Casa 140 - Relatos de meninos órfãos | Natália Oliveira

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL FACULDADE DE ARTES, LETRAS E COMUNICAÇÃO CURSO DE JORNALISMO

CASA 140 RELATOS DE MENINOS ÓRFÃOS

NATÁLIA OLIVEIRA

Campo Grande NOVEMBRO/ 2018


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CASA 140/ RELATOS DE MENINOS ÓRFÃOS

NATÁLIA OLIVEIRA

Relatório apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Projeto Experimental II do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Orientador: Prof. Dr Marcos Paulo da Silva



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SUMÁRIO Resumo

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Introdução

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1. Atividades desenvolvidas

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1.1 Execução

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1.2 Dificuldades encontradas

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1.3 Objetivos alcançados

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2. Suportes teóricos adotados

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Considerações finais

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Referências

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RESUMO: O trabalho constitui-se um livro reportagem, um dos formatos jornalísticos apresentados durante o Curso. No produto, estão presentes reportagens construídos a partir de experiências de imersão e da coleta de relatos de meninos em uma instituição de acolhimento municipal de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul. Além do registro dos relatos, valoriza-se as histórias, as vivências e as convivências na casa a partir de uma construção impressionista por parte da repórter. Fizeram-se necessárias várias visitas ao local para a construção da narrativa. Além das observações diretas, realizou-se entrevistas e conversas com os meninos da instituição, técnicos, cuidadores e funcionários ligados ao abrigo. O livro reportagem congrega, por conseguinte, informações e contribuições de diferentes perspectivas ligadas ao assunto: a criança e o adolescente, seus direitos e sua proteção.

PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo; Livro reportagem; Abandono Social infanto-juvenil; Casa de acolhimento. .


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INTRODUÇÃO

Durante a pesquisa exploratória e as primeiras experiências de imersão para o desenvolvimento do trabalho, constatou-se que o escopo original do livro reportagem apresentado no pré-projeto – a saber, “Abandono Social Infantil: livro reportagem sobre casas de acolhimento em Campo Grande” – deveria ser melhor recortado para os casos de abandono infanto-juvenil. A mudança se justificou pela observação de falta de abordagem para esta perspectiva e pela assustadora realidade vivida por jovens em abrigos. De acordo com dados do Conselho Nacional de Adoção (CNA), o número de pais cadastrados no Brasil chegou em 2018 a 44.824 mil. Entretanto, quando se estabelece a estratificação por idade, o número das famílias que aceitam adotar crianças com mais de dez anos diminui. O percentual cai drasticamente a partir dos 13 anos de idade. Com 14 anos, as chances são mais remotas. De acordo com o cadastro, apenas 111 pais aceitam filhos com esta idade em todo o território nacional. Entre as faixas etárias de 15 e 16 anos, apenas 85 e 63 pais, respectivamente, estão dispostos a receber adolescentes em todo o Brasil. Além disso, a preferência por meninas brancas e bebês, que não tenham tido contato com qualquer ambiente hostil, ou que os pais não sejam usuários de drogas contribui para o atual cenário de adoção no país. Nesse contexto, o livro tem como objetivo mostrar as histórias de adolescentes que vivem em situação de acolhimento na capital de Mato Grosso do Sul. A narrativa foi desenvolvida a partir de depoimentos e entrevistas com pessoas selecionadas para a composição dos personagens que ilustraram o livro. Optou-se também pela experiência de imersão em um dos abrigos localizados em Campo Grande. Buscou-se retratar, assim, a realidade do local, suas experiências, seus sonhos, objetivos e os aspectos psicológicos envoltos ao tema abandono infanto-juvenil. Para preservar as identidades dos jovens e da instituição – o que inclui seus funcionários –, foram utilizados nomes fictícios. A narrativa foi dividida em sete capítulos e seguem um fio condutor descritivo para ajudar na ambientação e na imersão do leitor no tema. Cada capítulo foi intitulado de acordo com observações, análises e pesquisas realizadas no desenvolvimento do projeto experimental. Nesse sentido, a liberdade de narrar e descrever os fatos e as cenas é o


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diferencial do livro reportagem, no estilo jornalismo literário, classificado por Edvaldo Pereira Lima (2004) numa perspectiva sistêmica como a intersecção entre o jornalismo e a literatura. Entende-se que o desenvolvimento de um projeto como este contribui para conceder visibilidade a um tema “invisível” na sociedade brasileira. A pesquisa exploratória mostra que pouco se fala com sensibilidade no país sobre abandono social infanto-juvenil. Falta empatia com a complexidade da questão nas matérias jornalísticas sobre o tema. Entende-se, portanto, ser necessário expandir o campo de pesquisa, trazer dados, depoimentos e conceder voz aos que vivem na realidade da negligência. Os números alarmantes, referentes a 2017, apresentados pelo Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e pelo Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA) apontam que 47 mil crianças e adolescentes vivem em casas de acolhimento em todo o pais. Segundo o Artigo 229 da Constituição Federal, é dever dos pais ou responsáveis legais criar, educar e “supervisionar”/acompanhar o crescimento dos filhos. Do mesmo modo, os filhos devem cuidar de seus pais durante a velhice, seja em âmbito afetivo ou físico. Quando há negligencia da lei, pode-se acionar a Justiça com a alegação de abandono material, intelectual ou afetivo. No Estado de Mato Grosso do Sul, segundo dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP) referentes ao primeiro semestre de 2015, foram notificados 109 casos de abandono afetivo de crianças, uma média de 20 casos por mês. Na capital sul-mato-grossense, dados da Vara da Infância e Juventude revelaram que, em 2016, de cada 100 crianças em processo de adoção, 15 foram devolvidas pelos pais adotivos aos abrigos. Este trabalho, por meio da identificação de histórias e da imersão no espaço social do abrigo, buscou explicar as razões pelas quais os pais ou guardiões legais abandonam os adolescentes. Vivenciar pequenos momentos no dia a dia dos garotos, seus “dramas”, frustações, medos, alegrias e perspectivas de futuro, enriqueceu a apuração que teve como principal objetivo narrar de maneira intimista histórias dos meninos da Casa 140 – nome adotado no livro para denominar a instituição com referência ao endereço do abrigo, porém com respeito à preservação da identificação dos envolvidos.


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A escolha do livro reportagem para a realização do projeto se deu por meio da empatia com a linguagem e procedimentos narrativos, bem como pela necessidade de mergulhar na complexidade do assunto abandono social infanto-juvenil. A liberdade narrativa e a construção da história por meio do livro reportagem possibilitou o espaço necessário para realização do projeto de acordo com os intensões da autora.


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1- ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

1.1 Execução: Durante o trabalho foram trilhados passos primordiais para a organização das ideias e o afunilamento do material. Primeiro, foi apresentado o tema proposto inicialmente: “Abandono social infantil”, com foco em crianças com até 12 anos e adolescentes “prestes” a completar 18 anos e sair do acolhimento. O objetivo era contar histórias de pessoas que passaram pelas instituições em diferentes fases, inclusive após deixarem o abrigo. Entretanto, depois das primeiras entrevistas, entendeu-se como pertinente a alteração no enfoque do abandono infantil para o infanto-juvenil uma vez que se notou a invisibilidade de adolescentes em pesquisas e abordagens jornalísticas locais. Em seguida, optou-se pela abordagem específica nas histórias de meninos de uma casa de acolhimento municipal da capital sul-mato-grossense. O objetivo foi reduzir a amplitude do campo de pesquisa e possibilitar um trabalho mais verticalizado nos aspectos da temática. Depois de definidos o foco da pesquisa, foram elaborados roteiros de perguntas para personagens que deram apoio teórico para a narrativa: assistentes sociais, psicólogas e partes vinculadas judicialmente às medidas protetivas para crianças e adolescentes. Cada roteiro foi direcionado especificamente para as funções desenvolvidas pelos mesmos, assim como para o impacto de seus trabalhos na vida dos adolescentes. Após alguns dias, foram feitas visitas à instituição de acolhimento escolhida. No local, desenvolveram-se entrevistas individuais, observações diretas e conversas informais. A escolha dos personagens foi em sua maioria aleatória, entre os quatro personagens que compõe o livro, apenas um deles foi intencional/premeditado. Os meninos chegaram até a repórter e demonstraram interesse na aproximação com a mesma. Logo após a coleta de dados adquirida nas entrevistas, foram realizadas a análise do material e a organização da estrutura temporal da narrativa, com a constituição do eixo


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narrativo e a escolha dos personagens e dos aspectos que seriam abordados. Os capítulos foram estruturados primeiramente para ambientar o leitor na estrutura da casa, assim como garantir a compreensão espacial das cenas sequenciais. Quatro histórias foram escolhidas para ilustrar as trajetórias de vida dos garotos que se encontram em situação de acolhimento. Cada um deles recebeu um capítulo exclusivo para melhor narrar sua chegada, vivência e – em alguns casos – saída da instituição. Por último, um apêndice foi integrado ao livro, explicando os procedimentos judiciais desde o recolhimento das crianças ou adolescentes do seio familiar, ou dos responsáveis legais, e a chegada aos abrigos. A narrativa apresenta estrutura diferenciada neste ponto, disponibilizando mais dados e explicando em uma linha cronológica os processos pelos quais as crianças e adolescentes passam até estarem “aptos” à adoção.

1.2 Dificuldades Encontradas Desde que o tema inicial “abandono social infantil” foi escolhido, com o enfoque em casas de acolhimento em Campo Grande, notou-se que seria uma temática complexa e de difícil acesso às crianças. O que não se esperava era o grande volume de procedimentos burocráticos, o que superou as expectativas iniciais. Depois da elaboração do projeto, logo entrou-se em contato com pessoas que poderiam fornecer orientações sobre as fontes e locais para obtenção de informações. Antes disso, solicitouse auxílio a membros do Programa Escola de Conselhos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, o que possibilitou o pontapé inicial dos trabalhos. A burocracia e a demora em conseguir chegar às fontes que realmente seriam uteis para o trabalho abreviou o tempo de execução da pesquisa, atrasando o processo em cerca de um mês. Constatou-se primeiro a dificuldade de acesso à juíza da 1º Vara da Infância, Adolescência e do Idoso de Campo Grande, o que dificultou a sequência da pesquisa, uma vez que era necessária sua autorização para desenvolver qualquer tipo


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de atividade dentro das casas de acolhimento. Como se tratava de adolescentes com medidas de proteção, o acesso aos locais é controlado. A entrevista com a juíza foi curta e objetiva, o que proporcionou o acesso aos documentos necessários e ao contato dos coordenadores dos abrigos. Depois de, enfim, conseguir a autorização da juíza, deparou-se com a demora em conseguir falar com outros membros do Fórum, responsáveis pela parte protetiva de crianças e adolescentes. Entretanto as medidas de proteção são necessárias e de extrema importância para realmente proteger crianças e adolescentes. Todas as precauções e dificuldades encontradas para chegar até os mesmos, se justificam pelas leis vigentes no ECA e exercidas pela rede de proteção da criança e adolescente. Após delimitar a instituição o qual o trabalho seria realizado, necessitou-se de muito esforço para as experiências de imersão no abrigo. A distância e o tempo também não ajudaram, devido a autora não ter o costume de se deslocar apara além da universidade. Em situações em que a acadêmica optou pelo transporte público urbano coletivo, a economia de tempo foi comprometida, o que não aconteceu com o transporte urbano privado. Entretanto, o alto custo para o deslocamento inviabilizava o recurso. Algumas vezes para a pontualidade e comprometimento da mesma com os entrevistados, o horário de almoço da autora foi improvisado. Comendo em períodos e locais distintos. Outras vezes foi necessária a ajuda de amigos para se deslocar até a unidade. Quanto à construção do livro, devido ao tempo perdido com fontes oficiais e de extrema importância para o projeto, o desenvolvimento do mesmo não correspondeu às expectativas neste quesito. O tempo pareceu ser insuficiente. Durante o pré-projeto, os alunos foram orientados a não desenvolverem atividades práticas enquanto a parte inicial, teórica, estivesse em andamento, o que inviabilizou a antecedência dos acadêmicos. A dificuldade de ser um trabalho desenvolvido individualmente também comprometeu o trabalho. Outro quesito que inviabilizou o tempo de construção da narrativa foi o estágio da acadêmica. Alguns momentos de instabilidade emocional e psicológica, afetada pelo momento, também contribuíram negativamente em partes do processo.


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1.3 Objetivos Alcançados Em grande maioria, os objetivos estipulados no pré-projeto foram alcançados, tais como: realização de pesquisas bibliográficas e documentais sobre o assunto e o formato “livro reportagem”; entrevistas com pessoas capacitadas para falar sobre o tema, “especialistas”; entrevistas com funcionários da casa de acolhimento, para entender melhor a realidade vivida pelos garotos. Tiveram sucesso também o os objetivos de descrever as histórias através de uma narrativa intimista, simples, mas que retratasse todas as sensações vividas no acolhimento, assim como todos os aspectos físicos e psicológicos do local; e desenvolver um livro reportagem dividido em capítulos, com ilustrações. Por motivos de mudança no enfoque do projeto, a autora não realizou como previsto no pré-projeto, o anexo de ilustrações de crianças abrigadas nas casas, bem como entrevistas com pais de crianças que já foram adotadas. Em suma. O trabalho cumpriu com a proposta de visibilizar adolescentes em casas de acolhimento na capital, Sul-mato-grossense através de uma narrativa sensível, que manteve a linguagem original dos personagens, suas gírias e manias verbais.


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2 SUPORTES TEÓRICOS ADOTADOS:

Abandono social infantil não é um problema recente, a situação se enraizou nas sociedades e se alastrou por todo o mundo. De acordo com Maria Luiza Marcílio (1998), – autora do livro História Social da Criança Abandonada, – desde a antiguidade o abandono de crianças é visto como uma “prática” legal, sendo aceita pelas sociedades, Estados e Igrejas. Historicamente, os maus cuidados e a indiferença para com as crianças, acarretavam em milhares de mortes desde Idade Média (Infanticídio). Na Europa, a morte de muitas crianças abandonadas às Rodas dos Expostos – instituições encarregadas de receber vítimas de abandono infantil da época (como igrejas) –, ou as Amas de leite – mulheres, fora a mãe da criança, que eram pagas para amamentar as mesmas –, chamaram a atenção para o assunto: Abandono Social. Após a criminalização da prática de abandono, as instituições foram “extintas” entre o século XVII e XVIII (MARCILIO, 1998) O processo no Brasil foi semelhante. Marcílio dedica a segunda parte de seu livro à sustentação de seus argumentos. No país também existiram as Rodas de Expostos, assim como as Amas de leite. Ocorreu também a necessidade de proteção à futura mão de obra escrava. O Brasil foi um dos primeiros países a criar e consolidar leis próprias para o assunto: criança e adolescente. Embora muitas dessas leis não sejam cumpridas em todo o país, tê-las no papel assegura parâmetros importantes. Segundo as autoras Keliane Lima da Silva, Camila Vitorino Alves, Lindair Ferreira Araújo (2012), no artigo “Abandono familiar infanto-juvenil um olhar sobre uma instituição do agreste pernambucano”, uma das características da contradição entre o amparo por lei e sua eficácia, é o grande número de casos de abandono no país. Com o abandono e casos de negligência relacionados a todos os tipos de violência, crianças e adolescentes são encaminhados para instituições conhecidas como casas de passagem ou abrigos, sendo obrigadas a conviver e aprender novos modos de socialização, se deparando com novas regras, rotinas e pessoas desconhecidas. Fazendo-se necessário para esses sujeitos


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uma nova compreensão dessa realidade que ele está assujeitado e muitas vezes essa nova adaptação forçada pode acarretar em disfunções nos mais diversos âmbitos da vida do sujeito, inclusive de identidade, de percepção de si mesmo. (SILVA, ALVES, ARAUJO 2012, p3)

Vários estudos sociais foram/são desenvolvidos para constatação dos fatores que levam ações e atitudes violentas com crianças e adolescentes, principalmente no âmbito de negligência. O abandono material acontece – de acordo com o Código Penal Brasileiro, Art. 244, capítulo III, “Dos crimes contra a assistência familiar” –, quando há menosprezo, sem justa causa, a subsistência do filho ou menor de 18 anos. Deixando de proporcionar recursos necessários, como pagar a pensão alimentícia, ou deixar de socorrê-lo em caso de enfermidade grave. O abandono intelectual ocorre quando os pais ou responsáveis legais deixam de garantir educação para o (os) filho (s) sem justificativa. Os pais têm a obrigação perante lei de assegurar a permanência da criança e adolescente na escola – dos 4 aos 15 anos –; quando os pais ou responsáveis permitem que um menor de idade frequente casas de jogos ou conviva com pessoas viciosas ou de “má- vida”, frequente espetáculo capaz de perverte-lo, resida ou trabalhe em casas de prostituição, etc. Abandono afetivo constitui-se na omissão de cuidados do genitor/ responsável em relação aos filhos quanto a educação, companhia, assistência moral, psíquica e social. Já o abandono de recém-nascidos, configura-se com a negligência total da criança prematura/ ou em período de amamentação. De acordo com o Art. 13 do ECA, toda gestante pode entregar seu filho para adoção, e pode fazê-lo com segurança e respaldo do poder judiciário. Entretanto, devese procurar a Vara da Infância, para “justificar” o ato. Para Silvia, Alves e Araújo (2012) se faz necessário uma análise geral, de todo o sistema social, não apenas de partes isoladas. O Eca afirma que toda criança tem direito à vida familiar e define a família de um modo bastante amplo, procurando fugir dos estereótipos da família burguesa do casal e filhos. Trata, mesmo, do que denomina família substituta, reconhecendo, desse modo, o direito ao amparo afetivo e material nos anos de formação. A


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família, mais do que uma instituição legal e jurídica, é um direito subjetivo de encontrar acolhimento para as dificuldades, as dúvidas, as inseguranças que a vida vai fazendo aparecer aos que crescem. (MELLO, 1999).

Para a melhor proteção das crianças e adolescentes desamparados, uma das alternativas existentes são as casas de acolhimento – sejam as que possuem um tempo reduzido de permanência ou as que mantem o menor abandonado por mais tempo até que se torne responsável por si próprio. Estas possuem um papel primordial na “reintegração” da criança e adolescente no âmbito afetivo, social, educacional e cultural. Os ambientes das instituições devem ser seguros, possibilitar que o acolhido se sinta parte do que agora é a realidade do mesmo. O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando na privação de liberdade. Pode-se compreender a priorização do ECA com o bem-estar da criança e do adolescente, pois segundo o mesmo“ [...] nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (MELLO apud WEBER,2000).

O produto escolhido para esse projeto experimental foi o livro reportagem, o que possibilita a melhor discussão e imersão no tema Abandono social infanto-juvenil, com enfoque para a capital sul-mato-grossense, permitindo que as narrativas sejam mais pessoais e não deixem de ter caráter jornalístico. Para que se entenda o conceito de livro reportagem, é necessário que o gênero jornalismo literário seja exposto primeiro.

De acordo com o autor, Felipe Pena, o

conceito de jornalismo literário é muito amplo, e significa potencializar os recursos da profissão, ultrapassar os limites dos acontecimentos diários, proporcionar diferentes visões da realidade e romper com as correntes do lide convencional. O jornalista literário não ignora o que aprendeu no jornalismo diário. Nem joga suas técnicas narrativas no lixo. O que ele faz é desenvolvê-las de tal maneira


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que acaba constituindo novas estratégias profissionais. Mas os velhos e bons princípios da redação continuam extremamente importantes, como, por exemplo, a apuração rigorosa observação atenta, a abordagem ética e a capacidade de se expressar claramente, entre outras coisas. (PENA, 2008, 6p).

Sendo o livro reportagem uma parte importante do jornalismo literário o autor, Edvaldo Pereira Lima (2004), escritor do livro Páginas ampliadas, define o livro reportagem como um veículo multidisciplinar de comunicação, um meio simples e excelente de narrar histórias e registrar as mais “desafiadoras de nosso tempo”. (LIMA,2004). Com a percepção de uma reportagem multiangular, foi possível compreender a realidade por uma perspectiva que ultrapassa o enfoque linear, convencional do jornalismo. Estando o livro reportagem na intersecção – de acordo com Pereira Lima – entre a informação e a literatura, e tendo caráter interpretativo, “a base de procura de entendimento para os problemas transita pelo conceito de causalidade múltipla para o mesmo fenômeno”. A função aparente de informar e orientar em profundidade sobre ocorrências sociais, episódios factuais, acontecimentos duradouros, situações, ideias e figura humana, de modo que ofereça ao leitor em quadro de contemporaneidade capaz de situa-lo diante de múltiplas realidades, lhe mostra o sentido, o significado do mundo contemporâneo. (LIMA,2004).

Dentre as 13 classificações de livro reportagem de Edivaldo Pereira lima, foram utilizados o Livro Depoimento: que consiste na construção de acontecimentos relevantes, de acordo com a visão de quem um personagem/ alguém participante. Esse tipo de classificação também pode ser escrito pelo próprio envolvido. Para o autor, é possível que livros se enquadrem em mais de uma classificação. Sendo assim, um bom livro transita entre as várias classificações sem que deixe de ser válido. A oportunidade


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de contar histórias e atrelar à literatura não poderia ter sido uma junção melhor se não um livro reportagem.


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3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que a pesquisa bibliografia auxiliou no entendimento geral do tema e dos critérios que caracterizam um livro reportagem. Todo material consultado foi de extrema importância para o desenvolvimento prático do trabalho. Durante a pesquisa, notou-se que o tema é muito amplo e mais complexo do que imaginou inicialmente a autora. Tomando como parâmetro os artigos e livros consultados sobre abandono social infantil, conclui-se que a base teórica do projeto está bem estruturada. Outro ponto importante a ser destacado é a compreensão de livro reportagem pela ótica de Edivaldo Pereira Lima (2004). O autor estrutura de maneira didática e simples o que caracteriza um livro reportagem, classificação de tipo de reportagens, fruição do texto e técnicas de edição. Através dele, a autora conseguiu decidir qual linha narrativa seria utilizada no projeto. Todo material produzido contou com as devidas autorizações das fontes, tanto dos personagens como de pessoas que compõem as histórias. Nomes fictícios foram atribuídos a todos os participantes da narrativa. Além de entender a complexidade do assunto, a autora sensibilizou-se com as questões de impacto afetivo na vida dos meninos que moram em abrigos, o que fica implícito na narrativa.


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REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Lei n° 8.069 de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069Compilado.htm acesso em: 23 de abril de 2018 BRASIL. Constituição (1988). Artigo 229, (Vide Emenda Constitucional nº 91, de 2016), Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm, acesso em: 23 de abril de 2018 BRASIL: Constituição de (1988): Código Penal Brasileiro, (Art. 244, capítulo III: Dos crimes contra a assistência familiar). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm acesso em: 23 abril de 2018 MARCÍLIO, Luíza. História social da criança abandonada. Editora Hucitec,1998. 331p. MEDINA, Cremilda. Entrevista: O Dialogo possível. ATICA, 1986. 96 p. MELLO, Sylvia Leser de. Estatuto da Criança e do Adolescente: é possível torná-lo uma realidade psicológica?. Psicol. USP, São Paulo, v. 10, n. 2, 1999 Disponível em http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65641999000200010. PENA, Felipe. Jornalismo literário. São Paulo: Contexto, 2008. PEREIRA LIMA, Edivaldo. Páginas Ampliadas: O livro reportagem como extensão do jornalismo e da cultura. 3.ed. São Paulo: Malone Ltda, 2004. 371p SILVA, Keliane lima; ALVES, Camila Vitorino; ARAÚJO, Lindair Ferreira. Abandono Familiar Infanto-Juvenil: Um Olhar Sobre Uma Instituição Do Agreste Pernambucano, 2012. Disponível em: acesso em: http://lidiaweber.com.br/Artigos/2000/2000Osfilhosdeninguem.pdf 22 de abril de 2018 TRINDADE, Judite. O Abandono De Crianças Ou A Negação Do Óbvio. São Paulo: Revista Brasileira de História, v.19, nº37, 1999. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 01881999000100003,


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acesso em: 22 de abril de 2018 WEBER, Lidia Natália. Os Filhos de Ninguém Abandono e de Crianças No Brasil, Revista Conjuntura Social: Rio de Janeiro, nº 4, p 30-36, 2000. Disponível em: http://www.unicap.br/jubra/wpcontent/uploads/2012/10/TRABALHO-149.pdf acesso em: 22 de abril de 2018.


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