Caderno -revista 7faces 7ª edição

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A respeito das novelas, em Corcel de fogo, Mario Carelli apontaria que “na novela o que interessa a Lúcio não é tanto o aspecto impressionante de uma cena de pesadelo, mas a possibilidade de enriquecer uma atmosfera e aprofundar o estudo da psicologia dos personagens.” (CARELLI, 1988, p. 117). Não obstante, acreditamos que a cena de terror muito interessa ao escritor enquanto projeção do mal-estar, como homem de cinema e teatro que foi, fato já observado no que tange à sua relação com o decadentismo. Carelli se refere como a análise psicológica – fato tão decantado por vários estudos e artigos sobre o autor – nos leva a repensar tal análise para reconsiderá-la como fruto do interesse de Lúcio em devassar a alma de personagens para apontar seus aspectos mais controversos e provocadores. Lúcio não se fez de rogado ao explorar profundamente os contornos dramáticos (por vezes excessivos e extravagantes) e, de tal modo, que muitas de suas narrativas possuem um caráter eminentemente insólito. A preocupação em enriquecer uma atmosfera, como Carelli acertadamente aponta, leva o escritor mineiro a configurar um caleidoscópio de situações grotescas que beiram o contrassenso. O grotesco nos conduziu até O mito de Sísifo: ensaio sobre o absurdo, de Albert Camus, pela referência óbvia que o livro do pensador faz sobre a absurdidade em seu título. Não obstante, pela leitura do texto de Camus, observamos que o modo com que trata o absurdo é absolutamente distinto e distante do enfoque usual. Procurávamos um conceito; encontramos outro ainda mais fértil e, ao mesmo tempo, absolutamente esclarecedor. O absurdo colocado sob outro prisma, coincidentemente, estabelece a mesma relação sui generis que Lúcio Cardoso possui da absurdidade ao construir suas novelas. O universo absurdo está submetido ao crivo de sua lente expressionista, que intensifica os matizes deste universo alucinatório construído deliberadamente para provocar o leitor e suscitar nele um mal-estar irremediável, o que veremos em todo o presente artigo. Albert Camus inicia o ensaio tendo como mote o suicídio, o ponto nevrálgico que atinge os limites de valoração da existência – lembremos que o suicídio é uma questão onipresente em quase todas as novelas de Lúcio Cardoso. O modo como tal questão se alia à falta de sentido da vida encerra uma atitude autodestrutiva, tão comum às personagens do autor. Camus lembra que o suicídio

7faces – Odirlei Costa dos Santos │ 71


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