Dívida de liberdade | Cinthia Miguéis Arruda e Maria Eduarda Façanho Leão

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL FACULDADE DE ARTES, LETRAS E COMUNICAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

DÍVIDA DE LIBERDADE: NARRATIVA LONGFORM SOBRE ALICIAMENTO E TRÁFICO DE PESSOAS PARA O MERCADO SEXUAL EM MATO GROSSO DO SUL

CINTHIA MIGUEIS ARRUDA MARIA EDUARDA FAÇANHO LEÃO

Campo Grande JUNHO/2018


CINTHIA MIGUEIS ARRUDA MARIA EDUARDA FAÇANHO LEÃO DÍVIDA DE LIBERDADE: NARRATIVA LONGFORM SOBRE ALICIAMENTO E TRÁFICO DE PESSOAS PARA O MERCADO SEXUAL EM MATO GROSSO DO SUL

Relatório apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Projetos Experimentais do Curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Orientador(a): Profª. Dra. Katarini Giroldo Miguel

UFMS Campo Grande JUNHO/2018


SUMÁRIO Resumo

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Introdução

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1. Atividades Desenvolvidas

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1.1. Execução

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1.2. Dificuldades Encontradas

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1.3. Objetivos Alcançados

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2. Suportes Teóricos Adotados

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2.1. Tráfico Humano: Definição e Abrangência

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2.2. Prostituição: Profissão e Exploração no Tráfico

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2.3. Narrativa Longform: Definições de Usos

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3. Considerações Finais

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4. Referências

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Apêndice A

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Apêndice B

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Apêndice C

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Apêndice D

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Apêndice E

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Apêndice F

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Apêndice G

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Apêndice H

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RESUMO: O presente trabalho “Dívida de Liberdade: Narrativa Longform Sobre Aliciamento e Tráfico de Pessoas Para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul” (www.dividadeliberdade.com) tem como objetivo discutir o tema do tráfico humano e seus desdobramentos com fins de exploração sexual em território sul-matogrossense. A narrativa criada em formato longform para web tem o intuito de enfatizar uma realidade desconhecida ou omitida no estado de Mato Grosso do Sul, em especial nas cidades de Campo Grande e Corumbá, locais onde as histórias retratadas no trabalho ocorreram. O formato em grande reportagem para internet possibilita ao leitor um conhecimento em profundidade sobre o tráfico e o aliciamento de pessoas tanto pela perspectiva das personagens principais, quanto sob o ponto de vista dos agentes de direitos humanos, do Governo Estadual, da polícia e das organizações de enfretamento ao crime na região. PALAVRAS-CHAVE: Ciberjornalismo; Humano; Prostituição.

Exploração

Sexual;

Longform; Tráfico


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INTRODUÇÃO

A proposta deste trabalho de conclusão de curso é divulgar a situação de aliciamento de pessoas para fins de exploração sexual em Mato Grosso Sul, por meio de uma narrativa longform para web. Os relatos sobre tráfico humano contidos no trabalho abordam situações ocorridas especificamente em Campo Grande e no município que faz fronteira com a Bolívia, Corumbá. O projeto experimental visa desmistificar o tema do tráfico humano tendo em vista que, muitas vezes, a sociedade local e as próprias vítimas não reconhecem a realidade do crime e seus desdobramentos no estado. A prostituição é um dos meios lucrativos do tráfico de pessoas e no trabalho são explicados os níveis de organização do mercado sexual. Por exemplo, o ato de aliciar um indivíduo é o a primeira etapa do tráfico humano. É a fase onde o aliciador realiza a captação de vítimas por meio de promessas de uma vida melhor, dinheiro, viagens e após aceitar a falsa oportunidade, a vítima é obrigada a se prostituir de forma forçada sem receber pelo serviço. O resultado desse tipo de situação se caracteriza como uma exploração da mão de obra sexual. A grande reportagem desenvolvida para web, conhecida como longform, faz o uso de recursos multimidiáticos, como áudios e vídeos de entrevistas com especialistas, fotografias das fontes, infográficos com explicações sobre as etapas do tráfico humano. A narrativa longform é um produto derivado do ciberjornalismo, modo de produzir notícia, que se utiliza do cibermeio para informar o público e possui características próprias e outros aspectos oriundos do jornalismo tradicional. Canavilhas (2014) compilou sete características do jornalismo no cibermeio que caracterizam a nova plataforma: interatividade, instantaneidade, hipertextualização, multimidialidade, memória, ubiquidade e personalização. O conteúdo escrito do site é dividido em três capítulos principais: “Dramas Violados”, “Ciclos do Tráfico Humano” e “Um Porvir de Dignidade”. No processo de construção da grande reportagem foram realizadas pesquisas sobre o significado e como se constitui o tráfico humano no Brasil, com foco principal em Mato Grosso do Sul, e estudos em leis internacionais e brasileiras para expor de maneira histórica o assunto. O primeiro capítulo contém os relatos em gênero descritivo de duas exaliciadoras que trabalharam com tráfico humano em Mato Grosso do Sul nas décadas


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de 1980 e 1990. O segundo capítulo, escrito em gênero informativo, discorre sobre as lacunas existentes no setor legislativo brasileiro a partir de entrevistas com delegados da Polícia Federal. Dados do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul apontaram em 2013 que o estado se encontrava em terceiro lugar no ranking nacional com o maior número de vítimas de tráfico humano e que grande parte delas eram indígenas residentes nas regiões fronteiriças com a Bolívia e Paraguai. A partir deste e de outros dados, os delegados dos municípios de Campo Grande e Corumbá em entrevista confirmaram a existência do crime no estado, especificamente na cidade corumbaense conhecida como rota de tráfico humano e contrabando em decorrência da fronteira Brasil-Bolívia. No

último

capítulo

do

produto

disponibilizado

na

plataforma

(www.dividadedeliberdade.com), são abordadas as ações realizadas pelo Projeto Nova da Fundação de Assistência à Pessoa Humana em Campo Grande (Funasph). Na capital, o programa atende e presta auxílio a vítimas de tráfico humano e abuso sexual infantil. Este capítulo também discorre sobre a história do Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Mato Grosso do Sul (CETRAP/MS), que reúne representantes da sociedade civil e propõe debates sobre o crime no estado. Por fim, nos suportes teóricos deste relatório é explicada a diferença entre a prostituição autônoma e a forçada. Resumidamente, a autônoma é feita por escolha pessoal do indivíduo e a prostituição forçada utiliza-se da mão de obra escrava como uma ação lucrativa, por via de ameaças e dívidas forjadas a serem pagas sem prazo determinado aos criminosos envolvidos. As duas categorizações são exemplificadas e diferenciadas também no decorrer dos relatos das fontes principais da grande reportagem que contam histórias que evidenciam o contexto real no qual muitas vítimas traficadas e exploradas sexualmente viveram ou ainda vivem em Mato Grosso do Sul.


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1- ATIVIDADES DESENVOLVIDAS As atividades desenvolvidas seguiram o cronograma estipulado no anteprojeto deste trabalho de conclusão de curso. Realizamos o levantamento bibliográfico sobre o tema de aliciamento de pessoas, tráfico e prostituição necessário para a construção da narrativa jornalística da grande reportagem, como entrevistas com especialistas, organizações não governamentais que lutam contra o tráfico e exploração sexual, delegados responsáveis por operações no estado e ex-aliciadoras de Campo Grande e Corumbá.

1.1 Execução Em janeiro de 2018, foi escolhido o tema “Aliciamento e Tráfico de Pessoas Para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul” devido à proximidade que tivemos com o trabalho do Projeto Nova, idealizado e organizado pela psicanalista, escritora e membro da Fundação de Assistência à Pessoa Humana em Campo Grande (Funasph) e do Comitê de Enfrentamento à Violência e Defesa dos Direitos Sexuais da Criança e do Adolescente em Mato Grosso do Sul (COMCEX), Viviane Machado Vaz. Em 2016, a acadêmica participante deste trabalho, Maria Eduarda Leão, fotografou um evento beneficente do Projeto Nova e teve contato com o trabalho realizado pela Viviane Vaz, como também com algumas vítimas de abuso infantil e tráfico humano atendidas pelo projeto. Desde então, nasceu o desejo de estudar e retratar jornalisticamente o assunto em um projeto experimental. Após a escolha do tema, nos meses de fevereiro e março foram realizadas as primeiras pesquisas sobre o tema proposto e a elaboração do levantamento bibliográfico através de leituras em livros, artigos, cartilhas, sites, reportagens e préentrevistas com dirigentes de ONGs (Organizações Não-Governamentais) e movimentos de luta contra o tráfico de pessoas no estado. Juntamente com o levantamento bibliográfico, no mesmo período, iniciamos a elaboração do anteprojeto, seguindo as coordenadas de nossa orientadora professora Dra. Katarini Giroldo Miguel e o entregamos em março. Entrevistamos dois representantes da Polícia Federal, os delegados de Mato Grosso do Sul lotados em Campo Grande e Corumbá, Fernando Rocha e Danilo Magno, respectivamente. Em entrevista foram relatados dados de casos e operações


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entre os anos de 2007 e 2017 e sobre como a Polícia Federal realiza as investigações e trabalha para lutar contra este crime. Realizamos uma entrevista com a assistente social, militante e pesquisadora de Direitos Humanos, Estela Scandola, que informou a inexistência de um banco de dados ou responsáveis pela documentação de casos de tráfico humano no estado, sendo de responsabilidade dos órgãos públicos este serviço como a Secretaria de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul e o Ministério Público. Em entrevista com a coordenadora do Projeto Nova, Viviane Vaz explicou que o projeto é voltado para pessoas que vivem na prostituição e que se encontram em situação de exploração sexual, com foco em crianças e adolescentes. O Nova proporciona tratamento psicológico e oportunidades sociais para pessoas que querem sair da prostituição ou que procuram um atendimento específico, como terapia ou auxílio financeiro. Ainda em abril realizamos duas entrevistas com ex-aliciadoras do início dos anos 1990 que nos cederam relatos detalhados de como funciona e se constitui o mercado sexual e tráfico na região de Corumbá e Campo Grande. Ambas as entrevistas foram decupadas para a redação da reportagem. Em contato com o projeto da Viviane Vaz, fomos apresentadas a uma das vítimas que foi peça chave neste projeto. Carla, a primeira fonte, nasceu em Corumbá e tem 43 anos. Quando criança foi explorada sexualmente e pouco tempo após se considerava prostituta, mesmo menor de idade. Perto de completar 30 anos, começou a aliciar crianças e mulheres. Carla foi entrevistada em sua residência no início de abril e relatou detalhes sobre os episódios que viveu de abuso infantil, estupro, como era ser prostituta e o que a levou a se tornar uma aliciadora. A partir de Carla, Riene se tornou a segunda fonte da grande reportagem. Riene foi traficante de drogas e por no período de um ano aliciou crianças e adolescentes entre as décadas de 1980 e 1990. A ex-aliciadora prestava serviços ao mercado sexual de Campo Grande e manteve relacionamentos estreitos com cafetinas da capital. Ela é a personagem que explica minuciosamente detalhes de como se caracterizam as cafetinas, quais os métodos utilizados para o aliciamento, em sua maioria, de mulheres e crianças, e como funcionam os aspectos de violência verbal, psicológica, agressões e dívidas forjadas realizados pelos criminosos nas vítimas. Ambas as fontes não tiveram suas identidades verdadeiras reveladas por motivos de preservação e segurança.


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É de extrema importância ressaltar que para todas as entrevistas realizadas escrevemos roteiros de perguntas com questionamentos específicos para cada fonte, pois a elaboração prévia das entrevistas no jornalismo coopera como uma base para que os diálogos entre o profissional e as fontes ocorram de forma fluída, imersiva e assertiva. Os roteiros seguem nos apêndices deste relatório (apêndice A, apêndice B, apêndice C, apêndice D, apêndice E, apêndice F, apêndice G e apêndice H). Além disso, deixamos claro que este é um trabalho estritamente acadêmico e que garantimos todas as formas de segurança para as fontes, incluindo nomes fictícios, fotografias e imagens para vídeos em silhueta e restrito fornecimento de informações que poderiam colocar em risco a vida das pessoas envolvidas. Com relação à criação da plataforma e dos elementos audiovisuais, optamos por usar o programa Adobe Muse para a construção da longform. O background da plataforma é na cor branca e usamos a cor vermelho bordô na fonte dos títulos dos capítulos e a cor preta na fonte do conteúdo escrito. Para as janelas com as falas destacadas, utilizamos fundo branco e cor vermelha bordô na fonte, essa parte contém trechos de falas que destacamos como importantes. As fotos e vídeos foram produzidos e editados em preto e branco, principalmente por conta do primeiro capítulo, que conta sobre o passado das duas fontes principais. A rolagem da longform é parallax e facilita o desenvolvimento da leitura da reportagem, que foi distribuída no site pelas seguintes seções: Capa, Início, Capítulo I “Dramas Violados”, Capítulo II “Ciclos do Tráfico Humano”, Capítulo III “Um Porvir de Dignidade” e Contato. O primeiro capítulo “Dramas Violados” traz os relatos das duas fontes principais que foram abusadas na infância e se tornaram aliciadoras nos anos 1980 e 1990 tanto em Campo Grande, quanto no município de Corumbá. A ex-aliciadora Carla conta como ocorreram os episódios de abuso pelo pai e o tio quando era criança, as primeiras pessoas que a aliciaram para a prostituição e como se tornou uma traficante de crianças e adolescentes nos anos 1990. Já a fonte Riene relata sobre um romance com uma cafetina que a levou a se interessar pelo tráfico humano nas décadas de 1980 e meados de 1990. Ela realizou aliciamentos no período de um ano e relatou informações sobre a organização do crime de tráfico de pessoas em Campo Grande. O segundo capítulo “Ciclos do Tráfico Humano” possui caráter informativo, com dados importantes de como se constituem as etapas do tráfico humano. Por meio


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de entrevistas com o delegado da Polícia Federal de Campo Grande, Fernando Rocha, e de Corumbá, Danilo Magno, foram relatados dados do crime em Mato Grosso do Sul. Além disso, foram explicados os processos de realização das investigações em casos de tráfico de pessoas e qual é a pena para quem comete o crime. Em contraponto, no intertítulo do segundo capítulo “Bastidores do Mercado Sexual”, a ativista dos direitos humanos e voluntária da Organização Internacional Project Rescue Switzerland, Luiza, que teve a identidade protegida por nome fictício, contribui com informações sobre os pormenores do tráfico no Brasil e no exterior com relatos precisos de como os traficantes agem. Na conclusão do capítulo, contamos com a fala da assistente social Estela Scandola para esclarecer essas informações em âmbito regional. No terceiro capítulo “Um Porvir de Dignidade” escrevemos sobre o Projeto Nova, que auxilia as vítimas que sofreram as consequências do tráfico humano e que ainda se encontram em situação de vulnerabilidade. O projeto há 7 anos se tornou um dos programas pioneiros no estado a prestar apoio às mulheres, homens, crianças e adolescentes que tiveram no histórico de vida casos de abuso infantil, exploração sexual e o tráfico humano. A atual coordenadora do Nova e psicanalista, Viviane Vaz, relata sobre vítimas que conheceu de perto e detalha a formação da equipe de apoio do projeto. No intertítulo “Debate Sobre o Tráfico Humano”, a assistente social e secretária executiva do Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Mato Grosso do Sul (CETRAP/MS), Luciana Cavalcanti, compartilha visões distintas no que se refere ao trabalho da Policia Federal nesses casos. Além disso, explica como funciona o Comitê e quais são os trabalhos de enfretamento realizados para combater o crime de tráfico de pessoas. Por fim, no intertítulo do terceiro capítulo “Vias de Ajuda e Esperança” apresentamos dois eixos de combate ao crime de tráfico de pessoas na Polícia Federal, o preventivo e o repressivo. O delegado Danilo Magno explica as orientações específicas para ação da polícia e exemplifica como é realizada a abordagem em um ônibus de passageiros na fronteira com a Bolívia. Finalizamos o texto com informações para as vítimas e pessoas que suspeitam de casos de tráfico de humano entrem em contato.


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As imagens em especial foram editadas em preto e branco em referência ao passado, às histórias relatadas pelas duas personagens principais do capítulo 1 “Dramas Violados”. As imagens das ex-aliciadoras foram tiradas em parceria com o acadêmico de Publicidade e Propaganda da Universidade Anhanguera Uniderp, fotógrafo e videomaker, Daniel Magalhães, que nos auxiliou com as fotos, a filmagem e edição dos vídeos das personagens do primeiro e terceiro capítulos. O visual da longform no geral possui impacto e consistência de elementos gráficos. O site longform foi criado pelo web designer, Mateus Santana, responsável pela execução do pré-layout que elaboramos. A diagramação do conteúdo, dos recursos audiovisuais e dos infográficos foi realizada com êxito a partir de um estudo aprofundado de quais seriam as tipografias a serem utilizadas para melhor leitura, paleta de cores de acordo com o tema, efeitos, posicionamentos das fotos, áudios, vídeos e infográficos, e a dinâmica de paginação do site. A construção do site e a elaboração das fotografias e vídeos foram realizadas em equipe, com a nossa participação em todos os processos desde a idealização até a finalização da plataforma e do conteúdo da grande reportagem.

1.2 Dificuldades Encontradas O tema “Aliciamento e Tráfico de Pessoas Para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul” é por si complexo e delicado de se tratar jornalisticamente. As primeiras dificuldades encontradas apareceram na etapa de coleta de dados concretos e atualizados sobre casos de tráfico e exploração sexual no estado. No decorrer das pesquisas percebemos divergências e inconsistências entre os dados da Polícia Federal referentes ao estado e os dados contidos especificamente em Campo Grande e Corumbá. Essas percepções iniciais foram confirmadas no processo das entrevistas, uma vez que dois delegados da Polícia Federal cederam para a grande reportagem dados diferentes sobre casos notificados em território sul-mato-grossense, e informaram que nenhum órgão ou instituição no estado atualmente é responsável pela notificação e acompanhamento e que não existe um banco de dados sobre os casos de tráfico humano. Com relação ao aporte teórico, encontramos poucos trabalhos e livros que tratam do assunto especificamente no Brasil e na região Centro-Oeste. Quanto aos aspectos práticos, no processo de entrevistas tivemos dificuldade em entrevistar os


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dois delegados. O acesso é limitado e os primeiros retornos foram insatisfatórios para o trabalho. Com persistência, conseguimos entrevistá-los e apenas um dos delegados contribuiu significativamente com dados e informações sobre operações policiais realizadas no estado para o combate ao tráfico humano. Entrevistar as vítimas de tráfico e exploração sexual foi um de nossos maiores desafios. Cada fonte possui uma história peculiar e profunda, o que explica o receio em relatar e se identificar. Conseguimos apenas entrevistar duas ex-aliciadoras do estado. Após as etapas de pesquisas, entrevistas e criação, percebemos insuficiências a serem pensadas e solucionadas futuramente. Primeiramente, a inconsistência dos dados nos levou a questionar a importância de o governo estadual possuir um núcleo de enfrentamento ao tráfico humano para fins de exploração sexual em Mato Grosso do Sul, a começar pelas cidades de fronteira com o Paraguai e a Bolívia e na capital. Por este motivo, a grande reportagem ficou em desfalque com relação a dados atualizados sobre o crime. Além disso, apesar da excelente parceria realizada com o web designer e o fotógrafo, inicialmente contávamos apenas com o auxílio deles na edição de vídeos e na diagramação do site. Porém, por conta de um assalto, nossos equipamentos foram roubados no início da elaboração deste trabalho de conclusão e a necessidade e urgência nos fizeram buscar por ajuda, inclusive na realização das imagens das fontes, geralmente feitas pelos próprios acadêmicos.

1.3 Objetivos Alcançados

Realizados: Foram feitas pesquisas bibliográficas e coleta de dados sobre tráfico humano e prostituição, como também informações sobre casos em Mato Grosso do Sul, com foco em Campo Grande e no município fronteiriço de Corumbá. Foram realizadas entrevistas com os delegados Fernando Rocha e Danilo Magno, representantes de ONGs em Campo Grande e da Suíça, pesquisadores e uma psicanalista que puderam nos ajudar a compreender sociologicamente e psicologicamente o tema proposto.


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Foram realizadas entrevistas com o coordenador da Escola de Conselhos, Antônio Motti e a coordenadora executiva do Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Mato Grosso do Sul (CETRAP/MS), Luciana Cavalcanti. Foram realizadas entrevistas com duas vítimas que sofreram abuso infantil e se tornaram aliciadoras de crianças e adolescentes nos anos 90 em Mato Grosso do Sul. Foi elaborado o pré-layout da grande reportagem no formato longform e a plataforma final da grande reportagem. Os produtos audiovisuais (áudios, fotos, vídeos e infográficos) que ilustraram as histórias e a situação atual dos personagens foram produzidos na segunda semana de maio. Foram desenvolvidos com base na proteção à identidade das vítimas, como fotos em silhueta e vídeos editados de forma que as fontes não puderam ser reconhecidas. A redação propriamente da grande reportagem de gênero narrativo descritivo foi desenvolvida em três capítulos: 1 – Dramas Violados, 2 – Ciclos do Tráfico Humano e 3 – Um Porvir de Dignidade. Após finalização do conteúdo escrito e audiovisual, realizamos a diagramação do produto, publicação e divulgação em plataforma longform que está disponível para acesso no desktop e mobile pelo site (www.dividadeliberdade.com).

Alterados: O título inicial foi alterado de “Tráfico de Pessoas para Fins de Prostituição Forçada em Mato Grosso do Sul” para “Dívida de Liberdade: Narrativa Longform sobre Aliciamento e Tráfico de Pessoas para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul”, porque a partir de entrevistas e conversas com especialistas em psicologia e psicanálise, foram relatadas situações de tráfico humano e casos de aliciamento envolvendo crianças e adolescentes tanto em Campo Grande quanto em Corumbá. As situações foram contatas nos relatos das personagens principais, Carla e Riene. A viagem para o município de Corumbá não aconteceu, porque encontramos em Campo Grande uma vítima de abuso infantil e ex-aliciadora que saiu dessa cidade e veio para a capital nos últimos anos, o que facilitou e agilizou nossa apuração e posterior entrevista.


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2- SUPORTES TEÓRICOS ADOTADOS

2.1- Tráfico Humano: Definição e Abrangência O termo “tráfico humano” ou “tráfico de pessoas” é definido no dicionário Houaiss (2004) como o comércio ou negociação ilegal de pessoas, sendo elas indivíduos atribuídos de singularidades e características próprias que se distinguem de outros seres, como por exemplo, os animais. Outro termo similar à palavra tráfico humano utilizado é o verbo “aliciar”, que significa “atrair e criar esperança, com promessas de prazer e aproveitamento da vida a alguém, se configurando como uma estratégia por vias de mentiras que viola os direitos básicos da pessoa” (HOUAISS, 2004). Segundo Alencar (2007), o tráfico de pessoas possui duas macro diferenciações: nacional e internacional. O tráfico nacional de pessoas ocorre quando um indivíduo é obrigado a sair de sua região, estado ou município para trabalhar ilegalmente em outra localidade dentro do país de origem, sem as condições necessárias de trabalho e vida. O tráfico internacional de pessoas se caracteriza quando um indivíduo é transferido para outra localidade fora de seu país, mesmo que de maneira legal e cumprindo as leis de migração de cada nação, de um país para outro, forçado ou enganado pela ação dos conhecidos como “aliciadores”: Esse deslocamento pode se dar de forma definitiva, quando o migrante não tem a intenção de retornar ao seu local de origem, ou de forma provisória, quando o migrante pretende retornar, existindo prazo certo ou não. Pode se realizar ainda de forma legal, observando a legislação migratória do país de acolhimento, ou de forma ilegal, quando há a inobservância dessas leis. (ALENCAR, 2007, p. 44)

Para Piovesan e Kamimura (2013), em casos de tráfico humano e suas vertentes, como o trabalho escravo e exploração sexual, a relevância do consentimento da vítima quando traficada é nula e não absolve a prática do crime, porque somente um aspecto como a privação da liberdade decorrente de uma situação de vulnerabilidade já configura o tráfico humano. Ainda de acordo com as autoras, “o termo ‘pessoa traficada’ ou ‘vítima de tráfico’ serve para qualificar as vítimas de tráfico de pessoas nos termos do art. 3º do Protocolo relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças” (PIOVESAN E KAMIMURA, 2013, p. 245).


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Piovesan e Kamimura (2013) também afirmam que o tráfico de pessoas se constitui como uma violação aos direitos humanos e a problemática está justamente no ato de limitar e explorar a condição humana de uma pessoa:

Ao longo da história, as mais graves violações aos direitos humanos tiveram como fundamento a dicotomia do “eu versus o outro”, em que a diversidade era captada como elemento para aniquilar direitos. Vale dizer, a diferença era visibilizada para conceber o “outro” como um ser menor em dignidade e direitos, ou, em situações limites, um ser esvaziado mesmo de qualquer dignidade, um ser descartável, um ser supérfluo, objeto de compra e venda (como na escravidão) ou de campos de extermínio (como no nazismo). Nessa direção, merecem destaque as violações da escravidão, do nazismo, do sexismo, do racismo. (PIOVESAN E KAMIMURA, 2013, p. 109)

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as mulheres representam 99% das vítimas do trabalho forçado na indústria comercial do sexo. Em 2017, a OIT divulgou “Estadísticas sobre el trabajo forzoso, las formas modernas de esclavitud y la trata de seres humanos” que mostra que existem mais mulheres (71%) do que homens (29%) na escravidão moderna e que 99% das são para exploração sexual forçada. A pesquisa ainda mostra que uma em cada quatro vítimas da escravidão moderna são crianças e que 25% são aliciadas para exploração sexual forçada. No ano de 2016, 4,8 milhões de pessoas foram vítimas de exploração sexual. Em média, elas são mantidas por 23,4 meses nessa situação antes de fugirem ou serem libertadas. A grande maioria, 99,4%, são mulheres e meninas. As crianças representam mais de 20% das vítimas. O Ministério da Justiça lançou no Brasil em 2013 a primeira edição da cartilha “Tráfico de Pessoas: uma abordagem para os direitos humanos”, onde é definido o Tráfico de Seres Humanos (TSH) como um tipo de agressão, categorizado como crime aos direitos humanos, que utiliza de instrumentos de privação da liberdade, afronta à dignidade pessoal, violência física e psicológica, como, por exemplo, ameaças e dependência financeira (dívida), que obriga a vítima a realizar um trabalho escravo para o lucro do aliciador e/ou quadrilha sem um prazo determinado.

Trata-se de atividade criminosa complexa, transnacional, de baixos riscos e altos lucros, que se manifesta de maneiras diferentes em


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diversos pontos do planeta, vitimizando milhões de pessoas em todo o mundo de forma bárbara e profunda, de modo a envergonhar a consciência humana. As práticas associadas ao tráfico de pessoas — como o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares, à servidão por dívida, a exploração sexual e a prostituição forçada, a remoção de órgãos, o casamento servil, a adoção ilegal, entre outras —, por constituírem graves violações aos direitos humanos, devem ser tratadas como crimes lesa-humanidade. (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2013, p.16)

A realidade das pessoas traficadas no Brasil, que vivem majoritariamente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, é de vulnerabilidade e dificuldades financeiras. Segundo a cartilha da Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2007, p.16) do Ministério da Justiça, “a estimativa é de que dois terços dos trabalhadores brasileiros encontrados em situação de trabalho escravo no Pará, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso sejam oriundos do Nordeste”. Em 2017, o jornal Agência Brasil, da Empresa Brasil de Comunicação S/A (EBC), publicou um artigo sobre um relatório privado do Ministério da Saúde apresentado no 1º Seminário Internacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes. Na apresentação do relatório foram informados dados que confirmam que, do período de 2014 a 2016, o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e trabalho escravo no Brasil foi maior com relação às mulheres.

Do total de 488 casos identificados pelo Ligue 180 para exploração sexual, 317 eram mulheres e cinco homens. Para trabalho escravo, foram recebidas denúncias de 257 casos no período de 2014 a 2016, com predominância também de mulheres, 123 contra 52 homens. Em termos de idade, a faixa etária compreendida entre 10 e 29 anos concentra cerca de 50% do total, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Pela SDH, crianças e adolescentes são vítimas de tráfico de pessoas, especialmente nas faixas etárias de 0 a 17 anos. Entre 2014 e 2016, elas somaram 216 traficados do total de 413. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2016 apud GANDRA, 2017, on-line)

Dados do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ/MS) apontaram em 2013 que o estado estava em terceiro lugar no ranking nacional com o maior número de vítimas de tráfico humano, que em sua maioria são indígenas que vivem nas regiões fronteiriças com a Bolívia e Paraguai. Porém, só no ano de 2017 o Ministério Público de Mato Grosso do Sul lançou uma campanha de enfrentamento ao tráfico de pessoas.


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No livro “Tráfico de Pessoas – Quando vale o ser humano na balança comercial?”, as autoras Siqueira e Quinteiro (2013) tratam o tráfico de pessoas como uma violação aos direitos humanos. Segundo Siqueira e Quinteiro, “o tráfico de pessoas rouba dela (vítima) sua condição de ser racional, pensante, humano [...] A pessoa traficada é uma cifra, um dado comercial. Ontologicamente, a pessoa traficada vira “coisa”, “peça”, torna-se mercadoria de consumo e de venda.” (SIQUEIRA, QUINTEIRO, 2013, p. 24). Os dados referentes à ocorrência de tráfico no Brasil são escassos e pouco estudados. Piovesan e Kamimura (2017) citam que a causa tem fundamentação na carência de estudos especializados sobre o tema, como também na dificuldade e deficiência da coleta e produção de informações, dados e estatísticos relacionados ao tráfico de pessoas no país. Na monografia “Prostituição vs. Exploração sexual: Uma análise crítica sobre o consentimento da vítima no crime de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual”, Monique Marques explica que a pessoa traficada possui uma característica que envolve a vulnerabilidade do ser humano, como a pobreza e o ensino básico precário: O sujeito traficado, na maioria dos casos relatados em pesquisas e relatórios, é uma pessoa vulnerável, detentora de certas características, como baixos níveis de escolaridade, renda, geralmente são mulheres, crianças, travestis ou transexuais, que na aspiração por uma vida melhor acaba por ser facilmente manipulado pelos aliciadores. (MARQUES, 2014, p. 12)

Para Marques (2014) há uma mercantilização do ser humano quando se trata do tráfico de pessoas. A vítima traficada serve para a prestação de serviços sexuais, ou seja, “perde sua condição de pessoa humana, deixa de ser senhora de si e torna-se artigo de consumo, produto a ser fornecido por terceiro para a prostituição” (MARQUES, 2014, p. 13) Em relação aos lucros, Marques (2014) explica que as estatísticas e informações sobre o quanto economicamente o tráfico produz são, na maioria das vezes, dissonantes e complexas entre si. Em muitos casos os valores são divulgados ou com referência ao preço do serviço sexual de um território, ou pelo preço pela intensidade do trabalho, que pode variar entre outros fatores. Por exemplo, para Marques a demanda de um determinado país depende em pequena ou grande escala


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pela compra em menor ou maior número de escravos e/ou escravas sexuais explorados.

2.2 - Prostituição: Profissão e Exploração no Tráfico A origem da palavra prostituição vem do Latim PROSTITUERE, também “ficar à frente de”, de PRO-, “à frente”, mais STITUERE, colocar, instalar. Para o autor Nucci (2014), a prostituição direta é definida por aquela que “(...) estabelece-se pela relação sexual mantida entre a pessoa que comercializa o corpo, para a prática de qualquer ato sexual, com outra, que lhe paga um determinado valor, em dinheiro, antes ou após o contato sexual” (NUCCI, 2014, p. 67-68). No Brasil, o Ministério do Trabalho e Emprego determinou por meio da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) com o código 5198-05, que a prostituição é uma atividade regulamentada desde 2002. Na CBO consta que, antes de exercer o trabalho, as profissionais do sexo precisam participar de oficinas sobre sexo seguro e o acesso à profissão é restrito aos maiores de dezoito anos. A Lei nº 12.015 de 7 de agosto de 2009 alterou o Código Penal Brasileiro no que se refere aos crimes sexuais. De acordo com o Título V “Do Lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual”, a lei discorre sobre como ocorre o tráfico humano e a pena para quem realiza o crime no Brasil:

Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1o Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.” “Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente. (CÓDIGO PENAL, 2009)

Já o termo exploração sexual é referente às práticas sexuais nas quais um indivíduo lucra a partir dos serviços de outra pessoa, e pode ocorrer de quatro maneiras na sociedade: em redes de tráfico de pessoas, de prostituição, pornografia e turismo sexual. Para Nucci (2010) a exploração sexual deve ser caracterizada como forma de retirada de vantagem em relação a alguém, valendo-se de fraude, posição


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de superioridade ou qualquer outra forma de opressão sexual, não se confunde com qualquer forma de violência sexual ou com a mera satisfação sexual. Segundo o Código Penal Brasileiro, o artigo 231 incide no tipo de tráfico internacional de pessoas quem promove ou facilita a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro. Por outro lado, incide no tipo de tráfico interno de pessoas quem promove ou facilita o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual. É comum que a população não reconheça a diferença entre prostituição como profissão e a prostituição explorada no tráfico humano no Brasil. De acordo com Rodrigues (2012), o consentimento da vítima de tráfico gera muitas discussões com relação à anulação ou não do crime em questão no território brasileiro. A autora explica que a legislação brasileira ainda não foi alterada de acordo com o documento internacional que discute o tráfico de pessoas, conhecido como Protocolo de Palermo, que exclui a denúncia de crime de tráfico quando o adulto tido como “vítima” consentiu com a situação de prostituição: O legislador brasileiro ignora o consentimento da pessoa maior e capaz que resolve prostituir-se no exterior contando com o auxílio de outrem. A razão estaria no fato de o consentimento não ser válido na seara penal, de o Estado brasileiro ser paternalista, de o País ainda não ter superado o ranço moralista na escolha do bem jurídico ou de todas as vítimas de tráfico [...] O argumento principal para a adoção dessa postura é que a análise do consentimento pelos tribunais poderia gerar impunidade, pois no caso de realmente existir o crime a discussão se concentraria na conduta da vítima, sob o argumento de que viajou sabendo que exerceria a prostituição, ou que já a exercia no Brasil. (RODRIGUES, 2012, p. 159)

Rodrigues (2012) ainda ressalta que o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual é um crime que um determinado indivíduo alicia a vítima, tirando-a do seu local de origem. A conceituação da autora Marques (2014) contextualiza a afirmação acima e explica que o tráfico é “onde o indivíduo é aliciado, recrutado e transportado mediante grave ameaça, violência, coação, uso da condição de vulnerabilidade, abuso ou fraude para a finalidade da exploração sexual” (MARQUES, 2014, p. 74).


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O tráfico de pessoas possui sua engrenagem com base na violência humana. De acordo com o Fundo das Nações Unidas Para a Infância, em inglês “United Nations Children's Fund” (UNICEF) são catalogados oito tipos de violência, que são a tortura, violência psicológica, sexual, física, negligência ou abandono, discriminação, trabalho infantil, tráfico de crianças, adolescentes e adultos e trabalho escravo. O próprio ato criminoso de traficar um ser humano, limitando sua liberdade física em diversos aspectos, se constitui como abuso e violência ao indivíduo.

2.3- Narrativa Longform: Definições e Usos A narrativa longform é um produto derivado do ciberjornalismo, modo de produzir notícia, que se utiliza do cibermeio para informar o público e que possui características próprias e outros aspectos oriundos do jornalismo tradicional. No livro “Webjornalism: 7 características que marcam a diferença”, Canavilhas (2014) estuda e compila sete características do jornalismo no cibermeio, que são elas: interatividade, instantaneidade,

hipertextualização,

multimidialidade,

ubiquidade,

memória

e

personalização. Ao analisar o tema “Aliciamento e Tráfico de Pessoas Para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul” pesquisamos as possibilidades de abordarmos o assunto de maneira complexa e aprofundada. A escolha da narrativa longform como produto para o trabalho de conclusão de curso se dá devido à facilidade de acesso do público, já que o material pode ser disponibilizado na internet em plataforma própria, sites jornalísticos, revistas online, periódicos acadêmicos, entre outros, além de sua leitura possuir dois formatos: desktop e mobile. O modelo também permite a utilização de diferentes formatos jornalísticos como fotos, vídeos, áudios, infográficos e elementos gráficos como animações. Segundo Longhi e Winques (2013) no artigo “O lugar do longform no jornalismo online. Qualidade versus quantidade e algumas considerações sobre o consumo”, o termo do jornalismo online tem uma definição mais apurada, em que o leitor vai a um nível mais aprofundado da notícia relatada. De acordo com os autores, o novo padrão jornalístico na internet permite que a produção de conteúdo e as narrativas retratadas venham acrescentadas de elementos multimídias, diferente de outros meios informativos como o impresso e o televisivo. No mesmo artigo os autores explicam que devido ao aumento do uso de dispositivos móveis, o novo formato disponibiliza maior facilidade na leitura das


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grandes reportagens e que “o uso do jornalismo longform no mercado brasileiro está seguindo o modelo da grande reportagem multimídia. Os exemplos mais notáveis são: Tudo sobre da Folha de São Paulo e o UOL TAB do portal de notícias UOL” (FISHER, 2013 apud LONGHI E WINQUES, 2013, p.9). Por esses motivos, de fácil acesso e maior suporte criativo na construção da grande reportagem, escolhemos esse tipo de formato jornalístico para o trabalho. Longhi e Winques (2015) ressaltam também que o jornalismo longform possui uma narrativa com dois padrões de leitura: o horizontal e o vertical. Contudo, afirmam que:

A dimensão narrativa verticalizada tem se destacado com maior frequência nas grandes reportagens multimídia e em portais específicos de longform. Em alguns casos, a GRM é também dividida em capítulos ou seções, que possibilitam aos usuários diferentes caminhos de leitura. (LONGHI; WINQUES, 2015, p.13)

De acordo com os autores, no ciberjornalismo, os profissionais podem produzir um conteúdo mais imersivo por meios de recursos audiovisuais como fotos, sons, vídeos, infográficos, hiperlinks e outros elementos que compõem e aproximam o leitor da notícia. Segundo Longhi e Winques, o ciberjornalismo resultou da convergência dos três grandes meios de comunicação: televisão, rádio e jornal impresso. Neste trabalho, a hipertextualização, a multimidialidade e a interatividade são as principais características exploradas. A hipertextualidade é o modelo de organização de uma informação em blocos de texto que são hiperligados. Para Canavilhas (2014), o hipertexto é “um conjunto de palavras ou frases organizadas segundo um conjunto de regras preestabelecidas, o texto transforma-se numa tessitura informativa formada por um conjunto de blocos informativos ligados através de hiperligações (links), ou seja, num hipertexto” (CANAVILHAS, 2014, p. 4). Na hipertextualidade, Canavilhas (2014) defende o uso de linguagens próprias para o meio e propõe o modelo da pirâmide deitada, que permite que a informação seja organizada por níveis de informação ligados por hiperligações internas. O formato permitiria ao leitor “seguir diferentes percursos de leitura que respondam ao seu interesse particular. O modelo mantém uma hierarquização de importância, oferecendo simultaneamente um relativo grau de liberdade ao leitor” (CANAVILHAS, 2014, p. 13).


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A multimidialidade é a combinação de, pelo menos, dois tipos de linguagem em apenas uma mensagem, podendo expressar um conteúdo a partir de fotografias, vídeos, áudios e infográficos. Contudo, Salaverría (2014) afirma que é necessário que os elementos multimídia estejam interligados, de modo que a informação seja atrativa e inteligível. Outro autor que compartilha dessa ideia é Yaros (2009): Os “ingredientes multimédia” devem estar interligados no sentido de evitar a competição entre eles e de, por outro lado, oferecer um resultado positivo e coordenado. Porém, esta é uma tarefa bem mais complicada do que aquilo que parece (Yaros, 2009). (YAROS, 2009 apud CANAVILHAS, 2014, p. 40)

A interatividade é uma das características mais importantes da comunicação na web, é através dela que vamos saber a reação e opinião dos leitores. Para Ritter e Winques (2013) a interatividade é entendida como a capacidade gradual que um meio de comunicação tem para dar maior poder aos utilizadores tanto na seleção de conteúdos “interatividade seletiva” como em possibilidades de expressão e comunicação “interatividade comunicativa” (ROST, 2006 apud RITTER E WINQUES, 2013, p. 55). A chamada interatividade comunicativa é caracterizada pelas inúmeras possibilidades de comunicação que o leitor tem com os conteúdos. É por meio dessas opções que o público muitas vezes confronta, apoia ou dialoga com o texto. Em nossa grande reportagem, fizemos com o que o leitor se identifique, conheça e se aprofunde no tema, de forma que por meio de comentários e compartilhamento do longform, ele expresse suas opiniões e divulgue nosso trabalho. Com relação à narrativa jornalística, a longform foi escrita em gênero interpretativo no primeiro capítulo e em gênero informativo no segundo e terceiro capítulos. Entendemos que, mesmo com dados escassos sobre o tráfico e aliciamento de pessoas em Mato Grosso do Sul, o intuito central é informar com base nas entrevistas com especialistas que a realidade dos casos existe e necessita de debate na sociedade local, priorizados pela escrita interpretativa. Marques de Melo (2015) enfatiza que o formato jornalístico possui um aspecto importante na narrativa voltado para a vigilância social e afirma que:

Formato jornalístico, em decorrência, é o feitio de construção da informação transmitida pela Mídia, por meio do qual a mensagem da


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atualidade preenche funções sociais legitimadas pela conjuntura histórica em cada sociedade nacional. Essa construção se dá em comum acordo com as normatizações que estabelecem parâmetros estruturais para cada forma, os quais incluem aspectos textuais e, também, procedimentos e particularidades relacionados ao modus operandi de cada unidade. (MARQUES DE MELO, 2015, p. 12)

A redação interpretativa descritiva foi à base dos relatos escritos no produto final. A narrativa interpretativa se constitui de um conteúdo voltado para o esclarecimento e a riqueza de detalhes, informações e dados do fato jornalístico. De acordo com Longhi (2015), autores como Núñez Ladevéze (1995, apud LARRONDO URETA, s/d) consideram a interpretação em formato reportagem como um gênero complementar ao ato de informar:

O autor entende que os gêneros interpretativos complementam a informação de atualidade, e por isso os considera gêneros complementares ou híbridos. Esses modelos são igualmente informativos – seu objetivo é prover informação, mas se diferenciam dos gêneros informativos propriamente ditos pela sua forma de exposição, que é menos rígida. Tratam-se de relatos informativos que se distinguem da notícia de atualidade porque sua função de informar fica subordinada a uma forma de exposição na qual se mesclam elementos narrativos, literários e interpretativos. (LONGHI, 2015, p. 3)

Em nossa grande reportagem utilizamos as características citadas e explicadas na tentativa de que o leitor se encontre em profundidade na narrativa dos relatos dos personagens, nas descrições das histórias, no debate dos especialistas e nos dados apresentados. O intuito da longform foi informar e proporcionar um papel educativo e de esclarecer uma realidade vivida, mas oculta aos olhos de grande parte da população.


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3- CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo principal do projeto experimental “Dívida de Liberdade: Narrativa Longform Sobre Aliciamento e Tráfico de Pessoas Para o Mercado Sexual em Mato Grosso do Sul” foi trazer à tona e reportar os casos de vítimas que tiveram seus direitos humanos violados, bem como mostrar como o crime de tráfico de pessoas ocorre e é tratado por agentes do poder público e ONGs que lutam para acolher e auxiliar pessoas que sofreram com este crime ou se encontram em situações de vulnerabilidade. Sobretudo, pautar este tema para que a sociedade tenha conhecimento dessa realidade que é ocultada no estado. Diante das pesquisas e entrevistas realizadas, detectamos que há uma inconsistência de dados sobre o crime por parte tanto das polícias Militar, Civil e Federal, como do Governo Estadual. A falta de um órgão notificador de casos no estado foi uma das causas percebidas ao longo dos relatos dos especialistas no tema, tendo em vista que um órgão fiscalizador contribuiria para a divulgação de dados mais próximos da realidade e atualizados possíveis. Outro apontamento é a escassez de campanhas de combate contra o tráfico de pessoas em âmbito regional que possuem, em sua maioria, o objetivo de conscientizar a sociedade. As raras mobilizações e a falta de iniciativa por parte do governo confirmam a falta de conhecimento que a população local tem com relação ao tráfico humano no estado. O mercado sexual ilegal suprido pelo tráfico humano para fins de exploração sexual existe e é lucrativo em Mato Grosso do Sul, mas permanece oculto na atualidade, principalmente na imprensa local. Pela dificuldade em fazer com que vítimas traficadas falassem sobre o assunto, continuaremos a trabalhar com a grande reportagem para captarmos situações recentes que colaborem para a realidade atual. Desejamos que essas novas histórias sejam reconhecidas pela população sul-mato-grossense e que especialistas, o governo estadual e as prefeituras das cidades unam forças e ideias para a criação de novos métodos, campanhas e projetos de enfrentamento ao tráfico humano no estado. A relevância dos resultados obtidos neste trabalho contribui para que profissionais da área de comunicação e que a imprensa regional venham a criar interesse em trabalhar com o tema de tráfico humano nos jornais, revistas, sites e programas televisivos. Se os profissionais da imprensa do estado se proporem a realizar matérias sobre o assunto, consequentemente a sociedade terá mais acesso ao


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conhecimento e uma base de informações para futuros debates importantes para o real enfrentamento do crime de tráfico humano e de exploração sexual, como também apoio na devida proteção e acolhimento das vítimas encontradas em território sul-matogrossense. Acreditamos também que o tema é muito extenso e que a função primordial da Universidade é gerar e construir conhecimento. Por isso, sugerimos que a partir deste trabalho outros acadêmicos conheçam e pautem o tema, que rodas de conversa sejam realizadas com maior frequência para debater o tráfico humano e a exploração sexual no meio universitário, que professores tragam o tema à tona que é pouco discutido em sala de aula e que o poder público esteja presente nessa construção. Do início até o fim deste trabalho de conclusão de curso obtivemos grande e significante aprendizado com relação ao tema principal e na vivência como futuras jornalistas. Como acadêmicas, percebemos que a realidade deste crime foi pouco ou quase nada debatida durante a graduação. O desafio de fugir de pautas comuns e relatar pessoas traficadas e que aliciaram outros seres humanos nos trouxe uma visão de mundo mais ampla, pautada no faro jornalístico e, principalmente, na sensibilidade de lidar com a complexidade das histórias encontradas e retratadas até aqui. O resultado alcançado nos proporcionou não apenas a criação de uma grande reportagem para internet, mas uma experiência universitária inesquecível e uma referência para nossos próximos passos como profissionais de comunicação.


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4- REFERÊNCIAS ALENCAR, Emanuela Cardoso Onofre de. Tráfico de seres humanos no Brasil: aspectos sociojurídicos – o caso do Ceará. In: Programa de Pós-graduação em Direito Constitucional. Universidade de Fortaleza. Fortaleza, 2007. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cp037035.PDF>. Acesso em: 25 fev. 2018. ALLIANCE 8.7. 2017 Global Estimates. Disponível em: <http://www.alliance87.org/2017ge/modernslavery#!section=0>. Acesso em: 06 mar. 2018. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p. BRASIL. Decreto nº 5.948, de 26 de out. de 2006. Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília, DF, 2006. BRASIL. Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009. Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoa para fim de Prostituição ou outra forma de Exploração Sexual. Brasília, DF, 2009. CANAVILHAS, João. Hipertextualidade: novas arquiteturas noticiosas. In: CANAVILHAS, João. (org). Webjornalismo: 7 caraterísticas que marcam a diferença. Covilhã, Pt: Livros Labcom, 2014, p. 1-24. Disponível em: <http://www.livroslabcom.ubi.pt/book/12>. Acesso em: 28 fev. 2018. COIMBRA, Oswaldo. O texto da reportagem impressa: um curso sobre sua estrutura. São Paulo, SP. 1993. 183 p. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Tráfico de pessoas. Disponível em: < http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/assuntos-fundiarios-trabalho-escravo-etrafico-de-pessoas/trafico-de-pessoas>. Acesso em: 18 fev. 2018. CORREIO DO ESTADO. Tráfico de Pessoas na Fronteira de Mato Grosso do Sul é tema de livro: obra esclarece que as migrações podem ser voluntárias ou forçadas. Disponível em: <https://www.correiodoestado.com.br/cidades/trafico-depessoas-na-fronteira-de-mato-grosso-do-sul-e-tema-de/259912/>. Acesso em: 25 fev. 2018. ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIME. Global report on trafficking in persons. Disponível em: <https://http://www.unodc.org/documents/data-andanalysis/glotip/2016_Global_Report_on_Trafficking_in_Persons.pdf>. Acesso em: 03 mar. 2018. FLORENTINO, Bruno Ricardo Bérgamo. As possíveis consequências do abuso sexual praticado contra crianças e adolescentes. Fractal, Rev. Psicol. 2015; 27(2):139-44. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S198402922015000200139&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 05 fev. 2018.


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APÊNDICE A – Roteiro de perguntas para o delegado Fernando Rocha, de Campo Grande

1-De acordo com a lei, o que configura e caracteriza crime de Tráfico de Seres Humanos?

2-De acordo com a lei, a exploração sexual se enquadra em crime de Tráfico de Seres Humanos?

3-Qual a pena para quem comete esse crime?

4-Quais são os dados de denúncia de Tráfico de Seres Humano?

5-Quais são os dados de denúncia de Tráfico de Seres Humano para fins de exploração sexual?

6-Qual foi o último caso de Tráfico de Seres Humanos no estado de Mato Grosso do Sul?

7-Qual foi o último caso de Tráfico de Seres Humanos no estado de Mato Grosso do Sul para fins de exploração sexual?

8-Quais são os números de casos e operações realizadas no estado de Mato Grosso do Sul?

9-Quantos casos já foram reconhecidos como Tráfico de Seres Humanos para fins de exploração sexual nas regiões fronteiriças de Mato Grosso do Sul?

10-Quais sãos os critérios da Polícia Federal para uma investigação?

11-Há casos de recrutamento das vítimas para serem traficadas? Existem dados que comprovem que no estado há um percentual de lucro significativo com relação ao crime de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual?


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13-Como a Polícia Federal trabalha para lutar contra esse crime?

14-De que maneira os países que fazem fronteira com o Brasil, como a Bolívia e o Paraguai, colaboram para os casos de tráfico? Quais são as políticas a respeito entre os países?


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APÊNDICE B: Roteiro de perguntas para o delegado Danilo Magno, de Corumbá

1-De acordo com a lei, o que configura e caracteriza crime de Tráfico de Seres Humanos?

2-De acordo com a lei, a exploração sexual se enquadra em crime de Tráfico de Seres Humanos?

3-Qual a pena para quem comete esse crime?

4-Quais são os dados de denúncia de Tráfico de Seres Humano?

5-Quais são os dados de denúncia de Tráfico de Seres Humano para fins de exploração sexual?

6-Qual foi o último caso de Tráfico de Seres Humanos no estado de Mato Grosso do Sul?

7-Qual foi o último caso de Tráfico de Seres Humanos no estado de Mato Grosso do Sul para fins de exploração sexual?

8-Quais são os números de casos e operações realizadas no estado de Mato Grosso do Sul?

9-Quantos casos já foram reconhecidos como Tráfico de Seres Humanos para fins de exploração sexual nas regiões fronteiriças de Mato Grosso do Sul?

10-Quais sãos os critérios da Polícia Federal para uma investigação?

11-Há casos de recrutamento das vítimas para serem traficadas?


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12-Existem dados que comprovem que no estado há um percentual de lucro significativo com relação ao crime de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual?

13-Como a Polícia Federal trabalha para lutar contra esse crime?

14-De que maneira a Bolívia colabora para os casos de tráfico? Quais são as políticas a respeito entre os países?

15-Acredita que existam falhas no reconhecimento desses crimes?


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APÊNDICE C: Roteiro de perguntas para Viviane Vaz, do Projeto Nova, de Campo Grande

1-Seu nome completo, idade, formação e profissão atualmente;

2-Quem idealizou e quando iniciou o projeto Nova? Qual(is) era(m) o(s) objetivo(s) do projeto inicialmente?

3-Quais atividades ou serviços vocês disponibilizam para as pessoas atendidas? E qual o perfil dessas pessoas?

4-Em âmbito social, vocês trabalham com que tipo de situações nos atendimentos?

5-Para você Vivis qual a diferença entre prostituição e exploração sexual?

6-Como você define a prostituição aqui da Capital? Quais as características do mercado sexual local?

7-A equipe do Nova conta com quantos profissionais? E suas áreas de atuação?

8-Sobre o tráfico humano, qual sua experiência com o assunto? Existe aqui no estado casos que você tem conhecimento?

9-Para você, a população entende que o tráfico humano e aliciamento de pessoas acontecem em Mato Grosso do Sul com certa relevância?

10-Em sua opinião a mídia dá espaço para discutir e falar mais sobre o tema ou ainda está muito longe do ideal? E sobre a exploração e a prostituição?


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APÊNDICE D: Roteiro de perguntas para Fonte A (explorada sexualmente e exprostituta da região de Corumbá e Porto Murtinho)

1-Nome, idade, onde nasceu e profissão;

2-Conte mais sobre sua história...

3-Na época você tinha quantos anos? Trabalhava, estudava...?

4-Com relação à prostituição, qual era a rotina e desafios do trabalho?

5-Existe uma organização no mercado sexual, além do que conhecemos: prostitutas e cafetões? Poderia explicar melhor?

6-Quando você se viu como vítima de tráfico de pessoas?

7-Quem organizava essa parte: aliciadores, cafetões, uma quadrilha especializada...?

8-E como foi viver sob o comando dessas pessoas?

9-Eles utilizavam de ameaças e outras ameaças e agressões para manipular você e outras vítimas?

10-Qual ou quais foram os momentos mais difíceis vívidos por você quando estava sob o domínio dos criminosos?

11-E como se libertou dessa situação? Você chegou a comunicar alguém, pedir ajuda para a polícia?

12-Atualmente, como é viver após esse episódio? Para você, quais as consequências que está tendo de enfrentar após ser traficada e explorada?

13-Você participa de algum grupo ou ONG que debate ou presta ajuda para vítimas de tráfico humano e exploração sexual?


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14-Existem meios para alertar outras vítimas que não compreendem que estão sendo exploradas?

15-As pessoas que viviam com você enquanto era prostituta achavam que estavam sendo enganadas?

16-Por fim, você aceita que tiremos fotos e façamos vídeos de forma que não será identificada?


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APÊNDICE E – Roteiro de perguntas para Fonte B (ex-traficante e ex-aliciadora de Campo Grande)

1-Nome, idade, onde nasceu e profissão;

2-Conte mais sobre sua história...

3-Na época em foi abusada sexualmente você tinha quantos anos?

4-Com relação à prostituição, qual era o seu contato com o mercado sexual? Você prestava que tipos de serviços?

5-Existe uma organização no mercado sexual, além do que conhecemos: prostitutas e cafetões? Poderia explicar melhor?

6-Quando você se viu como aliciadora de pessoas para à prostituição?

7-Quem organizava essa parte de aliciar e qual era o lucro em média obtido por pessoa?

8-Você informou que não trabalhou muito tempo nessa parte e que não utilizava de ameaças, mas a cafetão envolvida, que tipos de ameaças e agressões usava para manipular as vítimas?

9-E como se libertou desse mundo? Você pagou por todos esses crimes, além do tráfico de drogas?

10-Atualmente, como é viver após esse episódio? Para você, quais as consequências que está tendo de enfrentar após esse período?

11-Você comentou que atualmente organiza um projeto que ajuda crianças vulneráveis? Como funciona o projeto?


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12-Por fim, você aceita que tiremos fotos e façamos vídeos de forma que não será identificada?


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APÊNDICE F: Roteiro de perguntas para a assistente social e pesquisadora Estela Scandola, de Campo Grande

1-Nome, idade, formação e profissão;

2-Estela, qual e como foi o trabalho realizado por você enquanto estava na Secretaria Municipal de Saúde de Porto Murtinho?

3-Em nosso processo de pesquisa, recebemos informações que Porto Murtinho e Corumbá são os municípios que, de certa maneira, são mais conhecidos por casos de exploração sexual e tráfico de pessoas na fronteira. Essa é uma informação consistente?

4-Nas leituras que fizemos até então um ponto muito questionado entre os autores é o consentimento da vítima. Alguns seguem o Código Penal Brasileiro que diz que o consentimento da vítima é irrelevante no reconhecimento do crime de tráfico e/ou exploração sexual, enquanto outros seguem o Protocolo de Palermo, adicional à Convenção das Nações Unidades, onde o consentimento válido anula o crime. Afinal, qual a real questão que envolve essa discussão?

5-Para você, as leis e lacunas deixadas por nossa legislação, principalmente em âmbito estadual, dificultam o conhecimento da população regional sobre o crime de tráfico humano?

6-Sobre a prostituição autônoma como profissão e a forçada como exploração, quais os pontos relevantes ou não para diagnosticar o crime de exploração sexual por vias de tráfico humano?

7-Com relação aos dados obtidos aqui no estado, você possui pesquisas e informações atualizadas, como documentos, arquivos, livros que possam vir a nos auxiliar no processo de construção do TCC?

8-Com relação às pesquisas feitas por você, quais foram os tópicos abordados e os apontamentos encontrados?


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9-Quais são os órgãos estaduais que lidam com os casos de tráfico humano e exploração sexual?

10-Existem comitês com representantes de ONGs, governo e sociedade civil para tratarem sobre o tema? Quais são eles e quais pontos são mais debatidos?

11-Sobre o foco do nosso TCC: ainda estamos em dúvida se tratamos sobre o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual sem delimitação de gênero ou partimos para o foco das mulheres e crianças, sendo relatadas e aprofundadas no contexto de fronteira. Você tem alguma dica ou observação para nos passar?

12-Ainda sobre o TCC: sobre as leis do estado, algum trabalho que você tenha conhecimento estudou ou questionou as falhas e lacunas existentes quanto ao crime de tráfico? Pois, ao pesquisarmos, obtivemos poucas informações...

13-Nosso produto para o trabalho de conclusão de curso será uma grande reportagem longform (hipermídia) para internet que possui recursos como áudio, imagem, vídeo, animação, infográfico e outros que irão permear o texto escrito. Você tem alguma dica para nós de como devemos lidar com as vítimas ou personagens da reportagem?

14-Por fim, você nos indica alguma fonte que possa contribuir com informações sobre o tema?


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APÊNDICE G: Roteiro de perguntas para a Assistente Social e Coordenadora do Comitê de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Mato Grosso do Sul (CETRAP/MS), Luciana Cavalcante, de Campo Grande

1-Nome completo, idade, formação e profissão;

2-Quando foi criado o comitê de combate ao tráfico humano e de quem partiu a iniciativa?

3-Atualmente, quem faz parte do Comitê? E da diretoria?

4-Quais as organizações representantes da sociedade civil que participam das reuniões?

5-De quanto em quanto são feitas as reuniões?

6-Como são decididos os temas?

7-Qual o principal objetivo do Comitê? Discutir com a sociedade, promover conhecimento sobre os casos de tráfico no estado, etc.?

8-De que maneira o Comitê atua na prevenção ao crime de Tráfico Humano?

9-Qual foi a última campanha realizada?

10-Dados da Polícia Federal apontam que de 2005 até 2017 foram instaurados apenas cinco investigações de denuncias de Tráfico para fins de Exploração Sexual em Campo Grande. O Comitê acredita que há falha no reconhecimento dos crimes de Tráfico Humano?

11-Como o Comitê vê a atuação da Policia Federal nos crimes de Tráfico Humano?


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12-Sabemos que Mato Grosso Sul é um estado que faz fronteira com dois países, a Bolívia e o Paraguai. Como é visto o trabalho em conjunto desses países para o combate ao Tráfico Humano?

13-Como é realizado o acolhimento de vítimas de Tráfico Humano em Mato Grosso do Sul?


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APÊNDICE H – Roteiro de perguntas para o psicólogo e coordenador da Escola de Conselhos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Antônio Motti

1-Nome completo, idade, formação e profissão atualmente;

2-O que é e quando nasceu o Programa Escola de Conselhos?

3-Quais ações vocês realizam dentro do programa?

4-Sobre a questão do abuso infantil, com base na sua formação, como se caracteriza essa violação? E quais as formas de abuso infantil?

5-Dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP) este ano apontou Mato Grosso do Sul como o primeiro no ranking nacional com mais casos notificados de estupros de crianças e adolescentes. Que questões você pode citar e comentar que cooperam para essa realidade no estado?

6-A pedofilia para a psicologia é uma doença? Quais as principais características de um pedófilo?

7-Todo estuprador é um pedófilo?

8-Nosso TCC envolve com profundidade o relato de duas ex-aliciadoras de crianças e adolescentes para o Tráfico Humano e percebemos em suas histórias, o abuso sexual na infância por pessoas próximas e familiares. Na sua opinião, qual a ligação entre o abuso infantil e a exploração e tráfico de crianças para fins sexuais?

9-Entendemos que a criança violada sexualmente adquire alguns traumas em decorrência dos abusos sofridos. No caso das personagens do TCC, o que chama atenção é a naturalidade com que lidaram com a violência sexual e depois se tornaram aliciadoras, levando outras crianças a passarem pelo mesmo. O que você pode comentar sobre a questão da naturalidade nessa situação? Seria uma consequência inconsciente dos abusos na infância?


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10-Existem estudos que discorrem sobre os dois assuntos: tráfico humano e o abuso infantil?

11-Atualmente em Campo Grande e Mato Grosso do Sul, o que vem sendo feito (programas, capacitação, palestras...) com o governo, organizações de combate do abuso infantil e defesa dos direitos das crianças e adolescentes, e a população para diminuir os casos de abuso infantil no estado?


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