julho de 2022. JuAREZ CIRINO DOS SANtOS
pARtE I
1. INtRODuçãO
A maioria dos estudos sobre violência, em especial sobre violência criminal, concentram o foco no indivíduo, destacando características biológicas, compreendo os atavismos indicados por estigmas físicos (Lombroso); os caracteres morfológicos dos tipos corporais (Sheldon, Glueck, Kretschmer); anomalias cromossômicas popularizadas nas teorias genéticas do Y extra (Klinefelter); explicações extraídas das elaborações da psicologia beha viorista, desde os estudos etológicos do comportamento instintivo (Konrad Lorenz) até as construções mais so fisticadas sobre personalidades extrovertidas e emocionalmente instáveis (Eysenck); teorias psicológicas, centradas em experiências mais ou menos traumatizantes, correlacionando frustação e agressão, vulgarizadas pela Escola de Yale (John Dollard, com os trabalhos posteriores de Berkowitz, Megargee e outros); ou modelos mais refinados, desenvolvidos com base em instintos agressivos inatos, generalizados pela escola psicanalítica, legitimados pela autoridade de Freud, com as derivações e deformações das correntes kleinianas e adlerianas, até as elaborações mais específicas de Etienne de Greeff. To das essas construções teóricas da origem da violência se caracterizam pela ênfase em fatores que são, em última instância, biológicos, e podem ser classificadas na categoria de explicações antropológicas da violência nas relações humanas, fundadas nas premissas metodológicas e
nos postulados fundamentais do positivismo, com todas as limitações teóricas e deformações ideológicas que o informam. Em todos os modelos existe a preocupação de sumariar combinações de fatores causais, com o objetivo de apresentar uma etiologia da violência como “ciência de sua causação”, mecanicista e determinista, isolando o fenômeno estudado de seus condicionantes primários, localizados nas estruturas econômicas e nos sistemas ideológicos, políticos e jurídicos de controle social, como adiante se verá.
Por outro lado, estudos sociológicos vinculando a violência a fatores ambientais deslocaram o enfoque do indivíduo para as condições sociais, culturais, ecológicas, familiares, habitacionais, de trabalho etc., e origi naram modelos explicativos diversos, como as teorias ecológicas de Robert Park; as explicações do crime como patologia social, uma espécie de transposição sociológica de conceitos da área médica e biológica, desenvolvidos a partir de Emile Durkheim; as categorias desviantes derivadas de uma conceituação idealista de estrutura social, definindo o comportamento social pela relação ou posição do sujeito em face das metas culturais generalizadas pela ideologia do sucesso e os meios institucionais disponíveis para sua realização, dos trabalhos indiscuti velmente já avançados de Robert Merton; as teorias da aprendizagem do comportamento violento, representadas pela teoria da associação e organização diferencial de Edwin Sutherland, já antecipadas por Gabriel Tarde sob a modalidade da imitação; finalmente, as construções das teorias multifatoriais, objetivando agregar em uma
concepção geral os vários modelos sociológicos, em um ecletismo de hipóteses e variáveis justapostas, sem um critério unitário de integração sociológica. Toda a sociologia da violência produzida com base nos modelos mencionados trabalha com causalidades mais ou menos lineares, originadas de situações de desemprego, má habitação, lares desfeitos, privações econômicas, áreas desorganizadas e pobres, subculturas de violência, má distribuição de renda, marginalização etc., consideradas independentemente de sua historicidade e sem relação orgânica com as estruturas de produção econômicas, constituídas de classes sociais antagônicas, cujas relações de expropriação/exploração são instituídas e reproduzidas pelos sistemas jurídicos e políticos do Estado, sob a forma de dominação/subordinação de uma classe sobre outra. Esses modelos se fundamentam nas mesmas premissas metodológicas e postulados teóricos do positivismo, com todas as implicações ideológicas e políticas inerentes à aplicação das categorias que o informam, como também se analisará.
As teorias individualistas/antropológicas e as teorias sociológicas/ambientais da violência nas relações humanas cumpriram um papel ideológico essencial para legitimar, com o prestígio da ciência e do “método científico”, a repressão de classe nas sociedades capitalistas: essa ciência ideologizada, difundindo os mitos da violência individual inata ou aprendida, instalada geneticamente ou absorvida em ambientes ou áreas defeituosas, dissemina a consciência errônea de que programas de tratamento do indivíduo, ou reformas sociais loca-
lizadas e limitadas às áreas subculturais ou periféricas constituem medidas de terapêutica ou profilaxia criminal, recomendadas sob a égide da ciência.
Estudos mais recentes integraram os processos de aprendizagem no contexto das percepções psíquicas das experiências vividas e das atitudes pessoais fundadas na experiência representada, conforme os trabalhos de David Matza e, de um modo especial, os estudos da fenomenologia interacionista de Howard Becker, de Edwin Lemert e outros. As limitações desses estudos decorrem do método subjetivista e introspectivo que reduz as explicações do comportamento ao nível das percepções e atitudes individuais, sem relação com as determinações econômicas e políticas do mundo real. Não obstante, representam as mais flexíveis e lúcidas elaborações da criminologia dominante nas sociedades capitalistas, com um sentido crítico e humanístico próximos de uma compreensão mais totalizadora do comportamento, inteiramente inacessíveis aos determinismos mecanicistas da metodologia positivista. Mas a redução fenomenológica às representações como experiência percebida, e às atitudes como inserção pessoal escolhida ou eleita no contexto de uma realidade significativa para o sujeito, ao mesmo tempo que representa um avanço enorme em relação ao positivismo inerente à criminologia oficial, revela uma deficiência de base ao excluir do seu objeto científico a objetividade real dos acontecimentos históricos, expressos nas relações estruturais de produção da vida material da sociedade, e nos sistemas ideológicos, jurídicos e políticos de reprodução das condi-
ções de produção material e das relações sociais entre os seres humanos, agrupados e diferenciados em classes sociais opostas nos processos de produção material.
De um modo geral, a característica comum desses vários modelos teóricos sobre a violência, com seus métodos positivista/deterministas ou fenomenológico/ significativos, reside na redução das explicações da violência ao nível individual, pressupondo uma natureza humana intrinsecamente violenta, como nas várias formas do positivismo biopsicológico ou behaviorista, ou enfatizando processos sociais de aprendizagem da violência, como modo internalizado de solução de conflitos ou de superação de problemas existenciais. O resultado desse modo de teorização da violência aparece como reafirmação da racionalidade das bases estruturais da sociedade, legitimando, ao mesmo tempo, os sistemas ideológicos, jurídicos e políticos de controle social, e a atuação dos aparelhos de repressão da violência criminosa, como a polícia, a justiça e a prisão, coordenados pelo Estado, como instituição central do controle social. Mas essa ciência causal ou fenomenológica da violência, ao justificar as práticas de controle e a racionalidade da ordem social, exerce uma função mistificadora, que encobre a realidade violenta e irracional da ordem social e o significado de dominação de classe das práticas de controle social, que não só consolidam e legitimam os esquemas de opressão e repressão social, mas os reproduzem como relações materiais de exploração econômica e dominação política, inculcadas como necessárias, justas e racionais na consciência das pró-
prias classes dominadas, exploradas e reprimidas, quer nas suas contestações coletivas, sob a forma de greves, manifestações e protestos, quer nas suas rebeldias ou explosões individuais de frustração e fúria contidas, sob a forma do crime. Existe, portanto, como ideologia disfarçada de ciência, não apenas como resultado legitimador, mas como fundamento reprodutor da opressão política e da exploração econômica das classes dominadas.
2. MODElOS bIOlógICOS
Os modelos biológicos mais recentes da criminologia da violência desenvolvem etiologias fundadas, em geral, na categoria do instinto, como base do comportamento animal, identificado nos estudos etológicos ou de psicologia animal, conhecidos, também, como psicologia behaviorista. As constatações empíricas produzidas pela observação do comportamento instintivo animal embasam conclusões generalizadas sobre o comportamento do conjunto dos seres vivo: no animal humano a categoria instinto aparece modificada sob a noção de pulsão (ou de impulso), para indicar a superimposição, não necessariamente modificativa das de terminações instintivas primárias do comportamento, da experiência sensorial adquirida no curso da vida social e internalizada sob a forma de controles, bloqueios ou direcionamentos gerais na estrutura inconsciente do sistema cerebral (Debuyst, 1974, p. 190). Esses modelos biológicos do comportamento humano violento trabalham com categorias complementares, expressas no conceito de sistema neurônico, como superestrutura fisiológica organizada do cérebro, compreendendo dois subsistemas específicos: o subsistema da predação, necessária à sobrevivência física, e o subsistema da agressão, quer na dimensão intraespecífica, em que se estabelecem as relações de hierarquia no grupo, quer na dimensão interespecífica, necessária à proteção do grupo e à defe-
sa do território em que se desenvolve a vida do grupo. O sistema neurônico, composto pelos subsistemas da predação e da agressão, compreende mecanismos preestabelecidos, como circuitos disparados por estímulos exteriores, com as interferências modificadoras fisiológicas (especialmente hormonais) e psicológicas e, de modo mais especial ainda, as provocadas pelo superego e pelas experiências frustrantes (Debuyst, 1974, p.183 e s.).
1. CARACtERES DO pOSItIvISMO
Os modelos biológicos do comportamento violento são variações explicativas derivadas do mesmo método de produzir ciência: o método experimental, de observação e experimentação do pensamento positivista, originário das ciências naturais e generalizado, em seguida, para as ciências sociais. Esse método se fundamenta em alguns caracteres específicos, cuja integra ção seria responsável pelo prestígio dos conhecimentos obtidos com a sua aplicação: o determinismo causal, a objetividade da ciência e a quantificação da conduta.
1. O determinismo causal, como lei geral da natureza, incluiria não só fenômenos físicos, mas ações humanas: o comportamento humano, regido por leis causais, como relações de determinação internas, aparece como produto de forças não conhecidas e não controladas pelo sujeito. Esse comportamento determi nado revela ou manifesta a natureza do sujeito (bom/ mau, violento/pacífico etc.), que exprime, ao nível da
conduta, aquelas relações internas determinantes. Nessa perspectiva, a tarefa do cientista, ou seja, do perito informado sobre as relações intrínsecas determinantes do comportamento humano, consiste em descobrir as causas que produzem o comportamento e identificar as relações/distorções internas responsáveis pelas deformações da conduta, ligadas ao desvio das normais sociais e, consequentemente, indicar terapêuticas específicas capazes de alterar, reduzir ou excluir as disposições ou predisposições internas do comportamento anormal, atuando como método de reeducação ou de ressocialização do sujeito.
2. A objetividade da ciência produzida pelo método positivista é um corolário natural do determinismo causal dessas leis gerais, cuja natureza objetiva, necessária e independente da vontade individual fundamenta a objetividade do conhecimento, que organiza essas relações em um sistema de categorias abstratas. Aqui, porém, começa a aparecer o caráter ideológico da teoria positivista, porque a ciência não se produz por si mesma: é o produto organizado do cérebro pensante de indivíduos concretos - logo, a objetividade da ciência implica a neutralidade do cientista, que aplica o método positivista da observação do real, da formulação de hipóteses explicativas e da experimentação dessas hipóteses, produzindo a ciência. A neutralidade do cientista, responsável pela objetividade da ciência, pressupõe uma posição de superioridade e independência em relação às questões de valor contidas nas hipóteses experimentadas, definidas como interesses sectários, que não seriam
preocupação do cientista, mas do político: o cientista seria uma espécie cerebral programada para uma imparcialidade absoluta, sem interesses pessoais, relações sociais, objetivos existenciais e preconceitos individuais, vivendo em um mundo sem contradições e partidarismos. O método experimental se baseia na indução de hipóteses pela observação regular de fenômenos empíricos, verificados pela experimentação e confirmados, negados ou modificados pelos resultados obtidos. A verificação positiva de hipóteses expressivas de leis gerais do real concreto pressupõe a extensão da experiência a uma generalidade de casos semelhantes, e a reprodução dos mesmos resultados, nas mesmas condições, autoriza a elevação da teoria posta nas hipóteses ao nível de conhecimento científico positivamente comprovado.
3. A quantificação dos dados, pela extensão da pesquisa a uma generalidade de casos, é o critério geral da verdade científica na prática experimental. Esse critério, desenvolvido nas ciências físicas e biológicas, ao ser transposto para as ciências sociais e humanas exige a quantificação das condutas: a construção de teorias, postas em hipóteses expressivas de leis gerais induzidas, pressupõe a observação regular de uma quantidade de comportamentos semelhantes, mas a verificação empí rica dessas teorias é limitada por problemas éticos na manipulação de seres humanos e na inevitável violação de direitos humanos, que transforma o homem em cobaia e, portanto, em meio para produção da ciência, como fim em si mesmo. Por outro lado, a produção de ciência baseada na quantificação da conduta humana