Folha do Norte

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FOLHA DO NORTE O jornal que é mão de mucura assada

A

N°01

Brasil Norte

25 de abril de 2011

A influência do tupi

té o final do século XVII, a língua “oficial” do Brasil era o Tupi-guarani misturado com português. De cada três brasileiros, dois só falavam Tupi-Guarani. Mas em 1759, sobre influência do Marquês de Pombal, o governo português baixou um decreto proibindo o uso do idioma “híbrido” ao qual imbutia a acusação de que estava prejudicando as comunicações na colônia brasileira e impondo punições para quem não usasse o idioma português. Foi assim que, à força, o tupi-guarani foi tirado de circulação ao longo do tempo. Se não houvesse essa medida, o Brasil seria um país bilíngue cuja população usaria o português e o tupi-guarani, tal como hoje ocorre no Paraguai em que o povo de lá exprime-se em espanhol e guarani, uma língua parente do tupi. Vamos ver alguns exemplos da influência do tupi-guarani no português brasileiro. Temos a expressão “Tá”. É uma contração do verbo “Estar” na 3ª pessoa do singular? Muita gente pensa que sim, mas não é. É uma expressão do tupi incorporada na fala brasileira. Vejamos o que explica Afonso Frietas. “O tupi-guarani não sabia modular a voz em interrogativa: suprindo tal deficiência, sempre que perguntava incluía na frase as partículas tahá, tá, pá, projeções de uma mesma raiz, e será, todas supletivas da inflexão de voz imodulável pelo órgão vocal do aborígene. Dessas partículas- será- fixou-se no vernáculo, por modismo, mas também substituindo a expressão portuguesa- será-, razão talvez da sua rápida incorporação, total em São Paulo e noutros estados do sul, ainda incompleta nos do Norte. Em nheengatu a partícula- será- aparece, de ordinário, encerrando a frase, posição essa ainda mantida no português falado entre a gente do povo do Norte do Brasil: - chove será, isto é, será que chove?”. Raros são os brasileiros que pronunciam o “r” de final de palavras. Por exemplo, “pagar” é falado como “pagá”, “amor” soa a “amô” e assim vai. Pois esse vício de linguagem vem do tupi-guarani. As pessoas menos escolarizadas têm o costume de trocar o “l” pelo “i”. Não pronunciam “mulher”, mas “muié”, “pólvora” soa a “pórvora”, “filho” é “fio”, etc. Também é influência do antigo tupi, como lembra Afonso Freitas que acrescenta: “Da pecularidade do tupi-guarani empregar na frase, de preferência o particípio verbal ao infinito e de, invariavelmente, antepor as partículas pronominais aos verbos e aos nomes e pospor aos verbos os pronomes retos, é que

os paulistas dizem- está chovendo, me deixe, me faça o favor, etc., enquanto os portugueses locucionam- está a chover, construção tão malsoante aos nossos ouvidos, quanto aos ouvidos lusos devem ser os- me deixe, me faça o favor, do nhengatu aclimado ao vernáculo. A inexistência da partícula pronominal- lhe- no nheengatu, decorrente da ausência da consoante- l-, no alfabeto daquele idioma, deu azo à formação do modismo tão desagradável- disse pr’á ele (que muitos refinam desastradamente em disse p’r’ele), dá nele, etc., por disse-lhe, dá-lhe, etc”. Há tantas palavras tupi incorporadas ao português que nem percebemos, inclusive até na gíria de jovens. Por exemplo, há jovens que dizem: “O fulano chegou no serviço e BABAU. Perdeu o emprego”. O “Babau”, que muitos acham ser uma gíria de surfista, é uma expressão secular do tupi-guarani, que significa “acabou-se”. Outra expressão tupi é “nhenhenhén”. “Aquele cidadão é muito cheio de nhenhenhén”, ou seja, que fala e reclama incensantemente. A fala vem de “nheen nheen”, que significa em tupi “fala fala”. Vejamos a seguinte frase: “Este cara é meu xará”. Esta palavra, também tida como gíria, significa “amigo” no antigo idioma indígena. Os gaúchos usam e abusam do seu típico “tchê” no final de suas frases. “Tchê” é outro sinônimo tupi-guarani que significa “amigo”. Também significa “eu” e “meu”. Mas esta palavra tão usada pelos gaúchos incorporou-se tanto no português do Rio Grande do Sul como no espanhol dos argentinos e uruguaios dos pampas fronteiriços ao Brasil por influência também do guarani do Paraguai. Aliás, o famoso guerrilheiro argentino que participou da revolução cubana, Ernesto Guevara, que morreu na Bolívia em 1967, era chamado de “Che” (como é escrito “Tchê” no espanhol). Portanto, Che Guevara significa “Amigo Guevara”, que a história imortalizou como símbolo da rebeldia e da luta revolucionária esquerdista. Aliás, “gaúcho” era o nome dado aos índios guaranis que viviam nas missões. A influência do tupi está no vocabulário da fauna. Nome de animais e plantas como jaguar, jacaré, macaco, sagui (pêlo), tapera (casa abandonada), cangueiro (de “Acanga”-cabeça, instrumento de tração para os bois), ipê, piracema, etc, etc, etc. Ao todo, como lembra Raquel F. A. Teixeira, em artigo no livro “A Temática In-


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