Revista especial 1

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FICHA TÉCNICA

TÍTULO | TITLE Revista Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Journal of Mental Health Nursing

PUBLICAÇÃO E PROPRIEDADE | PUBLISHING AND PROPERTY

Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Society of Mental Health Nursing

DIRETOR | MANAGING DIRECTOR

Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal

COORDENADOR | COORDINATOR

Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal

COORDENADOR DA COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD COORDINATOR

Francisco Sampaio, MSc – Hospital de Braga, Portugal

COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD

Amadeu Gonçalves, MSc - Escola Superior de Enfermagem, Instituto Politécnico de Viseu Analisa Candeias, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Bruno Santos, MSc – Casa de Sáude do Bom Jesus - Braga Carlos Vilela, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto Lia Sousa, MSc - Centro Hospital de São João, Porto Luís Silva, MSc - Hospital de Magalhães Lemos, Porto Odete Araújo, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Olga Cunha Rocha, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto (Jubilada) Rita Costa, MSc - Unidade Local de Saúde de Matosinhos, Porto

COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC REVIEWERS

Agustín Simónelli Muñoz, PhD - Universidad Católica San Antonio, Múrcia, Espanha Aida Mendes, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Alexandre Marques Rodrigues, PhD - Escola Superior de Enfermagem da Cruz Vermelha Portuguesa de Oliveira de Azeméis Beatriz Araújo, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Carme Ferré Grau, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Elaine Antunes Cortez, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Elizabete Borges, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Francisca Manso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Portugal Geilsa Cavalcanti Valente, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Graça Pimenta, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Isilda Ribeiro, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Carvalho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Gomes, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Portugal José Carlos Santos, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Juan Roldan Merino, PhD - Escuela de Enfermería Sant Joan de Déu (adstrita a la UB), Espanha Júlia Martinho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Margarida Sotto Mayor, PhD - Hospital de Magalhães Lemos, Porto, Portugal Mar Lleixà-Fortuny, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Marluce Miguel de Siqueira, PhD - Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Michell Araújo, PhD - Faculdade Católica Rainha do Sertão - Fortaleza e Hospital de M., Brasil Odete Pereira, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil Raul Cordeiro, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal Teresa Barroso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Teresa Lluch-Canut, PhD – Escola Universitària d’Infermeria - Universitat de Barcelona, Espanha Zeyne Scherer, PhD – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo, Brasil

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 2


Público-alvo:

Enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e outras pessoas com interesse na área da saúde mental.

Objectivo:

Divulgação de evidências científicas sobre a promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento, reabilitação e reintegração das pessoas com doença mental ao longo da vida.

Âmbito:

Políticas e design dos cuidados de saúde; Avaliação, diagnóstico, intervenções e resultados de enfermagem; Sistemas de informação e indicadores em saúde mental; Direitos e deveres dos doentes mentais; Formação e investigação em enfermagem em saúde mental.

SUBSCRIÇÃO | SUBSCRIPTIONS

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Revista Portuguesa de Saúde mental é publicada duas vezes por ano, Junho e Dezembro O preço por número é: - para instituições € 10.00; - para particulares € 8.00 Portuguese Journal of Mental Nursing is published twice a year, June and December The price of each number is: - for institutions € 10.00; - for private subscribers € 8.00

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SECRETARIADO | SECRETARIAT

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ISSN:

1647-2160

FOTOS | PHOTOS Luís Silva

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ENDEREÇO | ADDRESS

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 3


Índice 1

EDITORIAL: PADRÕES DE QUALIDADE EM SAÚDE MENTAL ...............................................

2

PREVALÊNCIA DA SOLIDÃO E DEPRESSÃO NA POPULAÇÃO IDOSA RESIDENTE NA ZONA

HISTÓRICA DA CIDADE DE PORTALEGRE ............................................................................... 9

3

BULLYING ESCOLAR E AVALIAÇÃO DE UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO ................... 14

4

SUPORTE SOCIAL, EMPOWERMENT E DOENÇA CRÓNICA ................................................. 21

5

INDICADORES DE SAÚDE MENTAL COMO FATORES PREDITORES DE FRAGILIDADE NOS

IDOSOS

6

.................................................................................................................................... 27

6

QUEDAS EM IDOSOS COM PERTURBAÇÕES MENTAIS RESIDENTES EM UNIDADE DE

SAÚDE DE LONGA DURAÇÃO .................................................................................................. 33

7

RÓTULOS PSIQUIÁTRICOS: “BEM-ME-QUER, MAL-ME-QUER, MUITO, POUCO E

NADA…” ..................................................................................................................................... 40

8

CARGA MENTAL E CARGA PSÍQUICA EM PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM ................ 47

9

CONSTRUÇÃO E VALIDAÇÃO DE UM INSTRUMENTO PARA AVALIAR A SATISFAÇÃO E

IMPORTÂNCIA ATRIBUÍDA AOS SERVIÇOS DE ENFERMAGEM PRESTADOS NA ÁREA DA

SAÚDE MENTAL ....................................................................................................................... 53

10

FAMILIAR CUIDADOR DA PESSOA COM PSICOSE: SATISFAÇÃO NA PRESTAÇÃO DE

CUIDADOS ................................................................................................................................ 59 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 4


11

PREVALÊNCIA DE PERFIS LIPÍDICO E GLICÉMICO ALTERADOS EM PACIENTES COM

ESQUIZOFRENIA

12

INVESTIGAÇÃO EM ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL E PSIQUIATRIA: UMA ANÁLISE

DOCUMENTAL

13

VULNERABILIDADE AO STRESS EM PESSOAS COM ALCOOLISMO ................................. 76

14

MAUS-TRATOS À INFÂNCIA: AS REFERÊNCIAS DOS TÉCNICOS DAS COMISSÕES DE

PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS [CPCJ]

15

INTERVENÇÕES PROMOTORAS DA LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DOS ADOLESCENTES:

UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

16

FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS DE ESTUDANTES DE ENFERMA-

GEM EM CONTEXTO DE ENSINO CLÍNICO EM SAÚDE MENTAL E PSIQUIATRIA

17

A INTERVENÇÃO PSICOTERAPÊUTICA EM ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL:

CONCEITOS E DESAFIOS

18

A SAÚDE MENTAL NA PARENTALIDADE DE FILHOS GÉMEOS – REVISÃO DA

.................................................................................................................... 65

......................................................................................................................... 71

..................................................................... 82

.................................................................. 90

............ 97

.................................................................................................... 103

LITERATURA ........................................................................................................................... 109

19

PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL NA GRAVIDEZ E NO PÓS-PARTO

20

LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DE ADOLESCENTES: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO ... 125

21

NORMAS DE PUBLICAÇÃO DA REVISTA PORTUGUESA DE ENFERMAGEM DE SAÚDE

MENTAL

.............................. 117

................................................................................................................................ 133 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 5


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EDITORIAL: PADRÕES DE QUALIDADE EM SAÚDE MENTAL

Caras (os) colegas, Este número especial da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (número 11) pretende compilar artigos, relativos aos trabalhos apresentados no IV Congresso Internacional da ASPESM, dedicado aos Padrões de Qualidade em Saúde Mental, realizado nos dias 10 e 11 de Outubro de 2013 em Coimbra. Os restantes artigos são divulgados em E-book – Padrões de Qualidade em Saúde Mental, como ISBN nº 978-989-96144-5-1, disponível no site da ASPESM – www.aspesm.org. Esta é uma metodologia que pretendemos manter nos próximos eventos com o intuito de disseminarmos o conhecimento em Enfermagem de Saúde Mental, por um maior número de profissionais de saúde. Este número, ficou com um total de 20 artigos o que implicou um esforço acrescido dos elementos da comissão editorial e da comissão científica, aos quais queremos expressar o nosso agradecimento, pois só assim é possível manter os critérios de qualidade e disseminar o maior número de trabalhos possível. Os temas abordados são muito variados e integram o ciclo vital: infância, adolescência, jovens adultos, adultos e pessoas mais velhas, bem como, os diferentes contextos de intervenção em saúde mental. Incluímos temáticas sobre a promoção da saúde mental, a prevenção da doença mental; instrumentos de avaliação que aportam um maior rigor aos processos diagnósticos; estudos sobre a efetividade das intervenções, e, estudos sobre resultados em termos de ganhos em saúde para as pessoas, famílias e comunidades. Padrões de Qualidade em Saúde Mental Entende-se por padrões de qualidade na prática clinica a sistematização de uma ação em resposta a uma necessidade em cuidados de saúde de uma pessoa, família ou comunidade, num determinado contexto e num determinado momento, que traduza a intervenção mais efetiva, de acordo como os dados disponíveis no momento da sua prescrição e execução.

O padrão significa uma estrutura mínima do que é expectável, desejável, e qualidade significa boa prática, ou seja, a melhor prática de acordo com a evidência disponível. Por isso, os Padrões de Qualidade são indissociáveis da investigação, uma vez que esta é a via por excelência, para definirmos o padrão (comunalidade entre os casos/situações similares) e qualidade como a estratégia que está associada a melhores resultados, ou seja, maiores ganhos em saúde. Os Padrões de Qualidade são um instrumento fundamental, quer para os profissionais de saúde, quer para as pessoas: Para os profissionais de saúde porque servem de guias orientadores da prática clinica; para as pessoas porque constituem um suporte de segurança, uma garantia de qualidade da resposta. Em Saúde Mental os padrões de qualidade ainda merecem um maior destaque por várias razões: i) por vezes, a doença mental limita a capacidade de decisão da pessoa e por isso uma menor participação na tomada de decisão; ii) a doença mental pode interferir na capacidade de compreensão e de ajuizar sobre o seu problema devido ao compromisso da cognição; iii) a doença mental constitui um fator vulnerabilidade individual porque implica um compromisso da funcionalidade; iv) a Doença mental está associada a vulnerabilidade social devido ao estigma ainda presente na maioria das comunidades. Daí a importância de se definirem as práticas de qualidade de modo a que a intervenção esteja associada a um maior potencial de eficácia possível. Os padrões de qualidade referem-se aos processos (procedimentos), aos conteúdos da prática clinica e aos requisitos para a sua implementação com segurança para ambos os intervenientes em interação. Para a definição dos processos e dos conteúdos importa definir o que se entende pela ação dos enfermeiros nos diferentes contextos. De forma muito sintética, poderemos dizer que os enfermeiros ajudam as pessoas, nos processos de saúde a viver melhor (com mais saúde e durante um maior período de tempo) e ajudam as pessoas nos processos de doença a minimizar as consequências negativas

Citação: Sequeira, C. (2013). Editorial: Prioridades de investigação em saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (10), 05-07.. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 6


da mesma promovendo uma melhor recuperação (mais rápida e mais efetiva). A sua ação concretizase ao nível da promoção da saúde, da prevenção da doença, no tratamento, reabilitação e reinserção da pessoa. Em saúde mental uma ação significativa também está relacionada com a capacitação da pessoa e dos seus familiares cuidadores para lidarem com as adversidades (empoderamento – capacidade de resolução de problemas - saúde mental positiva). Em qualquer dos registos importa referir que a ação profissional dos enfermeiros se pode agrupar em três dimensões: i) Processo diagnóstico com o intuito de caracterizar uma determinada necessidade em cuidados de enfermagem. Nesta dimensão é fundamental definir as áreas de intervenção autónomas e partilhadas entre os enfermeiros de cuidados gerais/Enfermeiros especialistas e entre os enfermeiros/outros profissionais. Reitera-se que a noção de diagnóstico aqui descrito não se circunscreve à associação a um processo de doença, mas sim, à avaliação que, traduz a necessidade de intervenção do enfermeiro, quer seja ao nível da promoção, da prevenção e do tratamento. Quando os recursos são limitados, um diagnóstico rigoroso é fundamental para a sua otimização. Por isso, para que este processo cumpra os pressupostos de qualidade é necessário definir, face a cada situação/contexto, quais os dados mínimos que nos permitem enunciar determinado diagnóstico; quais os instrumentos de avaliação/escalas que devem ser utilizados, quais os critérios para a utilização de determinados instrumentos, (…). Cada instituição deveria disponibilizar aos seus profissionais estas informações, de modo a orientar os enfermeiros sobre o que deve ser feito, em situações ideais (padrão de qualidade) e depois compete ao enfermeiro avaliar a situação real e adaptar o padrão a cada contexto. Por exemplo, neste registo é habitual diferentes instituições utilizarem diferentes instrumentos para avaliar situações similares sem qualquer justificação para tal. Um padrão não significa fazer tudo da mesma forma por todos, mas implica diversos consensos sustentados na evidência científica. Por isso, é importante consensualizar linguagens, taxonomias, processos, e produzir investigação que nos permita dizer que o processo “A” tem vantagens face ao “B” e ao “C”.

ii) Uma outra dimensão refere-se às intervenções de Enfermagem. Estas podem ser subdivididas em duas categorias: a) as Intervenções Interdependentes - Iniciadas por outros técnicos, nas quais os enfermeiros se responsabilizam pela sua implementação; b) as intervenções autónomas Iniciadas pela prescrição do enfermeiro, nas quais os enfermeiros se responsabilizam pela sua prescrição, implementação e avaliação. No domínio das intervenções os padrões de qualidade devem: a) Garantir que há relação entre as intervenções e os diagnósticos, ou seja, que determinados diagnósticos são indicações terapêuticas de determinadas intervenções. b) Identificar quais as intervenções que revelam maior efetividade terapêutica; c) identificar as intervenções major e minor para cada diagnóstico; d) Descrever quais as atividades que concretizam cada intervenção, ou seja, qual o conteúdo que cada intervenção deve incorporar, de modo a promover a congruência entre utilizadores de léxico e de conteúdo. Ex: quais as atividades mínimas a incluir na intervenção “suporte emocional”; e) Identificar os processos que devem nortear as intervenções, quais os procedimentos, qual a melhor forma de implementar uma determinada intervenção, pois em saúde mental, a forma pode ser determinante para a efetividade da intervenção. iii) Uma outra dimensão está relacionada com os contextos e os requisitos que os mesmos devem “respeitar” para facilitarem a implementação de práticas de qualidade e garantirem a melhor recuperação das pessoas. Assim, teríamos pela via dos padrões de qualidade que determinada intervenção implica a existência de determinados recursos. Por exemplo, para a implementação da Intervenção “relação de ajuda formal; reestruturação cognitiva, relaxamento” são necessários espaços físicos com determinadas características que garantam a privacidade das intervenções; enfermeiros Especialistas (dotações seguras) que possam garantir a prescrição, a execução e continuidade das intervenções, (…). Nesta dimensão inclui-se também as características das estruturas que devem ter determinados serviços, em função da natureza dos seus utentes e dos objetivos dos mesmos. Uma unidade de demência deve ter características diferentes de uma unidade de urgência ou de uma unidade de cuidados continuados. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 7


Os padrões de qualidade devem integrar os requisitos das estruturas assistências, a matriz dos processos diagnósticos e a estrutura base das intervenções, tendo por base os indicadores epidemiológicos, os indicadores de estrutura, indicadores de processo e indicadores de resultado. Nesse sentido, para os focos de atenção mais frequentes em cada contexto devia existir um Padrão de qualidade que orientasse os profissionais de saúde para: quais os dados a recolher para cada foco; quais os dados major e a necessidade de utilização de instrumento de medida validado; qual o melhor enunciado diagnóstico face a um determinado conjunto de dados; quais as intervenções que são aconselhadas por níveis de efetividades e quais os resultados esperados em função da implementação de determinadas intervenções. Conclui-se que os padrões de Qualidade são importantes para: • Estimular a reflexão sobre as práticas; • Dar consistência ao conhecimento em enfermagem; • Trazer imparcialidade ao cuidado dos diferentes pacientes; • Avaliar a eficiência associada às intervenções de enfermagem;

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• Avaliar a qualidade das práticas de enfermagem; • Garantir práticas que cumpram requisitos científicos e estejam em consonância com a evidência empírica; • Promover a integração dos resultados de Investigação na prática clinica e a sua reformulação; • Aumentar a eficiência nos resultados; • (…). Os padrões de Qualidade devem informar sobre “O Que Fazer”, “Como Fazer” e qual a “Utilidade Social” (resultado efetivo) esperada do fazer. A sua construção é um trabalho contínuo, de todos os agentes envolvidos quer na formação quer na prática clinica, pelo que devem ser congregadas sinergias das várias entidades (Instituições de ensino e de investigação; Instituições de assistência; Ordens profissionais, Sociedades científicas,…) na sua edificação.  Porto, 30 de Março de 2014 O Diretor da Revista d’ ASPESM


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PREVALÊNCIA DA SOLIDÃO E DEPRESSÃO NA POPULAÇÃO IDOSA RESIDENTE NA ZONA HISTÓRICA DA CIDADE DE PORTALEGRE | António Calha1; Miguel Arriaga2; Raul Cordeiro3 |

RESUMO Neste artigo apresentamos os resultados de uma investigação realizada no âmbito do projeto: “Solidão, depressão e qualidade de vida em grupos vulneráveis da Cidade de Portalegre”. O objetivo central da investigação é identificar a relação entre os fatores biopsicossociais e o estado de saúde, o fenómeno da depressão e o sentimento de solidão. A metodologia utilizada baseou-se na recolha de informação através de um questionário junto de 123 idosos residentes na zona histórica da cidade de Portalegre - Portugal. Os resultados obtidos indicam que os idosos percecionam o seu estado de saúde de forma diferenciada em função do género. No que diz respeito à realização das atividades de vida diária podemos identificar um elevado grau de autonomia nos idosos incluídos na amostra. Ainda assim, foram identificadas evidências de que o aumento da idade está relacionado com uma progressiva perda da autonomia. Relativamente à existência de sintomas de depressão foram identificados, sobretudo, junto dos idosos de sexo feminino e uma tendência para o aumento dos sintomas associado à idade. As conclusões apontam para a necessidade de que, no exercício da prática clinica, se envolva a pessoa idosa e se tome em consideração as especificidades da sua situação. PALAVRAS-CHAVE: Envelhecimento; Depressão; Solidão

RESUMEN

ABSTRACT

“Prevalencia de la soledad y la depresión en la población anciana que vive en el casco histórico de Portalegre”

“Prevalence of loneliness and depression in the elderly population living in Portalegre historical area”

Este artículo presenta los resultados de una investigación llevada a cabo en el marco del proyecto: “La soledad, la depresión y la calidad de vida de los grupos vulnerables de la ciudad de Portalegre.” El objetivo central de la investigación es identificar la relación entre los factores biopsicosociales y el estado de salud, la depresión y los sentimientos de soledad. Los datos presentados se refieren a la discusión de los factores biopsicosociales relacionados con el estado de salud, el fenómeno de la depresión y los sentimientos de soledad. La metodología se basa en la recopilación de información a través de un cuestionario a 123 ancianos residentes en el casco histórico de la ciudad de Portalegre - Portugal. Los resultados indican que los ancianos avalúan su salud de manera diferente en función del sexo. En cuanto a la realización de las actividades de la vida diaria se puede identificar un alto grado de autonomía en las personas mayores incluidas en la muestra. Todavía se identificaron pruebas de que el aumento de la edad se asocia con una pérdida progresiva de la autonomía. En cuanto a la existencia de síntomas de depresión fueron identificados, sobre todo, entre las mujeres de edad avanzada y una tendencia al aumento de los síntomas asociados a la edad. Los resultados apuntan a la necesidad, en el ejercicio de la práctica clínica, de envolvimiento de los ancianos y de tener en cuenta las características específicas de su situación.

This article presents the results of a research carried out under the project: “Loneliness, depression and quality of life of vulnerable groups of the City of Portalegre”. The central aim of the research is to identify the relationship between biopsychosocial factors and health status, depression and loneliness. The methodology was based on the collection of information through a questionnaire to 123 elderly residents in Portalegre (Portugal) historical area. The results indicate that the elderly perceive their health according to gender. Regarding the performance of activities of daily living we identified a high degree of autonomy in the elderly included in the sample. There is evidence that increasing age is associated with a progressive loss of autonomy. Regarding the existence of symptoms of depression were identified, especially among elderly women and a tendency to increase in symptoms associated with age. The general findings point to the need to involve the elderly and take into account the specifics of their situation in the exercise of clinical practice.

DESCRIPTORES: Envejecimiento; Depresión; Soledad

KEYWORDS: Aging; Depression; Loneliness

Submetido em 30-11-2013 Aceite em 09-02-2014

1 Mestre em Sociologia; Núcleo de Estudos para a Intervenção Social, Educação e Saúde, C3I, Instituto Politécnico de Portalegre, antoniocalha@hotmail.com 2 Mestre em Psicologia Clinica e da Saúde; Coordenador Interdisciplinar do Núcleo de Estudos para a Intervenção Social, Educação e Saúde, C3I, Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal, miguelarriaga@essp.pt 3 Doutor em Ciências e Tecnologias da Saúde – Desenvolvimento Humano e Social; Núcleo de Estudos para a Intervenção Social, Educação e Saúde, C3I, Instituto Politécnico de Portalegre, 7300-110 Portalegre, Portugal, raulcordeiro@essp.pt Citação: Calha, A., Arriaga, M., & Cordeiro, R. (2014). Prevalência da solidão e depressão na população idosa residente na zona histórica da cidade de Portalegre. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 09-14.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 9


INTRODUÇÃO O envelhecimento da população é um fenómeno que, apesar de mundial, atinge com particular acutilância as sociedades ocidentais contemporâneas. As estimativas da Organização Mundial de Saúde preveem a existência de 1,2 biliões de pessoas com mais de 60 anos em 2025 (Sousa, Galante e Figueiredo, 2003). Portugal não constitui exceção ao panorama do envelhecimento populacional. As projeções a 50 anos realizadas pelo Instituto Nacional de Estatística (2009) apontam como principais tendências demográficas o aumento do progressivo do índice de envelhecimento (prevendo-se, em 2060, no cenário mais provável um rácio de 271 idoso por cada 100 jovens), uma redução da proporção de jovens (de 15,3% em 2008 para 11,9% em 2060), e um aumento considerável da percentagem de população com 65 ou mais anos de idade (passando de 17,4% em 2008 para 32,3% em 2060). Estas tendências conferem pertinência à aferição das variáveis ligadas à qualidade de vida dos idosos e das condições que propiciam bem-estar durante o envelhecimento. A identificação e análise dos fatores relacionados com a qualidade de vida e com o funcionamento emocional e social dos idosos constituem um importante instrumento de caraterização do bem-estar possibilitando a implementação de estratégias e práticas clínicas que promovam o envelhecimento bem-sucedido. Nesta comunicação apresentamos os resultados de uma investigação realizada no âmbito do projeto: “Solidão, depressão e qualidade de vida em grupos vulneráveis da Cidade de Portalegre”. Este projeto teve como objetivos, numa primeira fase, a avaliação do estado mental, a solidão e a qualidade de vida dos idosos para, posteriormente, numa segunda fase, contribuir, numa vertente interventiva, para a (re)construção de redes sociais de apoio. Os dados apresentados neste texto referem-se à discussão dos fatores biopsicossociais associados ao estado de saúde, ao fenómeno da depressão e ao sentimento de solidão. METODOLOGIA A metodologia utilizada baseou-se na recolha de informação através de um questionário junto de 123 idosos. O questionário foi aplicado por heteroavaliação e contém várias medidas: 1) Avaliação Breve do Estado Mental (Grupo de Estudos de Envelhecimento Cerebral e Demência - GEECD, 2008) - Exame Breve do Estado Mental: instrumento de rastreio para uma avaliação breve da Demência. É constituído por uma série de questões e tarefas que permitem a avaliação das seguintes funções cognitivas: orientação (10 pontos), repetição (3 pontos), atenção e cálculo (5 pontos), memória (3 pontos) e linguagem (9 pontos). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 10

De acordo com os pontos de corte estabelecidos para a população portuguesa, consideram-se com “défice cognitivo” os analfabetos com pontuação igual ou inferior a 15, os indivíduos com 1 a 11 anos de escolaridade com pontuação igual ou inferior a 22, e os indivíduos com escolaridade superior a 11 anos com pontuação igual ou inferior a 27. 2) Escala de Depressão Geriátrica (GEECD, 2008), escala de 15 itens para avaliação de sintomas depressivos em populações geriátricas; A escala pode ser aplicada por profissionais não médicos, pois não exige conhecimentos em psicopatologia. Foi utilizada a escala de versão reduzida (15 perguntas) dado o menor tempo gasto na sua aplicação. Para o preenchimento desta versão reduzida, deve considerar-se que os itens 1, 5, 7, 11 e 13, devem ser pontuados negativamente, isto é, a uma resposta “Não” corresponde um ponto. Aos itens 2, 3, 4, 6, 8, 9, 10, 12, 14, 15, será atribuído um ponto à resposta positiva “Sim”. 3) Escala de Solidão da UCLA (Neto, 1989), composta por 18 itens e que avalia a solidão e os sentimentos associados à mesma. Utilizou-se para versão portuguesa validada por Neto (1989). A versão portuguesa possui 18 itens. É um questionário que avalia a solidão e os sentimentos associados à mesma. As respostas de cada item fazemse através de uma escala de tipo Likert com 4 pontos, desde nunca (1) até muitas vezes (4). A pontuação mínima possível é de 18 pontos e a máxima de 72 pontos. A pontuação total é obtida através da soma dos itens, metade dos quais formulados da forma inversa (itens 1,4,5,8,9,13,14,17 e 18), e reflete o índice de solidão. Assim, um resultado mais elevado traduz solidão, enquanto um resultado mais baixo traduz satisfação social (ausência de solidão). A aplicação decorreu em duas zonas geográficas delimitadas da zona histórica da cidade de Portalegre, Portugal entre os dias 21 de janeiro e 2 de fevereiro de 2013.Os inquiridos foram identificados após consentimento livre e esclarecido permitindo a relação direta com os dados inquiridos. Os dados apresentados resultam de um estudo de caráter quantitativo, correlacional, observacional e transversal. De acordo com as caraterísticas das variáveis em estudo são apresentadas as várias análises e os resultados obtidos na investigação. Os dados foram trabalhados através do Software SPSS (Statistical Package the Social Sciences) versão 18.0 usando o teste do Qui-quadrado ou o teste de correlação conforme a natureza das variáveis, sendo consideradas


estatisticamente significativas as análises estatísticas cuja probabilidade de significância, p-value, do teste fosse inferior ou igual a 0.05. Dos 123 idosos inquiridos a maioria (69,9%) era do sexo feminino, sendo 30,1% do sexo masculino. A média de idades situou-se nos 77 anos. A tabela 1 permite a descrição da amostra através das principais variáveis de caracterização: grupo etário, estado civil e habilitações literárias. Tabela 1 - Caracterização da amostra Homens

Mulheres

Grupos etários n.

36

86

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

38,9% 41,7% 19,4% 0

38,4% 46,5% 12,8% 2,3%

Estado Civil n.

37

86

Solteiro Casado/União de facto Viúvo Divorciado/Separado

2,7% 73,0% 21,6% 2,7%

5,8% 32,6% 59,3% 2,3%

Habilitações Escolares n.

36

84

< 1.º Ciclo 1.º Ciclo 2.º Ciclo 3.º Ciclo Ens. Secundário Ens. Superior

2,8% 69,4% 2,8% 16,7% 8,3% 0

36,9% 50,0% 3,6% 7,1% 1,2% 1,2%

RESULTADOS O conceito de autoperceção do estado de saúde, ainda que reconhecidamente envolva processos ilógicos e irracionais no procedimento de aferição introspetiva da avaliação do estado de saúde, constitui hoje um preditor consistente de morbilidade. Este indicador é uma medida holística da saúde percebida que engloba uma síntese das perceções físicas, mentais e emocionais da saúde e capta a intuição do inquirido acerca de quão bem está (Jylha, 2009). A autora conclui que a utilização da autoperceção do estado de saúde para comparar o estado de saúde de diferentes grupos beneficia da sua natureza compreensiva e inclusiva. Na presente investigação consideraram-se três indicadores do estado de saúde: autoavaliação do estado de saúde; autoavaliação da existência de alterações ao estado de saúde e autonomia na realização de tarefas diárias. Os resultados obtidos indiciam que o género constitui um fator determinante na perceção do estado de saúde. A análise da tabela 2 permite observar que as mulheres tendem a ter uma pior consideração do seu estado de saúde quando comparadas com os homens. Como refere Vintém (2008, p. 14) o “género afigura-se como fator importante na maneira como cada pessoa aprecia o seu próprio estado de saúde”. Relativamente à idade podemos verificar que não se identificaram diferenças estatisticamente significativas na forma como cada grupo etário aprecia o seu estado de saúde. Tabela 2 - Autoapreciação do estado de saúde dos idosos Idosos que se Idosos que não consideram se consideram saudáveis saudáveis

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre

Os idosos residentes na zona histórica da cidade de Portalegre e incluídos na amostra apresentam características idênticas àquelas tipicamente associadas à população idosa portuguesa. A maioria dos idosos de sexo masculino é casado e a situação de viuvez atinge, sobretudo, as mulheres. Em termos de qualificações pode observar-se que se trata de uma população com baixos níveis de habilitações escolares.

Autoapreciação do estado de saúde, por sexo (%) n.

63

59

Homens Mulheres

66,7% 45,3%

33,3% 54,7% Χ2(1)=4,618; p=0,032

Autoapreciação do estado de saúde, por grupo etário (%) n.

62

59

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

63,0% 41,8% 55,6% -

37,0% 58,2% 44,4% 100% Χ2(3)=6,775; p=0,080

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre

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A tabela 3 contempla os resultados à questão “considera que atualmente existem alterações na sua saúde?”. Os valores estão em consonância com os resultados apresentados no quadro 2: são as mulheres que mais alterações identificam no estado de saúde, quando comparadas com os homens. Relativamente à idade as diferenças identificadas entre os distintos grupos etários não são estatisticamente significativas (p=0,558). Tabela 3 - Autoperceção de alterações do estado de saúde Idosos que consideram existirem alterações no seu estado de saúde

Idosos que consideram não existirem alterações no seu estado de saúde

Autoperceção de alterações do estado de saúde por sexo (%) n.

79

43

Homens Mulheres

51,4% 70,6%

48,6% 29,4% Χ2(1)=4,180; p=0,041

Autoperceção de alterações do estado de saúde por grupo etário (%) n.

78

43

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

56,9% 64,8% 72,2% 100%

40,4% 35,2% 27,8% Χ2(3)=2,069; p=0,558

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre

A análise da tabela 4 permite constatar que não se verificam diferenças de género em termos de limitações funcionais na autonomia no desempenho de atividades de vida diária. No que diz respeito à idade foram identificas evidências de que o seu aumento tem impacto na diminuição da autonomia dos idosos (Χ2(3)=10,644; p=0,014). A depressão é considerada hoje em dia, um problema de saúde importante que atinge pessoas de todas as idades, conduzindo a sentimentos de tristeza e isolamento social (Martins, 2008).

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Tabela 4 - Autonomia na realização de atividades de vida diária Idosos que se consideram autónomos na realização de AVDs

Idosos que se consideram dependentes na realização de AVDs

Autonomia na realização de AVDs por sexo (%) n.

115

8

Homens Mulheres

94,6% 93,0%

5,4% 7,0% Χ2(1)=0,105; p=0,746

Autonomia na realização de AVDs por grupo etário (%) n.

114

8

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

100% 90,9% 88,9% 50,0%

9,1% 11,1% 50,0% Χ2(3)=10,644; p=0,014

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre

A depressão é muito mais do que um sentimento. Ela pode ser uma doença mental grave e incapacitante, interferindo em todos os aspetos do dia-a-dia dos indivíduos. Nesta investigação foram avaliadas a solidão (através da escala de solidão da UCLA [Neto, 1989]) e a depressão (através da escala de depressão Geriátrica [GEECD, 2008]) junto da população idosa. Os resultados obtidos relativamente ao nível de solidão dos idosos (tabela 5) estão em consonância com outros estudos que utilizaram a escala de solidão da UCLA. Não se registam diferenças estatisticamente significativas em função do sexo (p=0,225) corroborando os resultados obtidos em investigações anteriores (Neto, 1989). No que diz respeito à idade não verificaram, igualmente, diferenças significativas. Refira-se que esta escala não questiona diretamente os sujeitos sobre se se sentem sós, mas procura avaliar a solidão indiretamente.


DISCUSSÃO

Tabela 5 - Nível de solidão dos idosos com base na escala de solidão da UCLA* Nível médio de solidão por sexo M*; (dp.) Homens Mulheres

29,0; (8,4) 31,2; (9,1) t(1)= -1,22; p=0,225

Nível médio de solidão por grupo etário

M*; (dp.)

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

29,6; (9,6) 31,2; (8,2) 30,3; (8,4) 35,5; (20,5) F(3;110)= 0,439; p=0,725

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre *Valor médio aferido numa escada que varia entre 18 e 72 valores, em que 18 corresponde ao nível mais baixo de solidão e 72 ao nível mais elevado de solidão.

Relativamente à existência de sintomas de depressão (tabela 6) foram identificados, sobretudo, junto dos idosos de sexo feminino uma tendência para o aumento dos sintomas associado à idade. Este período do ciclo de vida implica um conjunto de adaptações a várias mudanças, sobretudo associadas às alterações provocadas pelo envelhecimento. Porém, é frequente verificar que nem todos os idosos se conseguem adaptar a essas mudanças sendo a depressão uma possível consequência desta dificuldade adaptativa. Tabela 6 - Sintomas de depressão nos idosos com base na escala de depressão Geriátrica Idosos sem sintomas de depressão

Idosos com sintomas de depressão

Existência de sintomas de depressão por sexo (%) n.

78

40

Homens Mulheres

83,3% 58,5%

16,7% 41,5%

Χ2(1)=6,865; p=0,009 Existência de sintomas de depressão por grupo etário (%) n.

77

40

65 a 74 anos 75 a 84 anos 85 a 94 anos > 94 anos

78,7% 58,8% 58,8% -

21,3% 41,2% 41,2% 100%

Os resultados obtidos indicam que os idosos residentes na zona histórica da cidade de Portalegre percecionam o seu estado de saúde de forma diferenciada em função do género. São as mulheres quem apresentam uma pior conceção da sua saúde quando comparadas com os homens. Estes resultados são concordantes com os obtidos em outras investigações (Vintém, 2008; Araújo, Ramos e Lopes, 2011) que uma maior propensão para as mulheres idosas percecionarem o seu estado de saúde como mais fraco comparativamente com os homens. A perceção do estado de saúde não se revelou, contudo, influenciada pela idade dos idosos. Os resultados obtidos devem ser interpretados como uma perceção individual da saúde e não como uma medida exata do estado de saúde. As respostas obtidas são, necessariamente, o resultado do conjunto de informações relevantes sobre saúde que os inquiridos possuem. O seu posicionamento varia, assim, em função da informação de que dispõe e da sua conceção de saúde. No que diz respeito à realização das atividades de vida diária podemos identificar um elevado grau de autonomia nos idosos incluídos na amostra. Ainda assim, foram identificadas evidências de que o aumento da idade está relacionado com uma progressiva perda da autonomia. Sabemos hoje que, também no idoso, a depressão afeta a perceção de si mesmo e também a forma como vê o mundo que o rodeia. Assim esta variável pode influenciar varias dimensões do dia-a-dia do Idoso como alterações fisiológicas como no apetite, o sono ou níveis de energia assim como nas relações interpessoais, atividades laborais ou sociais (Alexopulos, Katz, Reynolds, Carpenter & Docherty, 2001; Hell, 2009). É frequente na população idosa, sinais e sintomas depressivos, sobretudo na imagem negativa de si mesmos, pensamentos involuntários negativos do self, e uma imagem negativa do mundo que os rodeia e do futuro que se avizinha, (Gotlib & Joorman, 2010). Associado ao envelhecimento, surgem por vezes, patologias como a depressão (Huang, Dond, Lu, Yue & Liu, 2010; Mead et al., 2008) considerada hoje uma das maiores causas de sofrimento emocional, relacionando-se muitas vezes, sobretudo nesta fase do ciclo de vida, com sentimentos de solidão.

Χ2(3)=8,808 p=0,032

Fonte: Inquérito aos idosos residentes na zona histórica de Portalegre

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CONCLUSÕES A perda de capacidades funcionais associada ao processo de envelhecimento e o consequente aumento dos níveis de dependência pode tornar-se particularmente problemático no atual contexto social em que se alteram as formas tradicionais de convivência de solidariedade intrafamiliar. Neste sentido, é espectável um aumento progressivo da procura de cuidados formais por parte da população idosa. Relativamente aos cuidados de enfermagem, como demonstra Costa (2011), podem ser influenciados pelas representações sociais acerca do envelhecimento, estando associados mitos e estereótipos, e levar à desvalorização da individualidade e autonomia da pessoa idosa. Os dados apresentados permitem caracterizar a condição sénior dos idosos residentes na zona histórica de Portalegre. As diferentes condições de vida na velhice apresentadas nesta investigação indiciam a necessidade de perspetivar formas distintas de intervenção e de promoção do envelhecimento positivo, devidamente adequadas e ajustadas à realidade social do idoso. Desta forma, preconiza-se que, no exercício da prática clinica, se envolva a pessoa idosa e se tome em consideração as especificidades da sua situação, este será, certamente, um importante contributo na promoção da autonomia e do empowerment dos idosos. Apenas através da análise das causas associadas ao estado de saúde e à prevalência da depressão e solidão se pode romper com as tradicionais formas simplistas de categorização da velhice dos seus problemas e das suas situações. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Araújo, J., Ramos, E., e Lopes, C. (2011). Estilos de vida e percepção do estado de saúde. Em idosos Portugueses de zonas rural e urbana. Acta Médica Portuguesa, 24(S2), 79-88. Alexopoulos, G. S., Katz, I. R., Reynolds, C. F., Carpenter, D., & Docherty, J. P. (2001). The expert consensus guideline series. Pharmacotherapy of depressive disorders in older patients. Postgraduate medicine, 1-86. Costa, A. (2011). Os enfermeiros e as representações sociais sobre o envelhecimento: implicações nos cuidados promotores da autonomia da pessoa idosa hospitalizada. Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa: Tese de Mestrado. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 14

Grupo de Estudos de Envelhecimento Cerebral e Demência, GEECD. (2008). Escalas e testes na demência (2ª ed.). Lisboa: Novartis. Gotlib, I. H., & Joormann, J. (2010). Cognition and depression: current status and future directions. Annual Review of Clinical Psychology, 6, 285-312. doi:10.1146/annurev.clinpsy.121208.131305 Hell, D. (2009). Depressão - que sentido faz? Uma abordagem integrativa (1.ª ed.). Lisboa: Sete Caminhos. Huang, C. Q., Dong, B. R., Lu, Z., Yue, J. R., & Liu, Q. X. (2010). Chronic diseases and risk for depression in old age: a meta-analysis of published literature. Ageing Research Reviews, 9(2), 131-141. Instituto Nacional de Estatística. (2009). Projecções de População Residente em Portugal 2008 – 2060: Relatório anual 2009. Jylhä, M. (2009). What is self-rated health and why does it predict mortality? Towards a unified conceptual model. Social science & medicine, 69(3), 307316. Martins, R. (2008). A depressão no idoso. Millenium - Revista do ISPV, 34. Acedido em 2010, Fevereiro 10 de http://www.ipv.pt/millenium/millenium34 Mead, G., Morley, W., P., Greig, C., McMurdo, M., & Lawlor, D. (2008) Exercise for depression. Cochrane database of systematic reviews, 4. doi: 10.1002/14651858.CD004366.pub3 Neto, F. (1989). A Escala de Solidão da UCLA: adaptação portuguesa. Psicologia Clínica, 2, 65-79. Sousa, L., Galante, H., e Figueiredo, D. (2003). Qualidade de vida e bem-estar dos idosos: um estudo exploratório na população portuguesa. Revista Saúde Pública, 37(3), 364-371. Vintém, J. (2008). Inquéritos nacionais de saúde: auto-percepção do estado de saúde: uma análise em torno da questão de género e da escolaridade. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 26(2), 5-16.


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BULLYING ESCOLAR E AVALIAÇÃO DE UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO | Ermelinda Macedo1; Fátima Martins2; João Cainé3; João Macedo4; Rui Novais5 |

RESUMO O bullying é um fenómeno preocupante em contexto escolar. Estudos realizados em vários países revelam que os estudantes observaram e relataram frequentemente experiências de bullying nas escolas, sendo um fenómeno com consequências dramáticas para as vítimas e agressores e preocupante para a comunidade escolar e para a família. OBJETIVOS: Caracterizar o bullying num grupo de estudantes que frequentam um Agrupamento Vertical de Escolas do Norte de Portugal (AVENP) e avaliar um programa de intervenção, envolvendo toda a comunidade educativa. METODOLOGIA: Recorrendo a uma amostra aleatória e estratificada por anos de escolaridade e através do questionário “Diagnóstico do Bullying na Escola” da Direção Geral da Saúde, foi efetuada uma avaliação diagnóstica (1º momento: n=313) e, posteriormente, implementado um programa de intervenção designado por “Nós e os Outros”. No final, foi efetuada nova avaliação (2º momento: n=298). RESULTADOS: A dimensão do bullying encontrada é concordante com os resultados da literatura diminuindo de 14.6% para 10.7% dos estudantes que referem já terem sido vítimas nos últimos dois meses. Relativamente aos bully-provocadores, os resultados evidenciaram diferenças marginais na intensidade do fenómeno, revelando uma diminuição dos comportamentos de agressividade verbal entre os dois momentos (Z= -1.808, p=.071). CONCLUSÃO: Considera-se pertinente que este tema conste do programa educativo deste AVENP. O bullying tem características mutáveis e a Escola tem o papel de o monitorizar, numa lógica longitudinal para se modificarem comportamentos. O programa implementado teve implicações para práticas pedagógicas que promovem a saúde mental dos estudantes. PALAVRAS-CHAVE: Bullying; Desenvolvimento de programas

RESUMEN

ABSTRACT

“Bullying escolar y evaluación de un programa de intervención”

“School bullying and evaluation of an intervention program”

La intimidación o bullying es un fenómeno preocupante en contexto escolar. Estudios realizados en varios países revelan que los estudiantes observaron y relataron frecuentemente experiencias de bullying en las escuelas, siendo un fenómeno preocupante para la comunidad escolar y para la familia. OBJETIVOS: Caracterizar el bullying en un grupo de estudiantes que frecuentan una Agrupación Vertical de Escuelas del Norte de Portugal (AVENP) y evaluar un programa de intervención, implicando toda la comunidad educativa. METODOLOGÍA: Recurriendo a una muestra aleatoria y estratificada por años de escolaridad y a través del cuestionario “Diagnóstico del Bullying en la Escuela” de la Dirección General de la Salud fue efectuada una evaluación diagnóstica (1º momento: n=313) y, posteriormente, implementado un programa de intervención designado “Nosotros y los Otros”. En la parte final, fue efectuada una nueva evaluación (2º momento: n = 298). RESULTADOS: La dimensión del bullying encontrada es coincidente con los resultados de la literatura disminuyendo de 14.6% a 10.7% de los estudiantes que refieren haber sido víctimas en los dos últimos meses. Relativamente a los bully-camorristas, los resultados evidenciaron diferencias marginales en la intensidad del fenómeno, revelando una disminución de los comportamientos de agresividad verbal entre los dos momentos (Z= -1.808, p= .071). CONCLUSIÓN: Se considera pertinente que este tema conste en el programa educativo de esta AVENP. La Escuela debe tener el papel de monitorizarlo, basándose en una lógica longitudinal para modificar comportamientos. El programa implementado tuvo implicaciones para prácticas pedagógicas que promueven la salud mental de los estudiantes.

Bullying is a worrying phenomenon in schools. Studies in various countries show that students often observed and reported experiences of bullying in schools, being a phenomenon with dramatic consequences for victims and perpetrators, and concern for the school community and family. OBJECTIVES: To characterize bullying, a group of students attending a Vertical Group of Schools in North Portugal (AVENP) and to evaluate an intervention program involving the whole school community. METHODS: Using a random sample stratified by years of schooling and through the questionnaire “Diagnosis of Bullying at School,” of The Directorate-General of Health, a diagnostic evaluation was performed (1st time: n= 313) and subsequently a program intervention called “We and the Others” was implemented. In the end, further evaluation was conducted (2nd time: n= 298). RESULTS: The extent of bullying found is consistent with the results of the literature decreasing from 14.6% to 10.7% of students who reported having been victims in the past two months. With regard to bully provokers, the results showed marginal differences in the intensity of the phenomenon, revealing a decrease of verbal aggressiveness behaviors between the two points in time (Z=1.808, p=.071). CONCLUSION: It is important that this topic be part of the educational program of the AVENP. Bullying has changing characteristics and the School has the role of monitoring this phenomenon in a longitudinal logic to modify behaviors. This program has implications for pedagogical practices that promote the mental health of students.

DESCRIPTORES: Bullying; Desarrollo de programa

KEYWORDS: Bullying; Program developement.

1 PhD em Psicologia; Professora Adjunta da Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho – Núcleo de Investigação em Enfermagem, emacedo@ese.uminho.pt 2 Doutora em Sociologia; Professora Adjunta da Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho – Núcleo de Investigação em Enf., fmartins@ese.uminho.pt 3 Mestre em Ciências de Enfermagem; Professor Adjunto da Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho, Braga, Portugal, jcaine@ese.uminho.pt 4 Mestre em Educação – Área de Especialização em Educação para a Saúde; Prof. Adj. da Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho, jmacedo@ese.uminho.pt 5 Mestre em Ciências de Enfermagem; Prof. Adj. da Escola Superior de Enfermagem da Univ. do Minho – Núcleo de Investigação em Enfermagem, rnovais@ese.uminho.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 05-02-2014 Citação: Macedo, E., Martins, F., Cainé, J., Macedo, J., & Novais, R. (2014). Bullying escolar e avaliação de um programa de intervenção. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 15-20.

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INTRODUÇÃO A escola, como espaço privilegiado de contacto pessoal, constitui o ambiente propício ao inter-relacionamento e desenvolvimento das crianças e dos jovens, sendo mesmo considerada como um dos mais importantes agentes socializadores com forte influência na construção das suas identidades. Todavia, esta mesma escola que, durante gerações, foi contemplada como um local seguro, tornou-se, nos dias de hoje, um palco de conflitos e de tensões e, na forma mais radical, pode mesmo ser considerada como um lócus de produção e reprodução de violência perpetrada sob as mais variadas formas (Abramovay, 2005). A violência escolar, não sendo um problema novo, é um fenómeno complexo e múltiplo que não pode ser ignorado. Na verdade, a incidência de comportamentos de violência nas escolas tem vindo a crescer nos últimos anos, preocupando toda a comunidade educativa, face ao clima de insegurança que se instala à maior probabilidade de insucesso escolar, aos comprometimentos físicos e emocionais ou mesmo a sentimentos de insatisfação com a vida (Mendes, 2010). Segundo Olweus (1999, p. 10) “A student is being bullied or victimised when he or she is exposed repeatedly and over time to negative action on the part of one or more other students”. O fenómeno do bullying não se refere apenas às agressões que acontecem ocasionalmente, nos intervalos ou fora da escola, mas à violência que se manifesta como um comportamento ligado à agressividade verbal (ex., chamar nomes, gozar de modo desagradável, ameaça), física (ex., bater, empurrar, dar encontrões), social (ex., deixar de fora do grupo, ignorar) e sexual (ex., tocar em partes do corpo do outro deixando-o desconfortável). Neto (2005) considera-o um problema de saúde pública que afeta a saúde das crianças e adolescentes em diversas dimensões. Sansone & Sansone (2008) identificamno como um fenómeno social que transcende o género, a idade e a cultura. Da diversa literatura pesquisada, podemos constatar que é possível definir critérios que permitam identificar comportamentos suscetíveis de ser qualificados como bullying, designadamente o facto de se tratar de uma conduta agressiva intencional, com carácter repetitivo e sistemático onde se destaca uma desigualdade de poder entre os alunos envolvidos, o agressor e a vítima (Fontaine & Réveillère, 2004; Lisboa, Braga e Ebert, 2009; Mendes, 2011; Olweus, 1993; Pereira, 2002; Roberts & Morotti, 2000). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 16

Estudos realizados em vários países revelam que os estudantes observam e relatam, frequentemente, experiências de bullying nas escolas. Os resultados da investigação realizada em países como a Austrália, Canadá, Reino Unido, Japão, Escandinávia e Croácia, publicados em 2012, demonstram que 7% a 23% dos entrevistados foram identificados como bullies (agressores), 5% a 12% como vítimas e 2% a 21% como bully/victims (agressores/vítimas) (Sesar, Barišić, Pandža & Dodaj, 2012). Segundo Martins (2005, p. 403) “O fato do bullying ser um fenómeno grupal, sugere que os programas de prevenção da violência escolar devem dirigir-se mais aos grupos, escolas e turmas, do que aos indivíduos; e o facto de se manifestar sob diferentes formas – físico, verbal e indireto – sugere que as estratégias de intervenção ou prevenção deverão levar em consideração o tipo de bullying que pretendam prevenir ou erradicar”. Sendo assim e partindo do pressuposto que a Escola, como Instituição, é garantia de que o ensino é transmitido num ambiente seguro e saudável, propomo-nos, no âmbito deste estudo, caracterizar o fenómeno bullying no seio de um grupo de estudantes que frequentam um estabelecimento de ensino do Norte de Portugal e avaliar o impacto que um programa de intervenção, em que esteja envolvida a comunidade educativa, pode exercer na prevenção e combate a este fenómeno. METODOLOGIA Participantes: Na avaliação inicial (novembro de 2012: n= 313) da dimensão do fenómeno em causa, a seleção dos estudantes foi feita de forma aleatória e estratificada por anos de escolaridade, obtendo uma amostra de 313 estudantes de turmas do 2º e 3º ciclos do ensino básico. No segundo momento de avaliação (junho de 2013: n=298) avaliou-se o programa de intervenção. Na realização deste estudo foram tidos em consideração todos os procedimentos éticos de acordo com os padrões estabelecidos na Declaração de Helsínquia. Para além dos estudantes foram incluídos numa oficina de formação vinte docentes que representavam as turmas incluídas na amostra. Instrumentos: O Instrumento utilizado para a avaliação do fenómeno do bullying no AVENP foi o Questionário “Diagnóstico do Bullying na Escola” da Direção Geral da Saúde – Ministério da Saúde. Visão Geral do Programa (“Nós e os Outros”): Depois de termos conhecimento da dimensão do fenómeno, foi elaborado um programa de intervenção que intitulamos “Nós e os Outros”, o qual foi aprovado pela Direção do AVENP e pelo Conselho Cientifico-Pedagógico da Formação Contínua de Professores.


Com este Programa pretendeu-se: i) Determinar a distribuição do comportamento de bullying no AVENP ii) colaborar com os educadores e outros intervenientes no trabalho com adolescentes e jovens a desenvolver um programa de intervenção; iii) implementar um programa de intervenção e; iv) avaliar o efeito de um programa de intervenção sobre bullying na escola em causa. O Programa contemplou três dimensões: Dimensão I – Formação a pais/encarregados de educação e assistentes operacionais; Dimensão II – Na escola e espaços exteriores à escola: otimização dos recreios e espaços com menos supervisão; melhoramento dos transportes escolares e; Dimensão III - Intervenção com os estudantes: desenvolvimento de competências sociais positivas, incidindo nas práticas diárias de convívio baseado no respeito, enfatizando estratégias de comunicação eficazes, o espírito de grupo e de cooperação, o aumento da autoestima e o respeito pela diferença. No que se refere à Dimensão I foram realizadas duas ações de formação direcionadas aos pais/encarregados de educação e aos assistentes operacionais, no sentido de lhes dar conhecimento e sensibilizá-los para o projeto. Relativamente à Dimensão II e III, foi efetuada uma de oficina de formação a vinte docentes que teve a duração de 30 horas, sendo 15 horas de sessões formais conjuntas e 15 horas de sessões de trabalho autónomo. A oficina de formação decorreu entre Fevereiro e Maio de 2012, tendo os seguintes objetivos: i) promover a discussão sobre o fenómeno do bullying na comunidade escolar; ii) desenvolver conhecimentos sobre a natureza do bullying; iii) reconhecer as características dos intervenientes no bullying; iv) reconhecer os sinais de alerta do bullying; v) analisar dados nacionais e internacionais reveladores das consequências do bullying na saúde das crianças e futuros adultos; vi) desenvolver estratégias de gestão do bullying; vii) desenvolver estratégias de comunicação eficaz com todos os atores educativos; viii) desenvolver estratégias promotoras de saúde e bem-estar em sala de aula e nos espaços escolares; ix) sensibilizar para a importância do envolvimento de toda a comunidade na dinâmica preventiva e interventiva; planear a inclusão da área da prevenção da violência em meio escolar no projeto educativo da escola e no plano de atividades da turma e; x) promover a conceção de materiais pedagógicos adequados ao contexto, adaptando-os ao público-alvo.

Neste sentido, foram abordados os conteúdos e estratégias que a seguir se mencionam: i) Introdução à problemática da violência escolar/bullying; ii) Natureza do bullying (conceito); iii) características dos intervenientes no bullying (vitimas, agressores, testemunha - observador); iv) sinais de alerta e risco do bullying; v) consequências do bullying (pessoais, familiares e sociais); vi) a família dos intervenientes no bullying; vii) a comunicação interpessoal; viii) lidar com a diferença; ix) competências de comunicação e; x) competências sociais; xi) a interação grupal e; estratégias de gestão do bullying. A oficina de formação seguiu quatro fases metodológicas: 1ª Fase: Dos doze temas previstos, foram abordados os seis primeiros, através da leitura e discussão de textos, apresentação de temas teóricos, visualização de vídeos e análise de estudos científicos em sala de formação e, trataram-se os restantes seis através da técnica de rol-play, leitura e análise de textos; 2ª Fase: Os formandos aplicaram em contexto de sala de aula as estratégias de gestão de bullying abordadas nas sessões anteriores; 3ª Fase: Fez-se uma reflexão sobre a aplicabilidade das intervenções e ajustaram-se de acordo com as situações apresentadas melhorando as práticas e; 4ª Fase: Realizou-se a avaliação da implementação das estratégias no espaço escolar, com a apresentação dos trabalhos desenvolvidos e implementados com os estudantes em sala de aula, nos espaços exteriores e interiores da escola, a partir do diagnóstico feito, de acordo com as sugestões que lhes foram transmitidas ao longo da oficina de formação. No final da oficina de formação foi realizada a sua avaliação através do preenchimento de uma ficha de avaliação da ação, de um relatório de reflexão crítica dos formandos, de um relatório dos formadores e de um relatório do consultor. Análise estatística: Os dados do questionário foram tratados com recurso ao programa informático Statistical Package for Social Sciences (IBM-SPSS, versão 21), com recurso a testes estatísticos no contexto de um design intra-sujeitos.

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RESULTADOS O fenómeno do bullying foi avaliado em dois momentos no mesmo grupo de estudantes do 2º e 3ºciclos do ensino básico distribuídos pelos diferentes anos letivos refletindo cada momento o antes e após a implementação do programa de intervenção. A perda de sujeitos entre os dois momentos foi de 15 indivíduos, correspondendo a 4.8% do total de estudantes incluídos na amostra (Tabela 1). Tabela 1 - Características da amostra para os dois momentos de avaliação no que se refere à idade, sexo e ano de escolaridade

Idade (anos) Média Moda Máximo Mínimo DP Sexo (%) Feminino Masculino Ano de escolaridade (%) 5º ano 6º ano 7º ano 8º ano 9º ano

Avaliação 1

Avaliação 2

n=313

n=298

12.5 12 16 09 1.76

13.0 13 17 10 1.75

52.4% 47.6%

49.6% 50.4%

19.0% 18.7% 23.2% 19.4% 19.7%

18.9% 18.3% 22.9% 19.6% 20.3%

Globalmente, a percentagem de estudantes que afirmou, em algum momento, já ter sido vítima de bullying nos últimos dois meses foi de 14.6% na primeira avaliação e de 10.7% na segunda avaliação. Relativamente aqueles que se assumem como agressores em algum momento nos últimos dois meses, as percentagens variam entre 4.7% para o bullying sexual e 23.4% para o bullying verbal. Procurou-se a existência de diferenças com significado estatístico no que se refere ao relato da prática de comportamentos agressivos no caso dos estudantes que se identificam como bully-provocadores e também, em relação àqueles que relatam terem sido vítimas de bullying entre os dois momentos de avaliação. As respostass variaram ordinalmente entre nunca (1) e várias vezes por semana (5). Para cada uma das duas vertentes foram analisadas quatro dimensões do bullying (físico, verbal, social e sexual). A análise dos resultados através do Teste de Wilcoxon revelou a existência de significado estatístico marginal para os comportamentos agressivos de bullying verbal (Z= -1.808, p=.071). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 18

A intensidade do fenómeno relatado pelos estudantes que assumiram comportamentos de agressividade verbal diminuiu marginalmente depois da implementação do programa de intervenção. Na análise descritiva verifica-se que a percentagem daqueles que relatam nunca terem comportamentos de agressividade verbal nos últimos dois meses aumentou de 76.6% para 80.5% entre os dois momentos. Estes dados revelam ainda que o bullying verbal é a dimensão do fenómeno com maior prevalência (Tabela 2). Tabela 2 - Percentagem de estudantes que relatam ausência de práticas agressivas para os dois momentos de avaliação pelos diferentes tipos de bullying Avalia- Físico % Verbal %Social % Sexual% ção Nunca foram vítimas de bullying nos últimos dois meses

1ª 2ª

75.6 81.2

63.9 88.1 92.3 69.7 88.8 93.0

Nunca tiveram práticas de agressividade nos últimos dois meses. (Buliprovocadores)

1ª 2ª

83.2 83.1

76.6 90.2 95.3 80.5 89.3 94.2

Ainda, como se verifica na Tabela 2, constatou-se, também, uma tendência de aumento dos estudantes que relatam nunca ter sido vítimas de bullying nos últimos dois meses em todas as quatro dimensões analisadas e um aumento residual do número de estudantes que revelaram terem comportamentos de agressividade nos últimos dois meses nas dimensões social e sexual. No entanto, em nenhuma destas dimensões das duas vertentes foram encontradas diferenças significativas que possam atribuir essa variabilidade ao programa de intervenção desenvolvido. DISCUSSÃO As percentagens de práticas de bullying encontradas neste estudo aproximam-se de outras investigações (Sesar, et al., 2012; WHO-Europe, 2012) que variam entre 5 a 12%. Relativamente aos agressores os dados também apontam para a comparabilidade com dados internacionais (Sesar, et al., 2012; WHO-Europe, 2012). Os resultados sugerem uma diminuição da existência do bullying verbal como consequência do programa de intervenção, o que indica uma alteração comportamental, ainda que ténue, decorrente das atividades desenvolvidas. Provavelmente, este facto deve-se à enfatização da comunicação interpessoal, estratégias de comunicação e competências sociais abordadas na oficina de formação.


O facto de ter diminuído ligeiramente o número de estudantes que nunca revelaram ter práticas de agressividade nos últimos dois meses, no que se refere ao bullying social e sexual, pode ser justificado pela baixa prevalência dessas práticas específicas e, simultaneamente, no segundo momento, os estudantes estarem mais sensibilizados para o fenómeno e reconhecerem mais facilmente estas práticas como agressivas. De realçar, que o 2º momento avaliativo foi efetuado no final do ano letivo, para garantirmos que os sujeitos avaliados nos dois momentos fossem os mesmos. Contudo, em termos de Educação para a Saúde (EPS), a avaliação de alteração de comportamentos exige um processo de mudança contínuo e prolongado, para que essa alteração ocorra, pelo que, novas avaliações serão necessárias no futuro. CONCLUSÕES (IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA)

Para prevenir o bullying, os programas devem envolver toda a comunidade escolar (estudantes, professores, pais, e outros elementos que integram direta ou indiretamente a escola). O programa apresentado foi de encontro a este princípio. Para além deste aspeto, a necessidade de intervenção nesta área foi detetada por este AVENP, condição imprescindível para que esta tivesse sido efetuada. Ao longo do ano letivo, foi sentido e demonstrado interesse em todos os atores escolares relativamente ao projeto, o que facilitou o seu envolvimento e a implementação do programa. Embora este tenha terminado, a Escola em causa mantem-se atenta a este fenómeno e, inclusivamente, já no presente ano letivo (2013/2014) comemorou o dia mundial do combate ao bullying (20 de Outubro). No entanto, considera-se pertinente que este tema conste do programa educativo desta Escola, o que permitiria uma abordagem e consciência longitudinal do fenómeno. Sendo um problema com características muito alternantes, a Escola tem o papel de o monitorizar, no sentido de, com frequência, se modificarem práticas. O programa de intervenção apresentado respondeu às necessidades da Escola, dado que foi enfatizada a necessidade de percecionarem o fenómeno como complexo, sendo da responsabilidade de todos e que exige continuidade. Neste sentido, o programa implementado teve implicações importantes para as práticas pedagógicas que promovem a saúde, e concretamente, a saúde mental dos estudantes.

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 20

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SUPORTE SOCIAL, EMPOWERMENT E DOENÇA CRÓNICA | Madalena Cunha1; Rosa Chibante2; Suzana André3 |

RESUMO CONTEXTO: O empowerment é uma filosofia exigível às pessoas com doença crónica como a diabetes de forma a superar as exigências da convivência diária com a própria doença. Por sua vez, o apoio social é um recurso cujo suporte informativo, emocional e instrumental, assume um papel de relevo na promoção da autogestão da doença crónica, contribuindo para o desenvolvimento da capacitação das pessoas para ultrapassar os obstáculos com que se deparam no seu dia-a-dia. OBJETIVO: Avaliar se o apoio social prediz o empowerment. METODOLOGIA: O estudo descritivo foi realizado numa amostra não probabilística constituída com 150 pessoas com diabetes acompanhadas em unidades de saúde de cuidados de saúde primários, na Consulta de Diabetes. A média de idades foi de 66,85 anos, a maioria casados/em união de facto, aposentados, com prevalência do 1º ciclo do ensino básico. Na colheita de dados utilizou-se o Diabetes Empowerment Scale (Anderson, Funnell, Fitzgerald & Marrero, 2000) e a Escala de Apoio Social (Matos e Ferreira, 2000). RESULTADOS: A maioria dos participantes pontuou com elevado empowerment e que o apoio social foi percecionado como bom. A escolaridade e a profissão estão positivamente relacionados com o empowerment. O apoio social revelou-se um preditor positivo da capacitação, explicando 17,1% da sua variabilidade, constatando-se que quanto melhor o apoio social, maior a capacitação manifestada pelas pessoas com diabetes. CONCLUSÕES: Englobar a gestão dos recursos de apoio social na Consulta de Enfermagem/Diabetes assume-se como uma estratégia promotora do empoderamento/capacitação das pessoas com diabetes. PALAVRAS-CHAVE: Poder (Psicologia); Apoio social; Diabetes mellitus

RESUMEN

ABSTRACT

“Apoyo social, empoderamiento y enfermedades crónicas”

“Social Support, Empowerment and Chronic Disease”

CONTEXTO: Empowerment es una filosofia exigible a las personas con enfermedades crónicas como la diabetes para superar las exigencias de la convivencia diaria con la própria enfermedad. El apoyo social es un recurso cuyo soporte informativo, emocional e instrumental, asume un papel importante en la promoción de la autogestión en la enfermedad crónica, que contribuye para el desarrollo de la capacidad de ultrapasar los obstáculos con los que se deparan en el día-a-día. OBJETIVO: Evaluar si el apoyo social predice el empowerment. METODOLOGÍA: El estudio descriptivo se realizó en una muestra no probabilística constituida con 150 personas con diabetes. La edad media fue de 66,85 años, la mayoría casados/vivendo en pareja, jubilado, con una prevalencia del 1º ciclo de la educación básica. En la recogida de datos se utilizó el Diabetes Empowerment Scale (Anderson et al., 2000) y la Escala de Apoyo Social (Matos e Ferreira, 2000). RESULTADOS: La mayoría de los participantes obtuvieron calificaciónes más altas en el empowerment y que el apoyo social fue percebido como bueno. La escolaridade y la profesión están relacionadas positivamente con el empowerment. El apoyo social ha demostrado ser un predictor positivo de la capacitación, explicando 17,1% de su variabilidad, constatándose que cuanto mejor es el apoyo social, mayor es la capacidad manifestada por las personas con diabetes. CONCLUSIONES: Incluir la gestión de los recursos de apoyo social en la consulta de Enfermería/Diabetes se assume como una estratégia para promover el empoderamento/capacitación de las personas com diabetes.

BACKGROUND: Empowerment is a philosophy demanded to people with chronic disease such as diabetes in order to overcome the requirements of daily living with the disease itself. In turn social support is a resource whose information, emotional and instrumental support plays an important role in promoting selfmanagement of diabetes, contributing to the development of capacity of people to overcome the obstacles they encounter in their day-to-day. AIM: To evaluate whether social support predicts the empowerment. METHODS: This descriptive study was conducted in a non-probability sample was composed of 150 people with diabetes followed in health facilities of primary health care, in Consultation Diabetes. The average age was 66,85 years, most married/living with a partner, retired, with a prevalence of the 1st cycle of basic education. In data collection used the Diabetes Empowerment Scale (Anderson, Funnell, Fitzgerald & Marrero, 2000) and the Social Support Scale (Matos e Ferreira, 2000). RESULTS: The majority of participants were scored with high empowerment and social support was perceived as being good. The educational level and the professional activity are positively related to the empowerment. The social support proved to be a positive predictor of training, explaining 17,1% of its variability, noting that the better social support, greater training/empowerment manifested by people with diabetes. CONCLUSIONS: Include the management of the resources of social support in Nursing Consultation/Diabetes is assumed as a strategy to promote the empowerment/training of people with diabetes.

DESCRIPTORES: Poder (Psicología); Apoyo social; Diabetes mellitus

KEYWORDS: Power (Psychology); Social support; Diabetes mellitus

1 Doutora em Psicologia; Centro de Estudos em Educação, Tecnologias e Saúde (CI&DETS) – Unidade de Investigação e Desenvolvimento (U&ID); Docente no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu – Departamento de Enfermagem, Viseu, Portugal, madac@iol.pt 2 Mestranda em Enfermagem Comunitária; CI&DETS – Unidade de Investigação e Desenvolvimento (U&ID), Instituto Politécnico de Viseu, chibante.rosa@gmail.com 3 Doutora em Ciências de Enfermagem; Docente no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde de Viseu – Departamento de Enfermagem, sandre@essv.ipv.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 14-02-2014 Citação: Cunha, M., Chibante, R., & André, S. (2014). Suporte social, empowerment e doença crónica. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 21-26. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 21


INTRODUÇÃO As doenças crónicas são consideradas uma epidemia, constituindo um sério problema de saúde pública a nível mundial, sendo-lhe atribuído 84,0% das mortes em 2008, (World Health Organization, (2011). Neste tipo de doenças está incluída a diabetes, cuja incidência e prevalência têm aumentado, a nível mundial, prendendo-se este facto com diversos fatores tais como: o envelhecimento da população, a crescente urbanização e a adoção de estilos de vida pouco saudáveis tais como o sedentarismo, a alimentação inadequada, entre outros (Temprão, 2006 cit por Ribeiro, 2010). Também em Portugal, se mantém essa tendência de crescimento da diabetes, existindo de acordo com o Relatório Anual do Observatório Nacional da Diabetes (Boavida et al., 2012), 991 mil pessoas com diabetes, o que corresponde a 12,4% da população com idade entre os 20 e os 79 anos. Neste âmbito, é particularmente preocupante a elevada incidência e prevalência da diabetes mellitus tipo 2 cujo aumento se traduz em proporções epidémicas, com repercussões ao nível da incapacidade e mortalidade prematura, dos gastos elevados com os tratamentos, para além das implicações e impacto pessoal, familiar e social da doença. Por estes motivos emerge a necessidade de “educar sobre a gestão da diabetes”, no intuito de desenvolver no indivíduo conhecimento, atitudes e habilidades necessárias ao adequado desempenho e autocontrolo da doença (Ribeiro, 2010). Em termos clínicos, o bom controlo metabólico de uma pessoa com diabetes só será conseguido se existir monitorização diária dos níveis de glicémia capilar, controlo da pressão arterial, peso corporal, toma correta da medicação, cuidados com os pés, prática de exercício físico e alimentação adequada. Todas estas exigências acarretam, por vezes, stresse físico e psicológico quer no doente, quer nos seus familiares (Martire et al., 2004 cit por Ribeiro, 2010). Daí que as equipas de saúde deverão proporcionar ao cidadão ferramentas, que, livremente, possam potenciar o seu empowerment, desenvolvendo na pessoa com diabetes maior autonomia e ganhos em saúde (Pereira, Fernandes, Tavares e Fernandes, 2011). O foco de atenção do sistema de saúde deve por isso centrar-se no cidadão, perspetivando-o como alguém livre com capacidades e habilidades de liderança no seu processo de vida e de saúde. Hammerschmidt & Lenardt (2010, p. 363) advogam mesmo que o empoderamento da pessoa idosa com diabetes, é entendido como Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 22

uma tecnologia educacional inovadora, pois permite a aprendizagem dialógica e o desenvolvimento de consciência crítica na qual o idoso com diabetes encontra sentido para um modo de viver saudável próprio/ autónomo/personalizado. Assim, a capacitação resultará da colaboração entre o profissional de saúde e o idoso com diabetes perspetivando a construção e reconstrução do conhecimento por parte deste, acerca da doença e suas consequências, de forma a poder tomar decisões informadas sobre o seu autocuidado. Trata-se pois de um processo educativo, relacional e progressista, que valoriza a experiência das vivências, o modo e o contexto de vida, transformando o idoso num ser crítico e agente da mudança da sua própria realidade, constituindo-se como cidadão e protagonista da sua vida (Hammerschmidt & Lenard, 2010, pp. 363-364). O atual Plano Nacional de Saúde 2011/2016 salienta que o desenvolvimento da cidadania em saúde passa pelo reforço do poder e da responsabilidade do cidadão para a melhoria individual e coletiva, exigindo um investimento na promoção de uma dinâmica contínua de desenvolvimento, aumentando a literacia em saúde, proporcionando pro-atividade, compromisso e autocontrolo do cidadão, com a finalidade de o tornar autónomo e responsável, fomentando o empoderamento (Campos e Carneiro, 2011). As pessoas com doenças crónicas, como a diabetes, são confrontadas, no seu dia-a-dia, com a tomada de decisão acerca da autogestão da sua doença, tornando-se necessária a educação para essa autogestão. Através de ações de apoio social são desenvolvidos mecanismos de aproximação dos doentes, atingindo objetivos comuns, contribuindo favoravelmente para o empowerment, no sentido do desenvolvimento e da descoberta de capacidades individuais do aumento de autoestima e de um papel mais ativo no tratamento. (Andrade & Vaintsman, 2002). Neste âmbito, sabe-se, atualmente, que a disponibilidade de apoio social, facultado por familiares, amigos ou outros poderá ser uma mais-valia para o controlo de doenças crónicas como a diabetes. No que aos profissionais de saúde diz respeito, a maioria dos estudos revela que o suporte social facultado quer pelos prestadores formais quer informais é de extrema importância nas práticas de gestão do autocuidado na diabetes (Tanqueiro, 2013). “Os cuidadores formais ensinam, orientam, aconselham, confirmam, modificam e monitorizam os idosos com diabetes sobre questões de gestão de autocuidado, alterando as estratégias sempre que é necessário e ajudando a desenvolver habilidades e


regimes de autogestão de cuidados” (Huang et al., 2004; Morrow et al., 2008; Moser et al.,2008 cit por Tanqueiro, 2013, p. 158). Por sua vez, Correia (2007) cit por Ribeiro (2010), advoga que a disponibilidade de apoio social facultado por familiares, amigos ou outros poderá ser uma maisvalia para o controlo da diabetes. A perceção de apoio social num indivíduo com doença crónica tem efeitos positivos no controlo da doença, tendo implicações práticas, na medida em que uma pessoa que percecione um bom apoio social terá maior facilidade em se adaptar física e psicologicamente a uma doença crónica (Saborit, 2003 cit por Boas, 2009). Os estudos de Sousa & Zausziewski (2005) citados por Tanqueiro (2013) revelaram que os conhecimentos sobre a diabetes parecem ser fundamentais para o reforço da capacidade de autocuidado e confiança (autoeficácia), que em conjunto (…) com a promoção do apoio social contribuem para a melhor gestão da doença. Deste modo, o apoio social tem um papel importante na adaptação à doença, nomeadamente, no que se refere à doença crónica, na medida em que esta impõe elevadas exigências adaptativas. O apoio social é por isso, considerado como um vetor que promove benefícios físicos e psicológicos para a saúde, dado que os doentes que o percecionam e o experienciam, recuperam mais rapidamente da doença, reduzindo, a longo prazo, a mortalidade e servindo, de igual modo, como uma ferramenta de autonomia na gestão do processo saúde/doença na comunidade (Mendoza & Faro, 2009). METODOLOGIA O presente estudo caracteriza-se por ser transversal, de natureza observacional e análise descritivo-correlacional e teve como finalidade determinar o grau de capacitação das pessoas com diabetes e avaliar em que medida o apoio social percecionado pelas mesmas prediz a variabilidade do seu empoderamento.

- Um questionário sociodemográfico e clínico; - A Escala de Empowerment: “ The Diabetes Empowerment Scale”(Anderson et al., 2000); versão traduzida e adaptada para português por Coimbra e Cunha (2011). Inclui 28 questões, avaliadas numa escala tipo Likert (de 1 a 5 pontos) e constituída por três subescalas, as quais avaliam a gestão dos aspetos psicossociais da diabetes; a insatisfação/prontidão para a mudança e a capacidade de estabelecer e alcançar metas na diabetes. - A Escala de avaliação do Apoio Social de Matos e Ferreira (2000) é constituída por um conjunto de 16 questões, avaliadas numa escala tipo Likert (1 a 5 pontos), correspondendo o último valor a níveis mais elevados de apoio social, com exceção dos itens 2; 5; 12; 13; 14 e 16 que apresentam cotação inversa. Esta escala avalia a disponibilidade do apoio informativo, emocional e instrumental percecionado pelo indivíduo. A utilização de ambos os instrumentos foi autorizada pelos seus autores. Procedimentos O estudo obteve parecer positivo da Comissão de Ética da Escola Superior de Saúde de Viseu e a colheita de dados foi autorizada e realizada nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2012, na Consulta de Diabetes, em unidades de saúde de cuidados de saúde primários da região centro. O instrumento de colheita de dados foi auto preenchido pelos utentes/investigadores. Foram explicadas a finalidade e o objetivo do estudo a cada participante e, obtido o seu consentimento informado, garantindo o anonimato e a confidencialidade. Os dados referentes a cada escala e subescala foram calculados seguindo as recomendações dos autores. Foi utilizado o software informático SPSS 21.0 para o tratamento estatístico.

Participantes A amostra foi selecionada de forma não probabilística e por conveniência, sendo constituída por 150 pessoas com diabetes seguidas na Consulta de Diabetes das unidades de saúde de cuidados de saúde primários da região centro. Foram participantes os que reuniram os seguintes critérios: - idade superior a 18 anos; - diagnóstico de diabetes há mais de um ano. Instrumentos O instrumento de colheita de dados incluiu: Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 23


ANÁLISE DOS RESULTADOS A amostra ficou igualmente representada face ao sexo (50,0%). A idade oscilou entre os 28 e os 90 anos, com uma média de idades de 66,85 anos (± 9,72), sendo 72,7% casados/em união de facto, possuindo baixo nível de escolaridade, cerca de 64,7% detêm o 1º ciclo do ensino básico e cerca de 13,3% são analfabetos. Residiam, predominantemente, em meio rural (56,0%), possuindo como fonte de rendimento maioritariamente, a reforma/pensão (74,7%), relatando, a maioria ter dificuldades financeiras (48,7%). A diabetes tipo 2 é predominante (88,0%) e em média, a doença foi diagnosticada há cerca de 11,56 anos (±10,62). Maioritariamente, os inquiridos usam um registo que os identifica como diabéticos (58,0%), dos quais 71,3% mencionam tratar-se do “Guia do diabético”. A maioria dos participantes efetua a pesquisa da glicémia capilar (90,7%) e desses, 83,3% fazem-no sem ajuda de terceiros. A prática de exercício físico é indiciada como a maior dificuldade sentida (82,7%). Dos participantes, 38,0% apresentam excesso de peso e 51,3% apresentam obesidade, dos quais 1,3% revelam obesidade mórbida (grau III). O risco metabólico e cardiovascular está presente em 89,3% dos homens, dos quais, 60,0% evidenciam risco muito aumentado (perímetro da cintura ≥ 102cm) e cerca de 98,7% das mulheres também apresentam risco metabólico e vascular, salientando risco muito aumentado em 86,7%. Da amostra, 64,4% revela mau controlo glicémico e, por conseguinte, encontram-se com risco metabólico, apresentando valores de hemoglobina glicosilada iguais ou superiores a 6,5%. O risco cardiovascular associado à existência de hipertensão arterial sistólica está patente em 82,0% dos participantes. A análise da variabilidade dos valores do empowerment permitiu constatar que em 36,7% dos participantes ele é elevado, em 30,0% razoável e 33,3% evidenciam fraco empowerment. Quanto à relação deste com as variáveis sociodemográficas verificou-se que: - os homens possuem em média scores de empowerment mais elevados (80,28 vs 70,72); - os mais jovens também pontuaram com valores médios de empowerment superiores aos das pessoas idosas (94,89 vs 71,39); - os casados/em união de facto revelaram melhor pontuação de empowerment do que os que viviam sozinhos (77,28 vs 70,76), porém em todas as situações sem significância estatística. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 24

A escolaridade, a profissão e o modo como a exercem estão positivamente relacionados com ao empowerment dos sujeitos, mostrando os resultados que as pessoas com habilitações mais elevadas apresentaram valores de empowerment superiores (123,71 vs 47,78), (H = 17,028, p = 0,001) e os trabalhadores por conta própria são também os que pontuam com melhor empowerment, (H = 11,879; p = 0,003). No referente às variáveis clínicas, apesar do empowerment ser mais elevado nas pessoas cuja duração da diabetes é mais longa e naquelas cujo valor de HbA1c é mais baixo, não se apurou significância estatística na relação entre o tempo de diagnóstico da diabetes e o empowerment (t = 0,045; p = 0,964), nem entre este e o estado metabólico. (t = -1,059; p = 0,291).Observamos que 44,0% dos inquiridos evidenciam “bom apoio social”, 25,3% revelam “razoável apoio social” e 30,7% manifestam “fraco apoio social”. As pessoas que percecionam auferir de melhor apoio social evidenciam também melhor empowerment. Aqueles que percecionam ter bom apoio emocional, informativo e instrumental revelam empowerment mais elevado (r = 0,410, p = 0,000; r = 0,403, p = 0,000; r = 0,288, p = 0,005 respetivamente). O apoio social explica em 17,1% a variabilidade do empowerment das pessoas com diabetes. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Observámos que alguns aspetos sociodemográficos guardam neste estudo relação com o empowerment, nomeadamente: a situação na profissão, o modo como exerceu/exerce a profissão, o nível de escolaridade, isto é, os grandes industriais e comerciantes, gestores de topo de grandes empresas/administração pública, profissionais liberais, os trabalhadores por conta própria, com habilitações literárias mais elevadas pontuaram com melhor empowerment global. Similarmente, Tol, Shojaeezadeh, Sharifirad, Alhani & Tehrani (2012), concluíram que o género, a idade e o nível de escolaridade influenciam, significativamente o empowerment das pessoas com diabetes. As pessoas com diabetes podem ser habilitadas para gerir a sua doença crónica se forem adequadamente formadas/informadas (Liu, Tai, Hing, Hsieh & Wang, 2010). Também Tol et al. (2012) advogam que qualquer melhoria na capacitação das pessoas com diabetes, pode promover melhor controlo da doença, pressuposto que não foi verificado no presente estudo, pois a associação inversa entre o HbA1c e o empowerment não apresentou significância estatística significativa.


O apoio social reforça as capacidades pessoais e sociais, através do empowerment, o qual é um processo e resultado da ação social, favorável ao controlo das próprias vidas pelos próprios doentes (Canesqui & Barsaglini, 2012). Em consonância, os nossos resultados patenteiam a existência de uma associação positiva entre o apoio social e o empowerment, inferindo-se que os utentes com melhor apoio social, possuem melhor empowerment. Concretizando, observamos uma associação positiva de elevada significância entre o apoio emocional e o empowerment (r = 0,410; p = 0,000). “Factores psicossociais e comportamentais como crenças em saúde, grau de aceitação da doença, (…), suporte social, influências contextuais, habilidades para o autocuidado, prontidão para mudanças, ajustamento psicossocial, estratégias para enfrentamento da situação, locus de controlo, bemestar emocional, maturidade cognitiva, estado de saúde, complexidade dos regimes terapêuticos e estruturação dos serviços de saúde são determinantes dos comportamentos relacionados com a diabetes” (Grossi & Pascali, 2009, p.21). Também Cunha, Nunes e Aparício (2009) advogam que “a aprendizagem de um conjunto de estratégias do tipo instrumental no conforto com a diabetes, como a resolução de problemas específicos, (administração de insulina, pesquisa de glicemia, adesão ao plano alimentar (…), aliada à procura de ajuda e da adequada informação sobre as implicações metabólicas dela decorrentes, tornam-se relevantes para a gestão da diabetes” (Cunha et al., 2009, p.444). O suporte social contribui ainda para o controlo da vida, beneficiando o estado de saúde das pessoas e, por conseguinte, é um elemento facilitador do empowerment (Valla, 1999 cit por Amorim, 2009). Relativamente à diabetes, o contexto social dos doentes portadores desta doença é reconhecido como um propulsor para a aquisição de capacidades que facilitam a gestão da doença de forma eficaz (Fragoso, 2009). Na revisão da literatura realizada por Nunes (2005), está documentado que o apoio social induz benefícios físicos e psicológicos, facultando às pessoas, que dele usufruem, um melhor ajuste aos acontecimentos indutores de stress, uma melhor recuperação de uma doença diagnosticada recentemente e reduz o risco de mortalidade a determinadas doenças, como é o caso da diabetes (Nunes, 2005).

CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Esta pesquisa apesar de não representar a população dos diabéticos portugueses, mostrou-nos resultados pertinentes, evidenciando a importância do suporte social no empoderamento/capacitação dos idosos com diabetes. Como limitações do estudo assinalamos a existência de um baixo nível de escolaridade assim como baixa literacia em saúde dos participantes que condicionaram, por vezes, o auto preenchimento do instrumento de colheita de dados. Estes aspetos deverão ser considerados na prática de cuidados e de investigação. Tendo em consideração os resultados obtidos, considera-se que as relações sociais que a pessoa mantém podem facilitar ou promover comportamentos promotores e/ou protetores de saúde e que o apoio social pode ser um valioso recurso, capaz de promover uma melhor adaptação da pessoa às exigências impostas pela diabetes, constituindo, assim, uma ferramenta importante para o incremento do empowerment das pessoas com diabetes. Neste sentido, consideramos que a nova filosofia de intervenção proposta aos profissionais de saúde/ajuda como os enfermeiros, deverá sustentar-se em estratégias que promovam o empowerment das pessoas, facultando-lhes apoio informativo, emocional e instrumental que favorecem a capacitação para a autonomia e autogestão da diabetes. Para que tal aconteça, dever-se-á incentivar à mudança de comportamentos de ajuda especializada por parte dos profissionais de saúde, focando o seu empenho nas boas práticas de cuidados de saúde humanizados, ricos em calor humano, técnica e cientificamente corretos com especial enfoque para considerar os determinantes sociais facilitadores do empoderamento/capacitação dos doentes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Amorim, M. I. S. P. L. (2009). Para lá dos números… Aspetos psicossociais e qualidade de vida do indivíduo com diabetes mellitus tipo 2. Tese de Doutoramento em Saúde Mental, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Porto. Acedido em: http://repositorioaberto.up.pt/bitstream/10216/7211/2/Aspectos%20 psicossociais%20e%20Qualidade%20de%20Vida%20 do%20indivduo%20com%20Diabetes%20Mellitus%20 tipo%202.pdf

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INDICADORES DE SAÚDE MENTAL COMO FATORES PREDITORES DE FRAGILIDADE NOS IDOSOS | Mafalda Duarte1; Constança Paúl2 |

RESUMO Na base do estudo da condição de fragilidade nas pessoas idosas destaca-se o modelo de Fried e colaboradores (2001) que fundamenta o Fenótipo de Fragilidade como uma síndrome composta por cinco critérios: perda de peso, resistência, baixa atividade física, lentidão e fraqueza. Quando são cotados três destes critérios a pessoa idosa é considerada frágil, entre um e dois é considerada pré-frágil e com nenhum critério é considerada robusta (não frágil). Da revisão da literatura efetuada são identificados uma panóplia de fatores que potenciam esta condição. O presente estudo visa identificar o valor preditivo de indicadores de saúde mental na fragilidade fenotípica. Para tal constituiuse uma amostra representativa de pessoas idosas a residirem na comunidade, no concelho de Guimarães (n=338). Desenvolveu-se um protocolo de fragilidade, que integrou os critérios de fragilidade e indicadores de saúde mental. Verificou-se uma prevalência acentuada da fragilidade fenotípica (34,9%) e da análise dos modelos de regressão logística verificou-se que a deterioração cognitiva (OR=2,9, 95% IC 1,6-5,3) e a presença de sintomatologia depressiva (OR=4,2, 95% IC 1,9-9,2) predizem esta condição. Desta forma, a condição mental da pessoa idosa deve ser tida em consideração de forma a retardar e minimizar a fragilidade na velhice. PALAVRAS-CHAVE: Envelhecimento; Idosos; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“Indicadores de salud mental como predictores de fragilidad en el anciano”

“Mental health indicators as predictor frailty in old age”

Sobre la base del estudio de la condición de fragilidad en los ancianos se destaca el modelo de Fried y colaboradores (2001) que fundamenta el Fenotipo de la Fragilidad como un síndrome que consiste en cinco criterios: la pérdida de peso, la resistencia, la escasa actividad física, la lentitud y la fragilidad. Cuando tres de estos criterios son observados, el anciano es considerado frágil, entre on y dos se considera pre-frágil y si no presenta ningún criterio se considera robusto (no frágil). A partir de la revisión bibliográfica realizada se identifican una serie de factores que potencian esta condición. Aquí surge la pertinencia de este estudio, que tiene como objetivo identificar el valor predictivo de los indicadores de salud mental en la fragilidad fenotípica. Para esto se constituye una muestra representativa de personas mayores que residen en la comunidad, municipio de Guimarães (n=338). Se desarrolló un extenso protocolo de fragilidad, que incorporó los criterios de fragilidad y los indicadores de salud mental. Se verificó una prevalencia acentuada de fragilidad fenotípica (34,9%) y el análisis de los modelos de regresión mostró que el deterioro cognitivo (OR=2,9, 95% IC 1,6-5,3) y la presencia de sintomatología depresiva (OR=4,2, 95% IC 1,9-9,2) predicen esta condición. Por lo tanto, la condición mental de los mayores se debe tomar en consideración con el fin de retardar y minimizar la fragilidad en la vejez. DESCRIPTORES: Envejecimiento; Anciano; Salud mental

On the basis of studying the condition of frailty we highlight the model of Fried and collaborators (2001) that underlies the Phenotype of Frailty as a syndrome consisting of five criteria: weight loss, endurance, physical activity, slowness and weakness. When three of these criteria are mentioned the elder is considered frail, between one and two is considered pre - frail and with no criterion is considered robust (not frail). The literature review identified a range of factors that enhance this condition. So emerges the relevance of this study that aims to identify the predictive value of mental health indicators in the frailty phenotype. To this we constituted a representative sample of elders residing in the community, in the municipality of Guimarães (n=338). An extensive protocol of frailty was developed, which incorporated the criteria for frailty and mental health indicators. There was a severe prevalence of phenotipical frailty (34.9%) and from the analysis of regression models we have seen that cognitive impairment (OR = 2.9, 95 % CI 1.6 to 5.3) and the presence of depressive symptoms (OR = 4.2 , 95 % CI 1.9 to 9.2 ) predict this condition. Thus, the mental condition of the elder should be taken into consideration in order to minimize and delay frailty in old age. KEYWORDS: Aging; Aged; Mental health Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 21-02-2014

1 Professora Doutora; Unidade de Investigação e Formação de Adultos e Idosos (UNIFAI); ICBAS – Universidade do Porto (UP), Rua de Jorge Viterbo Ferreira, nº 228, 4050313 Porto, Portugal, mafaldaduarte@hotmail.com 2 Professora Catedrática; Unidade de Investigação e Formação de Adultos e Idosos (UNIFAI); ICBAS – Universidade do Porto (UP), cpaul@up.pt Citação: Duarte, M. & Paúl, C. (2014). Indicadores de saúde mental como fatores preditores de fragilidade nos idosos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 27-32. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 27


INTRODUÇÃO A fragilidade tem vindo a merecer uma atenção crescente por parte dos clínicos e investigadores, o que fez espoletar um aumento do termo na literatura atual. Contudo verifica-se alguma confusão na utilização do mesmo, pois em inúmeras situações este é mencionado sem na realidade fazer referência ao que se pretende enunciar, facto do qual emana a necessidade de se clarificar este conceito no seio dos múltiplos modelos teóricos que o procuram fundamentar. Da análise temporal dos modelos teóricos existentes, constata-se o reconhecimento de uma progressiva complexificação do conceito desde a sua origem até às abordagens mais contemporâneas. Este conceito nasce nos modelos de cariz mais biológico e evolui até aos modelos multidimensionais que explicam o conceito de fragilidade nas pessoas idosas. Um dos contributos de destaque prende-se com o estudo longitudinal de Fried e colaboradores (2001) que fundamenta o “Fenótipo de Fragilidade” através da presença de três ou mais dos seguintes indicadores: 1) perda de peso: não intencional no último ano, ≥ 5% do peso corporal no ano anterior (por medição direta do peso); 2) fraqueza: diminuição da força (medida com o dinamómetro); 3) exaustão: auto relato de fadiga, identificado por duas questões da Escala de Depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos (CES-D); 4) lentidão: medida pela velocidade da marcha, indicada em segundos distância de 4,6m e 5) nível de atividade: resultado calculado de quilocalorias (kcal) gastas por semana e medido em função do auto relato das atividades e exercício físico realizados. Desta forma, os autores definiram três níveis de fragilidade: quando o sujeito apresenta três (ou mais) destes critérios é considerado “frágil”, quando apresenta um ou dois destes indicadores considera-se no estádio “pré - frágil” e os que não apresentam nenhum comprometimento a este nível são considerados “robustos” (não frágeis) (Fried et al., 2001). Sabe-se que esta condição potencia o risco de incapacidade, institucionalização, hospitalização e morte (Strandberg, Pitkãlã & Tilvis, 2011). Da revisão da literatura efetuada é identificada uma panóplia de fatores predisponentes desta condição, onde estão também presentes indicadores de saúde mental, mais precisamente ao nível da cognição e do humor. No que se refere ao domínio cognitivo, vários são os estudos que fundamentam a associação entre a fragilidade física com o desempenho intelectual (Ávila – Funes et al., 2009; Fried et al., 2001; Samper- Ternent, Snih, Raji, Markides & Ottenbacher, 2008). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 28

O projeto Rush Memory and Aging Project constatou que o risco de se desenvolver doença de Alzheimer foi de 2,5 vezes superior quando a fragilidade física estava presente (Buchman, Boyle, Wilson, Tang & Bennett, 2007). Outro dos estudos, é o Three- City Study que demonstrou que o declínio cognitivo é considerado um indicador preditivo da fragilidade fenotípica. Outros estudos corroboram estes resultados, na medida em que sugerem que o estado cognitivo dos indivíduos é considerado um marcador de risco da fragilidade fenotípica (Raji, Snih, Ostir, Markides & Ottenbacher, 2010). No Italian Longitudinal Study on Aging - ILSA constatou-se que o baixo desempenho cognitivo e a presença de sintomas depressivos estão associados com a fragilidade física (Solfrizzi et al., 2011). No Brasil, umas das linhas do projeto Fragilidade em Idosos Brasileiros – FIBRA constatou que as pessoas frágeis tinham um desempenho cognitivo pior, do que os pré-frágeis e os não frágeis (Yassuda et al., 2012). Os resultados do Jerusalem Longitudinal Cohort Study demonstraram que a condição de fragilidade está significativamente associada ao comprometimento cognitivo, com um odds ratio (OR) de 3,7 (Jacobs, Cohen, Ein - Mor, Maaravi & Stessman, 2011).Todavia, estes estudos não são totalmente conclusivos, pois parece existir um conjunto de mecanismos que influenciam mutuamente a condição de pessoa idosa frágil e a sua associação com a cognição. Deste modo, ressalva-se a necessidade de mais estudos, neste domínio, no sentido de se explicar esta relação, bem como perceber a progressão da condição de fragilidade (Shatenstein, 2011). No que diz respeito ao estudo do humor relacionado com a condição de pessoa idosa frágil a maioria dos resultados relata uma associação positiva entre a sintomatologia depressiva e a condição de fragilidade (Mezuk, Edwards, Lohman, Choi & Lapane, 2011). Contudo a investigação empírica espelha uma relação bidirecional entre estas duas condições. Gayman, Turner e Cui (2008) apuraram que a condição de fragilidade estava significativamente associada à sintomatologia depressiva. Chang e colaboradores (2009) atestaram que a fragilidade foi fortemente associada à presença de sintomas depressivos, no início da manifestação da fragilidade. Em suma, parece que a condição de pessoa frágil assume uma interligação com a saúde mental, nomeadamente com o défice cognitivo e sintomatologia depressiva o que sustenta a pertinência do presente trabalho empírico que visa identificar dimensões relacionadas com a saúde mental que possam ser preditoras da condição de fragilidade fenotípica.


METODOLOGIA A metodologia de investigação alicerçou-se num conjunto de passos investigacionais ao nível da composição da amostra, definição do instrumento utilizado e nomeação dos procedimentos para que a trabalho empírico fosse operacionalizado. Trata-se de um estudo transversal correlacional. Amostra Este estudo conta com uma amostra representativa, estratificada por classes etárias, de pessoas idosas a residirem na comunidade, no concelho de Guimarães, oriundas de 10 freguesias de duas comissões sociais. A definição das percentagens para cada um dos grupos realizou-se a partir dos dados do Censos 2001 (INE, 2002) relativos ao referido concelho. A amostra foi estratificada em três faixas etárias: entre 50- 59 anos (39,5%) 134 sujeitos; entre 60 – 69 anos (31,6%) 107 sujeitos; entre 70 – 79 anos (19,8%) 67 sujeitos e com mais de 80 anos (9,1%) 31 sujeitos, que perfaz um total de 339 inquiridos. Instrumentos Desenvolveu-se um protocolo alargado, que integrou os critérios ajustados ao modelo de fragilidade fenotípica: 1) perda de peso, 2) resistência, 3) fraqueza, 4) nível de atividade física e 5) lentidão (Fried et al., 2001); indicadores biocomportamentais e geriátricos, funcionalidade (Atividades de Vida Diária e Atividades Instrumentais de Vida Diária) e por fim indicadores de saúde mental (cognição e humor). O estado mental foi avaliada através Mini Exame do Estado Mental (Folstein, Folstein & McHugh, 1975) e a presença de sintomatologia depressiva com a Escala de Depressão Geriátrica (versão 15) (Sheikh & Yesavage, 1986). Procedimentos Gerais Foi constituída uma equipa, composta por dez profissionais de saúde, devidamente instruídos e treinados para a recolha de dados no domicílio. Cada protocolo foi administrado num único momento de avaliação e demorou cerca de 45 minutos a ser aplicado. Foram salvaguardados os princípios éticos e os direitos fundamentais do anonimato, do sigilo e da confidencialidade. Recorreu-se ao consentimento informado escrito. Para os procedimentos estatísticos recorreram-se a determinadas estratégias de análise, que passaram pela criação de um modelo ajustado ao modelo de Fried e colaboradores (2001) e definição da variável dependente (frágil

vs não frágil) para a aplicação do modelo de regressão logística, no sentido de se averiguar o poder preditivo das variáveis de saúde mental na condição de fragilidade. O suporte estatístico utilizado foi o SPSS - Statistical Package for Social Sciences, versão 20.0. Resultados Os resultados são apresentados em três patamares distintos, mais precisamente ao nível descritivo, com a caraterização sociodemográfica da amostra, prevalência do fenótipo de fragilidade e por fim ao nível inferencial, com aplicação do modelo de regressão logística. A amostra é composta por 158 Homens (46,6%) e 181 Mulheres (53,4%). A média (m) de idades é de 64,4 anos, com um desvio padrão (dp) de 9,25 anos. Ao nível do estado civil, 4,7% dos participantes são solteiros, 82% são casados e os restantes (13,3%) são viúvos, separados ou divorciados. Em termos do nível de literacia destaca-se que 11,2% da amostra são iletrados e os restantes 88,8% frequentaram a escola (Tabela 1). Tabela 1 - Caraterização sociodemográfica da amostra

Sexo Masculino Feminino Idade (média/ desvio padrão) Estado civil Solteiro Casado Viúvo/ Separado/Divorciado Escolaridade N/ frequentou Frequentou

n

%

158 181 64,4 (9,25)

46,6 53,4

17 277 45

4,7 82,0 13,3

38 301

11,2 88,8

Quanto ao estudo da prevalência da fragilidade fenotípica, verifica-se que 14,2% das pessoas idosas não pontuaram em nenhum dos cinco critérios de fragilidade; 172 (50,9%) pontuaram em um a dois critérios de fragilidade e 118 (34,9%) assumiu três a cinco critérios definidos pelo fenótipo de fragilidade (Tabela 2). É de salientar que um dos sujeitos foi eliminado do estudo porque não preencheu parte destes critérios, o que fez com que fosse excluído da amostra final. Tabela 2 - Prevalência do Fenótipo de Fragilidade

Níveis de fragilidade

Não Frágil (0 critério) Pré-Frágil (1-2 critérios) Frágil ( ≥ 3 critérios)

n= 338 n 48 172 118

% 14,2 50,9 34,9

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No que se refere ao estudo inferencial verifica-se que os indicadores de saúde mental estão relacionados com a condição de fragilidade de forma estatisticamente significativa (p <0,05) no modelo não ajustado, considerando um intervalo de confiança (IC) a 95%. O mesmo verifica-se quando se testa o modelo ajustado a estas mesmas variáveis e às variáveis sociodemográficas (sexo e idade). Desta forma, um idoso que apresente défice cognitivo assume 2,9 vezes maior probabilidade de ser frágil (OR=2,9, IC 95%: 1,6 - 5,3) relativamente a um idoso que não apresente défice cognitivo. No mesmo sentido, relaciona-se a presença de sintomatologia depressiva, verificando-se que uma pessoa idosa que apresente humor deprimido tem 4,2 vezes maior probabilidade de assumir características de uma pessoa frágil, quando comparada com uma pessoa idosa que não apresente humor deprimido (OR=4,2, IC 95%: 1,9 - 9,2). No geral, estes resultados demonstram o comprometimento cognitivo, e a presença de sintomatologia depressiva são fatores preditivos de fragilidade nas pessoas idosas. (Tabela 3). Tabela 3 - Modelo de regressão logística para a fragilidade ajustado à saúde mental, controlando as variáveis sociodemográficas

Funcionamento Cognitivo Sem défice Com défice Humor Sem sintomatologia depressiva Com sintomatologia depressiva

OR não ajustados ( IC 95%)

p

OR ajustados (IC 95%)

P

1 3,8 (2,3-6,3)

0,001**

1 2,9 (1,6-5,3)

0,001**

1 4,7 (2,2-10,0)

0,001**

1 4,2(1,9-9,2)

0,001**

**p <0,05

DISCUSSÃO Quanto à prevalência do fenótipo de fragilidade, é evidente o impacto desta síndrome na população em que 34,9% foram considerados frágeis. À semelhança com outros estudos, que testaram o fenótipo de fragilidade, este resultado encontram-se dentro do intervalo detetado, que varia ente 4,0- 59,1% (Collard, Boter & Schoevers, 2012). Contudo, ressalva-se que a prevalência da fragilidade varia amplamente, em função da definição do conceito (que tem implicações no instrumento de avaliação utilizado), bem como da população estudada. Esta prevalência poderá advir do facto desta população ser uma comunidade já assinalada, pelos agentes locais, por apresentar alguns indicadores de maior vulnerabilidade e alguma carência social. No entanto, é de salientar que metade da amostra (50,9%) encontra-se na condição de pré-fragilidade. Também estes resultados encontram-se equiparados a outros estudos de referência (Graham et al., 2009; Santos - Eggimann, Cuénoud, Spagnoli & Julien, 2009). Este é um dado importante, pois a literatura, baseando-se em estudos longitudinais, sustenta a ideia de que as pessoas que se encontram neste estádio apresentam grande probabilidade, com o avançar dos anos, de transitarem para a condição de frágil (Gill, Evelyne, Gahbauer, Heather & Han, 2006). Com uma percentagem mais reduzida, 14,2% da amostra foi considerada não–frágil (robusta). Do modelo de regressão logística para a fragilidade ajustado à saúde mental, controlando as variáveis soRevista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 30

ciodemográficas (sexo e idade) denota-se que ambos os indicadores de índole psicológica, foram identificados como preditores da condição de pessoa idosa frágil. No que diz respeito, ao valor preditivo do padrão cognitivo para a condição de fragilidade denota-se, neste estudo, que as pessoas que apresentam comprometimento ao nível cognitivo assumem 2,9 vezes de probabilidade de risco de serem frágeis (OR=2,9, IC 95%:1,6- 5,3s). A literatura sustenta esta mesma premissa, com um conjunto de estudos nesta área (Ávila – Funes et al., 2009). Por outro lado, destaca-se o peso do valor preditivo do humor depressivo para a condição de pessoa idosa frágil, em que a probabilidade de uma pessoa que apresente uma sintomatologia depressiva ser frágil é 4,2 vezes superior (OR=4,2, IC 95%: 1,9 - 9,2). Este indicador assume valor preditivo mais alto, o que reflete a importância das condições emocionais e afetivas do sujeito, enquanto potenciadoras de fragilidade. Na realidade a literatura assume uma relação bidirecional entre a depressão e a fragilidade (Mezuk et. al., 2011), sendo vários os estudos transversais e de coorte que explanam esta relação nos dois sentidos. Por sua vez, as investigações acerca da condição de fragilidade e o défice cognitivo são escassas, todavia parece evidente que existe uma relação entre estas condições (Buchman et al., 2007). Contudo, no seio da comunidade científica ainda não há consenso no que concerne à definição clara e evidente da relação entre estas duas condições do foro mental e a fragilidade nos idosos.


CONCLUSÕES Conclui-se que a fragilidade fenotípica apresenta uma prevalência significativa na população estudada, o que reforça a atenção e a necessidade de se estudar esta síndrome nos idosos. É evidente que o comprometimento ao nível da saúde mental das pessoas idosas é um fator predisponente para a condição de fragilidade. Assim sendo, torna-se pertinente para a prática clínica, o desenvolvimento de estratégias de intervenção focadas no desempenho cognitivo e no humor de forma a retardar e a minorar a condição de fragilidade associada ao processo de envelhecimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ávila-Funes, J. A., Amieva, H., Barberger-Gateau, P., Goff, M. L., Raoux, N., Ritchie, K., ... & Dartigues, J. F. (2009). Cognitive impairment improves the predictive validity of the phenotype of frailty for adverse health outcomes: the Three-City Study. Journal of American Geriatrics Society, 57, 453-461. Buchman, A. S., Boyle, P. A., Wilson, R. S., Tang, Y., & Bennett, D. A. (2007). Frailty is associated with incident Alzheimer’s disease and cognitive decline in the elderly. Psychosomatic Medicine, 69, 483-489. Chang, M., Phillips, C., Coppin, A. K., Linden, M., Ferrucci, L. Fried, L., & Guralnik, J. M. (2009). An association between incident disability and depressive symptoms over 3 years of follow-up among older women. Aging Clinical Experimental Research, 21(2), 191-197. Collard, R. M., Boter, H., & Schoevers, R. A. (2012). Prevalence of frailty in community- dwelling older persons: a systematic review. Journal American Geriatric Society, 60, 1487-1492. Folstein, M. F., Folstein, S. E., & McHugh, P. R. (1975). Mini-mental state. A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric Research, 12(3), 189-198. Fried, L., Tangen, C., Walston, J., Newman, A., Hirsch, C., Gottdiener, J., … & McBurnie, M. A. (2001). Frailty in Older Adults: Evidence for Phenotype. Journal of Gerontology: Medical Sciences, 56A(3), 146-141. Gayman, M. D., Turner, R. J., & Cui, M. (2008). Physical limitations and depressive symptoms: exploring the nature of the association. The Journals Gerontology B: Psychological Sciences and Social Sciences, 63, 219228.

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QUEDAS EM IDOSOS COM PERTURBAÇÕES MENTAIS RESIDENTES EM UNIDADE DE SAÚDE DE LONGA DURAÇÃO | M. Gorete Reis1; Constância Carneiro2; Margarida Sotto Mayor3; Helena Pestana4 |

RESUMO As quedas na população psicogeriátrica são um importante problema de saúde particularmente em situações de internamento ou institucionalização de longo prazo. São reconhecidas as repercussões na funcionalidade e na qualidade de vida e os elevados custos socio económicos. De etiologia multifatorial, pela sua gravidade e custos requer intervenção preventiva. OBJETIVOS: Determinar a prevalência de quedas das pessoas idosas com perturbação mental residentes numa unidade saúde de longa duração (USLD) e os fatores associados. METODOLOGIA: Trata-se de um estudo quantitativo, correlacional transversal a 80 idosos com perturbação mental, residentes numa ULSD do Centro de França. Estudou-se a prevalência de queda e fatores associados. Os dados foram colhidos da ficha de dados sociodemográficos; escala de funcionalidade Aggir e o evento de queda. O tratamento estatístico dos dados foi descritivo e correlacional com modelos de análise categórica. Foram respeitados os princípios éticos. RESULTADOS: Os resultados sugerem uma prevalência de 25% de quedas numa população envelhecida. A perturbação mental e a dependência são fatores em realce. CONCLUSÃO: Uma complexa interação entre múltiplos fatores pessoais, ambientais e sociais na etiologia de queda sugere a importância da prevenção e de programas de monitorização do risco a ela associados. PALAVRAS-CHAVE: Idoso; Institucionalização; Pessoas mentalmente doentes; Acidentes por quedas

RESUMEN

ABSTRACT

“Caídas en los ancianos con problemas mentales, que residen en una unidad de salud de longa instancia”

“Falls in the elderly with mental illness residing in long-term health unit”

Las caídas en la población geriátrica son un importante problema de salud particularmente en situaciones de hospitalización o institucionalización de longa instancia. Las repercusiones son reconocidas en la funcionalidad y la calidad de vida y los costos económicos y sociales. De etiología multifactorial, por su gravedad y costos requieren la intervención preventiva. OBJETIVOS: Determinar la prevalencia de caídas de ancianos con trastornos mentales, residentes de la unidad de salud a largo plazo (USLD) y conocer los factores asociados. METODOLOGÍA: Este es un estudio cuantitativo, correlacional a 80 ancianos con trastornos mentales, residentes en Francia en una ULSD. Se estudió la prevalencia de caídas y factores asociados. Los datos fueron los demográficos; la funcionalidad por la escala Aggir y el evento de una caída. El tratamiento estadístico de los datos fue descriptivo y correlativo con modelos de análisis categorial Cumplimiento de los principios éticos. RESULTADOS: Los resultados sugieren que la prevalencia de caídas es 25% en una población envejecida. El trastorno mental y la dependencia son factores en relieve. CONCLUSIÓN: Una compleja interacción entre múltiples factores personales, ambientales y sociales en la etiología de las caídas sugiere la importancia de la prevención asociados a programas de monitoreo del riesgo

Falls in psychogeriatric population are an important health issue particularly in long-term institutionalization. Repercussions in functionality and in quality of life are recognized as also in socio economic costs. Having multifactorial character, severity levels and costs, falls require preventive intervention. AIMS: To determine prevalence of falls of elderly with mental disorder, residents in long-term health unit (USLD), and identify associated factors. METHODS: It´s a cross-sectional, correlational descriptive study, to 80 elderly people with mental disorder, resident in a ULSD in middle of France. Studied the prevalence of falls and associated factors. Data collected: were demographic issues; Aggir scale (functionality) and a fall events. Data statistical treatment was descriptive and correlational with categorical analysis models. Ethical principles have been complied. RESULTS: Prevalence of falls is 25%. Mental disorder and dependence are factors highlighted. CONCLUSION: There is complex interaction between multiple personal, environmental and social factors in falls aetiology that suggests the importance of prevention and risk monitoring programs associated with falls.

DESCRIPTORES: Anciano; Institucionalización; Enfermos mentales; Accidentes por caídas

Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 15-02-2014

KEYWORDS: Aged; Institutionalization; Mentally ill persons; Accidental falls

1 PhD; Professora Coordenadora na Universidade de Évora, Escola Superior de Enfermagem de S. João de Deus; CIIS, Largo Senhor da Pobreza, Évora, greis@uevora.pt 2 Licenciada em Enfermagem; Enfermeira no Centre Hospitalier Regional d’Orleans, 45032, Orleans, França, constancia_p@hotmail.com 3 PhD; UNIFAI; Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria no Hospital Magalhães Lemos – Serviço de Psicogeriatria, Porto, Portugal, mgsottomayor@gmail.com 4 PhD; UNIFAI; Professora Auxiliar no Instituto Superior das Ciências do Trabalho e Emprego, 1649-026 Lisboa, Portugal, gageiropestana@gmail.com Citação: Reis, G., Carneiro, C., Sotto Mayor, M., & Pestana, H. (2014). Quedas em idosos com perturbações mentais residentes em unidades de saúde de longa duração. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 33-39. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 33


INTRODUÇÃO A população europeia envelhece e embora não sendo uniformemente, o índice de envelhecimento na União Europeia (27 países), em 2011 o valor médio foi de 113, variando entre 154,9 (Alemanha) a 54,6 (Islândia) segundo os indicadores de 2011 (Pordata, 2013). A maior longevidade predispõe à morbilidade, coexistindo várias entidades numa pessoa: a pluripatologia. De entre as situações, destacam-se as doenças do foro mental, as cárdio cérebro vasculares, as oncológicas, as articulares doenças crónicas e incapacitantes que obrigam à polimedicação, estratégia não isenta de riscos. As repercussões da restrição da mobilidade e da dependência física e mental inauguram o ciclo da fragilidade, sendo que essas pessoas ficam mais sujeitas a episódios de queda não intencional (Gilbert et al., 2012). A prevalência de queda varia entre os países, assumindo valores de 28% a 35% nos indivíduos com mais de 65 anos e valores entre 32% a 42% nos que têm mais de 70 anos (WHO, 2007). Nos grupos que vivem em residências de longo termo, a prevalência vai de 30% a 50%. No entanto, muitas vezes a incidência de queda é avaliada a partir da assistência hospitalar e negligenciada nas outras situações (Gilbert et al., 2012) seja por falta de controlo institucional seja porque os idosos não a reportam por esquecimento. Há autores que apontam a maior incidência nas mulheres (Morris, 2007) mas outros nos homens por causa da maior co morbilidade (WHO, 2007). A causa é multifatorial, com fatores intrínsecos ou extrínsecos que atuam sinergicamente ou, como na classificação da Organização Mundial de Saúde (WHO, 2007), fatores biológicos (idade, sexo, doenças crónicas, declínio nas capacidades física, cognitiva e afetiva); comportamentais (polimedicação, falta de exercício, calçado inadequado e abuso de álcool); ambientais (edifícios em mau estado; pisos e escadas irregulares; falta de varões de apoio, e iluminação deficiente) e socioeconómicos (baixo rendimento; más condições habitacionais; falta de interação social, acesso limitado aos serviços de saúde e sociais, precários recursos da comunidade). A limitação física e a necessidade de consumir medicação psicotrópica elevam o risco de queda (Carter, Kannus & Khan, 2001; Chan et al., 2013; Lavsa et al., 2010; Quach, Yang, Berry & Newton, 2013) e levam à repetição das mesmas. As pessoas com alterações cognitivas (Pitkälä, Savikko, Poysti, Strandberg, Laakkonen, Marja-Liisa, 2013), de balanço corporal e do equilíbrio têm o risco acrescido (Chen, Van Nguyen, Shen & Chan, 2011) que ganha expressão no pior desempenho das AVDs. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 34

A marcha lentificada também se associa às quedas. Num estudo sobre fatores de risco de queda em doentes psiquiátricos com grupo de controlo, Chan e outros (2013) verificaram diferenças estatisticamente significativas nos grupos, sendo pior nos: mais idosos; nos com co morbilidade, nos desorientados, nos com alterações de consciência e com restrição da mobilidade. Acrescese o que Lavsa e outros constataram de que a polimedicação era um fator de risco embora não a idade, o sexo e a doença (Lavsa et al., 2010). As consequências das quedas verificam-se a nível físico, emocional e funcional, podendo levar à morte, mas também têm elevado peso socioeconómico (Gilbert et al., 2012; WHO, 2007) e altos custos assistenciais (Gama, Conesa e Ferreira, 2008; Gates, Fisher, Cooke, Carter & Lamb, 2008) pelo que se repercute na qualidade de vida. Por isso, impõe-se a prevenção de quedas como melhor estratégia (Moyer, 2012) com abordagem multifatorial e multidisciplinar, com avaliação regular e sistemática que inclua o trabalho postural estático e dinâmico, o reforço muscular adaptado a cada pessoa, o ensino e orientação sobre técnicas de segurança e estilos de vida e a mobilização dos fatores ambientais e socioeconómicos (Gilbert et al., 2012) No entanto, ser mais vulnerável e viver numa instituição obriga a que se organize o trabalho daqueles que cuidam, de modo a proporcionar contactos de qualidade na área afetiva e da socialização (Mallidou, Cummings, Schalm & Estabrooks, 2013; Beauchet, Dubost, Revel-delhom, Berrut & Belmin, 2010), suavizando a intervenção instrumental. O enquadramento apresentado justifica que se queira conhecer os fatores associados ao risco de queda assim como determinar a sua prevalência nas pessoas institucionalizadas com alterações mentais. METODOLOGIA População São 80 pessoas idosas com perturbação mental (universo/amostra), residentes numa USLD de um hospital do Centro de França. É um estudo transversal, descritivo e correlacional. Instrumento de colheita de dados Seguiu-se um guião composto por ficha com dados sociodemográficos; Escala Aggir para a dependência/ independência; avaliação do estado mental (atenção, coerência; comportamento adequado, orientação espacial e temporal); presença de doença; número de medicamentos; ocorrência de queda e instituição de medidas de segurança.


A variável em estudo é a prevalência de queda das pessoas idosas com perturbação mental, verificada através do registo escrito do acontecimento. A grelha “Aggir” (autonomie, gérontológique, groupes iso-ressources) (Robbins, 2008) avalia as capacidades da pessoa idosa na realização das atividades físicas, mentais, domésticas e sociais. A pontuação obtida classifica a dependência em 6 grupos a que corresponde um determinado nível de cuidados para satisfazer os atos essenciais da vida quotidiana. Os graus de dependência do Aggir vão de 1 a 6, ou seja, do pior nível para a independência (6). Procedimentos Os dados foram colhidos seguindo o guião, por enfermeiros previamente preparados. O estudo decorreu no ano de 2012 e não foram alteradas as rotinas diárias de prestação de cuidados. Respeitaram-se os princípios éticos que norteiam a investigação com pessoas. O tratamento estatístico é descritivo e correlacional com modelos de análise categórica (Pestana e Gageiro, 2009; Pestana e Gageiro, 2008). Resultados É uma população envelhecida onde a maioria é: mulher 76,3%; viúva 62,5%. A média de idade é 83,05 anos e 50% tem entre 76 e 90,5 anos. A prevalência das quedas é 25% e não varia nem com a idade nem com o sexo. Os quadros ilustram os resultados. Apesar do risco de queda ser 7% maior nas mulheres, as diferenças não são estatisticamente significativas, para o sexo nem para estado civil. Em relação à antiga atividade profissional, a maioria foi doméstica e os menos representados foram agricultores. As quedas variam significativamente com as profissões e com o sexo. Conforme teste Rácio da Verosimilhança (LR): quem menos cai são os homens que outrora pertenceram aos quadros técnicos e os que fizeram parte dos agricultores. Quem mais cai são as mulheres domésticas (Quadro nº 1).

Quanto ao número de medicamentos prescritos e os episódios de queda verifica-se com uma confiança de 95% que os residentes têm uma média de 7,5 a 9,2 medicamentos prescritos. Observa-se que os residentes que têm mais episódios de queda tomam em média menos 0,6 medicamentos do que os que não caem, embora essa diferença não seja estatisticamente significativa. Esta conclusão é igual para ambos os sexos. Sobre as doenças psicológicas, psiquiátricas e neurológicas de que padecem verifica-se que a maioria não tem doença psicológica nem psiquiátrica (82,5%) embora haja 17,5% que sugere a sua presença nos registos clínicos. Na influência da doença psiquiátrica nos episódios de queda, encontram-se diferenças, sendo que quem tem a doença tem um risco de cair 1,69 vezes superior. A distribuição das doenças neurológicas indica que 45% (Mantel Haenszel Common odds ratio, (p=0.052) é afetada por este tipo de doenças e que as mulheres com este diagnóstico têm o risco de cair 1,3 vezes mais (Quadro nº 2)

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Os que não estão orientados espacialmente, 52%, têm um risco de cair 4,8 vezes superior aos restantes e, aqueles que têm sempre, 43,8%, ou têm pelo menos algumas vezes orientação em relação ao espaço, 3,8%, são aqueles que têm menos número de quedas, não se distinguindo entre si. O mesmo se passa com a variável orientação temporal em que a maioria, 53,8%, não está orientada. A associação é forte entre a orientação temporal e as quedas. Os que não têm orientação temporal, 53,8%, têm um risco de queda 6,5 vezes superior aos outros. Quem tem sempre orientação temporal, 53,8%, ou tem alguma vez ,16,3% são os que caem menos, não se distinguindo entre si. Assim, em relação ao estado mental observa-se que a orientação preservada, a coerência do discurso, o comportamento adequado a orientação espacial e temporal estão menos associados ao risco de cair do que os seus opostos (Quadro nº 3). Na análise do estado mental (atenção, coerência do discurso, adequação do comportamento, orientação espacial e temporal) constata-se que a maioria, 47,5%, tem atenção captável e que a atenção varia na razão inversa das quedas. Os que têm atenção não captável, 22,5%, caem 4,2 vezes mais do que aqueles cuja atenção se pode captar e 1,27 vezes mais do que aqueles que por alguns momentos conseguimos a sua atenção (30%). E aqueles cuja atenção se pode captar por alguns momentos caem 3,3 vezes mais do que aqueles cuja atenção está preservada na plenitude. A maioria dos residentes, 52,5%, não tem um discurso coerente e existe forte associação com as quedas. Aqueles que têm sempre coerência do discurso, 32,5%, ou que têm pelo menos alguma coerência, 15%, são os que têm menor número de quedas, não se distinguindo entre si. Apenas os que não têm coerência do discurso, 52,5%, têm um risco de queda 7,4 vezes superiores aos restantes. Já no que se refere à adequação de comportamento, a maioria dos residentes, 48,8%, não o tem e existe forte associação entre o comportamento desadequado e os episódios de queda. Apenas os que têm comportamento desadequado, 48,8%, têm um risco de queda 7,8 vezes superior aos restantes. Os que têm sempre comportamento adequado, 33,8%, ou pelo menos algumas vezes adequado, 17,5%, são os que têm menor número de quedas, não se distinguindo entre si. Em relação à orientação espacial, a maioria, 52%, tem desorientação, sendo que se associa fortemente com as quedas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 36

As doenças existem, embora com baixa prevalência, realçando-se as cardiovasculares, metabólicas e músculo-esqueléticas, embora não tenham influência nas quedas. O grau de dependência prediz o risco de queda, sendo que a escala Aggir sugere que todas as variáveis que a compõem são entendidas como medindo o mesmo conceito, conforme consistência interna de alfa de Cronbach =0,937. As oito variáveis podem ser resumidas com qualidade num único índice que explica 70,9% da informação dessas variáveis que a integram. Embora se observem dois comportamentos: quem menos cai (os mais autónomos) são os que têm valores mais elevados nas dimensões do vestir, deslocar-se ao exterior e eliminação urinária. Quem mais cai (os menos autónomos) são os que têm valores mais baixos nas dimensões de comer e de deslocar-se no interior. Estas diferenças não são significativas nem com as quedas nem com o sexo.


Em relação aos aspetos instrumentais, verifica-se que a maioria (80%) não se serve de um alimento ou da travessa na mesa e que quem não se serve tem um risco de cair 1,27 vezes superior ao dos que são capazes de fazê-lo, qualquer que seja o sexo. Embora a USLD não avalie o risco para a primeira queda, a maioria dos residentes tem medidas acrescidas de proteção das quedas depois de ter tido o primeiro episódio. Verifica-se que quem tem medidas de segurança tem 1,24 mais quedas registadas do que os que não têm essas medidas, sejam homens ou mulheres. DISCUSSÃO A população é muito idosa e a maioria dependente e com perturbação mental. Estas características, associadas ao tipo de residência, atestam a sua fragilidade e vulnerabilidade para cair. As doenças crónicas de evolução lenta estão presentes com maiores registos na doença neurológica, em aproximadamente metade da população e nas psiquiátricas e psicológicas em número inferior. As situações têm relação com as alterações mostradas na coerência do discurso, no comportamento e na orientação temporo espacial, sendo menos frequente a perturbação da atenção. As variações ao nível da atenção normalmente estão associadas a condições cerebrais patológicas que têm implicações na consciência de si, interferindo no modo de perceber a realidade e de poder agir sobre ela com consciência e cidadania. Tais condições são comuns nas doenças cerebrovasculares e têm grande implicação na aprendizagem e na velocidade de processamento da informação. Verifica-se no presente estudo um elevado consumo de medicamentos tal como verificado por outros autores. Contudo, ao contrário do que seria de esperar, quem cai mais toma menos medicamentos embora a diferença não seja significativa. Pode acontecer que quem toma menos medicação se mobilize mais e esse seja o risco associado, o que vai de encontro ao que Carter e colaboradores referem quando afirmam que a limitação física associada à medicação psicotrópica eleva o risco de queda (Carter, et al 2001). Acresce-se que o tipo de medicação, psicotrópicos, cardiotónicos e analgésicos estão associados a quedas e neste estudo o consumo médio de medicação é elevado, ultrapassando as médias sugeridas noutros estudos (8,8). A prevalência de queda é elevada (25%) e embora abaixo dos valores propostos pela OMS (WHO, 2007), pode estar-se face a uma situação de subnotificação, já apontada por diversos autores (Gilbert, et al, 2012).

As mulheres têm apresentado, noutros estudos, mais elevada prevalência de queda (Morris, 2007); neste, não se encontrou a diferença, embora os homens que foram quadros técnicos ou agricultores tenham risco menor de cair. Os fatores de risco comportamentais mostramse nas funções cognitivas deficitárias, que podem acompanhar as doenças cerebrovasculares e afetar todas as áreas do comportamento, inclusive, diretamente, o funcionamento cognitivo, o que compromete as estratégias de aproximação, planeamento, desenvolvimento de atividades cognitivas entre outras, situação verificada neste estudo (Nagamatsu, Munkacsy, Liu-Ambrose & Handy, 2013). A vida social fica alterada quando há compromisso das funções executivas predispondo ao isolamento social. Constata-se o papel fundamental destas funções no risco de queda e a fornecerem evidência de que lesões do hemisfério direito podem potenciar aquele risco (Nagamatsu et al., 2013). O declínio da capacidade mental, nas diferentes dimensões, tem subjacentes as patologias referidas e presentes em maioria nesta investigação. O padrão de fatores de risco sugere uma complexa interação de fatores pessoais e comportamentais nas quedas dos idosos com doenças mentais, sendo que são recomendadas pesquisas sobre o desenvolvimento de procedimentos de triagem multifatoriais e intervenções adaptadas individualmente para evitar a queda (Enkelaar, Smulders, van Schrojenstein Lantman-de Valk, Weerdesteyn & Geurts, 2013). No mesmo sentido aponta Chen, o que se partilha, de que a monitorização do risco é uma estratégia proativa em vez de reativa, ainda mais adequada quando há estudos que associam o aumento do risco para a queda às dificuldades nas capacidades física e mental (Chen et al., 2011). Conhece-se a poderosa associação entre a incapacidade funcional e a mortalidade (Idland, Pettersen, Avlund & Bergland, 2013) e neste estudo o grau de dependência prediz o risco de queda. Há um padrão hierárquico de declínio e quem menos cai são os mais autónomos em atividades que exigem mais potencial e o contrário também se verifica, isto é, os que caem mais têm mais limitações nas atividades menos complexas. Assim, identifica-se um padrão hierárquico de deterioração funcional (Idland, et al., 2013) e reconhece-se que aqueles que ainda têm energia para uma caminhada, ainda que lentificada, estão em menor risco, retardando em certa medida o círculo vicioso da redução da atividade física, perda da função física e início da incapacidade. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 37


LIMITAÇÕES DO ESTUDO A avaliação dos fatores de risco é limitada pelo que seria útil abranger os fatores socioeconómicos e ambientais e medir de modo mais compreensivo o risco de queda, incluindo o equilíbrio e a força. Apurar a medicação consumida permitirá prever fatores específicos relacionados com os consumos farmacológicos. CONCLUSÃO Os idosos com perturbação mental têm elevada prevalência de quedas e os fatores de risco são múltiplos, requerendo abordagens complexas e multidimensionais na prevenção. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA Estabelecer programas de monitorização do risco de queda e controlar os fatores, tem forte implicação para a prática, pode minorar os custos pessoais e em geral da sociedade com reflexo na qualidade de vida das pessoas mais velhas e institucionalizadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Beauchet, O., Dubost, V., Revel-delhom, C., Berrut, G., & Belmin, J. (2011). How to manage recurrent falls in clinical practice: guidelines of the French Society of Geriatrics and Gerontology. Journal Nutritional Health Aging, 15(1), 79-84. Carter, N. D., Kannus, P., & Khan, K. M. (2001). Exercise in the prevention of falls in older people. A systematic literature review examining the rationale and the evidence. Sports Medicine, 31(6), 427-438. Chan, C. H., Gau, S., Chan, H., Tsai, Y. J., Chiu, C.H., Wang, S., & Huang, M. L. (2013). Risk factors for falling in psychiatric inpatients: A prospective, matched case control study. Journal of Psychiatric Research, 47(8) 1088-1094. doi:10.1016/j.jpsychires.2013.04.002 Chen, X., Van Nguyen, H., Shen, Q., & Chan, D. K. (2011). Characteristics associated with recurrent falls among the elderly within aged-care wards in a tertiary hospital: the effect of cognitive impairment. Archives of Gerontology and Geriatrics, 53, 183-186. Enkelaar, L., Smulders, E., van Schrojenstein Lantmande Valk, H., Weerdesteyn, V., & Geurts, A. C. H. (2013). Prospective study on risk factors for falling in elderly persons with mild to moderate intellectual disabilities. Research in Developmental Disabilities, 34(11), 37543765. doi: 10.1016/j.ridd.2013.07.041 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 38

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RÓTULOS PSIQUIÁTRICOS: “BEM-ME-QUER, MAL-ME-QUER, MUITO, POUCO E NADA…”

RESUMO

| Luís Loureiro1; Carlos Sequeira2; Amorim Rosa3; Sara Gomes4 |

O reconhecimento das perturbações mentais enquanto componente da literacia em saúde mental é referido na literatura como um pré-requisito para a procura de ajuda profissional. É também referido que o reconhecimento atempado e a procura de ajuda precoce podem evitar a agudização dos problemas e contribuir para melhores resultados em saúde. OBJETIVOS: Descrever e analisar os rótulos utilizados pelos adolescentes portugueses para caracterizar situações de depressão, esquizofrenia e abuso de álcool nos seus pares; identificar em que medida os rótulos são preditores da intenção de procura de ajuda em saúde mental, relativamente às perturbações referidas. MÉTODO: Estudo descritivo-correlacional, com aplicação do QuALiSMental a uma amostra representativa de 3436 adolescentes, com idades compreendidas entre os 14 e os 17 anos, que frequentam escolas do 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário da região centro de Portugal continental. RESULTADOS: Observa-se, a partir dos rótulos assinalados pelos adolescentes, que uma parte substancial da amostra não reconhece os problemas de saúde mental. Esse deficit no reconhecimento pode ter implicações na intenção de procura de ajuda, já que os rótulos que correspondem a uma identificação correta do problema não se constituem como preditores com significado estatístico. CONCLUSÕES: Os resultados deste estudo mostram que há um campo vasto para intervir nomeadamente através de programas construídos para aumentar os níveis de literacia dos jovens, procurando deste modo facilitar os comportamentos de procura de ajuda. PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Promoção da saúde; Adolescentes

RESUMEN

ABSTRACT

«Bien me quiere, mal me quiere, mucho, poco y nada»

Psychiatric labeling “He loves me…he loves me not”

El reconocimiento de los trastornos mentales como componente de la alfabetización en la salud mental es tratado en la literatura como un prerrequisito para la búsqueda de ayuda profesional. Asimismo, se indica que el reconocimiento temprano y la búsqueda de ayuda previa pueden evitar la agudización de los problemas y contribuir a obtener mejores resultados en la salud. OBJETIVOS: Describir y analizar los rótulos utilizados por los adolescentes portugueses para caracterizar las situaciones de depresión, esquizofrenia y abuso de alcohol en sus pares; identificar en qué medida los rótulos son predictores de la intención de búsqueda de ayuda en la salud mental, en relación a los trastornos mencionados. MÉTODO: Estudio descriptivo correlacional, con aplicación del QuALiSMental a una muestra representativa de 3.436 adolescentes, con edades comprendidas entre los 14 y los 17 años, que asisten a escuelas del 3.º ciclo de enseñanza básica y de enseñanza secundaria de la región centro de Portugal continental. RESULTADOS: Se observa, a partir dos rótulos señalados por los adolescentes, que una parte sustancial de la muestra no reconoce los problemas de salud mental. Ese déficit en el reconocimiento puede tener implicaciones en la intención de búsqueda de ayuda, ya que los rótulos que corresponden a una identificación correcta del problema no se constituyen como fatores predictores con significado estadístico. CONCLUSIONES: Los resultados de este estudio muestran que hay un amplio campo para intervenir a través de programas construidos para aumentar los niveles de alfabetización de los jóvenes, procurando de este modo facilitar los comportamientos de búsqueda de ayuda. DESCRIPTORES: Salud mental; Promoción de la salud; Adolescencia

The acknowledgment of mental disorders as part of mental health literacy is referred to in literature as a prerequisite for professional help-seeking. It is also mentioned that the timely recognition and early help-seeking can avoid the exacerbation of problems and contribute to better health outcomes. AIM: To describe and analyze labels used by Portuguese adolescents to characterize situations of depression, schizophrenia and alcohol abuse among their peers; to identify in which way labels are predictors of help-seeking intention in the above stated mental health disorders. METHODS: This is a descriptive and correlational study, with QuALiSMental application to a representative sample of 3,436 14-17-year-old adolescents attending the 3rd cycle of basic and secondary education schools in the central region of mainland Portugal. RESULTS: From the labels highlighted by adolescents, we can observe that a substantial part of the sample does not recognize mental health problems. This deficit in acknowledgement can have implications in help-seeking intention, since the labels that correspond to correct problem identification, do not establish themselves as predictors with statistic significance. CONCLUSIONS: The results show that there is a wide scope for further intervention mainly through programs built to increase literacy levels in young people, thus making help-seeking behaviors possible. KEYWORDS: Mental health; Health promotion; Adolescence Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 04-02-2014

1 PhD; Docente na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem, Coimbra, Portugal, luisloureiro@esenfc.pt 2 PhD; Docente na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt 3 MSc; Docente na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra: Unidade Científico-Pedagógica de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Coimbra, amorim@esenfc.pt 4 Enfermeira; Investigadora na Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem, 3046-851 Coimbra, Portugal, aragomes@esenfc.pt Citação: Reis, Lourenço, L., Sequeira, C., Rosa, A., & Gomes, S. (2014). Rótulos psiquiátricos “bem-me-quer, mal-me-quer, muito, pouco e nada...”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 40-46. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 40


INTRODUÇÃO A adolescência é considerada um período crítico que se caracteriza por mudanças significativas no contexto de vida dos indivíduos, e em que os problemas relacionados com a saúde e bem-estar podem ter profundo impacto na vida adulta (Rickwood, Deane, Wilson, & Ciarrochi, 2005; Organização Mundial de Saúde - OMS, 2001). Estima-se que a prevalência de perturbações do foro mental na adolescência e juventude, tais como a depressão, o abuso de substâncias, os distúrbios de ansiedade, os distúrbios relacionados com os comportamentos alimentares e inclusive as perturbações psicóticas, se situam cumulativamente entre os 15 e os 20% (Kelly et al., 2011; Loureiro, Barroso, et al., 2013; Loureiro, Jorm, et al., 2013). Acresce ainda o facto de a adolescência e a juventude serem as idades críticas para o início das doenças mentais, dado que metade dos indivíduos que virão a sofrer de uma doença mental experienciam o seu primeiro episódio antes dos 18 anos (Kelly et al., 2011). A somar a isto observa-se outro dado, os adolescentes são o grupo que menos uso faz dos serviços de saúde, revelando os estudos que cerca de 35,5% a 50,3% dos casos graves de doença mental que necessitam de apoio e ajuda especializada não a procuram e por esta via não recebem tratamento no período de 12 meses. Mesmo os que recebem tratamento, fazem-no com grande atraso em relação ao início da doença, observando-se que o tempo que medeia a ocorrência dos primeiros sinais e sintomas e o tratamento dura meses, ou mesmo anos (Wright, Jorm, & Mackinnon, 2012). Das diferentes componentes da literacia em saúde mental, o reconhecimento das perturbações é referido como um facilitador da procura de ajuda, pois quando o problema é reconhecido e a procura é efetuada precocemente, contribui-se de modo substancial para a melhoria dos resultados em saúde dos indivíduos e sucesso dos tratamentos (Jorm, 2012). O reconhecimento é na literacia em saúde mental, entre outras formas, avaliado através da atribuição de rótulos psiquiátricos a diferentes situações do quotidiano que envolvem situações de adoecer mental e/ou sofrimento psicológico. Contudo esta atribuição ou nomeação não tem subjacente os pressupostos dos diagnósticos em saúde mental, já que para isso existem profissionais de saúde com formação especializada, tem uma intenção mais simples, favorecer ou potenciar a procura de ajuda e o tratamento se necessário, isto porque a primeira ajuda é na maioria das vezes informal, sendo prestada por alguém que não é profissional de saúde (Jorm, 2012; Wright et al., 2012; Loureiro, Barroso, et al., 2013; Loureiro, Jorm, et al., 2013).

O modo como os rótulos são aqui entendidos não se confunde com aquilo que é o exposto pela teoria clássica da rotulagem associando rótulos com estigma e discriminação sociais (Loureiro, 2008). Ainda que os aspetos negativos dos rótulos estejam bem expostos e fundamentados na literatura sobre estigma associada às doenças mentais, o modo como os rótulos são referidos no contexto da literacia em saúde mental subentende que o reconhecimento das perturbações, associandolhe rótulos oriundos da saúde mental e psiquiatria, pode conter aspetos positivos, na medida em que perspetivam aquilo que é a perceção da pessoa relativamente à gravidade do problema (seja em si ou nos outros), e do que ele pode significar para quem está em sofrimento, conduzindo subsequentemente à procura de ajuda (Wright et al., 2012). Naturalmente que a utilização adequada de rótulos psiquiátricos e a sua relação com a procura de ajuda varia de acordo com a natureza das perturbações e do que estas implicam em termos pessoais e sociais para o indivíduo, não podendo ainda alhear os aspetos contextuais e culturalmente situados em que as perturbações mentais se manifestam (Loureiro, Dias, & Aragão, 2008; Loureiro et al., 2011). É de salientar que se a utilização adequada dos rótulos poderá favorecer a procura de ajuda em saúde mental, não deverá descurar-se em simultâneo que nos rótulos psiquiátricos reside muito do preconceito que conduz aos comportamentos estigmatizantes e comportamentos discriminatórios, o que aliás está na base de muitas das campanhas de redução do estigma associadas às doenças e doentes mentais. O presente estudo tem como objetivos: a) descrever e analisar os rótulos utilizados pelos adolescentes portugueses para descrever situações de depressão, esquizofrenia e abuso de álcool nos seus pares; identificar em que medida os rótulos são preditores da intenção de procura de ajuda em saúde mental, relativamente às perturbações referidas. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo-correlacional [integrado num estudo alargado: PTDC/CPECED/112546/2009], realizado na região centro de Portugal Continental, a partir de uma amostra representativa de 3436 adolescentes que frequentam as escolas do ensino básico e ensino secundário, enquadradas na Direção Regional de Educação do Centro (DREC). Os participantes têm idades compreendidas entre os 14 e os 17 anos (média da idade de 15.59 anos e desvio padrão de 0,84 anos), sendo 45,00% do sexo masculino e 55,00% do sexo feminino. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 41


Os dados foram colhidos entre os meses de Novembro de 2011 e Maio de 2012, tendo sido utilizada amostragem multi-etapas, estratificada por clusters. Como instrumento de colheita de dados, foi utilizado o Questionário de Avaliação da Literacia em Saúde Mental – QuALiSMental (Loureiro, Pedreiro & Correia, 2011). Este questionário é constituído por uma 1.ª parte que inclui instruções de preenchimento e questões de caracterização sociodemográfica (género, idade, residência, distrito e habilitações literárias dos pais) e por diferentes seções relativas a cada componente da literacia em saúde mental. A seguir à 1.ª parte são apresentadas três vinhetas relatando três situações problema: depressão (vinheta A), esquizofrenia (vinheta B) abuso de álcool (vinheta C), de acordo com os critérios de diagnóstico da DSM-IVTR (Associação Americana de Psiquiatria - APA, 2006). Apresenta-se apenas a vinheta B referente ao caso de um adolescente chamado “Miguel”, o conteúdo das outras poderão ser encontradas em investigações publicadas (Loureiro, Barroso, et al., 2013; Loureiro, Jorm, et al., 2013). “O Miguel é um jovem de 16 anos que vive com os seus pais. Tem frequentado a escola de forma irregular ao longo do último ano e recentemente abandonou-a. Nos últimos seis meses desligou-se dos seus amigos e, em casa, tranca-se no seu quarto, não quer comer com a família e não tem cuidados de higiene (deixou de tomar banho). Os seus pais ouvem-no a vaguear no quarto durante a noite. Mesmo sabendo que ele está sozinho, ouvem-no aos gritos e a discutir como se mais alguém estivesse no seu quarto. Quando o tentam encorajar a fazer outras coisas, ele sussurra que não vai sair de casa porque está a ser espiado pelo vizinho. Eles percebem que ele não consome drogas, porque ele nunca vê ninguém, nem sai de casa”. Para cada vinheta é colocada a seguinte questão: “Na tua opinião, o que é que se passa com o … [nome]?”. De seguida é apresentada uma lista que inclui diferentes alternativas de resposta, admitindo que podem ser escolhidas várias opções: “não sei”; “não tem nada”; “depressão”; “esquizofrenia”; “psicose”; “doença mental”; “bulimia”; “stresse”; “esgotamento nervoso”; “abuso de substâncias (ex.: álcool) ”; “é uma crise própria da idade”; “problemas psicológicos/mentais/emocionais”; “anorexia”; “tem um problema”; “alcoolismo”; “cancro”.

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Na intenção de procura de ajuda, era colocada em cada vinheta a seguinte questão, “Se estivesses a viver atualmente uma situação como a da(o) [nome], procurarias ajuda?” e cujo formato de resposta era dicotómico em “sim” (valor 1) e “não” (valor 0). O questionário foi administrado em espaço de sala de aula, em sessões coletivas, com supervisão de um investigador e de um professor da turma. O tempo de resposta ao questionário situou-se entre 40 a 50 minutos. Os dados foram inseridos e tratados no software IBMSPSS 22.0. Dado tratar-se de um estudo descritivocorrelacional, foram calculadas as estatísticas resumo adequadas e as frequências absolutas e percentuais pelo procedimento de tabelas de resposta múltipla. Foram ainda realizadas Análises de Regressão Logística (Binária). O instrumento de colheita de dados foi submetido à Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação do Governo Português (processo n.º0252500001) e à Comissão de Ética da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde – Enfermagem (UICISA: E) da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (N.º: P58-12/2011). Em ambos os casos o parecer foi positivo, tendo sido aprovada a sua utilização e autorizada a aplicação. Dadas as características da amostra (menores de idade), o instrumento era acompanhado pelo formulário de consentimento informado para assinar pelos pais/encarregados de educação. RESULTADOS Relativamente ao reconhecimento das situações apresentadas (Tabela 1), observa-se que para a vinheta A referente à depressão, a opção mais assinala para caracterizar a situação da joana foi depressão (66,2%), seguido de stress (48,10%), problemas psicológicos/emocionais/mentais (41,90%), esgotamento nervoso (34,9%), anorexia (17,2%) e crise da idade (16,5%). No que concerne ao Miguel (vinheta B) referente à esquizofrenia, observa-se que a opção mais assinala é problemas psicológicos/emocionais/mentais (60,1%), seguido de doença mental (59,2%), esquizofrenia (40,3%), esgotamento nervoso (30,3%), depressão (28,2%), psicose (21,5%) e stress (15,8%). Para a vinheta C, o reconhecimento da situação de abuso de substâncias (álcool), a opção mais assinalada foi o abuso de substâncias (73,9%) seguido de alcoolismo (72,8%), crise da idade (21,4%), problemas psicológicos/mentais/emocionais com 14,0%. Tal como nas outras vinhetas existem diversas opções que apresentam valores relativamente reduzidos.


TABELA 1 - Distribuição percentual das categorias assinaladas pelos adolescentes na identificação das perturbações (N=3436)

Opções

Depressão Esquizofrenia Abuso de álcool

Não sei Não tem nada Depressão Esquizofrenia Psicose Doença mental Bulimia Stresse Esgotamento nervoso Abuso substância Crise idade Problemas psicológicos/mentais/emocionais Anorexia Alcoolismo Cancro

2,5 0,5 66,2 0,7 1,0 6,3 7,0 48,1 34,9 3,2 16,5 41,9

6,3 0,5 28,2 40,3 21,5 59,2 1,0 15,8 30,3 5,6 3,9 60,1

3,2 3,1 7,1 0,6 0,5 3,5 0,4 9,8 3,6 73,9 21,4 14,0

17,2 0,8 1,2

0,4 2,3 0,6

0,3 72,8 0,2

Na intenção de procura de ajuda, era colocada em cada vinheta a seguinte questão, “Se estivesses a viver atualmente uma situação como a da(o) Joana/Miguel/Jorge, procurarias ajuda?” e cujo formato de resposta era dicotómico em “sim” (valor 1) e “não” (valor 0). Das análises de regressão logística efetuadas para o estudo dos rótulos que são preditores do pedido de ajuda, pode observar-se (Tabela 2) relativamente à intenção de pedir ajuda na depressão que os preditores com significado estatístico são esgotamento nervoso (OR=1,227; p<0,01), crise da idade (OR=0,596; p<0,001) e anorexia (OR=1.299; p<0,01). No que concerne à vinheta B (situação do Miguel), apenas uma opção se reveste de significado estatístico e que é depressão (OR=1,251; p<0,01). Na vinheta C referente ao abuso de álcool (situação do Jorge) as categorias com significado estatístico são: não tem nada (OR=0,370; p<0,001), crise da idade (OR=0,600; p<0,001), e alcoolismo (OR=1,558; p<0,001).

TABELA 2 - Resultados da Análise de Regressão Logística Binária para o estudo dos rótulos preditores da intenção de pedir ajuda (N=3436)

Rótulos: Não sei Não tem nada Depressão Esquizofrenia Psicose Doença mental Bulimia Stresse Esgotamento nervoso Abuso substância Crise idade Problemas psicológicos Anorexia Problema Alcoolismo Cancro DISCUSSÃO

Depressão OR (IC 95%) 1,272 (0,797-2,029) 0,574 (0,212-1,558) 1,096 (0,943-1,273) 1,207 (0,505-2,883) 1,488 (0,679-3,262) 1,096 (0,814-1,477) 0,952 (0,712-1,274) 0,992 (0,858-1,147) 1,227** (1,054-1,429) 0,826 (0,544-1,254) 0,596*** (0,494-0,719) 1,013 (0,876-1,172) 1,299** (1,065-1,584) 1,046 (0,884-1,239) 1,149 (0,494-2,674) 1,429 (0,713-2,865)

É um facto assumido que o reconhecimento das perturbações pode facilitar a procura de ajuda em saúde mental, minorando o sofrimento e contribuindo para a resolução do problema, evitando a sua evolução para situações de cronicidade. O que se observa nesta amostra de adolescentes no que concerne ao reconhecimento e identificação das perturbações nas vinhetas é de facto muito modesto, podendo ser considerado como abaixo daquilo que seria o desejável, mesmo que se considere as combinações de rótulos assinalados pelos participantes.

Esquizofrenia OR (IC 95%) 0,841 (0,627-1,129) 0,840 (0,316-2,229) 1,251** (1,059-1,477) 0,989 (0,856-1,143) 0,857 (0,721-1,019) 1,012 (0,874-1,172) 1,256 (0,614-2,569) 1,194 (0,968-1,473) 1,046 (0,886-1,234) 1,115 (0,796-1,560) 1,005 (0,701-1,441) 1,052 (0,909-1,219) 0,880 (0,302-2,564) 1,034 (0,886-1,207) 0,918 (0,547-1,540) 0,990 (0,392-2,505)

Abuso de álcool OR (IC 95%) 0,860(0,571-1,295) 0,370***(0,235-0,584) 1,196(0,885-1,616) 2,451(0,803-7,478) 0,467(0,166-1,311) 0,957(0,641-1,430) 0,990(0,258-3,795) 0,954(0,734-1,241) 1,257(0,828-1,909) 1,172(0,997-1,378) 0,600***(0,506-0,711) 1,028(0,832-1,271) 0,556(0,106-2,902) 1,177(0,984-1,407) 1,558***(1,333-1,821) 1,097(0,219-5,495)

No que concerne à depressão (vinheta A) podemos verificar que apesar de serem assinalados rótulos que estão ajustados à situação, tais como depressão, stress, problemas emocionais/psicológicos/mentais e doenças mentais, certo é que o recurso aos rótulos como esgotamento nervoso, crise da idade e inclusive anorexia levanos a questionar o modo como é encarada a depressão, isto porque seja pela utilização do termo esgotamento nervoso, que é um termo vago utilizado para caracterizar quase todas as mudanças na saúde mental e não especifica o problema particular, seja ainda pela utilização Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 43


do termo crise da idade, que é normalmente assumido como fator da adolescência, certo é que pode significar a não valorização do sofrimento. Em ambos os casos não se trata de um entrave à procura de ajuda em saúde mental. A escolha do termo anorexia reflete ainda a incapacidade para reconhecer o problema, valorizando o sinal da perda de peso e o sintoma da perda de apetite. Relativamente à vinheta que refere um caso de esquizofrenia observa-se que os adolescentes são capazes de interpretar corretamente o problema, assinalando muitos dos rótulos adequados à situação, ainda que possam não compreender que o indivíduo em sofrimento tem pouca consciência da sua condição, com implicações no pedido de ajuda. Observa-se também nesta perturbação a utilização de termos mais gerais para rotular a situação, como doença mental e problemas emocionais/ psicológicos e mentais. É de salientar um duplo padrão de repostas. Por um lado, ao assinalar o rótulo doença mental com maior frequência (cerca de 3/5 da amostra) comparativamente ao que acontece com as outras duas vinhetas, pode indiciar que os adolescentes assumem que o problema é de facto grave e necessita de intervenção especializada. Por outro, o facto de assinalar rótulos como depressão e esgotamento nervoso pode sugerir menor gravidade da situação, e neste caso pode não se procurar a ajuda adequada. No caso da vinheta do abuso de álcool observa-se que também aqui o reconhecimento é complexo. Grande parte dos adolescentes reconhece a vinheta como sendo uma situação de abuso de álcool, contudo uma percentagem quase idêntica rotula a situação como alcoolismo. A sobrevalorização da situação como sendo alcoolismo, poderá ser bom, uma vez que a situação é percecionada como sendo grave, ainda que o rótulo alcoolismo seja aqui utilizado inadequadamente, revelando desconhecimento face aquilo que constitui, significa e o que implica a dependência, ainda que o uso do termo “alcoolismo” para falar de grande parte dos comportamentos associados ao álcool esteja banalizado. Como já se referiu, a associação do comportamento de abuso de álcool com uma crise transitória da idade, pode significar simultaneamente uma desvalorização do comportamento problema e inclusive uma barreira quer à procura de ajuda, quer à prestação da ajuda (Loureiro, Barroso, et al., 2013). Ao nível do estudo dos rótulos como preditores da intenção de procura de ajuda em saúde mental, os resultados merecem desde logo um reparo, isto porque apesar de alguns serem preditores com significado estatístico (esgotamento nervoso, anorexia e crise da idade), não são aqueles que correspondem à expectativa inicial referida e que caracterizam um reconhecimento/identificação adequado dos problemas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 44

Poderão ser apontadas várias explicações para estes resultados em todas as vinhetas, no entanto a que parece mais plausível situa-se ao nível da diferença entre aquilo que é a identificação e atribuição correta de um rótulo e o conhecimento do que o problema implica em termos da saúde do indivíduo em sofrimento e que acarreta a consulta de um profissional de saúde. No caso da depressão, os adolescentes assinalam e valorizam os sinais e sintomas descritos na vinheta, no entanto, como já foi referido noutros estudos (Jorm, 2012; Loureiro, Jorm et al., 2013), eles tendem, numa fase inicial, a não perspetivar a ajuda profissional como necessária e adequada, apontando a ajuda informal de amigos e familiares em detrimento dos profissionais de saúde. A intenção de procura de ajuda profissional na depressão é predita por dois rótulos que não correspondem a uma identificação correta do problema, tais como são esgotamento nervoso e anorexia pode dever-se ao facto, no caso do termo esgotamento nervoso, deste ter um forte enraizamento no universo sociocultural de referência destes adolescentes e eventualmente poder corresponder a uma efetiva valoração do problema, pois os adolescentes comungam da constelação de crenças e representações sociais das doenças mentais vigentes na sociedade. É ainda de salientar que, a procura de ajuda formal implica o recurso a profissionais de saúde, no entanto sabemos que esta procura é afetada de modo pungente pelo estigma associado às doenças mentais, e neste caso, as crenças estigmatizantes associadas às doenças mentais podem explicar a resistência dos jovens à procura de ajuda especializada, funcionando como uma barreira (Jorm, 2012). Entende-se também que os adolescentes que consideram o problema como uma crise da idade não valorizem o problema e não perspetivem a procura de ajuda como necessária. Ao nível da vinheta da esquizofrenia os resultados também nos levantam várias questões, especificamente se atendermos aquilo que é o conhecimento do que perturbação implica em termos da saúde mental e aquela que é a questão colocada relativamente à procura de ajuda (“Se estivesses a viver atualmente uma situação como a da(o) [nome], procurarias ajuda?”). Se o adolescente numa situação em que está a desenvolver uma esquizofrenia tem um reduzido insight acerca da sua condição, a capacidade de pedir ajuda está afetada e neste caso os resultados parecem consistentes, isto porque viver uma situação semelhante à descrita na vinheta implica que o jovem não peça ajuda, contudo não parece ser esse o caso. Parece-nos sim, que o reconhecimento através da utilização dos rótulos pode resultar mais daquilo que é a visibilidade pública


desta perturbação nos mass media, e em que os termos psicose e esquizofrenia são utilizados de modo quase indiscriminado. A consequência resulta num tipo de pensamento em que o problema é aparentemente considerado grave pelos adolescentes, no entanto não conseguem situar o pedido de ajuda (falamos de intenção, não de comportamento), ou seja, apenas quando lhe atribuem um cunho menos grave como a utilização do rótulo depressão, são capazes de perspetivar a ajuda como necessária e mostram intenção de pedir ajuda. Ao nível da vinheta do abuso de álcool os resultados mostram, por um lado, que a intenção de pedir ajuda resulta de uma visão do problema como configurando uma situação de alcoolismo, e ainda que não seja uma identificação correta face aos sinais e sintomas descritos, é salutar na medida em que o problema é perspetivado como grave e consequentemente a ajuda como necessária. Noutra perspetiva, situar o problema como uma crise da idade é considerado pelos adolescentes como uma razão para não procurar ajuda, e neste caso é preocupante pois sugere, uma desvalorização do comportamento problema (Loureiro, Barroso et al., 2013).

uma visão acrítica, que usa os mesmos pressupostos, metodologias e mensagens para intervenções que se querem diferenciadas. O setting escolar é um espaço primordial para intervenções neste domínio, já que a escola é lugar privilegiado para aquisição de saberes e competências promotoras de saúde, pelo que estes contextos são os mais adequados para trabalhar as questões de literacia em saúde mental.

CONCLUSÕES

Loureiro, L. (2008). Representações sociais da loucura: importância para a promoção da saúde mental. Tese de doutoramento. Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto.

Dos resultados deste estudo conclui-se, por um lado, que os rótulos indiciam uma valorização dos problemas de saúde mental presentes no quotidiano destes adolescentes, por outro, um reduzido reconhecimento do que são estas perturbações e situações problema e o que implicam na saúde e bem-estar. A intenção de pedir ajuda em saúde mental é um problema complexo, sobretudo quando as barreiras resultam, quer do desconhecimento e não valorização dos problemas, quer ainda do estigma social associado às perturbações. Os resultados sugerem a necessidade de construir programas de promoção da saúde mental em contexto escolar, assentes no conceito de literacia em saúde mental e que privilegiem todas as componentes do conceito, mais concretamente o reconhecimento dos problemas com objetivo de facilitar a procura de ajuda. Os programas devem englobar o pressuposto de que o conhecimento e competências a adquirir sejam voltadas para a ação em prol da saúde e bem-estar do indivíduo e dos seus pares, e para isso é necessário situar os conteúdos no universo social e cultural dos destinatários destas intervenções, não se cingindo à logica “fac-simile” de outros programas, iniciativas e temas,

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Associação Americana de Psiquiatria – APA (2006). DSM-IV-TR: manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais. Lisboa: Climepsi. Jorm, A. F. (2012). Mental health literacy: Empowering the community to take action for better mental health. American Psychologist, 67(3), 231-243. Kelly, C., Mithen, J., Fischer, J., Kitchener, B., Jorm, A. F., Lowe, A., & Scanlan, C. (2011). Youth mental health first aid: a description of the program and an initial evaluation. International Journal of Mental Health Systems, 5(4).

Loureiro, L., Barroso, T., Mendes, A., Rodrigues, M., Oliveira, R., & Oliveira, N. (2013). Literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens portugueses sobre abuso de álcool. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem, 17(3), 474-481. doi: 10.1590/S141481452013000300010 Loureiro, L., Dias, C., & Aragão, R. (2008). Crenças e atitudes acerca das doenças e dos doentes mentais: contributos para o estudo das representações sociais da loucura. Revista Científica da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde Referência, II(8), 33-44. Loureiro, L., Jorm, A. F., Mendes, A., Santos, J., Ferreira, R., & Pedreiro, A. (2013). Mental health literacy about depression: a survey of portuguese youth. BMC Psychiatry,13(1),129. doi: 10.1186/1471-244X-13-129 Loureiro, L., Pedreiro, A., & Correia, S. (2012). Tradução, adaptação e validação de um Questionário de Avaliação da Literacia em Saúde Mental (QuALiSMental) para Adolescentes e Jovens Portugueses a partir de um focus group. Revista de Investigação em Enfermagem, 25, 42-48. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 45


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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 46

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8

CARGA MENTAL E CARGA PSÍQUICA EM PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM | Maria Ferreira1; Carlos Ferreira2 |

RESUMO Os enfermeiros estão expostos no seu trabalho diário a um grande número de fatores que contribuem para a carga mental e psíquica, alguns dos quais inerentes ao próprio trabalho de Enfermagem, outros claramente relacionados com a organização do trabalho. A carga mental e a carga psíquica estão frequentemente associadas, podendo culminar em situações de stresse laboral. Os profissionais, por vezes, não têm consciência de estarem a viver uma situação negativa de stresse, contudo é uma realidade frequente e as suas consequências são muitas vezes ignoradas e até negligenciadas. O presente trabalho teve por base uma investigação realizada, através de um estudo transversal, por questionário, numa amostra aleatória de 235 enfermeiros, sendo 103 de um Instituto Oncologia e 132 de um Centro Hospitalar Português. Os resultados apontam para um índice elevado de carga mental em 59.5% dos inquiridos e um índice médio de carga psíquica em 67.0% dos enfermeiros de ambas as Instituições. Os níveis de carga mental incidiram maioritariamente na classe etária dos 20-30 anos e os profissionais com idades compreendidas entre os 20 e 40 anos apresentam um risco acrescido de carga psíquica. O horário por turnos de 35 horas semanais e a acumulação de funções constituem risco acrescido de carga mental e psíquica. Torna-se fundamental promover algumas medidas preventivas no sentido de contribuir para a qualidade de vida dos enfermeiros e com isso melhorar o seu desempenho e diminuir os índices de carga mental e de carga psíquica relacionados com a atividade laboral. PALAVRAS-CHAVE: Carga mental; Carga psíquica; Stresse profissional; Sinais de stresse

RESUMEN

ABSTRACT

“Carga mental y la carga psíquica en las enfermeras”

“Mental load and psychic load in nurses”

Las enfermeras están expuestos en su trabajo diario a un gran número de factores que contribuyen a la carga mental y psicológica, algunos de los cuales son inherentes a la labor de la enfermería, otros claramente relacionados con la organización del trabajo. La carga mental y carga psicológica se asocian a menudo, y dar lugar a situaciones de estrés laboral. Los profesionales a veces no saben que se enfrentan a una situación de estrés negativo, sin embargo, es una realidad y muchas veces sus consecuencias son a menudo ignorados e incluso abandonados. Este trabajo se basa en una investigación realizada por un estudio de corte transversal, un cuestionario en una muestra aleatoria de 235 enfermeras, 103 de un Instituto de Oncología y 132 un centro hospitalario portugués. Los resultados apuntan a una alta tasa de carga mental en el 59,5% de los encuestados, y un promedio de carga psíquica 67,0% de las enfermeras de ambas instituciones. Los niveles de carga mental se centraron principalmente en el grupo de edad de 20-30 años y los profesionales de edades comprendidas entre 20 y 40 años tienen un mayor riesgo de la carga mental. El cambio de hora de 35 horas a la semana y la acumulación de funciones están en mayor riesgo de la carga mental y psicológica. Es esencial promover algunas medidas preventivas para contribuir a la calidad de vida del personal de enfermería y así mejorar su rendimiento y reducir las tasas de carga mental y problemas psicológicos relacionados con la actividad laboral.

Nurses are exposed in their daily work to a large number of factors that contributes to mental and psychic workload, some of those are inherent to their nursing work and others are clearly related to the organization of work. Mental and psychic workloads are frequently associated and may lead to situations of stress at work. Sometimes the professionals have no conscience about the fact that they are living a negative stress situation, however it’s a frequent reality and the consequences are often ignored and even neglected. This work was based on a research made through a cross-sectional study, by questionnaire, in a random sample of 235 nurses, which 103 of them are from a Oncology Institute and 132 from a Portuguese Hospital Centre. The results indicates a high level of mental workload in 59,5% of the nurses and an average level of psychic workload in 67,0% of the nurses in both institutions. The levels of mental workload have focused mostly in age group of 20-30 years old and the nurses with ages between 20 and 40 years old show an increased risk of psychic workload. The schedule shifts of 35 hours per week and the accumulating work increases the risk of mental and psychic workload. It is essential to promote some preventive measures to contribute to the quality of life of nurses and thus improve their performance and reduce the rates of mental load and psychological burden related to labor activity.

DESCRIPTORES: Carga mental; Carga psicológica; Estrés profesional; Signos de estrés

KEYWORDS: Mental workload; Psychic Workload; Professional stress; Signs of stress

1 PhD em Medicina Preventiva e Saúde Publica; Docente da Escola Superior de Saúde do Instituto Jean Piaget de Vila Nova de Gaia – Enfermagem, mm_ferreira@netcabo.pt 2 Mestre em Saúde Pública; Enfermeiro Chefe no Hospital de Magalhães Lemos – Serviço de Residentes / Doentes Difíceis; Docente da Escola Superior de Saúde do Instituto Jean Piaget de Vila Nova de Gaia, 4470-370 Maia, Portugal, ccarlosferreira@netcabo.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 10-02-2014 Citação: Ferreira, M. & Ferreira, C. (2014). Carga mental e carga psíquica em profissionais de enfermagem. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 47-52. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 47


INTRODUÇÃO O trabalho tanto pode ser uma atividade extremamente enriquecedora para o individuo como constituir uma fonte de stresse, que gradualmente o desgasta (Sagehomme, 1997). As instituições de saúde constituem ambientes de trabalho particularmente stressantes. Quando as exigências laborais são percebidas pelo sujeito como excedentes aos recursos que tem para lidar com as mesmas, emerge o stress que pode conduzir à desmotivação, absentismo, angústia, baixo desempenho, e quebra de produtividade. O nível de stress será tanto maior quanto mais elevado for o desequilíbrio entre a perceção dos indivíduos e as caraterísticas objetivas do ambiente de trabalho (Serra, 2007). Consideram-se como fontes de stresse ocupacional, os fatores intrínsecos da profissão, o desenvolvimento da própria atividade profissional, as relações no trabalho, a estrutura e o clima organizacional, a progressão na carreira e a interface trabalho-família. Os enfermeiros vivenciam situações de stresse muito intensas, provenientes de conflitos de equipa, da sobrecarga de trabalho, da insegurança, da falta de autonomia, de conflitos de autoridade e, em grande parte, da atenção e dos cuidados que têm que disponibilizar continuamente aos doentes. São afetados por transtornos psicológicos superiores aos dos médicos e da população em geral, e quando em stresse, também se envolvem no consumo exagerado de álcool, tabaco e drogas ilícitas ou psicofármacos (Serra, 2007). O stress ocupacional constitui um problema de saúde pública, sendo responsável por elevados custos diretos e indiretos. Tendo em conta o seu impacto na saúde, qualidade de vida e economia torna-se indispensável intervir na sua gestão. CARGA MENTAL Fazer trabalhar a nossa massa cinzenta é uma atividade mental, que por sua vez origina carga mental. Esta pode estar relacionada com as tarefas que qualificamos de intelectuais, mas qualquer tarefa, mesmo a de maior esforço físico, implica carga mental. Independentemente do interesse ou da motivação, da natureza física ou intelectual da tarefa, existe uma carga mental ligada ao trabalho. Tudo o que vai perturbar o desenvolvimento de uma atividade de trabalho aumentará a nossa carga mental, mesmo que essa atividade seja aparentemente física (Magalhães, Riboldi & Dall’Agnol, 2009).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 48

A carga mental é um conceito que se utiliza para referir tensões induzidas numa pessoa pelas exigências do trabalho mental, tais como o processamento de informação relacionado com o conhecimento, a memorização, a procura de soluções em determinados momentos e a relação entre as exigências do trabalho e as capacidades mentais de que dispõe para fazer frente a tais exigências. Está relacionada com as tarefas que implicam fundamentalmente processos cognitivos e aspetos afetivos, tais como, a concentração, a atenção, a memorização, a coordenação de ideias e a tomada de decisão. São tarefas que requerem uma certa intensidade e esforço mental, mas necessárias para um bom desempenho profissional (Arquer, 2004). Nas situações de trabalho, são diversos os fatores que contribuem para a carga de trabalho mental e que exercem pressões sobre a pessoa que o desempenha (Arquer, 2004). Alguns autores debruçaram-se sobre estes fatores, agrupando-os em fatores inerentes à tarefa, como a informação, decisão/indecisão, incerteza, imprecisão e pressão de tempo e fatores Inerentes à organização do trabalho, como a comunicação, interrupções, ambiguidade de funções, tomada de decisão, satisfação profissional, carga e ritmo de trabalho (Sapata, 2012). CARGA PSÍQUICA A enfermagem é considerada uma profissão carregada de fortes emoções, pela natureza do seu trabalho. Implica cuidar de pessoas doentes ou em situações de saúde particularmente penosas, deparando-se os enfermeiros frequentemente com situações de inquietação, sofrimento, degradação e morte. Estas situações podem desencadear emoções ou sentimentos de natureza psíquica ou afetiva, intervindo na carga de trabalho, tornando este doloroso (Serra, 2007). São, sobretudo os sentimentos e emoções desagradáveis que podem ter consequências nefastas no organismo, tais como a fadiga, a irritabilidade, a instabilidade de caráter, a depressão e as somatizações. Outras consequências ainda se podem manifestar, tais como a dificuldade em realizar convenientemente as tarefas, a degradação da qualidade dos cuidados, o absentismo e abandono da profissão. Sobre o efeito emocional, é mais provável a ocorrência de erros, comportamentos inadequados e dificuldade de planificação do trabalho. A emotividade e a sensibilidade não diminuem propriamente com a experiência, pois quem é que se mantém indiferente perante um doente em fase de agonia, com dor ou perante a morte? Existe um limite além do qual as emoções e sentimentos se acumulam e provocam desequilíbrios na saúde, ou no próprio trabalho (Gestal, 2009; Ribeiro, 2004; Sapata, 2012).


A carga psíquica do trabalho de Enfermagem é influenciada por fatores específicos da profissão, com uma elevada implicação emocional e por fatores relacionados com a organização do trabalho, comuns a outras profissões (Frasquilho, 2005). Alguns autores consideram que na base destes fatores de risco estão o contacto contínuo com os doentes e família, em especial como o sofrimento e morte, as relações entre colegas e superiores hierárquicos, a valorização social da profissão, a necessidade de tomar decisões e o nível de responsabilidade, as qualificações profissionais, a valorização pessoal e a necessidade de reconhecimento, bem como o ambiente e a organização do trabalho, a carga de trabalho e os horários irregulares. (Puerto, Soler, Montesinos & Cortés, 2011) Considera-se que a carga mental e a carga psíquica estão presentes no desempenho da nossa atividade profissional, podendo-se afirmar que todos temos um limite além do qual as emoções e sentimentos se acumulam e começam a provocar desequilíbrios na nossa saúde e no nosso trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÃO As caraterísticas sociodemográficas da nossa amostra apontam para uma amostra predominantemente do sexo feminino, em ambas as instituições, com valores de 81.6% no HO e 83.3% no CH. (Figura 1) O estado civil de solteiro também predomina em ambas as instituições, com valores que se situam entre os 55.3% no HO e 54.5% no CH (Figura 2). Figura 1

Figu

Distribuição por Sexo

Distr

% 100

80 60 40 20

0

%

81,6 83,3

18,4 16,7

Feminino

HO CH

Masculino

D

V

C

S

MATERIAL E MÉTODOS Figura 1 Figura 2 Tratou-se de um estudo transversal ou de prevalência, Distribuição por Sexo Distribuição por Estado Civil cujo objetivo foi analisar os fatores que contribuem para a carga mental e psíquica em profissionais de enfermagem e identificar% sinais de stresse profissional. A popu% 100 lação foi constituída pelos de enfermagem 83,3 81,6 profissionais 55,3 54,5 60 a exercer funções 80 em duas unidades de internamento 42,7 43,2 50 hospitalar, um60 Centro Hospitalar (CH) e um Hospital 40 HO Oncológico (HO). A amostra foi constituída por todos HO 30 40 CH os enfermeiros que exerciam funções nos de CH 18,4 Serviços 20 16,7 20 Medicina e Cirurgia de internamento de adultos de am10 1 0 1 2,3 0 bos os hospitais,0 perfazendo um total de 359 elementos, Feminino Masculino dos quais 191 pertenciam ao CH (53%) e 168 ao HO (47%). A recolha de informação foi processada através de um questionário elaborado com base num já validado (Fiestas, 1995; Estryn-Behar 1999), utilizando alguns inTrata-se de uma população predominantemente jovem, dicadores de acordo com a realidade portuguesa. Para atendendo a que 68.9% dos enfermeiros do CH e 57.4% o tratamento e análise dos dados obtidos foi utilizado do HO se situam na classe etária dos 21 aos 30 anos, o programa informático de Estatística Package of the com uma média de idades, respetivamente de 29 e 25 Social Science (SPSS 19.0) e o programa informático anos. Os profissionais em estudo são maioritariamente Microsoft Excel. licenciados (Figuras 3 e 4).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 49

60 50 40 30 20 10 0


Figura Figura 31

Figura Figura24

Distribuição Etária

Distribuição por Formação Profissional

% 80 70 60 50 40 30 20 10 0

68,9 57,4

% HO 35,9

CH

22

21-­‐30

80 70 60 50 40 30 20 10 0

4,9 6,8

31-­‐40

41-­‐50

1,8 2,3 ≥ 51

Anos

70,9 66,7

0 2,3

28 22,3

HO

L

u E E o G C

BE

en

Lic

tu cia

ra

5,8 3

e ad d i al

ci

pe Es

1 0

CH

. Lic a utr

O

Em ambas as Instituições, os profissionais apresentam uma experiência profissional predominante inferior a 10 anos. O regime de horário mais praticado é o horário por turnos de 35 horas semanais, com 64% no HO e 56.8% no CH (Figuras 5 e 6). A acumulação do exercício profissional noutra Instituição foi referenciada por 38.6% dos enfermeiros que trabalham no CH e por 30.1% do HO. Figura Figura Figura15 Figura26

Experiências Profissional

Regime de Horário Praticado %

% 100

80 60 40 20

0

80

83,3 75,8

60

HO 40 19,4

0-­‐10 Anos

64

9,8

11-­‐20 Anos

4,8 6,9

CH 20 0

≥ 21 Anos

6,8

19,7

18,5

56,8

HO CH

16,7 10,7

6,8

Jorn. continua Jorn. Turnos (35h) Turnos (42h) continua (35h) (42h)

termos de carga mental, constatou-se que o índice de carga mental atingiu valores percentuais elevados, apreEm sentando um valor mais elevado no Centro Hospitalar quando comparado com o Hospital Oncológico. Este é considerado “alto” para 51.5% dos enfermeiros no HO e para 67.4% dos enfermeiros no CH e “médio” para 45.6% e 32.6% dos enfermeiros, respetivamente no HO e CH.. Já o índice de carga psíquica predominante é o “índice médio”, com 68.0% dos enfermeiros no HO e 65.9% no CH. O mesmo é considerado “alto” apenas para 9.7% no HO e 7.6% no CH (Figuras 7 e 8). Figura Figura Figura17 Figura2 8 Índice de Carga Mental % 70 60 50 40 30 20 10 0

45,6

32,6

2,9 0

Baixo

Médio

Índice de Carga Psíquica

51,5

HO CH

Alto

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 50

%

67,4

70 60 50 40 30 20 10 0

68 65,9

HO

26,5 22,3

Baixo

9,7 7,6

Médio

Alto

CH


A avaliação inferencial revela diferenças significativas para os índices de carga psíquica no CH (p <0.05) e altamente significativas no HO (p <0.001), permitindo inferir que o índice de carga psíquica é maior nos enfermeiros que trabalham em Oncologia. Evidenciaramse também diferenças estatisticamente significativas para o desenvolvimento de carga mental em ambos os sexos (p<0.05) e para a carga psíquica no sexo feminino (p<0.01). Estes resultados são concordantes com um estudo realizado, que refere um nível de carga psíquica elevado nas mulheres, com risco aumentado de fadiga emocional de cerca de sete vezes (OR= 6.9) (Cuenca, 2003). O tempo de exercício profissional mostra evidência estatística para o desenvolvimento de carga mental em todas as classes etárias (p<0.05), sendo esta mais manifesta na classe dos 20 aos 30 anos e com idade superior a 51 anos (p<0.05). Já para a carga psíquica, essa evidência observa-se na classe etária entre os 20 e os 40 anos (p<0.05). Observou-se também relação entre o tempo de exercício profissional e a carga mental (p<0.01) e psíquica p<0.05) nos enfermeiros que exercem a profissão à menos de dez anos. Os inquiridos com mais de vinte e um anos de experiência profissional, apresentam-se diferenças significativas para o desenvolvimento de carga psíquica (p<0.01) e mental (p<0.05). A prevalência de carga mental e psíquica no grupo dos 0-10 anos de experiencia profissional pode estar relacionada com a inexperiência profissional, a fase de adaptação à vida profissional, as caraterísticas inerentes da profissão, a integração no serviço e na instituição, a insegurança no trabalho e falta de autonomia profissional. No grupo com mais de vinte e um anos de experiência profissional, a maior prevalência de carga psíquica poderá estar relacionada com uma maior participação na tomada de decisão, o nível de responsabilidade exigido, a necessidade de valorização pessoal e reconhecimento, os horários irregulares e o confronto diário com o sofrimento e a morte. Observa-se ainda relação entre o regime de horário praticado e a prevalência de carga psíquica, com mais evidencia para o trabalho por turnos de 35 horas semanais (p<0.01). A acumulação do exercício profissional apresenta maior predisposição para o desenvolvimento de carga mental e psíquica (p <0.05), podendo considerar-se que o trabalho por turnos constitui um risco acrescido de carga psíquica e a acumulação de funções um risco acrescido de carga mental e psíquica. Alguns autores referem que os enfermeiros que trabalham por turnos estão mais predispostos à fadiga e desgaste, com implicações no seu bem-estar e segurança (Sapata, 2012).

São diversos os fatores que contribuem para a carga de trabalho mental e que exercem pressões sobre a pessoa que o desempenha. Na nossa amostra foram identificados alguns destes fatores contributivos de carga mental, sendo os mais referenciados as interrupções (68% no HO e 82% no CH) e sua interferência no trabalho, respetivamente com 33% e 39%, a sobrecarga de trabalho, com 45% no HO e 13% no CH e o ritmo rápido de trabalho, respetivamente com 64% e 62%. Alguns autores referem que a sobrecarga de trabalho e a escassez de pessoal são fatores que mais tensão e stresse produzem no pessoal de Enfermagem. As interrupções dos atos realizados pelos enfermeiros, nomeadamente chamadas telefónicas, perguntas de familiares e utentes, são uma constante no dia-a-dia, que obrigam a retomar o ato inicial, sendo responsáveis por uma maior complexidade na memorização das atividades e à necessidade de uma reprogramação mental. Um estudo efetuado cita que 44.0% dos enfermeiros são interrompidos frequentemente e 37.0% têm que reorganizar o trabalho planeado, do qual 26.0% referem sensação de sobrecarga de trabalho (Magalhães, Riboldi & Dall’Agnol, 2009; Sapata, 2012). Os fatores de carga psíquica que mais contribuíram para o índice de carga psíquica foram as caraterísticas inerentes aos doentes submetidos a cuidados (87% no HO e 77% no CH), as repercussões do trabalho na vida privada (72% no HO e 61% no CH), a não valorização e progressão na carreira (60% no HO e 54% no CH) e a falta de tempo para falar com utentes e familiares (38% no HO e 41% no CH). Alguns sinais de stresse foram referenciados pelos profissionais do HO, nomeadamente “aumento de fadiga” (77.7%), o “medo de cometer erros” (68.9%), a “dificuldade de concentração” (67.0%), as “perturbações do sono” (61.2%) e a “irritabilidade fácil” (55.3%). Relativamente aos enfermeiros do CH assumem maior relevância percentual o “aumento de fadiga”, (75.0%), a “dificuldade de concentração” (56.8%), as “perturbações do sono” (56.1%), a “irritabilidade fácil” (53.8%), as “falhas de memória” (50.8%) e o “medo de cometer erros” (47.7%). A análise estatística dos sinais de stresse com os índices de carga mental evidencia diferenças estatisticamente significativas para a dificuldade de concentração, perturbações do sono e falhas de memória (p<0.05) e altamente significativas para o aumento da fadiga e medo de cometer erros (p<0.01). Relativamente à carga psíquica, verificaram-se diferenças estatisticamente significativas para o medo de cometer erros e perturbações do sono (p<0.05) e altamente significativas para as falhas de memória e irritabilidade fácil (p<0.01). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 51


Estes resultados permitem confirmar a nossa hipótese, constatando a existência de relação entre os índices de carga mental e psíquica e a presença de alguns sinais de stresse. Estudos referem que os fatores maioritariamente causadores de stresse são a sobrecarga de trabalho, a falta de tempo para realizar todas as tarefas, as condições de trabalho, o espaço físico, a falta de tempo para os doentes e o receio de cometer erros (Puerto, Soler, Montesinos, & Cortés, 2011). Outros autores identificaram ainda a sobrecarga de trabalho, o contato com a morte e o cuidar de doentes graves (Vázquez, Varela, García & Fernández, 2001). CONCLUSÕES As conclusões do estudo evidenciam: em ambas as instituições observou-se um índice elevado de carga mental e índice médio de carga psíquica; o sexo feminino apresenta risco aumentado de desenvolver carga psíquica; maior prevalência de carga mental no grupo etário dos 21-30 anos e nos profissionais com mais de 51 anos; maior prevalência de carga psíquica nos profissionais com idades compreendidas entre os 21-40 anos de idade; os profissionais com menor experiencia profissional apresentam risco acrescido de desenvolver carga mental; os profissionais com mais de 21 anos de experiencia profissional apresentam risco aumentado de desenvolver carga psíquica; os enfermeiros que trabalham por turnos apresentam maior prevalência de carga psíquica, enquanto os que acumulam funções apresentam maior prevalência de carga mental e psíquica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Arquer, I & Nogareda, C. (2004). NPT 659: Carga Mental de Trabajo: diseño de tareas. INSHT. Acedido em outubro 6, 2013, em: http://www.insht.es/InshtWeb/ Contenidos/Documentacion/FichasTecnicas/NTP/ Ficheros/601a700/ntp_659.pdf Cuenca, G. (2003). La Ergonomía, el Hombre y la Situación de Trabajo. Acedido em outubro 6, 2013, em: http://www.arearch.com/salud%20laboral/ergonomia. htm Estryn-Behar, M. (1999). Stress et souffrance des soignants à l’hôpital: Reconnaissance, analyse et prévention. Paris: Estem. Fiestas M. (1995). Condiciones de Trabajo de la Mujer en el área de Enfermería de un Hospital. Madrid: Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 52

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9

CONSTRUÇÃO E VALIDAÇÃO DE UM INSTRUMENTO PARA AVALIAR A SATISFAÇÃO E IMPORTÂNCIA ATRIBUÍDA AOS SERVIÇOS DE ENFERMAGEM PRESTADOS NA ÁREA DA SAÚDE MENTAL | Sandra Mota1; Maria Araújo2 ; Maria Trigueiros3; António Leuchner4; Maria Sousa5 |

RESUMO A avaliação da satisfação dos utentes é um indicador da qualidade e eficácia dos cuidados de saúde prestados, pelo que é da maior importância ter instrumentos válidos para a recolha desta informação. Na existência de poucos instrumentos que cumpram esses requisitos, procedemos à construção e validação de um que permitisse avaliar a satisfação dos utentes e a importância que estes atribuem aos cuidados prestados numa instituição de saúde mental. Avaliou-se as propriedades psicométricas do instrumento, através dos testes α de Cronbach, Ró de Spearman e análise fatorial, numa amostra de 95 utentes. Verificou-se que o instrumento cumpriu os critérios intermédios necessários para ser considerado um instrumento validado para os utentes de consulta externa de cuidados de enfermagem de uma instituição de saúde mental. Verificou-se ainda que os utentes se encontram satisfeitos com os cuidados prestados e consideram estes cuidados importantes. PALAVRAS-CHAVE: Qualidade dos cuidados de saúde; Serviços de enfermagem; Validação de um instrumento; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“Construcción y validación de un instrumento para evaluar la satisfacción y la importancia dada a los servicios de enfermería prestados en el ámbito de la salud mental”

“Construction and validation of an instrument to assess satisfaction and importance given to the nursing services provided in the area of mental health”

La evaluación de la satisfacción del usuario es un indicador de la calidad y eficacia de la atención prestada, por lo que es muy importante contar con instrumentos válidos para la recogida de esta información. La existencia de unos instrumentos que cumplen estos requisitos, se procede a la construcción y validación de una medida que permitiría a la satisfacción del usuario y la importancia que atribuyen a los servicios prestados en una institución de salud mental. Se evaluaron las propiedades psicométricas del instrumento, utilizando el test de Cronbach α, Spearman Rho y el análisis factorial, una muestra de 95 usuarios. Se encontró que el instrumento intermedia cumplía los criterios necesarios para ser considerada una herramienta validada para los usuarios de la atención de enfermería ambulatoria en una institución de salud mental. También se encontró que los usuarios están satisfechos con los servicios prestados y considerar estos importantes servicios.

User satisfaction evaluation is an indicator of the quality and effectiveness of care provided, so it is very important to have valid instruments for the collection of this information. The existence of a few instruments that meet these requirements, we proceed to the construction and validation of an instrument that would allow the evaluation of user satisfaction and the importance they attribute to the care provided in a mental health institution. We evaluated the psychometric properties of the instrument, using Cronbach’s α test, Spearman Rho and factor analysis, a sample of 95 users. It was found that the instrument fulfilled the intermediate criteria necessary to be considered a validated tool for users of outpatient nursing care in a mental health institution. It was also found that users are satisfied with the care provided and consider these services important.

DESCRIPTORES: Calidad de la atención de salud; Servicios de enfermería; Validación de un instrumento; Salud mental

KEYWORDS: Health care quality; Nursing services; Instrument validation; Mental health

1 Assistente na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto – Instituto Politécnico do Porto: Área Científica de Análises Clínicas e Saúde Pública, CISA – Centro de Investigação em Saúde e Ambiente, 4400-330 Vila Nova de Gaia, Portugal, smm@estsp.ipp.pt 2 Técnica Superior de Saúde no Centro Hospitalar Tâmega e Sousa, 4564-007 Penafiel, Portuga, araujo.mariaj@gmail.com 3 Assistente na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto – Instituto Politécnico do Porto: Área Científica de Terapia Ocupacional, LabRP – Laboratório de Reabilitação Psicossocial da FPCEUP-UP/ESTSP-IPP, 4400-330 Vila Nova de Gaia, Portugal, mft@estsp.ipp.pt 4 Presidente do Conselho de Administração do Hospital de Magalhães Lemos, E.P.E., 4149-003 Porto, Portugal, ALeuschner@hmlemos.min-saude.pt 5 Professora Adjunta na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto – Instituto Politécnico do Porto: Área Científica de Análises Clínicas e Saúde Pública, CISA – Centro de Investigação em Saúde e Ambiente, LabRP – Laboratório de Reabilitação Psicossocial da FPCEUP-UP/ESTSP-IPP, Vila Nova de Gaia, Portugal, mas@estsp.ipp.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 10-02-2014 Citação: Mota, S., Araújo, M., Trigueiros, M., Leuchner, A., & Sousa, M. (2014). Construção e validação de um instrumento para avaliar a satisfação e importância atribuída aos serviços de enfermagem prestados na área da saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 53-58. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 53


INTRODUÇÃO A avaliação da satisfação é uma importante medida de resultado, já que estudos apontam que a probabilidade de um utente seguir as prescrições clinicas, voltar a outra consulta e continuar com o mesmo prestador de cuidados é mais elevada quando se encontra satisfeito (Beattie, Pinto, Nelson, & Nelson, 2002; Gigantesco, Morosini, & Bazzoni, 2003; Gigantesco, Picardi, Chiaia, Balbi, & Morosini, 2002; Pego, 1998; Ruggeri et al., 2000). Apesar de a satisfação dos utentes ser considerada uma variável de difícil operacionalização, por ser multidimensional e subjetiva, tem existido esforço em sistematizar as grandes dimensões que abrange. Assim, segundo na literatura, (Crow et al., 2002; Pego, 1998; Sitzia & Wood, 1997) as dimensões do conceito satisfação podem ser agrupadas em fatores inerentes aos serviços de saúde e fatores inerentes ao utente. Os fatores inerentes aos serviços de saúde, também designados por dimensões da satisfação, são: aspetos técnicos, aspetos interpessoais, acessibilidade, disponibilidade, continuidade

de cuidados, aspetos financeiros, resultado dos cuidados, e caraterísticas físicas do ambiente (Druss, Rosenheck, & Stolar, 1999; Gigantesco, et al., 2002). Os principais fatores inerentes ao utente são o estado de saúde, caraterísticas socioeconómicas e demográficas e as suas expectativas (Barker & Orrell, 1999; Crow, et al., 2002; Hasler et al., 2004). A avaliação da satisfação, como indicador da qualidade da prestação de cuidados de saúde, é muito útil na comparação de diferentes programas ou sistemas de saúde e na identificação de aspetos que necessitam de melhorias. Assim, têm surgido projetos (Langle et al., 2003; Sousa, 2003) que utilizam a medição conjunta da satisfação e da importância, considerando que a diferença entre estas duas variáveis representa uma medida mais sensível para planear e avaliar a qualidade da prestação de serviços. Segundo modelo de Harvey, 2001, a análise conjunta da satisfação e da importância permite identificar as áreas onde se podem realizar ações de melhoria (Tabela 1) (Harvey, 2001; Langle, et al., 2003; Sousa, 2003).

TABELA 1 - Identificação das áreas a implementar face aos resultados do cruzamento das respostas da importância com as da satisfação

Muito insatisfeito

Insatisfeito

Muito importante

E Ação imediata

D C Grande prioridade Alvo de futura de ação melhoria

Importante

e Ação para melhorar

d Alvo de melhoria

Nada importante

d) e) Garantir que não Melhorar até onde os há deslizamento recursos o permitir de posição

Adequado

Satisfeito

Muito satisfeito

A B Manter os Garantir melhoria padrões de até onde for possível excelência c a b Garantir que não Evitar esforços Manter os padrões à deslocamento desnecessários de posição c) Atenção restrita

b) Manter os padrões

a) Não necessita de ação

Adaptado de Harvey, 2001

A satisfação dos utentes com os cuidados prestados pode ser avaliada de diversas formas, sendo o questionário uma das mais utilizadas. No entanto, não se encontram muitos construídos para o efeito e adaptados às caraterísticas da população e dos serviços portugueses. Neste caso, parece-nos ser importante desenvolver medidas que se adequem à avaliação da satisfação e da importância dada aos nossos serviços de saúde. Contudo, após a construção de um questionário (Almeida & Freire, 2000; Ribeiro, 1999), é necessário proceder à sua validação através da análise das propriedades psicométricas: sensibilidade, fidelidade e validade (Almeida & Freire, 2000; Ferreira & Marques, 1998). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 54

Face ao exposto, este estudo teve como objetivos: a) construir e validar um questionário para avaliar o grau de satisfação e de importância atribuída aos cuidados de enfermagem prestados aos utentes da consulta externa de uma instituição de saúde mental, b) perceber, através da análise das respostas dos utentes, o grau de satisfação e de importância atribuída aos cuidados de enfermagem.


METODOLOGIA Participantes (população e amostra) A população do estudo são os utentes do Serviço de Enfermagem da Consulta Externa de uma instituição de Saúde Mental. A amostra para a construção do questionário, não probabilística, foi constituída por 5 profissionais do serviço (um psiquiatra, uma enfermeira, uma assistente social, uma psicóloga e uma administrativa) e por 10 utentes que recorreram num dia a este mesmo serviço, num total de 15 indivíduos (Painel de Peritos). A amostra para avaliação das propriedades psicométricas e dos dados obtidos, foi constituída por 95 utentes que recorreram à instituição de saúde durante o período de um mês. Excluíram-se os questionários indevidamente preenchidos. Instrumentos A primeira versão do questionário, com 45 itens, foi submetida a um Painel de Peritos que, após reformulação, culminou na versão final, o Questionário da Satisfação dos Utentes da Consulta de Enfermagem (QSUCE). O QSUCE é de auto-aplicação e dividido em duas partes. A primeira inclui a caraterização sociodemográfica do utente e a segunda, a avaliação da satisfação e importância que os utentes atribuem aos cuidados prestados na consulta de enfermagem. Esta segunda parte é constituída por 18 itens: 15 para avaliação da satisfação e da importância, dois itens ancora para avaliação da satisfação global e um item no qual os utentes declaram se recomendariam aquela instituição a familiares ou amigos. Todas as respostas aos itens, à exceção deste último (escala dicotómica), são dadas numa escala de cinco posições, tipo Likert, apoiada nos termos “1 = nada satisfeito a 5 = muito satisfeito” e “1 = nada importante a 5 = muito importante”. No final do questionário existe um espaço para os respondentes colocarem sugestões para melhorar o serviço. Os itens formulados propõemse abranger, com base na literatura, (Crow, et al., 2002; Pego, 1998; Sitzia & Wood, 1997), as componentes da satisfação: aspetos interpessoais (5 itens); aspetos técnicos (4 itens); acessibilidade/amenidades (6 itens). Procedimentos A primeira versão do instrumento, construída com base na investigação na área e em instrumentos já existentes, foi submetida a um Painel de Peritos sob a forma de Teste de Compreensão, com o objetivo de obter uma apreciação crítica relativamente à clareza, correção, compreensão e relevância dos itens (validade de conteúdo). A versão final do QSUCE foi respondida pelos utentes que recorreram à instituição de saúde mental no período definido.

Da análise das propriedades psicométricas foram ainda verificadas a sensibilidade, fidelidade (consistência interna e estabilidade intertemporal), validade de critério e de constructo. De forma a avaliar a estabilidade intertemporal, o QSUCE foi aplicado uma segunda vez, com intervalo de 10 a 15 dias, a 24 utentes pertencentes à mesma amostra. Utilizou-se estatística descritiva para a caraterização da amostra, determinação de máximos e mínimos da distribuição dos resultados de cada um dos itens e frequências do grau de satisfação e importância atribuída pelos utentes aos cuidados prestados. Para a determinação da consistência interna, foi usado o α de Cronbach e para a estabilidade intertemporal e a validade de critério o ró de Spearman; a validade de constructo foi verificada pela análise fatorial dos itens. As respostas à pergunta aberta foram analisadas utilizando a técnica de análise temática (Bardin, 1977), tendo-se depois contabilizado as respostas através das frequências. Os valores da importância foram posteriormente agrupados numa escala de 3 pontos, e cruzados com os da satisfação, de acordo com as recomendações (Harvey, 2001), e classificados segundo a sua nomenclatura (Tabela 1). RESULTADOS Verificou-se que a amostra apresenta maior frequência de utentes do sexo masculino (57,9%), na classe de idades dos 49 a 56 anos (23,2%), solteiros (52,6%), escolaridade 1ºciclo (31,6%), com patologia de esquizofrenia (53,7%). No teste de compreensão, realizado à primeira versão do questionário, o painel de peritos sugeriu a eliminação de alguns itens (Tabela 2), bem como a reformulação de outros de forma a terem uma linguagem mais acessíveis a todos os utentes. TABELA 2 - Discrição dos aspetos avaliados em itens que foram eliminados

Itens eliminados I1-Atenção dada aos utentes; I2-Condições e horários das instalações e/ou dos serviços da instituição; I3-Conhecimentos e atitude da equipa de enfermagem; I4-Continuidade de cuidados de enfermagem I4-Existência de assistentes sociais; Informação prestada sobre utilização de outros serviços da instituição I5-Informação fornecida aos utentes; I6-Linguagem utilizada pelos enfermeiros; I7-Localização da instituição I8-Preocupação em explicar e repetir informação quando não é entendida pelo utente I9-Preocupação, interesse e disponibilidade por parte dos profissionais; I10-Relação utente-enfermeiro I11-Respeito com que o utente é tratado; I12-Tempo de espera; I13-Tempo na prestação dos cuidados de enfermagem Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 55


Relativamente à sensibilidade, todos os itens do QSUCE percorrem a totalidade da escala de valores, à exceção dos itens 2,3,6,12,13,14 e 15. Estes itens apresentaram mínimo de 2 e máximo de 5. Os resultados da consistência interna, estabilidade temporal e validade de critério do questionário encontram-se descritos na Tabela 3. TABELA 3 - Resultados das propriedades psicométricas

Propriedade Psicométricas

Análise/Teste estatístico

Sensibilidade

Análise descritiva Maioria dos itens permínimo/máximo correm toda a escala

Fidelidade - Consistência interna

Resultados

α de Cronbach

0,827-Excelente

- Estabilidade intertemporal

Ró de Spearman

0,912 - Excelente

Validade de critério Validade de construto

Ró de Spearman Análise factorial

0,658 - Razoável 2 factores 43,97% de variância

Na análise fatorial (KMO 0,852) os 15 itens foram agrupados em 2 fatores (Tabela 4). Apenas 3 itens se encontram no fator 2: “Os horários de atendimento no serviço de enfermagem”; “Os dias de atendimento no serviço de enfermagem” e “Os acessos à instituição”. Os restantes 12 itens estão no fator 1. Verifica-se que os dois fatores explicam 43,97% da variância total dos itens, e a maioria destes itens se encontra no fator 1 (12 itens). TABELA 4 - Resultados da matriz das componentes

Itens- Satisfação com

Fatores 1

O tempo despendido pelo enfermeiro/a na prestação de cuidados de enfermagem O respeito que o enfermeiro/a manifesta pela privacidade durante os tratamentos A atenção do enfermeiro/a para ouvir o utente A linguagem utilizada pelo enfermeiro/a A informação dada pelo enfermeiro/a sobre o tratamento efetuado A simpatia /amabilidade do enfermeiro/a A competência com que o enfermeiro/a efetuou o tratamento As condições de higiene do gabinete de enfermagem Os cuidados de enfermagem que são prestados para resolver a situação de doença A informação dada sobre os serviços disponíveis na instituição O tempo de espera para efetuar o tratamento de enfermagem A existência de TV/ revistas na sala de espera Os horários de atendimento no serviço de enfermagem Os dias de atendimento no serviço de enfermagem Os acessos à instituição

,731

Valor próprio % de variância

4,979 33,197

2

,714 ,718 ,704 ,690 ,679 ,652 ,616 ,507 ,464 ,455 ,298

,672 ,556 ,438

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 56

1,616 10,771

Relativamente aos resultados obtidos sobre a satisfação e importância verifica-se que a maior frequência de respostas aos itens sobre satisfação é Satisfeito e aos itens da variável importância, Importante e Muito Importante. Na tabela 5 mostram-se, por item, o grau de Satisfação e Importância mais frequentes na amostra, bem como a classificação da ação resultante (Harvey, 2001). TABELA 5 - Respostas mais frequentes nas componentes da satisfação e importância, e classificação. B - Garantir melhoria até onde for possível; b - Manter os padrões

Item Satisfação com…

Valor da Satisfação Mais Frequente (%)

Valor da Importância Mais Frequente (%)

Conclusão

Os dias de atendimento no serviço de enfermagem A linguagem utilizada pelo enfermeiro/a O tempo despendido pelo enfermeiro/a na prestação de cuidados de enfermagem A competência com que o enfermeiro/a efectuou o tratamento Os horários de atendimento no serviço de enfermagem As condições de higiene do gabinete de enfermagem Os cuidados de enfermagem que são prestados para resolver a situação de doença A informação dada pelo enfermeiro/a sobre o tratamento efectuado Os acessos à instituição

Satisfeito 74,7 Satisfeito 74,7 Satisfeito 72,6

Importante 38,9 Importante 50,5 Importante 55,8

b

Satisfeito 66,3

Muito Importante 57,9

B

Satisfeito 66,3 Satisfeito 65,3 Satisfeito 60,0

Importante 42,1 Muito Importante 65,3 Muito Importante 56,9

b

Satisfeito 54,7

Muito Importante 49,6

B

Satisfeito 53,7 Satisfeito 53,7

Importante 52,6 Importante 53,7

b

Satisfeito 51,6 Satisfeito 50,5 Satisfeito 48,4

Muito Importante 64,2 Importante 60,0 Muito Importante 53,7

B

Satisfeito 47,4

Importante 47,4

b

Satisfeito 44,2

Muito Importante 53,7

B

A existência de TV revistas na sala de espera O respeito que o enfermeiro/a manifesta pela privacidade durante os tratamentos A informação dada sobre os serviços disponíveis na instituição A simpatia/amabilidade do enfermeiro/a O tempo de espera para efectuar o tratamento de enfermagem Atenção do enfermeiro/a para ouvir o utente

b b

B B

b

b B

Na análise conjunta da variável satisfação e importância verifica-se que todos os itens são considerados entre a posição b e B, ou seja, é considerado que o serviço deve manter os padrões e o sistema de gestão dos serviços deve garantir melhoria até onde for possível. A questão 18 “recomendava os serviços da Instituição a alguém que necessite de cuidados de saúde”, obteve-se 97,9% de respostas positivas.


A análise temática aos resultados obtidos na questão aberta aponta como sugestão mais referida pelos utentes existir maior disponibilidade dos enfermeiros para darem atenção, informação e apoio emocional. A segunda sugestão apontada relacionava-se com os acessos à Instituição. DISCUSSÃO A construção do QSUCE cumpriu os passos referidos na literatura, de revisão bibliográfica para a formulação de um conjunto de itens que integraram a sua primeira versão. A apreciação relativamente à clareza, correção, compreensão e relevância dos itens por um painel de peritos, e a consequente reformulação de alguns itens e eliminação de outros permitiu obter uma versão final para avaliar a qualidade dos cuidados de enfermagem na consulta externa de um serviço de saúde de cuidados de saúde mental. Na análise da validade de constructo, identificamos duas dimensões da satisfação que contribuem mais significativamente para a satisfação global dos utentes. O fator 1 que incorpora aspetos técnicos, interpessoais e acessibilidade/amenidades. O fator 2 que engloba itens que captam a acessibilidade/amenidades. Este número de fatores (2) não corresponde ao das dimensões inicialmente consideradas (3), no entanto, conservam-se dois fatores o que atribuem à satisfação um caráter de multidimensionalidade. Assim, as duas dimensões encontradas neste estudo parecem traduzir uma avaliação dos cuidados de enfermagem prestados aos utentes da amostra que não diferencia aspetos técnicos e interpessoais, mas antes os considera no seu todo. Isto é encontrado igualmente descrito na literatura, sendo considerado que existe dificuldade em o utente avaliar a capacidade técnica do profissional e diferenciá-la dos aspetos interpessoais (Pego, 1998; Sitzia & Wood, 1997). Mas, considerar esta multidimensionalidade não é unânime entre autores, com efeito segundo Nabati, Shea, McBride, Gavin, & Bauer, 1998, a satisfação nos cuidados de saúde é um constructo unidimensional, pelo que fica em aberto a discussão acerca da uni ou multidimensionalidade do constructo satisfação (Barker & Orrell, 1999; Nabati, et al., 1998; Pego, 1998). Na análise da sensibilidade verificou-se que alguns dos itens não percorriam toda a escala de valores e que os resultados revelavam uma tendência de enviesamento à direita, facto que a literatura também descreve (Barker & Orrell, 1999).

Obtivemos um α de Cronbach excelente (0,827), pelo que podemos dizer que o QSUCE tem elevada consistência interna e que tem excelente estabilidade temporal (r= 0,912). Em relação à validade de critério obteve-se um valor razoável (r=0,658) o que indica que os itens que constituem o questionário avaliam realmente a variável satisfação. Na aplicação do modelo de análise conjunta da satisfação com a importância verifica-se que o serviço deverá manter os padrões (b) e em alguns itens é importante que o sistema de gestão dos serviços garantam a melhoria até onde for possível (B). Na questão aberta, é apontada a importância de existir maior disponibilidade dos enfermeiros para apoiarem os utentes. Já a sugestão de melhoria nos acessos à Instituição apesar de ter sido a segunda mais apontada, os utentes reconheciam ser um fator externo à vontade da instituição uma vez se tratar da alteração e anulação das rotas dos transportes públicos. CONCLUSÕES Na saúde mental a qualidade de prestação de cuidados é essencial para que os programas sejam efetivos na prossecução dos seus objetivos. Para isso é importante que os seus serviços possuam instrumentos válidos para a recolha de informação. O QSUCE mostrou bons índices identificando um grande fator que engloba as questões interpessoais e técnicas e um outro limitado à acessibilidade. Deste modo a validação do QSUCE permite que a instituição de saúde mental recolha dados ao longo do tempo e tire conclusões válidas sobre essa prestação de modo a planear as ações em conformidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, A. & Freire, T. (2000). Metodologia da investigação em psicologia e educação (2ª ed.). Braga: Psiquilíbrios. Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70. Barker, D. A. & Orrell, M. W. (1999). The Psychiatric Care Satisfaction Questionnaire: a reliability and validity study. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 34(2), 111-116. Beattie, P. F., Pinto, M. B., Nelson, M. K., & Nelson, R. (2002). Patient satisfaction with outpatient physical therapy: instrument validation. Physical Therapy, 82(6), 557-565. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 57


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10 FAMILIAR CUIDADOR DA PESSOA COM PSICOSE: SATISFAÇÃO NA

PRESTAÇÃO DE CUIDADOS1

| Catarina Dinis2 ; Teresa Rodrigues-Ferreira3; José Carlos Carvalho4 |

RESUMO CONTEXTO: A doença, qualquer que seja a sua natureza, é vivenciada pela pessoa como uma agressão, conduzindo muitas vezes a uma incapacidade no individuo que se repercute no contexto familiar. OBJETIVO: Descrever a satisfação do familiar cuidador e suas as fontes de satisfação. METODOLOGIA: Questionário para recolha de dados socioclínicos do doente com psicose e um questionário dirigido ao familiar cuidador, heteropreenchido, para recolha dos dados psicossociais, aplicação da Escala de Avaliação da Espiritualidade, a Carers’ Assessment of Satisfactions Index (CASI), versão portuguesa. RESULTADOS: Os fatores do CASI que mais contribuem para a satisfação do familiar cuidador são a dinâmica dos resultados e o desempenho do papel de cuidador. O contexto de cuidar é o fator que melhor explica a variância da escala global (CASI). A atribuição de um significado de vida, a da esperança e uma perspetiva de vida positiva constituíram fontes de satisfação em particular no contexto de cuidar para o familiar cuidador. CONCLUSÕES: São várias as fontes de satisfação do familiar cuidador no prestação de cuidados pessoa mentalmente doente, que poderão constituir um desafio para o Enfermeiro de Saúde Mental e Psiquiatria, no sentido de preservar, promover e potencializar as capacidades no processo de cuidar, quer da pessoa quer do familiar cuidador. PALAVRAS-CHAVE: Satisfação; Familiar cuidador; Pessoas mentalmente doentes; Psicose

RESUMEN

ABSTRACT

“Los cuidadores familiares de personas con psicosis: satisfacción en el cuidado”

“Family caregivers of people with psychosis: satisfaction in care”

CONTEXTO: La enfermedad, cualquiera que sea su naturaleza, es vivida por la persona como una agresión, evolucionando muchas veces a una incapacidad del individuo que se repercute en el contexto familiar. OBJECTIVO: La satisfacción del familiar cuidador y las su fuentes de satisfacción. METODOLOGÍA: La recogida de datos socioclínicos del enfermo con psicosis es un cuestionario hacia el familiar cuidador, heterorelleno, para la recogida de los datos psicosociales, aplicación del Escala de Evaluación de la Espiritualidad, a Carer´s Assessment of Satisfactions Index (CASI), versión portuguesa. RESULTADOS: Los factores de CASI que más contribuyen para la satisfacción del familiar cuidador son la dinámica de los resultados y desempeño de su función al cuidado. El contexto de cuidar es el factor que mejor explica la variación de la escala global (CASI). La atribución de un significado de vida, la de la esperanza y una perspectiva de la vida positiva constituyeron frentes de satisfacción en particular en el contexto del cuidador para con el familiar cuidado. CONCLUSIÓN: Son varias las fuentes de familiar cuidador en prestación de cuidados al enfermo mental, que podrán constituir un desafío para el Enfermo de Salud Mental y Psiquiatría, en el sentido de preservar, promover y potenciar las capacidades durante el proceso de cuidar, ya sea del enfermo o del familiar cuidador.

CONTEXT: Illness, whatever its nature may be, is often felt as an aggression on the individual and conducive to an incapacitative state with repercussions within the family context. OBJECTIVE: The main question this research aims to sources of satisfaction, will be described through this research. METHODS: A questionnaire was applied to the patient with psychosis to gather socio-clinical data. Another questionnaire, aimed at the family caregiver, was carried-out by the investigator to gather psychosocial data, application of the data on two scales; the Escala de Avaliação da Espiritualidade scale, Carer’s Assessment of Satisfaction Index (CASI), the Portuguese version. RESULTS: The CASI factors which contribute the most to the family caregiver are the dynamics of the results and the caregiver’s performance. The caring context is the factor which best explains and relates to the variance of the global scale (CASI). A sense of meaning of life, hope and a positive outlook on life can be identified as sources of satisfaction for the family member carrying out the caregiver role. CONCLUSION: There are several sources of satisfaction for the family member, when carrying out the role of caregiver of the mentally persons, which may present themselves as tools for the psychiatric and mental health nurse, aimed to preserve, promote and potentiate his/her capacity in the caring process, with benefits to both the mentally persons and family caregiver.

DESCRIPTORES: Satisfacción; Familiar cuidador; Enfermos mentales; Psicosis

KEYWORDS: Satisfaction; Caregiver family; Mentally ill persons; Psychosis

1 Artigo extraído de Dissertação de Mestrado em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria “Satisfação do Familiar Cuidador do Doente Mental com Psicose” (2011) 2 Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria; Enfermeira no Centro Hospitalar São João EPE – Serviço de Psiquiatria: Polo Porto, catarinazevedodinis@gmail.com 3 Doutora em Psicologia; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, teresarodrigues@esenf.pt 4 Doutor em Ciências de Enfermagem; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, zecarlos@esenf.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 07-02-2014 Citação: Dinis, C., Ferreira, T., & Carvalho, J. C. (2014). Familiar cuidador da pessoa com psicose: satisfação na prestação de cuidados. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 59-64. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 59


INTRODUÇÃO Segundo a Coordenação Nacional para a Saúde Mental (CNSM, 2007-2016) os estudos epidemiológicos mais recentes demonstraram que as perturbações psiquiátricas e os problemas de saúde mental tornaram-se a principal causa de incapacidade e uma das principais causas de morbilidade, nas sociedades atuais. A perturbação mental afeta o indivíduo no seu todo, em todas as suas dimensões, biológica, psicológica, espiritual e social, repercutindo-se na unidade familiar e nos padrões de interação estabelecidos (Moreira, 2001). A esquizofrenia é, provavelmente, a mais cruel e devastadora das perturbações mentais. Estima-se que cerca de 1% da população tem esquizofrenia, afetando as pessoas numa idade jovem impedindo-as de participarem inteiramente na sociedade (Andreasen, 2003). Kozier (1993) e Sthanhope (1999) consideram que a família exerce uma função de saúde fundamental nos diversos membros, proporcionando-lhes, desta forma, os cuidados de que necessitam. Neste contexto a família é entendida como a mais direta fonte de apoio social ao indivíduo. A família é o suporte e o lugar mais privilegiado para a pessoa carenciada, sendo que os cônjuges e os filhos encontram-se na primeira linha da prestação de cuidados, considerados cuidadores informais (Moreira, 2001). Assim, facilmente se compreende que qualquer alteração num dos seus membros refletir-se-á na família como um todo. Daí que, o processo de doença para além de afetar o indivíduo na sua dimensão holística e para além das implicações individuais, acarreta igualmente instabilidade à célula familiar. Não obstante, a homeostasia familiar sofre uma rutura perante a doença de um dos seus membros o que implicará uma mudança em todo o seu sistema (Augusto et al., 2002). Não obstante, para vários autores, o processo de prestação de cuidados não acarreta apenas resultados negativos. Estes ao assumirem o papel de tutores tornam-se responsáveis pelo bem-estar e pela prestação de cuidados ao familiar doente, o que lhes permite desencadear sentimentos de satisfação e bem-estar (Lawton et al., 1989; Lawton, et al., citados por Martins, 2006). Perante a situação de doença, a família direciona a sua energia e faz tudo o que está ao seu alcance para manter ou alterar o mínimo possível o funcionamento familiar. Martins (2006, p. 79) considera que “ela tenta manter o equilíbrio e a harmonia interpessoais, o seu bem-estar familiar, incluindo a sua espiritualidade, a sua estrutura e funcionamento, e as relações com a comunidade”. Segundo Martins (2006), a satisfação do cuidador representa a perceção subjetiva dos ganhos desejáveis e dos aspetos positivos associados ao processo do cuidado informal. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 60

Porém, outras razões podem ser assinaladas ao processo de cuidar pelo familiar cuidador, tais como o altruísmo, o colocar-se no lugar do outro; o de ser reconhecido pela sociedade e/ou o de ter receio de ser julgado pela mesma; ou, ainda, sentimentos de agradecimento e de reciprocidade para com a pessoa doente (Monteiro, 2010). Ser cuidador é por vezes uma opção difícil de se tomar, e por vezes quando um familiar assume a tarefa de cuidar de um familiar doente não tem a noção da tarefa árdua e penosa que terá pela sua frente (Carvalho, 2009). “Ao assumir o papel de cuidador, o sujeito vê-se confrontado com uma situação sem alternativa de escolha, pautada por uma forte obrigação moral e social, a qual, raramente é partilhada com outros elementos da família” (Martins, 2006, p. 61). O estado de saúde e as solicitações do doente podem absorver de tal forma o tempo do cuidador, que este deixa de ter tempo livre para descansar o suficiente, para desenvolver atividades de que gostava e que lhe davam prazer (Martins, 2006). METODOLOGIA A questão central que orientou a pesquisa diz respeito à pessoa mentalmente doente e ao familiar cuidador. Assim, com este estudo pretendemos contribuir para um melhor conhecimento da visão da família face à problemática da pessoa mentalmente doente com psicose em contexto familiar. Objetivos Deste modo delineamos os seguintes objetivos: descrever a satisfação do familiar cuidador da pessoa mentalmente doente; descrever a relação entre a espiritualidade e a satisfação do familiar cuidador; descrever a relação entre as variáveis socioclínicas da pessoa mentalmente doente e a satisfação do familiar cuidador, e finalmente, descrever a relação entre as variáveis psicossociais e a satisfação do familiar cuidador da pessoa mentalmente doente. Tipo de estudo Trata-se de um estudo descritivo, transversal e exploratório, inserido num paradigma quantitativo e dirigido ao universo dos familiares cuidadores da visita domiciliária. Participantes Quanto aos familiares cuidadores, a idade varia entre os 27 e os 87 anos de idade [M= 58,9 anos (DP=17.5)], sendo que a maioria é casado [(21) 47,70%] e possuem o 1º ciclo do ensino básico [(25) 56,80%].


Em relação ao grau de parentesco, metade dos familiares cuidadores eram os progenitores (mãe/pai) [(22) 50,00%], em que a grande parte eram domésticos [(20) 45,50%]. Quando às pessoas mentalmente doentes, a grande parte é do sexo masculino [(31) 70,50%], solteiros [(30) 68,18%], e com idades que variam entre os 20 e os 68 anos [M= 47,1 anos (DP= 11,2)]. A amostra de conveniência, consecutiva, foi de quarenta e quatro familiares cuidadores e doentes com psicose acompanhados em Visita Domiciliária de um Serviço de Psiquiatria de um Centro Hospitalar do Porto. A amostra será coincidente com a população. Procedimentos Foi efetuado um pedido de autorização aos autores para aplicação dos instrumentos selecionados assim como um pedido de autorização ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar. As Visitas domiciliarias foram programadas mediante um contacto telefónico prévio, tendo sido explicados os objetivos e avaliado o interesse e/ou disponibilidade em participar. Esta foi realizada pelo investigador, na qual se procedeu a obtenção do consentimento livre e esclarecido. Análise dos dados Os dados colhidos foram introduzidos em base de dados e processados no programa de estatística SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 19.0. Os dados obtidos foram apresentados em tabelas de distribuição de frequências absolutas e relativas, tendo também sido calculadas as medidas de tendência central e de dispersão. Os valores decimais foram apresentados com duas casas decimais, por arredondamento às centésimas. Na análise de variância de médias utilizamos o teste t de Student para análise de dois grupos independentes e ao teste de Levene para a verificação da homogeneidade das variâncias. Nas situações em que pretendemos analisar as variações intra e inter grupos (ou categorias) aplicamos o teste F da one-way ANOVA, tendo selecionado o teste post-hoc Scheffé. Como medida de análise da associação entre duas variáveis utilizamos o coeficiente de correlação de Pearson. Material Para a realização deste estudo, recorremos a duas fontes de recolha de dados: processo clínico do doente e a aplicação de um questionário heteropreenchido, tendo em consideração o nível de literacia dos potenciais cuidadores, sendo constituído por perguntas fechadas e por duas escalas: a Escala de Avaliação da Espiritualidade e o CASI.

O essencial para qualquer medição ser precisa é, sem dúvida a sua fidelidade, isto é, se a medição for repetida, nas mesmas condições e com os mesmos respondentes, o resultado encontrado será idêntico. Assim, a fidelidade está relacionada com o grau de consistência ou concordância entre dois conjuntos de notas independentes, e expressa-se por um coeficiente de correlação. Neste estudo, recorreu-se ao alfa de Cronbach (α), que fornece a medida de consistência interna. Segundo Murphy e Davidshofer (1998 citado por Pais-Ribeiro 2008) uma boa consistência interna deve exceder um alfa de Cronbach de 0,80, sendo, no entanto, aceitáveis valores de 0,60, valor este justificado pelo facto de as escalas apresentarem um número de itens muito baixo. A Escala de Espiritualidade (Pinto e Pais-Ribeiro, 2007) é um instrumento de avaliação da espiritualidade para aplicação em contexto de saúde, que contem cinco itens, cujas respostas são obtidas em uma escala do tipo Likert. Tem 2 subescalas crenças e esperança/ otimismo, sendo a consistência interna para a escala global de 0,74. Podemos verificar que os valores de alfa de Cronbach encontrados, neste estudo, foram superiores ao dos autores supracitados. O CASI é um questionário que foi desenvolvido por Nolan e colaboradores, no Reino Unido (Brito, 2002; Sequeira, 2010). Brito (2002) traduziu e validou esta escala para a população portuguesa. Sequeira (2010) avaliou as propriedades psicométricas deste instrumento, ficando com 27 itens. Segundo Sequeira (2010, p. 222) esta versão abreviada “apresenta uma boa consistência interna α= 0,93 (alfa de Cronbach), valor ligeiramente superior ao encontrado para o índice com 30 itens”. Os valores de alfa de Cronbach do CASI globais foram de 0.83. O CASI é constituído por seis fatores: contexto de cuidar, desempenho do papel de cuidador, contexto da pessoa dependente, qualidade de desempenho, dinâmica dos resultados e, finalmente, dinâmica familiar (Sequeira, 2010). Podemos verificar que os valores de alfa de Cronbach encontrados neste estudo são, globalmente, superiores aos do autor Sequeira (2010). RESULTADOS Quanto à satisfação do familiar cuidador da pessoa mentalmente doente com psicose verificamos que a média ponderada da escala global do CASI é de 3,11 (DP=0,89). Verificamos também que o familiar cuidador, neste estudo, refere como fatores mais satisfatórios no cuidado da pessoa mentalmente doente o fator dinâmica dos resultados com valores médios M=3,43 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 61


(DP=0,95) e o desempenho do papel de cuidador com M=3,38 (DP=0,96). Por outro lado, os fatores assinalados como menos satisfatórios no cuidado à pessoa mentalmente doente são a dinâmica familiar com M=2,80 (DP=1,18) e o contexto da pessoa dependente com M=2,84 (DP=0,80). Da análise da correlação entre as pontuações da escala total e as pontuações dos fatores, constatamos que existe uma correlação significativa entre todos os fatores, sendo o fator relativo ao contexto de cuidar que melhor (92,16%) explica a variância da escala global do CASI r(44)=0,96, p<0,01. Os fatores desempenho do papel de cuidador e dinâmica de resultados explicam cada um, cerca de 90,25% a variância global da escala de satisfação do familiar cuidador. O fator relativo à dinâmica familiar explica em 65,61% a variância da escala total do CASI r(44)=0,81, p<0,01. Relativamente à relação entre espiritualidade e a satisfação do cuidador, e mediante a análise da correlação entre as pontuações da escala total do CASI e as pontuações totais e das subescalas da Espiritualidade, constatamos que existe uma correlação positiva significativa baixa entre a espiritualidade (global, crenças e esperança/ otimismo) com a satisfação do familiar cuidador do doente (CASI global e fatores), mas com significância estatística nas relações: crença com o contexto de cuidar r(44)=0,36, p<0,05 e a escala global CASI r(44)=0,31, p<0,05; entre a esperança/ otimismo e o contexto de cuidar r(44)=0,33, p<0,05; e a escala da espiritualidade global com o contexto de cuidar r(44)=0,37, p<0,05, o contexto da pessoa dependente r(44)=0,30, p<0,05 e a escala global do CASI r(44)=0,31, p<0,05. No que concerne à relação entre idade e escolaridade da pessoa mentalmente doente com psicose e a satisfação do familiar cuidador, podemos verificar que existe uma associação negativa entre idade e satisfação do familiar cuidador, e uma associação positiva entre escolaridade da pessoa mentalmente doente e a satisfação do familiar cuidador avaliada pelo CASI. Verificamos uma correlação negativa, com significância estatística, entre a idade da pessoa mentalmente doente e quatro dos fatores do CASI, incluindo a escala global. Assim, existe uma correlação negativa moderada entre a idade da pessoa mentalmente doente e o fator qualidade de desempenho do CASI r(44)=0,40, p<0,01; uma correlação baixa, com o fator desempenho do papel de cuidador r(44)=0,32, p<0,05; uma correlação baixa, com a escala global do CASI r(44)=0,32, p<0,05, e a dinâmica dos resultados r(44)=0,31, p<0,05. Neste estudo, a associação entre a idade e o CASI é negativa baixa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 62

No que respeita às variáveis psicossociais do familiar cuidador, apenas a idade, sexo e situação laboral constituíram uma fonte de satisfação do familiar cuidador. Verificamos que existem diferenças estatisticamente significativas entre o sexo do familiar cuidador e a satisfação relacionada com o desempenho do papel de cuidador (t(18,83)=2,20, p< 0,05) em que os familiares cuidadores do sexo feminino referiam, em média, maior satisfação no desempenho do papel de cuidador (M=3,67; DP=0,72), do que os do sexo masculino (M=2,47; DP=1,25). Quanto à relação entre idade do familiar cuidador e a satisfação do familiar cuidador da pessoa mentalmente doente verificamos que existem diferenças com significado estatístico entre a idade do familiar cuidador e os fatores relativos à dinâmica familiar (r(44)=0,38, p<0,05). E, finalmente, relativamente à relação entre a situação laboral e a satisfação do familiar cuidador verificamos que existem diferenças estatisticamente significativas entre a situação laboral do familiar cuidador e as fontes de satisfação relacionadas com a qualidade do desempenho F(2, 41)=3,46, p<0,05. No entanto, podemos analisar, mediante observação das médias ponderadas que os desempregados apresentam, em média, mais satisfação no desempenho do papel de cuidador (M=3,68; DP=0,63), seguidos da dinâmica de resultados (M=3,63; DP=0,55). Os familiares cuidadores quem têm uma atividade profissional apresentam, em média, valores de satisfação mais baixos na qualidade de desempenho (M=2,33; DP=0,99). DISCUSSÃO Augusto et al. (2002) considera que o processo da doença é, em parte, considerado pelo familiar cuidador como uma diminuição ou perda do equilíbrio da família. Moreira (2001) refere que o impacto do diagnóstico de uma doença é influenciado por um conjunto de fatores relacionados com a própria doença, a pessoa doente, a família e o contexto sociocultural em que estão inseridos. Não obstante, o fator relativo ao contexto de cuidar foi o que melhor (92,16%) explicou a variância da escala global do CASI. Imaginário (2004) defende que a prestação de cuidados à pessoa doente pode ser, muito satisfatória para o familiar cuidador uma vez que está a lutar por alguém a quem se deseja manifestar sentimentos de amor, carinho e interesse.


Os fatores desempenho do papel de cuidador e dinâmica de resultados explicaram cada um, cerca de 90,25% a variância global da escala de satisfação do familiar cuidador. Segundo Paùl (1997), esta menor satisfação associada ao processo de cuidar do doente com psicose, poderá estar relacionada com o sentimento de isolamento social imposto pelas responsabilidades do cuidar. Quanto à relação entre a espiritualidade e a satisfação do familiar cuidador da pessoa mentalmente doente com psicose, podemos afirmar que a atribuição de um sentido para o seu papel, de um significado da sua vida, o sentimento positivo e de esperança por parte do familiar cuidador (Pinto, Pais Ribeiro, 2007), constituíram fontes de satisfação em particular no contexto de cuidar, relacionados com as vantagens inerentes ao processo de cuidar do familiar doente. Também o sentimento de espiritualidade constitui, globalmente, uma fonte de satisfação quer relacionados com as vantagens quer com a perceção da importância do cuidar na melhoria da saúde da pessoa dependente. Couto (1998) e Nossa (2001, citados por Mendes 2004) consideram que as perceções, crenças e atribuições que os familiares cuidadores desenvolvem acerca da doença e/ou da saúde podem desempenhar um papel de extrema importância no seu comportamento e na aceitação perante o processo de prestação de cuidados à pessoa dependente. De entre as variáveis socioclínicas da pessoa mentalmente doente, a única que constituiu uma fonte de satisfação do familiar cuidador foi a idade. Podemos assim concluir que, a associação entre a idade e o CASI é negativa baixa. Ou seja, a maior satisfação do familiar cuidador está relacionada à idade mais jovem da pessoa mentalmente doente, aquando da prestação de cuidados. Leandro (2001) e Imaginário (2004) consideram que o envelhecimento humano pressupõe uma maior exigência não só no cuidado, mas também implica uma maior atenção às dimensões sociais, culturais, psicológicas, emocionais e afetivas à pessoa doente. Quanto às variáveis psicossociais do familiar cuidador, aquelas que constituíram uma fonte de satisfação do familiar cuidador aquando da prestação de cuidados à pessoa com psicose foram o sexo, a idade e a situação laboral. Quanto ao sexo do familiar cuidador, as mulheres apresentaram maior satisfação no desempenho do papel de cuidador, satisfação essa relacionada com as perceções associadas à importância, e às repercussões positivas do cuidado prestado à pessoa mentalmente doente com psicose. O mesmo se verificou no estudo desenvolvido por Sequeira (2010) que demonstrou que a maioria dos familiares cuidadores era do sexo feminino.

Domínguez-Alcón (1998) defende que um dos principais motivos que levam as mulheres a assumir o papel de cuidador familiar está relacionado com a educação recebida e com a construção social e cultural, o que faz com que estas se sintam melhor preparadas. Na variável idade, podemos verificar que, globalmente existiu uma associação positiva entre a idade do familiar cuidador e a satisfação do cuidador. Relativamente à situação laboral, verificamos que existiram diferenças estatisticamente significativas entre a situação laboral do familiar cuidador e as fontes de satisfação relacionadas com a qualidade do desempenho. Esta satisfação está relacionada com a qualidade da prestação de cuidados e com a dignidade e manutenção da pessoa no seu contexto. As fontes de satisfação associadas à idade e à situação laboral poderão estar, segundo Sequeira (2010), associados com a perceção da necessidade de cuidados, com uma maior e melhor vigilância e com o tempo disponível. Imaginário (2004, p. 73) refere que a esfera familiar é, profundamente, alterada pela presença de uma pessoa dependente de cuidados, originando desta forma mudanças consideráveis a nível da “individualidade e da autonomia de todos os elementos da família” (p. 79). Mudanças, estas, que podem levar os familiares cuidadores a abandonarem os seus projetos profissionais, a abdicarem da sua atividade profissional, limitando desta forma a sua satisfação no processo de cuidar. CONCLUSÕES No estudo foram evidenciadas relações entre a satisfação do familiar cuidador e variáveis psicossociais da pessoa com psicose e do próprio familiar. Verificamos que o contexto de cuidar foi o fator que melhor explicou a variância da escala global do CASI, e que a a atribuição de um sentido para o seu papel por parte do familiar cuidador, constituíram fontes de satisfação em particular no contexto de cuidar. Também o sentimento de espiritualidade constitui, globalmente, uma fonte de satisfação quer relacionados com as vantagens quer com a perceção da importância do cuidar na melhoria da saúde da pessoa. Constatamos ainda que de entre as variáveis socioclínicas da pessoa mentalmente doente com psicose, a única que constituiu uma fonte de satisfação do familiar cuidador foi a idade. E finalmente, quanto às variáveis psicossociais do familiar cuidador, aquelas que constituíram uma fonte de satisfação do familiar cuidador aquando da prestação de cuidados à pessoa mentalmente doente foram o sexo, a idade e a situação laboral. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 63


A metodologia utilizada mostrou-se útil para a consecução dos objetivos delineados. Este é um contributo importante para a enfermagem de saúde mental e psiquiatria, uma vez que promove a melhoria da prestação de cuidados especializados. A promoção da satisfação no cuidado a estes doentes constitui um fator protetor do curso da doença psicótica, como por exemplo: minimização de fases de descompensação psicótica e (re)internamento hospitalar, melhor integração psicossocial e familiar destas pessoas nos seus contextos naturais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Andreasen, N. (2003). Admirável cérebro novo: dominar a doença mental na era do genoma. Lisboa: Climepsi Editores. Augusto, B., Rodrigues, C., Rodrigues, C., Rodrigues, E., Simões, F., Ribeiro, I., ... & Gomes, M. (2002). Cuidados Continuados: Família, Centro de Saúde e Hospital como parceiros no cuidar (1ª ed.). Coimbra: Formasau. Carvalho, H. (2009). Sobrecarga, Morbilidade Psicológica, Suporte Social, Ajustamento Conjugal e Qualidade de Vida em Cuidadores de Idosos Dependentes. Braga: Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade do Minho. Conselho Nacional de Saúde Mental (2002). Propostas e Recomendações. Lisboa. Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008). Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016: Resumo Executivo. Lisboa. Domínguez-Alcón, C. (1998). Família, cuidados informales y políticas de vejez. In A. S. Staab & L. C. Hodges, Enfermaría gerontológica: adaptacion al processo de envejecimento. México: McGraw-Hill. Imaginário, C. (2004). O Idoso Dependente em contexto Hospitalar: Uma análise da visão da Família e do Cuidador principal. Coimbra: Formasau. Kozier, B. (1993). Fundamentos de enfermeria: procedimientos suplementarios. Mexico: Interamericana. Leandro, M. (2001). Sociologia da Família nas Sociedades Contemporâneas. Universidade Aberta. Leandro, M. (2009). Saúde e sociedade: os contributos (in)visíveis da família (1.ª ed.). Viseu: PsicoSoma. Martins, T. (2006). Acidente Vascular Cerebral: Qualidade de Vida e Bem-Estar dos Doentes e Familiares Cuidadores. Coimbra: Formasau. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 64

Mendes, M. (2004). Mudanças familiares ao ritmo da doença: implicações da doença crónica ao nível da família e do Centro de Saúde. Braga: Dissertação de Mestrado em Sociologia. Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho. Monteiro, M. (2010). Vivências dos Cuidadores Familiares em Internamento Hospitalar – o Início da Dependência. Porto: Dissertação de Mestrado em Ciências de Enfermagem. Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Moreira, I. (2001). O Doente em Contexto Familiar: Uma Análise da Experiência de Cuidar Vivenciada pela Família. Coimbra: Formasau. Paúl, M. C. (1997). Lá para o fim da vida: Idosos, Família e Meio ambiente. Coimbra: Almedina. Pinto, C. & Pais-Ribeiro, J. (2007). Construção de Uma Escala de Avaliação da Espiritualidade em Contextos de Saúde. Revista Investigação Original. Arquivos de Medicina. Sequeira, C. (2006). Introdução à prática clínica: do diagnóstico à intervenção em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica. Coimbra: Quarteto. Sequeira, C. (2007). Cuidar de Idosos Dependentes: Diagnósticos e Intervenções. Coimbra: Quarteto. Sequeira, C. (2010). Cuidar de Idosos com Dependência Física e Mental. Lisboa: Lidel. Sequeira, C. (2013), Difficulties, coping strategies, satisfaction and burden in informal Portuguese caregivers. Journal of Clinical Nursing, 22, 491-500. doi: 10.1111/ jocn.12108 Stanhope, M. (1999). Enfermagem comunitária: promoção da saúde de grupos, famílias e indivíduos (1ª ed.). Lisboa: Lusodidacta.


11 PREVALÊNCIA DE PERFIS LIPÍDICO E GLICÉMICO ALTERADOS EM

PACIENTES COM ESQUIZOFRENIA

| Maria Sousa1; Anabela Moreira2 ; Pedro Monteiro3; Rosário Curral4; António Marques5 |

RESUMO CONTEXTO: Os pacientes com esquizofrenia (SCZ) apresentam anomalias importantes no metabolismo lipídico e da glicose, que podem ser induzidas pela terapia antipsicótica (AP) e pelo estilo de vida associado. O risco de doenças cardiovasculares, diabetes mellitus e síndrome metabólica está aumentado nestes pacientes, que apresentam taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares duas vezes mais elevada do que a população geral. OBJETIVO: Analisar a prevalência de alterações nos perfis lipídicos e glicémicos e a terapêutica AP numa amostra de pacientes SCZ. METODOLOGIA: Realizou-se um estudo retrospetivo aos registos de perfis lipídico e glicémico e da terapia AP de pacientes SCZ de uma unidade de dia de cuidados de saúde mental, de 2009 a 2011. Selecionámos para estudo individualizado os casos que cumpriam os seguintes critérios: presença de fatores de risco cardiovascular, hiperglicemia ou fatores indicadores de síndrome metabólica. RESULTADOS: A amostra foi constituída por 51 pacientes SCZ, dos quais registámos 5 casos com fatores de risco cardiovascular, 6 com hiperglicemia indicadora de diabetes e 7 com fatores laboratoriais indicadores de síndrome metabólica. Para estes casos, analisámos o agente antipsicótico prescrito. CONCLUSÕES: Os dados mostram a necessidade de monitorização dos efeitos secundários metabólicos da terapia AP e do estabelecimento de medidas corretivas (alimentares, estilo de vida e terapêuticas). PALAVRAS-CHAVE: Esquizofrenia; Antipsicóticos; Hiperglicemia; Hiperlipidemias

RESUMEN

ABSTRACT

“Prevalencia de alteraciones en el perfil lipídico y glucémico en pacientes con esquizofrenia”

“Prevalence of lipid and glycemic profile altered in patient with schizophrenia”

CONTEXTO: Los pacientes con esquizofrenia (SCZ) muestran alteraciones significativas en el metabolismo de los lípidos y la glucosa, que pueden ser inducidas por el tratamiento antipsicótico (AP) y el estilo de vida asociado. El riesgo de las enfermedades cardiovasculares, la diabetes mellitus y el síndrome metabólico se aumenta en estos pacientes, que muestra la tasa de mortalidad por enfermedad cardiovascular dos veces más alto que la población general. OBJETIVO: Analizar la prevalencia de alteraciones en el perfil lipídico y glucémico y la terapia AP en una muestra de pacientes SCZ. MÉTODOS: Se realizó un estudio retrospectivo de los registros de perfiles de lípidos y la glucemia y la terapia AP, de los pacientes SCZ una unidad de día para la atención de salud mental, 20092011. Se seleccionaron para el estudio individúale los casos que cumplieron con los siguientes criterios: presencia de factores de riesgo cardiovasculares, hiperglucemia e indicador de los factores de síndrome metabólico. RESULTADOS: La muestra estuvo constituida por 51 pacientes SCZ, de los cuales grabamos 5 casos con factores de riesgo cardiovascular, 6 con hiperglucemia indicadora de diabetes y 7 con los factores de laboratorio indicadores del síndrome metabólico. Para estos casos, se analizó el agente antipsicótico. CONCLUSIONES: Los datos muestran la necesidad de una vigilancia de los efectos secundarios metabólicos de la terapia AP y del establecimiento de medidas correctivas, alimentación, estilo de vida y terapéutica. DESCRIPTORES: Esquizofrenia; Antipsicóticos; Hiperglucemia; Hiperlipidemias

CONTEXT: Patients with schizophrenia (SCZ) show significant abnormalities in lipid and glucose metabolism, which may be induced by antipsychotic (AP) therapy and the associated lifestyle. Risks of cardiovascular diseases, diabetes mellitus and metabolic syndrome are increased in these patients, who present mortality rate from cardiovascular disease a 2 fold higher than general population. AIM: To analyze the prevalence of alterations in lipid and glycemic profiles and AP therapy in a sample of SCZ patients. METHODS: We conducted a retrospective study on the records of lipid and glycemic profiles and AP therapy of SCZ patients from a mental health care unit, from 2009 to 2011. We selected for detailed study the cases that fulfilled the following criteria: presence of three cardiovascular risk factors, hyperglycemia and presence of three metabolic syndrome factors indicator. RESULTS: The sample consisted of 51 SCZ patients, of which we recorded 5 cases with cardiovascular risk factors, 6 with hyperglycemia indicating diabetes, 7 with laboratory factors indicators of metabolic syndrome. For these cases, we examined the antipsychotic agent. CONCLUSIONS: Data show the need for monitoring of metabolic side effects of AP therapy and the establishment of corrective measures, diet, lifestyle and therapeutic. KEYWORDS: Schizophrenia; Antipsychotic agents; Hyperglycemia; Hyperlipidemias Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 30-01-2014

1 Professora Adjunta na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto: Área Científica de Análises Clínicas e Saúde Pública, CISA – Centro de Investigação em Saúde e Ambiente, LabRP – Laboratório de Reabilitação Psicossocial da FPCEUP-UP/ESTSP-IPP, Vila Nova de Gaia, Portugal, mas@estsp.ipp.pt 2 Assistente no Instituto Politécnico do Porto – Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto: Área Científica de Análises Clínicas e Saúde Pública, adm@estsp.ipp.pt 3 Professor Adjunto no IPP – Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto: Área de Ciências Funcionais, LabRP da FPCEUP-UP/ESTSP-IPP, pmonteiro@estsp.ipp.pt 4 Assist. Hospitalar no Centro Hospitalar de São João – Psiquiatria e Saúde Mental; Docente na Universidade do Porto–Medicina: Neurociências, rosario.curral@hotmail.com 5 Prof. Adj. no IPP – Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto: Área Científica de Terapia Ocupacional, LabRP da FPCEUP-UP/ESTSP-IPP, ajmarques@estsp.ipp.pt Citação: Sousa, M.; Moreira, A.; Monteiro, P.; Curral, R.; Marques, A. (2014). Prevalência de perfis lipídico e glicémico alterados em pacientes com esquizofrenia. Revista Especial da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 65-70. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 65


INTRODUÇÃO A SCZ é um transtorno complexo e multifatorial que se caracteriza por sintomas designados como positivos (delírios e alucinações), negativos (apatia e embotamento afetivo), cognitivos (défices na atenção e memória trabalho) e afetivos (ansiedade e depressão). A SCZ tem elevada prevalência, cerca de 1% da população mundial, distribuindo-se por todo o mundo de modo semelhante (Freedman R, 2003). Atualmente, a intervenção terapêutica na SCZ focalizase desde a minimização dos sintomas à reabilitação do paciente. O controlo da sintomatologia positiva faz-se mediante a administração de fármacos antipsicóticos (AP). São vários os fatores que poderão entrar na análise da efetividade dos AP, para além da ação sobre a sintomatologia da SCZ, como a adesão à terapêutica e efeitos colaterais. Os efeitos colaterais descritos para os AP são extrapiramidais (Thomas, 2007), síndrome maligno dos neurolépticos, taquicardia, disfunção sexual, aumentos de níveis de prolactina, de peso, dislipidemias, diabetes, discrasias hematológicas, entre outros (Davis, 2006). Estes efeitos estão muitas vezes relacionados com a afinidade que cada fármaco tem para os diversos neurorecetores, por exemplo, os AP de primeira geração, com maior afinidade para os recetores dopaminérgicos (D2), estão mais associados a efeitos extrapiramidais e hiperprolactinémia. Já os de segunda geração, com mais afinidade para recetores 5-HT2A, têm sido associados a aumento ponderal e alterações do metabolismo da glicose e perfil lipídico (Haddad & Sharma, 2007). Os pacientes com SCZ apresentam elevada prevalência de fatores de risco cardiovascular (FRCV) (Ferreira, Belo, & Abreu-Lima, 2010), e têm duas vezes maior mortalidade por doença cardiovascular que a população geral (Vargas & Santos, 2011). A observação da prevalência de múltiplos FRCV conduziu à recomendação do controlo do perfil lipídico anualmente nestes pacientes quando o fármaco prescrito é de baixo risco, e de 3 em 3 meses quando é de elevado risco (Davis, Chen, & Glick, 2003). Se a dislipidemia persistir, pode ser administrada terapêutica para baixar os níveis ou alterar a prescrição de AP para outro com menor risco de alteração do perfil lipídico (Meyer, 2007). No entanto, na SCZ os AP são apenas um dos fatores a considerar quando se analisa o excesso de peso, dislipidemia ou alterações do metabolismo da glicose, já que existem fatores inerentes à própria doença que contribuem para a não adoção de estilos de vida saudável e assim com maior probabilidade de DCV (Van Dorn et al., 2013). O presente estudo teve como objetivo analisar a prevalência de alterações nos perfis lipídicos e glicémicos e a terapêutica AP numa amostra de pacientes SCZ. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 66

METODOLOGIA Realizámos um estudo descritivo retrospetivo na população de pacientes com patologia de SCZ do Hospital de Dia (HD) do serviço de Psiquiatria do Hospital São João (HSJ). A amostra foi constituída pelos registos de pacientes com diagnóstico de SCZ de acordo com os critérios do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-IV-TR) (APA, 2010), do referido serviço, nos anos de 2011, 2010 e 2009. Foram incluídos os pacientes com o mínimo de 3 anos de diagnóstico, idades entre os 18 e os 65 anos e registo da terapia AP e de análises laboratoriais bioquímicas no período temporal em estudo. Após o consentimento da Comissão de Ética do HSJ, foram consultadas as bases de dados dos participantes, para aceder aos registos dos 5 anos anteriores ao início do estudo (2011) e recolher dados quanto a: (i) Caracterização clínica e sociodemográfica: idade; sexo; estado civil; escolaridade; idade de diagnóstico SCZ; história familiar de doenças, incluindo do foro psicológico (DFP); (ii) Estilo de vida: hábitos tabágicos; consumo de álcool; consumo de drogas de abuso; atividade física; (iii) Avaliação antropométrica: peso; altura; índice de massa corporal (IMC) e perímetro abdominal; (iv) Pressão arterial: sistólica (PAS) e diastólica (PAD); (v) Terapêutica farmacológica antipsicótica: fármaco; dose e período de administração; (vi) Parâmetros bioquímicos séricos: colesterol total; colesterol das LDL (Lipoproteínas de Baixa Densidade, do inglês: Low Density Lipoprotein); colesterol das HDL (Lipoproteínas de Alta Densidade, do inglês: High Density Lipoprotein); triglicerídeos e glicose. Realizámos uma avaliação longitudinal e comparativa dos registos individuais de terapia AP para o(s) período(s) temporal(ais) com alteração dos parâmetros analíticos para os pacientes que cumpriam pelo menos um dos seguintes critérios: (i) presença concomitante de pelo menos três FRCV (De Hert, Dekker, Wood, Kahl, Holt, & Moller, 2009), (ii) hiperglicemia indicadora de Diabetes Mellitus (DGS, 2011), (iii) presença concomitante de pelo menos três fatores indicadores de síndrome metabólica (Usher, Foster, & Park, 2006). Realizou-se a análise descritiva das variáveis utilizando o software SPSS® versão 17.0. RESULTADOS Caracterização sociodemográfica e clínica A amostra foi constituída pelos registos de 51 indivíduos com SCZ, maioritariamente do sexo masculino (n=42, 82,4%), com idade média de 39,3±9,2 anos, com as características sociodemográficas e clínicas apresentadas na Tabela 1. A idade média de diagnóstico foi nos homens 24,1±8,5 anos e, nas mulheres, 26,6±8,5 anos.


TABELA 1 - Características sociodemográficas e clínicas da amostra

Variáveis

Frequência n ( %)

Sexo n=51

Feminino Masculino

9 (17,6) 42 (82,4)

Grupo etário (anos) n=51

20 aos 29 30 aos 39 40 aos 49 50 aos 59 ≥ 60

9 (17,6) 16 (31,4) 21 (41,2) 4 (7,8) 1 (2,0)

Estado Civil n=50

Solteiro Casado/união de Facto Divorciado

36 (72,0) 8 (16,0) 6 (12,0)

Escolaridade n=41

Até ao 9ºano 10º a 12ºano Ensino superior

23 (56,1) 13 (31,7) 5 (12,2)

História familiar de DFP n=26

Sem histórico Com histórico 1ºgrau 2ºgrau

12 (46,1) 14 (53,9) 10 (38,4) 4(15,4

Diabetes Mellitus Hipertensão arterial Doença cardiovascular Alcoolismo

5 (38,4) 5 (38,4) 5 (38,4) 3 (23,1)

Hábitos tabágicos n=42

Não fumador Fumador <10 cig/dia 10 a 20 cig/dia >20 cig/dia

17 (40,5) 25 (59,5) 1 (2,4) 3 (7,1) 21 (50,0)

Consumo de álcool n=44

Não consumidor Consumidor Esporádico Destilado

34 (77,3) 10 (22,7) 7 (15,9) 3 (6,8)

Histórico consumo de drogas de abuso n=28

Sem histórico Com histórico Cannabis Cocaína Heroína Morfina

11 (39,3) 17 (60,7) 13 (46,4) 5 (17,8) 4 (14,3) 2 (7,1)

Atividade física n=24

Hábitos sedentários Ativo

16 (66,7) 8 (33,3)

História familiar n=13

Perfil lipídico e glicémico Os resultados dos parâmetros analíticos colesterol total, LDL e HDL, triglicerídeos e glicemia registados para os pacientes estão sistematizados na Tabela 2. TABELA 2 - Resultados parâmetros bioquímicos

Variável (unidades)

n

Média ± MíniDesvio Padrão mo

Máximo

Colesterol total (mg/dL) Colesterol LDL (mg/dL) Colesterol HDL (mg/dL) Triglicerídeos (mg/dL) Glicose (mg/dL)

46 37 43 45 51

189,5±49,66 119,3±40,08 44,7±14,62 140,1±70,62 91,9±20,00

362 251 121 589 568

44 14 24 57 24

Do total da amostra 35 (68,6%, 27 homens e 8 mulheres) pacientes SCZ apresentavam pelo menos um fator indicador de síndrome metabólica. A presença concomitante de dois destes fatores foi encontrada em 30 (58,8%, 24 homens e 6 mulheres) pacientes SCZ. Análise individualizada de casos A aplicação dos critérios resultou na seleção de 10 casos para análise individualizada (Tabela 3). Destes pacientes, seis apresentam valores de glicemia indicadores de diabetes mellitus e cinco apresentam FRCV (hiperglicemia, hipercolesterolemia e colesterol LDL elevado). Registámos sete pacientes SCZ (13,7%) com presença concomitante de três fatores de indicadores de síndrome metabólica, todos com alteração dos valores de colesterol HDL, triglicerídeos e glicemia.

Nos consumidores de álcool registámos antecedentes pessoais, bem como história familiar de alcoolismo (n=3). Na atualidade, a maioria (n=40, 89,0%) não consome drogas de abuso, mas no registo histórico (n=28) cerca de 60,7% (n=17) referem ter consumido na juventude. Não obtivemos registos relativamente à avaliação antropométrica e pressão arterial. Em relação aos fármacos mais frequentemente prescritos, estes foram haloperidol e risperidona, em doses dentro do intervalo recomendado (Infarmed, 2013).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 67


Em relação à análise longitudinal aos dados do Paciente 1 a variação dos valores de colesterol HDL evidência valores sempre inferiores ao intervalo de referência (IR). É observado um período de hiperglicemia pré-diabetes após a introdução cumulativa de terapia com risperidona ao haloperidol. Há normalização da glicose quando a prescrição passa a apenas haloperidol. Quanto ao Paciente 2, com história familiar de alcoolismo, observam-se valores de colesterol total e triglicerídeos sempre superiores aos IRs. No colesterol LDL registaram-se valores superiores ao IR, seguindo-se a sua normalização com passagem de AP de risperidona para haloperidol. Os valores de colesterol HDL encontram-se sempre dentro do IR. O Paciente 3 apresentou valores de colesterol HDL sempre inferiores ao IR. A glicemia mantém-se dentro da normalidade, verificando-se um aumento para valores indicativos de diabetes (valor médio de 124,3 mg/dL) com a introdução de olanzapina em adição ao haloperidol. Já os valores de colesterol total e LDL mantiveram-se dentro dos IRs até ao momento em que se verificou aumento para valores superiores ao IR. A terapia de AP foi alterada 6 meses antes, com a introdução da clozapina em adição ao haloperidol. O Paciente 4, tem sempre valores de colesterol HDL e triglicerídeos fora do IR. Quanto à terapia AP, registou-se a administração de haloperidol conjugado com levomepromazina ou olanzapina, tendo estes 2 últimos fármacos sido suspensos a meio do período temporal em questão. Em relação ao Paciente 5, os valores de colesterol HDL baixos e de glicemia pré-diabetes foram observados após o início da administração de haloperidol. No Paciente 6 os valores de colesterol total, LDL, HDL, triglicerídeos e glicose evidenciaram valores sempre fora dos respetivos IR. Para este período temporal, a terapia AP administrada foi risperidona. No Paciente 7 observou-se uma alteração de valores normais dos parâmetros colesterol total, HDL e triglicerídeos para fora dos respetivos IR. Neste período existe registo de administração risperidona e levomeprozamina. No Paciente 8 registaram-se valores superiores aos IR para os parâmetros colesterol total e triglicerídeos, e dentro dos IR para colesterol LDL e HDL. Quanto à glicose sérica, registou-se apenas um valor ligeiramente superior ao limite máximo do IR. A terapia AP administrada foi inicialmente haloperidol, seguidamente acrescido de quetiapina e posteriormente de risperidona. No Paciente 9, observou-se valores de colesterol total sempre superiores ao IR, com valor mínimo de 247 mg/ dL e máximo de 317 mg/dL e um aumento da glicose para valores de hiperglicemia pré-diabética. Observouse esta situação após a introdução de haloperidol e quetiapina. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 68

Por fim, o Paciente 10 apresentou alterações a nível do todo o perfil lipídico em estudo. Realizava terapia com haloperidol e clozapina. De entre estes casos, em relação ao estado civil, 8 são solteiros e 2 casados; na escolaridade, 6 têm escolaridade igual ou inferior ao 12º ano e 4 sem dados. Quanto à história familiar de outras doenças, apenas há registo para o Paciente 2 (alcoolismo). DISCUSSÃO A maioria da amostra é do sexo masculino o que não é congruente com dados nacionais, em que a patologia atinge de igual modo ambos os sexos (Rabasquinho e Pereira, 2007). Este desequilíbrio na distribuição poderá ser explicado por um possível viés de Berkenson e limita a interpretação dos resultados quando analisado na perspetiva desta variável. O predomínio do estado civil solteiro na amostra também é descrito em outros estudos internacionais (86,7%) (Faulkner, Cohn, Remington, & Irving, 2007). Esta constatação é compatível com debilitação observada em muitas vertentes relacionais, limitando a capacidade de estabelecer relações sociais de amizade ou outras (APA, 2010). Comparando os resultados da escolaridade com o de outros estudos, verificámos maior frequência de pacientes SCZ com nível de escolaridade elevado (Ferreira et al., 2010). Quanto ao sexo masculino e a idade de diagnóstico verifica-se, como em outros estudos, que idade média de diagnóstico é inferior a 25 anos (De Hert, Dekker, Wood, Kahl, Holt, & Moeller, 2009). Quanto à história de doença familiar, os casos de SCZ distribuem-se de igual modo pelos grupos com e sem história de DFP, o que não vai de encontro ao predomínio da mesma nos familiares de 1º e 2º grau descrito na literatura. (Myles-Worsley, Tiobech, Blailes, Yano, & Faraone, 2007). De entre as variáveis de estilo de vida, a amostra tem registo de hábitos sedentários (67%), a maioria (59,5%) são fumadores, o que está de acordo com outros estudos (57,8%) (Chaves & Shirakawa, 2008). Apesar de a maioria (77,3%) não apresentar hábito de consumo de álcool, foram identificados 3 casos com registos de consumo de álcool com antecedentes pessoais de alcoolismo, assim como história familiar. Estes casos apresentam prognóstico grave de evolução no tempo. Quanto ao consumo de drogas de abuso, apesar de na atualidade a maioria não as consumir, mais de metade dos pacientes estudados (60,7%) refere ter consumido tóxicos na juventude, com a cannabis a ser a mais frequente.


Estes dados são coerentes com descrito em outros estudos que apontam o consumo de tóxicos na juventude para um conjunto elevado de casos com SCZ (Sevy et al., 2010). Para estas variáveis, observou-se a ausência marcada de dados ao longo do período em estudo. O estilo de vida nestes pacientes resulta em parte das terapêuticas farmacológicas e ocupacionais, e do maior ou menor controlo que estes pacientes têm. Assim, pensamos que o registo e a integração destes dados deverão ser significativamente melhorados. Quanto aos parâmetros bioquímicos, foi possível obter uma quantidade apreciável de informação cuja diversidade dificulta a análise. A sistematização desta informação, na tabela 2, parecenos poder dar uma visão abrangente sobre estes dados na amostra. Assim, em 10 de 51 doentes verificamse alterações metabólicas indicadoras de síndrome metabólico (n=7, 13,7%), risco cardiovascular (n=5) ou de diabetes mellitus (n=6). Estudos transversais apontam que a prevalência de síndrome metabólica nos pacientes SCZ é superior à registada na população geral, variando entre 30,4% e 37% (Vargas & Santos, 2011), especialmente nos que fazem terapia AP de 2ª geração (Usher et al., 2006). Na nossa amostra, registámos 13,7% pacientes com alteração dos valores de colesterol HDL, triglicerídeos e glicemia, fatores de indicadores de síndrome metabólica. A ausência de registo de dados relativos à pressão arterial e perímetro abdominal, parâmetros determinantes no diagnóstico desta síndrome, impossibilita a sua classificação. Contudo, a presença concomitante destes três fatores em pacientes SCZ com síndrome metabólica é indicadora de necessidade de intervenção clínica imediata (Usher et al., 2006). Existe evidência de associação entre o uso de antipsicóticos de 2ª geração e o aumento da prevalência da obesidade e diabetes nos pacientes SCZ, em relação à população geral (American Diabetes Association, American Psychiatric Association, American Association of Clinical Endocrinologists and North American Association for the Study of Obesity, 2004). A literatura define como fatores de prognóstico negativos na sobrevida destes pacientes a elevação do colesterol LDL e diminuição do HDL, que quando associados a outros fatores (ex. estilos de vida não saudáveis) obrigam a follow-up analítico mais apertado. Os nossos dados claramente indicam a necessidade de um acompanhamento neste âmbito e de estabelecimento de medidas corretivas (alimentares, estilo de vida e medicamentosa).

CONCLUSÕES Apesar da adoção de terapêutica farmacológica com AP ter permitido desintitucionalizar estes pacientes na tentativa de os integrar na sociedade, estes não melhoram sintomas da patologia, como o comprometimento cognitivo e o embotamento afectivo. Acresce, ainda, a elevada frequência dos FRCV nestes pacientes, que releva a importância da ação de equipas multidisciplinares que implementem e acompanhem intervenções psicossociais e comportamentais que permitam a adoção sustentável de estilos de vida mais saudáveis. Com o presente estudo foi observada a necessidade de estabelecer protocolos de follow-up dos pacientes com maior risco cardiovascular. Pode-se concluir que é fundamental para garantir um acompanhamento efetivo destes pacientes bem como o sucesso da investigação a existência de diretrizes terapêuticas e de registos padronizados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APA (2010). Practice Guideline for the Treatment of Patients With Schizophrenia. Acedido em: http://www. appi.org/CustomerService/Pages/Permissions.asp American Diabetes Association, American Psychiatric Association, American Association of Clinical Endocrinologists and North American Association for the Study of Obesity (2004). Consensus development conference on antipsychotic drugs and obesity and diabetes. Diabetes Care, 27(2), 596-601. Chaves, L. & Shirakawa, I. (2008). Nicotine use in patients with schizophrenia evaluated by the Fagerström Tolerance Questionnaire: a descriptive analysis from a Brazilian sample. Revista Brasileira de Psiquiatria, 30(4), 350-352. Davis, J. M. (2006). The choice of drugs for schizophrenia. New England Journal of Medicine, 354(5), 518-520. Davis, J. M., Chen, N., & Glick, I. D. (2003). A metaanalysis of the efficacy of second-generation antipsychotics. Archives of General Psychiatry, 60(6), 553-564. De Hert, M., Dekker, J. M., Wood, D., Kahl, K. G., Holt, R. I. G., & Moeller, H. J. (2009). Cardiovascular disease and diabetes in people with severe mental illness position statement from the European Psychiatric Association (EPA), supported by the European Association for the Study of Diabetes (EASD) and the European Society of Cardiology (ESC). European Psychiatry, 24(6), 412424. doi: 10.1016/j.eurpsy.2009.01.005 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 69


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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 70

Rabasquinho, C. e Pereira, H. (2007). Género e saúde mental: Uma abordagem epidemiológica. Análise Psicológica, 25, 439-454. Sevy, S., Robinson, D., Napolitano, B., Patel, R., Gunduz-Bruce, H., Miller, R., . . . Kane, J. (2010). Are cannabis use disorders associated with an earlier age at onset of psychosis? A study in first episode schizophrenia. Schizophrenia Research, 120, 101-107. Thomas, P. (2007). The stable patient with schizophrenia--from antipsychotic effectiveness to adherence. European Neuropsychopharmacology, 17(Suppl 2), S115-122. doi: S0924-977X(07)00022-3 [pii]10.1016/j. euroneuro.2007.02.003 Usher, K., Foster, K., & Park, T. (2006). The metabolic syndrome and schizophrenia: the latest evidence and nursing guidelines for management. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 13(6), 730-734. doi: 10.1111/j.1365-2850.2006.01026 Van Dorn, R. A., Desmarais, S. L., Tueller, S. J., Jolley, J. M., Johnson, K. L., & Swartz, M. S. (2013). Drug and alcohol trajectories among adults with schizophrenia: Data from the CATIE study. Schizophrenia Research, 148(1-3), 126-129. doi: 10.1016/j.schres.2013.05.006 Vargas, T. d. S. & Santos, Z. E. d. A. (2011). Prevalência de síndrome metabólica em pacientes com esquizofrenia. Scientia Medica, 21(1), 4.


12 INVESTIGAÇÃO EM ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL E

PSIQUIATRIA: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL | Francisco Sampaio1; José Carlos Carvalho2 ; Odete Araújo3; Olga Rocha4 |

RESUMO CONTEXTO: A investigação constitui uma área de ação estratégica definida no Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016. A Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria apresenta-se como uma área de investigação com um campo de ação significativo, considerando a emergência insidiosa de patologias como a depressão ou a demência. OBJETIVO: Tendo em conta a importância atribuída à investigação em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, o presente estudo teve como objetivo perceber quais as tendências da investigação em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, ao longo dos últimos cinco anos, no contexto de Portugal. METODOLOGIA: Foi conduzida uma análise documental dos títulos e abstracts de artigos científicos publicados entre os anos 2009 e 2013 (inclusive) na Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental. Tanto para analisar o paradigma de investigação utilizado como a área temática abordada foi realizada uma análise de conteúdo lato sensu com categorização a posteriori. Após estar concluída a categorização foi realizada análise quantitativa dos dados, tendo o tratamento dos mesmos sido de âmbito descritivo. RESULTADOS: Verificou-se um predomínio do paradigma quantitativo de investigação (46%). Quanto às áreas de investigação, verificou-se uma significativa predominância da investigação no âmbito das intervenções psicoterapêuticas (40%), seguida das temáticas “Vivências em Saúde Mental” (15%) e “Saúde Mental e Família/Prestador de Cuidados” (13%). CONCLUSÕES: Ao longo dos anos tem vindo a verificar-se um incremento do número e da qualidade dos trabalhos de investigação publicados sobre Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria. No entanto, existe a necessidade de tornar a investigação mais articulada e, portanto, com resultados mais significativos para a Enfermagem. PALAVRAS-CHAVE: Pesquisa; Enfermagem; Saúde mental; Psiquiatria

RESUMEN

ABSTRACT

“Investigación en enfermería de salud mental y psiquiátrica: Una análisis documental”

“Research in mental health and psychiatric nursing: A documentary research”

CONTEXTO: La investigación es una área de acción estratégica definida en el Plan Nacional de Salud Mental 2007-2016. La Enfermería Psiquiátrica y de Salud Mental es un área de investigación con un campo de acción considerable, considerando la emergencia insidiosa de patologías como la depresión o la demencia. OBJETIVO: Dada la importancia que se atribuye a la investigación en Enfermería Psiquiátrica y de Salud Mental, el presente estudio tuvo como objetivo comprender cuáles son las tendencias de la investigación en Enfermería Psiquiátrica y de Salud Mental, en de los últimos cinco años, en el contexto de Portugal. MATERIAL Y MÉTODOS: Se llevó a cabo una investigación documental de los títulos y resúmenes de artículos científicos publicados entre 2009 y 2013 (incluso) en la Revista Portuguesa de Enfermería de Salud Mental. Tanto para analizar lo paradigma de investigación utilizado como el tema dirigido se realizó una análisis de contenido latu sensu con categorización a posteriori. Después de haber sido completada la categorización se realizó un análisis cuantitativa de los datos, teniendo el tratamiento de los mismos sido de alcance descriptivo. RESULTADOS: Hubo un predominio del paradigma cuantitativo de investigación (46%). Con respecto a las áreas de investigación, se observó un significativo predominio de la investigación sobre intervenciones psicoterapéuticas (40%), seguida por los temas “Experiencias en Salud Mental” (15%) y “Salud Mental y Familia/Cuidador” (13%). CONCLUSIONES: A lo largo de los años se ha observado un incremento en el número y en la calidad de la investigación publicada sobre Enfermería Psiquiátrica y de Salud Mental. Sin embargo, hay una necesidad de realizar una investigación más articulada y, por lo tanto, con resultados más significativos para la Enfermería.

BACKGROUND: Research is a strategic action area, defined as such in National Mental Health Plan 2007-2016. Mental Health and Psychiatric Nursing is a significant research field, considering the insidious emergence of pathologies such as depression or dementia. AIM: Considering the importance attached to research in Mental Health and Psychiatric Nursing, the present study aimed to understand the prominent research trends in Mental Health and Psychiatric Nursing, over the past five years, in the context of Portugal. MATERIAL AND METHODS: It was conducted a documental analysis of scientific articles’ titles and abstracts, published between 2009 and 2013 (included) in the Portuguese Journal of Mental Health Nursing. Both for the analyse of research paradigm used as the subject area, was performed a content analysis lato sensu with subsequent categorization. Completed the categorization, a quantitative descriptive analysis of the data was developed. RESULTS: There was a clear predominance of the quantitative research paradigm (46%). As for the research areas, there was a significant predominance of research themes included in «Psychotherapeutic interventions» (40%), followed by «Experiences in Mental Health” (15%) and “Mental Health and Family/Caregiver” (13%). CONCLUSIONS: Over the years there has been an increase in the number and quality of research papers published about Mental Health and Psychiatric Nursing. However, there is a recognised need to develop more articulated research and, therefore, with more significant results for nursing.

DESCRIPTORES: Investigación; Enfermería; Salud mental; Psiquiatría

Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 10-02-2014

KEYWORDS: Research; Nursing; Mental health; Psychiatry

1 MsC em Saúde Mental e Psiquiatria; Doutorando em Ciências de Enfermagem no ICBAS–UP; Enfermeiro no Hospital de Braga, francisco.sampaio@hospitaldebraga.pt 2 Doutor em Ciências de Enfermagem; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, zecarlos@esenf.pt 3 Mestre em Gerontologia; Docente na Universidade do Minho – Escola Superior de Enfermagem, 4704-553 Braga, Portugal, odete.araujo@ese.uminho.pt 4 Mestre em Ciências da Educação; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto (aposentada), 4200-072 Porto, Portugal, omacrocha@gmail.com Citação: Sampaio, F., Carvalho, J. C., Araújo, O., & Rocha, O. C. (2014). Investigação em enfermagem de saúde mental e psiquiatria: Uma análise documental. Revista Especial da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 71-75. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 71


INTRODUÇÃO Os cuidados prestados por enfermeiros devem basearse em evidências científicas. A investigação em Enfermagem constitui um meio poderoso para responder a questões sobre as intervenções dos cuidados de saúde e de encontrar melhores formas de promover a saúde, prevenir a doença e prestar cuidados e serviços de reabilitação à pessoa e família ao longo do ciclo vital e em diferentes contextos. À semelhança de outras realidades internacionais, a Saúde Mental representa uma área emergente pela complexidade de áreas de intervenção. Certos de que um problema de investigação surge de uma inquietação, o desiderato dos enfermeiros em geral, e em particular dos enfermeiros da área de Saúde Mental e Psiquiátrica, deverá assentar na procura de uma melhor adequação entre o que se investigação e o que se prática. Significa que a prática de cuidados pressupõe um questionamento constante, que poderá ser compreendido através da investigação e, por seu turno, implementada na prática clínica a melhor evidência. São inquestionáveis os avanços no domínio da investigação em Enfermagem na última década. Uma grande parte através de trabalhos académicos de Mestrado e Doutoramento, e outra através de esforços coletivos dos enfermeiros, que nos diferentes contextos de Saúde Mental, fizeram com que a investigação se tornasse parte do quotidiano na prática de cuidados. Sem este questionamento constante, não será possível pôr em prática a melhor evidência, nem acrescentar conhecimento a uma disciplina e profissão que queremos ver advogada e reconhecida como tal. A investigação em Enfermagem de Saúde Mental tem a vindo a projetar-se e afirmarse enquanto dispositivo de produção de conhecimento e desenvolvimento de competências profissionais. Por conseguinte, e alicerçados no paradigma de procura da melhor investigação para uma melhor praxis tivemos como desafio, conhecer o tipo de investigação e as diferentes áreas temáticas neste domínio. METODOLOGIA De modo a perceber quais as tendências da investigação em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria (ESMP) ao longo dos últimos anos, no contexto português, foi desenhado um trabalho de análise documental dos títulos e abstracts de artigos publicados na Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (RPESM) entre os anos 2009 e 2013 (inclusive), ou seja, num horizonte temporal de cinco anos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 72

Para a definição dos artigos a analisar foram delineados os seguintes critérios de inclusão: a) ser um artigo de investigação (incluindo-se neste grupo trabalhos de revisão sistemática – com ou sem meta-análise ou metasíntese – e integrativa da literatura); b) ser um artigo publicado numa fonte com “peer review”; c) ter como primeiro autor (autor principal) um enfermeiro. Na análise documental realizada foram encontrados 52 artigos que davam resposta aos critérios de inclusão prédefinidos. Assim, e dado o número significativo de artigos a apreciar, optou-se por limitar a análise a apenas dois itens: a) o paradigma de investigação utilizado; b) a área temática abordada. Tanto para analisar o paradigma de investigação utilizado como a área temática abordada optou-se por realizar uma análise de conteúdo lato sensu com categorização a posteriori, concretizada através de uma leitura detalhada dos títulos e abstracts dos artigos selecionados procurando, a partir daí, identificar as categorias emergentes. Após estar concluída a categorização foi realizada análise quantitativa dos dados, tendo o tratamento dos mesmos sido de âmbito descritivo, realizado com recurso ao software Microsoft Excel 14.0 (Office 2010) para Windows®. RESULTADOS Dos 52 resumos analisados, e conforme pode verificarse pela análise do Gráfico 1, os trabalhos de natureza quantitativa são maioritários (46%), seguidos pelos trabalhos de revisão de literatura (33%). Os trabalhos de índole qualitativa são os que apresentam menor expressão (21%).

GRÁFICO 1 - Distribuição Percentual do Paradigma de Investigação Utilizado

Ao nível das áreas temáticas e conforme se pode verificar pelo Quadro 1, salienta-se o interesse em investigar resultados de intervenções de âmbito psicoterapêutico (40%), dirigidas a diferentes grupos-alvo, em diferentes situações clínicas, e em que se incluíram temáticas como: gestão/intervenção no regime terapêutico, consulta de Enfermagem em Saúde Mental, grupos de apoio e Educação para a Saúde.


QUADRO 1 - Distribuição Numérica e Percentual das Temáticas

TEMÁTICAS

n

%

Intervenção Psicoterapêutica Vivências de Saúde Mental Saúde Mental e Família/Prestador de Cuidados Papel do Enfermeiro em Saúde Mental Conceção de Cuidados em Saúde Mental Enfermagem Transcultural Dependências Saúde Mental no Trabalho Outros Total

21 8 7 3 2 2 2 2 5 52

40% 15% 13% 6% 4% 4% 4% 4% 10% 100%

Em segundo lugar, situam-se as vivências em saúde mental (15%), onde se incluíram temáticas como, por exemplo, a problemática da morte e do luto e a utilização do humor no contexto de cuidados. A Enfermagem de família é também uma temática de interesse para a investigação por parte dos enfermeiros de Saúde Mental, reconhecendo-se a importância do papel do prestador de cuidados. Contudo, evidencia-se igualmente a emergência de novas temáticas de investigação, como a Enfermagem Transcultural (4%). Na categoria «outros» incluíram-se temáticas como: Supervisão Clínica em Saúde Mental, teorias de Enfermagem em Saúde Mental e literacia em Saúde Mental. DISCUSSÃO A Organização Mundial de Saúde, tendo em conta a problemática da Saúde Mental a nível mundial, recomendava a adoção de medidas urgentes e «apelava ao reforço do papel da investigação enquanto meio, não só para aprofundar o conhecimento sobre esta problemática, mas também para apoiar as definição de prioridades, o planeamento e a avaliação de vários tipos de intervenção» (Sousa, 2006, p. 105). Quando se olha para a investigação em Enfermagem realizada em Portugal, Basto faz uma análise aos temas das teses de Doutoramento em Enfermagem realizados no nosso país e verifica que apenas uma pode ser relacionada com a área da Saúde Mental, sendo um trabalho na área das dependências (Basto, 2008). Ainda assim, importa perceber que a Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica é, de todas as áreas de especialidade de Enfermagem em Portugal, a que tem um menor número de enfermeiros especialistas, e que grande parte dos profissionais de Enfermagem que exercem funções em contexto hospitalar o fazem em serviços médico-cirúrgicos.

Nos últimos anos, quando se tenta analisar a produção científica na área da Saúde Mental e Psiquiatria em Portugal, esta tem sido escassa. No entanto com o aparecimento d’ A Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, cuja missão passa por promover e por divulgar a investigação na área da Enfermagem de Saúde Mental, este aspeto parece ter sido colmatado. A criação da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, pode ser um instrumento importante para disseminar a evidência científica sobre promoção da saúde, prevenção da doença, tratamento, reabilitação e reintegração de pessoas com doença mental ao longo do seu ciclo de vida. No Brasil foi efetuada uma revisão das publicações - Cartografia da Publicação Brasileira em Saúde Mental - entre 1980 e 1996. Das temáticas dominantes neste texto, salientam-se a organização de serviços (34,6%) e a análises de experiências (35,5%) com maior destaque e aparecendo a seguir os estudos clínicos (14,1%) e os estudos epidemiológicos (11,3%) (Passos, 2003). Num outro documento, também do Brasil, verificámos que a práticas assistencial (práticas terapêuticas relacionadas com a área da Enfermagem Psiquiátrica) foi o tema mais abordado nos estudos efetuados (Munari, Oliveira, Saeki, & Souza, 2008). Na Irlanda foi efetuado um estudo semelhante, com análise de 75 artigos publicados. Verificou-se que os assuntos refletem os debates e discussões no contexto da Enfermagem, com 40% relativos aos problemas da prática clínica, 31% à educação em Enfermagem, 18% à gestão e 6% aos aspetos metodológicos (Higgins & Farrelly, 2007). No estudo conduzido por Zauszniewski e Suresky, em que foram analisados 227 estudos publicados nos cinco jornais de Enfermagem Psiquiátrica mais lidos num período de três anos, são referidas como cinco grandes áreas de investigação: a perspetiva global, os enfermeiros psiquiátricos como sujeitos, os estudos sobre os cuidadores familiares, investigação com os doentes ao longo do ciclo de vida, e por último a utilização (verificação/ teste) das intervenções de Enfermagem. Destes estudos publicados, 88% foram conduzidos nos Estados Unidos, 63% eram referentes aos destinatários dos serviços de saúde mental, e apenas 11% foram sobre as intervenções de Enfermagem Psiquiátrica (Zauszniewski & Suresky, 2004). Na realidade portuguesa, e pelos números de trabalhos analisados, parece verifica-se algo contrário, em que as intervenções psicoterapêuticas (40%) são a área de maior destaque nas investigações realizadas. Contudo, este dado deve ser ponderado de forma cautelosa, visto que apenas os estudos empíricos constituíram material de análise no presente trabalho, embora o mesmo se verifique no estudo conduzido por Zauszniewski e Suresky (2004). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 73


Em termos de prioridades de investigação, a Ordem dos Enfermeiros considera que «tendo em conta a realidade nacional, as áreas de investigação recomendadas incluem as funções e contributos dos enfermeiros na redução do risco e prevenção de comportamentos suicidários; instrumentos de avaliação de risco e de intervenção; estratégias para melhoria das práticas nos contextos de internamento e comunitários e, principalmente, dar prioridade ao estudo da efectividade das intervenções realizadas por enfermeiros de Saúde Mental» (Ordem dos Enfermeiros, 2012, p. 75), indo de encontro àquelas que parecem ser, efetivamente, as tendências de investigação atuais em Enfermagem de Saúde Mental. Salienta-se, igualmente, a importância da família e do prestador de cuidados informal como objeto de estudo: «o diagnóstico de «risco de sobrecarga» ou de «sobrecarga do cuidador» possibilita a implementação de intervenções em estádios mais precoces, o que terá como consequências a diminuição das repercussões negativas para a pessoa dependente e o prestador de cuidados, bem como a redução dos custos globais, individuais e familiares que lhe estão associados» (Sequeira, 2010, p. 62). Estes aspetos são muito relevantes, uma vez que “fazer investigação em saúde e em enfermagem implica, muitas vezes, estudar uma população constituída por indivíduos fragilizados física ou psicologicamente, de uma forma temporária ou permanente: por isso, devem ser alvo de cuidados redobrados atendendo ao dever de protecção daqueles que estão mais fragilizados e vulneráveis” (Nunes, 2013, p. 9). Mendes apresentou alguns dados, em 2012, sobre o estado da arte, com referência aos trabalhos referenciados na RPESM, destacando os trabalhos com os cuidadores (30,4%) e com o doente adulto (26%) (Mendes, 2012). CONCLUSÕES Recentemente, a investigação em Enfermagem de Saúde Mental tem-se centrado, cada vez mais, na implementação e avaliação da efetividade de intervenções de âmbito psicoterapêutico. Este facto deve ser realçado, uma vez reflete a iniciativa e o interesse por parte dos enfermeiros de Saúde Mental em divulgar as suas práticas e que que contribui para o crescimento da profissão e do seu reconhecimento. A emergência de novas temáticas de investigação, como a Enfermagem transcultural, parece traduzir o interesse dos enfermeiros em acompanhar as mudanças sociais (e.g., imigração). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 74

O incremento de qualidade da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ao longo dos anos, particularmente pela sua recente integração na SciELO Portugal®, traduziu-se também por uma maior procura da revista por parte de autores / investigadores interessados em publicar e, consequentemente, numa tendência para o aumento da qualidade dos trabalhos de investigação publicados. Este é o caminho, mas existe ainda um grande percurso a ser feito. Como refere Mendes, é necessário mais investigação e de melhor qualidade, equipas de investigação com peritos tanto em área clínica como no ensino, e por último maior ligação entre a academia e prática (Mendes, 2012). Por outro lado, como salientam Zauszniewski e Suresky (2004), alcançar a prática baseada em evidências nesta área de especialização de Enfermagem deverá exigir que os investigadores sejam qualificados e que façam estudos relevantes para a prática, e não menos importante, que façam a divulgação das suas investigações e dos seus resultados. O presente estudo centrou-se unicamente nos estudos empíricos publicados na RPESM entre 2009 e 2013, portanto, num horizonte temporal demasiado curto para se realizar uma análise da evolução das tendências de investigação em Enfermagem de Saúde Mental ao longo do tempo. Porém, a análise dessa evolução constitui um objetivo pertinente e com prováveis implicações para a Enfermagem enquanto disciplina científica e, em particular, para a Enfermagem de Saúde Mental. Assim, em estudos futuros recomenda-se a realização de trabalhos centrados neste tipo de análise, dada a importância, a nível académico e profissional, que a ela poderá estar associada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Basto, M. L. (2008). Investigação em Enfermagem Temáticas atuais a nível académico. In Colectânea do Projecto ICE. Canárias. Higgins, A. & Farrelly, M. (2007). Peer-reviewed publication output of psychiatric nurses in the Republic of Ireland. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 14(5), 495-502. Mendes, A. (2012). Estado da Arte em Enfermagem de Saúde Mental, I Encontro Internacional de Saúde Mental. Coimbra. Munari, D., Oliveira, N., Saeki, T., & Souza, M. (2008). Análise da produção científica dos encontros de pesquisadores em enfermagem psiquiátrica e saúde mental. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 16(3).


Nunes, L. (2013). Considerações éticas a atender nos trabalhos de investigação académica de enfermagem. Setúbal: Departamento de Enfermagem ESS|IPS Setúbal. Ordem dos Enfermeiros (2012). Guia orientador de boas práticas para a prevenção de sintomatologia depressiva e comportamentos da esfera suicidária. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Passos, I. (2003). Cartografia da publicação brasileira em saúde mental: 1980 – 1996. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 19(3), 231-239.

Sequeira, C. (2010). Cuidar de idosos com dependência física e mental. Lisboa: Lidel. Sousa, F. (2006). Prioridades de investigação em saúde mental em Portugal: as perspectivas de um painel Delphi de psiquiatras e pedopsiquiatras. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 24(1), 103-114. Zauszniewski, J. A. & Suresky, J. (2004). Evidence for psychiatric nursing practice: an analysis of three years of published research. Online Journal of Issues in Nursing, 9(1).

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13 VULNERABILIDADE AO STRESS EM PESSOAS COM ALCOOLISMO | Olga Valentim1; Célia Santos2 ; José Pais-Ribeiro3 |

RESUMO Alguns autores referem-se ao stress como um agente que desafia as capacidades adaptativas de um indivíduo. Quando mencionamos o stress, temos inevitavelmente que abordar o conceito de vulnerabilidade. O alcoolismo enquanto doença crónica tem implicações físicas, psicológicas e sociais. Embora algumas pessoas entrem em disrupção pela crise ou stress crónico, outras protegem-se e reduzem o risco de disfuncionamento, respondendo com novos recursos e uma adaptação positiva. O alcoolismo é uma doença comum em Portugal e não encontrámos pesquisas que estudem especificamente a vulnerabilidade ao stress. Questão de investigação: Qual é a vulnerabilidade ao stress da pessoa com alcoolismo? Objetivo geral: conhecer a vulnerabilidade ao stress de pessoas com dependência do álcool, com a finalidade de contribuir para o desenvolvimento de estratégias de intervenção em enfermagem. Metodologia: aplicámos a escala de Vulnerabilidade ao Stress (23QVS) a 444 pessoas com dependência alcoólica, diagnosticada há pelo menos um ano. A amostra foi essencialmente composta por homens, casados, desempregados, e diagnosticados, em média, há cerca de oito anos. Resultados e conclusões: as pessoas com dependência alcoólica, de uma forma geral, são vulneráveis ao stress, à exceção da Inibição e Dependência Funcional, Carência de Apoio Social e da Deprivação de Afeto e Rejeição. Encontraram-se correlações estatisticamente significativas entre a idade, os anos de escolaridade, o tempo de dependência alcoólica, o número de internamentos e de recaídas, relativamente à vulnerabilidade ao stress. Compreender melhor essa vulnerabilidade é um contributo importante para uma reflexão sobre o processo de adaptação, recuperação e fortalecimento da pessoa com alcoolismo. PALAVRAS-CHAVE: Vulnerabilidade ao stress; Alcoolismo; Enfermagem

RESUMEN

ABSTRACT

“Vulnerabilidad al Estrés en Personas con Alcoholismo” Algunos autores definen el estrés como un agente que desafía la capacidad de adaptación de un individuo. Al hablar de estrés, resulta inevitable abordar el concepto de vulnerabilidad. El alcoholismo, en la medida en que es una enfermedad crónica, tiene consecuencias físicas, psicológicas y sociales. Aunque algunas personas se vean desbordadas por la crisis o el estrés crónico, otras se protegen y reducen el riesgo de disfunción respondiendo con nuevos recursos y una adaptación positiva. El alcoholismo es una enfermedad habitual en Portugal y no hemos encontrado trabajos que estudien de forma específica la vulnerabilidad al estrés. Cuestión de investigación: ¿Cuál es la vulnerabilidad al estrés de las personas que padecen alcoholismo? Objetivo general: conocer la vulnerabilidad al estrés de personas con dependencia del alcohol con la finalidad de contribuir al desarrollo de estrategias de intervención en enfermería. Metodología: se aplicó la escala de Vulnerabilidad al Estrés (23QVS) a 444 personas con dependencia alcohólica diagnosticada como mínimo hace un año. La muestra estaba principalmente constituida por hombres casados, desempleados y con una media de diagnóstico de hace aproximadamente ocho años. Resultados y conclusiones: las personas con dependencia alcohólica, en general, son vulnerables al estrés, a excepción de los casos de Inhibición y Dependencia Funcional, de Carencia de Apoyo Social y de Privación de Afecto y Rechazo. Se encuentran correlaciones estadísticamente significativas entre la edad, los años de escolarización, el tiempo de dependencia alcohólica, el número de ingresos y recaídas con respecto a la vulnerabilidad al estrés. Comprender mejor esa vulnerabilidad constituye una contribución importante para una reflexión sobre el proceso de adaptación, recuperación y fortalecimiento de la persona con alcoholismo. DESCRIPTORES: Vulnerabilidad al estrés; alcoholismo; enfermería

“Vulnerability to Stress in People with Alcoholism” Some authors refer to stress as an agent that challenges the adaptive capabilities of an individual. When we mention stress, we must inevitably address the concept of vulnerability. As a chronic disease, alcoholism has physical, psychological and social implications. While some people enter a state of emotional disruption due to a crisis or chronic stress, others protect themselves and reduce the risk of dysfunction, responding with new resources and positive adaptation. Alcoholism is a common disease in Portugal and we found no studies specifically studying vulnerability to stress. Research question: How vulnerable to stress is a person suffering from alcoholism? General objective: to determine the vulnerability to stress of people with alcohol dependence, in order to contribute to the development of intervention strategies in nursing. Methodology: we applied the Vulnerability to Stress scale (23QVS) to 444 people with alcohol dependence, who had been diagnosed at least one year ago. The sample was primarily composed of married, unemployed men diagnosed on average around eight years ago. Results and conclusions: in general, people with alcohol dependence are vulnerable to stress, except for Inhibition and Functional Dependency, Lack of Social Support and Deprivation of Affection and Rejection. In relation to vulnerability to stress, statistically significant correlations were observed between age, years of education, length of alcohol dependence, number of hospitalisations and relapses. Gaining a better understanding of this vulnerability to stress makes an important contribution to a reflection on the process of adaptation, recovery and strengthening of the person with alcoholism. KEYWORDS: Vulnerability to stress; Alcoholism; Nursing Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 16-02-2014

1 Mestre em Terapias Cognitivas e Comportamentais; Doutoranda em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa; Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria no ACES Lisboa Norte – UCSP de Benfica, Rua General Morais Sarmento, 1500-310 Lisboa, Portugal. E-mail: ommvalentim@gmail.com 2 Doutora em Psicologia; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, celiasantos@esenf.pt 3 Doutor em Psicologia; Professor Associado na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto – Departamento de Psicologia, jlpr@fpce.up.pt Citação: Valentim, O. S., Santos, C.; Pais-Ribeiro, J. (2014). Vulnerabilidade ao Stress em Pessoas com Alcoolismo. Revista Especial da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 76-81. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 76


INTRODUÇÃO

METODOLOGIA

Quase sempre a doença desencadeia situações de stress e de sofrimento, tanto pelas situações novas e imprevistas, como pelas decisões de grande complexidade. O alcoolismo, sendo uma doença crónica, caracteriza-se pela longa duração e impossibilidade de cura, exigindo tratamentos prolongados e adaptações constantes, o que torna esta doença uma importante fonte de stress (Ridder & Schreurs, 2001). O álcool é um fator determinante de saúde, responsável por 7,4% de incapacidade e morte prematura na União Europeia (EU). Avaliando o impacto do álcool através dos Anos de Vida Ajustados à Incapacidade (DALYs), este corresponde ao terceiro entre vinte e seis fatores de risco de doença na UE (Balsa, Vital, Urbano e Pascueiro, 2008). O alcoolismo ou Síndrome de Dependência Alcoólica (SDA) é uma doença grave que afeta um número cada vez maior de pessoas. Segundo Gameiro (1998) citado pela Direcção-Geral da Saúde [DGS] (2002), as estimativas mostram a existência de, pelo menos, 580 000 pessoas com alcoolismo e 750 000 bebedores excessivos, em Portugal. Em 2007 estimou-se que terão sido consumidos 11,4 litros de álcool puro per capita em Portugal, valor superior à média dos cinco países da UE com menores consumos (8,1 litros per capita) (World Health Organization [WHO], 2012). O consumo do álcool, de 2001 para 2007 aumentou de 76% para 79%, assim como, a ingestão de seis ou mais copos, de 56,8% para 58,4% (Balsa, 2008). Para Vaz Serra (2005) uma pessoa encontra-se em stress quando perceciona que não tem controlo sobre um evento que é relevante e perante o qual sente que as exigências do mesmo ultrapassam as suas próprias capacidades e recursos pessoais e sociais. Portanto, entende-se o stress como resposta resultante da avaliação subjetiva que o indivíduo faz de uma determinada situação, ou seja, qual o significado que lhe confere (insignificante, positiva ou stressante) e quais os recursos que possui para lhe dar resposta. Assim, se o indivíduo percecionar que essa situação lhe é prejudicial e que é incapaz de lidar com ela, entra em stress. Segundo o mesmo autor (Vaz-Serra, 2000, p. 291), o perfil do indivíduo vulnerável ao stress é consistente pela “pouca capacidade autoafirmativa, fraca tolerância à frustração, dificuldade em confrontar e resolver os problemas, preocupação excessiva pelos acontecimentos do dia-a-dia e marcada emocionalidade”. Considerando que o stress depende da perceção individual perante a circunstância em que se encontra, importa determinar qual o nível de vulnerabilidade ao stress que influencia a procura de ajuda, o apoio social, a adesão a grupos de autoajuda ou, ao próprio tratamento, e em consequência, a eficácia do mesmo.

Para dar resposta à questão de investigação elaboramos um estudo quantitativo, de tipo descritivo, transversal e correlacional. Participantes - Neste estudo participaram 444 pessoas com o diagnóstico de dependência alcoólica. A amostra de conveniência, foi recolhida em serviços e/ou consulta de alcoologia em diferentes subregiões do País (Norte, Centro e Lisboa e Vale do Tejo) e grupos de autoajuda. Consideramos como critérios de inclusão: idade igual ou superior a 18 anos; diagnóstico clínico de dependência alcoólica há pelo menos um ano; saber ler e escrever e que não apresentassem alterações neurológicas ou cognitivas impeditivas do preenchimento do questionário. Instrumentos - Questionário de caracterização sociodemográfica e clínica e a Escala de Vulnerabilidade ao Stress (23QVS) desenvolvida por Vaz Serra (2000). Trata-se de uma escala tipo likert, com cinco possibilidades de escolha (de 0 a 4). Quanto mais alto for o valor da nota global, maior é a vulnerabilidade ao stress. Uma classificação de 43 representa o ponto de corte acima do qual uma pessoa se encontra vulnerável ao stress. No estudo de validação para a população portuguesa foi obtido um Alfa de Cronbach da escala global de 0,82 (Vaz-Serra, 2000) e no nosso estudo de 0,78. Procedimentos - Requeremos autorização em Unidades de Alcoologia e em grupos de autoajuda (Alcoólicos Anónimos), assim como ao autor do 23QVS (Vaz-Serra, 2000). Respeitámos as normas éticas constantes da declaração de Helsínquia. A cada participante uma vez esclarecidos os objetivos do estudo, processo de colheita de dados e confidencialidade, foi pedida a colaboração voluntária e o consentimento informado. Procedimento Estatístico - A análise dos questionários foi realizado através da utilização do SPSS (Statistical Program for Social Sciences – versão 20.0). Utilizou-se a análise exploratória e descritiva dos dados. Para a comparação de dois grupos independentes, recorreu-se ao teste de Mann-Whitney ou ao teste de Kruskal-Wallis, sempre que pelo menos um grupo não apresentava distribuição normal (Marôco, 2011). No teste de Kruskal-Wallis, sempre que foram detetadas diferenças estatisticamente significativas, recorreu-se ao teste de comparações múltiplas. Para o estudo da forma e intensidade da relação entre duas variáveis (ambas métricas), recorreu-se ao coeficiente de correlação de Pearson. Os resultados são considerados significativos para um nível de significância de p<0,05.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 77


RESULTADOS A amostra é maioritariamente constituída por pessoas do sexo masculino (81,5%; n=362), casadas ou que vivem em união de facto (42,3%; n=188), com uma média de idade de 45,35 anos (DP=9,29). Existe um número significativo de solteiros com 27,9% (n=124), e de divorciados com 25,9% (n=115). 41,9% (n=186) dos participantes estavam desempregados, 39,4% (n=175) são trabalhadores, 13,3% (n=59) reformados, e 0,7% (n=3) são estudantes. Relativamente aos anos de escolaridade, os participantes têm em média 7,60 anos (DP= 3,67; ampl. 0-19). A média da idade em que começaram a beber ronda os 18 anos (DP=8,11; ampl. 4-55). O período de diagnóstico da SDA, em média, são os 7,73 anos (DP=7,17; ampl. 1-38). O número de internamentos apresenta uma média de 2,01 (DP= 2,46; ampl. 0-21). Constatámos que a maioria dos inquiridos (57,9%, n=257) já teve recaídas, com uma média de 1,69 (DP=0,46; ampl. 1-2). A maioria dos inquiridos estava em abstinência, 88,3% (n=392), com uma média de abstinência de cerca de três anos (DP= 5,96; ampl. 0-43). Analisando o quadro 1, verificamos que as pessoas com SDA são em geral vulneráveis ao stress, pois atingem uma média de 50,26 (DP=11,42). Também verificámos que existe uma tendência mais elevada de vulnerabilidade ao stress para qualquer uma das subescalas, à exceção da Inibição e dependência funcional, Carência de Apoio Social e ainda a de Deprivação de Afeto e Rejeição.

Da análise dos resultados destacamos a escala global do 23QVS, que mostra diferenças estatisticamente significativas, entre os casados/união de facto, os solteiros e os divorciados/separados, sendo as duas últimas categorias as que apresentam valores mais elevados (χ_3^2=15,22, p=0,002), pelo que concluímos que os casados/união de facto são menos vulneráveis ao stress.

Da análise do quadro 3, observamos diferenças estatisticamente significativas entre as cinco categorias da situação profissional.

QUADRO 1 - Medidas descritivas da escala global e das subescalas, mínimo, máximo e score médio Subescalas do 23QVS e escala global

N.º Itens

Mínimo/ Máximo

M

DP

Score médio (M / n.º itens)

Perfeccionismo e intolerância à frustração Inibição e dependência funcional Carência de apoio social Condições de vida adversas Dramatização da existência Subjugação Deprivação de afeto e rejeição 23 QVS Global

6

0-24

16,73

4,12

2,79

5

0-20

9,86

3,68

1,97

2 2 3 3 3 23

0-8 0-8 0-12 0-12 0-12 0-92

2,73 4,49 6,84 9,23 5,84 50,26

1,93 2,24 2,26 3,29 2,39 11,42

1,37 2,25 2,28 3,08 1,95 2,19

Da aplicação do teste de Mann-Whitney para comparar a vulnerabilidade ao stress entre os sexos, não se detetaram diferenças estatisticamente significativas (p>0,05). Na comparação entre as subescalas e a escala global do 23QVS com a situação conjugal dos participantes, detetámos a existência de diferenças estatisticamente significativas, conforme é possível verificar no quadro 2. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 78

Dando evidência à vulnerabilidade ao stress global (χ_4^2=14,19, p=0,007), verificamos que os trabalhadores apresentam valores mais baixos, ou seja, as pessoas com SDA desempregadas são mais vulneráveis ao stress do que os trabalhadores. Estudou-se ainda a correlação entre o 23QVS global, e respetivas subescalas, com a idade, os anos de escolaridade, o tempo de dependência alcoólica, o número de internamentos e de recaídas (Quadro 4).


QUADRO 4 - Correlação de Pearson entre as subescalas do 23QVS e escala global e a idade, os anos de escolaridade, o tempo de dependência alcoólica, o número de internamentos e de recaídas Subescalas do 23QVS e escala global

Idade

Anos de escolaridade

Tempo de diagnóstico (anos)

Número de vezes de internamento

Número de Recaídas

Perfeccionismo e intolerância -0,07 -0,17** -0,06 0,02 -0,06 à frustração Inibição e dependência -0,12* -0,11* 0,01 0,11* 0,10 funcional Carência de apoio social -0,11* 0,06 0,03 0,09 0,06 Condições de vida adversas -0,04 -0,16** 0,12* 0,15** 0,20** Dramatização da existência -0,05 0,09 -0,03 0,00 -0,04 Subjugação 0,02 -0,26** -0,03 0,02 0,01 Deprivação de afeto e rejeição -0,13* -0,14** 0,00 0,09 0,01 23QVS global -0,10 -0,17** -0,00 0,12* 0,04 * Correlações significativas ao nível de significância de 5%. ** Correlações significativa ao nível de significância de 1%.

As pessoas com SDA numa idade mais avançada são menos vulneráveis à Inibição e Dependência Funcional, Carência de Apoio Social e Deprivação de Afeto e Rejeição. As que têm menos escolaridade são mais vulneráveis ao stress em geral, e em relação ao Perfeccionismo e Intolerância à Frustração, Inibição e Dependência Funcional, Condições de Vida Adversas, Subjugação e com a Deprivação de Afeto e Rejeição. Verificámos ainda que, quanto maior for o tempo de dependência alcoólica e o número de recaídas, maior é a vulnerabilidade comparativamente às Condições de Vida Adversas. Por sua vez as pessoas com mais internamentos são mais vulneráveis ao stress em geral e também à Inibição e Dependência Funcional e às Condições de Vida Adversas. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas nas várias subescalas e na escala global da vulnerabilidade ao stress entre quem frequenta e quem não frequenta grupos de autoajuda (p>0,05). DISCUSSÃO A amostra do presente estudo mostrou de uma forma geral ser vulnerável ao stress, à exceção das suas componentes de Inibição e Dependência Funcional, Carência de Apoio Social e da Deprivação de Afeto e Rejeição, ou seja, embora tenham pouca capacidade de adaptação face às adversidades, sentem conseguir resolver os problemas, poder contar com os amigos e que são agradáveis para os outros. Relativamente, à situação conjugal os participantes casados apresentam menos vulnerabilidade ao stress, comparativamente com os divorciados e os solteiros. Na Carência de Apoio Social, verificámos que os viúvos são os inquiridos que apresentam valores mais baixos, sentindo-se assim mais solitários e isolados.

O alcoolismo, a separação e o isolamento relacional, estão entre os fatores de risco referenciados nos estudos sobre vulnerabilidade ao stress (Anaut, 2005), ou seja, o casamento acaba por ser um fator protetor e promotor de resiliência. Tal como no estudo de Ferreira (2013) verificaram-se diferenças ao avaliar a vulnerabilidade ao stress mediante a categoria profissional. Neste contexto, os desempregados apresentam maior vulnerabilidade ao stress global e menor capacidade em lidar com as adversidades da vida, relativamente aos trabalhadores e aos reformados. A situação profissional, no caso concreto dos que trabalham, contribuiu para diminuir o risco de reação negativa perante um determinado acontecimento de vida, sentindo-se assim mais apoiados socialmente. Estes resultados corroboram com o descrito por Vaz Serra (2002) que refere ser o “apoio social” um fator de resistência ao stress. Os elementos mais jovens da amostra mostraram-se mais vulneráveis à Inibição e Dependência Funcional, sentindo menos apoio social e menos afeto. Os jovens em consequência da sua vulnerabilidade, e de fatores como o álcool ser uma substância lícita, crenças, e à necessidade de aceitação por parte dos amigos, acabam por ser o grupo mais atingido pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas (Cabral, Farate, e Duarte, 2007; Claudino, Cordeiro e Arriaga, 2007). Vaz Serra (2000) concluiu que o nível de stress não é influenciado pelo grau de instrução. Porém, o presente estudo indicou que a escolaridade, influencia a vulnerabilidade ao stress, sendo os indivíduos com menos instrução os mais vulneráveis. Apesar de não termos encontrado estudos que analisem a vulnerabilidade ao stress das pessoas com SDA, o que dificulta a discussão dos resultados por nós obtidos, é importante analisar o estudo de Ferreira (2013) sobre a vulnerabilidade ao stress na transição para a reforma, no qual verificou, tal como nós, que as pessoas com maior grau de escolaridade demonstram menos tendência para a dramatização e para a subjugação, e de forma geral menos vulnerabilidade ao stress. Estes resultados podem indicar que um índice de escolaridade mais baixo reduz as oportunidades de usufruírem de fatores protetores como, por exemplo, o progresso e êxito académico, ou os relacionamentos positivos com colegas. Por outro lado, um maior nível de escolaridade pode corresponder a maior informação e conhecimentos no âmbito da saúde, bem como a possibilidade de desenvolver estilos de vida mais saudáveis, com um impacto favorável, tanto no estado de saúde, como na vulnerabilidade ao stress. Os resultados indicaram ainda que, quanto maior é o tempo de diagnóstico de dependência alcoólica, maior é a vulnerabilidade sentida. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 79


As pessoas sentem-se cansadas, desiludidas, devido à cronicidade da doença e sentem que não dispõem de dinheiro suficiente para as suas necessidades pessoais (Ferreira-Borges e Filho, 2004; Kiritzé-Topor & Bénard, 2007). Quanto maior o número de internamentos (das pessoas com SDA), maior é a vulnerabilidade em relação às Condições de Vida Adversa e ao stress de uma forma geral. Relativamente à recaída, constata-se que o aparecimento de episódios agudos da doença está diretamente associado a eventos causadores de stress, que por vezes podem ser confundidos com consequências, sendo que as pessoas com SDA que vivenciaram experiências de vida negativas como a perda de um familiar ou o desemprego têm maior possibilidade de recaída (Ferreira-Borges e Filho, 2004; Kiritzé-Topor & Bénard, 2007). Um dos resultados inesperados do presente estudo foi o facto de não serem encontradas diferenças, no que se refere à vulnerabilidade ao stress, relativamente à frequência, ou não, de grupos de autoajuda. Uma das explicações possíveis para estes resultados é o fato da amostra ser pequena ao que se associa uma frequência recente dos participantes nos grupos. CONCLUSÕES Vaz Serra (2007) afirma que uma pessoa vulnerável é aquela que tem a perceção de estar submetida a perigos, de carácter interno ou externo sobre os quais não tem controlo suficiente que lhe permitam sentir-se segura. Portanto, pode-se afirmar que a pessoa quando vulnerável sustenta a expectativa de não conseguir superar as dificuldades. Sem dúvida, esta vulnerabilidade traduz uma dimensão pouco positiva perante os desafios a enfrentar no quotidiano, nomeadamente a dependência alcoólica e a necessidade de internamentos sucessivos. As implicações do estudo podem repercutir-se a três níveis: prática, formação e investigação. O papel do enfermeiro para detetar precocemente as pessoas em risco é fundamental, podendo delimitar estratégias de intervenção para maximizar a relação de ajuda. Segundo Anaut (2005) e em função dos resultados obtidos sugerimos como estratégias de intervenção: Melhorar as aptidões pessoais; Desenvolver a autoestima, a confiança e o sentimento de esperança; Fomentar a autonomia e a independência; Incentivar a utilização dos recursos pessoais e sociais; Corrigir a perceção errada dos acontecimentos; Ajudar a modificar comportamentos inadequados; Sociabilização; Ajudar a implementar hábitos para aumentar a resistência ao stress e estimular atitudes positivas que permitam enfrentar, resolver problemas e prever consequências. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 80

No âmbito da formação, devemos proporcionar momentos de discussão em equipa no sentido de adotar estratégias positivas promotoras de bem-estar. Por fim, é importante acentuar a necessidade de, em futuras investigações, sejam analisadas outras variáveis, designadamente as estratégias de coping e as competências e habilidades comunicacionais das pessoas com SDA e seus familiares. Consideramos que os resultados obtidos constituem um contributo importante para a compreensão dos fatores que influenciam a vulnerabilidade ao stress. Como aspeto positivo salientamos a inovação do presente estudo, que avalia, pela primeira vez, a vulnerabilidade ao stress das pessoas com SDA. A falta de estudos com características idênticas acaba por dificultar este trabalho, uma vez que impede a comparação dos resultados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anaut, M. (2005). A resiliência: Ultrapassar os traumatismos (E. Pestana, Trad.). Lisboa: Climepsi Editores. (Obra original publicada em 2002). ISBN: 972-796-1436 Balsa, C., Vital, C., Urbano, C., e Pascueiro, L. (2008). Inquérito nacional ao consumo de substâncias psicoativas na população geral, Portugal, 2007. Lisboa: UNL/ CEOS/FCSH. Cabral, L. R., Farate, C. M., e Duarte, J. C. (2007). Representações sociais sobre o álcool em estudantes do ensino superior. Referência, 2(4), 69-78. Claudino, J., Cordeiro, R., e Arriaga, M. (2007). Hábitos e crenças sobre o consumo de álcool na cidade de Portalegre. Hospitalidade, 19, 278-284. Ferreira, M. C. (2013). Stress na Transição para a Reforma. Dissertação de Mestrado, Universidade de Coimbra, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Coimbra. Ferreira-Borges, C. e Filho, H. C. (2004). Alcoolismo e Toxicodependência. Usos, Abusos e Dependências. Lisboa: Climepsi Editores. ISBN: 972-796-150-9. Kiritzé-Topor, P. & Bénard, J. (2007). Guia Prático Climepsi de Alcoologia (1ª ed.). (R. Rocha, Trad.). Lisboa: Climepsi Editores. (Obra original publicada em 2001). ISBN 978-972-796-289-1. Marôco, J. (2011). Análise estatistica com o SPSS Ststistics (5ª ed.). Pêro Pinheiro: ReportNumber. ISBN 9789899676329.


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14 MAUS-TRATOS À INFÂNCIA: AS REFERÊNCIAS DOS TÉCNICOS DAS

COMISSÕES DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS [CPCJ] | Paula de Oliveira1; Aida Simões2 |

RESUMO A violência contra crianças e adolescentes é um grave problema de saúde, portanto, deve ser identificado e abordado pelos profissionais e especialistas na matéria. Este artigo tem como objetivo apresentar a perceção dos técnicos face aos maus-tratos da criança. O desenho metodológico baseia-se num estudo com caráter exploratório, descritivo, pesquisa quantitativa, procurando trabalhar com o universo de significados, motivações, e atitudes. A população deste estudo foi formada por todos os elementos pertencentes às CPCJ´s do Distrito de Setúbal. Com base nos resultados obtidos, a atitude substitutiva dos técnicos não favorece o desenvolvimento de competências, aumentando a postura da delegação como também diminui a autoestima da família. Relativamente a uma eventual mudança de atitude em relação à vítima, de acordo com o número de anos, observou-se que nada ou quase nada havia mudado, já os sentimentos para com o agressor, verificou-se que a raiva é o sentimento mais frequentemente e a passividade era o sentimento menos frequente, quanto ao abuso no geral, o sentimento mais referenciado foi a frustração.O projeto de vida das crianças era uma das preocupações referidas, sendo necessário contextualizar a singularidade de cada caso. PALAVRAS-CHAVE: Atitude; Maus-tratos; Criança; Valores

RESUMEN

ABSTRACT

“Maltrato infantil: Las referencias a los técnicos de las Comisiones de Protección de los Niños y Jóvenes [CPNJ]”

“Child Maltreatment: References to technicians at the Commissions for Protection of Children and Young [CPCY]”

La violencia contra los niños es un problema de salud grave, por lo tanto, deben ser identificadas y tratadas por los profesionales y expertos. Este artículo tiene como objetivo presentar la percepción dos técnicos contra los niños. Nuestra metodología se basa en un estudio de investigación exploratoria, descriptiva cuantitativa, tratando de trabajar con el universo de significados, motivaciones y actitudes. La población de estudio consistió de todos los elementos que pertenecen a Setúbal del CPNJ. En base a los resultados obtenidos, la actitud de sustitución técnica no favorece el desarrollo de habilidades, incrementando la postura de la delegación, pero también disminuye la autoestima de la familia. Para un posible cambio de actitud hacia la víctima, de acuerdo con el número de años, se observó que poco o nada había cambiado desde los sentimientos hacia el agresor, se encontró que la ira es un sentimiento más a menudo y la pasividad era el sentido menos común, el abuso en general, la sensación de mayor frecuencia fue la frustración. La vida útil de los niños fue una de las preocupaciones planteadas, siendo necesario contextualizar la singularidad de cada caso.

Violence against children is a serious health problem, therefore, must be identified and addressed by professionals and experts. This article aims to present the perception of technical against the child. Our methodology is based on a study of exploratory, descriptive, quantitative research, seeking to work with the universe of meanings, motivations, and attitudes. The study population consisted of all elements belonging to the CPCY of Setubal. Based on the results obtained, the attitude of technical substitution does not favor the development of skills, increasing the stance of the delegation but also decreases the self-esteem of the family. For a possible change of attitude towards the victim , according to the number of years , it was observed that little or nothing had changed since the feelings toward the offender , it was found that anger is a feeling more often and passivity was the least common sense , the abuse in general, the most commonly reported feeling was frustration. The design life of children was one of the concerns raised, being necessary to contextualize the uniqueness of each case.

DESCRIPTORES: Actitud; Maltrato; Niño; Valores

KEYWORDS: Attitude; Abuse; Child; Values

1 Doutoranda na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde; Docente na Escola Superior de Saúde Egas Moniz – Departamento de Enfermagem, Quinta da Granja, Monte de Caparica, 2829-511, Caparica, Portugal, psarreira@gmail.com 2 Doutoranda na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde; Docente na Escola Superior de Saúde Egas Moniz, Caparica, aidasimoes@gmail.com Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 16-02-2014 Citação: Oliveira, P. S. & Simões, A. (2014). Maus-tratos à infância: as referências dos técnicos das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens [CPCJ]. Revista Especial da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 82-89. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 82


INTRODUÇÃO Ao analisar a existência e prevalência do abuso a crianças ao longo dos tempos, será imprescindível falar acerca das conceções da infância, enquadrando a sua relação com as conceções de abuso e proteção legal. A problemática relacionada com os maus-tratos é uma realidade com dimensões e implicações gigantescas para a sociedade, à qual não se pode mostrar indiferença. Os maus-tratos em crianças e jovens constituem ainda, um grave e complexo problema social, resultando essencialmente das várias vertentes do conceito de maus-tratos, relacionados com fatores culturais, socioeconómicos e com a área profissional ao nível da qual é feita a sua abordagem. Magalhães (2010, p.19) refere que “(…) os maus-tratos resultam, essencialmente de três aspetos: das várias vertentes do conceito de maus-tratos, relacionados com os fatores culturais, socioeconómicos e com a área profissional ao nível da qual é feita a sua abordagem. A violência contra as crianças e adolescentes é um grave problema de saúde, que deve ser identificado e abordado por profissionais que atuam na área”. A preocupação e estratégias de proteção expressam-se através de textos e documentos legais. Deve por isso ser um elemento ativo na proteção da criança quando as relações que ela estabelece durante os primeiros anos de vida revelam-se manifestamente inadequadas e prejudiciais ao seu desenvolvimento harmonioso. A Organização Mundial da Saúde [OMS] (2002) preconiza que as intervenções nestas circunstâncias sejam a nível primário, secundário e terciário. A intervenção a nível primário tem por objetivo evitar a sua ocorrência através de práticas educacionais de paternidade e maternidade responsável. Neste nível de intervenção, as ações propostas incluem a atenção à saúde pré-natal, perinatal e na primeira infância, visando entre outras coisas, melhorar o desenvolvimento e fortalecer os vínculos afetivos. Ao nível secundário, as intervenções devem ser dirigidas para as famílias em situação de risco, proporcionando informações sobre educação e recursos disponíveis na comunidade. Já a intervenção a nível terciário está direcionada para minimizar os efeitos dos maus-tratos, evitar novos episódios e proporcionar uma adequada gestão terapêutica. O reconhecimento imediato desse problema e a rápida intervenção, por parte dos profissionais, representam uma proteção efetiva para estas crianças e uma possibilidade de se rever as relações parentais.

Silva (2011) refere que a violência contras as crianças e adolescentes é um fenómeno complexo e multifatorial, isto é, envolve fatores socioeconómicos e histórico-culturais, bem como a invisibilidade e impunidade. O mesmo autor salienta que, as pesquisas efetuadas mencionam que, os principais tipos de violência ocorrem entre as famílias (violência intrafamiliar), muitas vezes praticada em ambiente doméstico, por pessoas de família, cuidadores ou pessoas próximas da família (violência doméstica). No entretanto também acontece noutros ambientes, como a escola, creches, lares, comunidade e ambientes sociais de uma forma geral (Silva, 2011). Deste modo, a identificação do problema deve, necessariamente, desencadear ações de proteção e notificação, cumprindo com isso, as determinações contempladas na Lei. A atitude dos profissionais na abordagem dos maus-tratos infligida contra a criança e o adolescente encontra-se intimamente relacionada com a visibilidade ou não que o problema assume no seu quotidiano. A reflexão sobre os conceitos dos diferentes tipos de maus-tratos e as ideias a eles associadas contribuem para se entender os possíveis encaminhamentos que dão aos casos identificáveis. Assim, a efetivação de um atendimento depende da possibilidade de ser capaz de identificar a presença ou a suspeita da violência nos diferentes casos. Por outro lado, ter ou não visibilidade depende, de outros aspetos, como o da escuta e do olhar que o profissional consegue no atendimento. Pesquisas deram origem a novas definições do constructo. De Bogardus (Droba, 1933, p. 515) define atitude como “ (...) uma tendência para agir a favor ou contra algo no meio ambiente, o que se torna por isso um valor positivo ou negativo”. Três quartos de século depois, Eagly & Chaiken (2007) argumentam por uma definição mais inclusiva, em que atitude fosse considerada como uma tendência psicológica expressa pela avaliação de uma entidade particular com um certo grau de favorabilidade ou desfavorabilidade. Considerando que as instituições, profissionais ou técnicos que contactam com as crianças e jovens em situação de risco ou perigo são um dos pilares no acompanhamento das situações diagnosticadas ou seja, as que estão sobre objeto de intervenção da Lei. Deste modo, pretendemos verificar qual a perceção dos técnicos face à representação dos maus-tratos às crianças, verificar qual a perceção e sentimentos face ao mau-trato, vitima e agressor, bem como qual as sequelas mais observadas e que identificam através da sua experiência, qual a intervenção, recuperação e acompanhamento mais adequado, de forma a uma integração mais adequada dessa criança. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 83


Conscientes da complexidade do fenómeno e das muitas variáveis em jogo, aceitámos o desafio ao procurar respostas para as questões que nos preocupam. A investigação realizada contribui para um melhor conhecimento dos contextos e práticas profissionais dos elementos constituintes das CPCJ´s, incidindo na construção das atitudes e valores bem como as suas implicações na intervenção institucional destas famílias. METODOLOGIA Com a convicção de que os maus-tratos deixam marcas emocionais que têm mais dificuldade em sarar que as marcas físicas, cabe a cada técnica ajudar na diminuição dessas marcas, nomeadamente na ajuda na e para a família. A criança que é maltratada no seio da família experimenta de uma forma permanente o facto de ser maltratado por quem deveria ser responsável pela sua proteção, cuidado e amor. De modo geral os valores humanos têm sido definidos como critérios que guiam o comportamento, desenvolvimento e manutenção das atitudes em relação às pessoas e eventos bem como, capaz de justificar preferências e até para avaliação cognitiva (Lima, 1993). Revendo a temática abordada na tipologia dos valores humanos de Schwartz & Sagiv (1995), referimos como base, de que os valores são como princípios abstratos que guiam ou justificam as atitudes, as opiniões e os comportamentos. Tornando-se desejável que certas formas de pensar, sentir e agir, sejam definidas como a expressão de sistemas organizados e duradouros de preferência, que tanto podem ser analisados e encontrados no plano social, como no plano individual. De facto, Estevam (2011) refere que, os valores podem ser de grande utilidade, pois não só dando orientações de valores que mantêm as relações pessoais, dando prioridade aos seus próprios interesses e valores pessoais, como também indicam uma relação com os outros, focando a relação interpessoal e os interesses coletivos e sociais, que podem predizer certas atividades. Partindo da análise dos pressupostos teóricos, definiuse a seguinte questão: Qual a perceção dos técnicos sobre abuso infantil? Este estudo tem como objetivo, explorar as atitudes do técnico para os pais que abusam, reconhecer os valores fundamentais do técnico e por último mas não menos importante para contribuir e melhorar a implementação de estratégias de intervenção perante a questão do abuso infantil. Foi escolhida uma pesquisa quantitativa de abordagem exploratória descritiva. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 84

Na pesquisa efetuada tivemos dificuldade em encontrar um questionário adequado ao nosso estudo, confrontando-nos com a necessidade de construir um instrumento próprio. Na elaboração do questionário, juntamente com a pesquisa bibliográfica, tivemos presente a nossa experiência enquanto profissionais de saúde. Para LoBiondo-Wood e Haber (2001), questionários são instrumentos de registo escritos e planeados para pesquisar dados de sujeitos, através de questões, a respeito de conhecimentos, atitudes, crenças e sentimentos. Neste instrumento de colheita de dados é necessário ter uma atenção cuidadosa na sua preparação e na sua organização. Antes de mais, as perguntas foram organizadas, de uma forma lógica para quem a ele responde, por áreas temáticas claramente enunciadas. A recolha de dados foi realizada através de um questionário anónimo e voluntário, preenchido pelo entrevistado, e composto por perguntas fechadas e mistas. População deste estudo foi composta por membros da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens do Distrito de Setúbal N=96; sendo a nossa amostra n = 67 elementos, no período de Maio a Julho de 2008, tendo sido recebidos e considerados como válidos para efeitos do presente estudo 67 questionários, representando uma taxa de retorno e adesão de 69.79%. RESULTADOS Todas as variáveis em estudo foram analisadas individualmente. Com o objetivo de organizar, apresentar e interpretar os dados recolhidos, efetuámos um tratamento estatístico recorrendo ao programa de análise de dados SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 17.0 para Windows. Na análise univariada, para as variáveis com níveis de medida nominal e ordinal determinou-se as frequências absolutas e as percentagens; no caso das variáveis com nível de medida quantitativo calculou-se os valores das médias e dos desvios-padrão. Seguindo os procedimentos apontados por Vilelas (2009), em primeiro lugar, deve procederse à delimitação dos objetivos e à definição do quadro teórico referencial e, em seguida construir “ um corpus ”, isto é, organizar o conjunto dos documentos que serão submetidos aos procedimentos analíticos. Deste modo, depois de definido o quadro teórico, iniciámos um trabalho exploratório, constituído por todas as questões das entrevistas. Tentámos reconstituir as ideias principais, a coerência e as contradições. Este permitiu estabelecer um plano de categorias cuja orientação teve subjacente o pressuposto teórico.


Começamos por fazer a análise descritiva de algumas caraterísticas da amostra que nos parecem pertinentes, passando depois para a descrição dos resultados obtidos. Para concluir, iremos analisar as relações entre os diferentes dados recolhidos. Verificamos deste modo que a maioria dos elementos da amostra se situa na faixa etária dos 30 aos 39 anos com 39% da amostra, sendo a média de 38,93 anos com desvio-padrão 9,845. Em relação à análise dos participantes do estudo por género, verificámos, que a maioria dos elementos da CPCJ, concretamente 86,6% era do sexo feminino o que corresponde a n=58 e sendo 13 % do sexo masculino com um n=9. Relativamente ao estado civil verifica-se que, 47% dos inquiridos, com n=31 dos elementos eram casados, seguidos de 38% com a representação de n=25. Quanto à área da Formação, salientamos que a grande parte da nossa amostra apresenta como área de formação predominante o Serviço Social e a Psicologia com 22.4% o que corresponde a n=15 segue-se com 6.4% a formação ligada à área do Ensino, corresponde a n=11. A Enfermagem e a Educação Social apresentam valores de n=2 ou que corresponde 3% da nossa amostra. A situação de vinculação designada como de Cooptados representa uma percentagem igual aos elementos que mantêm com a Comissão um vínculo de voluntariado. A percentagem de elementos que integram a comissão há menos de 1 ano, em detrimento dos elementos “seniores” ou seja os que integram as Comissões à 11anos. Na distribuição do número de horas verificasse a não existência de número ou de um horário padrão, para os diversos elementos. Existindo uma diversidade no nº de horas que cada elemento efetiva em trabalho na CPCJ. Com base nos resultados obtidos, verificou-se que uma grande parte da nossa amostra tem trabalhado na Comissão a menos de um ano, estes resultados vão refletir sobre a prevenção, detenção e monitoramento de situações de maustratos, visto que essas famílias são geralmente seguido por uma quantidade enorme de serviços. Relativamente à associação entre experiencia na CPCJ e maus-tratos, é relevante a maioria dos elementos (17,9%), associar imediatamente e em primeiro lugar, a situação em que os maus-tratos estão diretamente ligados a exposição de violência doméstica, Alcoolismo/Toxicodependência e a Abuso Físico por Familiares. Foi respondido que sobre a eventual alteração da atitude perante a vítima ter sido alterada com o número de anos responderam 46,3% da nossa amostra respondeu que Nada ou Quase Nada, ter sido alterado na sua atitude perante a vítima com o número de anos nas Comissões.

A análise indica que os sentimentos de Passividade e Negação com 28.4% ou n=19, são nada ou pouco frequentes para a maioria dos inquiridos. Por outro lado, a Angústia e a Frustração surgem como muito ou mesmo extremamente frequentes para bastantes inquiridos. Em relação a uma eventual mudança de atitude em relação à vítima criança / jovem, de acordo com o número ou anos de exercício na Comissão, observou-se que 46,3 % da amostra respondeu que nada ou quase nada havia mudado. Quanto ao abuso no geral, a frustração foi o sentimento mais comum. Podemos observar os sentimentos perante o agressor de Raiva a Insegurança e a Incerteza surgem como os mais referidos como muito ou extremamente frequentes, sendo a Passividade e a Negação os sentimentos escolhidos pela maioria como sendo pouco ou nada frequentes. Quanto ao acompanhamento recomendado para a recuperação das crianças, observámos que a maior número de inquiridos discorda com a Institucionalização/ Hospitalização da criança/jovem vitimizado. Verificou-se que o projeto de vida das crianças era uma grande preocupação para os técnicos. A maioria dos elementos classifica o funcionamento das Comissões como Bom com 52.2% (n=35), Apurou-se que é necessário incorporar a singularidade de cada caso, com o conhecimento elaborado a partir de milhares de famílias auxiliadas sobre situações de abuso infantil e adolescente. DISCUSSÃO Assim, muitas crianças ainda experimentam os dissabores das agressões. Infelizmente, o uso da punição ainda é instrumento utilizado com frequência em contexto familiar, na sociedade contemporânea. Mesmo encarado como algo normal para alguns, os maus-tratos na infância podem acarretar problemas que muito provavelmente terão impacto para toda a vida da vítima, levando-a a repetir por vezes o comportamento violento. O reconhecimento da ocorrência de maus-tratos contra crianças trouxe, como consequência direta a necessidade de protege-la. É importante que os profissionais saibam reconhecer uma criança vítima de maus-tratos e se consciencializem que a omissão pode representar uma opção pela violência. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 85


Deste trabalho podemos referir que houve dificuldade de comparação entre géneros uma vez que as desigualdades, em termos de participação no estudo, entre os sujeitos do sexo masculino e os do sexo feminino foram elevadas (13% homens e 87% mulheres), no entanto poder-se-á extrapolar para a atribuição à mulher, no núcleo familiar, a função dos cuidados educacionais e corporais dos seus filhos (Bustamante e Trad, 2005), assim a sua profissão, assemelha-se a uma extensão do lar, permitindo o aproveitamento desse potencial feminino na prestação de cuidados. Relativamente ao conceito de maus-tratos, verifica-se que é relevante a maior concordância (concordo fortemente), com a referência a toda a forma de violência, prejuízo ou abuso físico ou mental, descuido ou trato negligente, maus-tratos ou exploração enquanto a criança se encontra sob custódia dos seus pais, de um tutor ou de qualquer outra pessoa que a tenha a seu cargo, bem como toda a forma de violência que afeta negativamente a saúde física e/ou psíquica da criança e comprometem o seu desenvolvimento. O próprio conceito mostra um alerta para como, é um conceito culturalmente construído, indicando que o que se considera violência em determinada época e cultura tem significado historicamente delimitado, como é referido por Faleiros e Faleiros (2008) ao referir que “ (…) as crueldades cometidas contra crianças pequenas fazem parte da história, sem falar do direito de vida ou de morte dado ao pai sobre os filhos. Somente em meados do século XIX começa a se esboçar uma preocupação com a criança, que passa a ser encarada como uma pessoa em formação. (…)”. Este resulta, essencialmente de três aspetos: das várias vertentes do conceito de maus-tratos, relacionados com os fatores culturais, socioeconómicos e com a área profissional ao nível da qual é feita a sua abordagem; dos mecanismos etiológicos, tais como problemas como a precariedade socioeconómica, o alcoolismo, a baixa formação escolar ou o excesso de stress que são frequentemente associados aos maus-tratos físicos, revestindose estes de maior visibilidade relativamente a outras formas de violência, como os maus-tratos emocionais, mais característicos dos núcleos socioeconomicamente favorecidos. Depende também das várias modalidades de abordagem da problemática, desde a intervenção (informal ou formal) à prevenção (Magalhães, 2010). Os trabalhos relacionados com os diversos tipos de maus-tratos, em geral, colocam essa problemática como uma questão de violência doméstica, uma vez que, segundo eles, grande parte dos agressores eram os pais ou parentes. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 86

Verificamos que os diferentes fatores que causariam ou influenciariam a ocorrência dos distintos tipos de maustratos estariam presentes em quase todas as suas formas de apresentação, não havendo, em geral, uma explicação específica para um determinado tipo de violência. No entanto, a explicação mais recorrente refere-se à reprodução das experiências de violência familiar vividas durante a infância, contribuindo deste modo, para que se perpetuem os maus-tratos. Considera-se que a vivência de determinada forma de violência influenciará no desenvolvimento do sujeito, sendo que em muitas situações marcam profundamente o ciclo vital (Silva, 2011). A noção de atitude como predisposição socialmente apreendida para o comportamento é aceite clássica e consensualmente pelas ciências sociais. Da mesma forma, aceita-se que as atitudes são organizadas em sistemas cujo carácter distinto é avaliativo e que é expressa afetivamente em termos de intensidade (mais /menos, ou maior/menor) e direção (positiva/negativa) e que orientam a ação tendo um componente cognitivo. Eagly & Chaiken (2007) referem que atitude é uma tendência psicológica que se expressa mediante a avaliação de uma entidade (objeto) concreta, com certo grau de favorabilidade ou desfavorabilidade. No entanto relativamente à atitude, a questão fulcral é que ela é complexa, isto é, simultaneamente estável e suscetível de mudar, tendo algo de subjetivo e de objetivo e tem origem interna e externa. A atitude, não existe no abstrato, está ligada a crenças e valores, com os quais interage, determinandose mutuamente. Deste modo, a atitude dos profissionais na abordagem aos maus-tratos encontra-se intimamente relacionada com a visibilidade que o problema assume no quotidiano. Assim a efetivação de um atendimento depende da possibilidade de ser capaz de identificar a presença ou a suspeita da violência nos diferentes casos. Por outro lado, ter visibilidade depende de outros aspetos como a escuta e o “olhar” que o profissional consegue na abordagem à situação. Quanto aos dados que recolhemos sobre os sentimentos que os elementos vivenciaram face aos maus-tratos, podemos concluir que os sentimentos mais manifestados foram a angústia e a frustração e os menos referidos foram a passividade e negação. Contudo, outros autores elegeram outras conclusões. A atitude perante o agressor a maioria da nossa amostra referiu que a sua atitude não se alterou nada ou quase nada com o decorrer dos anos. Referindo que os sentimentos mais vivenciados são a raiva e a frustração.


Podemos concluir que as atitudes podem construir uma explicação psicológica para os maus-tratos, com base na análise da personalidade de quem maltrata pode, de certa maneira, apresentar de forma patológica o agressor, que é reprovado mas compreendido pela sua patologia. No nosso estudo mais de 50% dos elementos respondeu que as maiores repercussões dos maus-tratos é a dificuldade nos relacionamentos interpessoais, com altos níveis de agressão física e verbal, acompanhados por isolamento, rejeição e não inserção no seu grupo de pares, indo de encontro ao referido por Oliveira (1989) que salienta que as consequências da vitimização física são danos causados no desenvolvimento físico, neurológico, intelectual e emocional. Dentro das consequências psicológicas pode-se citar auto conceito negativo e baixa estima, comportamento agressivo, dificuldade de relacionamento com crianças e adultos, capacidade prejudicada de acreditar nos outros e infelicidade geral. Estes resultados podem ser reforçados com os estudos elaborados por Maughan, Cicchetti, Toth & Rogosch (2007), que ao examinar os efeitos dos maus-tratos, verificaram que existe uma correlação entre os ambientes patogénicos e a proporção na diminuição da regulação da emoção impedindo o bem-estar psicológico quando na interação com o adulto. Vieira (2010) afirma que os maus-tratos infantis são um problema multidimensional, e relacionado com uma multiplicidade de fatores que sendo um fenómeno universal, ocorre em todas as culturas e sociedades. O problema da criança maltratada exige uma intervenção que, de acordo o mesmo autor, só poderá ser eficaz se for interinstitucional e multidisciplinar, essencialmente ao nível dos cuidados antecipatórios e de modo a envolver toda a comunidade. Para uma melhor recuperação destas crianças, os elementos, referiram que a melhor estratégia seria o “Trabalho de projeto de vida, com o menor e com a família” ou seja foi a opção que reuniu uma concordância mais forte. Esta concordância vai de encontro ao que foi vinculado por Allport, Vernon & Lindzey (1970) que sugeriram que a maioria das atitudes, são adquiridas através do diálogo estabelecido entre a família e amigos, ou seja quando outras instituições começam a moldar o indivíduo, a família já realizou esta transformação. A família é o transformador do organismo biológico em ser humano. A atitude substitutiva em nome dos técnicos não favorece o desenvolvimento de competências e, pelo contrário, aumenta a postura da delegação e assumir, também diminuindo a autoestima da família.

Este material biológico transformado tem como fundamento a cultura a que esta família pertence, embora estas famílias são muito vulneráveis e onde estão presentes múltiplos problemas de natureza fisiológica, psicológica ou social, vivendo frequentes e não contínuas, situações de desorganização, em que o ciclo familiar representa uma sucessão sem fim de crises, impossibilitando o desempenho das funções familiares. O componente social age na formação da atitude, na aquisição e desenvolvimento das mesmas, influenciando o indivíduo indiretamente através da menor unidade do sistema social, que é a família. Esta vinculação social irá, construir os “modelos” que promovem efeitos positivos ou negativos em relação aos diversos agrupamentos humanos, determinando comportamentos. Os “modelos” e as demais atitudes, que os seres em sociedade manifestam, funcionam de certo modo, para compreender o mundo, para proteger a nossa autoestima de forma a ajustarmo-nos no mundo complexo e de modo a expressar os nossos valores fundamentais. Os aspetos que o social fornece vão completar ou corrigir as atitudes iniciadas na família. Os resultados obtidos também estão de acordo com Tyler, Brownridge e Melander (2011), onde são referidas conclusões que apontam para o facto de pais com menor disponibilidade afetiva e mais negligentes. Quanto à prática corrente e acessível na CPCJ, na recuperação da criança, encontra-se muitas vezes nos sistemas envolventes como a família alargada, vizinhos, conhecidos, amigos, instituições e grupos de voluntários, que sensibilizados pelos muitos problemas e dificuldades daquelas famílias, desenvolvem mecanismos compensatórios que se tornam recursos importantes para a intervenção, realçando a importância de não se tornarem uma forma de diminuir as competências da família mas, antes pelo contrário alargá-las e implementá-las. Cruz (2006, p.34) refere que, perante as famílias com padrões de funcionamento conflituoso, existe uma grande dificuldade em assegurar a totalidade as suas funções, em consequência do seu modo de funcionamento, apresentando “ (…) limites confusos, alianças fracas entre pais e filhos, oposição à mudança, equilíbrio rígido e comunicação pouco clara.” De facto as Instituições podem ser elas mesmas modeladoras das atitudes nos diferentes grupos sociais através da sua ideologia de uma forma direta ou indireta, sendo os valores que nos orientam e fornecem parâmetros para o julgamento, avaliação e adoção de condutas, doutrinas, crenças, ideologias e culturas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 87


Como referencial, temos os dados da Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens em Risco de 2004, que refere as medidas mais aplicadas pelas Comissões, continuam a ser as que se referem ao apoio em meio natural de vida, com destaque para as medidas de apoio junto dos pais. Do que foi referido acerca dos conceitos de atitude e conceções, é de referir que as conceções são do campo do conhecimento e estão por essa razão, relacionadas com o que pensamos, com conceitos intelectuais e com valores morais. Ou seja as conceções que um indivíduo tem acerca de um assunto determinam a sua atitude face a esse mesmo assunto. Assim, as atitudes estão relacionadas com as posições assumidas, com as ações e podese dizer que são do campo da ação. Fazendo uma abordagem sobre a dimensão do conhecimento, Popadiuk & Choo (2006) apontam que este é baseado na experiência, pensamento e sentimentos num contexto específico, e é composto de componentes cognitivos e técnicos. O componente cognitivo refere-se a modelos mentais de um indivíduo, crenças, paradigmas e pontos de vista. O componente técnico refere-se ao know-how e às habilidades que se aplicam em determinado contexto específico. Também discute um terceiro tipo de conhecimento: o conhecimento cultural, que se esse refere aos pressupostos e crenças usados para descrever e explicar a realidade, as convenções e expectativas usados para atribuir valor e significado à uma nova informação. Lima (1993), referenciou que o componente cognitivo é uma estrutura de conhecimentos ou de crenças compartilhadas com outras pessoas. Tais estruturas possibilitam ao indivíduo organizar e hierarquizar as informações recebidas e assim auxiliam a construção das noções sobre o mundo externo e sobre si mesmo. CONCLUSÕES Partimos do pressuposto que os profissionais são portadores de saberes e experiências que adquiriram ao longo da sua vida pessoal e profissional que ajudaram na formação das suas atitudes e saberes refletindo-se na sua prática do quotidiano influenciando a sua ação e determinação na resolução de situações de maus-tratos. As questões orientadoras marcaram a direção, imprescindível e necessária a toda a pesquisa, no entanto, sofrendo reformulações no decorrer da investigação; o carácter recursivo da abordagem, as interações estabelecidas e o conhecimento progressivo sobre o objeto de estudo assim o exigiram. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 88

O estudo evidenciou a preocupação que os elementos das Comissões têm com as estratégias de recuperação destas crianças bem como o trabalho de projeto de vida com o menor e família. A possibilidade de inverter o destino de exclusão, gerando a mudança de atitudes, valores, padrões de comportamento e alargando os conhecimentos e competências indispensáveis à obtenção de uma qualificação profissional portadora de autonomia económica, dignidade e relacionamentos sociais, depende estreitamente da criação de um meio de socialização rico, não somente no plano do relacionamento e das referências como no da interiorização de conhecimentos e competências. A complexidade e multidimensionalidade dos problemas que impedem estas crianças de serem protagonistas de trajetos sociais inclusivos implicam o recurso a formas de intervenção de grande qualidade, designadamente no que respeita às atividades de apoio ao estudo, de educação de atitudes, valores e afetos, de aquisição de competências culturais em domínios como o desporto, a música e outras formas de expressão artística. A possibilidade de inverter o destino de exclusão, gerando a mudança de atitudes, valores, padrões de comportamento e alargando os conhecimentos e competências indispensáveis à obtenção de uma qualificação profissional portadora de autonomia económica, dignidade e relacionamentos sociais, depende estreitamente da criação de um meio de socialização rico, não somente no plano do relacionamento e das referências como no da interiorização de conhecimentos e competências. Sem esses requisitos decisivos não será possível reparar as marcas profundas e dolorosas deixadas pelas privações materiais e pela debilidade ou rotura dos laços afetivos no seio das suas próprias famílias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Allport, G., Vernon, E. P., & Lindzey, G. (1970). Manual, study of values. Cambridge: Mass.: Houghton Mifflin. Bustamante, V. & Trad, L. (2005). Participação paterna no cuidado de crianças pequenas: um estudo etnográfico com famílias de camadas populares. Cadernos de Saúde Pública, 21(6), 1865-1874. Cruz, M. (2006). Menores em risco/Perigo uma responsabilidade colectiva. Lisboa: Universidade / Internacional de Lisboa. Droba, D. (1933). Topical Summaries of Current Literature: Social Attitudes. American Journal of Sociology, 38, 513-524.


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15 INTERVENÇÕES PROMOTORAS DA LITERACIA EM SAÚDE MENTAL

DOS ADOLESCENTES: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA | Tânia Morgado1; Maria Botelho2 |

RESUMO CONTEXTO: O conceito de literacia em saúde mental foi definido como o conhecimento e as crenças sobre distúrbios mentais que ajudam no seu reconhecimento, gestão ou prevenção. Quer internacionalmente, quer nacionalmente os estudos evidenciam reduzida literacia em saúde mental dos adolescentes e a necessidade de serem desenvolvidas intervenções em contexto escolar para aumentar o seu nível de literacia em saúde mental. OBJETIVO: Foi realizada uma revisão sistemática da literatura com o objetivo de identificar a evidência científica atual e disponível sobre as intervenções promotoras da literacia em saúde mental dos adolescentes. METODOLOGIA: Foi formulada a questão de investigação segundo a mnemónica PICO: “Que intervenções (I) promovem a literacia em saúde mental (O) dos adolescentes (P)?” e definidos os critérios de selecção dos estudos. Seguidamente foram selecionadas as palavras-chave que permitiram realizar a pesquisa. Foram efetuadas as pesquisas em bases de dados electrónicas durante os meses de Abril e Maio de 2013, para resultados de 2008 a 2013. RESULTADOS: Resultaram 15 artigos em texto completo, dos quais 12 artigos foram excluídos. Foram incluídos 3 artigos submetidos posteriormente à avaliação da sua qualidade metodológica. CONCLUSÕES: Os estudos indicam a necessidade de serem desenvolvidas, validadas e avaliadas intervenções que promovam a literacia em saúde mental dos adolescentes. No entanto, a complexidade das intervenções de promoção da literacia em saúde mental dos adolescentes exige que essas sejam investigadas através de um processo de desenvolvimento, viabilidade/pilotagem, avaliação e implementação. PALAVRAS-CHAVE: Adolescente; Literacia em saúde; Saúde mental; Promoção da saúde

RESUMEN

ABSTRACT

“Intervenciones de promoción de literacía de la salud mental de los adolescentes: una revisión sistemática de la literatura”

“Promoting interventions of mental health literacy of teenagers: A systematic review”

CONTEXTO: El concepto de literacía de la salud mental se definió como el conocimiento y las creencias acerca de los trastornos mentales que ayudan en el reconocimiento, la gestión o la prevención. En el ámbito internacional y nacional, los estudios muestran una reducción de educación para la salud mental y la necesidad de llevar a intervenciones de promoción de educación para la salud mental en los adolescentes. OBJETIVO: Se realizó una revisión sistemática de la literatura con el fin de identificar la evidencia actual disponible y en las intervenciones que promueven la educación en materia de salud mental de los adolescentes. METODOLOGÍA: Fue formulado pregunta de investigación según la nemotécnica PICO: “¿Qué intervenciones (I) promover la alfabetización de la salud mental (O) de los adolescentes (P)?” Y se definen los criterios para la selección de los estudios. Luego fueron seleccionadas las palabras clave que permitieron a la búsqueda. Las encuestas se realizaron en bases de datos electrónicas en los meses de abril y mayo de 2013, para los resultados de 2008 a 2013. RESULTADOS: Se encontraron 15 estudios y 12 fueron excluidos. Se incluyeron tres artículos presentados después de la evaluación de la calidad metodológica. CONCLUSIÓN: Los estudios indican la necesidad de desarrollar, validar y evaluar las intervenciones promueven la educación para la salud mental de adolescentes. Sin embargo, la complejidad de las intervenciones para promover la educación para la salud mental de los adolescentes exige que éstos se investiguen a través de un proceso de desarrollo, viabilidad/pilotaje, evaluación e implementación. DESCRIPTORES: Adolescente; Literacía de la salud; Salud mental; Promoción de la salud

BACKGROUND: Mental health literacy was defined as knowledge and beliefs about mental disorders which aid their recognition, management or prevention. Internationally and nationally, studies show reduced mental health literacy in teenagers and it’s necessary to develop interventions in schools to increase the level of mental health literacy among teenagers. AIM: We performed a systematic review in order to identify the current evidence available on interventions that promote mental health literacy among teenagers. METHODS: The research question was stated according to the PICO mnemonic: “What interventions (I) promote mental health literacy (O) among teenagers (P)?”. We defined criteria for selection of studies. Were selected the keywords that enabled the search. Surveys were carried out in electronic databases during the months of April and May 2013 regarding results for 2008 to 2013. RESULTS: We found 15 full-text articles and excluded 12 articles. We included three articles submitted after assessment of the methodological quality. CONCLUSION: Studies indicate the need to be developed, validated and evaluated interventions in the area of mental health in schools, particularly interventions that promote mental health literacy among teenagers. However, the complexity of interventions to promote mental health literacy among teenagers requires that these be researched regarding development, feasibility/piloting, evaluation and implementation. KEYWORDS: Adolescent; Health literacy; Mental health; Health promotion

1 Mestre em Bioética; Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental, no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE, tmorgado@gmail.com 2 Doutora em Filosofia; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, 1700-063 Lisboa, Portugal, rbotelho@esel.pt

Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 13-02-2014 Citação: Morgado, T. & Botelho, M. R. (2014). Implicações Promotoras da literacia em saúde mental dos adolescentes: Uma revisão sistemática da literatura. Revista Especial da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 90-96. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 90


INTRODUÇÃO O conceito de literacia em saúde mental foi definido pela primeira vez por Jorm e colaboradores em 1997 como o conhecimento e as crenças sobre distúrbios mentais que ajudam no seu reconhecimento, gestão ou prevenção (Jorm et al., 1997) e em 2000 o autor definiu as componentes que integram esse conceito (Jorm, 2000). Essas componentes foram sofrendo alterações ao longo dos anos, sendo mais recentemente definidas como a) conhecimento sobre como prevenir as perturbações mentais; b) reconhecimento de quando uma perturbação se está a desenvolver; c) conhecimento sobre as opções de procura de ajuda e tratamentos disponíveis; d) conhecimento sobre estratégias efetivas de auto-ajuda para os problemas menos graves; e) competências para prestar a primeira ajuda a outras pessoas que estão a desenvolver uma perturbação mental ou que estão numa situação de crise (Jorm, 2011). Os resultados preliminares do primeiro estudo nacional sobre a saúde mental coordenado pelo psiquiatra Caldas de Almeida e integrado no projeto liderado pela Universidade de Harvard e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgados em 2010, revelaram que Portugal é o país da Europa com a maior prevalência de doenças mentais na população, clarificando “a prevalência anual em Portugal das perturbações psiquiátricas era de 22,9%, sendo que as perturbações de ansiedade e as perturbações depressivas representavam 16,5% e 7,9%, respetivamente” (Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2012, p. 83). Atendendo ao aumento da prevalência de doenças mentais na população portuguesa, torna-se imprescindível a promoção da literacia em saúde mental. Se a literacia em saúde mental não for promovida pode resultar num entrave para a população, na aceitação dos cuidados de saúde mental baseados na evidência e que as pessoas portadoras de perturbação mental poderão ser menosprezadas e não ter acesso aos cuidados de saúde, nem apoio por parte da comunidade (Jorm, 2000). Desde o início do século XXI, a Literacia em Saúde Mental (LSM) tem sido estudada por vários autores em várias faixas etárias, nomeadamente na adolescência. A adolescência é considerada como a faixa etária compreendida entre os 10 e os 19 anos (OMS, 1965). Por um lado, caracteriza-se pelo desenvolvimento de uma grande capacidade de processar informação, de pensar de forma abstracta e usar ao máximo a sua capacidade de raciocínio, sendo esta etapa privilegiada para se realizarem intervenções na área da literacia em saúde, uma

vez que uma melhor literacia numa idade jovem tem um impacto directo nas suas vidas mais tarde, uma vez que os adolescentes estão a adquirir conhecimentos e a definir comportamentos que os acompanharão na sua vida adulta (Manganello, 2007). Por outro lado, pelas suas características, a adolescência constitui-se como uma fase de vida crítica para a saúde mental e são várias as perturbações mentais que têm o seu pico de incidência nestas fases, nomeadamente a depressão e tentativas de suicídio, uso de substâncias, perturbações alimentares, ansiedade e psicoses (Rickwood, Deane, Wilson & Ciarrochi, 2005; Sprintall & Collins, 2011), sendo “mais comuns durante os anos intermédios (idade do ensino secundário) e no final da adolescência (quando entram para o ensino superior), do que no princípio deste período de desenvolvimento (terceiro ciclo do ensino básico)” (Sprintall & Collins, 2011, p. 511). Políticas de saúde internacionais e nacionais têm enfatizado a emergência de reconhecer a saúde mental dos adolescentes e jovens no contexto escolar como uma área de intervenção prioritária. De acordo com o Regulamento de Perfil de Competências do Enfermeiro de Cuidados Gerais (OE, 2011), os enfermeiros no domínio da prestação e gestão de cuidados contribuem para a promoção da saúde. Segundo o Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental, Regulamento n.º 129/2011 de 18 de Fevereiro (2011), os enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde mental assistem a pessoa ao longo do ciclo de vida, família, grupos e comunidade na otimização da saúde mental e coordenam, implementam e desenvolvem projectos de promoção e protecção da saúde mental e prevenção da perturbação mental na comunidade e grupos. Internacionalmente, os estudos evidenciam uma reduzida LSM dos adolescentes e jovens e a necessidade de serem desenvolvidas intervenções em contexto escolar para aumentar o seu nível de LSM (Morgan & Jorm, 2009; Oh, Jorm & Wright, 2009; Klineberg, Biddle, Donovan & Gunnell, 2010; Swords, Hennessy & Heary, 2011). Em Portugal, têm sido realizados estudos por Loureiro e colaboradores que evidenciam que os maiores entraves à procura de ajuda profissional centram-se no facto das doenças serem causa de estigma e descriminação social e indicadores de fraqueza pessoal (Loureiro, Mateus & Mendes, 2009) e que o nível de LSM dos adolescentes e jovens é reduzido para todas as perturbações, tornandose “preocupante quando se sabe que grande parte das Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 91


perturbações têm a sua primeira ocorrência na adolescência e de que este grupo é de todos os cidadãos, o que menos contato tem com o sistema de saúde, assim como grande relutância em procurar ainda ajuda profissional especializada” (Loureiro et al., 2012, p. 405). Os dados destes estudos realizados em Portugal revelam, à semelhança dos estudos internacionais, a necessidade de serem realizadas intervenções promotoras da LSM nos adolescentes. Neste contexto, foi realizada uma revisão sistemática da literatura com o objetivo de identificar a evidência científica actual e disponível sobre as intervenções que promovem a LSM dos adolescentes. METODOLOGIA Foi formulada a questão de investigação e definidos os critérios de seleção dos estudos primários (Quadro 1) segundo a mnemónica PICO (Participantes ou População - Population [P]; Intervenções – Intervention [I]; Comparação – Comparator, caso exista [C]; Resultados – Outcomes [O] (Joanna Briggs Institute (JBI), 2011, p. 13): “Que intervenções (I) promovem a literacia em saúde mental (O) dos adolescentes (P)?”. QUADRO 1 - Critérios de seleção dos estudos primários

Critérios de selecção

Critérios de Inclusão

Critérios de Exclusão

Participantes Adolescentes.

Adolescentes com doença mental. Participantes de outras faixas etárias.

Intervenção

Intervenções de promoção e educação para a saúde mental.

Intervenções de promoção e educação noutras áreas da saúde. Não existir desenvolvimento de intervenções.

Resultado

Resultados relativos às Resultados relativos a inintervenções na área tervenções noutras áreas da literacia em saúde da literacia em saúde. mental.

Desenho

Estudos quantitativos, Revisões narrativas da qualitativos e revisões literatura. sistemáticas da literatura.

Seguidamente foram selecionadas as palavras-chave que permitiram realizar a pesquisa. Foi realizada uma pesquisa inicial através do motor de busca EBSCOhost com acesso a duas bases de dados: CINAHL Plus with Full Text e MEDLINE with Full Text. Foram consultados os descritores validados em CINAHL Headings (adolescence; health education; health promotion; mental health; literacy) e em Medical Subject Headings – MeSH (adolescent; education; health education; health promotion; mental health; health literacy). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 92

Foram efetuadas as pesquisas em bases de dados electrónicas durante os meses de Abril e Maio de 2013, para resultados de 2008 a 2013., com os operadores boleanos OR e AND. Resultaram 15 artigos em texto completo, os quais foram lidos na sua totalidade e analisados à luz dos critérios de inclusão definidos. Foram excluídos 12 artigos: participantes de outras faixas etárias (4); intervenções de promoção e educação noutras áreas da saúde (3); não existir desenvolvimento de intervenções (2); resultados relativos a intervenções noutras áreas da literacia em saúde (1) e revisões narrativas da literatura (2). Foram incluídos 3 artigos: revisão sistemática da literatura com meta-análise (1); desenho experimental, ensaio clínico randomizado (1) e desenho experimental, com grupo de controlo e com pré-teste e pós-teste (1), submetidos posteriormente à avaliação da sua qualidade metodológica, segundo os instrumentos Critical appraisal tool for systematic reviews e MAStARI critical appraisal tools randomised control/pseudo-randomised trial (JBI, 2011). De acordo com estes instrumentos, estes 3 artigos apresentaram critérios de avaliação superiores a 70%, sendo considerados com qualidade metodológica e por isso foram incluídos, constituindose como a amostra nesta revisão sistemática da literatura (Figura 1).

FIGURA 1 - Processo de pesquisa e seleção dos estudos


RESULTADOS Foram incluídos 3 artigos, dos quais foram extraídos os dados com recurso ao instrumento Data extraction tools for systematic reviews e MAStARI data extraction tools (JBI, 2011). Apresentam-se seguidamente os dados relativos à caracterização dos estudos em função do objectivo e da questão de investigação desta revisão sistemática da literatura (Quadro 2). QUADRO 2 - Caracterização dos estudos incluídos

Autor Ano

Desenho Objetivos Níveis de Evidência

Participantes Intervenções

Kavanagh et al. (2009)

RSL com metaanálise NE = E1

Identificar intervenções de promoção da saúde mental baseadas na terapia cognitivocomportamental para adolescentes entre os 11 e os 19 anos em contexto escolar.

Adolescentes com idades dos 11-19 anos.

Intervenções cognitivo-comportamentais em contexto escolar (school-based cognitive-behavioural interventions).

Fraser e Pakenham (2008)

Experimental Grupo de controlo Pré-teste e pós-teste NE = E2

Avaliar a eficácia de uma intervenção de psico-educação dirigida a 44 adolescentes de idades compreendidas entre os 12 e os 18 anos, filhos de um dos pais com doença mental.

Adolescentes (N = 44) com idades dos 12-18 anos, com um dos pais com presença de doença mental (Grupo experimental: n = 27; Grupo de controlo: n = 17).

Intervenção de psico-educação dirigida a filhos de pais com doença mental (children of parents with mental iilness copmi): Koping Adolescent Group Program – KAP, peer support Intervention.

Chisho lm,Pat terson, Torger son,Tu rner & Birchwood (2012)

Experimental Grupo de controlo Randomizado NE = E2

Avaliar a viabilidade da intervenção de educação para a saúde mental em contexto escolar SchoolSpace, dirigida a adolescentes com idades compreendidas entre os 12-13 anos.

Adolescentes com idades dos 12-13 anos de 7 escolas secundárias.

Intervenção de educação para a saúde mental em contexto escolar sobre: estigma da doença mental; literacia em saúde mental e promoção da saúde mental, denominada SchoolSpace.

DISCUSSÃO Os estudos encontrados apresentam intervenções promotoras da LSM dos adolescentes com diferentes métodos e estratégias. Kavanagh et al. (2009) realizaram uma revisão sistemática da literatura (RSL), na qual identificaram estudos que desenvolveram intervenções cognitivo-comportamentais em contexto escolar. Todos os estudos incluídos nesta RSL apresentaram intervenções desenvolvidas em grupo, variando de pequenos grupos a turmas inteiras. Nenhum estudo referenciou o envolvimento de jovens em nenhum momento da intervenção.

Todos os estudos apresentaram algum nível de treino e suporte para as pessoas que desenvolveram as intervenções, apesar desse variar consideravelmente. Os níveis de treino e suporte foram idênticos tanto para o pessoal da escola como para o pessoal externo. Intervenções desenvolvidas por pessoal da comunidade escolar tiveram um mínimo de 6 horas de treino em torno do manual ou protocolo da intervenção, sendo que o treino e suporte mais intensivo incluiu uma semana de treino e supervisão e feed-back quinzenal. Intervenções desenvolvidas por pessoal da escola foram eficazes até 3 meses após a intervenção, enquanto aquelas que foram desenvolvidas por pessoal não escolar como psicológos ou investigadores não se mostraram eficazes. Intervenções de maior duração (10 ou mais sessões) foram eficazes até três meses após a intervenção, enquanto intervenções de curto (até nove sessões) foram eficazes apenas até quatro semanas após a intervenção. Intervenções desenvolvidas durante o período escolar foram eficazes até quatro semanas após a intervenção. Intervenções desenvolvidas fora do horário escolar mostraram-se ineficazes. O estudo de Fraser & Pakenham (2008) apresenta uma intervenção psico-educativa dirigida a adolescentes, filhos de pais com doença mental denominada Koping Adolescent Group Program - KAP e que consistiu em 3 sessões de grupo com a duração de 6 horas quinzenalmente. As estratégias incluíram psico-educação; treino; educação pelos pares; discussão em grupo; questionamento e outras actividades como arte criativa, artesanato, vídeos e jogos. O KAP foi implementado de acordo com um manual facilitador e teve a participação de dois facilitadores profissionais de saúde mental, um deles foi o coordenador do programa. Chisholm, Patterson, Torgerson, Turner & Birchwood (2012) apresentam o projeto de um estudo que prevê a implementação de uma intervenção de educação para a saúde mental, em contexto escolar, denominada SchoolSpace e que consiste em sessões de educação sobre o estigma da doença mental; a literacia em saúde mental e a promoção da saúde mental. Esta intervenção inclui o contacto com uma pessoa jovem com a experiência de doença mental que irá trabalhar com os participantes como um dos dinamizadores e fará uma apresentação e discussão interativa de 10 a 20 minutos sobre como viver com a doença mental. A intervenção será desenvolvida por profissionais de saúde especializados em saúde mental e pessoal do contexto escolar, que receberão treino e decorrerá no período e contexto escolar habitual. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 93


Cada turma será dinamizada por 2 a 4 pessoas, incluindo um assistente em educação e um profissional de saúde especializado em saúde mental que será o líder. Pelo menos um professor da escola estará presente em cada turma.

Podem ser consideradas limitações desta RSL: a dificuldade de acesso aos artigos em texto integral e as opções metodológicas que determinaram os resultados. Propõe-se a realização de outras revisões sistemáticas da literatura sobre esta temática.

CONCLUSÕES

IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA

Esta revisão sistemática da literatura permitiu identificar intervenções promotoras da LSM dos adolescentes: intervenção cognitivo-comportamental em contexto escolar; intervenção de psico-educação e intervenção de educação para a saúde mental em contexto escolar. Identificou-se o contexto escolar como área de intervenção. Os estudos incluídos clarificaram os métodos e as estratégias desenvolvidas nas intervenções.

Esta RSL apresenta implicações para a prática e para a investigação, na medida em que os estudos incluídos reforçam a necessidade de serem desenvolvidas, validadas e avaliadas intervenções que promovam a LSM dos adolescentes, nomeadamente em contexto escolar. A complexidade das intervenções de promoção da literacia em saúde mental dos adolescentes exige que estas sejam investigadas através de um processo de desenvolvimento, viabilidade/pilotagem, avaliação e implementação.

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16 FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS DE

ESTUDANTES DE ENFERMAGEM EM CONTEXTO DE ENSINO CLÍNICO EM SAÚDE MENTAL E PSIQUIATRIA

RESUMO

| Júlia Martinho1; Regina Pires2; José Carlos Carvalho3; Graça Pimenta4 |

A formação em contexto da prática é uma componente fundamental na integração de saberes e desenvolvimento de competências dos estudantes de enfermagem, constituindo um eixo estruturante da sua socialização e construção da identidade profissional. Considerando a complexidade que envolve a formação em contexto de saúde mental e psiquiatria, a supervisão dos estudantes assume uma relevância decisiva, na medida em que lhes proporciona os instrumentos necessários para a otimização da aprendizagem e desenvolvimento de competências. OBJETIVO: conhecer as perspetivas dos estudantes sobre o ensino clínico em contexto de saúde mental e psiquiatria e as competências desenvolvidas no decurso do mesmo. METODOLOGIA: estudo exploratório, de natureza quantitativa. Colheita de dados efetuada de 13 de fevereiro a 30 abril 2013. Todos os procedimentos éticos foram respeitados. Realizada a caraterização sociodemográfica do estudante e a avaliação das competências que se desenvolvem com maior predominância através da escala Adaptive Competency Profile – ACP, validada para Portugal. RESULTADOS: amostra constituída por 48 estudantes, sendo 42 (87,5%) do sexo feminino, com M=22,9 anos (DP=3,9). Como motivação para a escolha do curso, 42,6% referem a questão vocacional, 34,4% o interesse na área da saúde e 23% o fato de terem contactado com a enfermagem enquanto recetores de cuidados. CONCLUSÕES: os estudantes salientam o ensino clínico como uma mais-valia possibilitando-lhes confronto com a realidade da profissão, proporcionando-lhes experiências de trabalho e preparação para o futuro. As competências mais desenvolvidas em contexto de psiquiatria são as de relação, ligadas à experiência concreta e à observação reflexiva. PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Estudantes; Estágio clínico; Educação baseada em competências

RESUMEN

ABSTRACT

“Formación y desarrollo de competencias de los estudiantes de enfermería en el contexto de la enseñanza clínica en salud mental y psiquiatría”

“Training and skills development of nursing students in the context of clinical teaching in mental health and psychiatry”

La formación en la práctica es un componente clave en la integración del conocimiento y desarrollo de habilidades de estudiantes de enfermería, formando un eje estructural de socialización y construcción de identidad profesional. Teniendo en cuenta la complejidad que implica la formación en salud mental y psiquiatría, la supervisión de estudiantes es de importancia decisiva, ya que les proporciona instrumentos de aprendizaje y desarrollo de habilidades. OBJETIVO: conocer las perspectivas de los estudiantes acerca de la educación clínica en contexto de salud mental y psiquiatría y las habilidades desarrolladas durante el mismo. METODOLOGÍA: estudio exploratorio de carácter cuantitativo. La recolección de datos se llevó a cabo entre 13 de febrero y 30 de abril 2013. Todos los procedimientos éticos fueron respetados. Se hice la caracterización sociodemográfica y evaluación de las habilidades de los estudiantes, desarrolladas con mayor prevalencia en todo el rango del Perfil de Competencias - ACP, validados para Portugal. RESULTADOS: muestra de 48 estudiantes, siendo 42 (87,5%) mujeres, con M = 22,9 años (DE = 3,9). Como motivación de elección del curso, el 42,6% informó de la cuestión vocacional, 34,4% del interés en la salud y el 23% que se han puesto en contacto con la enfermería como receptores de cuidados. CONCLUSIONES: Los estudiantes destacan la formación clínica como una ventaja que permite enfrentar la realidad de la profesión, proporcionándoles experiencia laboral y preparación para el futuro. Las habilidades más desarrolladas en contexto de psiquiatría son la relación, vinculada a experiencia concreta y observación reflexiva.

The clinical training is a key component in the integration of knowledge and skill development of student nurses, forming a structural axis of socialization and professional identity construction. AIM: to understand the perspectives of students about clinical education in the context of mental health and psychiatry and skills developed during the same. METHODS: exploratory, quantitative study. Data collection from February 13th to April 30th, 2013. All ethical standards were observed. Sociodemographic characterization and assessment of student skills more developed was made using the Adaptive Competency Profile – ACP scale, validated to Portuguese. RESULTS: sample consisting of 48 students, 42 (87.5%) females, with M = 22.9 years (SD = 3.9). Reasons for choosing nursing course highlight vocation (42.6%), interest in health (34.4%) and previous contact with nursing as patients (23%). CONCLUSIONS: Students highlight the clinical education as an asset allowing them to confront the reality of the profession, providing them with work experience and preparation for the future. Relationship skills are considered most developed in context of clinical training in psychiatry, linked to concrete experience and reflective observation.

DESCRIPTORES: Salud mental; Estudiantes; Prácticas clínicas; Educación basada en competencias

KEYWORDS: Mental health; Students; Clinical clerkship; Competency-based education

Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 27-02-2014

1 Doutora em Ciências de Enfermagem; Investigadora do grupo “NurID: Inovation & Development in Nursing” – CINTESIS-FMUP; Professora Adjunta na Escola Superior Enfermagem do Porto (ESEP)– Unidade Científico-Pedagógica “Enfermagem, Disciplina e Profissão”, Rua Dr. António Bernardino de Almeida, Porto, Portugal, julia@esenf.pt 2 Doutoranda em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa; Professora Adj. na ESEP – Unidade Científico-Pedagógica “Formação e Gestão em Enf.”, regina@esenf.pt 3 Doutor em Ciências de Enfermagem; Investigador do grupo “NurID” – CINTESIS-FMUP; Professor Adjunto na ESEP – Unidade Científico-Pedagógica, zecarlos@esenf.pt 4 Doutora em Ciências da Educação; Investigadora do grupo “NurID” – CINTESIS-FMUP; Professora Coord. na ESEP – Unidade Científico-Pedagógica, gpimenta@esenf.pt Citação: Martinho, J., Pires, R., Carvalho, J. C., & Pimenta, G. (2014). Formação e desenvolvimento de competências de estudantes de enfermagem em contexto de ensino clínico em saúde mental e psiquiatria. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 97-102. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 97


INTRODUÇÃO A formação e desenvolvimento humano constituem um processo constante de apropriação e transformação de saberes, onde os contextos envolventes assumem um papel preponderante. Considerando a natureza do exercício profissional dos enfermeiros e respetivas trajetórias de formação, percebe-se que estas segundas envolvam uma forte componente prática, principalmente no que à formação inicial diz respeito. A formação em contexto da prática, constitui um elemento fundamental no desenvolvimento das aprendizagens e competências dos estudantes de enfermagem, sendo que, também aqui, a ecologia envolvente se constitui como elemento fundamental no processo de aprendizagem, até porque, como referem Alarcão e Rua (2005), as trajetórias de formação em enfermagem ganham sentido, se perspetivadas numa lógica de cruzamentos disciplinares de saberes interpessoais, interprofissionais e interinstitucionais, pois constituem momentos de aproximação à vida profissional. A formação em contexto clínico tem sido foco de intenso debate e consistentemente reconhecida na literatura como uma fase crucial no percurso formativo dos estudantes, por um lado, pelas aprendizagens que proporciona, facilitadoras da aquisição e consolidação de conhecimento e promotoras da socialização à profissão e da formação da identidade profissional, por outro lado, pela complexidade de que se reveste, quer pela natureza complexa dos contextos e das práticas, quer pelos atores envolvidos no processo (Charleston & Happell, 2005; Abreu, 2007; Silva, Pires & Vilela, 2011). Das nossas experiências profissionais, percecionamos que esta complexidade se acentua quando o ensino clínico se desenrola em contexto de saúde mental e psiquiatria [SMP], pois admitimos, tal como Markstrom e colaboradores (2009), que os estudantes, nomeadamente numa fase mais inicial, partilham de conceções estigmatizantes que poderão influenciar as suas aprendizagens, o desenvolvimento de competências e, futuramente, a prestação de cuidados enquanto enfermeiros. À luz de Happell e Gaskin (2013) acrescentamos ainda que estas conceções são suscetíveis de influenciar as opções profissionais, pois como revela a revisão sistemática realizada por estes autores, no âmbito da investigação sobre as atitudes dos estudantes em contexto de formação em enfermagem em saúde mental, tem mostrado consistentemente que esta é uma das áreas menos preferenciais da enfermagem para uma potencial carreira profissional. No entanto, como sugerem os estudos de Happell e colaboradores (2008; 2011), o aumento da componente de experiência clínica em SMP, é suscetível de produzir atitudes mais positivas em relação às pessoas com doença mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 98

Moir e Abraham (1996) e Charleston e Happell (2005) apontam para diferenças essenciais entre os contextos de saúde em geral e os de saúde mental em particular. Estes autores apontam ainda que o ambiente geral de saúde é normalmente mais estruturado, com tarefas específicas orientadas, principalmente, para a pessoa com necessidades de cuidados físicos, nos quais os estudantes têm mais facilidade de se concentrar em tarefas definidas e na aquisição de competências clínicas específicas, sendo que a natureza das suas intervenções envolve todos os domínios, no entanto, salientamos a forte componente de execução de procedimentos, com reflexo na aquisição de competências no âmbito das habilidades instrumentais. Por sua vez, a área da saúde mental sugere contextos frequentemente contrastantes com os ambientes mais familiares, mais conhecidos, dos hospitais gerais, onde o papel do enfermeiro de psiquiatria é, geralmente, muito menos incidente sobre intervenções do domínio instrumental e muito mais sobre o desenvolvimento de uma relação terapêutica, interpessoal, com os clientes, o que exige do estudante o desenvolvimento de competências neste domínio, o que, regra geral, estes consideram difíceis de se desenvolver, pois apelam a um desenvolvimento pessoal, ético e moral, que se desenrolam a par do crescimento humano, e não com a prática reiterada de qualquer procedimento específico (Charleston & Happell, 2005). Os mesmos autores referem ainda que o ambiente em SMP é muito menos estruturado, com uma maior dependência da abordagem multidisciplinar, onde a própria natureza do papel da enfermagem pode ser perturbador para os estudantes, exigindo que estes sejam obrigados a ajustar-se ao fato de que muitos clientes são admitidos numa base involuntária e, portanto, são mais propensos a serem hostis aos cuidados. Daqui resulta que o processo de formação em contexto da SMP exige um conjunto de dispositivos que permitam ao estudante o desenvolvimento da criatividade, da comunicação terapêutica, da sua sensibilidade para o cuidar, de escuta, de empatia, e da capacidade de relacionamento interpessoal com o cliente, equipa pluridisciplinar, família e comunidade e, fundamentalmente, o desenvolvimento de capacidades crítico-reflexivas e de pensamento crítico, que lhes permitam a integração dos saberes. Para que se atinja este desiderato, o ensino clínico em SMP requer ser integral, interdisciplinar, pautado em referenciais que permitam a assimilação de competências que assegurem uma ação holística e solidária, que contemple a integralidade do ser humano, promovendo todo o seu sentido de humanidade.


A formação de estudantes, logo profissionais reflexivos, orientadas para estes preceitos, requer uma supervisão sistemática e de qualidade, fundamental no processo de construção do seu conhecimento pessoal e profissional, no desenvolvimento das capacidades crítico-reflexivas, éticas, morais e humanas, e na consolidação da identidade profissional, essenciais no processo de aquisição das competências conducentes à prática de cuidados de excelência. Neste sentido, tal como Schön (1983), entendemos que a formação reflexiva deve contemplar situações onde o estudante possa praticar sob a supervisão de um profissional competente que, simultaneamente orientador, conselheiro (coach) e companheiro, lhe faz a integração e ajuda a compreender a realidade, que pelo seu carácter desconhecido, se lhe apresenta, inicialmente, sob a forma de caos (mess), tendo em linha de conta a ecologia das situações. Os benefícios da supervisão no âmbito da SMP revestem-se duma importância crucial, na medida em que fornecem aos estudantes os instrumentos necessários que os ajudam a lidar com as sentimentos e emoções que tendem a refletir atitudes negativas em relação às pessoas com doença mental. Neste sentido, é fundamental que esta supervisão seja feita por profissionais com preparação adequada, sendo primordial o afastamento das práticas tradicionais, onde o processo de acompanhamento dos estudantes não passe por uma questão de “boa vontade”, mas sendo encarada com o profissionalismo e formação que se lhe exige, pois como é referido na literatura, a qualidade do supervisor é determinante para a qualidade da supervisão e das experiências de aprendizagem dos estudantes (Charleston & Happell, 2005; Myall, Levett-Jones & Lathlean, 2008; Ordem dos Enfermeiros, 2010; Silva et al., 2011). Por sua vez, de acordo com Sá-Chaves (2000, p. 103) também nós entendemos que “quem forma e ensina profissionais para a saúde deve refletir construtivamente a complexidade dos saberes científicos, em função dos aprendentes e das situações que, nos contextos reais da praxis profissional se lhe apresentam e deve fazê-lo de forma não standard”. Sendo fundamental o papel da supervisão no sucesso das aprendizagens dos estudantes, outros fatores e condições devem ser tidos em conta no desenvolvimento do ensino clínico, devendo ser consideradas, por um lado, o objetivo da formação, o contexto de aprendizagem, por outro lado, as competências profissionais do supervisor/tutor, que garantam à pessoa cuidados de enfermagem de qualidade e que favoreçam as aprendizagens dos estudantes; neste sentido, é fundamental a articulação contínua entre a escola e os contextos da prática (Silva et al., 2011; Ordem dos Enfermeiros, 2012).

O estudo tem como objetivo conhecer as perspetivas dos estudantes sobre o ensino clínico em contexto de saúde mental e psiquiatria e as competências desenvolvidas no decurso do mesmo. METODOLOGIA Considerando a natureza e objetivos do estudo, este é de cariz exploratório, de natureza quantitativa. A população em estudo compreendeu os estudantes do 4º ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem do Porto [ESEP], em ensino clínico de SMP, sendo a amostra não probabilística intencional, composta por 48 estudantes (92,3% da população em estudo). O instrumento de recolha de dados consistiu num questionário de autorrealização constituído por: dados sociodemográficos e a escala Adaptive Competency Profile – ACP, de Kolb (1984), validada em Portugal por Abreu, em 1995. A escala é constituída por 20 itens utilizando uma escala de concordância de estrutura do tipo Likert (7 opções), que varia desde baixo nível (1) a alto nível (7), referentes ao desenvolvimento de competências adaptativas de ação (5 itens), relação (5 itens), experimentação (5 itens) e conceptualização (5 itens), dando indicação do estilo de aprendizagem preponderante dos estudantes num determinado contexto. A pontuação obtida em cada subescala pode variar entre 5 e 35, considerandose quanto maior o score obtido, maior é o desenvolvimento da competência no contexto estudado, caraterizando o estilo de aprendizagem preponderante destes estudantes. No que releva para os procedimentos envolvidos na realização do estudo, resta salientar que foi pedida autorização ao presidente do conselho técnico científico da ESEP para realização do estudo. Foi explicado aos estudantes o objetivo do estudo, os procedimentos e pedida a sua colaboração no preenchimento do questionário. A participação foi anónima e voluntária. O questionário foi aplicado a todos os estudantes a frequentarem o ensino clínico de SMP. A recolha dos dados foi efetuada no período de 13 de fevereiro a 30 de abril 2013. O procedimento para a análise dos dados obtidos através dos questionários envolveu a estatística descritiva simples, com a respetiva análise de frequências absolutas e medidas de tendência central.

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RESULTADOS Participaram no estudo 48 estudantes (92,3%) de uma população de 52, maioritariamente do sexo feminino (87,5%, n=42), com idades compreendidas entre os 20 e os 39 anos (M=22,9 DP= 3,9). Dos participantes, 12,5% frequentaram outro curso, previamente ao curso de enfermagem. A questão vocacional ainda emerge como a principal motivação para a escolha do curso de enfermagem (42,6%), seguindo-se o interesse na área da saúde (34,44%) e a experiência de ter contatado com enfermagem enquanto recetores de cuidados (22,96%). Estes estudantes destacam como mais-valia da realização dos ensinos clínicos a perceção do mundo real: o confronto com a realidade (38,2%); a experiência adquirida (25,5%); a preparação para o futuro (21,5%); o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos saberes, entre os quais, conciliar teoria e prática (6,4%), treino de competências (4,2%), identificar lacunas (2,1%) e maior investimento no estudo (2,1%). Quando se avaliam os ensinos clínicos, o que é referido pelos estudantes como o mais impactante nas suas vivências é, precisamente, a sua primeira experiência de contato com a realidade, ou seja, o primeiro ensino clínico. Os participantes deste estudo, maioritariamente, iniciaram a sua formação, em contexto da prática, em âmbito hospitalar (60,5%), sendo a cirurgia o contexto de aprendizagem por onde se iniciaram o maior número de participantes (29,1%), seguindo-se os ensinos clínicos de saúde familiar (22,8%), medicina (18,8%), enfermagem comunitária (16,7%) e parentalidade e gravidez (12,6%). QUADRO 1 - Perceção dos estudantes sobre os aspetos positivos do 1º ensino clínico Ganhos no âmbito de competências pessoais (17,6%) Oportunidade

Oportunidade de evoluir (2,2%) Autonomia (4,4%) Compreensão (2,2%) Motivação (2,2%) Confiança (2,2%) Capacidade de adaptação (2,2%) Melhorar destreza técnica (2,2%)

Fatores associados ao local de estágio (18,8%)

Acolhimento (2,2%) Equipa de enfermagem (2,2%) Compreensão dos enfermeiros (2,2%) Integração (12,2%)

Fatores associados ao processo de ensino aprendizagem (28,4%)

Satisfação com a realização de atividades (33,2%)

Tutoria (2,2%)

Entrevistar utentes (4,4%)

Ausência de exigência e pressão (2,2%) Orientação (14,3%)

Sessões educação (2,2%)

Pôr em prática conhecimentos (2,2%) Confronto com opiniões diferentes (2,2%) Trabalhos realizados (2,2%) Contato com procedimentos técnicos (4,1%)

Contato com procedimentos técnicos (4,4%) Treino com o SAPE (2,2%) Contato com utente (9,9%) Espontaneidade da relação (6,7%) Perceção de ganhos com intervenções (2,2%) Sensação de gratidão (2,2%)

Sendo o primeiro ensino clínico referido como o mais impactante, os estudantes destacam como aspetos positivos a satisfação obtida com a realização das atividades de natureza clínica (33,2%), onde a componente relacional adquire primazia (21%); seguindo-se os fatores associados ao processo ensino-aprendizagem (28,4%), com destaque para a orientação (14,3%); nos fatores associados ao local de estágio (18,8%) a integração é tida como um fator a destacar (12,2%). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 100

QUADRO 2 - Perceção dos estudantes sobre os aspetos negativos do 1º ensino clínico

Os aspetos negativos que os estudantes destacam no primeiro ensino clínico são os associados ao processo ensino-aprendizagem (61,6%), onde o regime tutorial é o mais apontado (24%) salientando os estudantes, neste item, as dificuldades no planeamento dos cuidados. Para além do regime tutorial são apontados aspetos inerentes ao planeamento/acompanhamento clínico por parte dos docentes (19,8%), evidenciando-se neste item a referência ao pouco acompanhamento por parte dos mesmos (10,2%). Um aspeto transversal ao processo de ensino-aprendizagem que também é destacado refere-se ao processo de avaliação (9,8%). Outro fator relevante para estes estudantes são as dificuldades associadas aos serviços onde os ensinos clínicos se realizam (24%), com as condicionantes do espaço físico (9,6%) a ser o item mais destacado. As competências pessoais também são percecionadas como fatores negativos (14,4%), destacando-se as dificuldades de interação com os colegas, a falta de iniciativa e o medo de magoar os doentes (4,8%). QUADRO 3 - Análise comparativa das competências desenvolvidas nos primeiros ensinos clínicos e no Ensino Clínico de Saúde Mental e Psiquiatria Primeiros Ensinos Clínicos Competências

Ensino Clínico Saúde Mental e Psiquiatria

Mínimo

Máximo

Média

Competências

Mínimo

Máximo

Média

Relação

12

35

26,25

Conceptualização

9

35

24,48

Relação

16

35

29,26

Conceptualização

11

35

26,05

Experimentação

8

35

26,55

Experimentação

16

35

28,57

Ação

6

35

24,96

Ação

10

35

26,47

Estilo de aprendizagem preponderante Estilo convergente

Estilo de aprendizagem preponderante Estilo divergente

Ao analisarmos as competências desenvolvidas nos primeiros ensinos clínicos, podemos observar que são as competências de experimentação as que mais se desenvolvem nesta fase de aprendizagem dos participantes (26,55), seguindo-se as de relação (26,25), as de ação (24,9) e as de conceptualização (24,48).


Kolb (1984) nos seus estudos conclui que profissões como a engenharia e a medicina desenvolvem estilos convergentes que resultam da ênfase dada às competências de experimentação, fundamentalmente ligadas à maior apetência para a conceptualização abstrata e para a experimentação ativa. Demarca-se por uma maior capacidade de resolução de problemas, tomada de decisão e aplicação prática de ideias. No que concerne ao ensino clínico de SMP, a competência que os estudantes desenvolvem mais, nesta fase da sua aprendizagem, é a competência de relação, com valor médio de (29,26), seguindo-se as competências de experimentação (28,57) e, com um pouco menos de visibilidade, as de ação (26,47) e conceptualização (26,05). Constata-se que os participantes, no decurso do ensino clínico em contexto de SMP, desenvolvem estilos de aprendizagem divergente, que resultam da ênfase dada às competências de relação e que são caraterísticas das profissões humanistas. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O primeiro ensino clínico é considerado marcante para estes estudantes, verificando-se que a satisfação alcançada na realização das suas atividades em contexto da prática constitui o principal aspeto positivo que estes identificam no decurso do mesmo; por sua vez, os fatores associados ao ensino-aprendizagem emergem como o segundo aspeto mais positivo, neste período formativo. No entanto, quando nos reportamos aos aspetos que os estudantes percecionam como negativos, verifica-se que emergem do principal aspeto negativo, fatores relacionados com aquele que acima foi identificado como o segundo aspeto mais positivo, alguns destes inerentes ao planeamento e acompanhamento clínico por parte dos docentes. Neste sentido, entendemos de suma importância continuarmos a desenvolver estudos que nos façam compreender melhor este aspeto de forma a alterar áreas que são percecionadas como menos positivas neste processo. Relativamente às competências, verificamos que estes estudantes desenvolvem mais a competência de experimentação nos primeiros ensinos clínicos, o que pode estar relacionado com a necessidade de colocarem em prática processos assistenciais de natureza técnica mais complexos, movendo-se assim entre a reflexão e a prática, exigindo por parte destes, pensamento crítico. No ensino clínico de SMP verifica-se maior desenvolvimento na competência de natureza relacional, o que pode justificar-se pelo facto desta área da saúde ser, por excelência, do domínio da relação, ou seja, existe uma valorização da vertente afetiva e relacional do cuidar.

A competência menos desenvolvida é a de conceptualização, traduzindo menor investimento na reflexão sobre as práticas, resultado que nos deve indicar maior necessidade de trabalhar estas áreas. CONCLUSÕES O ensino clínico emerge como um período de transição no desenvolvimento de competências tidas como essenciais à profissão. Entre as principais razões que motivam a escolha do curso de enfermagem, os estudantes que integraram este estudo referem as questões vocacionais, o interesse pela área da saúde e a experiência de ter contatado com enfermagem enquanto recetores de cuidados, razões congruentes com as apontadas por Canário (2005). Os contextos da prática constituem‑se como locais privilegiados de contacto com a realidade profissional, permitindo aos estudantes prepararem-se para o futuro através das experiências que vão adquirindo, desenvolvendo e aperfeiçoando saberes, bem como tomando consciência das zonas de não saber que ainda vão estando presentes no seu percurso pré-profissional. O ensino clínico que mais impacto tem no desenvolvimento das vivências destes estudantes é o primeiro, independentemente de ser realizado em contexto hospitalar ou comunitário, destacando-se como fator positivo a satisfação obtida com a realização das atividades relacionais com o utente e, como fator negativo, os aspetos associados ao processo ensino-aprendizagem (regime tutorial, acompanhamento pelos docentes e avaliação), alertando-nos para eventuais décalages num processo que se pretende crítico e reflexivo. Desta forma, entendemos ser crucial o papel do professor que supervisiona o estágio, já que este desenvolve as suas atividades no âmbito da formação e, concomitantemente, no campo da prática pré-profissional dos futuros enfermeiros, gerindo e articulando, diferenças, eventuais conflitos e saberes, aproximando as realidades da escola ao campo clínico. Por sua vez, é também o impulsionador de uma prática reflexiva e o suporte do estudante num continuum de experiências emocionalmente intensas. Este é, sem dúvida, um papel complexo, que exige deste capacidade de adaptação e decisão, frente aos desafios e incertezas com que se confronta nos processos supervisivos.

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Por todas estas razões, entendemos que a qualidade da formação em enfermagem é influenciada por múltiplos fatores, sendo fundamental uma boa articulação com os atores da prática onde se realizam os ensinos clínicos, de forma a minimizar o impacto de fatores menos positivos e a desenvolver nos estudantes habilidades e partilha de competências integradoras de cuidados técnico-científicos avançados, aumentando a satisfação de todos os envolvidos neste processo. Não obstante a relevância do estudo, entendemos que este encerra uma limitação que nos remete para a impossibilidade de generalização dos resultados a outras situações, devendo-se essencialmente ao número limitado de participantes. Consideramos também, que a entrevista deveria ter sido associada ao questionário, potencializando a recolha de dados e uma melhor compreensão dos fatores referenciados como negativos. Deixamos como sugestão a replicação do estudo com as limitações retificadas.

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17 A INTERVENÇÃO PSICOTERAPÊUTICA EM ENFERMAGEM DE SAÚDE

MENTAL: CONCEITOS E DESAFIOS

| Francisco Sampaio1; Carlos Sequeira2; Teresa Lluch-Canut3 |

RESUMO CONTEXTO: Em Portugal, o Regulamento n.º 129/2011 refere que os enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Mental têm a competência para prestar cuidados de âmbito psicoterapêutico. Porém, não existe uma definição operacional do termo “intervenção psicoterapêutica” nem existe qualquer modelo de intervenção psicoterapêutica criado por enfermeiros e/ ou baseado no conhecimento de Enfermagem. Tal facto dificulta a afirmação do enfermeiro especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica (ESMP) como um profissional com conhecimentos e competências para a prestação de cuidados de âmbito psicoterapêutico. OBJETIVOS E METODOLOGIA: De modo a compreender o que pode ser feito, em Portugal, para promover e advogar pela realização efetiva de intervenções psicoterapêuticas, enquanto intervenção autónoma de Enfermagem, por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP, foi elaborado o presente artigo teórico. Assim, procedeu-se a uma revisão da literatura sobre o tema e à análise do mesmo como forma de procurar encontrar uma proposta de solução para o problema identificado. RESULTADOS E CONCLUSÃO: O desenvolvimento e avaliação de um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem parece ser uma possível solução para permitir que os enfermeiros especialistas em ESMP realizem, efetivamente, intervenções psicoterapêuticas enquanto intervenção autónoma de Enfermagem. Na sua base terá que estar presente, necessariamente, conhecimento de Enfermagem (desenvolvido por enfermeiros), como forma de consolidar a vertente autónoma do modelo de intervenção a criar, devendo este dar resposta a diagnósticos de Enfermagem e não a diagnósticos médicos. PALAVRAS-CHAVE: Psicoterapia; Enfermagem; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“La intervención psicoterapéutica en enfermería de salud mental: Conceptos y desafíos”

“The psychotherapeutic intervention in mental health nursing: Concepts and challenges”

CONTEXTO: En Portugal, el Reglamento n.º 129/2011 establece que los enfermeros especialistas en Enfermería de Salud Mental son competentes para prestar cuidados de ámbito psicoterapéutico. Sin embargo, no existe una definición operacional del término “intervención psicoterapéutica” ni hay ningún modelo de intervención psicoterapéutica creado por enfermeros y/o basado en el conocimiento de Enfermería. Este hecho dificulta la afirmación de los enfermeros especialistas en Enfermería de Salud Mental y Psiquiátrica (ESMP) como profesionales con conocimientos y competencias para prestar cuidados de ámbito psicoterapéutico. OBJETIVOS Y MÉTODOS: Con el objetivo de comprender lo que se puede hacer en Portugal para promover y abogar por la realización de intervenciones psicoterapéuticas, mientras intervención autónoma de Enfermería, por parte de los enfermeros especialistas en ESMP, se ha preparado este artículo teórico. Así, se ha procedido a una revisión de la literatura sobre el tema y a la análisis de lo mismo como una forma de intentar encontrar una propuesta de solución para el problema identificado. RESULTADOS Y CONCLUSION: El desarrollo y evaluación de un modelo de intervención psicoterapéutica en Enfermería parece ser una posible solución para permitir que los enfermeros especialistas en ESMP ejecuten, efectivamente, intervenciones psicoterapéuticas mientras intervenciones autónomas de Enfermería. En la base del modelo tendrá que estar presente, necesariamente, conocimiento de Enfermería (desarrollado por enfermeros), como una forma de consolidar el carácter independiente del modelo de intervención, que debe dar respuesta a los diagnósticos de Enfermería y no a los diagnósticos médicos.

BACKGROUND: In Portugal, Regulation No 129/2011 states that nurses specialized in Mental Health Nursing have the competence to provide psychotherapeutic care. However, there is no operational definition of the term “psychotherapeutic intervention” nor any model of psychotherapeutic intervention created by nurses and/or based on nursing knowledge. This fact makes the assertion of nurses specialized in Mental Health and Psychiatric Nursing (MHPN) as a professional with knowledge and skills to provide psychotherapeutic care more difficult. AIM AND METHODS: In order to understand what can be done in Portugal to promote and advocate for the execution of psychotherapeutic interventions, by nurses specialized in MHPN, as an autonomous nursing intervention, we have decided to prepare this theoretical paper. Thus, we have proceeded to a literature review about the subject and its analysis as a way to find a possible solution for the identified problem. RESULTS AND CONCLUSION: The development and evaluation of a psychotherapeutic intervention model in nursing seems to be a possible solution to allow nurses specialized in MHPN to carry out psychotherapeutic interventions as autonomous nursing interventions. The model must be based, necessarily, on nursing knowledge (developed by nurses) as a way to consolidate the autonomous aspect of the intervention model, which must respond to nursing diagnoses and not to medical diagnosis.

DESCRIPTORES: Psicoterapia; Enfermería; Salud mental

KEYWORDS: Psychotherapy; Nursing; Mental health

Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 31-01-2014

1 Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria; Doutorando em Ciências de Enfermagem no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto; Enfermeiro no Hospital de Braga – Serviço de Internamento de Psiquiatria, Sete Fontes – São Victor, 4710-243 Braga, Portugal, Francisco.Sampaio@hospitaldebraga.pt 2 Doutor em Ciências de Enfermagem, Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt 3 PhD em Psicologia; Enfermeira Especialista de Saúde Mental; Professora Catedrática na Universitat de Barcelona, Escola d’Infermeria, Barcelona, Espanha, tlluch@ub.edu Citação: Sampaio, F., Sequeira, C., & Lluch-Canut, T. (2014). A intervenção psicoterapêutica em enfermagem de saúde mental: Conceitos e desafios. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 103-108. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 103


INTRODUÇÃO A intervenção psicoterapêutica pode ser definida, de acordo com aquela que é, para a American Psychological Association, a mais consistente definição do conceito, como “the informed and intentional application of clinical methods and interpersonal stances derived from established psychological principles for the purpose of assisting people to modify their behaviors, cognitions, emotions, and/or other personal characteristics in directions that the participants deem desirable” (Norcross in Zeig & Munion, 1990, p. 218-220). Apesar desta definição parecer apontar, sobretudo, para a Psicologia, dada a referência realizada aos “psychological principles”, existe em Portugal um Regulamento que refere, tacitamente, que o enfermeiro especialista em Enfermagem de Saúde Mental tem a competência de prestar “cuidados de âmbito psicoterapêutico, socioterapêutico, psicossocial e psicoeducacional” (Regulamento n. º 129/2011, p. 8672). É precisamente a partir deste facto que foi sentida a necessidade de elaborar o presente artigo, sendo que este procura oferecer uma análise teórica acerca da realização de intervenções psicoterapêuticas por parte dos enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria (ESMP). Portanto, procurar-se-á apresentar alguns dados relativos a esta temática e compreender os desafios que ainda subsistem, em Portugal, para a realização efetiva de intervenções psicoterapêuticas por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP, visando dar resposta à seguinte questão de partida: o que pode ser feito, em Portugal, para promover e advogar pela realização efetiva de intervenções psicoterapêuticas, enquanto intervenção autónoma de Enfermagem, por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP? Analisando a situação atual, verifica-se que apesar de o Regulamento acima citado, publicado em Diário da República, referir a possibilidade de os enfermeiros prestarem cuidados de âmbito psicoterapêutico, podendo daí depreender-se que têm a competência de realizar intervenções psicoterapêuticas junto das pessoas que apresentem essa necessidade (mediante avaliação prévia), não foi encontrado na literatura consultada qualquer modelo de intervenção psicoterapêutica desenvolvido por enfermeiros e para enfermeiros, embora fosse possível verificar a existência de dois modelos de cuidados criados por enfermeiros (Barker & Buchanan-Barker, 2005; Wheeler, 2011). No entanto, estes parecem tratarse mais de modelos orientadores do “cuidar” em ESMP do que, propriamente, de modelos de operacionalização da realização de intervenções psicoterapêuticas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 104

Na base da elaboração deste artigo foi assumida a concetualização de Enfermagem a partir da conjugação de três diferentes definições: como o “study of caring in the human health experience” (Newman, Sime, & Corcoran-Perry, 1991, p. 3); como “facilitating transitions to enhance a sense of well-being” (Meleis & Trangenstein, 1994, p. 257); e como “a health care discipline and healing profession, both an art and science, which facilitates and empowers human beings in envisioning and fulfilling health and healing in living and dying through the development, refinement and application of nursing knowledge for practice” (Roy, 1984, p. E33), sendo definido “facilitating humanization, meaning, choice, quality of life and healing in living and dying” (Roy, 1984, p. E33) como o foco central unificador da disciplina de Enfermagem. Dentro desta concetualização de Enfermagem, o papel do enfermeiro especialista em ESMP parece estar, de acordo com Peplau (1991), centrado na qualidade da relação interpessoal entre o enfermeiro e o cliente, sendo que essa mesma relação atravessa quatro estádios de desenvolvimento: fase de orientação; fase de identificação; fase de exploração; fase de resolução. A interligação entre os conceitos acima definidos parece essencial para se compreender a pertinência e a importância da realização de intervenções psicoterapêuticas por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP. Assim, e tendo por base a definição concetual apresentada, o capítulo seguinte será dedicado a apresentar uma contextualização teórica para a(s) possível/possíveis resposta(s) a dar à questão de partida apresentada. REVISÃO DA LITERATURA Em Portugal, considera-se que as intervenções autónomas de Enfermagem são “as acções realizadas pelos enfermeiros, sob a sua única e exclusiva iniciativa e responsabilidade, de acordo com as respectivas qualificações profissionais, seja na prestação de cuidados, na gestão, no ensino, na formação ou na assessoria, com os contributos na investigação em enfermagem” (DecretoLei n.º 161/96, p. 2961). Analisando esta frase, presente em Diário da República, pode considerar-se que uma intervenção de Enfermagem apenas se assume verdadeiramente como “autónoma” quando, na sua base, está a realização de investigação em Enfermagem.


No caso das intervenções psicoterapêuticas potencialmente realizáveis por enfermeiros, descritas na Classificação das Intervenções de Enfermagem, como são exemplos a reestruturação cognitiva e a modificação do comportamento (Bulechek, Butcher, & Dochterman, 2010), verificam-se dois aspetos importantes: a) não foi encontrado na literatura qualquer modelo de intervenção que permita operacionalizar, de forma sistematizada, estas intervenções psicoterapêuticas; b) em ambos os casos, os conhecimentos que estão na base da realização deste tipo de intervenções são do âmbito da Psicologia e/ou da Psiquiatria, não tendo sido encontrada na literatura qualquer investigação em Enfermagem que suporte as intervenções psicoterapêuticas supracitadas. Apesar disso, foi possível encontrar alguma investigação em Enfermagem (e.g., Newbold, 1996) em que foram utilizadas as técnicas de reestruturação cognitiva e/ou de modificação do comportamento, porém, sempre numa lógica de avaliação da sua efetividade em casos concretos e utilizando a reestruturação cognitiva e a modificação do comportamento sem evidência concreta da sua metodologia de operacionalização e tendo como base, sobretudo, os princípios gerais da Terapia Cognitiva (Beck & Alford, 2009) e da Terapia Comportamental (Skinner, Solomon, & Lindsley, 1953). Na prática clínica, em Portugal, verifica-se que a realização de intervenções psicoterapêuticas por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP se apresenta algo aquém do que seria expectável e daquelas que são as reais necessidades em cuidados das pessoas, embora esta afirmação careça de evidência científica que possibilite a sua exploração. Ainda assim, parece haver alguma relação entre este aparente défice e o facto de os enfermeiros não se sentirem seguros na realização de intervenções psicoterapêuticas, dada a ausência de modelos que permitam a sua clara operacionalização, à exceção de alguns casos, como as técnicas de relaxamento, cujas metodologias de operacionalização estão claramente definidas (Payne, 2002). A somar a esta realidade, verifica-se que os enfermeiros que procurem incrementar os seus conhecimentos e competências para a realização de intervenções psicoterapêuticas, por exemplo, através da realização de formação em Psicoterapia numa sociedade científica com oferta formativa na área, nem sempre conseguem aceder ao curso que desejariam realizar ou, noutros casos, conseguem aceder aos cursos mas não nas mesmas condições disponibilizadas a profissionais de saúde de áreas afins.

Assim, a título de exemplo, na Sociedade Portuguesa de Psicoterapias Breves (2012), o acesso ao Curso de Psicoterapeutas está apenas disponível, de forma direta, a quem tiver realizado uma Licenciatura de cinco anos ou Mestrado Integrado em Psicologia com área de Curso e estágio na área de Psicologia Clínica (portanto, a psicólogos clínicos), e a licenciados em Medicina com especialidade em Psiquiatria ou Pedopsiquiatria (portanto, a médicos psiquiatras ou pedopsiquiatras). No caso dos enfermeiros especialistas em ESMP que queiram realizar o Curso de Psicoterapeutas, estes necessitam, previamente, de realizar o Curso de Técnicos de Aconselhamento (com uma duração de dois anos) e, posteriormente, ingressar no Curso de Psicoterapeutas (com uma duração de cinco anos), totalizando sete anos de formação na área de estudo. Internacionalmente, as perspetivas apontam para a importância da realização de intervenções psicoterapêuticas por parte dos enfermeiros. Assim, de acordo com um “position document” da Horatio: European Psychiatric Nurses (2012), assinado por Martin Ward, devem ser evitados os monopólios profissionais no que concerne à prestação de cuidados de âmbito psicoterapêutico, sendo que: a) os enfermeiros especialistas em ESMP, devidamente formados, devem ser incorporados nos serviços de Saúde Mental, especialmente naqueles em que existam patologias mentais significativas e complexas que requeiram uma abordagem combinada de âmbito psicoterapêutico e psicofarmacológico; b) os enfermeiros que não realizem Psicoterapias mas que apoiem as pessoas que são alvo das mesmas, devem ser formados de modo a complementar o trabalho do psicoterapeuta. Para dar resposta às dificuldades supracitadas, parece essencial a criação de um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem. Na pesquisa realizada foi possível encontrar dois modelos, “The Tidal Model” (Barker & Buchanan-Barker, 2005) e “The RelationshipBased Model for Psychiatric Nursing Practice” (Wheeler, 2011) que, ainda assim, parecem assumir-se mais como modelos orientadores do “cuidar” em ESMP do que como modelos de operacionalização da intervenção psicoterapêutica em Enfermagem. No primeiro caso, trata-se de uma abordagem filosófica à descoberta da Saúde Mental e de uma abordagem ao recovery não se tratando, contudo, de um sistema rígido, facto que lhe retira alguma facilidade de operacionalização. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 105


Quanto ao segundo modelo referido, este trata-se de uma síntese de investigação e de teoria nas áreas da neurobiologia, ligação, desenvolvimento infantil e trauma tratando-se, portanto de um modelo que, com base nos metaparadigmas da Enfermagem e na assunção da importância da relação terapêutica, assenta numa interpretação psicodinâmica e biopsicológica da patologia mental e norteia as opções psicoterapêuticas que podem ser tomadas para dar resposta à situação da pessoa doente. No entanto, trata-se de um modelo que orienta o “cuidar” mas não a intervenção psicoterapêutica, visto que sugere estratégias de intervenção de acordo com o contexto patológico, mas não operacionaliza essas mesmas estratégias de intervenção. Com base na contextualização teórica (e empírica) apresentada, parece existir a necessidade de desenvolver e avaliar um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem, como forma de permitir a realização efetiva de intervenções psicoterapêuticas, enquanto intervenção autónoma de Enfermagem, por parte dos enfermeiros especialistas em ESMP. Assim, o capítulo seguinte destinar-se-á a aprofundar esta possível solução para dar resposta à questão de partida inicialmente formulada. ANÁLISE Tendo em linha de conta os factos apresentados no capítulo anterior, o desenvolvimento e avaliação de um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem parece ser uma possível solução para permitir que os enfermeiros especialistas em ESMP realizem, efetivamente, intervenções psicoterapêuticas enquanto intervenção autónoma de Enfermagem. Na base deste modelo de intervenção terá, necessariamente, que estar presente conhecimento de Enfermagem (desenvolvido por enfermeiros), como forma de consolidar a vertente autónoma do modelo de intervenção a criar. Assim, considera-se que como pilar do modelo deverá estar a relação de ajuda profissional em Enfermagem, matéria amplamente trabalhada por teóricos da disciplina (Chalifour, 2008; Lazure, 1994; Phaneuf, 2005). Porém, e seguindo a perspetiva de Chalifour (2008), a relação de ajuda profissional deve ser considerada como uma atitude subjacente à realização de qualquer intervenção de âmbito psicoterapêutico, e não como uma estratégia terapêutica per si.

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Considerando que, ao longo do tempo, tem havido uma tendência para a convergência das abordagens psicoterapêuticas (e.g., atualmente a Terapia Cognitiva e a Terapia Comportamental têm vindo a ser “substituídas” por uma abordagem mais inclusiva – a Terapia Cognitivo-Comportamental), o modelo de intervenção psicoterapêutica a desenvolver deverá ser tão inclusivo quanto possível, tanto ao nível da intervenção como ao nível dos contextos, sendo crucial a sua aplicabilidade nos contextos tradicionais da prática clínica. Ao nível do potencial terapêutico, não se espera que o modelo permita dar resposta direta a diagnósticos médicos, mas sim a diagnósticos de Enfermagem a definir (elaborados de acordo com a linguagem classificada da Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem®), embora seja possível que, consequentemente, haja também ganhos ao nível dos diagnósticos médicos. Desta forma, poderá tornar-se possível obter indicadores de resultado em Enfermagem mais positivos, em particular ao nível das “Modificações positivas no estado dos diagnósticos de enfermagem (reais)” (Ordem dos Enfermeiros, 2007), sendo este facto de extrema importância considerando o momento atual, em que o Ministério da Saúde do Governo de Portugal tem vindo a considerar os indicadores em Saúde como uma prioridade estratégica para o futuro do Serviço Nacional de Saúde. Os principais objetivos do desenvolvimento de um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem são, portanto, os seguintes: estabelecer a operacionalização de uma metodologia de intervenção comum, assente na relação de ajuda profissional; uniformizar a linguagem a utilizar nas diferentes intervenções psicoterapêuticas; clarificar a especificidade da intervenção psicoterapêutica em Enfermagem; estimular o desenvolvimento de modelos de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem; contribuir para a melhoria das respostas de âmbito psicoterapêutico em Saúde. Assim, o modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem a desenvolver deverá obedecer aos seguintes critérios: a) ser suficientemente abrangente para ser aplicado em diferentes settings; b) ser consistente com os modelos já existentes, mas não dependente de nenhum modelo em específico; c) ser sensível às diferentes necessidades das pessoas, ou seja, dar resposta a um número considerável de diagnósticos de Enfermagem; d) ter como matriz a relação de ajuda profissional, e por “veículo” de ação a relação terapêutica.


Finalmente, importa clarificar que o modelo de intervenção psicoterapêutica a desenvolver deve comportar dois níveis. O primeiro nível deverá consistir numa árvore de decisão que permita aos enfermeiros especialistas em ESMP decidir, de acordo com as necessidades apresentadas pelo cliente, sobre qual a melhor abordagem psicoterapêutica a adotar, devendo haver duas opções de intervenção possíveis: a) baseada na Psicoterapia Psicodinâmica, caso o problema da pessoa esteja nos processos mentais inconscientes; b) baseada na Terapia Cognitivo-Comportamental, caso o problema da pessoa resida na disfuncionalidade dos seus pensamentos, emoções e/ou comportamentos. O segundo nível deverá consistir numa forma clara de operacionalização destas duas tipologias de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem. CONCLUSÃO Em Portugal, urge criar condições para que os enfermeiros especialistas em ESMP possam realizar, efetivamente, intervenções psicoterapêuticas, assumindo-se estas como intervenções autónomas de Enfermagem, com um corpo de conhecimento próprio (ainda que apoiado noutras disciplinas científicas), e com uma metodologia de operacionalização bem sistematizada. Nesse sentido, uma possível solução parece residir no desenvolvimento de um modelo de intervenção psicoterapêutica em Enfermagem que tenha na sua base estrutural a relação de ajuda profissional em Enfermagem, atitude consistentemente trabalhada por alguns teóricos de Enfermagem. Apesar de a solução proposta estar fundamentada em factos e evidências que a suportam, importa ressalvar que não foram encontradas na literatura experiências similares realizadas, quer nacional quer internacionalmente, pelo que existe alguma imprevisibilidade nos resultados que poderão ser obtidos. Portanto, após o desenvolvimento do modelo, torna-se essencial avaliá-lo de forma rigorosa, tanto ao nível dos resultados como dos processos (de modo a ser possível clarificar os mecanismos causais e identificar os fatores contextuais associados com as variações nos resultados). A proposta apresentada assenta naquele que é assumido como o foco da ação do enfermeiro especialista em ESMP: a qualidade da relação interpessoal estabelecida entre o enfermeiro e o cliente (Peplau, 1991). Para além disso, caso o modelo de intervenção psicoterapêutico a desenvolver apresente resultados positivos, pode afirmar-se que este auxiliará significativamente o enfermeiro especialista em ESMP a cumprir uma das principais missões da Enfermagem: “facilitating transitions to enhance a sense of well-being” (Meleis & Trangenstein, 1994, p. 257).

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 108

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18 A SAÚDE MENTAL NA PARENTALIDADE DE FILHOS GÉMEOS –

REVISÃO DA LITERATURA*

| Luísa Andrade2; Maria Martins3; Margareth Angelo4; Júlia Martinho5 |

RESUMO A saúde mental é condicionada por múltiplos fatores: pessoais, familiares e sociais. Sabendo nós que o exercício do papel parental é dos mais exigentes, acreditamos que este pode condicionar a qualidade de vida. Quando este papel é exercido com filhos gémeos há reconhecidamente maior exigência podendo por si só comprometer a saúde mental de quem o exerce. OBJETIVOS: Conhecer os riscos para saúde mental dos pais na gemelaridade. Identificar os fatores psicossociais que influenciam a experiência parental na gemelaridade. METODOLOGIA: Revisão sistemática de estudos primários publicados entre 2000-2012 em bases de dados referenciais: ISI Web of Science e Scopus database. RESULTADOS: Foram identificados 483 artigos (Scopus-274 artigos, Web of Science-275 sendo 66 destes comuns às duas bases de dados referenciais). Procedeu-se à leitura dos resumos após o qual selecionamos 15 artigos tendo em consideração os critérios de inclusão (disponibilidade dos artigos nas bases consultadas; a temática da vivência da parentalidade na gemelaridade ser central aos estudos). Os estudos em análise procuram identificar variáveis que influenciam a qualidade de vida nos pais focando-se em particular na saúde mental, no bem-estar psicossocial e no stresse parental. Níveis de stresse, ansiedade no apego materno, adaptação conjugal, paridade e tempo de gestação foram preditores da saúde mental nas mães. CONCLUSÕES: A experiência da parentalidade de gémeos é mais exigente e complexa. A compreensão desta problemática torna-se fundamental porque permite estabelecer intervenções facilitadoras ao seu desempenho e que por isso são promotoras de uma melhor saúde mental. PALAVRAS-CHAVE: Pais; Gémeos; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“La salud mental en paternidad de hijos gemelos - revisión de la literatura”

“Mental health in parenting of twins - literature review”

La salud mental está condicionada por múltiples factores: personales, familiares y sociales. Sabiendo que el ejercicio de paternidad es exigente, creemos que este puede afectar la calidad de vida. Cuando esta función se ejerce con gemelos ciertamente que esta exigencia puede poner en peligro la salud mental de quien lo ejerce. OBJETIVOS: Conocer los riesgos para la salud mental de los padres en el embarazo gemelar. Identificar factores psicosociales que influyen en la experiencia de los padres con gemelos. METODOLOGÍA: revisión sistemática de estudios primarios publicados entre 2000-2012 en las bases de datos: ISI Web of Science y Scopus. RESULTADOS: se identificaron 483 artículos (274 artículos, Scopus, 275 Web of Science - 66 comunes a ambas bases de datos). Se procedió a la lectura de los resúmenes, se seleccionaron 15 artículos atendiendo a los criterios de inclusión (la centralidad de los estudios, disponibilidad de artículos en las bases de datos consultadas). Los estudios revisados apuntan las variables que influyen en la calidad de vida de los padres, centradas sobre todo en la salud mental. La maternidad es el foco central de la investigación. Los niveles de estrés, la ansiedad en el apego materno, el ajuste marital, la paridad y la edad gestacional fueron predictores de la salud mental en las madres. CONCLUSIONES: La experiencia de tener hijos gemelos es diferente, en general, más exigente y compleja. La comprensión de este tema establece intervenciones facilitadoras y promotoras de una mejor salud mental.

Mental health is constrained by multiple factors: personal, family and social. Knowing that we exercise the parental role is the most demanding, we believe this may affect the quality of life. When this role is exercised with twins there is admittedly higher requirement may itself compromise the mental health of those who exercise it. OBJECTIVES: Knowing the risks to mental health of parents in twin pregnancy. Identifying psychosocial factors that influence parental experience in twinning. METHODOLOGY: A systematic review of primary studies published between 2000-2012 in reference databases: ISI Web of Science and Scopus database. RESULTS: 483 articles (Scopus: 274 and Web of science: 275, with 66 common to both of these reference databases) were identified. We proceeded to read the summaries after which we selected 15 articles, taking into account the inclusion criteria (availability of articles in the databases consulted, centrality of the studies in the experience of parenthood in twin pregnancy). The reviewed studies aim to identify variables that influence the quality of life in parents, focusing in particular on mental health, psychosocial well-being and parental stress. Motherhood is the central focus of research. The best mental health in mothers, one year after the birth of the twins, was associated with lower levels of stress, anxiety in maternal attachment, marital adjustment, being a first time mom and full-term twins. CONCLUSIONS: The experience of parenting twins is more demanding and complex. Understanding this issue becomes critical as it establishes facilitative interventions to their performance and therefore are promoting better mental health.

DESCRIPTORES: Padres; Gemelos; Salud mental

KEYWORDS: Parents; Twins; Mental health

1 Artigo inserido no projeto “Luzes e sombras em famílias de gémeos”, do Doutoramento em Ciências de Enfermagem – Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar-UP 2 Doutoranda em Ciências de Enfermagem no ICBAS – UP; Prof. Adj. na ESEP – Unidade Científico-Pedagógica “Enfermagem, Disciplina e Profissão”, luisaandrade@esenf.pt 3 Doutora em Ciências de Enfermagem pelo ICBAS – Universidade do Porto; Investigadora no grupo “NurID: Inovation & Development in Nursing” – CINTESIS-FMUP; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto – Unidade Científico-Pedagógica “Enfermagem, Disciplina e Profissão”, mmartins@esenf.pt 4 PhD em Psicologia Escolar; Professora Titular da Universidade de S. Paulo – Departamento de Enfermagem Materno-Infantil, São Paulo, SP, Brasil, angelm@usp.br 5 PhD em Ciências de Enfermagem; Investigadora do grupo “NurID”; Prof. Adj. na ESEP–Unidade Científico-Pedagógica “Enfermagem, Disciplina e Profissão”, julia@esenf.pt Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 02-03-2014 Citação: Andrade, L., Martins, M. M., Angelo, M., & Martinho, J. (2014). A saúde mental na parentalidade de filhos gémeos – revisão da literatura. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 109-116. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 109


INTRODUÇÃO A família é uma unidade basilar na organização da sociedade e tem duas funções fundamentais uma é a criação de um sentimento de pertença e a outra é possibilitar que os seus elementos se desenvolvam e construam a sua individualidade (Relvas e Lourenço, 2006) Neste processo complexo e único, são vividas transições que acomodam processos vitais, contínuos e descontínuos, do ser humano. A transição para a parentalidade tem sido um dos grandes desafios colocados à família e às pessoas que a constituem. Alguns dos estudos centrados na vivência da transição, para e na parentalidade sugerem que esta é vivida de modo diferente pelo homem e pela mulher, tem implicações na conjugalidade e revela-se mais difícil do que o esperado, mostrando-se como um elemento fundamental na saúde da família (Allborg & Strandmark, 2001) apontando para a importância do casal ter conhecimento sobre as mudanças que podem ocorrer na transição para a parentalidade. A complexidade desta transição pode rodear-se ainda de circunstâncias que a tornam mais diversa e exigente, tais como a parentalidade na gemelaridade. Neste sentido centramos a nossa atenção na questão “Que repercussões tem na saúde mental dos pais o nascimento de gémeos?” Procurando dar resposta a esta nossa inquietação desenvolvemos uma pesquisa com o intuito de conhecer os riscos para saúde mental dos pais na gemelaridade e analisar os fatores psicossociais que influenciam a experiência parental na gemelaridade. METODOLOGIA Para a concretização dos nossos objetivos, procedemos a uma revisão sistemática com considerando a formulação da pergunta; localização e seleção dos estudos; avaliação crítica dos estudos considerando os participantes nesse estudo, o problema de saúde em análise e resultados. Para identificar os estudos relevantes utilizamos as bases de dados referenciais: ISI Web of Science - Science Citation Index Expanded (SCI-EXPANDED); Social Sciences Citation Index (SSCI); Arts & Humanities Citation Index (A&HCI); Conference Proceedings Citation Index - Science (CPCI-S); Conference Proceedings Citation Index- Social Science & Humanities (CPCI-SSH); Scopus database – Subject Areas: Life Sciences; Health Sciences (100% cobertura Medline); Physical Sciences; Social Sciences and Humanities. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 110

Como descritores da pesquisa, definimos os seguintes tópicos: parenting, twins, multiple birth, stress, mental health e depression. Considerando as características específicas das bases de dados selecionadas na base de dados SCOPUS, utilizamos os termos “parenting” AND “twins” OR “multiple birth” AND “stress” OR “mental health” OR “depression” no KEYWORD+TITLE+ABSTRACT; na base de dados WEB OF SCIENCE consideramos como tópicos de pesquisa “parenting” AND “twins” OR “multiple birth” AND “stress” OR “mental health” OR “depression” em artigos, considerando a categoria geral - Ciências Sociais. Como critérios de inclusão neste estudo consideramos: a) Estudos primários publicados entre 2000 e 2012; b) Que os artigos estivessem disponíveis nas bases de dados consultadas; c) Que os participantes fossem famílias com filhos gémeos ou trigémeos biológicos (não adotados); d) Que a centralidade dos estudos se situe na vivência da parentalidade pela família em situação de gemelaridade. Consideramos, ainda, essencial que os estudos tenham confiabilidade e relevância, pelo que a sua avaliação crítica foi suportada no MAStARI critical appraisal tools (The Joanna Briggs Institute, 2011). RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram identificados 483 artigos (Scopus - 274 artigos, Web of Science-275 sendo 66 destes comuns às duas bases de dados referenciais), tendo-se procedido à leitura dos respetivos resumos. Na etapa do processo de identificação dos estudos, excluímos 16 artigos, porque não cumpriam o 1º critério de inclusão, isto é, serem estudos primários; 51 artigos porque não cumpriam o 3º critério de inclusão, ou seja, os participantes não são famílias com filhos gémeos e, por último, 393 artigos não centram a problemática do estudo na vivência da parentalidade na gemelaridade, focando os estudos nas práticas parentais, na experiência e vivência de ser irmão gémeo e na influência da genética e do meio nas pessoas, utilizando como população irmãos gémeos. Selecionamos assim 23 artigos, sendo que eliminamos oito deles porque não tivemos acesso ao texto integral (2º critério de exclusão) redundando em 15 artigos. No que se reporta à qualidade metodológica e face aos resultados obtidos (moderado e alto) ponderamos pela inclusão da totalidade dos artigos. A apresentação é feita por ordem cronológica da sua publicação (Quadro 1).


QUADRO 1 - Sumário dos estudos selecionados

Nº do estudo/ Objetivo/Participantes/Desenho/Resultados Autor/Ano/ País E1- Colpin, Munter, Nys, Vandemeulebroecke (2000) Bélgica.

Objetivo: Estudar as determinantes pré e pós-natal, do stresse parental nas mães de gémeos. Participantes: Mulheres grávidas de gémeos com 27 semanas de gestação (N=40). Desenho: Coorte prospetivo. Momento de recolha de dados: 27 semanas de gestação e 1 ano após o nascimento. Resultados: O bem-estar pessoal e o suporte do cônjuge no período pré-natal foram preditores do stresse parental nas mães de gémeos um ano após o nascimento.

E2- Ellison e Hall (2003) EUA.

Objetivo: Identificar os domínios da qualidade de vida das mães onde tem maior impacto o nascimento de gémeos. Participantes: Mulheres com: a) um filho por conceção, com idade entre os 4 e 5 ou 9 e 10 anos (N=10), b) gémeos com baixo risco à nascença, com idades entre 4 e 5 anos ou 9 e 10 anos (N=12), c) gémeos com alto risco à nascença com idades entre o 1 e os 5 anos (N=11), concebidos espontaneamente ou por reprodução medicamente assistida (RMA). d) um filho (N=4) ou gémeos (N=6) concebidos com RMA e com idades entre os 8 meses e os 11 anos. Desenho: Grupo focal. Instrumentos de recolha de dados: Os tópicos de discussão foram baseados na literatura: stresse familiar, necessidades familiares, programas sociais, suporte social, saúde das crianças, satisfação conjugal e impacto no sentido de self da mulher. A “Grounded Theory” suportou a análise dos dados. Resultados: Os domínios da qualidade de vida da mulher que sofreram maior impacto com o nascimento foram: o estigma social, as perdas na gravidez, a satisfação conjugal, a saúde das crianças, as necessidades familiares, o stresse parental, a depressão materna e a experiência do tratamento para a infertilidade, principalmente no período neonatal. Com exceção da experiência do tratamento de infertilidade que foi igualmente importante para todas as mulheres que a ele se submeteram, todos os outros domínios da qualidade de vida foram mais marcantes para as mães de gémeos.

E3. Glazebrook, Sheard, Cox, Oates, Ndukwe (2004) Reino Unido.

Objetivo: Analisar o stresse parental e o bem-estar psicossocial de mulheres que foram mães pela primeira vez e que conceberam múltiplos por FIV. Participantes: Mulheres primigestas com 18 semanas de gestação, constituindo-se por dois grupos: a) com gravidez simples (N=95), com recurso a FIV, b) com gravidez gemelar (N=36), com recurso a FIV, c) com gravidez simples conceção natural (N=129). Desenho: Coorte prospetivo. Momento de recolha de dados: 18 semanas de gestação, 6 semanas e 12 meses após o parto. Resultados: Os partos por cesariana foram mais frequentes nos gémeos. As crianças que nasceram de gravidez gemelar tiveram menor peso à nascença, foram mais prematuras, tiveram mais complicações médicas foram mais frequentemente admitidas em unidades neonatais e permaneceram em média mais dias no hospital. As mulheres com filhos gémeos apresentaram valores mais elevados de stresse parental total e especificamente no que se reporta às dificuldades da criança e à interação disfuncional entre os pais e a criança comparativamente com os restantes grupos, contudo os valores totais que avaliam o stresse parental foram considerados anormalmente elevados nos três grupos. Não foram identificadas diferenças significativas entre grupos no que se refere aos problemas de saúde e às dificuldades associadas às exigências da parentalidade. As mulheres mães de gémeos estavam menos satisfeitas com o seu trabalho fora de casa e trabalhavam em média menos horas que os restantes grupos.

E4. Ellison, Hotamisligil, Lee, RichEdwards, Pang, Hall (2005) EUA.

Objetivo: Determinar se o aumento de riscos psicossociais nas famílias que conceberam com RMA está associado ao aumento do número de filhos por gravidez. Participantes: Mulheres que conceberam após RMA: a) um filho (N=128), b) filhos gémeos (N=111), c) filhos trigémeos (N=10). Desenho: Transversal. Momento de recolha de dados: 12 e os 48 meses após o nascimento. Resultados: O nascimento de múltiplos aumentou os riscos psicossociais, sendo maior nos trigémeos relativamente aos gémeos. Estes riscos associam-se à dificuldade no fornecimento de material básico, necessidade da família, diminuição da qualidade de vida, aumento do risco de estigma social e depressão materna.

E5. Olivennes, Golombok, Ramogida, Rust e equipe de Follow-Up (2005) Reino Unido.

Objetivo: Estabelecer a natureza e extensão das dificuldades dos pais e o desenvolvimento comportamental e cognitivo das crianças de famílias com gémeos que conceberam com recurso a RMA. Participantes: Mãe e um filho de famílias com filhos concebidos com recurso a RMA: a) um filho (N= 344), b) filhos gémeos (N=344). Desenho: Transversal. Momento de recolha de dados: crianças com idade entre 2 e 5 anos. Resultados: As mães de gémeos eram mais velhas e estes tinham menos irmãos. A percentagem de mulheres mães de gémeos com trabalho remunerado era percentualmente menor quando comparadas com as outras mães. As mães de gémeos apresentaram níveis mais elevados de stresse parental e depressão. Não se observaram diferenças na satisfação conjugal e no interesse sexual contudo as mães de gémeos referiram uma menor frequência no que se reporta à atividade sexual. Nas crianças não foram identificadas diferenças significativas ao nível emocional ou comportamental, em termos cognitivos os gémeos obtiveram valores mais baixos ao nível da linguagem, motor fino adaptativo e interação social. A experiência materna nas mães de gémeos reportou mais dificuldades na parentalidade e menos prazer na relação com os filhos. As mães de gémeos referiram menos vontade de ter mais filhos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 111


E6. Findler, Taubman-BenAri, Jacob (2007) Israel.

Objetivo: Analisar as contribuições do temperamento do bebé, apego materno e suporte proporcionado pela avó materna para a saúde mental e adaptação conjugal das mulheres um ano após o nascimento de gémeos. Participantes: Mulheres mães de gémeos: a) de termo (N=78), b) prematuros (N=70). Desenho: Coorte prospetivo. Momento de recolha de dados: 3 semanas e um ano após a alta hospitalar. Resultados: A melhor saúde mental nas mães, um ano após o nascimento dos gémeos, esteve associada a baixos níveis de stresse, ansiedade no apego materno e adaptação conjugal. O apego materno foi o fator que mais contribuiu para a adaptação conjugal e saúde mental da mulher. A associação inversa entre os níveis de stresse e os níveis de saúde mental foi mais significativa em mães de gémeos de termo. As mulheres que foram mães pela primeira vez e de gémeos de termo apresentaram uma melhor saúde mental do que as que já tinham filhos ou que tiveram gémeos prematuros. Elevados níveis de suporte da avó materna foram promotores da capacitação da mãe para lidar com as dificuldades associadas ao temperamento da criança minimizando a associação negativa entre o temperamento das crianças e a saúde mental materna. Nas mães de gémeos prematuros o suporte da avó materna foi um contributo ainda mais significativo para a sua saúde mental. Nas mães de gémeos de termo o stresse materno e a ansiedade no apego tiveram associação inversa relativamente à adaptação conjugal, um ano após o nascimento de gémeos. Não se observaram diferenças significativas na adaptação conjugal nas mulheres dos dois grupos.

E7. Golombok, Olivennes, Ramogida, Rust, Freeman e equipe de Folowup. (2007) Reino Unido/França

Objetivo: Conhecer a natureza e extensão das dificuldades da parentalidade e do desenvolvimento psicológico de trigémeos que nasceram após FIV/injeção intracitoplasmática de espermatozoides (ICSI) centrando-se no bem-estar psicológico e sócio emocional dos pais e no desenvolvimento das crianças. Participantes: Família com filhos concebidos com recurso FIV/ICSI: a) um filho por conceção (N=30), b) filhos gémeos (N=15), c) filhos trigémeos (N=10). Participaram mães e filhos. Desenho: Transversal. Momento de recolha de dados: filhos com idades compreendidas entre os 2 e os 3 anos. Resultados: As mulheres que tiveram mais do que um filho por gravidez apresentaram níveis mais elevados de stresse parental. As mães de trigémeos revelaram significativamente menos interesse sexual quando comparadas com as mães de gémeos e ambas referiram uma menor frequência nas relações sexuais. Os gémeos e trigémeos obtiveram valores mais baixos ao nível da linguagem quando comparados com o outro grupo.

E8. Sheard, Cox, Oates, Ndukwe Glazebrook (2007) Reino Unido.

Objetivo: Explorar o impacto do nascimento de múltiplos com recurso a FIV na saúde mental materna. Participantes: Mulheres que foram mães pela primeira vez e que conceberam por FIV. Constituíram-se por grupos: a) um filho por conceção (N=119), b) gémeos (N=49), c) trigémeos (N=7). Desenho: Transversal. Momento de recolha de dados: 6 semanas após o parto. Resultados: As mães de múltiplos eram mais jovens. Os partos por cesariana foram mais frequentes nos nascimentos múltiplos. As crianças que nasceram de gravidez múltipla tiveram menor peso à nascença, foram mais prematuros, tiveram mais complicações médicas à nascença, foram admitidos mais em unidades neonatais e permaneceram em média mais dias no hospital. Observou-se uma forte correlação entre o temperamento das crianças e os valores obtidos na escala que avalia a depressão. As mães de múltiplos apresentaram pontuações mais elevadas no que se reporta à escala que avalia a depressão pós-parto. As mães de múltiplos falaram mais frequentemente de temas menos positivos tais como: o modo como se sentiam cansadas, os sentimentos de stresse e depressão e questionamento da parentalidade e as mães que conceberam um único filho falavam mais do modo como se sentiam bem refletindo o seu prazer com a parentalidade. Os dados sugerem ainda que as mães de múltiplos tiveram uma experiência e bemestar emocional mais pobre e negativo.

E9. Damato, Objetivo: Determinar a relação entre os fatores: stresse parental, suporte social e sentido de competência com o Anthony, Maloni estado de humor de mães de gémeos. (2009) EUA. Participantes: Mães de gémeos (N=162). Desenho: Transversal. Momento de recolha de dados: nos 2 primeiros anos após o nascimento. Resultados: O sentido de competência parental e o “distresse” (angústia) parental estão relacionados com o humor materno para mães de gémeos. As mulheres com baixa pontuação na escala que avalia a competência parental revelaram maior humor negativo e as mulheres que reportaram menor “distresse” parental e pontuações mais elevadas nas escalas, que avaliaram a competência parental ao nível da eficácia, apresentaram maior humor positivo. O apoio social não contribuiu para a variação no humor materno. E10. Choi, Bishai, Minkovitz (2009) EUA.

Objetivo: Avaliar a relação entre o nascimento de múltiplos e os sintomas de depressão na mãe. Participantes: Mulheres mães de: a) um filho por conceção (N=7293), b) mais do que um filho por gravidez (N=776). Desenho: Transversal integrado num estudo longitudinal. Momento de recolha de dados: 9 meses após o nascimento. Resultados: As mães de múltiplos foram mais propensas a apresentar sintomas depressivos moderados ou graves. O stresse parental foi sugerido como uma das principais causas de depressão nestas mulheres.

E11. Vilska, Unkila-Kallio, Punamäki, Poikkeus, Repokari, Sinkkonen, Tiitinen, Tulppala (2009) Finlândia.

Objetivo: Avaliar a saúde mental dos pais e mães de gémeos. Participantes: Casais que conceberam: a) um filho por RMA (N=270), b) gémeos por RMA (N=55), c) um filho naturalmente (N=251), d) gémeos naturalmente (N=11). Desenho: Coorte prospetivo. Momentos de recolha de dados: 2º trimestre de gravidez, 2 meses após o nascimento e 1 ano após o nascimento. Resultados: Os casais que conceberam por RMA tinham um relacionamento mais longo. As mulheres que conceberam por RMA tiveram menos sintomas de depressão durante a gravidez. As mulheres que conceberam gémeos por

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RMA tiveram significativamente menos sintomas de depressão de que as mulheres que conceberam gémeos naturalmente mas os valores são comparáveis com as mulheres que só tiveram um filho por conceção. As mães de gémeos, 2 meses após o nascimento, tiveram significativamente níveis mais elevados de sintomas de ansiedade e depressão. As mães de gémeos, um ano após o nascimento continuaram a reportar mais sintomas de depressão. As mães de gémeos concebidos por RMA tiveram menos sintomas de ansiedade que as mães de gémeos que conceberam naturalmente. Relativamente aos pais, no 2º mês após o nascimento apresentaram mais sintomas de depressão. A disfunção social foi maior nos pais de gémeos. Um ano após o nascimento, os pais de gémeos continuaram a apresentar mais sintomas de depressão e apresentaram mais ansiedade que os que só tiveram um filho por nascimento. Dificuldade em dormir foi mais comum em pais de gémeos. E12. Baor & Soskolne (2010) Israel.

Objetivo: Avaliar o stresse materno experienciado em primíparas de gémeos considerando: as expectativas pré-natais maternas, os recursos de enfrentamento (pessoais: sentido de coerência e auto-eficácia e sociais: perceção do apoio social e da qualidade conjugal). Participantes: Mulheres mães de gémeos: a) que conceberam naturalmente (N=98), b) que conceberam com recurso a FIV (N=88). Desenho: Coorte prospetivo. Momento de recolha de dados: entre a 33 e 36 semana de gestação e 6 meses após o nascimento. Resultados: O grupo de mulheres mães de gémeos concebidos com recurso a FIV eram mais velhas, estavam casadas há mais tempo e seis meses após o nascimento trabalhavam percentualmente menos. A taxa de cesarianas foi significativamente maior neste grupo e a idade gestacional foi significativamente menor, os bebés nasceram proporcionalmente com menos peso, tiveram mais complicações neonatais e necessidade de tratamento. As mulheres que conceberam com recurso a FIV tinham expetativas pré-natais significativamente mais positivas, recursos de enfrentamento mais pobres e níveis significativamente mais elevados de stresse 6 meses após o nascimento. As expetativas maternas não tiveram um poder preditivo do stresse materno e os recursos de enfrentamento estiveram significativa e positivamente relacionados com o stresse 6 meses após o parto.

E13. TaubmanBem-Ari, Findler, Kuint (2010) Israel.

Objetivo: Examinar os fatores que contribuem para o crescimento pessoal das mães após o nascimento de gémeos prematuros considerando este como um evento stressante. Participantes: Mulheres mães de: a) um filho de termo por conceção (N=75), b) gémeos de termo (N=72), 3- gémeos prematuros (N=64). Desenho: Coorte prospetivo. Momento de recolha de dados: nas primeiras semana após o parto e 1 ano após o parto. Resultados: As mulheres mães de gémeos prematuros foram sujeitas a maior stresse, tiveram níveis mais baixos de saúde mental, percebiam o temperamento dos filhos como mais difícil, mostravam sentimentos mais negativos acerca dos seus filhos e recebiam mais apoio das suas mães quando comparadas com os outros dois grupos de mulheres. Por outro lado, experimentaram um maior crescimento pessoal quando comparadas com as mulheres com filhos de termo. O crescimento pessoal, um ano após o nascimento dos filhos em mães de gémeos prematuros, esteve positiva e significativamente associado a uma melhor adaptação conjugal logo após o nascimento destes, para os outros dois grupos o crescimento pessoal das mulheres esteve associado à variável suporte da avó materna percebido.

E14. Baor & Soskolne (2012) Israel.

Objetivo: Avaliar a prevalência de níveis significativos de stresse materno 6 meses após o nascimento de gémeos considerando os recursos sociais de enfrentamento. Participantes: Mães de gémeos concebidos por FIV (N=88). Desenho: Coorte prospetivo. Momentos de recolha de dados: 3º trimestre de gravidez, 6 meses após o nascimento. Resultados: Níveis clínicos de stresse materno foram identificados em 41% da amostra. O suporte social e a atividade profissional foram as variáveis com mais significado na experiência do stresse materno.

E15. Lutz, Burnson, Hane, Samuelson, Maleck, Poehlmann (2012) EUA.

Objetivo: Avaliar a influência do suporte familiar no stresse materno. Participantes: Mães com filhos prematuros: a) um filho por conceção (N=123), b) gémeos (N=27). Desenho: Coorte prospetivo. Momentos de recolha de dados: 3º trimestre de gravidez, 24 meses após o nascimento. Resultados: Maior stresse materno está relacionado com menor brincadeira com a criança. Apenas o suporte funcional funcionou como fator protetor. As mães de gémeos referem maior stresse.

Nota: Os estudos selecionados e apresentados foram identificados com o número correspondente precedido de “E” de estudo.

Partindo dos resultados acima mencionados propomo-nos fazer uma síntese e análise dos dados que, em nosso entender, mais contribuíram para a compreensão da problemática assim como a natureza dos estudos que a sustentaram. Deste modo, procuramos avaliar até que ponto as variáveis dos estudos constituem fatores de proteção e/ou de risco da parentalidade, com vista à conceptualização de medidas dirigidas à implementação do bem-estar dos pais. O bem – estar subjetivo resulta de um sentimento positivo de felicidade face à avaliação pessoal da qualidade de vida (medindo a perceção individual das suas experiências, atendendo às suas características e traços pessoais. Trata-se, pois, de um conceito amplo que usa como critérios a perceção pessoal de sentimentos agradáveis e de um baixo nível de emoções negativas, que conduzem a um balanço positivo de satisfação com a vida (Diener, 2002, cit. in Borges, 2010). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 113


Segundo Borges (2010), o conceito de bem-estar procura transpor a qualidade da relação do indivíduo com o contexto relacional, sendo um indicador do funcionamento psicológico. A multidimensionalidade do conceito tem sido objeto de estudo, salientando-se duas dimensões: a afetiva e a cognitiva. A dimensão afetiva envolve a perspetiva positiva e negativa experienciada, sendo a primeira associada a emoções agradáveis (alegria, êxtase, entusiasmo, otimismo, felicidade) e a segunda a emoções negativas (vergonha, culpa, tristeza, pessimismo) enquanto a dimensão cognitiva alude aos processos de avaliação das experiências de vida (Simões, et al., 2000, cit. in Borges, 2010). Se os contextos forem favoráveis ao exercício da parentalidade, a função parental poderá incrementar o sentido geracional, favorecendo não só os sentimentos de bem-estar pessoal, mas também o bem-estar da geração futura. As variáveis identificadas nos estudos focam-se em particular: FIGURA 1 - Fatores protetores e de risco no stress materno

O bem-estar pessoal e o suporte do cônjuge no período pré-natal foram fatores preditores do stresse parental nas mães de gémeos (Colpin, et al., 2000). A melhor saúde mental nas mães, um ano após o nascimento dos gémeos, esteve associada a baixos níveis de stresse, ansiedade no apego materno, adaptação conjugal, ser mãe primeira vez e de gémeos de termo. (Olivennes, et al., 2005) O suporte funcional (Lutz, et al., 2012), o suporte social e a atividade profissional foram as variáveis com mais significado na experiência do stresse materno (Baor & Soskolne, 2012). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 114

O stresse parental foi sugerido como uma das principais causas de depressão nestas mulheres (Choi, et al., 2009) e níveis clínicos de stresse materno foram identificados em 41% da amostra de mães de gémeos (Baor & Soskolne, 2012), neste sentido estudos insinuam que as mães de gémeos referem maior stresse (Ellison & Hall, 2003; Glazebrook, et al., 2004; Olivennes, et al., 2005; Golombok, et al., 2007; Lutz, et al., 2012) contudo os valores totais que avaliam o stresse parental foram considerados anormalmente elevados em todas as mulheres (Glazebrook, et al., 2004). As mães de gémeos apresentam ainda níveis significativamente mais elevados de sintomas de depressão. (Ellison & Hall, 2003; Ellison, et al., 2005; Olivennes, et al., 2005; Sheard, et al., 2007; Vilska, et al., 2009; Choi, et al., 2009). Da análise comparativa utilizada em algumas das pesquisas foi considerada a diferença entre grupos tendo em consideração: os diferentes tipos de conceções, o número de nascimentos por gravidez e o tempo de gestação. As mães de gémeos falam, mais frequentemente, de experiências difíceis (Olivennes, et al., 2005; Sheard, et al., 2007) questionando-se sobre a parentalidade e sobre as dúvidas que vão surgindo (Sheard, et al., 2007). Sentemse cansadas, revelando que as suas expetativas, relativamente à maternidade eram diferentes, apresentando-se esta, como um trabalho mais duro e com mais dificuldades do que imaginavam. Em consequência, experienciaram sentimentos de stresse e/ou depressão, referindo também menos sentimentos de prazer com os gémeos e menor desejo de ter mais filhos do que as mães de não gémeos (Olivennes, et al., 2005). A qualidade de vida das mulheres diminui com o nascimento de filhos múltiplos (Ellison, et al, 2005). Quanto ao temperamento dos filhos as mulheres mães de gémeos têm a perceção que estes têm um temperamento mais difícil do que as mulheres mães de não gémeos (Taubman-Ben-Ari, et al., 2008) potenciando um aumento da vulnerabilidade emocional materna (Sheard, et al., 2007). Relativamente ao stresse parental, o bem-estar pessoal e o suporte do cônjuge, percebido pelas mulheres, no último trimestre da gravidez de gémeos, são preditores do menor stresse parental por elas experienciado, um ano após o nascimento destes (Colpin, et al., 2000). Ao nível da gestão diária, a sobrecarga de trabalho na realização repetitiva de rotinas familiares e a consequente privação de horas de sono, são alguns dos fatores stressores identificados.


Outro fator que pode funcionar como stressor é a existência anterior de outros filhos, pelo acréscimo e diversidade de necessidades familiares que esse fato representa (Ellison & Hall, 2003). A percentagem de mulheres de famílias de gémeos com trabalho remunerado é inferior comparativamente a outras mulheres que foram mães. Muitas mulheres têm que desistir da sua profissão e carreira e se algumas mães percebem esta opção como uma oportunidade, outras sentem que, ao abdicaram da sua profissão e carreira, perdem parte da sua identidade e independência, (Ellison & Hall, 2003) podendo este facto influenciar a saúde mental da mulher (Glazebrook, et al., 2004). CONCLUSÃO De acordo com Colpin, et al. (2000) os casais que esperam gémeos necessitam de informação específica e de suporte, no sentido de os preparar para o cuidar de gémeos, sugerindo aconselhamento e orientação prénatal. Dão enfase, ainda, à importância das mães de gémeos poderem dispor da possibilidade de discutir as suas experiências pessoais e sentimentos com os profissionais. Ter consciência das dificuldades vividas por estes pais, assim como as estratégias a adotar, é determinante para a eficácia dos cuidados. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA O conhecimento nesta área possibilita oferecer suporte adequado e direccionado às necessidades identificadas nestas famílias sustentando uma prática fundamentada em conhecimento científico. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Allborg, T. & Strandmark, M. (2001). The baby was the focus of attention-first-time parent’ experiences of their intimate relationship. Scandinavian Journal of Caring Science, 15(4), 318-325. Baor, L. & Soskolne, V. (2010). Mothers of IVF and spontaneously conceived twins: a comparison of prenatal maternal expectations, coping resources and maternal stress. Human Reproduction, 25(6),1490-1496. Baor, L. & Soskolne, V. (2012). Mothers of IVF twins: the mediating role of employment and social coping resources in maternal stress. Women Health, 52(3), 252264.

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19 PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL NA GRAVIDEZ E NO PÓS-PARTO | Maria Guerra1; Maria Braga2; Isabel Quelhas3; Rosa Silva4 |

RESUMO Cada mulher vive a gravidez como uma experiência única que envolve uma série de transformações psíquicas, físicas, fisiológicas, sociais e emocionais. Sendo na maioria dos casos um processo saudável, surgem por vezes alguns desvios da normalidade que podem, através de despiste precoce, ser devidamente acompanhados e não trazerem consequências para a grávida/mãe e seu filho. O enfermeiro tem um papel privilegiado desde o planeamento da gravidez, no acompanhamento da mesma e no pós-parto para despistar situações de risco e promover um plano de intervenção que minimize os efeitos nefastos das mesmas. Com o intuito de perceber quais os fatores de risco para a saúde mental e bem-estar da grávida e puérpera, bem como os achados sobre as estratégias promotoras da saúde mental da população alvo, foi realizada uma revisão integrativa da literatura com a seleção de 12 artigos, que constituíram a amostra, onde foram identificados vários fatores de risco e algumas estratégias promotoras da saúde mental. Os estudos apontam contudo a necessidade de incrementar o conhecimento sobre a problemática da saúde mental neste período da vida da mulher, quer na compreensão dos fenómenos que a afetam, quer nas estratégias que promovem a saúde mental. PALAVRAS-CHAVE: Enfermagem; Gravidez; Bem-estar materno; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“Promoción de la salud mental en el embarazo y el posparto”

“Promotion of mental health in pregnancy and postpartum”

Cada mujer vive el embarazo como una experiencia única que implica una gran cantidad de transformaciones: mentales, físicas, fisiológicas, sociales y emocionales. En la mayoría de los casos es un proceso saludable, a veces surgen de que algunas desviaciones de la normalidad se pueden, a través de la detección temprana e un seguimiento adecuado no traer consecuencias tanto para la embarazada / madre o su hijo. Las enfermeras tienen un papel clave, ya que la planificación del embarazo, el seguimiento de lo mismo y en el postparto para detetar situaciones de alto riesgo y poder promover un plan de acción para minimizar los efectos adversos de los mismos. Con el fin de entender cuáles son los fatores de riesgo para la salud mental y el bienestar de las mujeres embarazadas y posparto, así como las conclusiones sobre las estrategias de promoción de la salud mental da mujer embarazada o puerperal, una revisión integradora de la literatura se llevó a cabo con la selección de 12 artículos que se ha constituido en la muestra donde se identificaron varios fatores de riesgo y algunas estrategias de promoción de la salud mental. Los estudios muestran, sin embargo la necesidad de aumentar la conciencia sobre el tema de la salud mental en este período de la vida de la mujer, tanto en la comprensión de los fenómenos que afectan tanto a las estrategias que promueven la salud mental. DESCRIPTORES: Enfermería; Embarazo; Bienestar materno; Salud mental

Each woman lives pregnancy as a unique experience that involves several changes: mental, physical, physiological, social and emotional. Becoming a mother is normally a healthy process, however, there are some deviations from normality that can, through early screening, be properly monitored and not bringing consequences both for the pregnant/mother and son. Nurses have a key role since pregnancy planning, monitoring and postpartum, doing the screening risk situations and promoting an action plan to minimize the adverse effects. In order to understand which are the risk factors for mental health and well being of pregnant and postpartum women, as well as the findings on the strategies of promoting mental health of the population, a integrative literature review was done and 12 items were selected, which constituted our sample. There were identified multiple risk factors and some strategies promoting mental health. However, studies showed the need of the increasing awareness on the issue of mental health in this period of a woman’s life, in understanding phenomena that affect and the strategies that promote mental health. KEYWORDS: Nursing; Pregnancy; Maternal welfare; Mental health Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 05-03-2014

1 Mestre em Enfermagem; Docente na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde: CIIS – Centro de Investigação Disciplinar em Saúde, Rua Dr. António Bernardino de Almeida, nº 400, 4200-072 Porto, Portugal,mguerra@porto.ucp.pt 2 Docente na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde: CIIS – Centro de Investigação Disciplinar em Saúde, Porto, Portugal, mbraga@porto.ucp.pt 3 Docente na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde: CIIS – Centro de Investigação Disciplinar em Saúde, Porto, Portugal, iquelhas@porto.ucp.pt 4 Docente na Universidade Católica Portuguesa – Instituto de Ciências da Saúde: CIIS – Centro de Investigação Disciplinar em Saúde, Porto, Portugal, rcgsilva@porto.ucp.pt Citação: Andrade, L., Martins, M. M., Angelo, M., & Martinho, J. (2014). A saúde mental na parentalidade de filhos gémeos – revisão da literatura. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 117-124. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 117


INTRODUÇÃO A gravidez e a maternidade é uma experiência única que envolve adaptações fisiológicas significativas a nível físico, psíquico, social e emocional, que têm diferentes implicações no bem-estar materno (Ministério da Saúde, 2006; Alderdice, MacNeill, & Lynn, 2013), que implicam a aprendizagem de tarefas relacionadas com o exercício da maternidade e que requerem a aquisição de saberes e competências associadas ao cuidado da criança, que podem trazer grande ambivalência de emoções e interferência no bem-estar materno (Cantwell & Cox, 2003). O pós-parto é um tempo de ajustamento psicológico e de adaptação ao desempenho do novo papel. Neste período correm alterações hormonais bruscas e significativas às quais acresce o cansaço decorrente do processo de parturição (Raynor, 2006). Durante a gravidez a mulher vivencia níveis elevados de ansiedade relacionados com preocupações sobre o bem-estar do feto e com o do seu próprio bem-estar (Alderdice, MacNeill, & Lynn, 2013). Os desconfortos associados às adaptações fisiológicas da gravidez comportam problemas de saúde a nível do bem-estar físico e psicológico da mulher. A prevalência e incidência destes sintomas podem implicar que, em algumas mulheres, estes problemas podem afetar a sua qualidade de vida e ter um efeito negativo na sua relação com a criança, parceiro e outros membros da família (Schmied, et al., 2013). Segundo o Conselho Internacional de Enfermeiros, o conceito de bem-estar está relacionado com o conceito de saúde, sendo apresentado como: “Saúde: imagem mental de se sentir bem, de equilíbrio, contentamento, amabilidade ou alegria e conforto, usualmente demonstrada por tranquilidade consigo próprio, e abertura para as outras pessoas ou satisfação com a independência” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p. 41). Na conceção apresentada nos Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem de Saúde Mental, “A pessoa, no decurso do seu projeto de vida e de saúde, confronta-se com inúmeros desafios, cujo sucesso na resolução, reside nas suas capacidades de adaptação” (Ordem dos Enfermeiros, 2011, p. 2). Considerando então que a gravidez e o pós-parto são períodos críticos para a saúde mental da mulher, e que estes eventos constituem desafios no decurso do seu projeto de vida, que implicam processos de adaptação para a sua resolução saudável, desenvolveu-se a presente revisão integrativa com a finalidade de identificar os Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 118

fatores de risco para a saúde mental e bem-estar da grávida/puérpera, e ainda os achados sobre as estratégias promotoras da saúde mental da população alvo. As questões de investigação orientadoras do estudo são: • Quais são as situações de risco para a saúde mental e bem-estar da grávida/puérpera? • Quais são as estratégias promotoras da saúde mental tanto na grávida como no puérperio METODOLOGIA Foi realizada uma revisão integrativa da literatura recorrendo a pesquisa bibliográfica através dos motores de busca ISI Web of Knowlegde e EBSCOhost e ScienceDirect da Elsevier utilizando como descritores nursing, pregnancy, maternal mental health e postpartum. Esta pesquisa foi realizada entre os meses de agosto e setembro de 2013. Como critérios de inclusão foram considerados os artigos que contivessem no título um dos descritores considerados e com data de publicação compreendida entre 2008 e 2013. Foram encontrados 17 artigos, que respondiam a estes critérios. Tendo em conta as questões de investigação e a finalidade do estudo e após leitura integral dos mesmos foram selecionados 12 artigos. Destes verificamos que eram: um estudo de caso controle, seis revisões sistemáticas da literatura, um estudo quase experimental, dois estudos longitudinais e um estudo com metodologia de focus group. Os resultados da análise dos artigos foram organizados tendo por base um processo de categorização. As duas categorias selecionadas dão resposta aos objetivos do trabalho: Situações de risco para a saúde mental da mulher durante o seu processo gravídico; Intervenções promotoras da saúde mental.


RESULTADOS A análise dos dados permitiu obter dados consistentes sobre as finalidades do estudo (Tabela 1) e que se apresenta na seguinte sistematização: TABELA 1 - Estudos incluídos na revisão integrativa sobre saúde mental das mulheres no pré e pós-parto

Autores e Ano

Objetivos

Conclusões

(Alderdice, Revisão MacNeill, & Lynn, sistemática 2013)

Tipo de estudo Título “A systematic review of systematic reviews of interventions to improve maternal health and well-being”

Identificar intervenções não invasivas no período perinatal que permitem as parteiras oferecer suporte efetivo às mulheres dentro da área da saúde mental e bem estar.

De uma forma geral nenhuma das revisões identifica uma intervenção a implementar no período perinatal que possa ser considerada definitivamente como recomendável para a prática clinica. Algumas intervenções destacaram-se merecendo maior atenção: intervenções psicossociais e psicológicas, intervenções direcionadas à mente e o corpo durante a gravidez e o exercício. Os cursos de preparação para a parentalidade foram também considerados promissores na prevenção dos problemas de saúde mental materna.

(Byatt, et al., 2012))

focus group com recurso a grounded theory

“Patient, provider, and system-level barriers and facilitators to addressing perinatal depression”

Explorar as perspetivas dos profissionais de saúde em relação às barreiras e aos fatores facilitadores para lidar com a depressão perinatal

Verifica-se que os profissionais têm recursos limitados para lidar com a saúde mental e não têm as competências necessárias para lidar com as questões de saúde mental, o que diminui a confiança e a motivação para lidar com a depressão perinatal.

(Demissie, SiegaRiz, Evenson, Herring, Dole, & Gaynes, 2013)

Estudo prospe- “Physical activity tivo de coorte during pregnancy and postpartum depressive symptoms”

Examinar as associações entre atividade física moderada e/ou vigorosa total e de domínio específico (MVPA) durante a gravidez e a ocorrências de sintomas depressivos no pós-parto

A associação entre atividade física e os sintomas de depressão no pós-parto podem diferir no momento de avaliação. São necessários mais estudos, com amostras mais alargadas, que envolvam as mulheres ao longo da gravidez e do pós-parto de forma a explorar as diferenças em relação à influência da atividade física nos sintomas depressivos.

(Emmanuel, St John, & Sun, 2012)

Longitudinal

“Relationship between Social Support and Quality of Life in Childbearing Women during the Perinatal Period”

Explorar os suportes sociais e demográficos preditores de qualidade de vida relacionados com a saúde (HRQoL) (mental e física) para mulheres grávidas no período perinatal.

O suporte social é um significativo e consistente preditor de uma maior qualidade de saúde quer a nível físico quer a nível mental.A relação entre suporte social e a qualidade de saúde apresentouse independente de outros fatores incluindo nível de educação, tempo de relacionamento com o parceiro, no domínio mental às 32 semanas de gestação.

(Fisher, Wynter, & Caso controlo Rowe, 2010)

“Innovative psychoeducational program to prevent common postpartum mental disorders in primiparous women: a before and after controlled study”

Determinar a eficácia da implementação de um programa psicoeducacional de curta duração, inovador para mães, pais e os recém-nascidos.

A implementação de um programa psicoeducacional universal e breve direcionado a pais, nos cuidados de saúde primários, reduz a ocorrência de novo de desordens mentais nas puérperas. Uma abordagem universal suplementada por um programa adicional pode melhorar a eficácia nas mulheres com história de desordens psiquiátricas.

(Kantrowitz-Gordon, 2013)

“Expanded Care for women and families after preterm birth”

Melhorar o conhecimento sobre a experiência de ser mãe de um recémnascido pré-termo e apresentar estratégias efetivas para parteiras e obstetras, aproveitando o alto nível de confiança, ganho durante a gravidez, a fim de ajudar as mães e suas famílias no período pós parto.

A experiência de um parto prematuro tem um impacto profunda na transição para a maternidade e no bem-estar da família. Encorajar o método de canguru, ou o contacto pele-a-pele, com o recém-nascido, que se encontra só com a fralda e uma capa, realizado em contacto direto com a pele da mãe ou de outros membros da família. Disponibilizar orientação e suporte. Rastrear pais de crianças pré-termo em relação à depressão e ansiedade, e oferecer a oportunidade de falar dos eventos relacionados com o parto.

Revisão da literatura

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(McQueen, Mont- Revisão gomery, Lappan- sistemática Gracon, Evans, & da literatura Hunter, 2008)

“Evidence-based Recommendations for Depressive Symptoms in Pospartum”

Traçar 10 recomendações clínicas para o pós-parto devidamente suportadas na evidência científica.

Não existe, uma abordagem sistemática para a deteção, prevenção e tratamento da depressão pós-parto estabelecida para a prática de enfermagem. A gravidade da depressão por si só não deve ditar o tipo de intervenção. O tratamento deve ser baseado nas necessidades maternas, preferências e severidade dos sintomas. O humor materno no pós-parto imediato (ou até 2 semanas de puerpério) é um preditor significativo da depressão pós-parto.

(Sawyer, Ayers, & Smith, 2010)

Revisão sistemática da literatura

“Pre- and postnatal psychologic wellbeing in Africa: A systematic review.

Evidenciar a prevalência e os fatores de risco de perturbações da saúde mental nas mulheres africanas que residem em áfrica.

As desordens na saúde mental das mulheres africanas têm uma prevalência relevante, e demonstra a importância da integração nos cuidados da abordagem a nível da saúde mental materna nas políticas de saúde materna e infantil dos países africanos.

(Schmied, et al., 2013)

Estudo prospetivo longitudinal

“Maternal mental health in Australia and New Zealand: A review of longitudinal studies”

Descrever os fatores que têm impacto sobre a saúde mental das mulheres da Austrália e da Nova Zelândia no período perinatal (gravidez e no ano seguinte o nascimento), e determinar o impacto da saúde mental perinatal na saúde subsequente das mulheres.

As enfermeiras especialistas em saúde materna e obstétrica têm um importante papel na identificação, suporte e referenciação das mulheres a experienciarem problemas de saúde mental. Sabendo que muitas mulheres não assumem comportamentos de procura dos serviços especializados em saúde mental, a existência de uma enfermeira especialista de referência para a mulher garante a avaliação a nível da saúde mental das mulheres.

(Seimyr, WellesNyström, & Nissen, 2013)

Estudo longitudinal

“A hystory of mental health problems may predict maternal distress in women postpartum”

Elucidar sobre os efeitos de história de transtornos mentais prévios na saúde mental das puérperas e comparar os diferentes instrumentos de rastreio do stress maternal e depressão após o nascimento do seu filho.

A angústia maternal foi vivenciada em 20% das mulheres avaliadas 4-6 semanas pós-parto, pelo inventário de depressão de Beck e pela escala de depressão pós-parto de Edinburgh, e por 13-16% das mulheres às 10-12 semanas após o parto. Uma análise retrospetiva mostra que as mulheres com problemas de saúde mental a nível

(Thome & Arnardottir, 2012)

Estudo quase experimental

“Evaluation of a family nursing intervention for distress pregnant women and their partners: a single group before and after study”

Reportar o estudo dos efeitos de uma intervenção de enfermagem na família no período prénatal em mulheres com perturbações/sofrimento/angústia emocionais e seus companheiros.

As mulheres experienciam um maior nível de angústia do que os homens antes da implementação da intervenção ( os casais usufruíram de 4 visitas domiciliárias estruturadas de acordo com o modelo de intervenção familiar de Calgary).

“The Enigma of Post-natal depression: an update”

Fornecer uma análise crítica dos principais conceitos associados com a depressão pósnatal (PND), através da melhoria dos padrões de qualidade e os cuidados de saúde prestados pelos profissionais.

De acordo com a evidência identificada é fundamental o reconhecimento precoce da depressão pós-parto, seguida da implementação de intervenções baseadas na evidência por profissionais de saúde com as competências necessárias à identificação e desenvolvimento das mesmas.

(Wylie, Holiins Revisão da Martin, Marland, literatura Martin, & Rankin, 2011)

Situações de risco para a saúde mental da mulher durante o seu processo gravídico Os dados a nível internacional indicam que cerca de 18,4% das mulheres sofrem de depressão durante a gravidez e 19,2% das mulheres têm depressão durante os três meses após o parto (Gaynes et al., 2005). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 120


A identificação precoce da presença de fatores de risco ou dos fatores preditores para a depressão no pós-parto é considerada fundamental para a promoção da saúde mental. Assim foram identificados como fatores preditores para a ocorrência de uma depressão pós-parto a baixa condição social, o stress durante a gravidez, uma gravidez ou parto complicados, dificuldades no relacionamento com o parceiro e/ou família, falta de suporte por parte da família, amigos, o estado civil, história de psicopatologia, história de abuso sexual, má relação com a própria mãe, falta de autoconfiança, gravidez não planeada, o temperamento da criança, situação de desemprego ou de instabilidade no trabalho e o stress crónico (Wylie, Holiins Martin, Marland, Martin, & Rankin, 2011). O estado de humor materno quer durante a gravidez quer no pós-parto é considerado um preditor importante para a depressão (McQueen, Montgomery, Lappan-Gracon, Evans, & Hunter, 2008). Existe evidencia no sentido de que as mulheres com história de alteração da saúde mental antes da gravidez e parto, estão mais vulneráveis ao stress durante o desempenho do papel maternal (Seimyr, Welles-Nyström, & Nissen, 2013). Schmied, et al. (2013) destaca que a falta de suporte marital e a maternidade precoce como situações de risco de saúde mental materna. Além destes foram identificados como fatores preditores a gravidez não planeada ou situações como: mudança de casa, dificuldades financeiras, morte de alguém próximo, desemprego, separação e situação de doença, violência ou agressão. Salienta de maior vulnerabilidade para a depressão no pós-parto os consumos de substâncias aditivas como por exemplo o álcool e baixo nível de instrução. O estigma associado ao facto de ser mãe solteira pode contribuir para uma menor saúde mental. A falta de suporte familiar, assim como os problemas conjugais foram identificados como fatores de risco para a perturbação mental e bem-estar das mulheres no período pré e pós-natal (Sawyer, Ayers, & Smith, 2010). Existem estudos que enfatizam igualmente a importância do suporte social como um significativo e independente fator preditor da qualidade de vida e bem-estar da maternidade e consequentemente para a saúde mental, sendo o parceiro um dos principais vértices desse suporte (Emmanuel, St John, & Sun, 2012). Como fatores de risco ainda da depressão materna, consideram o blues, o temperamento da criança, o cuidado à criança e o stress no desempenho do papel parental (Seimyr, Welles-Nyström, & Nissen, 2013).

O conhecimento produzido mostra que as mulheres que experienciaram uma situação de blues intenso têm uma maior probabilidade, no pós parto, de apresentar processos de depressão materna (McQueen, Montgomery, Lappan-Gracon, Evans, & Hunter, 2008; Wylie, Holiins Martin, Marland, Martin, & Rankin, 2011). Intervenções promotoras da saúde mental As visitas domiciliárias realizadas pelas enfermeiras especialistas de saúde materna e obstétrica, durante o primeiro mês pós-parto, surgem como uma intervenção preventiva da depressão pós-parto, devendo englobar como objetivos o reconhecimento precoce dos sintomas, e a referenciação para um acompanhamento especializado na área da saúde mental (Wylie, Holiins Martin, Marland, Martin, & Rankin, 2011) A preparação para o parto também se mostra como um significativo contributo na redução do risco de sintomas depressivos imediatamente após o parto (Alderdice, MacNeill, & Lynn, 2013). Os cursos de preparação para a parentalidade é outra intervenção identificada como promotora da saúde mental materna dados os significativos ganhos obtidos (Alderdice, MacNeill, & Lynn, 2013; Fisher, Wynter, & Rowe, 2010). A intervenção por parte da enfermagem, segundo o modelo de intervenção familiar de Calgary, em casais com grávidas que apresentam maiores dificuldades na gestão das emoções pela sintomatologia depressiva, ansiosa, ou pela baixa autoestima, consegue diminuir os níveis de ansiedade do casal e a sintomatologia depressiva, melhorando a autoestima (Thome & Arnardottir, 2012). Num dos estudos considerados, foram identificadas 10 recomendações para a prática, duas na perspetiva da prevenção, seis relacionadas com a confirmação de sintomas depressivos e duas dirigidas ao tratamento da depressão pós-parto (McQueen, Montgomery, LappanGracon, Evans, & Hunter, 2008). Na perspetiva da prevenção recomenda-se que os enfermeiros providenciem cuidados, individualizados e flexíveis, no pós-parto, baseados na identificação dos sintomas depressivos e na preferência materna. São apresentadas como estratégias para o acompanhamento de puérperas, a relação terapêutica e de confiança estabelecida entre a enfermeira especialista em saúde materna e obstétrica e a mulher, a utilização do método canguru, o apoio na amamentação, o encorajamento à expressão dos sentimentos, o envolvimento do pai, irmãos, avós e outros membros da família (Kantrowitz-Gordon, 2013). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 121


Demissie, et al. (2013) refere ainda não existe suficiente evidência para fundamentar que o exercício físico pode influenciar positivamente a saúde mental da mulher durante a gravidez e pós-parto. Um estudo com 450 450 mulheres, verificou que 86% acreditavam que o passeio com o seu filho no carrinho de bebé reduzia o risco de depressão pós-parto (Currie & Develin, 2002 cit por Wylie, Holiins Martin, Marland, Martin, & Rankin, 2011) Intervenções promotoras da saúde mental: Planeamento de Cuidados Os enfermeiros e os enfermeiros especialistas em saúde materna, que acompanham as mães, precisam de estar consciencializados das circunstâncias sociais maternas, particularmente nas situações onde se evidenciam dificuldades em realizar um ajustamento saudável à maternidade (Emmanuel, St John, & Sun, 2012). Byatt, et al. (2012) acentua que um inadequado treino da equipa diminui a confiança da mulher e a sua predisposição para enfrentar os problemas. A formação e treino da equipa têm assim particular importância, sendo um fator importante a ter em conta também para Schmied, et al. (2013), com a finalidade de melhorar a assistência de enfermagem às mulheres durante esta etapa da sua vida de particular vulnerabilidade. Só assim, serão os enfermeiros, capazes de avaliar as necessidades psicossociais da mulher e de prestar o apoio e implementar as intervenções adequadas. Intervenções promotoras da saúde mental: Programas psicoeducacionais Dados mostram que programas psicoeducacionais dirigido a ambos os membros do casal, com o objetivo de minimizar as experiências de humilhação através do aumento da compreensão e da empatia, por parte do companheiro sobre o impacto, do isolamento a que leva o cuidado ao bebé, através da promoção da partilha do cuidado, como um esforço comum, em que os pais ficam com competências semelhantes de forma a possibilitar momentos de independência e de lazer para cada um (Fisher, Wynter, & Rowe, 2010). É necessário ensinar os pais com o objetivo de promover uma resposta cognitiva e menos emocional ao choro da criança, incrementando as suas competências na resposta assertiva às necessidades da criança (Fisher, Wynter, & Rowe, 2010).

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DISCUSSÃO A análise dos dados permite-nos inferir que há diversas condicionantes que podem precipitar o aparecimento de vários sintomas que apontam para alteração da saúde mental quer no período da gravidez quer no pós-parto. Apresenta-se em forma de esquema a sistematização dos preditores de risco identificados nos estudos considerados na figura 1. FIGURA 1 - Preditores de risco de alteração de saúde mental no pós-parto

Pudemos inferir que há algumas intervenções que podem promover o bem-estar com ganhos significativos e nas suas relações sociais e na saúde mental da mulher (Fig. 2). FIGURA 2 - Intervenções promotoras de bem-estar materno

A depressão pós-parto e o bem-estar a nível da saúde mental, durante todo o processo de “tornar-se mãe”, requere um aprofundamento do conhecimento quer na prevenção, através da identificação dos fatores de risco, quer na identificação das estratégias a utilizar, sendo fundamental a realização de um maior número de estudos sobre estas questões, na procura de uma prática baseada na evidência (McQueen, Montgomery, Lappan-Gracon, Evans, & Hunter, 2008; Wylie, Holiins Martin, Marland, Martin, & Rankin, 2011; Schmied, et al., 2013). Existe também a necessidade de se realizar outros estudos que avaliem a perceção das mulheres sobre o suporte social, especialmente nas situações de mulheres jovens, desempregadas e as que não têm companheiro (Emmanuel, St John, & Sun, 2012).


CONCLUSÕES O enfermeiro tem um papel privilegiado, desde o planeamento da gravidez, no acompanhamento da mesma e no pós-parto, no despiste de situações de risco e no planeamento da intervenção ou encaminhamento das mesmas. A Enfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstétrica tem um papel importante na: identificação, suporte e referenciação das grávidas/puérperas vivenciando problemas sociais e de saúde mental durante o período perinatal. Durante o primeiro ano, e no cumprimento do plano nacional de saúde, há vários momentos de contacto da díade com os enfermeiros (Saúde Infantil e Pediátrica, Comunitária, Saúde Materna e Obstétrica), nomeadamente para a vacinação e vigilância de saúde, sendo fundamental que os profissionais sejam capazes de despistar precocemente situações de risco e orientar/referenciar para o profissional adequado, como o enfermeiro especialista em Saúde mental e psiquiátrica. No nosso país é-nos possível seguir o preconizado pelo Ministério da Saúde (2006) publicado no Manual de Orientação para Profissionais de Saúde. Realçamos o facto dos estudos consultados e os resultados obtidos estarem consentâneos com estas diretrizes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alderdice, F., MacNeill, J., & Lynn, F. (2013). A systematic review of systematic reviews of interventions to improve maternal mental health and weel-being. Midwifery, 29, 389-399. Byatt, N., Biebel, K., Lundquist, R. S., Simas, T. A., Debordes-JacKson, G., Allison, J., & Ziedonis, D. (2012). Patient, provider, and system-level barriers and facilitators to addressing perinatal depression. Journal of Reproductive and Infant Psychology, 305, 436-449. Cantwell, R., & Cox, J. L. (2003). Psychiatric disorders in pregnancy and the puerperium. Current Obstetrics & Gynaecology, 13, 7-13. Conselho Internacional de Enfermeiros (2011). CIPE Versão 2 - Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem. Ordem dos Enfermeiros: Lisboa. Demissie, Z., Siega-Riz, A., Evenson, K. R., Herring, A. H., Dole, N., & Gaynes, B. N. (2013). Physical activity during pregnancy and postpartum depressive symptoms. Midwifery, 29, 139-147.

Emmanuel, E., St John, W., & Sun, J. (2012). Relationship between Social Support and Quality of Life in Childberaring Women during the Perinatal Period. Journal of Obstetric, Gynecological and Neonatal Nursing - JOGNN, 41, E62-E70. Fisher, J. R., Wynter, K. H., & Rowe, H. J. (2010). Innovate psycho-educational program to prevent common postpartum mental disorders in primiparous women: a before and after controlled study. BMC Public Health, 10(432), 1-15. Gaynes, B., Gavin, N., Meltzer-Brody, S., Lohr, K., Swinson, T., Gartlehner, G., … & Miller, W. (2005). Perinatal Depression: prevalence, Screening Accuracy, and Screening Outcomes. Evidence Report/Techonology Assement Nº 119.AHRQ Publication Nº 05-E006-2. Rockville, MD: Agency for Healthcare Research and Quality. Kantrowitz-Gordon, I. (2013). Expanded Care for Women and Families after Preterm Birth. Journal of Midwifery & Women´s Health, 58(2), 158-166. McQueen, K., Montgomery, P., Lappan-Gracon, S., Evans, M., & Hunter, J. (2008). Evidence-Based Recomendations for Depressive Symptons in Postpartum Women. Journal of Obstetric, Gynecologic and Neonatal Nursing - JOGNN, 37(2), 127-136. Ministério da Saúde. (2006). Direção-Geral da Saúde - Direção de serviços de Psiquiatria e Saúde Mental. Obtido Agosto 4, 2006, em: http://www.dgs.pt/documentos-e-publicacoes/promocao-da-saude-mental-nagravidez-e-primeira-infancia-manual-de-orientacaopara-profissionais-de-saude.aspx Ordem dos Enfermeiros. (2011). MCEE de Saúde Mental e Psiquiátrica - o seu Colégio. Obtido Outubro 22, 2013, em: www.ordemdosenfermeiros.pt/colegios/Documents/PQCEESaudeMental.pdf Raynor, M. (2006). Pregnancy and the puerperium:the social and psychological context. Psychiatry, 5(1), 1-4. Sawyer, A., Ayers, S., & Smith, H. (2010). Pre- and postnatal psychologic weelbeing in Africa: A systematic review. Journal of Affective Disorders, 17-29. Schmied, V., Johnson, M., Naidoo, N., Austin, M.-P., Matthey, S., Kemp, L., … & Yeo, A. (2013). Maternal mental health in Australia and New Zealand: A review of longitudinal studies. Women and Birth, 132, 167-178.

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Seimyr, L., Welles-NystrĂśm, B., & Nissen, E. (2013). A history of mental health problems may predict maternal distress in women postpartum. Midwifery, 122-131. Thome, M., & Arnardottir, S. B. (2012). Evaluation of a family nursing intervention for distressed pregnant women and their partners: a single group before and after study. Journal of Advanced Nursing - JAN, 69(4), 805-816.

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Wylie, L., Holiins Martin, C. J., Marland, G., Martin, C. R., & Rankin, J. (2011). The enigma of post-natal depression: an update. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 18, 48-58.


20 LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DE ADOLESCENTES: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO

| Amorim Rosa1; Luís Loureiro2; Carlos Sequeira3 |

RESUMO CONTEXTO: O baixo nível de literacia em saúde mental (LSM) é determinante para a ausência de comportamentos de procura de ajuda na adolescência, afetando o desenvolvimento e aumentando o risco de recorrência das perturbações psiquiátricas. OBJETIVOS: Explorar os conhecimentos dos adolescentes sobre três problemas de saúde mental comuns, depressão, ansiedade e abuso de álcool, bem como a tipologia de ações e a importância atribuída à ajuda profissional METODOLOGIA: Foram realizados três focus group com um total de 23 participantes, recrutados em três escolas secundárias públicas. As entrevistas foram transcritas e sujeitas a análise qualitativa de conteúdo com o programa Nvivo9. RESULTADOS: Os adolescentes evidenciam dificuldades no reconhecimento das perturbações e recorrem frequentemente ao uso de rótulos inadequados; desvalorizam a ajuda profissional e mostram preferência pelas ajudas informais como os amigos e a família. Estes fatores, associados ao estigma, às preocupações de confidencialidade e de confiança nos profissionais de saúde constituem as maiores barreiras no acesso à ajuda profissional. Experiências prévias positivas e apoio social foram identificados como os principais facilitadores da procura de ajuda. CONCLUSÕES: Os resultados mostram a necessidade de criar programas para promover a literacia em saúde mental, aumentando os conhecimentos sobre os próprios sintomas e a compreensão dos conceitos associados à saúde mental e minimizando os constrangimentos associados ao estigma e outras barreiras na procura de ajuda. PALAVRAS-CHAVE: Alfabetização; Saúde mental; adolescente

RESUMEN

ABSTRACT

“Alfabetización en salud mental en adolescentes: Un estudio exploratorio”

“Mental health literacy in adolescents: An exploratory study”

CONTEXTO: El bajo nivel de alfabetización en salud mental es crucial para la falta de conductas de búsqueda de ayuda en la adolescencia, afectando el desarrollo y aumentando el riesgo de recurrencia de los disturbios psiquiátricos. OBJETIVOS: Explorar los conocimientos de los adolescentes sobre tres problemas comunes de salud mental, la depresión, la ansiedad y el abuso del alcohol, así como los tipos de acciones y la importancia dada a la ayuda profesional, centrándose en el reconocimiento de la enfermedad y conductas de búsqueda de ayuda. METODOLOGÍA: Tres grupos de discusión (focus group) fueran realizados con un total de 23 participantes, seleccionados a partir de tres escuelas secundarias públicas. Las entrevistas fueron transcritas y sometidas al análisis de contenido cualitativo con el programa Nvivo9. RESULTADOS: Los adolescentes muestran dificultades en el reconocimiento de los trastornos y, a menudo, recurren a la utilización de etiquetas inadecuadas; devalúan la ayuda profesional; y muestran preferencia por la ayuda informal como amigos y familiares. Experiencias positivas anteriores y apoyo social fueron identificados como facilitadores clave de la búsqueda de ayuda. CONCLUSIONES: Los resultados muestran la necesidad de crear programas de promoción de la alfabetización en salud mental, mejorando los conocimientos acerca de los síntomas y la comprensión de los conceptos relacionados con la salud mental y reducir al mínimo las restricciones asociadas con el estigma y otras barreras en la búsqueda de ayuda. DESCRIPTORES: Alfabetización; Salud mental; adolescente

BACKGROUND: The low level of Mental Health Literacy is crucial to the lack of help-seeking behaviors during adolescence, affecting the development and increasing the risk of recurrence of psychiatric disorders. AIM: To explore adolescent’s knowledge of three common mental health problems, depression, anxiety and alcohol misuse as well as the types of actions and importance given to professional help, focusing in recognition and help-seeking behaviors. METHODS: We conduct three focus group with a total of 23 participants recruited from three public secondary schools. Interviews were transcribed and subjected to qualitative content analysis with the program Nvivo9. RESULTS: Adolescents show difficulties to recognize mental disorders and often use inappropriate labels; devalue professional help and show preference for informal help as friends and family. These factors, plus the stigma, concerns of confidentiality and trust in health professionals are the major barriers to accessing professional help. Previous positive experiences and social support were identified as key facilitators of help-seeking. CONCLUSIONS: Findings show the need to create programs to promote mental health literacy, increasing knowledge about the symptoms themselves and understanding of concepts related to mental health and minimizing the embarrassment associated with stigma and other barriers in seeking help. KEYWORDS: Literacy; Mental health; adolescent Submetido em 30-11-2013 – Aceite em 06-03-2014

1 MSc; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – Unidade Científico-Pedagógica de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, amorim@esenfc.pt 2 PhD; Professor Adjunto na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, 3046-851 Coimbra, Portugal, lloureiro@esenfc.pt 3 PhD; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal, carlossequeira@esenf.pt Citação: Rosa, A., Loureiro, L., & Sequeira, C. (2014). Literacia em saúde mental de adolescentes: Um estudo exploratório. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Ed. Esp. 1), 125-132. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 125


INTRODUÇÃO Os pilares da saúde mental fundam-se nos primeiros anos de vida. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que cerca de 20% das crianças e adolescentes sejam afetados por problemas de saúde mental com expressão antes dos 18 anos de idade (World Health Organization, 2000), e que destas, cerca de metade desenvolve uma perturbação psiquiátrica com reflexo na idade adulta, implicando diminuição da qualidade de vida e aumento do consumo de cuidados. Contudo, na maioria destas situações os adolescentes não recebem a ajuda adequada, ou recebem-na com muito atraso (Kelly, Jorm & Wright, 2007). A ansiedade, a depressão, o risco de suicídio e outros comportamentos de risco constituem as problemáticas com prevalência mais significativa, começando também a tornar-se mais frequentes as patologias aditivas, requerendo novas formas de intervenção ao nível da avaliação e tratamento (Coordenação Nacional para a Saúde Mental/Administração Central do Sistema de Saúde, 2011). O atendimento de adolescentes com perturbações psiquiátricas apresenta caraterísticas particulares. As questões relacionadas com o desenvolvimento têm um papel determinante nessa etapa do ciclo vital, onde experiências particularmente desestabilizadoras poderão determinar sofrimento psíquico e o surgimento de perturbações psiquiátricas cujo agudizar se deve, entre outros fatores, a estereótipos que conduzem à ausência de comportamentos de procura de ajuda profissional (Loureiro, Mateus e Mendes, 2009). Reconhecendo que a prevalência de problemas de saúde mental na adolescência é significativa e que as atitudes estigmatizantes fazem prevalecer uma visão preconceituosa das doenças e dos doentes fortemente enraizada cultural e socialmente (Loureiro et al., 2012); que as atitudes relativas a estes problemas são adquiridas precocemente desenvolvendo-se de forma gradual e consolidando-se na idade adulta (Wahl, 2002); e que a escola é um contexto privilegiado de acesso aos adolescentes, tem-se assistido nos últimos anos a uma preocupação crescente com a promoção da literacia em saúde mental enquanto pré-requisito para um reconhecimento precoce e intervenção atempada nas perturbações mentais (Scott & Chur-Hansen, 2008), através da educação e sensibilização para a saúde mental e do combate ao estigma. Jorm et al. (1997) introduziram o conceito de ‘literacia em saúde mental’ e definiram-no como conhecimento e crenças sobre as perturbações mentais que ajudam o seu reconhecimento, gestão e prevenção. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 126

Os estudos têm demonstrado que os níveis de literacia em saúde mental são baixos, independentemente da população considerada. As pessoas têm dificuldade em identificar corretamente as perturbações mentais, têm baixa compreensão dos fatores causais, crenças erradas sobre a efetividade do tratamento, são relutantes em procurar ajuda profissional e não sabem como ajudar os outros (Jorm, Wright & Morgan, 2007). Este estudo tem como objetivo explorar os conhecimentos dos adolescentes relativamente a três problemas de saúde mental, depressão, ansiedade e abuso de álcool, bem como compreender a tipologia de ações e a importância atribuída à ajuda profissional, centrando-se nas componentes do reconhecimento da doença e comportamentos de procura de ajuda. METODOLOGIA Trata-se de um estudo exploratório de abordagem qualitativa. Foi utilizado o focus group como método de recolha de informação, por ser particularmente adequada quando se pretende aprofundar informação sobre um conceito, um problema ou experiências (Krueger & Casey, 2009), mas também para explorar as perceções e vivências de cada um dos participantes. O focus group privilegia a observação e o registo de experiências e reações dos indivíduos participantes, que não seriam possíveis de captar por outros métodos (Galego e Gomes, 2005). Para além disso, permite criar espaço para a dinâmica de grupo, possibilitando que os participantes se expressem numa discussão flexível, usando as suas próprias palavras e de acordo com as suas prioridades. Sendo este um estudo preliminar de um estudo mas amplo de construção e validação de um instrumento de avaliação da literacia em saúde mental em adolescentes, recorreu-se ao método de focus group, na medida em que pode ser utilizado como técnica de pesquisa exploratória para o levantamento de dados preliminares sobre determinado objeto de pesquisa, sendo um instrumento fundamental na criação de questionários, permitindo que, através dos investigadores, se possam ouvir o que as pessoas têm a dizer acerca da área a investigar (Galego e Gomes, 2005).


Participantes O estudo integra-se num projeto mais abrangente de educação e sensibilização para a saúde mental: um programa de intervenção escolar para adolescentes e jovens, projeto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e autorizado pela Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação do Governo Português. Foi solicitado o consentimento prévio aos encarregados de educação e aos participantes, antes do início de cada sessão. Neste estudo participaram 23 adolescentes, estudantes do ensino secundário público em três escolas da região centro, com frequência do 7º ao 12º ano. As idades variaram entre 12 e 17 anos (M= 14.91 e DP= 1.73), sendo 16 (69.6%) do género feminino e 7 (30.4%) do género masculino. Todos os participantes eram solteiros e de nacionalidade portuguesa. Os pais tinham habilitações literárias compreendidas entre o 1º ciclo e o mestrado, tendo a grande maioria habilitações entre o 2º ciclo e o ensino secundário. Relativamente à situação profissional, 78.3% dos pais e 78.3% das mães encontravam-se empregados. Procedimento Foram realizados três focus group em escolas secundárias sendo uma situada em zona urbana, outra em zona rural e uma terceira em zona suburbana. Esta opção metodológica justifica-se pelo facto de existir evidência científica de que fatores como o estigma assumem um papel fundamental na ausência de comportamentos de procura de ajuda, sobretudo em populações rurais (Scott & Chur-Hansen, 2008). As sessões tiveram uma duração de 70 minutos e decorreram durante os meses de Maio e Junho de 2013, em espaço e tempo cedidos para o efeito pelos diretores das escolas. No início de cada sessão os participantes foram informados sobre os objetivos do estudo, os limites de confidencialidade, e o direito de, em qualquer momento, poderem retirar-se. De seguida assinaram um termo de consentimento e preencheram um questionário demográfico de caraterização. Foi ainda solicitada autorização para audiogravar as sessões. As entrevistas foram orientadas por um guião estruturado, elaborado a partir da revisão da literatura atual, contendo os temas chave a serem explorados, sendo projetado para melhorar a interação do grupo. A sequência dos temas foi ordenada, primeiramente por questões gerais e, em seguida, por questões específicas, permitindo que os elementos essenciais surgissem de forma natural (Borges e Santos, 2005).

Foram formuladas quatro questões gerais relacionadas com a literacia em saúde mental nas componentes do reconhecimento da doença mental, comportamentos de procura de ajuda, incluindo barreiras e facilitadores: - Que pensamentos, palavras ou imagens associam à doença mental? - Se estiverem preocupados com o facto de terem um problema de saúde mental, quem procurarão para falar sobre isso? - Que fatores consideram importantes para vos levar a procurar ajuda profissional? - Quais os fatores que consideram poder constituir impedimento para procurar ajuda profissional? As questões específicas integravam um conjunto de pistas que, pelo seu pormenor, permitiam aprofundar as questões ou melhorar a sua explanação. Para explorar a dimensão ‘reconhecimento da doença mental’, para além do guião, foram utilizadas vinhetas clínicas retratando três problemas de saúde mental: depressão, ansiedade e abuso de álcool. A primeira questão era introdutória sendo projetada para envolver os participantes no tema. As restantes três questões eram as fundamentais visando explorar as componentes da literacia em saúde mental em estudo. As sessões foram moderadas pelo investigador principal. As entrevistas foram transcritas e sujeitas a análise qualitativa de conteúdo com o programa Nvivo9. O método de análise, centrado em procedimentos fechados, incluiu categorias pré definidas anteriormente à análise propriamente dita, associadas ao quadro empírico a partir do qual se formularam as questões da entrevista. Os resultados qualitativos são apresentados como resumos descritivos no âmbito das componentes do estudo: reconhecimento, comportamentos de procura de ajuda (incluindo barreiras e facilitadores). ANÁLISE DOS RESULTADOS De seguida apresentaremos os resultados considerando o sistema de categorias emergente das narrativas dos participantes. Serão analisadas as categorias de primeira e segunda geração. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 127


Reconhecimento da doença mental Os enunciados dos participantes na análise às três vinhetas apresentadas (depressão, ansiedade, abuso de álcool) traduzem o recurso ao uso de rótulos adequados como por exemplo ‘tem uma depressão’, ‘sofre de ansiedade’; ‘tem problemas com álcool’, mas também a utilização inadequada de rótulos como ‘estado de espírito passageiro’, ‘esgotamento’, ‘vício’ e ‘stress’ que, pela sua conotação, são inibidores dos comportamentos de procura de ajuda. Ao longo do discurso dos participantes vão surgindo enunciados relativos a outros problemas de saúde mental como ‘esquizofrenia’, ‘baixa autoestima’, ‘distúrbio alimentar’; relativos a caraterísticas de personalidade e problemas comportamentais (e.g. ‘falta de confiança’, ‘problemas de adaptação’, ‘bulling’); e ainda a outros problemas de saúde tais como ‘cancro’ e ‘doença do sistema nervoso’, que são considerados pelos adolescentes como perturbações mentais ou erroneamente identificados nas vinhetas apresentadas. Esta diversidade de respostas representa uma lacuna importante, colocando ênfase na falta de conhecimentos relativamente a estas questões. Comportamentos de Procura de Ajuda Na dimensão ‘comportamentos de procura de ajuda’ foram exploradas três categorias: ‘recursos e opções de ajuda’, ‘barreiras’ e ‘facilitadores’. Recursos e opções de ajuda. A primeira categoria integra as opções dos adolescentes em termos de procura de ajuda e a identificação dos recursos disponíveis. Os adolescentes identificam sete subcategorias sendo a sua maioria referidas de forma transversal na literatura: amigos, familiares próximos, especialistas, médico de família, professores, grupos de autoajuda, bruxa. Destas, duas foram repetidamente retratadas dentro de uma estrutura hierárquica evidenciando uma clara preferência dos adolescentes pelas ajudas informais, traduzida numa maior intenção de procurar ajuda na família e nos amigos do que em fontes formais (ajuda profissional), tal como ilustram as seguintes expressões: “Na nossa geração, as primeiras pessoas a quem se vai recorrer é aos amigos mais próximos e depois à família”; “Podemos procurar ajuda junto de alguém que já tenha passado pela mesma situação, por exemplo, grupos de autoajuda”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 128

As ajudas formais são também consideradas úteis como podemos verificar através da verbalização de uma participante: “Primeiro procuraria um psicólogo e depois, se fosse caso disso, um psiquiatra (…) os enfermeiros especializados também poderiam ajudar”. Contudo, o reduzido número de referências em cada uma das subcategorias mostra uma baixa intenção de procurar ajuda de especialistas. Outra participante refere: “Inicialmente falaria com os pais ou os amigos e através dos conselhos deles, procuraria uma ajuda mais específica, como por exemplo um psicólogo”. Esta narrativa demonstra uma preferência inicial por fontes de ajuda informais mas reconhece também a importância de, em sequência, procurar ajuda profissional. Em ambas as situações anteriores os participantes considerem ser menos útil consultar o médico do que outros profissionais de saúde. Ao longo do discurso verbalizado pelos participantes, surgem enunciados relativos a outros tipos de opções de ajuda. Refere um participante: “Podemos procurar alguém que nos vá ouvir e compreender, mesmo sem ser técnico (…) alguém que não nos vá julgar”. Outro participante residente em zona rural refere: “Há pessoas que poderão ir à bruxa ou à cartomante (…) há pessoas que têm crenças e acreditam que isso resolve”. Estes dois exemplos enfatizam a falta de conhecimento e compreensão das perturbações com desvalorização da importância da ajuda profissional, bem como a existência de crenças que são inibidoras dos comportamentos de procura de ajuda profissional. Barreiras Neste estudo o estigma e alguns fatores associados às caraterísticas do profissional de saúde surgem ao longo das narrativas como as barreira mais importantes na procura de ajuda profissional para problemas de saúde mental. As perceções estigmatizantes estão presentes de forma transversal embora sejam mais evidentes no discurso dos participantes residentes em zona rural. Os dois excertos seguintes são um exemplo. Diz uma participante: “Se precisasse e tivesse que procurar ajuda, teria algum receio do que os outros poderão pensar (…) na sociedade onde estamos inseridos, se eu chegar hoje à escola e disser que tenho um problema mental, vou ser considerada como louca”. Outra participante elabora e antecipa a reação estigmatizante dos amigos: “Eu teria medo da reação dos meus amigos, do seu afastamento, de falarem mal de nós por sermos diferentes”, e acrescenta: “também teria receio de encontrar alguém conhecido que vá divulgar (…) preferia que ninguém soubesse”.


Embora de forma menos vivenciada, os adolescentes residentes em zona urbana também fazem referência ao estigma como podemos verificar pela narrativa de uma participante: “ Os estereótipos e preconceito que acabam por estar associados às doenças mentais podem dificultar a procura de ajuda (…) por essa razão, muitas vezes, numa fase inicial, a pessoa pode querer lidar com a situação e resolvê-la sozinha”. As barreiras relacionadas com o estigma verificam-se sobretudo aquando da procura de ajuda profissional e, na sua maioria, são preocupações com o que os outros poderão pensar, incluindo a própria fonte de ajuda. Fatores associados às caraterísticas do profissional de saúde como ‘preocupações de confidencialidade’, ‘confiança’, ‘personalidade’, ‘profissionalismo’ entre outros, impregnam as narrativas dos participantes, independentemente da sua origem. Os dois excertos seguintes permitem-nos perceber algumas das suas preocupações. Diz um participante: “O profissional de saúde com quem vamos falar pode, por exemplo, ser antipático, fazer juízos de valor sobre o nosso problema ou divulgálo a outras pessoas (…)”, “Gostava que fosse alguém em quem eu pudesse confiar, que conseguisse criar afinidade, fosse compreensivo mas que também fosse ao mesmo tempo direto, uma pessoa aberta mas direta, que dissesse o que está a acontecer”. Facilitadores. Nesta categoria analisamos os fatores que os adolescentes consideram como facilitadores da procurar ajuda. São identificadas quatro subcategorias: ‘acompanhamento’, ‘apoio social’, ‘consciência e aceitação do problema’, ‘experiência prévia positiva’. Os participantes consideram o ‘acompanhamento’ e a ‘experiência prévia positiva’ como os dois principais facilitadores, no sentido em que são mais vezes referenciados. A este propósito diz-nos um participante: “As pessoas não querem ajuda porque têm vergonha mas gostam que alguém os acompanhe (…) eu gostava de ser acompanhado por amigos mais próximos ou familiares, a pessoa sente-se bem ao pé dessas pessoas”. Outro participante elabora e enfatiza a preferência pelo acompanhamento dos pares em detrimento de outras pessoas, como por exemplo os pais. Diz-nos: “Na adolescência os pais não nos compreendem, dizem que é uma fase (…) preferia ir com um amigo da minha idade. Nós também achamos que os pais não estão do nosso lado”.

A ‘experiência prévia positiva’ emerge enquanto facilitador em duas vertentes: a vivência própria e o conhecimento de outras pessoas. Uma participante refere: “se eu tivesse um problema de saúde mental e precisasse de ajuda, inicialmente gostaria de falar com alguém que tenha tido uma boa experiência”. Outros participantes reforçam a ideia e acrescentam os aspetos da motivação que advém do conhecimento de situações e experiências positivas: “Se eu visse que uma pessoa que passou pelo que eu estou a passar, conseguiu ultrapassar e hoje estava bem estava feliz (...) então era sinal que eu também iria conseguir e dar-me-ia força para ir (….) é a prova de que é possível”. Outra participante acrescenta: “Às vezes associamos as doenças mentais a coisas más e dolorosas mas se tivermos uma pessoa que passou por isso e conseguiu superar, vai sempre motivar, se os outros conseguiram nós também vamos conseguir”. Uma participante com antecedentes de problemas de saúde mental diz-nos: “Eu já tive que ir à psicóloga porque não andava bem. A primeira vez não queria ir, foi a minha mãe que me obrigou (…) mas depois até gostei de falar com ela. Agora não custa nada ir e falar dos meus problemas”. Nesta narrativa é a própria vivência que se constitui como fator facilitador. Do discurso verbalizado pelos participantes emergem enunciados relativos a outros facilitadores como o ‘apoio social’ e a ‘consciência e aceitação do problema’. Os dois excertos seguintes traduzem-no de forma clara. Refere uma participante: “Gostava de me sentir apoiado pelos meus amigos, pelo menos aqueles em quem mais confio”, e acrescenta: “(…) é também importante ter o apoio dos pais e até dos professores”. Outra participante, contrapondo e realçando a importância da aceitação do problema refere: “Eu acho que se não houver uma aceitação própria da nossa parte e dizer ‘eu não estou bem’, é muito difícil mesmo com o apoio do pai ou da mãe ou dos amigos”. Diz-nos ainda outra participante: “Eu posso achar que numa fase inicial, sozinha vou conseguir lidar e resolver a situação. Mais tarde irei perceber que não vou conseguir porque é totalmente impossível a uma pessoa que está com distúrbios psicológicos lidar com uma situação deste calibre sozinha. Então aí vou ter que interiorizar que tenho que procurar ajuda”. Este excerto introduz uma variável fundamental na facilitação dos comportamentos de procura de ajuda, a consciência da gravidade do problema e não só da sua existência. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 129


DISCUSSÃO DOS RESULTADOS De seguida serão discutidos os resultados mais proeminentes colocando-os no contexto de revisões e estudos prévios relacionados. Dos resultados do estudo sobressai a dificuldade dos adolescentes para reconhecer as perturbações mentais bem como para identificar os seus sintomas chave, traduzindo-se pelo recurso frequente ao uso de rótulos inadequados, que pela sua conotação, são inibidores dos comportamentos de procura de ajuda profissional. Este dado é sustentado por Wright, Jorm, Harris & McGorry (2007) que nos referem que o reconhecimento e o uso de rótulos adequados é o preditor mais frequentemente associado com a procura de ajuda e tratamento pelos adolescentes. Estudos recentes (Leighton, 2009; Olsson & Kennedy, 2010) têm centrado a sua atenção sobre se os adolescentes têm o conhecimento suficiente para identificar corretamente a doença mental em si próprios ou nos seus pares. As conclusões destes estudos mostram que o nível de reconhecimento das doenças mentais e dos seus sintomas é baixo. Para além disso, o uso inadequado de rótulos, além de traduzir a dificuldade de reconhecimento das perturbações, pode estar relacionado com o estigma e ser um dos fatores associados com a recusa na procura de ajuda (Rose, Thornicroft, Pinfold & Kassam, 2007). Vários estudos sobre comportamentos de procura de ajuda identificam dois tipos de fontes de ajuda utilizadas, as formais (profissionais) e as informais, como por exemplo os amigos e a família (Rosa, Loureiro e Sousa, 2014). Os adolescentes a experienciar problemas de saúde mental deveriam aceder a profissionais e serviços preparados para dar respostas ajustadas e eficazes. Porém, a realidade é outra. Como se verifica neste estudo, os adolescentes desvalorizam as ajudas profissionais e mostram maior intenção de procurar ajuda junto do grupo de pares e noutras fontes informais como a família, os professores e os grupos de autoajuda. Estes resultados relacionam-se de forma consistente com as conclusões de estudos anteriores que revelam que as fontes de ajuda informais são preferidas às fontes formais em todas as idades, e em ambos os géneros (Cotton, Wright, Harris, Jorm & McGorry, 2006). Outro dado relevante e que reforça as conclusões do estudo de Jorm et al. (2007) resulta da desvalorização do papel do médico relativamente a outros profissionais de saúde, ainda que todos sejam considerados úteis. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 130

Estudos realizados com populações de adolescentes identificam dois tipos de barreiras na procura de ajuda: as logísticas e as pessoais (Rosa et al., 2014). Neste estudo, as barreiras pessoais como o estigma e as preocupações sobre os profissionais de saúde, associadas aos constrangimentos de confidencialidade e à confiança, surgem como as principais barreiras na procura de ajuda para problemas de saúde mental. O estigma assume-se como uma barreira importante sobretudo em populações rurais. Este resultado é consistente com as conclusões de outros estudos anteriores, de que o estigma é um fator determinante e contribui para a relutância de muitos adolescentes em procurar ajuda (Rose et al., 2007), afetando mais a busca de ajuda em populações rurais do que urbanas (Scott & ChurHansen, 2008). Uma grande preocupação para muitos dos participantes é a confiança no profissional de saúde e a confidencialidade da informação. Esta preocupação foi identificada em estudos anteriores que concluíram que os adolescentes apresentam maior intenção de procurar ajuda em fontes confiáveis (Rickwood, Dean & Wilson, 2007) e confidenciais (Scott & Chur-Hansen, 2008). As preocupações com a confidencialidade e confiança podem também estar relacionadas com o estigma. Neste caso, o medo da violação de sigilo decorre da vergonha de que a família e os amigos descubram que o adolescente procurou ajuda (Gulliver, Griffiths & Christensen, 2010). O estudo explorou também os facilitadores percebidos na procura de ajuda. Os participantes consideram o ‘acompanhamento’ e a ‘experiência prévia positiva’ como os dois principais facilitadores. Este resultado reforça as conclusões de outros estudos prévios. Numa revisão sistemática da literatura realizada por Gulliver et al. (2010), três estudos examinam os facilitadores e todos mencionam as experiências prévias positivas, sendo também o tema para o qual foi relatado o maior número de facilitadores individuais. O acompanhamento é um fator facilitador que assume uma grande importância no nosso estudo apesar de não ser referido de forma isolada em estudos prévios. Podemos no entanto entendê-lo como parte integrante do apoio social. Esta variável, que também emergiu no nosso estudo, é referenciada de forma reiterada na literatura, em estudos como o de Sheffield, Fiorenza & Sofronoff (2004) ou o de Gulliver et al. (2010).


CONCLUSÕES Este estudo permite concluir que os adolescentes demonstram dificuldades significativas no reconhecimento das perturbações mentais e na identificação dos seus sintomas chave, traduzindo-se, na prática, por comportamentos de procura de ajuda desajustados das necessidades, com desvalorização das ajudas profissionais e preferência por fontes informais como o grupo de pares ou a família. Os resultados da análise revelam que os adolescentes comungam de uma visão que assenta tanto no saber médico da doença como no saber popular, onde o recurso a rótulos inadequados é frequente, traduzindo um desconhecimento efetivo da doença e das suas implicações. Para além das dificuldades de reconhecimento, fatores como o estigma, a falta de confiança nos profissionais de saúde e os constrangimentos de confidencialidade, constituem barreiras no acesso à ajuda profissional. Pelo contrário, há também alguma evidência de que o apoio social e as experiências prévias positivas, enquanto fator promotor da literacia em saúde mental, podem reduzir o estigma, sendo facilitadores da procura de ajuda neste grupo etário. Assim, como implicações, surge a necessidade de criar programas para promover a literacia em saúde mental, por um lado, aumentando os conhecimentos sobre os próprios sintomas e a compreensão dos conceitos associados à saúde mental, por outro, minimizando os constrangimentos associados ao estigma e outras barreiras na procura de ajuda. No entanto, barreiras e facilitadores podem variar entre os diferentes pontos do processo de procura de ajuda. É necessária investigação mais avançada sobre estes fatores e como eles operam em cada nível do processo de procura de ajuda. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Borges, C. & Santos, M. (2005). Aplicações da técnica do grupo focal: fundamentos metodológicos, potencialidades e limites. Revista da Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo, 6(1), 74-80. Coordenação Nacional para a Saúde Mental/Administração Central do Sistema de Saúde (2011). Rede de referenciação hospitalar de psiquiatria da infância e da adolescência. Acedido em http://www.saudemental.pt/ wp-content/uploads/2012/01/Documento-técnico-desuporte-à-Rede.pdf.

Cotton, S. M., Wright, A., Harris, M. G., Jorm, A., & McGorry, P. (2006). Influence of gender on mental health literacy in young Australians. Australian and New Zealand Journal of Psychiatry, 40, 790-796. Galego, C. & Gomes, A. (2005). Emancipação, rutura e inovação: o “focus group” como instrumento de investigação. Revista Lusófona de Educação, 5, 173-184. Gulliver, A., Griffiths, K. M., & Christensen, H. (2010). Perceived barriers and facilitators to mental health helpseeking in young people: A systematic review. Bio Med Central Psychiatry, 10, 113. Jorm, A., Korten, A., Jacomb, P., Christensen, H., Rodgers, B., & Pollitt, P. (1997). “Mental health literacy”: a survey of the public’s ability to recognize mental disorders and their beliefs about the effectiveness of treatment. The Medical Journal of Australia, 166(4), 182-186. Jorm, A., Wright, A., & Morgan, A. (2007). Where to seek help for a mental disorder? National survey of the beliefs of Australian youth and their parents. The Medical Journal of Australia, 187, 556-560. Kelly, C., Jorm, A., & Right, A. (2007). Improving mental health literacy as a strategy to facilitate early intervention for mental disorders. British Journal of Psychiatry, 177, 396-401. Krueger, R. A. & Casey, M. A. (2009). Focus groups: a practical guide for applied research. Los Angeles: Sage. Leighton, S. (2009). Adolescents’ understanding of mental health problems: conceptual confusion. Journal of Public Mental Health, 8(2), 4-14. Loureiro, L., Mendes, A., Barroso, T., Santos, J., Oliveira, R., & Ferreira, R. (2012). Literacia em saúde mental de adolescentes e jovens: conceitos e desafios. Revista de Enfermagem Referência, 3(6), 157-166. Loureiro, L., Mateus, S., & Mendes, M. (2009). Literacia em saúde mental: conceitos e estratégias para a promoção da saúde mental de adolescentes em contexto escolar. Revista de Enfermagem Referência, 2(10), 115. Olsson, D. P. & Kennedy, M. G. (2010). Mental health literacy among young people in a small US town: recognition of disorders and hypothetical helping responses. Early Interventions in Psychiatry, 4, 291-298. Rickwood, D., Deane, F., & Wilson, C. (2007). When and how do young people seek professional help for mental health problems? The Medical Journal of Australia, 187(Suppl. 7), 35-39. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 131


Rosa, A., Loureiro, L., & Sousa, C. (2014). Reconhecimento e procura de ajuda em saúde mental: uma revisão dos estudos realizados em amostras de adolescentes. In L. Loureiro (Coord.), Literacia em saúde mental: capacitar as pessoas e as comunidades para agir (pp. 7791). Coimbra: Unidade de Investigação em Ciências da Saúde-Enfermagem, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra. Rose. D., Thornicroft, G., Pinfold, V., & Kassam, A. (2007). 250 labels used to stigmatize people with mental illness. Bio Med Central Health Services Research, 7, 97. Scott, L. & Chur-Hansen, A. (2008). The mental health literacy of rural adolescents: Emo subculture and SMS texting. Australasian Psychiatry, 16(5), 359-362.

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Sheffield, J. K., Fiorenza, E., & Sofronoff, K. (2004). Adolescent’s willingness to seek psychological help: promoting and preventing factors. Journal of Youth and Adolescence, 33(6), 495-507. Wahl, O. (2002). Children’s views of mental illness: a review of the literature. Psychiatric Rehabilitation Skills, 6, 134-158. World Health Organization (2000). World health report. Genebra: World Health Organization. Wright, A., Jorm, A., Harris, M. G., & McGorry, P. D. (2007). What’s in a name? Is accurate recognition and labelling of mental disorders by young people associated with better help-seeking and treatment preferences? Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 42, 244-250.


21 NORMAS

DE PUBLICAÇÃO DA ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

REVISTA

PORTUGUESA

DE

A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é publicada duas vezes por ano, em junho e dezembro, tratando-se de uma revista indexada em bases de dados nacionais e internacionais. A Revista apresenta, atualmente, as seguintes secções: Artigos de Investigação; Artigos de Revisão (Narrativa, Sistemática e Integrativa) da Literatura; Artigos de Boas Práticas/Reflexão. 1 – Procedimentos de Submissão do Artigo: 1.1 – Submissão eletrónica: os artigos devem ser sempre submetidos eletronicamente no sítio da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental: http://www.aspesm.org/. 1.2 – Para a submissão dos artigos, deverão sempre ser enviados os seguintes documentos: a) Artigo integral, obedecendo às normas da revista; b) Checklist de autoverificação, preenchida na totalidade c) Declaração de Cedência de Direitos de Autor e de Observação dos Princípios Éticos da Investigação, provando que os autores concordam que o artigo, uma vez aceite, fique da propriedade d’ ASPESM, não podendo, por isso, ser publicado noutra fonte, e que foram cumpridos todos os princípios éticos inerentes a um trabalho de investigação. Nota: a Direção da Revista reserva-se o direito de retirar um artigo do processo de revisão ou das bases de dados (no caso dos artigos publicados), sempre que se verifique que os autores publicaram uma versão idêntica noutra Revista. 2 – Processo de Revisão: Os artigos propostos são apreciados num processo Double Blinded (duplamente cego). Neste processo, o artigo é enviado por dois Peer Reviewers (Pares Revisores), os quais o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações que julgarem convenientes. Sempre que não se verifique acordo entre os dois revisores, o Diretor da Revista reserva-se o direito de indicar um terceiro revisor. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a eventual aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação. No caso da aceitação com alterações, os autores receberão os pareceres e recomendações sugeridas pelos Peer Reviewers. O autor deve efetuar as alterações e reenviar o documento, via eletrónica, no tempo regulamentado. Nota: caso não se verifique o cumprimento rigoroso do tempo estipulado para correção do artigo, este pode ser excluído do processo de revisão. Cada artigo será, posteriormente, verificado pelo Diretor e Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. O processo de revisão será efetuado online. As fases do processo de revisão e recomendações encontram-se descritos no quadro abaixo: Fase Receção do Artigo Revisão Reformulação do Autor Verificação Redatorial Publicação

Procedimento Após o envio do artigo, este será submetido a um processo de revisão técnica (revisão dos aspetos formais e de normalização, de acordo com as normas de publicação da Revista). O artigo é enviado para 2 Peer Reviewers, que o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações convenientes. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação, bem como os pareceres e recomendações dos Peer Reviewers. As alterações a efetuar pelo autor deverão ir, rigorosamente, de acordo com as recomendações dos Peer Reviewers. Cada artigo deverá ser verificado pelo Diretor e pelo Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. A oportunidade de publicação é da inteira responsabilidade da Direção da Revista.

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3 – A decisão final acerca da oportunidade de publicação dos artigos é da responsabilidade do Diretor da Revista. 4 – O artigo: 4.1 – Tipo de artigo: devem ser artigos científicos originais e versarem temas de saúde mental, Enfermagem de saúde mental ou educação em saúde mental. O conteúdo dos artigos é da exclusiva responsabilidade dos seus autores, aos quais compete respeitar os princípios éticos da investigação e cumprir as normas da edição da Revista. A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental poderá incluir artigos em língua portuguesa, espanhola, inglesa ou francesa, consoante a origem dos artigos. 4.2 – Estrutura do artigo 4.2.1 - Título: o artigo deverá incluir um título informativo (que vá de encontro ao âmbito do trabalho) e sucinto (em português, espanhol e inglês); máximo de 16 palavras, sem abreviaturas e sem a indicação da localização geográfica da investigação. 4.2.2 - Autores: os autores devem estar devidamente identificados, com o nome, habilitações académicas, categoria profissional, instituição onde exercem funções, contactos (morada, e-mail e telefone institucionais) e informação no caso de o artigo ser extraído de Dissertação ou Tese (indicando o título, ano e instituição onde foi apresentada). O nome e afiliação dos autores deve surgir imediatamente após o título em português. As afiliações devem estar por extenso (ex.: Local de Trabalho – Escola Superior de Enfermagem do Porto). Os endereços de correio eletrónico dos autores dos artigos devem estar com hiperligação (com link disponível). 4.2.3 - Resumo: o resumo do trabalho deve ser apresentado em português, espanhol e inglês, e não deve exceder as 250 palavras, devendo incluir a descrição do contexto, objetivo(s), metodologia, resultados e conclusões. 4.2.4 - Palavras-Chave: o artigo deve apresentar, no máximo, 4 palavras-chave, transcritas de acordo com os descritores MeSH (em português, ver DeCS), em português, espanhol e inglês. 4.2.5 - Corpo do artigo: O artigo (tratando-se de um trabalho de investigação) deve ser estruturado em secções, devendo incluir os seguintes capítulos: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão, Conclusão, e Implicações para a Prática Clínica). Os artigos de revisão e de boas práticas/reflexão não têm que obedecer, necessariamente, a esta divisão. 4.3 - Formato: • O texto deve ser apresentado em formato Word, letra Arial, tamanho 11, espaçamento 1,5, páginas em formato A4, em coluna única, evitando negritos e sublinhados, variação do tipo de letra, fundos de cor, etc.; • Todas as margens devem ter 2,5 cm.; • Não devem ser incluídas notas de rodapé. • O artigo não deve ultrapassar as 15 páginas incluindo resumo (em português, espanhol e inglês), referências, tabelas, quadro e figuras. • O artigo não deverá ser paginado. • Os parágrafos não devem ser indentados. • O artigo deve ser redigido de acordo com o Novo Acordo Ortográfico (caso não o seja, a Comissão Editorial reserva-se o direito de realizar a conversão). Nota: caso o(s) autor(es) se recuse(m) a redigir o artigo segundo o Novo Acordo Ortográfico devem, aquando do seu envio, manifestar essa posição de forma clara e inequívoca. • Na primeira utilização de uma sigla esta deve estar, primeiramente, por extenso, por exemplo: Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). • Quando se realizarem citações de três a cinco autores, todos os nomes devem ser mencionados na primeira vez que a citação é feita (ex.: Bradley, Ramirez, & Soo, 1999). Nas vezes seguintes, deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.” (ex.: Bradley et al., 1999). Caso a citação seja de seis ou mais autores, logo na primeira vez em que a citação é feita deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 134


• No corpo do artigo, ao citar autores coletivos, na primeira vez que a citação é feita, deve ser mencionado o nome por extenso (ex.: National Institute of Mental Health [NIMH], 2003). Nas vezes seguintes, pode ser utilizada a abreviatura (ex.: NIMH, 2003). • Os títulos dos capítulos devem seguir a seguinte estrutura: Nível do Título Formato 1 Centrado, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 2 Alinhado à Esquerda, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 3 Indentado, negrito, em minúsculas terminando com ponto final. 4 Indentado, negrito, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 5 Indentado, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 4.3.1 - Tabelas, quadros, gráficos e figuras: devem ser incluídos apenas os que sejam absolutamente essenciais para a compreensão do artigo e numerados por ordem de inclusão no texto, em função de cada tipo. As tabelas e quadros devem apresentar o título em cabeçalho e os gráficos e figuras devem apresentar o título por baixo. Para tabelas e quadros o tamanho da letra pode ser reduzido até um mínimo de 9 e sem espaçamentos. As tabelas, quadros, gráficos e figuras devem surgir imediatamente após o parágrafo em que é feita referência às mesmas. 4.3.2 - Citações: todos os autores citados no artigo devem constar da lista de referências bibliográficas. Exemplo: Sequeira (2006), (Sequeira, 2006), ou “Em 2006, Sequeira (...)”. Deve indicar-se o número de página, no caso de citação textual, tal como nos exemplos: Sequeira (2006, p. 32) ou (Sequeira, 2006, p. 32). Quando citar dois ou mais autores numa mesma paráfrase, deve ordená-los por ordem alfabética, tal como no exemplo: (Miller, 1999; Shafranske & Mahoney, 1998). Nota: utilizar o símbolo “&” apenas nas paráfrases em que os autores citados sejam de países em que o português não é uma língua oficial (ex.: EUA, Reino Unido, etc.). 4.3.3 - Referências Bibliográficas: • As referências selecionadas devem permitir evidenciar as publicações mais representativas do “estado da arte” da problemática em estudo (últimos 5 anos, extensíveis a 10 anos para problemáticas que tenham sido pouco estudadas), resultando da pesquisa de bases de dados de revistas indexadas nacionais e internacionais. • As referências bibliográficas devem estar elaboradas de acordo com as normas da 6ª Edição da American Psychological Association (APA). Todas elas deverão estar citadas no artigo. • Nas referências bibliográficas, independentemente do número de autores, estes devem ser todos referidos, não sendo permitido o uso de “et al.”. • O título das revistas nunca deve ser abreviado nas referências bibliográficas. Por exemplo, não se deve escrever “RPESM”, mas sim “Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental”. • Sempre que se inclua um site nas referências bibliográficas, a sua hiperligação deve estar presente e funcionante. Nota: as fontes devem ser alvo de seleção criteriosa, em função da sua pertinência, e não devem ultrapassar um total de 20 referências, organizadas por apelido do autor e ordenadas por ordem alfabética. APA 6ª Edição (Exemplos – consultar http://www.apastyle.org/) 4.3.3.1 Modelo de referências (indicar o nome de todos os autores – não usar “et al.”): Livros Shotton, M. A. (1989). Computer addiction? A study of computer dependency. London, England: Taylor & Francis. Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 135


Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Editor literário Barkley, R. A. (Ed.) (2008). Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: Manual para diagnóstico e tratamento (3ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Capítulos de livros Haybron, D. M. (2008). Philosofy and the science of subjective well-being. In M. Eid & R. J. Larsen (Eds.), The Science of subjective well-being (pp. 17-43). New York, NY: Guilford Press. Autor coletivo American Psychological Association. (2010). Publication manual of the American Psychological Association (6ª ed.). Washington, DC: Author. Artigos de publicações periódicas Com DOI Herbst-Damm, K. L. & Kulik, J. A. (2005). Volunteer support, marital status, and the survival times of terminally ill patients. Health Psychology, 24, 225-229. doi: 10.1037/0278-6133.24.2.225 Sem DOI Light, M. A. & Light, I. H. (2008). The geographic expansion of Mexican immigration in the United States and its implications for local law enforcement. Law Enforcement Executive Forum Journal, 8(1), 73-82. Documentos eletrónicos Livros Schiraldi, G. R. (2001). The post-traumatic stress disorder sourcebook: A guide to healing, recovery, and growth [Adobe Digital Editions version]. doi: 10.1036/10071393722 Artigos de publicações periódicas Wheeler, D. P. & Bragin, M. (2007). Bringing it all back home: Social work and the challenge of returning veterans. Health and Social Work, 32(1), 297-300. Acedido em http://www.naswpressonline.org Outros (póster, comunicação livre, etc.) Leclerc, C. M. & Hess, T. M. (2005, agosto). Age diferences in processing of affectively primed information. Póster apresentado na 113ª Annual Convention of the American Psychological Association, Washington, DC. Nota: no caso de os autores serem de países de língua oficial portuguesa, nas referências bibliográficas o “&” deve ser substituído por “e”. 5 – Formato Padrão do Artigo a submeter: Primeira Página • Título (em português, espanhol e inglês) • Nome dos autores (separados por ponto e vírgula); • Afiliações dos autores (uma afiliação por linha); • Indicação caso o artigo seja extraído de Dissertação/Tese. Nota: esta página, posteriormente, é retirada pelo Coordenador da Comissão Editorial, sendo atribuído um número codificado que identifica o artigo junto dos revisores Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 136


Segunda Página • Titulo (em português); • Resumo (em português); • Palavras-Chave (em português); • Título (em espanhol); • Resumen; • Descriptores; • Titulo (em inglês); • Abstract; • Keywords. Páginas Seguintes: • Introdução; • Metodologia; • Resultados; • Discussão; • Conclusões; • Referências bibliográficas; • Apêndices (se existentes), agradecimentos (se existentes), conflitos de interesses (se existentes), fontes de financiamento (se existentes), e contribuições dos autores (se aplicável).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 10 (DEZ.,2013) | 137

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 137


Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental (SPESM)

V Congresso da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2014 18 a 20 de Jun. de 2014

Brevemente estará disponivel no site da ASPESM, informação sobre:

V CONGRESSO INTERNACIONAL D’ ASPESM:

Consensos em Enfermagem de Saúde Mental E Seminário Internacional de Investigação em Saúde Mental

Que se realizarão em Braga entre 18 a 20 de Junho de 2014 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 138


Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental (SPESM)

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 1 (ABR.,2014) | 139

ASPESM


MODELO DE ESTRUTURA DE PROPOSTA DE COMUNICAÇÃO TIPO DE COMUNICAÇÃO (ELIMINE A alínea QUE NÃO SE APLIQUE): 1) Comunicação livre (10’) 2) Póster

TÍTULO: IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES

(Dados obrigatórios: Nome; Local de trabalho (Instituição/Serviço); Contactos (Tel. e Email)

PROBLEMA OU INTRODUÇÃO

(Identificação da situação | Formulação da questão)

OBJECTIVO (S) METODOLOGIA

(amostra; Recolha da informação; Instrumentos; Tratamento de dados/análise)

PRINCIPAIS RESULTADOS CONCLUSÕES

Ref. Bibliográficas relacionadas com o assunto (APA) Nota: Resumo não pode ter mais de 500 palavras (Letra Arial 11, espaço 1,5).

Brevemente submissão online ou enviar para: dir.spesm@gmail.com

ASPESM

MAIS INFORMAÇÕES SOBRE A SPESM EM:

WWW.ASPESM.ORG


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