Pedagogia da Avaliação e Paulo Freire: Incluir para transformar

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Os processos de empoderamento/autodeterminação são aqueles em que as tentativas para ganhar controle, obter os recursos necessários e compreender criticamente o ambiente social são fundamentais. O processo é empoderador se ajuda as pessoas a desenvolverem habilidades para que possam tornar-se solucionadoras de problemas e tomadoras de decisão independentes (...) Os resultados finais (outcomes) do empoderamento referem-se à sua operacionalização, a fim de que possamos estudar as consequências das tentativas dos cidadãos e cidadãs de ganharem maior controle em sua comunidade, ou os efeitos de intervenções planejadas para empoderar os participantes. (p.3)

A teoria do empoderamento ajuda a operacionalizar tanto a avaliação empoderadora quanto a pedagogia freiriana, ao separar os processos dos resultados finais (outcomes). Ambas proporcionam às pessoas as habilidades conceituais necessárias para compreender seu contexto social de forma crítica e se tornar solucionadoras de problemas, com independência.

2 Veja também Bandura,1982, para mais detalhes sobre temas relacionados a autoeficácia e autodeterminação 3 Existe uma abundante literatura relativa ao uso da avaliação. No entanto, a maior parte dela se dedica às lições aprendidas após a avaliação. A discussão do uso do processo, neste contexto, concentra-se no uso dessas lições durante a avaliação (ver também Patton, 1997, 1998 e 2005). 4 (N. da T.) O autor extraiu a maioria das citações de Freire, de Pedagogy of the Oppressed (New York: Seabury Press, 1974). Ao traduzir este capítulo, tais citações foram substituídas pelos parágrafos correspondentes da Pedagogia do Oprimido (São Paulo: Paz e Terra, 2015). As citações que o autor retirou de Freire (1985), The Politics of Education: Culture, Power, and Liberation, foram traduzidas para o português por nós, para esta edição.

Autodeterminação Este é um dos conceitos fundamentais subjacentes à teoria do empoderamento. Autodeterminação é definida como a capacidade de uma pessoa de mapear seu próprio curso na vida. Consiste em numerosas competências interconectadas, tais como a habilidade de identificar e expressar necessidades; estabelecer objetivos ou expectativas e um plano de ação para alcançá-los; identificar recursos; fazer escolhas racionais entre vários cursos alternativos de ação; estabelecer os passos apropriados para atingir os objetivos; avaliar resultados no curto e longo prazo, inclusive reavaliando planos e expectativas e fazendo os desvios necessários; e persistir na busca desses objetivos. Uma ruptura em qualquer nó dessa rede de competências – bem como diversos fatores do ambiente – podem reduzir a probabilidade de uma pessoa de ser autônoma, se autodeterminar.2 Estes micropassos instrumentais são necessários para que as pessoas alcancem seus objetivos, construam confiança, projetem novas metas desafiadoras e, finalmente, se responsabilizem por suas próprias vidas. Freire reconheceu a necessidade de as

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pessoas agirem baseadas na realidade, para transformar suas vidas. Estes passos são um mapa para a ação, em um nível micro.

Uso do processo Este conceito representa muito da lógica subjacente à avaliação empoderadora na prática, porque cultiva a apropriação do processo, colocando a abordagem nas mãos da comunidade e dos membros da equipe. Quanto mais as pessoas se envolvem na condução de suas próprias avaliações, mais é provável que acreditem nelas, porque os resultados lhes pertencem. Além disso, um subproduto desta experiência é que elas aprendem a pensar de forma avaliativa. Isso as torna mais propensas a tomar decisões e realizar ações baseadas nos seus dados de avaliação. Essa forma de pensar é o cerne do uso do processo3 (ver Patton, 1997 e 2005). Em uma avaliação empoderadora, pensar de modo avaliativo é um produto da imersão orientada. Isso ocorre quando um grupo de pessoas conduz sua própria avaliação, com apoio de um avaliador que empodera. Ensinar as pessoas a pensar avaliativamente é como ensiná-las a pescar. É algo que vale para toda a vida e é disso que trata a sustentabilidade avaliativa – internalizar a avaliação. A avaliação empoderadora segue o modelo da pedagogia libertadora freiriana, em parte porque reconhece a importância de as pessoas permanecerem no controle de suas próprias vidas, ao invés de transferi-lo a peritos externos. Como Freire (2015) alertou: (...) o fato de os investigadores, na primeira etapa da investigação, terem chegado à apreensão mais ou menos aproximada do conjunto de contradições, “não os autoriza a pensar na estruturação do conteúdo programático da ação educativa. Até então, esta visão é deles ainda, e não a dos indivíduos em face de sua realidade”. (p. 149)4

A avaliação empoderadora pressupõe que as pessoas aprendam e internalizem essa aprendizagem, ao praticá-la. Freire (2015) observou que somente


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