Revista Literária Plural nº 3

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Ano 4 – nº 3 – novembro/2008– Rio de Janeiro, RJ

OFICINA Editores

Delgado & Delgado

Av. Mal. Henrique Lott, 270/1111 Rio de Janeiro – RJ – 22631-370 Tel.: (21) 3328-4863 Telefax: (21) 2293-3054 www.oficinaeditores.com.br oficinaeditores@oficinaeditores.com.br Capa:

EDITORIAL

Projeto gráfico: SérgioGerônimo&AlonsoHigino

Conselho editorial: FlávioDórea,FlávioRubens, Glenda Maier,JujuCampbell,Márcia Leite.

Normas de publicação: Normas de publicação: Normas

Revista Literária: PLURAL está aberta a publicações de crônicas, minicontos, entrevistas, ensaios, poemas, traduções, resenhas, roteiros, monografias...

Os textos deverão vir digitados em fonte TNR, tamanho 12, em disquete e cópia em papel. Deverão ser endereçados ao Conselho Editorial.

2008, Centenário da morte do “Bruxo do Cosme Velho” - Machado de Assis - muitas foram as manifestações, por esse Brasil afora, ao nosso escritor-mor, um dos fundadores da Academia Brasileira de Escritores, sendo seu primeiro presidente e nesta publicação vamos encontrar a entrevista do presidente do Pen Clube do Brasil, Cláudio Murilo, que expõe como Machado enriqueceu sua vida literária, à poeta Laura Esteves. Neste ano, outra efeméride tomou conta da agenda literária carioca, o Jubileu de Ouro da União Brasileira de Escritores (UBE/RJ) e Edir Meirelles, seu presidente, fala a Cláudio Aguiar sobre as comemorações ainda sendo realizadas. Stella Leonardos, secretaria-geral da UBE/RJ (desde a sua criação), conversa com Márcia Leite & Sérgio Gerônimo sobre o seu caminhar nas Letras. Encontraremos um conto inédito, saído do baú, do luso-carioca Francisco Igreja (idealizador da Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro – APPERJ). Destaques: para o Festival de Poesia Falada do Rio de Janeiro / APPERJ; posse de novos membros no Pen Clube do Brasil; prêmios obtidos por autores da OFICINA; nossa revista PLURAL participando de uma Mostra de Revistas Literárias. Crônicas, contos, moda, música, ensaio, resenha de livros e muita poesia em todas as páginas. Mais uma vez a Revista Literária vem movimentar o cenário de artes nesta primavera e como de outras vezes, fazendo seu lançamento, literalmente, em movimento. Isto mesmo, em 2004 o lançamento foi ao longo das ruelas do famoso bairro de Santa Teresa, dentro do bonde Paula Mattos, com sarau no bar da Fatinha; em 2006 na travessia da baía de Guanabara, na Barca RioNiterói, com sarau no espelho d’água do Museu de Arte Contemporânea e esta no Trem da Poesia, durante o X Festival Carioca de Poesia (coordenação do Grupo Poesia Simplesmente), no percurso da Supervia entre a estação D. Pedro II (Central do Brasil) e a estação de Marechal Hermes, finalizando com o sarau Via Plural no teatro Armando Gonzaga. “Poetas, namorados, seresteiros é chegada a hora....” Estamos presentes aqui e agora. Sucesso sempre!

Editor Sérgio Gerônimo

TunaBorges Fotolitos: Alonso/prellus
Reproarte
Impressão e acabamento:
Fotografias: SérgioGerônimo,FlávioDórea

Referência em Poesia desde 1985 www.oficinaeditores.com.br

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Site referendado no Diretório Mundial da Poesia da UNESCO desde 2001

Site referendado no Diretório Mundial da Poesia da UNESCO desde 2001 RiodeJaneiro/RJ

ROTEIRO DA POESIA Rio de Janeiro/RJ

1 – TE ENCONTRO NA APPERJ, Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro, OFICINA Editores, Sérgio Gerônimo & Márcia Leite convidam: 2ª segunda-feira do mês, no Bar do Ernesto, Largo da Lapa, 41, começando às 19h, com concurso-relâmpago e boletim literário Deleites. Informações pelos tel.: (21) 3328-4863 / 24470697 ou e-mail: apperj@apperj.com.br

2 – POETA SAIA DA GAVETA – no Reza Forte, Rua Tenente Cerqueira Leite, 7 (próximo à Pça Agripino Grieco). Coordenação de Neudemar Sant‘Anna (apperjiana) e a idealizadora do projeto Teresa Drummond, ocorre toda 2ª terça-feira, de março a dezembro, das 18h às 22h, entrada 5 reais. O rodízio de poesia é acompanhado com música de Maury Sant‘Anna. E no Teatro Armando Gonzaga, Av. Osvaldo Cordeiro de Faria 511, Marechal Hermes, toda 1ª e 3ª terça-feira do mês, de 19:30 às 21h, até 18 de novembro de 2008 (entrada 5 reais, apperjianos 20% desconto). Direção: Teresa Drummond (apperjiana) Coordenação: Neudemar Sant’Anna (apperjiana) Produção Geral: APPERJ & Grupo POESIA SIMPLESMENTE. Informações pelo tel.: (21) 9252-9031 / 8767-0581 ou e-mail: poetasaiada gaveta@gmail.com

3 – TERÇA CONVERSO NO CAFÉ, com o grupo Poesia Simplesmente e seus convidados, toda terça-feira, a partir das 18:30h. No Teatro Glaucio Gill, Pça Cardeal Arcoverde, Copacabana, entrada: R$ 5,00. Informações com Angela Carrocino (apperjiana), no tel.: (21) 2552-8186 ou e-mail: angelacarrocino @hotmail.com

4 – SARAU DO JOÃO E SARAU DO MARQUÊS –coordenação de Gilson Nazaré, Irany de Andrade e Selma Wandersman (apperjiana), última quinta-feira do mês, a partir das 20h, no Rei Caçador, Rua Santo Amaro, 33, Glória. Informações: joaodorio2004 @yahoo.com.br

5 – A POESIA CONVERSA COM O VERSO – no Teatro Arthur Azevedo, Rua Victor Alves, 454, Campo Grande, toda 1ª e 3ª terça-feira do mês, de 20 às 22 h, até 18 de novembro de 2008 (entrada 5 reais, apperjianos 20% desconto). Direção e coordenação: Sonia Abreu (apperjiana). Produção Geral: APPERJ & Grupo POESIA SIMPLESMENTE. Informações pelo tel.: (21) 3336-0932 / 9967-9305 ou e-mail: sonia breu@click21.com.br

6 – AJEB-NACIONAL – Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil, convida para uma tarde de descontração com poesia, música e canto, toda 4ª segunda-feira do mês, às 15:30h, na Confederação das Academias de Letras do Brasil, na Rua Teixeira de Freitas, 5/3o andar. Coordenação de Lourdes Balassiano (apperjiana). Informações pelo tel.: (21) 2235-1508

7 – SARAU CONECTE – no Bar Estilo da Lapa, na Av. Mem de Sá, 127, entre as ruas Gomes Freire e Inválidos. 2ª quinta-feira do mês, às 19:30h. Coordenação de Barbara-Ella Jovanholi (apperjiana) e Carlitos. Apoio: OFICINA Editores. Mais informações pelo e-mail: novosuivos@hotmail.com Ver programação www.novosuivos.blogspot.com/2007/07/ nova-1.html

8 – CHARAU – 2ª quinta-feira do mês, a partir das 18h, no SEERJ, roda de poesia, com o lançamento de livros, na Rua Heitor Beltrão, 353, Praça Saens Peña. Coordenação de Angela Carrocino (apperjiana), Elmo Rama Gomes e Luiz Lima. Mais informações pelo e-mail: angelacarrocino@hotmail.com

9 – ENTARDECER DE POESIA & ARTE – a ALAP, Academia de Letras & Artes de Paranapuã, faz sua reunião toda 2ª segunda-feira do mês, na CONFALB, Confederação das Academias de Letras do Brasil, Rua Teixeira de Freitas, 5/3º andar, Lapa, a partir

das 15:30h, com coordenação de Eliane Mariath (apperjiana). Mais informações pelo telefax: (21) 22933054 ou e-mail: alap.rj@ig.com.br

10 – CIRCUITO LITERÁRIO CONVERSA COM VERSO – itinerante, último sábado do mês, a partir das 16h, Campo Grande. Coordenação: José Maria. E-mail: conversacomverso@yahoo.com.br

11 – POESIA NOS ARCOS – atenção todas as tribos poéticas! Vamos celebrar a poesia, a música, o teatro no local mais poético da Capital da Poesia –a Lapa. Nilton Alves assim o fez durante 5 anos (começando em julho de 2001), agora que o poeta é poema eterno, vamos a cada ano festejar a sua passagem pelos Arcos em grande estilo. Tributo ao poeta NILTON ALVES (apperjiano), 07 julho de 2009, 19h, Lapa/Rio/RJ. Coordenação Gladis Lacerda (apperjiana) & Sérgio Gerônimo (apperjiano). Informações: apperj@apperj.com.br

12 – CHÁ DOS POETAS – leitura de poemas pelos seus autores. Coordenação de Antonio Alberto, na AAFBB – Associação dos Antigos Funcionários do Banco do Brasil, na Rua Araújo Porto Alegre, 64/10° andar, Centro. Toda 2ª quinta-feira do mês, às 15h. Entrada: R$ 3,00, com direito ao chá completo. Mais informações pelo tel.: (21) 2262-8317, fax: (21) 2262-2817.

13 - POEMAS & CANÇÕES - último domingo do mês, a partir das 14h, no Bar Papo de Esquina, Rua Antonio Storino, 161, Vila da Penha. Coordenação: Paulo Peres. Poetas, compositores, músicos apresentam peculiares trabalhos sobre a música e a poesia brasileira. Informações pelo e-mail: pauloperes@poemasecancoes.com.br

14 – SERESTA E POESIA – organização de Belmiro Ferreira, toda última 5ª-feira do mês, na Biblioteca de Botafogo, Rua Farani, 53, das 14 às 17h, com apoio da Associação dos Amigos da Biblioteca de Botafogo. Mais informações pelo e-mail: belmirof@ uol.com.br

15 – TODAS ELAS & ALGUNS DELES – evento poético da APPERJ, idealização de Márcia Leite, supervisão de Sérgio Gerônimo, no CEDIM, Rua Camerino, 51, Centro, às 16:30h, um enfoque da voz feminina na poesia contemporânea. Poetas convidados. Mais informações pelos tel.: (21) 3328-4863 / 2447-0697 ou e-mail: apperj@apperj.com.br

16 – CLUBE DA POESIA – poetas comentam e estudam seus poemas, ciranda de poesia, 1ª quintafeira do mês, meses ímpares das 16 às 18h, meses pares das 15 às 18h no SEERJ, na Rua Heitor Beltrão, 353, Praça Saens Peña. Coordenação de Dartagnan Holanda (apperjiano) e Carlota Duarte (apperjiana). Mais informações pelo tel.: (21) 25692938 ou e-mail:carlotahd@terra.com.br

17 – SARAU NA CASA – Quinta Cultural apresenta “o ponto de encontro das artes”, apresentação de Gilberto D’Alma, poesia, performances teatrais, apresentações musicais e de dança, sebo do sarau, toda 2ª quinta-feira do mês, a partir das 20h, entrada franca. Local: Casa de Cultura Elbe de Holanda, rua Eng. Rozauro Zambrano, 302, Jardim Guanabara, Ilha do Governador. Contate pelo tel.: (21) 2466-0061. Mais informações acesse www.cceh.com.br ou email: divulgacao@cceh.com.br.

18 – POEXISTÊNCIA POESIA – ocorre no 2° sábado do mês,das18às20h,noEspaçoPersonaTerapiasCorporais,naRua Santo Afonso, 44/501,próximo à Praça Saens Peña. Um poeta homenageado, um poeta convidado, que será entrevistado, uma curta apresentação de um músico convidado e espaço aberto para todosospresentesdizeremseuspoemas.CoordenaçãodeAntonio Sciamarelli, Roberto Woo e Claudio Lima Carlos. Mais informações pelo e-mail: poexistencia@yahoo.com.br

19 – RATOS DI VERSOS – ocorre quinzenalmente na quinta-feira, às 20h, no Beco dos Carmelitas, próximo ao Beco dos Ratos, Lapa, com a presença dos Ratos de carteirinha: Dalberto Gomes, Carluxo, Marcelo Nietzsche, Juliana Hollanda, Dan Magrão e Dudu Pererê. Mais informações pelo blog ratosdiversos.blogspot.com ou pelo email: ratosdiversos@gmail.com

20 – SALÃO POÉTICO DA AABB – ocorrerá às 16h, no Salão Margarida, da Associação Atlética Banco do Brasil, Av. Borges de Medeiros, 829, Lagoa. Coordenação de Eurídice Hespanhol (apperjiana), Regina Gonzales, Evelyn Esteves e Marcelo Ottoni. Para inscrições ou informações os telefones são: (21) 2274-4722, Biblioteca do Clube ou email: ehm.pessoa@gmail.com.

21 – SARAU POESIA EM MOVIMENTO – semestralmente, a partir das 16h, Centro de Estudos da Criança, na Rua Arquias Cordeiro, 614/201, Méier. Coordenação de Rosa Prista (apperjiana) e apresentação de Valéria Coelho. Informações pelo tel.: (21) 2269-6572 ou e-mail: poesiaemmovimento @encontresenocec.com.br

22 – POESIA NO PAÇO D’ARLEQUIM – o Grupo de Humanização Poética (Juçara Valverde –apperjiana, Ricardo Sant’Anna Reis – apperjiano, Rosivaldo Pereira e Eurídice Hespanhol –apperjiana) e a Livraria ARLEQUIM, do Paço Imperial, com o apoio da APPERJ e do Movimento Poetas Sem Fronteiras, no 2° sábado do mês, a partir das 15h, na Livraria Arlequim, Praça XV de novembro, 48, Paço Imperial, Loja 1, Centro. Momento musical; personalidade literária; roda poética; poeta convidado; momento performático; projeto vitrine; sorteio de livros. Informações: (21) 91709004 / 9955-5835 ou e-mail: poetasdarlequim @gmail.com

23 – POESILHA ACONTECE – artistas, cantores & poetas encontram-se na 3ª terça-feira, no Restaurante Farol da Ilha, Praia da Bica, 1191, Jardim Guanabara / Ilha do Governador, a partir das 19h. Coordenação de Áureo Ramos (apperjiano). Mais informações pelo e-mail: aureoramosr@bol.com.br

24 – POESIA, VOCÊ ESTÁ NA BARRA (POVEB)–coordenação de Mariangela Mangia e Aluizio Rezende (apperjiano); 1ª sexta-feira do mês, no condomínio Novo Leblon, Av. das Américas, Km 7, Barra da Tijuca, em frente ao Shopping InfoBarra, a partir das 19h. 3ª quinta-feira do mês, a partir das 18:30h, no SEERJ, na Rua Heitor Beltrão,353, Praça Saens Peña. Apoio: APPERJ. Mais informações pelo email: marimangia@yahoo.com.br

25 – POETAS SEM FRONTEIRAS – evento para libertação dos textos engavetados e dos talentos reprimidos. Toda manifestação literária ou musical será muito bem-vinda, haverá luaus também, na praia do Recreio dos Bandeirantes. Coordenação: Valéria Bersot, Shirley Vanhaes, Eurídice Hespanhol (apperjiana), Juçara Valverde (apperjiana), Ricardo Sant’Anna (apperjiano) e Vânia Moraes (apperjiana). Apoio: APPERJ. Mais informações pelo e-mail: ehm.pessoa@gmail.com

26 – TROVAS & + TROVAS – realização da Academia Brasileira de Trovas, coord. da presidente Messody Benoliel (apperjiana), 1ª terça-feira do mês, na CONFALB, Rua Teixeira de Freitas, 5/3° andar, Lapa, a partir das 16h. Mais informações pelo email: mebenoliel@yahoo.com.br

27 – POESIA NO LEME (POLEM) – todo domingo, das 17 às21h,juntoàPedradoLeme,calçadão.Poetasconvidados,clássicos e contemporâneos. Agitação de: Eduardo Tornaghi, José Calazans,MarceloMourãoeGutman(apperjiano).Informações: (21) 2542-2364 ou e-mail: eduardotornaghi@yahoo.com.br

28 – CORUJÃO DA POESIA – UNIVERSO DA LEITURA – coordenação: João Luiz de Souza. Uma iniciativa artístico-cultural extensionista da UNIVERSO – Universidade Salgado de Oliveira, na Letras & Expressões, Av Ataulfo de Paiva, 1292, Leblon, das 23:50h às 4h da madrugada, toda terça-feira. Poetas e público presente podem dizer poemas de suas próprias autorias ou de seus autores prediletos. A entrada é franca. Mais informações pelo email: a.cultura@nt.universo.edu.br

29 – O PRAZER DA POESIA – 2ª quarta-feira do mês, das 16 às 19h, Amélia Brasil & Espaço Cultural Siberarte, na Rua Uruguaiana, 18, 3° and, Centro. Coordenação: Zelia Fernandes. Poetas, compositores, músicos se apresentam. Informações pelo e-mail: ameliabrasil@click21.com.br

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ROTEIRO
DA POESIA

Cláudio Aguiar entrevista Cláudio Aguiar entrevista Cláudio Aguiar entrevista Cláudio Aguiar entrevista Cláudio Aguiar Edir Meirelles Edir Meirelles Edir Meirelles Edir Meirelles Edir

Em 1958, um grupo de escritores brasileiros fundou a União Brasileira de Escritores no RiodeJaneiro.Aentidade,quelogoganharia jurisdição nacional, passou a ser o principal centro de defesa das atividades do escritor brasileiro. Ao completar 50 anos de vida associativa, a UBE-RJ está comemorando o seu Jubileu de Ouro. Seu presidente, escritor Edir Meirelles, goiano radicado no Rio de Janeiro há várias décadas, membro da Academia Carioca de Letras e do PEN Clube do Brasil, nos fala, entre outros temas, sobre a trajetória da UBE-RJ ao longo de seus 50 anosetambémdasperspectivasquenortearão o futuro da entidade. Cláudio Aguiar – Qual o significado do Jubileu de Ouro da UBE-RJ?

EdirMeirelles–OfatodaUniãoBrasileirade Escritoreshaverchegar aos cinqüenta anos, ter ultrapassado períodos turbulentos da história do Brasil, sobrevivido aos chamados “anos de chumbo” e se manter intacta, por si só é uma grande vitória. Muitossãoosmotivosde alegriaerazãoparacomemoraroJubileudeOuro. Este cinqüentenário é uma prova viva da luta heróica,deresistênciaculturaldosintelectuais brasileiros.Umaluta independente em favor da cultura, promovendo encontros culturais, estimulando a criatividade apesar do descaso dos poderes públicos. Estão de parabéns, não somente a UBE-RJ, mas todas nossas congêneres possuidoras do mesmo galardão. O Jubileu de Ouro é a coroação de uma luta vitoriosa. É um convite aos escritores para novos momentos de atividades. Neste ano jubilar, promoveremos inúmeras atividades culturais.Faremosumbalançodopassadocom osolhosvoltadosparaofuturo.

CA – Quais os principais marcos da UBE/RJ ao longo de sua história?

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EM – A meu ver, a principal marca da UBE-RJ foi a resistência ao arbítrio. Antes que a entidade completasse o seu primeiro triênio, o Presidente Jânio Quadros nos doou, por decreto, uma sala no Palácio Capanema. Era um ponto de referência e local de encontro e confraternização dos escritores. Nos primórdios da ditadura a sala foi retomada por meio de um simples memorando. Ficamos ao léu, sob chuvas e temporais mas, sobrevivemos. Durante alguns anos promoveu o “Festival do Escritor Brasileiro”, iniciativa de Jorge Amado, que se transformaria, mais tarde, nas atuais Bienais do Livro. A continuidade e a manutenção de concursos literários anuais da UBE, sem interrupção nesses 50 anos, é outro marco. Nesse período foram revelados inúmeros autores novos e consagrados outros escritores notáveis. Ressalte-se os Prêmios Fernando Chinaglia da UBE-RJ que marcaram época. Mas, o que melhor caracteriza essa firmeza de propósitos é a presença contínua de dois nomes compondo a diretoria da entidade desde sua fundação: Antonio Olinto e Stella Leonardos – eleitos ícones do Jubileu de Ouro por unanimidade da atual Diretoria da UBE.

CA – A UBE-RJ ultima a edição de sua revista Renovarte. Qual a linha editorial a ser mantida?

EM – A revista Renovarte é parte intrínseca do projeto de revitalização da UBE-RJ, que carecia de um órgão de divulgação da entidade e motivasse a aglutinação dos escritores. Objetiva divulgar seus feitos, valoresculturaisesuagrandiosidadehistórica. Levar aos associados a importância da casa quePeregrinoJúnioraoladodeJorgeAmado, Stella Leonardos, Antonio Olinto, Josué Montello, Octávio Faria, Eduardo Portela, nos legaram. Portanto, a linha editorial da revistavisaaressaltarahistóriadaagremiação, divulgar os escritores da atualidade, balizar o futuro, incentivar a cultura literária, defender os interesses do idioma e dos escritores.

CA – Como, onde e quando ocorrerão os eventos comemorativos do Jubileu de Ouro?

EM – Os eventos e solenidades do Jubileu de Ouro se darão no decorrer do ano de 2008. Já iniciamos com palestras em homenagens a todos os presidentes que dirigiram a instituição. Em junho, uma

palestra será proferida pela professora Helena Ferreira, em memória do saudoso Fagundes de Menezes. Nos meses subseqüentes os demais dirigentes serão homenageados. Faremos o lançamento da revista em julho, em grande estilo. Entretanto, o ápice dos eventos ocorrerá no dia 27 de agosto, data do surgimento da Casa de Peregrino Júnior. A cerimônia será no Teatro R. Magalhães Jr., da ABL em solenidade festiva marcando o cinqüentenário. Haverá outorga da medalha Jorge Amado a autoridades e personalidades do mundo cultural, além da entrega do Troféu RIO – Personalidade Cultural de 2008 – ao vencedor da eleição a ser feita brevemente. Espera-se que o ilustre poeta Ferreira Gullar, ganhador do Troféu em 2007 (foto), possa estar presente para transmitir a insígnia ao novo titular. No mesmo espaço cultural da ABL, promoveremos a festa de premiação dos vencedores do Concurso da UBE-RJ 2008, em outubro próximo. Outro momento de grande significado: a UBE promoverá nos dias 23 a 25 de setembro o Congresso Brasileiro de Escritores de Língua Portuguesa em parceria com a Academia Brasileira de Filologia (ABRAFIL), o Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Lingüísticos (CiFEFIL), a Faculdade CCAA, além do inestimável apoio da Academia Brasileira de Letras (ABL), cujo Presidente, Cícero Sandroni, fará a conferência de abertura sob o tema: A herança machadiana.

CA – Quais os planos para o futuro da entidade?

EM – Antes mesmo de assumirmos a direção da entidade, propusemos a atualização dos Estatutos da União Brasileira de Escritores (UBE-RJ). Dinamizá-la, é a nossa intenção. A chapa única levou o nome de Renovação –não somente no sentido de inovar, mas, sobretudo, no de revigorar a instituição e ampliar seu quadro social. Queremos ousar e abrir espaços para os novos, promover o debate sobre a situação do escritor e o direito autoral, ombrear com outras instituições que visam ao fortalecimento do idioma e lutar pela democratização

cultura, de modo que todo cidadão possa ter acesso aos livros.

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da Ferreira Gullar recebe troféu de Dorée Camargo, auxiliada por Tobias Pinheiro, sob aplausos de Edir Meirelles
UNIÃ UNIÃ UNIÃ UNIÃ UNIÃO BRASILEIRA DE ESCRIT O BRASILEIRA O BRASILEIRA DE ESCRIT O BRASILEIRA O BRASILEIRA DE ESCRITORES COMEMORA ORES COMEMORA ORES COMEMORA ORES COMEMORA ORES COMEMORA
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Entrevista

Nofundodasala,portrásdagrande mesa dos acadêmicos vejo uma mulher alta, pele claríssima, bonita, cabelos negros arrumados sob uma fita larga e vermelha (da mesma cor do casaco) encimando a testa. É Stella Leonardos, carioca da Gávea, poetisa, professora, ficcionista, romancista, ensaísta, escritora de literatura infantil em prosa e verso, teatróloga, tradutora e atual presidente da Academia Carioca de Letras. É fundadora e secretária-geral da União Brasileira dos Escritores há

cinqüenta anos. Desde muito jovem traduziu obras do catalão, espanhol, francês, inglês, italiano e provençal (tarefa que executou até 1971) e aos 19 anos lançou seu primeiro livro de poesia, Passos na Areia. Em 1945, aos 22 anos, teve sua peça teatral Palmares encenada pelo grupo “Teatro do Estudante”, de Paschoal Carlos Magno, na inauguração do Teatro Experimental do Negro. Publicou até hoje mais de cem livros.

Stella recebe-nos com um abraço caloroso. Elogia meus olhos, vê beleza em mim, expressando isso com a generosidade que só as mulheres satisfeitas com elas mesmas conseguem. Seus comentários diminuem meus receios iniciais frente à tarefa de entrevistá-la; eu, uma iniciante no caminho das palavras, buscando as desta mulher, integrante da terceira geração do movimento modernista e uma de nossas mais premiadas escritoras.

Alguns dos inúmeros prêmios de Stella: 1957 – Rio de Janeiro RJ – Prêmio Olavo Bilac de Poesia, pelo livro Poesia em 3 Tempos, concedido pela Academia Brasileira de Letras/ 1961 – Rio de Janeiro RJ – Prêmio Júlia Lopes de Almeida, pelo livro Estátua de Sal, concedido pela Academia Brasileira de Letras/1964 – Rio de Janeiro RJ – Prêmio Nacional de Poesia pelo livro Geolírica, concedido pelo Instituto Nacional do Livro e pela Editora Porta de Livraria/1975 – Rio de Janeiro RJ – Prêmio Casemiro de Abreu, pelo livro Romançário, concedido pela Secretaria de Educação e Cultura/1986 – São Paulo SP – Prêmio Bienal Nestlé de Literatura Brasileira, 3º lugar na categoria poesia, pelo livro Romanceiro da Abolição/2001 – Barcelona (Espanha) – Prêmio Batista I Roca concedido pelo Institut de Projecció Exterior de la Cultura Catalana/ 2001 – Belo Horizonte MG – Prêmio de Poesia Centenário de Henriqueta Lisboa, com a obra Mítica, concedido pela Academia Mineira de Letras, concurso instituído em homenagem ao centenário de nascimento de Henriqueta Lisboa.

“Há uma estranha tendência de distanciarem os poetas da seriedade. Parecem acreditar que vivemos nas nuvens.” Aos nove anos de idade foi iniciada, através da mãe Alice (30 anos, na época), na arte de ‘ouvir estrelas’:

– Mamãe, como é que a gente vira escritora?

– Ouvindo estrelas.

– Você ouve?

– Ouço. Por isso você se chama Stella: estrela.

Escolhe uma estrela para você ouvir também.

– Aquela ali meio azulinha. Pronto. Ela se chama Alice.

– Você ouviu essa Alice?

– Ouvi. Ela contou que se chama Alice por que você escreveu um livro chamado “Ouvindo estrelas”.

– Que bom. Vou contar ao Olavo Bilac.”

Entrevista

(Alice Leonardos da Silva Lima é autora do livro de contos ‘Ouvindo estrelas’, lançado pela Academia Brasileira de Letras)

Aos onze anos, Stella escreveu seu primeiro poema. “Hoje considero isso uma coisa mística. Tinha respondido mal à minha mãe, não consigo lembrar ao certo porquê, e me arrependi muito. Só fiquei livre desse sentimento ao escrever um poema, a lápis, e alfinetar a folha em seu travesseiro para que ela pudesse lê-lo assim que chegasse. Aí consegui dormir! Acordei no meio da noite com um beijo emocionado de minha mãe que disse: – Já temos poetisa em casa.”

Um dos passeios prediletos, quando criança, com o avô (que ‘vivia’ em bibliotecas) era à livraria do ‘velho Quaresma’. E foi ele, ‘o velho Quaresma’, quem presenteou a menina Stella (na época com oito anos de idade) com a Antologia de Ouro da Literatura Brasileira (que ela decorou!).

O francês era a segunda língua na casa. E foi nesse idioma que Stella leu Shakespeare, aos oito anos de idade (“uma coleção lindíssima de meu avô, com ilustrações de Gustave Doré”).

A avó sentava a pequena Stella à sua frente, lhe ensinava a cerzir meias (“com aquele ovo de madeira enfiado dentro delas” ) e conversava em francês com a menina para que ela adquirisse fluência no idioma ( “Eu, distraída com a conversa, cerzia tudo com uns pontos enormes...”). Neta de Rosa Maria, autora de A Arte de Comer Bem, diz gostar muito de cozinhar, principalmente pratos da culinária espanhola. E finaliza o assunto, dizendo: “Fomos muito mal acostumados em relação à comida. Comíamos sempre muito bem lá em casa”.

Com sua avó aprendeu a arte do bordado, a delicadeza dos pontos (cita o petit point), a engenharia de esticar um pedaço de pano fino num pequeno bastidor para receber as cores e as formas.

Nesse momento não deixo de reparar nas mãos de Stella, delicadas, sem manchas, e me surpreendo com a beleza e a aparência jovem delas, apesar dos seus 85 anos de idade. Mãos atemporais, acostumadas à magia da transformação.

Conto ter lido em uma de suas entrevistas que Stella considera a genética como fator primordial da sua vida literária. Ela confirma.

Oriunda de uma família de artistas, historiadores e poetas, diz que são os livros que a escrevem ‘uma coisa meio fora de controle’, ‘as palavras parecem vir de um outro lugar’, e completa: – É a parte que me coube aqui. Prosa ou poesia? –Poesia. A poesia é um’ caudal’.

– Escrevo sempre ouvindo música. Não vivo sem música. Espiritualista, segue o Deus Único do Ecumenismo. Ela acredita no Deus de Alegria e Amor, e detalha as influências religiosas e filosóficas que recebeu de sua família (retrato do Brasil): “Ortodoxos gregos, anglicanos, católicos, protestantes suecos, uma tia Kardecista e meu avô Positivista”. Diz que em suas conversas com Deus pede sempre a prática do Perdão, e cita: “Piedade é fraqueza, Caridade é força.”

E vai além: “Gostaria de ter tido a capacidade de ser uma cristã convicta. O Mandamento, na minha opinião, poderia ter sido apenas ‘Não faça ao próximo aquilo que não gostaria que fizessem a ti mesmo.’ Se todos o seguissem o mundo alcançaria seu propósito original”

“A função da Beleza é a de sublimar as inutilidades e tornar as pessoas mais felizes”

Como conheceu seu marido? – “Eu não o‘conheci’; ele me conheceu! Foi numa festa beneficente em SP, no ano de 1944.

Stella Leonar dos

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Márcia Leite e Sérgio Gerônimo conversam com Stella Leonardos

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Eu tinha escrito o libreto e era a mestre de cerimônias do espetáculo. Eu trocava de roupa toda hora, como pedia o roteiro, desempenhando minha parte com entusiasmo e não podia imaginar que na platéia estava aquele que seria meu marido.”

O mundo estava em guerra, e o médico e pesquisador Alejandro J. Cabassa, porto-riquenho residente nos EUA, veio ao Brasil pesquisar nossas plantas e seus efeitos curativos. Encantou-se de tal maneira com a jovem Stella que conseguiu, através de um amigo do consulado americano (e só essa parte da história já daria um romance), a permissão do pai dela para visitá-los em casa, no Rio de Janeiro, e declarar suas intenções. Stella aguardava a visita daquele estrangeiro que ‘se encantara por ela’ com grande curiosidade e alguma ansiedade. Vestiu um tubinho preto “com um decote discreto” e ficou aguardando. Como não o conhecia, a primeira pessoa que avistou, quando seu pai chamou-a à sala de visitas, foi o tal funcionário do consulado, e, por alguns segundos, decepcionou-se acreditando ser aquele o moço. Olhando mais à frente percebeu o outro homem, sentado num dos sofás e, ela, também, encantou-se com “aquele homem grande e gentil”, assim que o viu. Ele conquistou toda a família e suas primeiras palavras (quase sussurradas) para Stella foram “jo voy a casarme con usted.” Ele foi para os EUA e quando a guerra acabou, sete meses depois, voltou ao Brasil e marcaram logo o casamento. Foi um amor à primeira vista (apesar de ‘primeiras vistas’ em tempos distintos) que durou mais de 40 anos. Casaram-se, pouco tempo depois, na igreja onde o avô de Stella era pastor e ela embarcou para os EUA acompanhando o marido.

Eu pude ver, claramente, nos olhos de Stella a felicidade que conheceu durante todos os anos do casamento. E a partir desse trecho de nossa conversa, Stella intercalou palavras e uma ou outra frase em espanhol. A lembrança do marido – “Alejandroeragenial, fantástico.” – permaneceu no seu olhar, até o final da entrevista.

‘Não sou eu quem canta o Rio é o Rio que canta em mim.’

Stella é apaixonada pelo Rio de Janeiro – “O Rio sempre foi meu coração e minha coragem –. Quando Sérgio Gerônimo pergunta se sente saudade da cidade dos anos 40, ela responde: –Só da convivência com os entes queridos, que hoje já não estão mais aqui.

Mora hoje, com uma irmã, na mesma rua onde nasceu, Marquês de São Vicente, na Gávea, numa casa que fica em frente ao casarão da família, onde, hoje em dia, moram os padres da PUC. Lamenta que os padres não tenham respondido a seu pedido de visitar a antiga casa. E diz: “Não precisaria entrar na casa, entendo que é a privacidade deles, gostaria de pelo menos caminhar um pouco pelos jardins.”

Algum arrependimento do não feito, alguma tristeza pelo não conseguido? – Sim (ela responde, com olhar distante) Lamento muito não ter tido filhos para poder repartir Alegria com eles. Não ter tido tempo de praticar mais a caridade, por ter me dedicado totalmente à Literatura

Projeto Brasil

“O número impressionante de poemas épicos publicados por Stella, por conta de seu Projeto Brasil, faz-nos relembrar o projeto nacionalista de José de Alencar e é índice revelador de o quanto a contribuição das escrituras produzidas por mulheres está aquém do reconhecimento crítico necessário.” Chris Ramalho

...”Ah... por que os compêndios de História não são escritos por poetas?” Carlos Drummond de Andrade

Entrevista

Estimulada por Drummond e Cassiano Ricarto, o Poeta, Stella Leonardos começou a dedicar-se aos romanceiros e ouviu de Gilberto Mendonça Telles: “Isso não é mais um romanceiro. Isto já é um projeto: Projeto Brasil.” Esse Projeto Brasil deu-nos belíssimas e incontáveis páginas da história do país. Suas personagens exuberam em força, convicção, e, é através de Stella que melhor nos aproximamos dessas heroínas e heróis brasileiros. E na voz de Anita Garibaldi (exatamente em Anita Marinheiro, no diálogo abaixo, tão bem destacado por Chris Ramalho em seu ensaio sobre Stella Elas escrevem o épico, Florianópolis: Ed. Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2005), em Romanceiro de Anita e Garibaldi, Stella nos revela uma mulher, Anita, que transgride e deseja “ir além das limitações normalmente impostas às mulheres”. – Me ensina a guiar o veleiro./– Não te basta ser bem guiada,/Anita meu benquerer?/– Não. Me ensina a pilotar/pelas bússolas e estrelas./Haverá mal em saber?/ (Giuseppe: fica a meu lado/ que me sinto renascer).

Quando pergunto se ela considera a UBE uma espécie de ‘mãe’ do movimento poético como o temos agora, ela responde: – Antes da fundação da UBE só existia mesmo a Academia Brasileira de Letras. Após um desentendimento entre Drummond e Dalcidio Jurandir, houve uma cisão na entidade e fundamos a UBE. Stella, totalmente envolvida pela causa da mulher, criou e consegue manter, desde 1992, o Prêmio Alejandro J. Cabassa, concedido pela UBE, para livros escritos só por mulheres, em todos os gêneros. E ao lhe perguntar (voltando ao comentário feito por Manuel Bandeira – membro do júri, além de Cassiano Ricardo e Drummond de Andrade – quando Stella ganhou o “Prêmio Porta de Livraria / Instituto Nacional do Mate: — Bravo, Stella! Como você está escrevendo bem! Pensei que você fosse o Suassuna, ou o João Cabral de Melo Neto. Você está escrevendo feito um homem!) sobre a diferença da literatura feita por mulheres hoje em dia em relação à de décadas passadas, ela diz: “As mulheres leram mais, estão mais bem informadas, melhoraram a literatura. Isso também ajudou a mudar a visão dos homens sobre elas”

“A vida é uma coisa maravilhosa. Eu gosto!”

Um dos pontos mais interessantes da conversa com essa grande escritora foi perceber seu real interesse pelo outro. Em diversos momentos ela inverteu os papéis e parecia ser a entrevistadora. Queria nos conhecer melhor, saber sobre nós.

Falou-nos de sua expectativa (e alguma dificuldade) em publicar Romanceiro de Anita e Garibaldi em italiano (traduzido por Amélia Sparano). Elogiou o livro Panínsula, de Sérgio Gerônimo, lembrou de Francisco Igreja e concordou com a opinião de SG: “Ele deve estar por aí fazendo outras coisas.” Perguntou sobre meu estilo de escrita, se eu havia levado algum livro meu e se fui ‘precoce’. Entendi, sorri e respondi que sim. Naquele momento era como se fôssemos duas meninas e, em pensamento, desejei poder carregar o peso da precocidade com, pelo menos, metade da leveza e competência daquela outra – infinitamente mais precoce, ali, ao meu lado – que lera Shakespeare em francês aos oito anos de idade, e que, mais de sete décadas depois, sorria, bela, serena e realizada (tanto quanto um ser inteligente consegue ser por aqui), para a vida.

O que Stella não sabe é que enquanto caminhávamos de volta ao estacionamento, após a entrevista, a cidade me pareceu muito mais iluminada, e posso jurar que estrelas nos observavam, escondidas por trás das nuvens cinza-inverno no céu de final de tarde.

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Márcia Leite e Sérgio Gerônimo conversam com Stella Leonardos

Poeta Cláudio Murilo

Como aconteceu o seu encontro com a Poesia?

– Meu avô era poeta. Com mais de 80 anos, cego, ditava para mim, que tinha 12, poemas que ia criando no escuro da sua memória. Na noite em que ele morreu, corri para a sua escrivaninha e escrevi o meu primeiro poema: “A Morte”. Hoje, com quase 20 livros publicados, parece que ainda escrevo os poemas que ele medita e me dita lá do espaço espiritual.

O que você busca quando escreve?

– Busco o Outro. Porque a mim mesmo, sei que jamais me encontrarei.

Como você define seu processo de criação poética?

– Escrevo somente em momentos de extrema Paz ou de insuportável Angústia, energias que arrastam a minha mão para o poema.

chamar-se “Arte e ótica” na sua posterior transcrição no livro de poemas reunidos Módulos. O poema está modificado, pois o que eu queria dizer saiu muito hermético na primeira versão. Na segunda, finalizo com os versos: “Fotografia./Natureza, retrato,/ papel carbono do real.” Eu estava pensando na oposição aos quadros de Mondrian, em que a obra se torna autônoma e independente da realidade. Ao contrário, a obra fotográfica, isto é, realista, privilegia a mímesis do mundo e não a sua recriação.

No livro “As Guerras Púnicas” você destaca logo no início, seus poetas preferidos: Ezra Pound, Maiakowsky, entre outros. Porém lendo os seus textos nos deparamos com Pessoa, Bandeira, “o poema do beco”, Borges... Como estes escritores influenciaram sua obra?

Solidão, Solidão, Açude da Solidão... é o fim inexorável do ser humano?

– A solidão foi o começo. O jovem, e ainda mais poeta, é um ser solitário. Hoje, sou solidário. Amo as pessoas do Bem.

É preciso, antes e sempre, reformar o homem (“Poema das Reformas”). Fome, Luta, Reformas, Camilo Cienfuegos...O que você acha da poesia engajada?

– Marx e a poesia engajada queriam reformar a sociedade e, com isso, reformar o homem. Freud era cético, pensava que não havia como consertar a alma humana. Creio que é preciso melhorar o que está por aí. Mas não sei como começar: se pelo ovo ou pela galinha.

No livro “A velhice de Ezra Pound”, você presta homenagem a Frederico Garcia Lorca com um belo poema. A Espanha, sempre a Espanha! Conte para nós sobre o seu tempo em Madri, quando dirigiu a Casa Brasil.

Fora a poesia, o que existe de real para você?

– Menos Ezra Pound, envolvi-me apaixonadamente com todos. Pound é vazio, sem rumo, sem luz ou idéias próprias. Um sanguessuga das obras alheias.

– As pessoas que eu amo. E meu Anjo da Guarda.

O que você acha da frase de João Cabral: “não é com a emoção que se faz arte?”

– A emoção é o motor de arranque. Depois que o poema pega, anda e é escrito, vem a arte, o trabalho de artesanato, a técnica, que evitam que o poeta fique molhando com lágrimas a folha em branco e achando que está fazendo poesia.

Poesia; reflexão, resposta ou indagação?

– Deve ser reflexão e indagação. Da poesia, ainda não recebi qualquer resposta.

A Pessoa

Qual é o seu grande medo?

– Meu medo é que tudo, a vida, ter sido em vão.

A idéia da morte lhe causa sofrimento,como isso aparece em sua obra literária?

– A certeza da morte me faz ficar olhando o mundo com os olhos bem abertos. Não me canso de ver as mesmas coisas, ler os mesmos livros, deixar a vida entranhar no meu corpo. Gostaria que aparecesse como no poema “Sobrevivente”, do livro O poeta versus Maniqueu. Sobrevivi a tantos sustos e intempéries que, estar vivo, é um milagre. No entanto, no poema “Morte”, escrevo: “Única via certa / no mapa da vida incerta.”

Os livros e os poemas

Arte e Natureza é o nome de um poema de seu livro “Catarse”

Qual a sua relação com a natureza?

– Engraçado, o poema “Arte e natureza ” que aparece no livro Catarse, passou a

Não preciso pensar, não preciso trabalhar, não preciso andar... Esse super-homem, também, não precisa amar?

– Não precisar fazer nada é escrito no registro irônico. Mas no fundo é meu desejo zen.

Sobre o amor, o que você nos fala? A amada não está, foi fazer compras?

– Tenho um poema que repete ad nauseam “Tanto amor / tanto sofrimento. É o quadro amoroso da juventude. Hoje o sofrimento não está mais ligado ao meu sentimento de amor.

Sabemos que João Cabral detestava música. Em seus poemas você cita Mozart, Bach, Bob Dylan, a nona sinfonia, Pixinguinha, João da Baiana... por aí afora. Qual a importância da música para você? (Machado de Assis amava a música, não é verdade?)

– Toquei saxofone na casa do Pixinguinha, em Ramos. Quando entrei para a Faculdade de Letras, abandonei a música (como executante). Mas acho que a poesia lírica é antes de tudo: – música. Machado colocou a música no seu currículo de autodidata para completar a sua formação de homem civilizado.

E brincar de Tarzan, ainda é a melhor sugestão? (poema “The End”)

– Tarzan foi, para mim, o bom selvagem, o companheiro de infância, aquele que me inspirava um sentimento de liberdade. Admirava-o por sua força selvagem, liberto da influência de pais, professores, religião: um animal humano sem super-ego. O grito de Tarzan foi a minha catarse de menino.

– Passei dez anos na Espanha. Ainda estou ruminando no que ela me modificou. Claro, culturalmente Espanha e Europa me enriqueceram enormemente. Mas não sei se, no cerne do meu ser, algo tenha se modificado. Somos resultado de nossas circunstâncias agindo sobre nós, como escreveu Ortega y Gasset? ou somos nós e nós, eu e eu?

Você escreveu sobre o suicídio: ato de coragem?

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– Escrevi um livro 13 poemas suicidas. Mas nunca pensei em suicidar-me. Foi uma postura de poeta dramático. Transferi para as personagens suicidas, as minhas dramatis personae, as sensações que imaginei elas teriam tido em seus momentos finais. Como se eu fosse um autor de teatro, eu estava fora do palco onde se desenrolavam as ações. Kandinsky, Picasso, Chagall, Cézane... Poesia e Artes Plásticas. Muitos poetas fazem esta ligação. Como este processo acontece com você?

– Vendo, admirando as obras de arte dos museus de Europa e dos Estados Unidos. Eles criavam, para o olhar, um frisson parecido com a leitura de um poema.

Você afirma num poema que Poesia é arte de minorias (“Minorias”). Mas fala também que é denúncia, é pão e razão de viver. Afinal, qual o papel da Poesia no mundo atual?

– Não sei qual o papel da poesia no mundo. Todos os dias me faço essa pergunta.

“Missão Lever”, “Este poema é um comercial”, “Ode à loucura”, “Fausto e a estátua”, “Central Park”... ironia... humor perplexidade ou denúncia?

– É. São essas as palavras (e sentimentos)

Entrevista

Revista Literaria: Plural —— 6 ´
Laura Esteves Entrevista Cláudio Murilo

que eu gostaria que transpirassem destes poemas: ironia, humor, perplexidade e denúncia.

O poema “Vitrines” é um inventário de coisas, uma ode ao consumo (1984)... Estamos em 2008, que tal completar este inventário? O que mudou? Ou nada mudou? O que você acrescentaria?

– Podemos colocar mais uns “chips” no poema. A parafernália que a pósmodernidade está inventando é infinita. Neste momento, é muito bom eu estar escrevendo estas linhas no computador para enviá-las, depois, a você, pela Internet. Mas Machado de Assis escrevia um bilhete para José de Alencar com pena de pato, e um moleque ia entregá-lo no Alto daTijuca. Mas ele escrevia melhor do que os novos internautas.

“Visão do mundo”, sobre NY, lembroume Lorca. De propósito?

– “Visão do mundo” escrevi no topo de uma das torres gêmeas. Foi um poema premonitório. Senti que aquele cenário não ia durar

livros de aventuras da coleção “Terramarear”.

Múcio Teixeira escreveu no Jornal do Brasil que “Machado como poeta é medíocre e monótono, repetindo em excesso palavras como flor”. Outros acham que a Poesia de Machado de Assis é um subproduto da sua excelente ficção. O que você acha dessas informações?

Quanto à poesia de Machado, comecei a apreciá-la na Universidade de Essex, Inglaterra, em 1968, quando dava aulas de Literatura Brasileira. Os alunos não ficaram interessados na poesia dos modernistas. Os ingleses têm uma tradição de poesia narrativa. Quando li os poemas de Machado, que desenvolviam uma estória, tinham um plot, como “Pálida Elvira” ou “Círculo vicioso”, os estudantes adoraram. Comecei, então, a rever a poesia do Machado e passei 32 anos escrevendo uma tese de doutorado, defendida na Academia Brasileira de Letras, mas vinculada à UFRJ, onde fui professor

a vida. O réquiem dedicado a ela é um dos poemas mais comoventes da nossa literatura.

Petronilha é um mistério. Mas estou prestes a resolvê-lo. Esperem a próxima entrevista.

...A mulher é um cata-vento, Vai ao vento, Vai ao vento que soprar; Como vai também ao vento Turbulento Turbulento e incerto o mar

Sopra o sul; a ventoinha Volta asinha Volta asinha para o sul... (“As ventoinhas”/fragmento)

Estes versos são de Machado, mas poderiam ser de Quintana? O que você acha?

Machado tem poemas leves e brincalhões, como Mário Quintana. Todo bom poeta sabe encontrar e exprimir o lado lúdico da vida e da arte. Poesia também é jogo e divertimento.

E a derrubada do Monroe... doeu? Achei o máximo você transformar aquele episódio em Poesia.

– Os crimes doem. Foi um atentado à História, ao nosso povo, apesar do mau gosto arquitetônico do Monroe. (Palácio Monroe, Cinelândia, Rio, RJ).

Projetos

Fale sobre seus futuros projetos literários.

– Quero escrever ensaios que me levem a uma compreensão do mundo, dos homens e da arte. Estou entendendo muito pouco das coisas que estão rolando por aí. Não sei se é um problema meu, do Brasil ou do nosso mundo.

E o Pen Clube? Quais os projetos?

– Projetos para o PEN: olho para a ponta do meu sapato e tenho mil idéias. Uma ou duas consigo realizar. Quero trazer os jovens para o PEN, criar núcleos nos Estados, publicar uma Revista, fazer uma Feira de Livros, promover leituras dramatizadas, gostaria de aproximar autores e público. Mas, reunir numa sala pessoas debatendo cultura, como estamos fazendo, já é gratificante.

Machado de Assis

O encontro com Machado, como aconteceu?

– Minha mãe me deu as obras de Machado, com uma encadernação verde, da editora Jackson, quando eu tinha 14 anos. Foi muito estranho ler Machado naquela época. Tudo muito diferente dos

Ouvidor, Gonçalves Dias, Matacavalos, Confeitaria Colombo... a paisagem do Rio de Janeiro em seus poemas, os caminhos de Machado de Assis. Explique esta coincidência, por favor.

Nostalgia de um passado que não vivi. Muita coisa contada por meu avô, amigo de Machado, que escreveu A boêmia do meu tempo, um livro que narra fatos da vida dos intelectuais nos começos do século passado, quando a literatura era “o sorriso da sociedade.”

Fale sobre a importância da obra poética de Machado.

A exemplo de Machado de Assis, você acha que esquecer é importante?

Acho um preconceito dizer que um bom ficcionista não pode ser, também, um bom poeta. Borges, Mário de Andrade, Thomas Hardy foram excelentes prosadores-poetas.

Machado é o equilíbrio. Nem as paixões românticas nem a obsessão com a fôrma da forma, a rima rica, a chave de ouro, a métrica perfeita. A poesia de Machado passou incólume pelo Romantismo e pelo Parnasianismo. Ele escreveu uma poesia com uma dicção própria, reflexiva e mesmo filosófica. A vertente narrativa foi muito forte na conformação do seu estilo. Se seus começos não mostraram um talento acima da média dos poetas de sua época, em Ocidentais apresenta uma das melhores poesias do século XIX.

Agora, vamos para as fofocas: para qual amor Machado escreveu os “Versos a Corina?” E quem foi Petronilha?

Corina parece ter sido uma paixão juvenil. Carolina, a grande companheira de toda

O fato de ter sido jornalista influenciou a escrita de Machado?

O jornalismo firmou a mão do escritor Treinou-o. Muitos escritores se perdem com o trabalho diário na imprensa. Machado foi bastante forte para não se contentar com a glória fugaz das crônicas, do nome estampado no jornal. Ele buscava as letras que o levaram à imortalidade.

vista

Podemos afirmar que Machado é precursor do movimento parnasiano?

Não. Machado foi uma ilha, sem antecedentes ou descendentes. Os estudiosos dizem que isso não existe nas histórias das literaturas. Mas acho que foi um pouco por aí.

Dona Maria José Barroso Pereira, dona da chácara onde Machadinho viveu; Maria Inês, a madrasta; Carolina, a esposa. O escritor foi cercado por mulheres fortes e decididas. É verdade? De que forma isto aparece na sua obra?

As mulheres de Machado na vida e na ficção demonstramfortespersonalidades.Capituera mais mulher do que Bentinho homem. Ardilosa, sedutora, madura. E ainda Virgília, de Memórias póstumas, Flora, de Esaú e Jacó, Sofia, de Quincas Borbas.

Cláudio MuriloPres. do Pen Clube do Brasil. Seu mais recente sucesso o livro Toda poesia de Machado de Assis.

Entrevista

Revista Literaria: Plural —— 7 ´
Laura Esteves Entrevista Cláudio Murilo

Convido você, leitor generoso, a conceder-me seu valioso tempo — verdadeiro pecado nos dias de hoje — e examinar comigo o inquieto e paradoxal momento que vivemos e o esforço para encontrar o papel que cabe a cada um de nós neste caleidoscópio pós-moderno.

O Sujeito da Pós-modernidade

O Sujeito da Pós-modernidade

Nada é estático. Tudo se move como, aliás, sempre se moveu. Na pós-modernidade tudo continua a se mover, porém num ritmo outro; o movimento se turbilhona e se espirala numa pulsação tão acelerada que não parece possível à percepção humana captar a mesma visão

duas vezes. No olho desse furacão, a sociedade busca freneticamente acompanhar o ritmo alucinante desse movimento, que já torna velho o que recém-surgiu. E se antes o mundo andava para frente — ou para trás, segundo os mais pessimistas —, hoje ele traça múltiplos caminhos que se entrecruzam e enredam o sujeito numa co-autoria inexorável. Dentro da efemeridade e fugacidade desse caos, os sujeitos desse tempo precisam se organizar. Alguns conseguem. Inocentes e inofensivos. Aparentemente...

Palavra de Olhar

Por mais que eu ame as palavras E me dedique com esmero A torná-las fiéis significantes Do que me acode ao espírito, E me vire do avesso Em intermináveis tentativas De mostrar-me ao direito, Nada há Como ler As palavras invisíveis Do discurso do meu olhar Sem parar, me pergunto Se é bom Ou faz sofrer, Ser dono de olhar tão falante E ter que buscar febrilmente Alguém que o queira ler. Não importa o que prometa, Estrelas cadentes, planetas, Suaves e doces instantes, Feéricos, pulsantes momentos, Mais tudo que se possa imaginar, De pouco ou nada vale O cristal do meu olhar

Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio

Um Dia

Ninguém se sente co-responsável? não? é a tendência simplista de sempre, a que usamos para dormir... mas cada dia é novo um repensar é bem-vindo mesmo que os olhos ardam sufocados pelo escuro de nossos amanheceres mesmo que o coração dispare desconcertado de medo de que a flecha arremeta e se perca em terra amiga e que um dia, que era para ser belo, desperte com um encarnado pôr-do-sol.

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Cristina Abrantes
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Sangue e Cinzel na Obra de Pedro Grossi *

Todos os dias, seus olhos perscrutadores se abrem para o mundo. Suas mãos hábeis anseiam pelo movimento. O que o espera, ninguém sabe. Uma hipnotizante tela em branco ou o branco asséptico de um centro cirúrgico? Não importa, desde que o mundo pare e o mágico momento se faça para que exerça a sua arte.

Em meio ao frio silêncio da sala estéril, quebrado apenas por sussurros e pelo tinido de metais, ele se concentra em restaurar a Humana Obra. Vermelhos, brancos, amarelos, as cores não são seu arbítrio.

A ele cabe, tão somente, recolocá-las na harmonia previamente decidida. Obedientes, seus instrumentos se encaixam em suas mãos, como se delas fossem parte orgânica, trabalhando com paciência e perícia para que tudo volte a ser perfeito. Ao fim desse ato minuciosamente calculado, o lacre que tinge o avental e as luvas lhe garante que sua arte tornou o mundo menos miserável.

No silêncio de seu ateliê, infindáveis janelas se abrem para receber os mais multicoloridos ruídos da pós-modernidade. A sala se deixa invadir pelo caos vertiginoso e instigante do tempo que se vive agora e que, fielmente, suas mãos instalam na poderosa concretude de cada peça. Nada parece o mesmo ao segundo olhar, de tal maneira que é impossível determinar quantos trabalhos ele produziu. Obra a obra, suas mãos operárias suscitam questionamentos que se sucedem de forma implacável. Não há como resistir às promessas de sua arte, a todo um mundo de novas e impensáveis dimensões espaço-temporais e, muito especialmente, a essa generosa oferta de co-autoria. Ao fim dessa delirante mistura que atrai e envolve inexoravelmente o observador, a paleta ensandecida e a mão machucada pelo cinzel lhe garantem que sua arte tornou o mundo menos miserável.

* Artista Plástico e Cirurgião Ortopédico

E então, caro leitor, consegue dormir com todo esse ruído? Trate de acordar ligeiro e pensar ainda mais rápido, pois nestes tempos de agora, o bonde sempre passa ontem...

Mas não se desespere porque

Eu desejo

Eu desejo

Que você seja capaz de degustar As pequenas coisas da vida Tão imprescindíveis como Ouvir o farfalhar das folhas de outono Apreciar o passeio suave da chuva Nos vidros da sua janela Ver o verde verdinho da grama Brincar com o desenho das nuvens Falar com os duendes da floresta Ficar com o nariz vermelho de frio Deixar-se acariciar pelo vento

Mergulhar na maciez da água morna Comer brigadeiro na panela Ser pego pelo sono no sofá da sala Espreguiçar-se no fofo dos travesseiros Roubar cerejas e beijos E todas as coisas bobinhas Que o dia-a-dia nos dá, Esperando que entremos no jogo E façamos da vida Uma troca feliz.

CRISTINA ABRANTES nasceu na cidade do Rio de Janeiro, tendo formação na área biomédica pela UNIRIO e na área de humanas, Letras (Português/Literaturas), pela UERJ. Revisora e produtora de textos em prosa e poesia. É membro da APPERJ.

Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio Ensaio

Revista Literaria: Plural —— 9 ´
CRISTINA ABRANTES

VIOLÊNCIA: VIOLÊNCIA: VIOLÊNCIA: VIOLÊNCIA: há antídoto na Educação?

A temática da violência, nesta época em que falamos tanto em PAZ, nos cerca em todos os momentos de nossa vida. Haverá possibilidade de mudança?

Sejamos a mudança que queremos ver no mundo Sejamos a mudança queremos ver no mundo Sejamos a ver Gandhi Gandhi Gandhi Gandhi Gandhi comunicação de massa exercem “uma iniciação cultural” pois, se lê pouco, se reflete menos ainda e nos deparamos, em nosso país, com quantidade assustadoradeanalfabetosfuncionais,conceituados como os que lêem e não entendem, são incapazes de emitir uma opinião a respeito do que terminaram de ler

Negar não é mais possível. O mal parece triunfar por todos os lados: internet, vídeos, reportagens, livros, todos os meios enfim são usados. Estaremos sem enraizamento e abertura para que a tão falada paz, continue voando para longe de nós, inalcançável à sociedade e à cada ser? A separação gente do bem e do mal parece com os dias contados. A cada estudo, a cada acontecimento observa-se o bem e o mal aparecendo na mesma pessoa. Não há (ou Não haverá) mais eleitos?

Acondutahumana,emplenoséculoXXI,ainda é uma incógnita para o grande público. O campo das interações sociais onde sujeitos se encontram para falar, discutir, negociar e buscar entender a vida de relação, obedece ao campo das emoções e não da razão. Precisamos do especialista que nos conduzirá nos meandros, na busca científica para entender como a realidade social constrói os símbolos que povoam nosso cotidiano e nos movem a esta ou aquela ação, por vezes tão desconcertante para o observador...

O mal muitas vezes praticado por razões de Estado e encoberto por causas ditas... nobres, não é aceitável sendo porém de certa forma assimilável. Por outro lado quando se trata de instituições milenares como a família, a escola, torna-se extremamente difícil de “metabolizar”. O mal intramuros, o mal doméstico, que envolve indefesas pessoas, movimenta o eu mais interno, o núcleo de defesa da integridade do ser. Nos assusta a sua prática. Ficamos indefesos. É uma ferida da humanidade inteira que se expõe. A representação social visa investigar como explicar as imagens, símbolos e representações que circulam e dão forma aos saberes que uma sociedade desenvolve sobre aquilo que ela teme ou deseja.

Os estudiosos buscam aprofundar, para a população que vive, também num mundo permeado de sinais onde os meios de

Seria preciso voltar a aprender a ouvir o outro, saindo do atual modelo egótico de educação. Biografias, valores permanentes da humanidade, ouvir diferentes opiniões sem se defender nem agredir o outro podem ser práticas, novamente usuais nas escolas do Brasil. Porém lembremos: nada muda se as pessoas não mudam! Há diferenças que precisam ser vivenciadas , desenvolver a auto-estima sem danificar o outro pois, para o outro cada um de nós é... o outro!

O século XXI, o século do cérebro, estuda a natureza e a química do amor em laboratórios, centros de pesquisa. Andamos chocados: nunca tivemos tanta informação sobre nós mesmos e continuamos sem saber como lidar com as emoções destrutivas. Caberia um desafio à sociedade: é possível crescer sem violência ou estamos impotentes frente ao avanço da agressividade, uma de nossas características animais?

Pesquisa inovadora foi levada a efeito por Helen Fischer, antropóloga e professora universitária. O amor seria um instinto tão poderoso quanto a fome, tendo dentre seus ingredientes básicos a intimidade intimidade intimidade intimidade intimidade, conceituada como: calor humano, proximidade, conexão e vínculo. O mal romperia esta cadeia e a saúde mental se deterioraria.

Estamos feridos, de luto. Enquanto sociedade precisamos de palavras, de metamorfose e de transformação. Aprender a guardar o equilíbrio, a atitude justa. Como a educação educação educação educação pode nos ajudar a abrir o mínimo de nossos atos à presença do amor e da compaixão? Como ter esperança, atitude básica na educação, frente aos acontecimentos diuturnos?

Professores são seres de esperança! Professores são seres de esperança! seres esperança!

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Ensaio DinaFrutuoso
Dina Frutuoso Dina Frutuoso Dina Frutuoso Dina Frutuoso Dina Frutuoso – Professora Doutora da UFRJ/FE – Conselheira da Associação de Diplomados da UERJ/FE. Coordenadora da Comissão 3ª Idade, ABRAPA. Criadora e coordenadora do Projeto Escola – Barra/Barra da Tijuca/RJ. Diretora do Núcleo/Barra da Sociedade de Cultura Latina do Rio de Janeiro e Delegada da SCLRJ. 1º lugar 1996/SBGG/RJ. Psicóloga Clínica. Autora premiada pela Editora Litteris e ZMF Editora. Seu mais recente sucesso: A IDADE DO SABER (auto-ajuda, Leo Christiano Editorial).

MEMORIAL

DO INFERNO MEMORIAL DO INFERNO

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DO INFERNO MEMORIAL DO INFERNO MEMORIAL DO INFERNO

ASagadaFamíliaAlmeidano ASagadaFamíliaAlmeidano ASagadaFamíliaAlmeidano Jardim do Éden Jardim do Éden Jardim do Éden Jardim do Éden Jardim ,, , autoria V autoria autoriaV V autoria V autoria Valdeck aldeck aldeck aldeck Almeida

de Jesus Almeida de Almeida de Jesus Almeida de Almeida de Jesus

“Na casa de Dona Dete e seu Chico a gente morria de rir. A dona da casa e o marido, toda vez que viam os atores Tony Ramos e Elisabete Savala ficavam falando: “André Cajarana e Carina estão tão diferentes...”, se reportando aos personagens vividos na novela Pai Herói por aqueles atores. Dona Dete e Seu Chico não conseguiam separar a realidade da ficção e faziam a maior confusão entre a vida dos atores e os vários personagens vividos por eles durante as novelas”.

Assim como Dona Dete e Seu Chico, personagens reais, deste romance verdade, o leitor também irá confundir, em alguns momentos, a impressionante história de Valdeck Almeida de Jesus, este brasileiro, funcionário público federal nascido em Jequié, na Bahia, que conta a saga de sua família que se afronta com todo tipo de dificuldades financeiras como falta de moradia, carência de escola básica, deficiência de tratamento médico-odontológico, além da fome. Mas mesmo contra todas as barreiras essa família guerreira procura vencer os obstáculos, com fé no futuro até conseguir atingir os objetivos estabelecidos, como Valdeck nos conta nesse livro, cuja renda obtida com a venda será totalmente destinada às Obras Assistenciais de Irmã Dulce, o dia-a-dia da batalha pela sobrevivência, com o intuito de incentivar outros brasileiros a acreditarem no país e a lutarem por seus objetivos. Este é um exemplo de vida que pode servir de estímulo para muitos jovens das nossas grandes cidades, que ao invés de estudarem e acreditarem em um sonho, se dirigem deliberadamente pelos caminhos da droga e da violência.

Vale a pena conferir este texto de fácil leitura que, além das belas lições de vida que o autor nos proporciona, a renda obtida com a venda do livro irá contribuir para garantir a continuidade e a qualidade, daquilo que lhe faltou na infância, ou seja: o atendimento gratuito em saúde, educação e assistência social, hoje proporcionada pelas Obras Assistenciais da Irmã Dulce.

RESENHA por Grocoski

Não há como tornar fácil o que é difícil, mas pode-se tratar temas difíceis com clareza. É assim neste livro autobiográfico, que Valdeck Almeida de Jesus narra a história de sua família, abrangendo sua mãe, seu pai e sete irmãos, onde conta passagens de momentos difíceis, como aquela em que “a comida variava de pão seco com café preto a pirão de farinha com água fria. Muitas vezes dormíamos com fome, acreditando no que minha mãe dizia: “amanhã Jesus vai trazer comida”. Eu me irritava e xingava muito, pois todos os dias eu ouvia a mesma história e Jesus nunca chegava com a comida prometida.”

Autobiografias existem em abundância, algumas de primorosa qualidade literária, valor pessoal e importância documental. Todavia, um atributo indispensável à autobiografia está contido na vitalidade da sua narrativa, e na intensidade do ambiente social que cerca o seu autor, desvendado pela força da sua palavra. Valdeck Almeida de Jesus não almejou somente narrar a sua história, de sua família e todos os desafios que presume a procura da felicidade. Ele quis contála a outros brasileiros como ele, com o objetivo de despertar-lhes a consciência para que acreditem no país e a que lutem por seus objetivos.

Mostra-nos as asperezas da vida, seus riscos e conseqüências, e de como enfrentar os desafios com valor e dignidade, protegendo a sua integridade e defendendo os seus direitos: direito à informação e educação, direito a uma adequada assistência à saúde, direito à solidariedade, direito à vida, como faz a Obra Assistencial da Irmã Dulce, para onde Valdeck Almeida de Jesus faz questão de direcionar toda a renda resultante da venda deste livro.

É incontestável a importância deste testemunho e, seguramente, o leitor não resistirá à empatia de um documento

aprazível e que se compreende com facilidade, à originalidade do seu autor e também personagem, juntamente com sua honestidade e ousadia de defender as próprias idéias além de suas experiências, conflitos, desilusões e realizações.

Estamos diante da odisséia de uma família residente numa cidade do interior da Bahia, que, por causa de sua renda baixa, enfrenta dificuldades de toda ordem, como falta de moradia, falta de alimentação, falta de escola básica, falta de tratamento médico-odontológico, mas onde nunca faltou a esperança, pois ao contrário das pessoas de poucas perspectivas, essa família guerreira venceu os obstáculos, com fé no futuro até conseguir atingir os objetivos estabelecidos, como Valdeck nos conta nesse livro, a fim de incentivar outros brasileiros a acreditarem no seu país e a lutarem por seus objetivos.

Hoje, contrariando todas as expectativas, Valdeck Almeida de Jesus, venceunavida,sendoumfuncionáriopúblicofederalelembra,nummisto de orgulho e nostalgia o jovem pobre, cuja mãe era paralítica e o pai portadordemúltiplasdoençasqueoincapacitavaparaotrabalho.Afamília deValdecknãotinha casa própria, e nos faz emocionar ao ler... “Eu tentei conseguir ferramentas emprestadas para construir a casa: picareta, enxada, formão e colher de pedreiro, mas ninguém me emprestou. Tive que comprar tudo o que precisava para construir uma casa. Todos os dias eu ia trabalhar no Frisuba e meus irmãos saíam do Pau Ferro para o Mandacaru para limpar o terreno, carregar água do rio de Contas e bater adobes de barro. Era uma maratona de mais de dez quilômetros, percorridos a pé, sob o sol escaldante de 40 graus ou mais. Fazia pena, pois eles nem conseguiam carregar a picareta por causa do peso. Eu não podia ajudar todos os dias pois quando eu chegava do trabalho já era no final da tarde, além do mais, eu estudava à noite. Nos finais de semana eu ia para o terreno para ajudar na construção da casa. Fizemos tudo sozinhos, desde as fundações até colocar as telhas no telhado.

Foram longos anos de trabalho até poder entrar na casa e sorrir feliz de ter onde morar, uma casa própria, construída com as próprias mãos. Foi uma sensação muito boa, sensação de liberdade. A gente sempre tinha morado em casas de aluguel, desde minha infância, e finalmente, aos 22 ou 23 anos de idade, podia estar em uma casa que ninguém poderia dar ordens. A casinha tinha três metros de largura por seis metros de comprimento. Era bem baixinha e tinha somente dois cômodos. Depois dividimos a “sala” com uma meia parede para fazer uma pequena cozinha. Passamos a morar em nossa casinha, após entregar a casa de aluguel.”

O amor de sua mãe fez com que a família permanecesse unida até que cada um dos seus membros pudesse sobreviver por si só. Mesmo após a morte da mãe, em junho de 2000, a família continuou unida e cada um de seus componentes sempre encontra um tempo para visitar os demais e para compartilhar os momentos de alegria e/ou de tristeza.

Momentos tristes como aqueles na infância que, por força da necessidade, se obrigavam a pedir esmolas, mas que culmina com a alegria de durante uma viagem para São Paulo, em 2003, para onde Valdeck levou seu irmão Gal, sua esposa Eliana, a sobrinha Paulinha e o filho Junior, e... “na viagem de volta, uma cena me chamou a atenção. Na verdade, eu já tinha visto esta cena várias vezes, nas minhas idas e vindas de Salvador para Jequié. Mas eu queria mostrar para Junior e para Paulinha. Havia pessoas sentadas à beira da rodovia, com a mão estendida. Paulinha me perguntou o que as pessoas estavam fazendo naquela posição. Falei que estavam pedindo esmolas. Ela, surpresa, me perguntou o que significava “esmolas”... Sorri para meu irmão e para minha cunhada e expliquei a ela do que se tratava. Afinal, eu tinha muita experiência naquilo...”

Valdeck Almeida de Jesus, brasileiro, solteiro, funcionário público federal, nascido a 15 de fevereiro de 1966 em Jequié/BA, onde viveu até aos seis anos de idade, indo residir na Fazenda Turmalina, onde continuou a estudar até os 12 anos de idade. Aluno exemplar e agora, nosso professor, pois nos ensina, entre tantas coisas, que se deve ter sempre uma atitude positiva diante da vida e deixar esta imagem transparecer para os outros.

Valeu a pena ler este livro...

www.galinhapulando.com,

Revista Literaria: Plural —— 11 ´
RESENHA
Luiz Antônio Grocoski, professorluizantonio@terra.com.br, teletrabalho@terra.com.br Site do livro: linkdolivronoexterior Memorial do Inferno,traduzidoparaoinglês,nosEstadosUnidos:http://www.iuniverse.com/bookstore/ book_detail.asp?isbn=0-595-48247-3 Professor Luiz Antônio Grocoski

Lili,aEstreladoMar,infanto-juvenil,14x21cm,28pág,Katia Pino,OFICINAEditores,2007,RiodeJaneiro,Brasil PRÊMIOADOLFOAIZEN/2008,1°lugar:LiteraturasInfantileJuvenil,UniãoBrasileiradeEscritores/RJ. Estelivrotocaocoraçãodacriançaedoadulto,atravésdesuas lindas analogias sobre a existência das duas únicas escolhas da vida: a verdade e a ilusão. Kátia consegue passar em uma linguagem onde a criança compreende e se projeta, a idéia de que o caminho da verdade é o único que nos leva à verdadeira felicidade, e que toda “provocação” pela qual passamos é fruto de um erro, quando não entendemos que o melhor nos é dado em cada momento, em cada lugar que estamos, não havendo com isso espaço para o medo, pois aí existe o amor Éumlivroquefalasobreaceitação,auto-estimaeomaisinteressante é a idéia de que podemos errar, desviar de nosso caminho e que a reparação do erro e o retorno à felicidade é sempre possível. O que fica, nesse retorno, é uma valiosa aprendizagem.

Cristina Zouein Psicóloga, psicoterapeuta de crianças e de adultos. Diretora do Instituto de Programação Neurolingüística do Rio de Janeiro.

EspinhaDorsal,poesia,14x21cm,64pág,RevanierVenâncio, OFICINAEditores,2008,RiodeJaneiro,Brasil

Em tempos de tendência plural da linguagem, entre os experimentostransgressoreseoconservadorismoderitmoseformas, eis aqui uma importante estréia na literatura contemporânea. Esta Espinha Dorsal sustenta, com alinhavos de sua artesã, a palavrarevestidademetáforasemetonímias,imprimindo,como emumraio-x,silêncios,impressões,vãosedesejos.Étônica,em muitos poemas, a presença de elementos da natureza. Depois de longos anos de inspiração, de ter publicado em coletâneas e de fazer parte de algumas tribos de poetas, recitando em bares do Rio, a autora, em fase madura, rende-se “ao curto-circuito que arranca da espinha dorsal o verso”. O “eu” lírico revela-se em metonímias de mão dupla: partes pelo todo e o todo pelas partes.EénessamãodupladacriaçãoedacriaturaqueEspinha Dorsal chega às mãos do leitor, sustentando um universo de anseios, tão comum a todos nós. Um livro que, por refletir o comportamento do corpo e da alma, proporciona, a quem o lê, umnaturallaçodeidentificação.

Poeta, idealizadora do Projeto Cultural Poeta Saia da Gaveta (Ano 15), no Méier, Rio/RJ. A convite da Telemar, o poema

“Irreverência”,desuaautoria,foioprimeiropoemaeditadoem cartãotelefônico,emjulhode1999,Rio/RJ.Publicou: Enquanto houver dança (biografia de Maria Antonieta); Trampolim do Poeta (poesia); Olhos de Poeta (poesia), site Livronline.

TodaMeninaPodeSerMulher,poesia,14x21cm,84pág,Ana CarolinaCoelho,OFICINAEditores,2008,RiodeJaneiro, Brasil

Ana Carolina Coelho, a mulher, a professora e poeta desvenda seus poemas com direito a coração e silhueta feminina. Uma boneca? Talvez? Fez questão de ter seus poemas em ordem cronológica, um aviso a Cronos. E isto nos remete a um refazer o percurso? Não nesse caso. Não o mesmo caminho anteriormente trilhado, mas o fazer com outros olhos (olhos atentos), que sabem que o outrora passou e o aprendizado se concretiza a cada momento. De imagens contundentes, vocabulário vário e o constante tema: sensualidade explícita. A autora é elegante em seus versos enxutos. Seus poemas são substantivos, concisos, emaranhados de sentimentos expressos em metáforas à flor da pele. Um livro, certamente, de cabeceira. Deguste-o.

Sérgio Gerônimo Poeta,editor,pres.daAPPERJ TalvezCrônicasVolII, crônica,14x21cm,152pág,Glenda Maier, OFICINAEditores, 2007, Rio de Janeiro, Brasil PRÊMIOALEJANDROCABASSA/2008:Melhorlivroescrito por mulher, União Brasileira de Escritores/RJ. Neste segundo volume de Talvez Crônicas, a autora registra crônicas publicadas nos jornais Condomínios Em Foco e Jacarepaguá em Destaque, editados no Rio de Janeiro, no período de janeiro de 2002 a dezembro de 2006. São conversas com os seus leitores. Pretende, Glenda, com este volume dois que o eco de seus momentos literários continuem a reverberar. São conversas tipicamente do universo carioca e por extensão fazem consonância com os casos e descasos deste “continente” chamado Brasil. Politicamente correta alfineta os desmandos dos incorretos políticos, mas não apenas critica, sugere soluções, às vezes contundentes, mas soluções. A capa é idêntica a do volume um, demonstrando ser este uma continuação dos seus apanhados jornalísticos. Boa leitura.

Revista Literaria: Plural —— 12 ´ RESENHA
SérgioGerônimo Poeta,editor,pres.daAPPERJ RESENHA: Cristina Zouein, Teresa Drummond e SérgioGerônimo

APOESIALIBERTA,AMÚSICARESGATA.

Se eu fosse cronista, teria que seguir os padrões pré-estabelecidos para a técnica de escrever crônica. Sou apenas uma pessoa em expansão que, acidentalmente, ou não, tem a possibilidade de se expressar publicamente e compartilhar com outros o que me vai à alma.

Procuro, em meus poemas, contos e crônicas, não ser totalmente pessoal, no entanto, não consigo entender uma obra de arte que não expresse, de uma maneira ou de outra, os mais profundos anseios e as mais autênticas emoções do artista.

Um pintor, por exemplo, deve saber pintar um rosto e receber um bom patrocínio para fazê-lo, mas, acredito eu, há um determinado momento em que um rosto se impõe ao pintor. Um rosto real ou imaginário, não importa. Um rosto que terá que ser pintado, sob pena de não haver inspiração nem competência para pintar mais nada.

Aqueles que lêem minhas crônicas há muito tempo sabem do meu entusiasmo pela poesia. Fui poetisa fanática por um bom tempo. Agora tenho outra paixão: a música. Felizmente, no mundo das artes não há ciúme nem exclusividade. A poesia não está pedindo divórcio pelo fato de estar eu, atualmente, apaixonada pela música. Bendita arte que oferece plenitude aos que ousam e arriscam enfrentá-la. Quantos artistas se perdem por falta de oportunidade! Que pena!

Artista é aquele que deseja expressar BELEZA. Beleza é tudo aquilo que liberta o homem, ou a mulher, das correntes do puramente animal, material, humano. O artista transcende e se eleva e se torna CRIADOR, DEUS de sua própria criação.

O tempo de poesia foi para mim exatamente isto: o tempo da libertação. Agora, volúvel que sou, entrego-me à música e encontro no cantar a possibilidade de resgate do “mim mesmo”. Não me perguntem exatamente o que quero dizer com isso. Sinto-me resgatada. É suficiente.

Do mesmo modo que convidava as pessoas a se assumirem poetas – e foram muitas as pessoas que “libertei” nos tempos de ativismo poético, agora é a hora de convidá-los a resgatar a si mesmos. Cantem.

Em seu bairro deve existir pelo menos uma escola da música. Aproveite-a. Se já conhece alguma, aproxime-se. Na hora em que você ousa fazer o que sempre quis – pode ser cantar, compor, escrever, pintar, criar um prato culinário que jamais ninguém provou, dançar, esculpir, ousar subir em um palco e ser Julieta, ou Romeu – nesta hora, se você já ousou uma primeira arte libertadora, a segunda arte será a de resgate. Você resgatará o mais humano, o mais belo, o mais indizível em você mesmo.

Sabem, uma vez fui júri em um concurso de poesia em uma escola do bairro. O júri foi unânime: um determinado poema foi considerado o melhor. Surpresa geral: o autor havia colocado um pseudônimo e ninguém, nem professores, nem jurados, nem alunos sabiam quem era o autor. Depois de muita pesquisa foi descoberto que o autor era tímido, gordinho, inexpressivo de acordo com os padrões sociais vigentes. Este rapazinho foi aplaudido, condecorado, valorizado, talvez, pela primeira vez na vida. Não sei o que aconteceu com ele, mas, pelo poema vencedor, que deve tê-lo libertado, eu desejo que agora, onde quer que ele esteja, possa haver a oportunidade do resgate.

Crônica

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

ASARTESTALVEZSEJAMOPORTALDAPLENITUDE. DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Este exemplar é de abril, mas estou escrevendo este artigo hoje, dia 8 de março, consagrado, artificialmente às mulheres. Continuo questionando: quando haverá o Dia internacional do Homem?

Nós vivemos num mundo e numa cultura dicotômica: paz e guerra; branco e preto; homem e mulher; bom e mau... Devido a esta tendência, e, talvez, conseqüência de um profundo sentimento de culpa, ao percebermos as injustiças historicamente cometidas criamos os “Dias internacionais”. Não percebemos que, ao criar o “Dia Internacional da Mulher” canonizamos a diferenciação. Quando aceitamos um feriado para o “Dia da Consciência Negra” estabelecemos a separação.

Quando era mais jovem, sofri a influência da “moda” e tentei jogar “I Ching”. Para quem não sabe, o I Ching é um método de predição do futuro criado pelos chineses. Se vocês tentarem jogar perceberão que as respostas do I Ching são vagas e profundas, deixando, na verdade, a interpretação ao gosto do freguês. Não coisas do tipo: “Você vai encontrar o homem de seus sonhos na próxima viagem de trem”. Não. O I Ching é mais sutil, dando informações do tipo: “Forte mas suave, a linha inteira no centro indica que nossa vontade será atendida e o sucesso é certo. As densas nuvens que não dão chuva significam que os nossos negócios ainda estão progredindo; o fato de elas virem do oeste indica que ainda não chegou a hora de agir”. (I Ching – Livro das Transmutações, de John Blofeld)

Como vocês podem ver uma predição assim faz com que nós a interpretemos de uma forma totalmente subjetiva. Não vou me estender sobre esse assunto. Falei do I Ching porque, depois da fase inicial de entusiasmo, comecei a me interessar mais a fundo sobre o mesmo. Na introdução do livro de adivinhações havia a seguinte informação: “Embora a filosofia dialética do Extremo Oriente tenha sido classificada como binária, apenas aparentemente é ela dualista. Na realidade, é monista, porque Yin e Yang, opostos e antagônicos, são complementares”. (I Ching – Livro das Transmutações, de John Blofeld)

É isto que me incomoda nos “Dias Internacionais”! Querendo ou não, as celebrações de apenas uma das partes mantêm a dualidade, a separação. Como celebrar o dia sem celebrar a noite? Vocês já imaginaram viver em um planeta onde o sol brilhasse vinte quatro horas sem nenhum momento de escuridão, aconchego, repouso? Vocês já se deram conta de que a única razão de celebrarmos o dia da mulher é por terem os homens oprimido as mulheres durante séculos e agora estão querendo “limpar a barra”? Imaginem um mundo só de “celebradas mulheres”! Eu odiaria viver num mundo assim. Será que alguém já ofereceu aos homens, que tanto oprimiram as mulheres, a oportunidade de imaginar um mundo só de homens?

O I Ching, baseado nos princípios do Yin e Yang esclarece este problema. Antagônicos? Sim. Porém, complementares. É esta complementaridade que falta no mundo. Precisamos entender que nossos valores, quaisquer que eles sejam só podem ser reconhecidos porque existem valores diferentes dos nossos. Se os homens oprimiram as mulheres, seria muito triste querer uma revanche fazendo com que as mulheres oprimissem os homens. Somos complementares, como complementares são o dia e a noite, o branco e o negro, a guerra e a paz.

No momento em que entendermos essa verdade, saberemos que todas as religiões falam de um mesmo Deus, em linguagens diferentes; que toda pobreza exagerada gera uma riqueza exagerada e que ambas são nocivas; que toda verdade incontestável tem em si o embrião de uma mentira também incontestável, gerando a confusão. Que toda paz trás em si o embrião da guerra e deveríamos encontrar nas guerras os embriões complementares da paz.

Bom dia-a-dia para todos. TAO.

Glenda Maier.

Aquariana. Carioca. Professora de inglês. Ativista cultural. Sempre mãe. Apenas mulher Presidente da APPERJ de 1996 a 2001. Seu mais recente sucesso: Talvez Crônicas vol. II, recebeu o Prêmio Alejandro Cabassa, como melhor livro escrito por mulher, em 2008, pela União Brasileira de Escritores/RJ.

Revista Literaria: Plural —— 13 ´
Glenda Maier

Afusãoperfeita dosomasomado esvaiu-seembruma, esvoaçado... Depois de feita fumaça branca, a magia do amor eterno para não perder-se em si, transmutou-se emgarçanívea e saiu na busca doparperdido...

Corpus

Portanto se vir de longe essa alma alada não pense que é fumaça veja nela essa n(ave) singrando os ares sangrando no meio dos outros pares a grasnar de solidão... Graça,garça,sarça ardendodePaixão.

Apokã

À mesa, semblantes severos. Tios e tias de luto. O patriarca se fora e mal ousavam falar. Para a morte, alguns eufemismos: partir, passar para, descansar. E lá merecia o velho feroz algum descanso, pensava a adolescente retirada no meio da noite do leito morno e quase surpreendida em sua doce lascívia das mãos curiosas sob os lençóis? Ainda bem que no dia seguinte, deveria apresentar o trabalho de pesquisa sobre a Guerra do Irã (ou seria Iraque?). Quase nada pesquisara, mesmo pela Internet, pois a Pat fizera quinze anos na véspera e batera pé para a festinha na cobertura ser no mesmo dia, não no sábado. A mãe não pudera com a birra, temendo ser catalogada de atrasada, em relação à sua própria, que não ousara proibi-la ao ser comparada à da Pat, tão in. Combinação de meninas: uma citava a mãe da outra para conseguir qualquer coisa... Cada mãe, temente de ser out e perder o amor da filhota mimada, cedia então.

Levanta os olhos de grandes pestanas douradas, meio desfocados. Avalia os comensais. Um deles faz o mesmo e a apanha na teia de aranha que se instala entre ambos, de imediato. Ele aponta com o queixo, os demais, faz movimentos cômicos, taxandoos de chatos. Ela aquiesce mudamente, sorriso a meio, pronto para desmanchar-se se alguém a surpreendesse no mudo colóquio.

Ele apanha farinha e escrevo “fofa”, sobre o feijão frio. Ela, devagar, lambe os lábios, coração disparado. Pat lhe dissera, com a sabedoria das mocinhas de quinze anos, que os homens ficavam maluquinhos quando via a ponta da língua. Por isso chamavam as mulheres de gatinhas. Ela arregala, ainda mais, os olhos sombreados, passa as mãos pelo queixo onde espetam centenas de fios de barba. Também fora acordado no meio da noite para o enterro do avô. O telefone vibrara logo após uma petit mort. Seqüente a um grande gozo.

Subitamente, deixa o sapato do pé direito cair, sem alarde algum. Mocassim fácil de tirar. Estende a perna e deixa o pé

descansar sobre as coxas úmidas da adolescente. Esbarra com calças jeans. Ela estremece. Ele escreve com a farinha: “Tira.” A garota o interroga com o olhar. Escreve então, da mesma farinheira: “Como?”

O moço ri. Apanha uma pokã. Descasca-a sem pressa. Pega dois gomos e mostra-os com calma à quase menina. Entreabreos. Coloca entre eles, o polegar. A garota estremece de prazer. O coração parece que desceu e pulsa nela, lá embaixo, entre os gomos túmidos.

Tentando, sob a toalha de linho, imensa, fazer o mínimo possível de gestos, muito devagar. Vai desabotoando os botões de metal. A calça apenas cobre o púbis. Consegue ir levantando as nádegas. Puxa as pernas da calça. Noite abafada na sala de fazenda, sem ventiladores. Acomoda o pé invasor. Segura-o como se isso bastasse para impedir um abuso maior. Mas tem vontade de acariciar o pé, um minicorpo. Quando se distrai, é tocada, qual uma corda de violão. Estremece e geme. Todos a olham, de súbito. Está vermelha. A mãe pergunta, preocupada: – O que foi?

Ela fala baixinho, só para a inquisidora ouvir: – Cólicas...

O pé já se recolhera. A mãe se aproxima e pergunta alto: Aonde ela vai dormir? A tia mais velha conversa com outra, decidem logo e ela é convidada a ir tomar banho, antes de deitar-se. As adultas agora estão num canto, falando de absorventes, coisas de mulher. O primo primogênito apanha os gomos do desejo e os põe na boca. Todos se levantam. A empregada, ao recolher a louça, vê sobre o feijão escuro, a frase: “Que pena!” No quarto da donzela, sob o chuveiro, ela revê esses gomos sumarentos ao fechar os olhos. E com os olhos dos dedos, imita os dedos do sedutor

Em pé, na varanda, ele pensa na fêmea madura que deixara à sua espera. Enquanto come os últimos gomos da dourada pokã...

Clevane Pessoa, nascida no Rio Grande do Norte, radicada em Minas Gerais. Psicóloga, ilustradora, consultora de teatro, oficineira e palestrista. Desenvolveu o PPP (Projeto Poesia no Pano). Quatro livros de poesia editados: Sombras feitas de Luz, Asas de água, A Indiazinha e o Natal, Partes de Mim. Em 2007, publicou Mulheres de Sal, Água e Afins, contos. Participa de cerca de 60 antologias, possui 19 e-books. Poeta Honoris Causa pelo Conjunto da Obra Poética de 50 anos, outorgada pelo Clube Brasileiro de Língua Portuguesa, que contempla os oito Países Lusófonos. Cônsul Z-C de Poetas Del Mundo, em Belo Horizonte, representante do Movimento Cultural aBrace (Brasil-Uruguai), e contemplada com a Medalha do Colar de Mérito da Câmara Municipal de Belo Horizonte, em 2007.

Revista Literaria: Plural —— 14 ´
Crônica Clevane Pessoa

REENCONTRO

No auge dos meus desejos em que eras o preferido da lista, estupidamente te perdi de vista. Antagônicos caminhos surgiram. Que pena senti de mim por não ver se realizar sonhos embalados pelos mais puros desejos carnais.

II

Agora, já se foram muitos carnavais e um reencontro traz a certeza de que não foi por acaso. Mas uma vontade danada de te saber feliz e ouvir de tua boca o quanto estás bem contigo mesmo.

III

Sigo eu pela vida afora dando pulinhos e mais pulinhos em amarelinhas desbotadas, que não mais me permitem prosseguir no jogo, indo até o final.

IV

Mas não faz mal, felicidade às vezes consiste em sabermos que alguém tão querido, hoje, regozija-se de amor Assim, pertence-me plenamente essa árdua estrada de um passado por mim não vivido.

poemetos

O difícil não é viver, é ter que suportar a monotonia do dia-a-dia, de sol a sol e das madrugadas frias e vazias...

Nosso namoro é estranho, se estou em casa, você briga mas, quando saio e deixo a janela fechada, você não reclama nada. Será que você nasceu pra ser corno?

O futuro não pertence a Deus, Ele apenas dá um empurrãozinho na gente. O resto é por nossa conta e risco. Portanto, seja arisco, sempre.

TEMPOS DESCONTRAÍDOS

Há pouco tempo reencontrei uma colega de ginásio. Dolly custou um pouco a me reconhecer, guardávamos ambas lembranças de fisionomias bem menos circunspectas. Éramos da mesma sala de aula, embora cada uma de nós possuísse sua própria “turminha”. Criávamos as situações mais absurdas na escola. Alguns professores ficavam irados. Meu conceito de autora intelectual das “artes” era um fato consumado, eu era considerada a culpada, o que nem sempre correspondia à verdade. Convidavam-me delicadamente a sair da sala e, assim, mais uma advertência em letras vermelhas na caderneta escolar. Dentre as minhas diabruras, havia aquela em que, habitualmente, eu jogava uma colega, toda uniformizada, dentro da piscina. Desculpem, ia esquecendo, o colégio era o Anglo-Americano, na Praia de Botafogo, final da década de quarenta, onde estudei, sob a direção de Miss Coney e tempos depois sob a direção do professor Frederico Ribeiro. A diretora de ensino era Nair Salles Manzo, por sua forte personalidade, temida por todos nós. Nosso Ginásio de Esportes era imenso, andávamos em rodas de ferro, os pés presos com tiras de couro; as rodas giravam com um simples impulso do corpo, era emocionante! Dentre as meninas jogadas na piscina por mim, algumas eram avisadas com a justificativa que poderiam ir para casa muito antes da hora da saída, sem qualquer punição. Às vezes tal argumento as satisfazia, quando não, a pancadaria comia solta. Planejávamos as programações mais loucas. Íamos constantemente, “de graça”, passear nos bondinhos do Pão de Açúcar O esquema era estarmos uniformizadas, dizendo ao bilheteiro que o colégio havia exigido uma pesquisa sobre o local. Pura Mentira! Chegando lá, sentávamos nos balanços e ríamos felizes com as nossas invencionices. Uma aventura inesquecível foi quando resolvemos conhecer a mansão da família Martinelli, na Avenida Oswaldo Cruz, em Botafogo. Pulamos o muro da casa, pelos fundos, ou seja, subimos de elevador até o último andar do “Edifício Residência”, que ficava na Avenida Ruy Barbosa, onde existia um muro que dava acesso ao casarão sem grandes problemas. Em solo firme, éramos seis ao todo e ali naquele imenso jardim, deparamos com uma porta aberta de um corredor bem comprido. Durante o percurso começamos a sentir medo, pois era muito escuro, apesar de termos visualizado vários bustos de pessoas, ou melhor, de figuras ilustres. De repente, uma porta de elevador, e, quando a abrimos, quase morremos de medo, pois havia uma cabeça de caveira em cima de uma pequena mesa. Foi o bastante para nos agarrarmos umas as outras e freneticamente sairmos nos arrastando de volta por aquele corredor, apavoradas, aterrorizadas. Ao dar de novo com aquele jardim, nos acalmamos quando demos de frente com um menino gordinho de uns 10 anos de idade, que além de nos tratar com naturalidade, a nosso pedido, nos ensinou a saída pelo portão principal, de frente para a Avenida Oswaldo Cruz. Relembrando tais façanhas, eu e Dolly concluímos que hoje em dia já não mais poderíamos agir com tanta espontaneidade e destemor. A violência, a maldade humana estão aceleradas. Nossas vidas sentimentais vieram à tona, porém, não nos pareceram tão atraentes como aqueles momentos vividos na infância, plenamente descontraídos. Não há condição de fatos como estes se repetirem, não por culpa nossa, mas pelas mudanças que se sucedem no dia-a-dia de todos nós, eivadas de um desamor que nos faz pensar várias vezes, antes de fazermos qualquer coisa. A autenticidade ficou em segundo plano. Fomos afoitas, hoje somos pessoas tensas e preocupadas, com o que ainda possa nos acontecer

Y BENOLIEL, carioca, advogada, poeta e cantora. Presidente Fundadora da APPERJ, da SOLIS (Sociedade Literária do Soneto), Vice Presidente daAcademia Brasileira de Literatura de Cordel, Presidente daAcademia Brasileira de Trova e membro de várias academias e de inúmeras entidades culturais. Autora dos livros de poesia: “A Solidão Que Ficou”,” À Flor Da Pele”, “Sob Todas as Coisas”, “Identidade em Noite de Coroação”, “In Verbis”, “Faces”, e ainda, com várias obras em Cordel.

MESSOD MESSOD MESSOD MESSOD MESSODY BENOLIEL Y BENOLIEL Y

Crônica

Revista Literaria: Plural ´
Messody Benoliel —— 15
BENOLIEL

Mistérios de minha alma Mistérios de minha alma Mistérios de minha alma Mistérios de minha alma (escrito em 1999)

Como decifrar os mistérios da minha alma?

Tento sufocar a melancolia que se acolheu em meu peito, na ânsia diária da vida: rotina, pulos, trabalhos, idas e vindas e, em meu peito, a tristeza se instala, impune.

Vejo meu filho na alegria infinda dos cinco anos: seu rosto é festa, luz, música! Esboço um sorriso, tímida; ele, a única ponta de felicidade que ainda me alivia.

Por fora, minha apatia destoa do vulcão abrigado em meu peito; meus olhos perdidos não refletem o redemoinho em minha cabeça. Passos e atos sem direção. Qual é o caminho, a rota?

Essa ânsia difusa que carrego é um sinal que me atemoriza; remete a situações prévias de momentos infelizes e sufocantes, só de pensar em serem repetidos. A vontade de chorar, essa sim, não me deixa. Uma simples palavra, lembrança ou visão me deixam prestes a jorrar toda a tristeza.

O que existe em mim? Qual é o ponto que me atordoa? Qual o segredo de minha alma? Essa velha conhecida que me acompanha e que se esconde entre trapos e tramas do passado, esperando que eu os rasgue e, enfim, ela se vista de mim e possamos entrar no mesmo compasso.

Resposta ao café Resposta ao café Resposta ao café Resposta ao café Resposta café (escrito há... perdi as contas)

As minhas mãos estavam nas suas e, o meu olhar sobre o seu, quando nossas bocas se encontraram e, nossas línguas molhadas, buscavam os segredos um do outro.

Naquele momento, nossos corpos não nos pertenciam e, as nossas mentes, se voltavam para a mesma finalidade; naquela hora não havia céu ou terra: havia nós, havia você.

Tudo agora brotava na pele; a sensibilidade tomava conta de nós. Nós dois sós. Nus. Aquele era o instante. Como nos conhecemos bem naquele dia! Nem eu sabia de certos segredos a meu respeito e, você, os descobriu. Nem eu sabia da dimensão do meu corpo e, você, a revelou.

Como fomos sensuais!

Depois, na manhã, vendo meu corpo quieto, pensei não ser o mesmo corpo da madrugada. Senti-me descoberta, nua, indefesa. E, senti medo de você. Eu também o descobrira, em todas as suas fraquezas e fortalezas; em todos os seus altos e baixos. Fiquei feliz e, pensei: quantas já não o haviam descoberto? Quantas já não o haviam feito sensível? Senti ciúmes, por você ser tão “infiel”. Fiquei com raiva, só que agora é tarde: você me conhece como a palma de minha mão. Detalhe por detalhe.

Eu penso lhe conhecer, não sei se é verdade. Você pode ter outras faces e, se essa for a única, por quanto tempo me pertencerá? Não a quero por hoje ou amanhã; a quero para sempre.

Você estava na minha frente, me esperando acordar. Estendi meus braços e, entendi que, naquele instante, de verdade, você era meu. Senti-me feliz e compreendi que poderei ser eu, um dia, quem irá procurar outra felicidade, se esta acabar. Notei que o instante deve ser aproveitado e nunca estragado com pensamentos no futuro. Pelo menos, em questão de amor!

Largo da Carioca, largo de todos nós. Largo da largo de todos

Caminhar pelo Largo da Carioca é uma experiência única. Deixando de lado os perigos inerentes de uma cidade grande como o Rio de Janeiro, podemos encontrar uma diversidade de sons, odores, cores e sensações que formam uma mistura, às vezes repugnante e, sempre interessante. Passar por ali e, observar silenciosamente, essa deliciosa confusão é marcante. O cheiro do dendê invade as narinas e manda nossa lembrança para a outra cidade onde tudo nasceu. Muito melhor do que mais adiante, onde o cheiro insuportável dos dejetos dos transeuntes nos faz detestar Cabral por ter começado tudo isso.

Fileiras de barraquinhas expõem o que é artesanato entre outros itens nem tão únicos ou legítimos. Distribuidores de folhetos fazem fila como num “corredor polonês” e, pior do que apanhar, enchemnos de (in)úteis papéis de empréstimos; nesse momento temos a perfeita idéia de como anda a vida dos brasileiros, atolados em dívidas, contraindo umas para pagar outras. E, a bola de neve cresce...

Cresce mas não permanece, porque no verão, o sol que cai à tarde não deixa nada intacto; a não ser a Estátua Viva, que permanece de pé, coberta de tinta tentando sobreviver e chamar mais atenção do que o restante da praça. E, assim, segue aturando os bêbados, os curiosos e algumas poucas crianças que passam e tentam, a todo custo, fazê-la mover-se; muitos já sabem que essa mágica só é conseguida, depositando um trocado no recipiente abaixo dela e, aí sim, ganhamos até beijinhos. Outros artistas ali se encontram, vendendo seu produto que a mídia não divulga por achar que não há campo para eles: humoristas, cantores de todos os gêneros – brega, “covers”, índios (?) – mostram seu trabalho e vendem muito, se assim não o fosse, já teriam desistido. E quem perde é a própria mídia. O som desses artistas mescla-se com os evangélicos que, aos gritos e, por vezes cantorias, tentam convencer aos passantes que o inferno é aqui; quer dizer, ali, literalmente. Porque esse Largo é o próprio, embora, sob as vistas e bênçãos do Sagrado Convento de Santo Antônio.

E, assim, ocupa-se cada metro quadrado desse espaço público e tão democrático. Se alguém foi esquecido, perdoe-me. Faça seu manifesto, grite, proteste. Esse é o espírito reinante nesse Largo de Todos Nós.

Katia Machado Pino. Psicóloga Clínica e professora de Psicologia com vários títulos de pós-graduação e especialização. Escreve contos, crônicas e poemas; publicou em 2007 o livro infantil: LILI, A ESTRELA DO MAR (Prêmio Adolfo Aizen 2008 da UBE/RJ) e participou, neste mesmo ano, das coletâneas Caderno de Poesia 33 e Antologia Bienal Mais, todos publicados pela Oficina Editores. É membro fundador da Academia de Artes, Ciências e Letras da Ilha de Paquetá; é membro da APPERJ e da AEILJ (Associação dos Escritores e Ilusionadores de Literatura Infanto-Juvenil. Participou da Coletânea Perfil 2008.

Crônica

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DO DESAPARECIMENTO DAVEROTINA

Fazer verso com vocábulo Relativo à medicina Como? Se até com minhas receitas sumiram De minhas pílulas de Verotina?

E João Cabral não fez Seu MONUMENTO ÀASPIRINA? – Agora mostra outro remédio De tua própria autoria.

– Doutora, receita o meu remédio Que me devolva minha euforia Como é mesmo que ele se chama? Euforiol ou Verotina?

– “Você é poeta ou química? Euforia não existe Existe a boa VEROTINA Pra adiar teu suicídio.”

O que foi? Perdeu o contrato? Com o music-hall? Ou imaginativa Pensou ganhar, na “Sweet Wall” Numa jogada decisiva?”

– “Na verdade, minha doutora Sem mensalão e sem aposentadoria Como obter ínfimo sucesso Só com artísticas melodias?

Ainda por cima um infeliz Me levou a prescrição da VEROTINA Que se dê muito mal, cada vez pior Mesmo com toneladas Da desaparecida receita minha (da VEROTINA).

Que ele num só inferno viva Pois estando poeta, não sou química E minha única obrigação É inventar só paraísos. Até fáceis de imaginar Se penso em VERO [= in vino veritas] E junto: Tina [= feminino de tino] Isto lembrando também ONASSIS E de Cristina, sua filha, o *apelido.

* Onassis, miliardário grego, casado com Maria Callas, que era pai de Tina Onassis (apelido de Cristina), sua filha e herdeira.

O RESTO É QUE SÃO ELAS

(Paris2008)

Não procurei em Paris nada do que já não conhecia, mas achei tanta coisa diferente! Paris rebrilhando esplendorosa nos monumentos, as cúpulas e partes douradas espelhando um ouro nunca visto anteriormente. Os bairros antigos e desiguais, patinados e realçados em seu tosco lado, seu tosco colorido! O inverno caracterizado pelo vermelho que envolvia de suas brumas e de seu nevoeiro os galhos das árvores, dos bosques e das praças! A ambientação nos quarteirões mais modestos estudadamente moderno, popular, e comodamente funcional. Decoração repleta de fotografias históricas das figuras características dos quarteirões como: dançarinos e acrobatas, comércio de frutas e vinhos, crianças do bairro em suas brincadeiras etc etc

fazendo ressaltar um lado de vigorosa vitória de um operariado saído de qualquer conotação de miséria. Verdade é que não chegamos a Paris para fazer nem críticas, nem oposição mas para tirar férias em popular fruição.

Na volta não trouxe bagagem nem de modelos nem de perfumes, mas um monte de fascículos, livros, revistas de poesia, filosofia, cinema, teatro, alguns batons, cremes de limpeza, alguns pares de meias de seda e de lã. Inverno fechado desembarcando no verão do Rio. Euros e dólares tendo que ser coados e peneirados em favor e fazendo lugar ao real. Frente única e roupa branca substituindo écharpes de lã, luvas forradas, proteção de cabeças e orelhas. A reambientação aqui bem mais difícil do que poderíamos imaginar. Atribuição ao peso das primaveras que já não são poucas propriamente ditas.

Pouco depois, minha filha queixou-se das mesmas dificuldades. Ela que já lá estava uma francesa vivida em ritmo e velocidade francesas, discutindo, reclamando, duvidando de tudo, mãos nas cadeiras, sem deixar passar nada. Voltada ao Brasil, sua voz no telefone não deixa entreouvir nada do deblaterar constante e vário com que as mulheres francesas reivindicam seu lugar ao sol e à neve.

Integremos com alegria, nossa informal, ininterrupta, constante criatividade, a que caracteriza os brasileiros nas vésperas deste Carnaval. Essa não nos faltou nem nos faltará, nunca! O resto é que são elas!

A MELODIA

Tinha sido uma tarde cansativa

A volúpia de ver recuperado o já feito, o já construído, equilibrando-se com propostas rejuvenescedoras para a função, a utilidade, o progresso das novas gerações havia ruído abaixo. Até logo, esperança! Boa noite utopias! Adeus otimismo e saúde para continuações! Até mais vê-los sonhos e quimeras para Américas!

Os cortes da violência impondo-se inapagáveis, visíveis em páginas e telas! Esforço? Pra que? Paciência, sim, infinita e infindável.

Noite que monologa. Busca de melhor vida onde encontrada?

Propôs-se a atravessar o imenso pátio cimentado do edifício aonde trabalhava de onde saía absolutamente inerte e atingir a calçada fronteira onde finalmente descansaria e providenciaria o próprio transporte e a própria remoção.

Para o telhado do seu abrigo.

Iniciar a travessia. Com as mãos nos bolsos, o olhar fixo no objetivo da calçada a ser alcançada, qualquer baixa na atenção deixá-lo-ia prostrado, imóvel, meio o pátio deserto, despovoado. Sem apoio. Sem salvação. Foi quando passou a soar uma incrível melodia do fim lá do seu trajeto. Seria oriental o instrumento soprado rascante, indubitável não dirigido, desafiante, sideral.

Sim, sideral era sua modalidade. Imantava. Arrastava. Agilizava o cansaço do seu solitário ouvinte. O caminhante agora sentia-se um astro, um cometa, um atleta quase chegante. Quase chegando embalado na improvisada sinfonia. Auditório? Não se formara nenhum! Na chegada uma espécie de pequeno grupo esdrúxulo estava absorto em assuntos próprios, em suas próprias piadas e preocupações.

O homem psicologicamente inutilizado chegara vencendo o desânimo e o cansaço ao solitário cantor.

Estivera fascinado e motivado pela modulação, a prece, o apelo implícito contido, continuado naquelas escalas. Singelas. Solitárias. Noturnas e notívagas.

Rápido e forte cortante colocou o caminhante a boa nota aos pés do cantor de rua.

Havia lua, sim, distante, imprevisível, distraidíssima.

Assim mesmo os cúmplices tinham sido um para o outro necessários, instigantes, orientais, essenciais.

Campbell Juju Campbell Juju Campbell Juju Campbell Juju

Juju

– Membro e fundadora da APPERJ, associada do SEERJ, diretora de acervo da UBE/RJ. Participou de diversas coletâneas como Cadernos OFICINAPOESIAS, do nº 3 ao 33;Antologias VII, VIII, X e XIII daAcademia de Letras e Artes de Paranapuã, nos anos 1997, 1998, 1999 e 2003. Fez parte da Revistas Letras Itaocarenses, nº 112, de Outubro de 1998; faz parte dos volumes International Poetry do ano 2000, e do Directory of International Writers and Artists (ano 2003) eAntologia MAIS da Bienal de 2007 (Oficina Editores),Amizade em Prosa & Verso, EdiçõesALBA, eAntologia (em verso e prosa) Autores do Brasil da UNIONE CATTOLICAARTISTI ITALIANI – UCAI Brasil 2007, levada para GALLERIA LA PIGNA em Roma, 2007, poema TRATADO, sobre o romance “Viver e reviver” de Anna Guasque, vertido para o italiano: TRATTATO.

Crônica

Revista Literaria: Plural —— 17 ´
Juju Campbell

O ÔNIBUS DO TEMPO

De repente, vi-me nas nuvens dirigindo um ônibus pelo espaço afora. Tinha 32 confortáveis poltronas vazias e parecia não voar muito alto, pois driblava graciosamente as nimbus, cumulus e stratus que encontrava pela frente. Eu tentava entender o que fazia ao volante daquele veículo, quando numa claridade próxima notei um homem sinalizando para que parasse. Abri a porta dianteira e quase desmaiei quando identifiquei o indivíduo: Era Albert Einstein em pessoa!

– Por que esse espanto, meu caro? Você não leu o destino desta condução no painel externo?

– Na verdade não li nada.

– É o primeiro motorista que conheço e que não sabe para onde vai. Lá está escrito de forma bem clara: FANTÁSTICO ENCONTRO COM GRANDES VULTOS DA HISTÓRIA. Modéstia à parte me incluíram no time e cá estou, ansioso para conviver com os demais.

– Mui... muito prazer. É uma honra tê-lo aqui, e ainda mais como primeiro passageiro... Mas, mas diga uma coisa Dr. Albert –desculpando a indiscrição – sua teoria é realmente definitiva?

– Meu caro, definitiva somente a Entidade Divina. Todas as teorias...

– Perdão se o interrompo, porém tem três velhinhos discutindo lá fora com os braços estendidos.

Parei. Eles entraram devagarinho, continuando a discussão, depois dos cumprimentos:

– Espero que não se ofenda Platão, porém vejo uma certa contradição em seus Diálogos; eles me parecem incompatíveis. Também sou obrigado a lhe fazer uma crítica, querido Sócrates. Você, com sua Ironia e Maiêutica, tem uma postura de desrespeito, de deboche para com seus discípulos...

– Este Aristóteles parece o Rei da Sabedoria, não é verdade Mestre?

– Não esquente Platão, ele vai cair do cavalo sozinho...

Não acreditando no que via e ouvia, peguei um caderno e uma caneta no porta-luvas e pedi respeitosamente a Einstein que me escrevesse algumas palavras e, logicamente, assinasse. E que se não fosse incômodo, fizesse o mesmo com os demais passageiros.

Pouco adiante um modesto casal pediu para embarcar. Acomodaram-se silenciosamente nos últimos bancos, enquanto eu os olhava com expressão ignorante.

– Pelo vácuo em sua fisionomia percebo que não os conhece, comentou Einstein. São Pierre e Marie Curie, os primeiros a isolarem quimicamente o Rádio e o Polônio; sendo assim, praticamente, os pais dos estudos da radioatividade.

Entraram ainda muitos gênios de todas as épocas e campos de atuação, muitos deles tendo se encontrado apenas post mortem. Einstein ajudava-me a identificá-los:

– Ali se sentou um segmento importante de todas as religiões. O Buda, cujo nome verdadeiro é Sidarta Gautama; Moisés – o Patriarca – autor dos Dez Mandamentos e agora Maomé trocando conceitos com Pitágoras:

– Não entendo, exímio matemático, que sua Escola considere O Número como sendo o princípio de todas as coisas. O princípio é o nosso deus Alá, de acordo com o que está explicado no Corão.

– Ilustre profeta, não me leve a mal, mas a definição de Deus dada pelos homens não é científica, já que inúmeras pessoas tem opiniões subjetivas e diferentes sobre o significado desta palavra; isto não é Ciência. A Matemática, exata e perfeita, é a única capaz de defini-Lo, pressupondo ser Ele a perfeição absoluta.

Tive a atenção desviada ao ser surpreendido por três figuras que pediam para viajar, agitando freneticamente os braços com par-

tituras nas mãos. Ao me aproximar, e reconhecê-los, senti tamanha emoção que o veículo se desgovernou. Einstein segurou o volante e abriu a porta; Haydn, Mozart e Beethoven embarcaram diante de um motorista deslumbrado. Tive ímpetos de gritar que aquele grupo era o responsável pelos mais sublimes momentos da minha vida, que sua música maravilhosa me transportava para o transcendente e...

– Se você deseja que eu faça uma colheita de autógrafos é necessário voltar ao comando do veículo.

– Tem razão Dr. Albert, tem razão.

Trinta e um lugares do coletivo estavam agora ocupados. O restante dos passageiros era composto por grandes personalidades do cinema, como Fellini, Chaplin, Tati, Vivian Leigh, Bogart, Tracy, Kubrick... Frank Capra se desculpou:

– Falta uma enormidade, que evidentemente não cabe aqui. Eu olhava embasbacado pelo retrovisor. Monet, Renoir e Van Gogh não desgrudavam das janelas, procurando no empolgante jogo de cores formado pelos raios solares e nuvens, um novo projeto para – quem sabe? – futuras telas. Galileu, Edison e Pasteur roncavam em seus assentos, como que dizendo:

– Já demos a nossa contribuição, agora deixem-nos em paz. Dei um adeusinho para Santos Dumont, que estava quase ao meu lado, murmurando:

– Oi! Também sou brasileiro, sabia?

Da Vinci, Michelangelo e Kant completavam a extraordinária safra de seres que eu conduzia.

Aos poucos, porém, uma força interna trouxe-me uma grande inquietude. Percebi que ainda havia um lugar vago no ônibus e eu tinha certeza a quem devia pertencer. Tinha certeza, mas vacilava.

Aquele lapso de insegurança fez com que rapidamente dois fortes e antagônicos blocos de pensamentos invadissem a minha mente.

O passageiro ausente era famoso; milhões de pessoas o idolatravam; realizou centenas de milagres, jamais repetidos. Além disso, proporcionava um conforto espiritual aos seus seguidores, também nunca dantes visto. Provavelmente não embarcara porque eu, sujeitomaçante,questionadorepolêmiconãomereciaasuacompanhia. E muitos daqueles vultos, também não.

O outro bloco de pensamentos era mais contundente: este homem nunca existiu; é uma lenda que engana há séculos grande parte da Humanidade; os principais e responsáveis historiadores da época nem o citam. Na verdade, a maioria das pessoas não gosta de ir a fundo nos assuntos transcendentes, aceitando assim narrativas de episódios duvidosos, em tempo algum provados com exatidão.

A guerra mental começava a me deixar nervoso. Perguntas pipocavam: Devia, ou não, deixar o lugar vago? Bach fez sinal e não parei. O mesmo aconteceu com Leibniz, Verdi, Dostoievski, Sabin, Victor Hugo e muitos outros... Aquele passageiro famoso estava me perturbando: será que realmente existia? Não, não existia; sua ausência confirmava que era uma ficção.

E se eu estivesse enganado? Se ele, de fato, não me quisesse como motorista?

Um estranho poder fazia-me pisar cada vez com mais intensidade no acelerador e procurar aflito, entre as nuvens, um braço divino que pedisse para viajar

Quando – completamente desorientado – solicitei ajuda ao meu amigo Einstein, senti um suave beijo na face, acompanhado de uma doce voz:

– São 7 horas Mário, está na hora de trabalhar.

Era minha querida esposa Sabina, trazendo-me de volta à realidade.

Revista Literaria: Plural —— 18 ´ Conto
Mário Weikersheimer; brasileiro; carioca; 68 anos; casado; engenheiro civil e corretor de seguros; três anos de estudos na Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro; dois livros publicados: “Saudades do Amanhecer” (1998) e “O Enterro Utópico” (2002).
Mário Weikersheimer

O PERU

Sempre apreciei o Peru como personagem literário. E o tenho degustado em vários autores. Especialmente Guimarães Rosa que dele fez o encantamento de um menino no conto “As Margens da Alegria”.

Certa vez, também, tive o Peru inserido na minha estória. Havia terminado, recente, um caso amoroso. Costumava, então ir ao Parque do Flamengo nos fins de tarde. Caminhava à beira-mar até cansar-me. Permitia-me pensar sobre a situação presente. Além disso, o cansaço me propiciava um sono mais tranqüilo, naqueles dias agitados pela separação.

A água me atrai muito. O calor, o dourado do sol refletido no mar. Irresistível. Mergulho vestida. Neste momento, acaso. O homem de quem me separei passa caminhando à beira da água. Flagrante. Segue com meneio irônico de cabeça. Sinto-me ridícula. Perturbada, o acompanho com os olhos até desaparecer. Saio da água e recomeço a caminhada. Preciso me apaziguar

Não sei há quanto tempo estou andando pela areia da praia. Completamente abstraída. O mar, a paisagem do outro lado da baía. Percebo, agora, luzes em Niterói. Olho à minha volta, noite. Sobressalto. Outono, praia deserta. Até os habituais corredores já se foram. Penso, tenho que sair daqui. Esta cidade tão violenta. Estou me expondo muito num lugar ermo como este.

Mas entro num estado de sonolência. Vontade irresistível de deitar. Adormeço na areia morna. Perco a noção do tempo. Sensação de desconforto. Consciência de um peso pressionando meu corpo. Lenta, abro os olhos. Um enorme Peru está em cima de mim. Asas brancas, rajadas de mel, me cobrem. Longo arrepio. Passiva. Pernas abertas erguidas para ele. Algo me penetra o ânus. Um pequeno pênis. Ânsia de mais. Mexe-se ritmado dentro de mim. Bate as asas num frêmito. Pende a cabeça para trás alongado. Vejo-lhe a pele rugosa do pescoço. Os olhos têm a opacidade, a angústia que antecedem o gozo. Sua expressão é humana. Estremece como quando se vai chegar ao orgasmo. Quero desesperada me libertar. Que aquilo acabe logo. Acaba o sonho.

Tempo passou depois do sonho do Peru. Uma noite, vou ao lançamento de um livro de poesia e encontro meu ex-amor. Solturas de vinho, pequenas mútuas confidências. Ele conta, um dia furioso com meu sono prolongado, transou comigo dormindo. Não tive dúvidas. Recordo nítida sua expressão. Era ele o Peru que tinha me violado.

Pouco depois nos despedimos e nunca mais o vi. A não ser em sonhos... Um dos episódios do livro Contos Eróticos Fantásticos – inédito.

ANATOMIA DE NADJA

Anelados Rastros de marfim Dedilham noites Ardem desérticos Lamentos loucos Olhos mouros Sorrir menina Fatal sedução Pra fruta proibida Sargaços conchas corais Toda coisa marinha Ornamentos da sereia Ninho de alabastro Onde a lascívia arfa Em suaves ondas Duas aves empinadas Biquinhos ariscos Voar luxúrias

Flocos de paina e seda Exóticas essências Inebriam a natureza Sons selvagens Desvarios de mel Veuve Clicquot

EM 70 Incensos de opium doces no bico porcelana do bule século XIX Relaxos de tapete ao som de Ravi Shankar Briguinhas metafísicas regadas a basés e vinho branco Certo tesãozinho incestuoso e estrelas viscerais explodem no primeiro conhaque da manhã Breves suaves momentos na década dura que rolava Na ditadura que durava Dura

Lúcia Nobre – Uma das precursoras da voz erótica feminina na poesia carioca, participa dos movimentos de poesia, a partir da década de 1980. Foi co-editora da Revista Urbana Poema Fanzine. Colaboradora de diversas publicações literárias, seus poemas e contos “elegantemente excitantes” constam de inúmeras antologias. Publicou Folhetos Eróticos; Floresta dos Leões; O bom trepador, ilustrado por Apicius e a série de cartões Papai Noel Erótico. lucianobre29@hotmail.com BLOG: www.erotopoemas.blogspot.com

Revista Literaria: Plural —— 19 ´
Conto
Lúcia Nobre

Saudades da Zona

Rafael era mais uma vítima da má vontade dos funcionários da Prefeitura. Perdido nos corredores de luxo da burocracia, só queria uns cartazes sobre aleitamento materno. Há dias não conseguia encontrar aberto o setor de atendimento: era cafezinho que jamais terminou, funcionário que tinha ido cumprir um ordem... na China, greve preventiva, reuniões, dor de barriga que impede a ida ao trabalho. Tudo, menos o cumprimento do dever Tudo se faz no Centro Administrativo do Rio de Janeiro. Tudo não, alto lá. Naquele pandemônio monumental à ineficiência nem tudo se faz. Trabalhar, por exemplo. Esperou o elevador, pacientemente. Chegado à Secretaria, mais um porteiro pediu explicações. Deixou um documentozinho: “Tudo pelo povo”, não parava de repetir Abriu a porta, tantas vezes já o fizera, e viu o esperado – mesa vazia. “Não faz mal. Hoje dá pra esperar.”. Sentou na cadeira virada pro lado de fora de uma imensa parede de vidro: ”Nossa! Estou na Alta Zona. É a Zona daqui de dentro e a antiga Zona que não tem mais lá fora.” Coração apertado, deu uma saudade enorme. Quantas horas de almoço e aulas passara na Zona. Primeiro a infância, quando pegava o bonde Aguiar-Fábrica, no Largo da Segunda-Feira, o velho 60, e ia com a mãe à Rua da Alfândega. O bonde passava num lugar esquisito em que as mulheres ficavam dentro de casas e uma multidão de homens nas ruas, tudo aglomerado. Mais estranho era as pessoas que estavam no bonde, principalmente as mulheres. Ficavam mudas e abaixavam a cabeça. Nenhuma jamais saltou ali. Os homens ficavam ou sem graça ou com ar de cúmplices, também em silêncio.

Era um dos reinos do mistério. Todos mudos, parecia que o barulho do bonde era mais forte; o motorneiro corria mais naquele quarteirão; virava a curva e pronto. Que alívio, todos ressuscitavam.

Rafael menino não entendia nada.

Certa vez não agüentou. Na hora do silêncio fatal, cheio de curiosidade e procurando desvendar o mundo, deu um berro, ou nem deu, o silêncio é que fez como que todos os e as discretas passageiras sentissem o coração na garganta: “Mãe, que é isso aí....?”

Lembra do tapa tonitruante e a voz envergonhada e suplicante da mãe: “Cala a boca, menino!”. O motorneiro acelerou ainda mais.

Quanta zorra na Zona. Maiorzinho, sabia bem o caminho. Pinto de Azevedo. Quem terá sido esse Pinto? Bem a calhar, essa do Azevedo. Devia ser é doce, um dos “bons” e que entrou pra história. E a Carmo Neto? Seria alguma Maria do Carmo que também mereceu ser nome de rua por serviços prestados à comunidade?

Talvez não, a história poderia ser bem mais cabeluda. Ter sido o nome de alguma carmelita que fugira do convento com seu neto, ou com algum Neto...

Ele não pegara a época das francesas nem das polacas judias. Era a geração das mineiras, as cearenses, alguma cabocla amazonense. Mas o que tinha mesmo era neguinha de morro carioca. Já se tinha ido a época das grandes casas, agora eram puteiros, declarados, com puta na porta balançando a mão esquerda e chupando a própria língua... Emocionante! Com a mão direita balançando o peito esquerdo, chamando os garotos de machinho; ou só de calcinha, atravessando a rua.

Em outros tempos, quando passava de bonde, era tudo bem mais respeitoso, como muda.

Só que ficou melhor, mais livre. Era bom que existisse a Zona. Assim as donzelas da Zona Norte, Zona Sul, Zona Rural, podiam casar intocadas por tanto tarado que existia no Rio de Janeiro. Nenhum homem de bem queria que a Zona acabasse, pra lá é que mandavam os filhos homenzinhos, pra deixarem as filhas dos vizinhos virgens até a lua-de-mel. E elas ficavam. Era o dessufoco.

Saudades da Zona. Fazia bem passar a hora de almoço naquelas poças d’água melada e fumaça de churrasquinho de pelanca disputando o domínio aromático no Mangue. Olhar fundo pelas portas de sedução e que terminavam sempre com um ar oriental de corredores vermelhos com cortina esfarrapada na diagonal. Espiar desejoso o interior de um cubículo e imaginar quantas trepadas salvadoras já haviam sido gemidas e encenadas ali. A cara vermelha com que os paraibinhas saiam lá de dentro, arrumando a braguilha e tentando esconder o volume do alívio ainda um pouco inchado.

Rafael ia quase todos os dias. Fazia um bem danado à digestão. O ruim era a polícia, se aparecia um camburão, adeus viola.

Agora ele, doutor, que bobagem, os medos também da gonorréia. É, naquela época o medo era é de gonorréia... Saudades.

Revista Literaria: Plural —— 20 ´ C
onto
FRANCISCO IGREJA

Olhava pela vidraça como quem procura o passado de fortunas perdidas. Melancólico, esquecido que esperava alguém que talvez não existisse. Da Prefeitura, via terrenos arrasados como fotografia de guerra alemã nos dias finais da rendição. Não existia nem mais o rendez-vous da tia Laura, era por ali. Talvez bem debaixo do próprio prédio em que estava.

Machinho, incentivava os colegas de colégio a irem lá. Certa vez doeu o coração quando o Hipólito disse que nunca tinha comido mulher, disse isso com mais cara de babaca ainda. Rafael, bom anjo da guarda, emprestou dinheiro. Apertaram a campainha e um imenso cordão puxou o abridor. Subiram. Com ar de quem estava fazendo isso pela primeira vez, o virgem comprou a fichinha; passou à sala de escolha, umas dez putas piscaram o olha para ele. Tentou bancar um falso ar de Dom Juan pode e sabe escolher, fez sinal pra mais peitudinha. Entraram no cubículo, saindo dália a quinze minutos. “Eu disse pra ela que ela era a mulher mais gostosa que já comi.” “E ela acreditou?” “Mas ela é mesmo a mais gostosa...” “Pára com isso, ela é a única””. “Levou um susto. Pensei que tinha desvirginado a puta, com meu cacetão. Ela arregalou os olhos quando viu o lençol cheio de sangue. Me fez tirar o pau e aí é que notei que eu é que arrebentei o cabresto. Ela me fez pagar mais uma grana, pra lavar o lençol”.

A vida de Zona é divertida, meditava Rafael. Com quantas mulheres não transara por ali? Todas, sempre gostavam de suas taras carinhosas. Era macho mesmo. E se tivesse nascido mulher? Ah, ia ser puta. Isso aí, trepar o dia todo e ainda levantar uma grana. Até se imaginava na porta, polpa da bundinha à mostra, peitinho foragido, pedindo um cigarro a todo homem que passava e, discretamente, apertandolhe a parte baixa com as mãos, sussurrando pra entrar. Bem melhor que ser médico.

A Zona sempre tinha história. Certa vez foi um engraçadinho que esculpiu uma pica imensa numa barra inteira de sabão português. Quase dois palmos de comprimento, mais grossa que uma garrafa de barriguda. Saiu duvidando que alguma puta agüentasse tudo aquilo. É claro que nenhuma se interessou pela aventura. Aí apareceu uma das bichas faxineiras de puteiro e disse que agüentava. Molharam a escultura e... Ela foi de uma vez só. Tá na cara que deu rabecão. Todos riram à vontade. Alguns até mostravam admiração pelo sacrifício em nome da competência. Era muito humana, a Zona. Até pura, por parte de alguns iniciantes. Ainda no princípio, lá numa das pontas, sentou-se num botequim, do lado da maior lourona. Perguntou se ela queria fazer um programinha e quase estonteou de susto quando, com a maior voz grossona, ela respondeu: “Olha aqui, ô garoto, eu gosto é de homem, e com muito dinheiro”. Sem graça, mas tentando bancar o malandrinho, ele procurou salvar a situação: “Homem você tem, dinheiro é que são outras conversas”. E já que dinheiro chama dinheiro, quase sorriu quando lembrou da história em que ele e mais dois estavam na maior dureza e mataram aula pra ir pra Zona. Era o Paulo e o Clóvis. Juntando tudo que tinham não dava nem meia entrada pra um só. Não desistiram, saíram à cata. Queriam uma puta que desse pros três, assim mesmo. Elas sempre foram compreensivas. Não custou muito, arranjaram uma coroa bacana. Quem ia primeiro? É claro que quem entrou com a maior parte do dinheiro, o Paulo, um sulista de quase um e oitenta e fama de pau grande. Em seguida o Clóvis, o maior negão da escola. Quando chegou a vez do Rafael, ele foi. Só que saiu com a sensação de que tinha entrado numa bola oca e onde cabia mais umas cinco iguais à sua, todas juntas.

Ah, Zona bendita. Quanto cigarro filado às putas, quanta conversa de mãe compreensiva lhe deram. Foi muita porra que deixou pelos quartos, mais ainda pelas paredes das ruas escondidas, quando estava sem dinheiro e aproveitava pra desafogar o tesão na justiça de suas próprias mãos, com carona no olhar escorregado pro peito de alguma puta deitada e gemendo dentro de uma dessas casas encardidas.

Esperava e sentia saudades, saudades de seu paraíso perdido. Tudo num mesmo local. Agora firme na vida, constatando que dos escombros da antiga Zona surgiu uma outra forma de zonear a vida dum cidadão respeitável. Ergueram a Prefeitura – nada cortês, nada gratificante, nada libertadora. Perdeu a paciência. Sem pensar mais, levantou e foi-se embora, agora com a certeza de que nem mais a Zona é como era antigamente. Isto sim, muito pelo contrário, agora é que tem muita sacanagem, no sentido ruim da palavra. Saiu dali com uma nova frase de ordem: “Abaixo os putos, viva às putas!”.

FRANCISCO IGREJA (1948 – 1992) – Conto inédito do escritor luso-carioca. Autor de: “Script”; “Procura-se um poema”; “Nascimento de Irene”; “Das sortes e do destino”; “Postais de Irene” (livro virtual, in memoriam), co-autor de “4 poetas modernos”, todos de poesia. Ensaísta publicou: “A Semana Regionalista de 22”. Em conto: “Renascer de Jacinto”. Publicou, também, o “Dicionário de Poetas Contemporâneos”. Idealizador e um dos fundadores da APPERJ – Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro. Criou os “Cadernos de Poesia OFICINA”.

Revista Literaria:
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Plural
Conto
FRANCISCO IGREJA

À alma não basta o pré-destino.

A alma necessita do inesperado, das surpresas, dos encantos.

Alongo-me entre os galhos da roseira, arranhando os ânimos amortecidos pelas mentiras. Mentiras que matam a vontade de rosas. Mas apenas por um instante. No seguinte, já me reconheço flor, e desabrocho com cheiro de manacá.

Canto para encantar gente grande. Viajo nas asas das mariposas, entre as estrelas de Escorpião. Deslizo sobre as folhas do maracujá e renasço, dentro da flor. Ninguém, além dos alados, me conhece. É no pólen que encontro a única realidade. Fecho as portas à maioria, simplesmente por zelar pela delicadeza que cultivo, à revelia.

Estive a um passo do abismo, alguns poucos centímetros antes do inferno. E, com certeza, lá era o limbo. Foi quando minha alma fraquejou, o corpo acionou o medo e permaneci no lugar onde ainda estou: um exato passo antes do abismo.

Existe um litoral imenso, um espaço enorme, vazio, entre eu e parte de minha ascendência. Por isso vivo sem pouso. É o preço que pago. Mas nada pode ser mudado: sou diferente. (Graças a Deus!)

Talvez eu tenha esperado demais, porque o menos não me bastaria nessa altura de tempo quando já vivi metade do mundo e percebo aquilo que antes não via.

Sou filha dos bambuzais dançantes, das auroras e dos relâmpagos sobre a montanha. Amadureci ao som de roques, baladas pop, ecoando cantos enfumaçados de solidão. Não procurei refúgio em drogas, malditos apenas os tragos de nicotina, vinhos guantanameras e chucrúticos chopes. Dispensei há muito ressacas lexotínicas. Enfrentei a vida cara a cara. Tropecei na sorte e aprendi com a morte. Sou cúmplice da noite e fã da estrela vespertina.

Santa nunca fui, apesar de seguidamente incorrer em insanas santices. Aí prescrevo rimas a mim mesma e entrego minha sorte à mãe de Jesus. Sou pecadora recorrente, principalmente por falhar nas promessas. Peço perdão, me desculpo, me explico, mas sei que faço feio toda vez. Não me intranqüiliza muito esse pecado, pois minhaalmaéobedienteeaplicadanascoisasquediferemosestados de espírito que se aspira de cada filho.

Gostaria de acreditar, igual Clarice, que ‘dou para o mal’. Seriamuitomaislevecarregarculpasedevoçõesmalexercidas. Asvelasarderiampormaistempoàcabeceira

Aslágrimasdaparafinaseriambem-vindasqueimandoosdedos. Aceitariacomresignaçãoasmentirasdehoje-penitênciaa cumprir.

Uma visão mística seria bem-vinda clareando a madrugada. Terços e terços se revezariam na minha garganta até o deserto esperado, onde talvez encontrasse um oásis dentro da falsidade das noites. Se eu acreditasse...

Passagem

aJoséLeite

quero passar despercebida entre as pedras e águas que correm mansas e decididas a caminho do mar

o olhar perdido no roxo dos ipês que anunciam a casa de meu pai registrará apenas para mim mesma essa passagem de farsas e mutações as noites de encantamento visitando galáxias e constelações olhos atentos às imagens do universo são saudades de coração antigo procurando alento para as pequenas tragédias e continuarão, mesmo além no espaço que conquistei as palavras que cresceram comigo que brotaram e jorraram seguidamente aguçando o presente ficarão nas lembranças dos amigos só deles, mais ninguém

é meu desejo testamento para os que me amam digo: quero passar despercebida me deixem ir embora comigo.

Fogo sagrado de

Amelia à Amelia Sparano (in memoriam)

quando o vento sopra sobre a carta que anuncia sua partida entre a brasa do cigarro e a água dos olhos, penso em você seu perfume de tempo permanece à minha volta e, desde aquele dia recebi-o como prêmio por eu ter perseverado na vida um prêmio de esperança no entendimento, só após você que algumas de nós sobrevivem.

Márcia Leite, poeta, cronista e contista. Atual vice-presidente da APPERJ, editora do boletim literário Deleites, idealizadora e coordenadora do evento Todas elas e alguns deles, um enfoque na voz feminina da poesia contemporânea. Uma das poetisas de Além do Cânone-Vozes Femininas Cariocas Estreantes na Poesia dos Anos 90, organizada por Helena Parente Cunha, Ed. Tempo Brasileiro, 2004. Publicou Curtos & Definitivos, Poesia, RJ/2000 e Versos Descarados, Poesia, Rio/2007, ambos pela OFICINA Editores. Blogs: www.mulheresdelirantes.blogspot.com.br e www.versosdescarados.blogspot.com.br

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onto
Márcia Leite
Revista Literaria: ´

Carta 18

Paris, 5 de fevereiro de 2008

Saímos todos juntos, a noite parecia quente. Você não foi, pois nos encontraríamos em sua casa às duas da manhã. Não sei como tudo se passou realmente, embora tenha vivido os fatos. Contaramme que fomos ao Café com Letras e que cheguei à sua casa duas horas antes do previsto, completamente bêbada. Sua mãe, que também estava embriagada, deixou-me entrar e esperar

Sei que devo ter achado tudo isso muito estranho e agora, ao tentar ordenar os acontecimentos, até improvável. Fui até seu quarto, deitei-me em sua cama e, de tão confortável, adormeci.

Meio que ainda sonolenta vi a porta se abrir docemente, quase sem ranger: era você, que veio caminhando leve, doce e linda... Sorria gostoso. Era como se a visse, a me ver sonhar… Mas me assustei com a mudança brusca de sonho à realidade, embora a contigüidade os ligasse, o que fez com que de calmo o pulso se acelerasse e como que numa mistura de sensações senti meu corpo todo pular: a visão que tinha era embaçada, mas real.

Ainda não estava completamente lúcida e foi quando me cumprimentou. Respondi virando-me de lado, tentando voltar ao sonho. Mas você se assentou na beirada da cama, puxou-me contra seu corpo e beijou meu rosto, ombro e mais abaixo ainda, minha canela. Como num reflexo, ergui o corpo e nos abraçamos… Um abraço tão demorado que ainda agora, ao relembrar, consigo sentir seu cheiro e, sutilmente, ao mesmo tempo forte e decisiva, sua pele. Foi isso, naquele instante, que me fez enxergar. Ficamos assim, tronco a tronco, seios colados, cabeças sobre os ombros quando eu, insana, deixei meu corpo ir e a perdi de mim, transformando o lugar onde antes vivera o carinho, em um vão.

Feito o silêncio nos olhamos e, como se fôssemos habituadas uma a outra, iniciamos uma conversa informal. As coisas iam bem até que seu amigo entrou sem nos pedir licença e como se não fosse a hora imprópria, logo estava se apresentando e depois não parava de falar! Pouco a pouco isso fez com que a nossa dissimulada informalidade se transformasse em transtorno e foi isso, justamente isso, que me levou ao erro de lhe dar aquele escrito. Mas mesmo com a entrada brusca do rapaz, nossa conversa triunfou, embora agora muda. Ainda com o envelope fechado nas mãos, olhouo grave e indiferente. Sua insatisfação, no meio daquilo tudo, era nítida e se destacava mais ainda vindas de seus olhos grandes e verdes. E antes que me mandasse ir embora, saí dizendo que queria lhe rever, embora já soubesse ser o pedido inútil e a promessa insustentável.

Meus amigos me esperavam na sala e foram eles as minhas pernas para sair daquela casa que, pequena por fora, tornara-se imensa. No caminho, um deles foi quem me contou o que havia se passado antes d’eu ver você — mas eu sentia o cheiro louco do seu travesseiro… — ele me falava sobre sua mãe — … o toque macio dos seus lábios, os seus seios contra os meus… — ele me falava da cafeteria — … e percebi que talvez ainda me sentisse tocada! Lembro-me de olhar bem para a namorada e esvair-me em lágrimas, enquanto ela em indiferente.

Naquele mesmo dia, à noite, retornei a sua casa e, outra vez, sua mãe me deixou entrar. Em seu quarto vi o papel rosa sobre a mesa. Peguei-o. Dos vazios você fizera uma caderneta: estavam escritos telefones e nomes de alguns rapazes. Um José Sei Lá O Quê com endereço e encontro marcados para aquela noite. Havia outros de quem não me lembro o nome. Calmamente, aconcheguei-me em sua cama e olhando o papel, permaneci estática. Naquele eterno instante, tudo que eu pedia era para novamente sonhar

Isabella Lembi

. Foi uma das produtoras do programa “Letras em curso”, em Belo Horizonte/MG. Já teve seus poemas publicados em jornais e agendas literárias. Blog www.larissismo.blogger.com.br Em 2008, seu 1º livro de poemas: Larissismo

La polysémie de voyager

Je viens d’une grande ville appelée Belo Horizonte, dans l’état de Minas Gerais, au Brésil. Oui, je sais que vous connaissez São Paulo et également Rio de Janeiro, mais pour votre surprise BH est à côté de ces deux grandes états et nous sommes 2 millions d’habitants!.

J’ai toujours voyagé dans mon état avec mes amis. Normalement pendant les weekends on prend les voitures et on roule deux, trois heures pour aller découvrir des nouvelles cascades, pistes... on fait des marches d’environ 18 km pour arriver dans les endroits moins visités par les touristes: ça nous donne un plaisir inexplicable!

C’est importante de vous raconter tout ça, car j’ai besoin infiniment de vous préparer pour l’avenir. Tous ce que je vais vous raconter est tellement embarrassant même pour moi, non seulement le personnage de l’histoire, mais aussi la personne qui a vécu toutes les aventures possibles dans son exotique pays! Imagine-vous que j’ai déjà nagé dans le lacs avec beaucoup de piranhas! Mais même pour moi le voyage que je vais vous raconter est la plus dépaysant que j’avais fait jusqu’au aujourd’hui... Mais bon, je ne vais plus faire du suspense. D’abord il faut que je vous dise que mon voyage est pour vous quelque endroit courant, peut-être ordinaire. Donc, je n’espère pas que vous aimez tous ce que j’écris, mais je vous demande de ne pas vous fâcher et aussi d’être ouvert.

Je l’ai commencé il y a longtemps, car sa préparation m’a demandé des mois! Je lus quelques livres et je regardai aussi les filmes classiques, comme César et Rosalie, La vie est Belle, Paris je t’aime, Moulin Rouge et Le petite chaperon rouge!

... Et je suis arrivée en France! La première fois que je vins à Paris je ne connaissais rien, ni même un système de transport public efficace! Il faisait froid mais le soleil était la, bien que pas aussi content que moi! Tout de suite je me mis à parler mon français de grec et avec un peut de chance je réussis a acheter un billet pour aller voir la Tour Eiffel... vous le savez: on arrive à Paris seulement après l’avoir vue. Ensuite à ces années à programmer mon voyage j’étais en train d’en profiter! Quelque mois après je découvris que je ne pouvais plus partir et je restai.

Un an et quelque mois après je suis encore à Paris et mon voyage m’amène toujours aux endroits plus fantastiques et inconnues. J’ai besoin de vous dire que parfois c’est même difficile d’être là, traverser les rues, comprendre les gens dans la rue... mais au même temps est aussi un plaisir!Ce voyage est la découvert la plus belle de toutes les autres, car elle est seulement à moi. Elle est concrète et de fois colorié, drôle ou même mystérieuse. Elle peut se déguiser sans être jamais découverte... elle peut être dans les livres, se masqué dans les musiques et de plus dans la rue. Mon voyage la plus dépaysant, mon cher, est la langue française!

Brasiottinos

Da Loba nos despedimos em um quase trem Trem europeu e que não era bala, anunciava! Aos poucos a paisagem cinza se transformara em praia Em cada Lembi o olhar de visitar sua casa!

Viajavam sem conhecimento, só com a alma Mas haviam chegado sim, a placa afirmava! Para onde ir? Confusão, havia duas praias… E vieram à medieval, pois quem tá na bota usa saia! Enfeites na rua anunciavam festa próxima Mas no íntimo dos quatro já era a hora! Perambularam brumas e subiram muita escada Aquela rua era sua busca, mas aonde seria a morada? Cidade pequena e com muitas oliveiras De um conto aqui, outro ali, chegaram Logo propagou-se a popularidade brasileira! E na casa dos parentes, por meia cidade, entraram! Theresinha, que não falava italiano, esbanjou-se no licor Isabella, que deu seu licor a Theresinha, fotografou Juliana, que esbanjava inglês, praticou o portunhol E Itamar, que não falava nada, enrolou o italiano!

Revista Literaria: Plural —— 23 ´ Conto

Villa-Lobos – o brasileiro

OO Ouvindo a valsa da Dor uvindo da uvindo sente-se fundo a alma deste autor, a alma deste autor, alma este lobo Villa-Lobos. este lobo Villa-Lobos. Seus prelúdios pra violão, maravilhas. prelúdios violão, Seus prelúdios pra violão, maravilhas. prelúdios violão, Seus choros, inconfundíveis, choros, choros, tang tangem as cor em as cor em as cor em as cor em as cordas do nossos cor das do nossos cor das do nossos cor das do nossos cor das coração ação ação ação ação O Villa, também eu o conheci. Villa, também eu o Juntos, às vezes, às vezes, Juntos, às vezes, às vezes, subíamos ou descíamos os elevadores, subíamos ou descíamos ou cruzávamos nos compridos corredores cruzávamos nos compridos corredores corredores do Conservatório Brasileiro de Música, Conservatório Brasileiro Música, do Conservatório Brasileiro de Música, Conservatório Brasileiro Música, onde estudei. onde estudei. onde estudei. onde estudei. Sentia-me uma formiguinha Sentia-me formiguinha Sentia-me uma formiguinha Sentia-me formiguinha formiguinha diante daquele homenzarrão daquele diante daquele homenzarrão daquele daquele no físico, no temperamento forte, no físico, no forte, no físico, no temperamento forte, no físico, no forte, na ar ar arte e no cor te no cor te coração ação

Sempre com seu charuto à boca, com seu à boca, Sempre com seu charuto à boca, com seu à boca, dando suas baforadas de sons e tons, dando baforadas de sons tons, baforadas dissonâncias, cadências, dissonâncias, baforadas de ritmos brasileiros. baforadas de ritmos brasileiros. baforadas de ritmos brasileiros. baforadas de ritmos brasileiros. Ah! Esta alma brasileira Ah! brasileira Ah! Esta alma brasileira Ah! brasileira que fez música com o mesmo nome. que música com nome. Fez Noturno e Ballada Fez Ballada Fez Noturno e Ballada Fez Ballada numa Hommage à Chopin, numa – grande lobo polonês. grande polonês. E suas divinas Bachianas E suas divinas Bachianas que nos reportaram a um ser-filigrana que nos reportaram a um que nos reportaram a um ser-filigrana que nos reportaram a um a – o eterno germânico – Sebastian Bach. eterno – – o eterno germânico – Sebastian Bach. eterno ––Este homem brasileiro, homem Este homem brasileiro, homem Este homem brasileiro, natural do Rio de Janeiro natural Rio de que escreveu “Dança do Índio Branco”, que do Índio “Plantio do Caboclo”, do Caboclo”, “Plantio do Caboclo”, do Caboclo”, “Impressões Seresteiras”, “Impressões Seresteiras”, “Impressões Seresteiras”, “Impressões Seresteiras”, “Festa do Sertão”, do Sertão”, todas fazem parte do seu todas parte seu todas fazem parte do seu todas parte seu “Ciclo Brasileiro”, “Ciclo Brasileiro”, Brasileiro”, foi também, um violeiro, foi também, um tocador de violão, de por isso mesmo por isso mesmo mesmo,, ,, , ser ser ser ser seresteir esteir esteir esteir esteiroo oo o A este lobo genial este lobo este que hoje amo com paixão, que com que hoje amo com paixão, que com vai aqui uma humilde homenagem aqui homenagem vai aqui uma humilde homenagem aqui homenagem de um pequenino cordeiro, pequenino cordeiro, de um pequenino cordeiro, pequenino cordeiro, e por ser, também, brasileiro por ser, brasileiro e por ser, também, brasileiro por ser, brasileiro agradece a Deus por este Heitor a Heitor agradece a Deus por este Heitor a Heitor que nasceu neste nosso Brasil, que nasceu Brasil, plantou, colheu e partiu. colheu e partiu. plantou, colheu e partiu. colheu e partiu. colheu Eternizou sua obra e sua obra pingou em cada coração, pingou em cada pingou em cada coração, pingou em cada em a nota-gota da brasilidade. a da brasilidade. a nota-gota da brasilidade. a da brasilidade. Obrigada Villa-Lobos.

Obrig Obrig Obrigada ada ada meu ir ir irmão mão mão mão

Heitor Villa-Lobos nasceu na rua Ipiranga, em Laranjeiras, a 5 de março de 1887, filho do professor Raul Villa-Lobos e de Noêmia Monteiro Villa-Lobos. Aos 6 anos, seu pai lhe deu um pequeno violoncelo e iniciou-o na música, levando-o a ensaios, concertos, óperas, a fim de habituá-lo ao conjunto instrumental. Estudou, mais tarde, clarinete, violão, piano e seu pai obrigavao a discernir gênero, estilo, origem das obras, como também obrigava-o a apurar seu ouvido, testando-o em relação a notas, tonalidades etc..., e, palavras do próprio Villa: “pobre de mim quando não acertava...”. Perdeu seu pai aos 12 anos. Em 1900 escreveu uma peça para violão – A Panqueca – e já em 1905 começou suas andanças pelo Nordeste; mais tarde, Sul e depois os estados do Oeste brasileiro, iniciando assim suas pesquisas musicais.

Em 1908 escreveu “Cânticos Sertanejos” e, pouco depois, ingressou no antigo Instituto Nacional de Música, hoje Escola de Música da U.F.R.J.. Ali conheceu o grande maestro Francisco Braga, porém, rebelde e indisciplinado que era, meio ano depois abandonou os estudos. Daí para frente, Villa-Lobos foi praticamente um autodidata.

Quando viajou Brasil afora, voltou maravilhado, possuído de motivações sertanejas, folclóricas e dava também um imenso valor à pujança da nossa Natureza. Em suas entrevistas, disse, certa vez: “Na minha música eu deixo cantar os rios e os mares deste Brasil. Componho sem prender-me a formalismos, ou melhor, convencionalismos da nossa civilização.” Nesta época, VillaLobos para sobreviver tocava violoncelo, às vezes violino, em pequeninas orquestras do interior. Passou também, a dar maior importância ao violão como instrumento de recital e concerto, o que faria na prática, mais tarde.

Homem de temperamento explosivo, exaltado, também sabia ser generoso, terno e amigo. Por ser verdadeiro em suas opiniões e respostas, quando solicitado, foi odiado ou incompreendido por muitos. Ao mesmo tempo, possuía um magnetismo pessoal que atraia pessoas de várias classes sociais. Teve como amigos escritores e poetas: Ronald de Carvalho, Graça Aranha, Menotti del Picchia, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Bandeira, Drummond entre outros.

Em 1913 casou-se com a pianista Lucília Guimarães. Em 1922 participou, em S.Paulo, da Semana de Arte Moderna e, como tantos outros artistas que lá estiveram, foi vaiado. Daí para frente dá início às suas viagens pelo exterior, apresentando-se lá e cá, no Rio e em S.Paulo. Em 1932 foi nomeado superintendente de Educação Musical e Artística do então D. Federal, e, em 1942, diretor do Conservatório Nacional de Canto Orfeônico do Ministério de Educação e Cultura. Durante todo este tempo realizou concentrações orfeônicas fabulosas. Ainda em 1932 teve a 1ª concentração no campo do Fluminense com professores e alunos das escolas primárias e secundárias do então D. Federal. Em 1940, uma grande concentração no estádio do Vasco da Gama com 40 mil vozes sob sua regência, e em 41, nova demonstração no mesmo estádio, quando Sílvio Caldas cantou “O Gondoleiro do Amor” de Castro Alves, regido por Villa, acompanhado por 30 mil vozes.

Em 1936, durante sua estada em Berlim, enviou carta à mulher rompendo definitivamente com seu casamento, e, de volta ao Brasil, passou a morar oficialmente com Arminda Neves d’Almeida, no apartamento 54 da rua Araújo Porto Alegre nº 56, no centro da cidade, onde viveu com sua companheira até sua morte em 1959.

Villa-Lobos, já como regente de suas obras, atuou frente a inúmeras orquestras de 24 países, incluindo o Brasil, claro; ocupou o alfabeto inteiro, começando por Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica e terminando pela Suécia, Suíça, Uruguai e Venezuela. Villa-Lobos está entre os 20 grandes compositores de todos os tempos. Recebeu muitas láureas estrangeiras, principalmente nos Estados Unidos e em alguns países da Europa.

Sua bagagem musical é enorme; perto de 1.000 peças de todos os gêneros: 9 Bachianas, 14 Choros, 17 Quartetos de Cordas, 16 Cirandas, 12 Sinfonias, Sonatas, Trios, Poemas Sinfônicos, Música Sacra, peças para piano solo, óperas, balés etc , etc , etc... Suas Bachianas, cuja origem remonta às viagens que fez pelo interior do nosso país – quando constatou a semelhança de modulações e contracantos do nosso folclore musical com a música de Bach – colocaram-no no ápice, entre os maiores músicos de nosso tempo. Quando misturou esse material primitivo com formas pré-clássicas, conseguiu uma síntese absolutamente original, onde o “Lobo de Leipzig” (Bach), seu espírito e sua técnica foram envolvidos em cadências brasileiríssimas. No mundo musical, planeta afora, as Bachianas são suas obras mais conhecidas e mais executadas. Villa-Lobos é, sem dúvida, o maior gênio musical das Américas, principalmente pela sua brasilidade ao compor. Sua obra passou à posteridade, pois é venerado, reconhecido e executado por todos os rincões deste Planeta.

Em 1948 fez uma cirurgia no Hospital Memorial de Nova Iorque, onde, horas antes de ser operado, pediu papel em branco, pautou-o e lá escreveu uma Ave Maria. De 49 a 59 continuou suas turnês pela Europa e Américas. Em 1957, pelos seus 70 anos, o New York Times publicou um editorial em sua honra. Em julho de 59 regeu seu último concerto, no Empire Music, ao ar livre – Festival de Verão em Nova Iorque. Em 7 de setembro no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Villa-Lobos assistiu, já bem combalido, ao concerto em sua homenagem, Magnificat-Aleluia, obra sacra de sua autoria, feita a pedido do Papa Pio XII. Este pedido foi formulado por intermédio do então Cardeal Giulio Montini, que veio a ser, posteriormente o Papa Paulo VI.

A doença agravou-se e Villa-Lobos foi internado no Hospital dos Estrangeiros. Faleceu, de câncer, aos 72 anos de idade em 17 de novembro de 1959, em sua residência.

Só recentemente, os brasileiros passaram a comemorar em 5 de março o Dia Nacional da Música (depois de um escrutínio, entre três compositores nossos mais famosos). Felizmente venceu Villa-Lobos. No entanto, em 1961, o então prefeito de Nova Iorque, Robert F. Wagner, proclamou o dia 5 de março como o Dia de Villa-Lobos.

Espero e desejo que em 2009 saibam comemorar aqui no Brasil, com muita arte, respeito e veneração, os 50 anos de morte deste grande homem e compositor brasileiro, carioca, eternizado mundialmente em sua Arte – a Música – . Aguardemos!

ILKA JARDIM – carioca, formada em Música pelo Conservatório Brasileiro de Música, exerceu, por mais de 20 anos, o cargo de pianista – ensaiadora do Corpo de Baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Faz parte da diretoria da APPERJ – Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro; associada ao SEERJ – Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro. Seus poemas estão em várias coletâneas lançadas no Rio de Janeiro. Seu poema “Maria da Silva” mereceu 1º lugar de melhor texto no VIII FestCampos de Poesia Falada/2006 onde, também, obteve o prêmio de melhor intérprete. É responsável pelo evento poético anual “Poesia dá Jardim”, junto a APPERJ, no mês de setembro e que reúne mais de 80 poetas de várias tribos, em sua casa em Copacabana, Rio/RJ. Musa da Poesia em 2005, pelos Cadernos de Poesia OFICINA.

Música
Villa-Lobos – pinceladas sobre o gênio “O petróleo e a eletricidade são úteis para movimentar as máquinas; a música movimenta as almas.” H. Villa-Lobos
Revista Literaria: Plural ´ —— 24 ILKAJARDIM

o luxo custa caro

Pode até parecer loucura, e acho que é por se tratar de um poeta metido a cronista, masotítulodestamatériatocoufogoemmeusneurônios;oricoeocaro.Aoescrevê-la medepareicomasseguintesperguntas:seráqueaaltasociedadequefazdoseucotidiano um luxo, combina com as duas últimas palavras daquela frase (custa caro)? Ou sequer sabe o que é caro? Enfim (caro ou rico) leitor, o “sol

nasce para todos, masasombraéparapoucos

”,assiméoluxo,umacaríciadepelúcia felpuda,ummmmmmmm!!! Buquêde merlot nachamavalsanteàluzdevela.

Assim é a moda, atiça e envolve a todos como um novelo de lã. Se pararmos para pensar que o estilista, quando tece e gera sua criação modela pespontos no cristal de pura seda, lapida formas que contornam a bela criação humana em busca de sua mais nova inspiração, despertando em todos o desejo de navegar com um salto agulha na base de seus pés, então iremos respirar “dourados”, em um final de tarde num típico caminharbardotvestindoumlongovermelho.

Acordemos para realidade, mas sem deixar de sonhar, um sonho simples de meros mortais que circulam por entre escadas rolantes à procura de um pret-a-porter ilusório queasfaçamimaginarumtoquedeglamouremsua maison corporal.

A mulher, ao se despir de sua nudez, constrói a pincelada do seu mais recente personagem. “Da saia godê-dramática” ao “simples tubinho-humor” ela transita em marés de emoções, ancora sua roupa à sua identidade momentânea, um troca-troca de emoções, constatando, apenas, que só a MODA é capaz dessa proeza, de nos permitir essa diversidade de nos expressarmos.

Ao levantar do dia – hippie. Em um breve passeio – retrô. E ao cair da noite –femmefatale,umluxo!

Essa cadeia “alimenticiamodista” que devora a racionalidade humana, nos concede recursos para transitarmos em delírios que vão do luxo ao lixo.

Portanto, chega de regras e padrões impostos por ditadores da arte de criar, o grande “Top-Hit(ler)” dessa temporada do século XXI é você.

Então é hora de ativar sua imaginação. Construa sua maison com o que há de mais saudávelparaoseucorpo.Coloquenapassareladavidaoseumelhor casting edesfile... Apenas desfile... Deixando o mundo se render ao MAIOR de todos os luxos –VOCÊ!

“...amodaéumluxoenãoumanecessidade”.

Moda

Revista Literaria: Plural —— 25 ´
Marc Jacobs Flavio Dorea a Christiano Butke por Flávio Dórea – Zulu

Posse no PEN Clube do Brasil

(filiado ao Pen Club Internacional – Londres/GB), Rio/RJ de novos membros titulares: Edir Meirelles (Pres. da União Brasileira de Escritores/RJ), Laura Esteves (Grupo Poesia Simplesmente), Tanussi Cardoso (Pres. do Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro), Marcus Vinicius Quiroga (indicado ao Prêmio Jabuti/APCA 2008), Cláudio Murilo Leal (presidente do PEN Clube), Sérgio Gerônimo (Pres. da Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro) e à esquerda Maria Leda (Escritora).

PP PP Prêmio de MELHOR REVIST rêmio de MELHOR REVIST rêmio de MELHOR REVIST rêmio de MELHOR REVIST de REVISTAA AA A

CUL CUL CUL CUL CULTURAL TURAL TURAL TURAL TURAL AL AL AL AL ALTERNA TERNA TERNA TERNATIV TIV TIV TIVAA AA A de 2007 de 2007 de 2007 de 2007

A Revista Literária Plural n° 1 A Revista Literária Plural 1 Revista 1, organizada por Sérgio Gerônimo, foi uma das escolhidas para participar da das escolhidas participar uma das escolhidas para participar da das escolhidas participar Mostra de Revistas Literárias Brasileiras (1970/ Mostra Literárias Brasileiras (1970/ Brasileiras 2005), 2005), 2005), 2005), dada a sua importância no cenário cultural nacional, divulgando e reconhecendo o mérito dos autores brasileiros, uma retrospectiva de revistas que se tornaram referência na história da literatura brasileira, o acervo mostra 52 títulos: de 23 a 30 de novembro de 2007, em Brasília/DF, na Faculdade Evangélica; de 8 a12 de janeiro de 2008, na cidade de São Félix/BA, no Centro Cultural Dannemann/UFRB; de 1° a 11 de setembro de 2008, em Brasília/DF, na Biblioteca da UnB, durante a 1ª Bienal Internacional de Poesia de Brasília. Recebemos, também, o prêmio de MELHOR RE- prêmio de MELHOR VIST VIST VISTAA

A CUL

TIVAA AA de 2007 2007 2007,, ,, , outorgado pelo Congresso da Sociedade de Cultura Latina – Seção Brasil. Estamos orgulhosos. A OFICINA Editores há 23 anos vem incentivando, divulgando a poesia e a prosa brasileira, e nesse percurso publicou mais de 1000 poetas/prosadores.

Festival de Poesia Falada do Rio de Janeiro Prêmio Francisco Igreja/APPERJ

AppFlávioDórea entregandooPRÊMIO FRANCISCOIGREJAao1° lugardemelhortextodo Festival de Poesia Falada doRiodeJaneiroaopoeta CésarBorralhodoRio/RJ, comopoemaOcarteiro.

Anna Gilli, MELHOR MELHOR MELHOR MELHOR MELHOR INTÉRPRETE INTÉRPRETE INTÉRPRETE do festival comopoemaTemapara uminteriorimaginário,ao centro acompanhada de SérgioGerônimoeo autorGüntherDiDio KrähenbühlSãoPaulo/SP .

TROFÉU FRANCISCO IGREJA TROFÉU FRANCISCO IGREJA IGREJA: Renata Paccola (a mais bem classificada associada neste festival – 3° lugar demelhortexto).Apperjianosquetambémconcorreramao troféu –LuizOtávioOliani;TatianaAlves;Cristina Abrantes; Lêda Miranda; Larissa Loretti

Jurados do encerramento do festival: app MárciaLeite,GilbertoMendonçaTeles,Paulo Telles, Quivia Mariana, Jacqueline Sperandio, appSérgioGerônimo,TeresaCristinaMeireles de Oliveira, Deolinda Manuela Gonçalves Oliveira,MariaEmíliaIgrejaGonçalvesMotta.

Variedades

Variedades Variedades Variedades Variedades

Variedades

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Variedades
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AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQUEDO

AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQ AMORES DE BRINQUEDO UEDO UEDO UEDO

Nosso Nosso amor de Natal amor Natal Eu te quero no Natal, como se eu fosse o papai Noel maisfemininoqueexistisse.Distribuotodosospresentes, deixo-te por último. Estacionoomeutrenóemteutelhado,desçoachaminé, acendoalareira,eporqueestounostrópicos,virofogo...

Eu te amo Eu te amo te

Eu te amo, Como quem rabisca a parede Brinca de pique, Pula um riacho Sem que saibas o quanto, Eu te amo, De esconde-esconde por enquanto Eu te quero, Como o menino quer a bala, O chocolate, A bola de gude, O sorvete!

Eu te amo como quem sabe Que o doce tem paladar efêmero, E a infância, Gosto eterno!

Amor de chuva Amor de chuva Amor de chuva Amor de chuva Eu hoje te amo, como quem brinca na chuva pisando em poças d’água, Molho os pés e porque tudo em mim vira água, te bebo.

Nossa amarelinha! Nossa Nossa

No céu das amarelinhas, Conto estrelas. Pulo espaços no infinito de nós dois. Jogo a pedra. Jogo, jogo, jogo... Alcanço o cometa dos teus olhos, Multiplico as constelações No céu da tua boca.

Nosso amor, agora, Virtual,longínquo, Próximo e distante, Me convida ao jogo Nesta infância tão bem-vinda! Jogo, jogo, jogo Jogamos, Jogamos tudo fora, Porque?

Eurídice Hespanhol.

PP PP Paa aa a la la lavr vr vr vr as as as as as Nas palavras penso chegar onde quero, Viajo, navego, me entrego... Sinto se estou perto ou longe. É um jogo, Mas não de palavras, De esconde-esconde, De pique-pega, De infância plena... Um amor bobo, Despreocupado O amor quando não tem medo, É bobo, muito bobo!

Por isso eu te amo, Assim como quem brinca De pique, De passear no bosque Encontrar o lobo mau E nunca, nunca ser a chapeuzinho vermelho Nem a vovó ou a mãe. Tu não és o lobo, muito menos o caçador Eu sou a cesta de doces e tu és O cãozinho que acompanhava a menina. Pronto, Acabou a história...

Futebol enamorado! Futebol enamorado! Você deu a largada, Saiu correndo para a grande área! Chutou pra mim! Na trave... Ninguém agarra nada... Lateral, No meio do campo, Vencendo a distância Correndo pro gol! O juiz apita, Falta! Não pode pôr a mão na bola... Tudo de novo, Vai rolando a bola devagar, Calma, Não chuta ainda! Espera!

ídice Hesp

E ur

anhol . Mãe, poet a, dirige atualmente o Movimento Poet as sem Fronteiras (Prêmio Dest aque Cultural 2008, concedido pela Academia de Letras e Artes de Paranapuã, RIO/RJ), coordena t ambém os salões poéticos da AABB. Ativist a cultural. Membro da APPERJ, SEERJ e UBE/RJ. No prelo seu primeiro livro de poesia: “Infinitos”.

Calcula a distância! Mede, mede o entusiasmo da torcida! Corre, senão pode ser gol contra, Chuta,vai! Chuta! Um grito! Um apito! Impedimento total... Quem mandou esquecer a camisinha!

Beijos atropelados Beijos Eu hoje te desejo, Como quem desce a ladeira De bicicleta, Sem freio:

Beijos

Beijos

Beijos

a atrtr trtr tropelados opelados opelados opelados...... ...... ...

a

a

Revista Literaria: Plural —— 27 ´
UEDO UEDO UEDO Poesia
UEDO
Goool...

REVELAÇÃO

Já não posso esperar da vida novo encanto, viver de um grande amor momentos delirantes, voltar a ser feliz, sequer alguns instantes, adormecer sorrindo e nunca mais em pranto.

Sua revelação, que ainda me dói tanto, é prenúncio, doutor, de dores cruciantes, sofrimentos cruéis, angústias incessantes, mas, enquanto puder, das mágoas farei canto.

Não faço imprecações nem grito em desatino. Aceito, sem revolta, a cruz do meu destino. Começo a definhar. Eu já não faço planos.

Em breve partirei. E ao terminar meus dias, vendo morrer comigo as minhas fantasias, conforta-me prever o fim dos desenganos.

POR QUE, FLORBELA?

Por que, Florbela, abandonaste a vida, tristemente, num quarto solitário? Por que marcaste a hora da partida para o dia do teu aniversário?

Pudesses resistir, mulher sofrida, farias de sonetos um rosário. Talvez, no afã dos versos, distraída, esquecesses o mal do teu sacrário.

Mas eu não te condeno, pois o amor, o amor, em ti, Florbela, foi tão forte, tão grande a tua angústia interior!...

Teus versos foram belos de tal sorte que, após uma existência de amargor, teu nome permanece além da morte.

O RELÓGIO

Horas depois de me encontrar com ela e apaixonado arder, preso em seus braços, eu deparei com o relógio dela no leito onde repouso meus cansaços.

Quando partiu (eu vi pela janela), o meu olhar acompanhou-lhe os passos. Ia ditosa, radiante, bela!... Por certo, ia pensando em meus abraços.

Segurei o relógio, ternamente, daquela que se fora tão contente, que o esqueceu no instante da partida.

E constatei, surpreso, estar parado, talvez para deixar eternizado o encontro mais feliz da minha vida!

GRATIDÃO

GRATIDÃO

Disseste que meu nome é doce e que seduz, que ele é nome bendito, enleva e tem primor Fizeste-me feliz, poeta sedutor, e me elevaste ao céu, qual um astro de luz.

É meu nome de estrela? Ele fulge e reluz? De infinita beleza e de raro fulgor, teu soneto me faz viver sonhos de amor, de inefável prazer entre enlevos a flux.

Comparaste o meu nome ao nome de uma santa?!... É carinho demais! É ternura que encanta. É sublime emoção. Tais louvores eu hei de abrigar, jubilosa, em meus sonhos mais tersos. Com que ardor exaltaste o meu nome em teus versos!... Mais ditosa eu fiquei por meu nome ser Neide.

NEIDE BARROS RÊGO, premiada no Brasil e no exterior, fundou e dirige o Centro Cultural Maria Sabina, em Niterói, onde ensina a arte e dizer e realiza eventos lítero-musicais. Membro de diversas academias, entre elas a Fluminense e a Niteroiense de Letras. Membro vitalício e delegada da Associação Universal de Esperanto, especializada em poesia e declamação. Em 1994, organizou e editou a antologia Água Escondida. Em 2004, lançou seu livro de poesias Revelação. Em 2007, publicou duas antologias, que organizou com o poeta esperantista Sylla Chaves: Brazila Esperanta Parnaso (em esperanto) e Poesias Escolhidas do Brazila Esperanta Parnaso (bilíngüe).

NEIDE BARROS RÊGO

Revista Literaria: Plural —— 28 ´
Poesia

Vida

Perdas Lutos Entraves Problemas Horizonte Abertura Possibilidades Diálogo Enfrentandoavida!!!

Carnaval?

Hoje Fantasia Máscara Brincadeira Rua Folião Agitação Compasso

É música no ar No olhar No tato e no contato

Povo que dança Alegria? Só se não contar Com o raiar do dia...

Amo

Amo Amomuito Amo muito você

Você e eu Você em mim Eu em você Nós Muitos nós Muitos de nós...

Onda

Movimento de ir e vir de partir e voltar de nascer e morrer onda de som onda de mar onda de rádio onda de vibração em todo lugar cor sabor envolvimento

Para cima e para o alto Canto ou culto Devoção-dedicação popular erudição...

Eliana Wissmann Alyanak. Psicóloga, poeta e musicista. Primeiro livro individual lançado em 2001, DeliciosamenteApaixonada, ao qual se seguiu UrbanoAmor Suburbano, e está aguardando lançamento de In Tempo.Associada da APPERJ, participa de várias de suas coletâneas e antologias. Participou na REVISTA LITERÁRIA PLURAL N° 1.

oesia

Revista
P
Eliana Wissmann Alyanak

Mulher, você é quem brilha

Durante período de gestação, doa-se em prol da nova criação, conduzindo a semente da vida, do novo ser que assume guarida.

As dores do parto logo esquece, pelo filho qu’embala s’enternece e leva seu tempo sempre em prece, doando amor que jamais fenece.

Funcionária do lar, por vezes d’Empresa. Ajuda por pão e educação à mesa. Maternal-guia, nunca erra a trilha.

Por tanta capacidade de doar, não olvidar de: ao esposo acarinhar, faz-se estrela, ELA É QUEM BRILHA!

Saudades de outros

Era criança. Toda agasalhada sob neblina, quase congelada ia correndo até a invernada onde bebia o leite da vaca Malhada.

Pari passu, o pai, qual um cão de guarda seguia os passos daquela menina. Havia tanta paz e ninguém de farda. Borboletas... Sede? Água da mina.

Hoje... O pai subiu pra outra morada. Leite? Vem empacotado do mercado. Muros ao lado do caminho, com cartaz.

Entre os passantes vai gente fardada. Por onde pisa é tudo concretado. Mina d’água não existe mais. Sem paz.

Mais apelo ecologista

Perguntam-me se vou continuar chorando pelos rios, pelo mar, implorando em prol da despoluição, fazendo poesias em profusão.

Poderia até calar meus versos, tentar esquecer sonhos dispersos, dizer: estou pregando em desertos, procurar olvidar a poluição, limitar os anseios em oração...

Mas, não consigo esquecer o Senhor! Veio ao mundo apregoar o Amor.

E prossigo a distribuir poesias, por não conseguir sentir alegrias sem tentar esclarecer o ser errante!

Não deve soltar balão, não queime a plantação salve o ambiente, aprenda a ser gente.

A natureza tem de subsistir e Deus a criou pra te servir

Águas de Marte

Águas de Marte

Os cientistas pesquisando estão... Mal esperam o dia em que partirão; e acharão a água... De gelo extrairão? Lá poderão até fazer plantação?

Os cientistas pesquisando estão... Mal esperam o dia em que partirão; e acharão a água... De gelo extrairão? Lá poderão até fazer plantação?

Enquanto isso na Terra há pena... Continuam a nossa água poluir. Balões ao alto mudam a cena, não zelam para o ser subsistir

Enquanto isso na Terra há pena... Continuam a nossa água poluir. Balões ao alto mudam a cena, não zelam para o ser subsistir.

Continuando as matas incendiar, poluindo os rios, que poluem o mar Que futuro iremos encontrar?

Continuando as matas incendiar, poluindo os rios, que poluem o mar Que futuro iremos encontrar?

Precisamos ajudar solo florescer Lógico, queremos água em Marte ter... Mas, se alimentos na Terra não colher, não contarmos com Deus a nos abençoar, poderá até tornar-se tarde demais para as comemorações espaciais.

Gecy Cândida da Silva

Precisamos ajudar solo florescer Lógico, queremos água em Marte ter... Mas, se alimentos na Terra não colher, não contarmos com Deus a nos abençoar, poderá até tornar-se tarde demais para as comemorações espaciais.

, paulista, 81 anos de idade. Escritora, pintora, filiada a várias Academias (ANLA,APALA, GEBIA,AJUB-RJ), àAPPERJ, ao Lions Clube Maracanã-RJ, ao Centro Cultural Forte Copacabana e à IWA/EUA. Obra publicada em jornais e revistas literárias; é conferencista, adesguiana, dedica parte de sua obra à conscientização da despoluição e conservação da natureza, especialmente pelas águas do Rio Paraíba do Sul.

Gecy Cândida da Silva

Revista Literaria: Plural —— 30 ´
Poesia

Meu Companheiro, Rio Potengi

Ah! Meu doce e sempre companheiro Viste meu primeiro suspiro, verso ao vento. Acolheste-me em teus braços de leite Leito das bravuras adormecidas em meu peito.

Nuvem dourada no arrebol do dia. Trazes no sorriso a inocência do infante

E nos fartos lábios o mistério secular dos anos. Com sabedoria alimentaste meus sonhos Sem esquecer os sobreviventes dos teus frutos Heróico povo ribeirinho com barcos e velas de pano.

Vi o beijo do verde e largo Tejo mar português Vi a sinuosa poesia do boêmio Sena – flor parisiense Vi então através d’um véu d’água salobra

A prata estonteante dos fios dos teus cabelos Quando a lua cheia derrete-se lá no firmamento E faz bater no meu peito acordes de saudade Então me veio vontade louca de correr para teu peito Só para aninhar-me outra vez em teu morno leito.

Ah! Meu doce e sempre companheiro Companheiro da tristeza, da alegria, da resistência. Enxugasteminhaspalavrasdedesesperança

Para demonstrar que na rua da vida A constante rima tem que ser sempre com esperança. És meu rio de ontem, de hoje, de sempre. Lavadeira de minhas magoas, exaltação de meus brios.

Revelação do espelho do meu íntimo Em eterna corrida entre os braços mornos do teu leito.

Ah! Meu doce e eterno companheiro Lado a lado sempre a cada novo sol No embalo das palhas de coqueiro Quando o bem-te-vi fagueiro paquera o pôr do sol És minha memória no traço das minhas vitórias.

Colômbia, por que choras? Colômbia, por que choras? Teu choro é lamento angustiado em muda prece impotência mergulhada em turbulento mar de egos. Egos que se exaltam na busca do poder e confirmam o círculo da ganância no livro triste da história através do punho serrado dos algozes. Tiranos incansáveis da luxúria do ter e da prática do domínio sobre a humanidade comsoberbia, arrogância implacável. Hoje, a luta dos povos não é apenas por liberdade não é mais uma luta apenas por comida casa, saúde, educação, emprego... Não é mais uma luta apenas por igualdade amor, respeito, dignidade, paz... Hoje, a luta é mais feroz e desigual. É o tráfico em ascensão ao poder total com a mísera desculpa que vai cuidar dos pobres, dos campesinos, dos excluídos e vão destruindo com coca e heroína os restos agonizantes da humana sociedade.

O tráfico organiza-se como grande empresa industrial fomenta a demanda por seus produtos entre os incautos infiltra-se sorrateiramente entre jovens de qualquer idade e mina a família, a escola e a sociedade abala as estruturas do campo e da cidade. Forma exércitos de criminosos impiedosamente organizados para destruir a paz, harmonia do convívio social. Hordasdeseqüestros,assassinatos,roubos,vícios.

A sociedade agoniza na inércia do descaso. Batalhões de jovens aliciados com o colorido da fábula do poder e riqueza fácil sem esperança de vida continuada.

— tiros — bombas — explosões — corpos trucidados. — lágrimas — dor — angústia — luto – comoção geral.

Em uma escola do bairro em que moro — perguntou-se a uma criança de apenas nove anos o que desejaria ser quando crescesse... — Sem titubear em seu sorriso inocente depôs contra os valores estabelecidos pelos antepassados real pintura grotesca do crítico momento atual da humanidade: —“traficanteserei”.

S

Colômbia, por que e por quem choras? Sei que choras por teus diletos filhos nas mãos da empáfia do crime. Crimequeescravizacomfalsaspromessas na cisão da liberdade, na cisão do direito de ir e vir na cisão do direito de transformar dignamente o país. O sorriso do sol nos olhos do teu povo apagou-senadesesperança de futuro incerto de futuro tenebroso...

Tão tenebroso quanto às patifarias do famigerado Pizon ao devastar os povos das Cordilheiras dos Andes. Colômbia, tu choras por todas as crueldades praticadas contra teu povo hospitaleiro e pacífico.

Choras pelos teus bravos filhos sobreviventes de velhas contendas sequiosos de liberdade, amor, paz.

Sequiosos do direito ao trabalho sequiosos do direito ao cultivo à terra dos ancestrais sequiosos da celebração à vida, à cultura, à tradição, à poesia.

Choras pelas mesmas razões que corre o choro de todas as nações.

Choras pelo direito que tem o teu povo de ser uma nação plena e feliz soberana na harmonia da paz e na construção do progresso com justiça social fruto da união dos teus filhos.

Este é o grito que rasga minha alma, meu peito e coincidentemente ressoa com o eco do grito teu. Corre os Andes, o Atlântico, o Saara, as Estepes deságua no coração de pais, mães, avós e tios aflora no sorriso angelical de cada criança na busca de um mundo em que se possa ser realmente feliz.

ESSAS VALOROSAS MULHERES

Heroínas,asvalorosasmulheres incansáveis na labuta da cria. Do fogão à marreta com arado ou caneta sua fala, veludo na tristeza na coragem imbatível sempreavencerespinhos.

Heroína é a mulher que sem esperança no ventre tece amor com seu sangue e fertiliza a nova terra. Do fruto das entranhas busca sempre caminhos na escritura de novos horizontes.

Essasmulheressãorosas,violetas orquídeas,açucenas. Trazem no ventre fé nocoração,carregamesperança. Força—sãoessasvalorosasmulheres!

Retrato de Mulher

Catedral de fé e esperança (...) Mulher! Sois coração superior à razão Sois das batalhas estandarte da paz Semeeira do jardim da tolerância Sois andorinha serva do amor Águia esplendorosa em defesa do ninho Sois renda miçanga pão alecrim Mágico mister de ternura e paixão Cheiro de tarde, porta aberta aos sentidos Aurora na canção de bom-dia. Eis frasco com preciosa fragrância Sábias mãos na ordenha do mundo Incenso ímpar de aromas mil Secretos noturnos paridos no amor Lábios em vestes de cetim e mel... Sois rio manso, córrego, alicerce Soiscria,criadouro;soisessência Peito farto em aconchego, sois Mulher!

Revista Literaria: Plural —— 31 ´
Poesia
JANIA OUZA – poeta, escritora, artista plástica, ativista cultural, Diretora de Eventos da Sociedade dos Poetas Vivos e Afins do RN – SPVA/RN, tendo organizado a “Antologia Literária” publicada pela entidade, volumes 01; 02; 03 e 04. Participação em várias coletâneas nacionais. JANIA SOUZA

O mundo vai acabar?

Como será o final anunciado?

Acabarão as matas, as florestas Onde permanecerão os pássaros, onde farão seus ninhos Não mais ouviremos aquele cantar anunciando O amanhecer, não verei mais beija-flores

Sugando a água doce dependurada no bebedouro do meu jardim? E os bem-te-vis, com seu Cantar Repetitivo: bem te vi, bem te vi. As rolinhas, ou rouxinóis?

Não havendo mais árvores, onde dependurarão seus ninhos Onde ficarão os filhotes que ainda não aprenderam a voar? Com o desmatamento, sem arborização ciliar, como Ficarão os rios? As fontes que cantam, as cachoeiras. Como haverá rios se elas não mais existirem?

Os animais selvagens que na mata vivem, Procriam e se alimentam, mas eles estão acabados

Tentam criá-los em cativeiro e as pessoas Cuidam com tal carinhos, que eles vão continuar Vivendo, se multiplicando, embelezando as matas.

rouxinóis? desmatamento ou estrelasmais

vai acabar?

Que matas? Não estão destruindo as florestas, Com desmatamento, queimadas? Plantar pastos Para o gado ficar gordo e forte, para depois Serem devorados por predadores que estão esfomeados Os beirais dos rios, estão desmoronando com o desmatamento Dos mares, estão tirando o que um dia virão cobrar E a Terra aos poucos vai se acabando até nada mais existir O céu escurecendo, logo não teremos mais lua, sol, ou mais estrelas. Aumentarão os predadores, os invasores de terras, Os traficantes, as guerrilhas, os assassinos Poderão descansar, nada mais existe para acabar Oceanos invadirão a terra e ela se vingará Vai tremer, desmembrar-se em pequenas partículas Que se espalharão por todo universo. É o fim da Terra e de toda Humanidade Que nada fez para salvá-la.

Que nada fez para salvála.

TherezaFreireVieira – Médica, especialista em Geriatria e Gerontologia.Atividade literária abordando gêneros como romance, contos, poesia, infantil, biografias, com mais de quarenta livros publicados. Os artigos sobre velhice e envelhecimento são distribuídos pela Agência de Notícias Brasília, de norte a sul do país.

Revista Literaria: Plural —— 32 ´
Poesia Thereza Freire Vieira

FIM

Na luta frenética de vaga-lumes Os olhos se abrem Ao caminho do rochedo Cabelos voam atônitos ao encontro Do pássaro sagrado, de bicos enormes Ansioso por um afago Cruza as paisagens bélicas Com as asas quebradiças Que se molham Nos nichos solitários.

PERDIDO

Nem luar existe, Para se fazer sonhar Só há o ser vagante Na corrida do tempo Que naufraga sua alma Em bolhas escuras Esmagadoras dos pensamentos férteis Atravessa as poças de lamas Com barro grudado de cima a baixo Fazendo o jeans ficar pesado Na combinação perfeita Para um ente aclamado Em derrotas Cor, peso, forma e desigualdade Na plenitude insípida De um dia solitário.

VAZIO

Solidão gera uma camada, Parecida com gelatina. Ora treme, outra hora se endurece. Uma coisa é certeira, Afeta palatos, murmúrios, zunidos, suspiros. Não existe sabor de múltiplas sensações, Sem o doce gélido pestanejar... De uma lágrima escorrida em rostos, Que sangram os Adoçantes amargos. No vazio de suas vontades.

SER

No badalo de um relógio, Momentos de uma vida Dançam nos olhos da mente Resumindo o diário de um ser Soberano e autêntico Sem grandes dons de persuasão Apenas com alma alva Sobrevive à memória Ainda que seja através De um ponteiro dourado Que insiste em ser preciso Assim como a figura que partiu.

Débora Villela Petrin

, nascida em Piracicaba, em 10 de janeiro de 1966, interior de São Paulo, sempre conviveu com a caneta e uma folha de papel ao seu lado, trazendo as cores do amor para a união dos dois, em busca da paz... A vida só é vivida com plenitude quando somos o que somos.

Revista Literaria: Plural —— 33 ´
Poesia

Brasil, Brasileiro

Para a poetamiga Luiza Varaschin

Não canto o Brasil das verdes matas e dos extensos rios, das flores tropicais ou dos frutos saborosos.

Nem mesmo o Brasil de mares férteis, da lagosta, do camarão, da espada, da serra, do namorado, do sururu.

Brasil das araras, dos papagaios, dos macacos, dos jacarés, das onças pintadas, das garças, dos tucanos.

Brasil do café, do açúcar, do algodão, da mamona, sempre exportados, com lucros para poucos.

O Brasil das riquezas minerais, do ouro, do ferro, do urânio, do diamante, das esmeraldas, dos topázios, das safiras. O país sempre explorado, roubado, esvaziado.

Não canto o Brasil de Pancetti, Tarsila ou Portinari, de Anita Malfati, Di Cavalcanti ou Guignard.

Nem mesmo o Brasil de Gonçalves Dias, Castro Alves, Bilac, Bandeira, Augusto dos Anjos ou Cruz e Souza.

Brasil de Alberto Nepomuceno, Carlos Gomes e Villa Lobos, de Ernesto Nazaré, Chiquinha Gonzaga, Tom Jobim.

Brasil de Noel Rosa, Cartola, Pixinguinha, Sinhô, Lupicínio, Ari Barroso, Isolda, Fagner, João Bosco e Caymmi.

O Brasil das letras imortais, de Machado, Lima Barreto, Euclides, Mário de Andrade, Guimarães Rosa, Clarice. Brasil admirado, ouvido, lido, mas desvalorizado.

Não canto o Brasil dos inventores, de Santos Dumont, Bartolomeu de Gusmão, Padre Landel.

Nem mesmo o Brasil da arquitetura moderna, de Oscar Niemeyer, Lúcio Costa, Sérgio Bernardes. Brasil do paisagista Burle Marx, do Aterro do Flamengo, de Brasília e da Ponte Rio-Niterói.

Brasil dos cientistas, de Nina Rodrigues, Oswaldo Cruz, Vital Brasil, Carlos Chagas e César Lates.

O Brasil dos estadistas, de Bonifácio de Andrada, de Ruy, do Barão do Rio Branco, de Afonso Arinos. Brasil estudado, festejado e sempre esquecido.

AníbalA

oesia

Não canto o Brasil dos bandeirantes, de João Ramalho, Fernão Dias Paes Leme, Jorge Velho.

Nem mesmo o Brasil vitorioso em Guararapes, na Cisplatina, no Paraguai, nos campos gelados da Itália.

Brasil dos heróis, de Vidal de Negreiros, Camarão, Tiradentes, de Caxias, Osório, Sampaio, Barroso, Tamandaré.

Brasil das mulheres valentes, de Anita Garibaldi, Maria Quitéria, Jovita Feitosa, Bárbara Heliodora.

O Brasil esportivo de Maria Ester Bueno, Algodão, Alfredo, Eder Jofre, Nelson Pessoa, Ayrton Senna, Pelé, Oscar. Brasil aplaudido, comemorado, sempre lembrado.

Canto o Brasil do povo brasileiro, do homem anônimo, do carvoeiro, do seringueiro, do jangadeiro, do tangerino, do tropeiro, do vaqueiro nordestino. Brasil que toma chimarrão e ferra o gado na estância. Brasil do plantador de cana-de-açúcar, do pescador de lagosta, do apanhador de café, do lavrador da terra fértil ou seca. Brasil que colhe soja, mandioca, milho, feijão, batata, cacau, banana, laranja, caju, maracujá, sapoti, manga e abacaxi. Brasil que vende na feira, que atende nas lojas, nos bancos, que conduz barcaças, carro-de-bois, carroças e charretes; que solda as chapas de ferro, que descarrega navios, que ergue prédios, que pinta paredes e une os fios elétricos; que conserta o telefone e o aparelho de televisão; que traz o botijão de gás, as compras do supermercado; que busca o ouro na mina ou no riacho, que encontra o diamante, a água-marinha e a turmalina; que constrói barragens e desvia cursos de rios. Brasil que dança xaxado, baião, frevo, rancheira, carimbó; que toca violão, sanfona, viola, zabumba, pandeiro, berimbau; que samba no carnaval e sai no bloco ou no maracatu. O Brasil que pisa a uva, faz o vinho, tira leite, fabrica o queijo; que trata a ferida e cura o doente, que enterra os mortos; que cozinha o tutu e assa a leitoa ou o peru; que dirige o ônibus, o táxi, o caminhão e a carreta; que imprime o livro e entrega o jornal; que desentope o esgoto, varre a rua e recolhe o lixo.

Brasil

Anibal Albuquerque.

Revista Literaria: Plural —— 34 ´
lbuquerque. Verão de 1998. 3º lugar no Concurso Literário Nacional da ACLCL, Conselheiro Lafaiete/MG, 1998. (Publicado, originalmente, na Terceira Antologia Poética ALBA, Varginha/MG, 1999; publicado na Revista da Academia Fluminense de Letras, volume XVI, jan. 2005; em esperanto, na antologia Brazila Esperanta Parnaso, Rio de Janeiro, 2007). Oficial Superior da Reserva do Exército, editor. Premiado em 3º lugar de Melhor Texto no Festival de Poesia Falada do Rio de Janeiro/APPERJ 2008 com o poema Indecisão
P
do brasileiro que produz petróleo e anda a pé.

Lenitivo Poético

Gostaria que cada um vasculhasse o seu interior, Buscando realmente refletir, Sem procurar camuflar ou mentir, As peculiaridades de seu SER. Como era e para que essa energia se transformou em um SER?

O destino é inflexível ou abrange diversas possibilidades Que poderão ser vivenciadas em diferentes fazes e idades?

Para os problemas da matéria ocorrem várias soluções, Mas como reagir em relação à área emotiva, do meu EU energia, Que não quer só caminhar, mas evoluir, como espírito crescer? Este é o “desafio – missão”. Descubra! Não fuja! Peça ajuda à POESIA!

Mortos – Vivos.

Vejo um homem a correr em busca de uma religião. Procura por um milagre, resposta à sua omissão. Tem a mente em desalinho.

Corpo e alma formam um universo em desagregação. Sabe qual é a causa, mas se nega a dizer. Age consigo da mesma forma que faz com os outros. Não atua com sinceridade, mas buscando se enaltecer. Quer e tem necessidade, em qualquer tempo e idade, De se exibir e aparecer.

Necessita de flashes, manchetes e mesmo de bajulação. Alguns até mesmo fingem elevada espiritualidade, Mas a sua conduta materialista Só vem a ratificar o seu grau de falsidade.

Agora ali está ele com medo de se olhar

Em um simples metal espelhado, Não querendo realmente ver, muito menos encontrar, O que em verdade é o justo Grau de sua realidade, Porque não consegue ou não quer Nesta vida caminhar, buscando se lapidar.

Reflexões Poéticas.

Qual a origem do meu surgimento?

Por que, para que esta forma eu recebi?

Haverá explicação para onde nasci? Minha família, meus amigos foram escolhidos Obedecendo à Lei do Acaso

Ou ocorreu um sério planejamento, Envolvendo sutis energias, Objetivando as missões a serem cumpridas, Durante esta encarnação?

Será que já ocorreram outras no Passado? Será que depois novas virão? Na busca de Luz e Sabedoria É preciso se encontrar e manter O equilíbrio e harmonia, Buscando pelas sensações Entender as percepções

Para que realmente em seu caminhar, Ainda nesta vida, Consiga o espírito se elevar

LUECIR LUCAS GONÇALVES

Mensagem de Mel

Não sei se já é noite ou se piorou a minha cegueira. Afasto-me do asfalto, sinto a terra úmida e percebo os arbustos e o mato da orla da lagoa. Fujo da voz feminina que me chamava, apesar de aparentar bondade, pois estava muito recente o amargor e a dor de mágoas e desilusões com o Ser Humano. E assim fiquei sob a chuva, frio e vento, acalentada pala mãe natureza, recebendo a proteção que não tive, daqueles que amava não como donos, mas como pais.

Escutava diariamente a mesma voz feminina que me acalentava e me trazia água e comida. Pensava ser a minha fada madrinha. Assim se passaram alguns dias em que lembrava que só dei fidelidade e carinho. Lembrei dos filhotes que tive e que me eram retirados, antes de poder orientá-los para a vida, só para que viessem a ganhar dinheiro mais rápido, pois sou de raça pura. Quando perceberam que a cegueira me atingia, atrapalhando a “qualidade da venda”, me abandonaram no asfalto, certamente para longe morrer

Um dia, já com o calor a me aquecer, percebi vultos a se aproximarem. Reconheci ser um a “minha fada madrinha”, que na realidade se chama Márcia. Cansada deixei-me levar. Precisava voltar a confiar para continuar a minha evolução. Recebia naquele instante o alimento para a alma, pois nós também a temos.

Hoje, dias das mães para os humanos, quieta em minha macia caminha, ao lado de meus novos pais, Vandinha e Lucas, pois assim se denominam, sinto não os pingos da chuva, mas as lágrimas a rolarem. Como sou feliz agora! Após tanto sofrimento, agora eu tenho vários irmãos, todos também salvos das maldades humanas, atropelados, doentes e machucados. Compomos uma linda família a formar, com a nossa querida “dinda” Regina, o Lar Escalada, em Bambuí.

Hoje meu nome é MEL, pois adoço todos os momentos com as energias positivas de amor e carinho do âmago de meus sentimentos, com que o Mestre me destinou.

Orquidófilo,

e análise da Natureza, é a sua bandeira como educador há vários anos. Participação em diversas coletâneas. Promotor e coordenador do evento de poesia São Pedro da Poesia, de 2000 a 2007, em Bambuí, distrito de Maricá/RJ. Destaque Cultural em 2002, da ALAP – Academia de Letras e Artes de Paranapuã/RJ. Delegado da APPERJ Região Lagos/Maricá/RJ.

Orquidário LuVan, em Maricá/RJ. Ecologista. Compreensão da vida pela

Revista Literaria: ´
Militar da Reserva. Bacharel em Física. proprietário do observação
Poesia LUECIR
GONÇALVES —— 35
LUCAS

DOPRIMEIROAOÚLTIMOATO

Luz!... Ação!... Vida!... Ato após ato, dia após dia, amamos, ganhamos, perdemos, sonhamos, choramos, sorrimos... sentimos medo, dor, frio, calor, milcalafrios... crença, descrença, eterna esperança... às vezes cai o “pano”, cai a “ficha”, mas não recuamos. Persistimos... revivemos, ensinamos, aprendemos... nos decepcionamos, lutamos e, mesmo enxergando, muitas vezes, fingimos nada ver. Luz!... Ação!... Morte!... Ato após ato, dia após dia, nascemos novamente, morremos aos poucos, sem entendermos os ciclos que passam entre as paralelas das linhas de nossas próprias mãos.

INDIFERENÇAS

Pedra sobre pedra, tijolo sobre tijolo dia após dia noites e mais noites, tudo em vão... Pois o paredão criado de diferentes indiferenças fortificou-se como um tudo, diante de insistentes e inconstantes nadas.

PARA ZAYRA

Essa mulher guerreira que durante toda sua vida sozinha transpôs barreiras, partiu em busca do sol para agasalhar seu mundo imaginário, para aquecer seu coração solitário. Essa mulher de frágil aparência que durante toda sua vida teve memória invejável, partiu hoje em busca das estrelas para bordar sua nova caminhada, e iluminar sua “ponte” imortalizada.

Essa mulher amiga que durante quase toda sua vida mais ouviu do que foi ouvida, construindo sozinha sua história, não quis de ninguém se despedir...

Partiu rumo ao infinito, levada pela brisa silenciosa da noite, laçada de vez pelas asas da inspiração, nos deixando seu manto de poesias e solidão.

EM FORMA DE ORAÇÃO

Quando recosto minha cabeça, sempre tola e sonhadora, num macio travesseiro de fantasias, procuro mentalizar o novo dia que, com a luz do amanhecer surgirá, onde sei que terei, mais uma vez, que materializar todos os meus ais e, também, os meus risos, nessa louca utopia de querer viver Em forma de bênção percebo então, que meus sonhos não são assim tão bobos e vazios, pois ninguém disfarça tão bem e eternamente, sua mágoa, sua ira...

E assim, minha inútil vingança vem em forma de amor que nunca se liberta, vem na corrente forte da verdadeira união e na transparência em todos os atos e fatos.

Vem em forma de canção que abre o coração para receber mãos estendidas e bofetadas pela vida recebidas.

Vem na beleza da simplicidade da natureza e no pulsar forte da emoção.

Vem na aquarela que pinta o arco-íris, vem nos diferentes perfumes que exalam as flores e, principalmente, vem na força de uma oração.

EM BRANCO E PRETO

Os passos dessa estrada, conheço todos... de tanto ir e vir, de tanto por ela caminhar, sei que nada vou achar, sei que no nada ela vai dar As pedras do caminho, conheço todas... contei uma por uma, fiz pequenos muros, barreiras, para depois perceber que de nada adiantariam e tudo derrubar.

As arvores do caminho, conheci todas... deram-me sombra para descansar, frutos para o meu sustento, folhas para o aquecimento, foram verdadeiras amigas a acalentar.

E assim segui a vida caminhando, tropeçando, levantando, seguindo meu sonho delirante, buscando alegria, harmonia... aprendendo que mesmo quando tudo está, aparentemente, em branco e preto, sem graça, sem amor, continuamos com um coração no peito pulsando à espera de redescobrir o segredo que encontramos na simplicidade da natureza, que nos mostra através de suas inúmeras cores, a sinfonia e o perfume de suas belas flores.

Revista Literaria: Plural —— 36 ´
ELIANE MARIATH – Presidente daALAP–Academia de Letras eArtes de Paranapuã, Presidente da CONFALB, Vicepresidente da FALARJ, 2ª Diretora secretária da Casa das Beiras/RJ, Diretora cultural da Ordem do Mérito Pero Vaz de Caminha – Itapira/SP, Diretora da APPERJ, membro honorária do Colégio Militar do Rio de Janeiro, membro do SEERJ, da ACLERJ, da SCLRJ. Coordenadora do evento: Entardecer da Poesia com a Arte. Publicou: “Sementes”, poesia, Oficina Editores, 2003.
Poesia

LÚCIDA MENTE LOUCA

que refletia quieto num canto filósofo que recitava poemas de vanguarda pós-moderno que pregava ajoelhado para o povo visionário que distribuía fantasias para todos folião que dançava seminu pelas ruas feliz que cumprimentava as estátuas fidalgo que urinava em era um louco cada poste debochado filósofo/pós-moderno/visionário/folião/feliz/ fidalgo/debochado os outros riam dele histéricos xingavam e gritavam/ mal-educados jogavam pedras sem compaixão histéricos/mal-educados/sem compaixão quem era o louco?

L OUCA

Não me venham com: locador/locatário contratante/contratado, outorgante/outorgado. Detesto tudo isso. Odeio esses termos. Eu quero é voar com minhas asas leves e transparentes, de fina teia. Pela Via Láctea, dar rasantes e fazer firulas. Me esborrachar pelos telhados. Me deixem em paz: eu e a minha loucura.

AMAZONA

Eu sou normal Verdade, não acredita? Estou muito bem. Até virei personagem do folclore carioca. É que eu caminho pelas ruas do Horto, toda vestida de branco, recitando Florbela Espanca, puxando o Cão Andaluz — crédito para Buñuel e Dali — pela coleira. Em tempo, estou aprendendo a latir Mas garanto: não mordo.

Tem noite que cavalgo a tempestade. Nua, me equilibro no selim. Me fascina a aventura, o perigo sem sentido, o risco e a incerteza. Então, esqueço da vida. Sonho, vou pras ruas, alheia a tudo e a todos. Alheia até mesmo de mim.

L

AURA ESTEVES é conselheira do Sindicato dos Escritores/RJ, conselheira da União Brasileira dos Escritores, pertence ao Pen Clube do Brasil, à APPERJ e é membro do Grupo Poesia Simplesmente. A ascendência portuguesa e a infância pobre vivida nos subúrbios do Rio marcam fortemente sua obra. Seu primeiro livro de poemas, Transgressão, foi editado pela Sette Letras, em 1997. O segundo, um romance memorialista lançado em 1998, O sabor, o saber e o sonho, conta a saga de uma família, desde a seca de 1877 até os dias de hoje. Como água que brota na fonte, seu terceiro livro, saiu pela Editora Barcarola no ano de 2000. A mulher e a pedra, livro de contos, foi editado pela Ibis Libris, em 2004. Em 2007, lançou Rastros – poemas

Revista Literaria: Plural —— 37 ´
P
oesia
Laura Esteves

Inspiração

Quando eu estava sonhando que finalmente ia conseguir beijar a Beatriz, a Inspiração me acordou, fazendo cócegas no nariz.

“Ande logo, meu tempo é precioso. Pule sem demora da cama! Deixe de ser preguiçoso!”

E eu, ainda de pijama, me preparei para escrever um poema consagrador

Mas um poeta maior, acho até que da Academia, tinha brigado com a sua Musa – era uma relação bem confusa –e ligou desesperado para a Inspiração.

E ela, mais que depressa se esqueceu da promessa. “Sinto muito, não fique chateado, é uma emergência. Ele é um poeta consagrado e tem preferência.” E partiu zombando de mim. Desculpe, caro leitor, se em vez do poema consagrador saiu este versinho chinfrim.

Mulheres...

Calendário do Amor

Em janeiro me prometeu um amor sem final que só durou até o carnaval. Voltou no finzinho de março amorosa e gentil e desapareceu no início de abril. De maio a julho, aconteceu algo inédito: só tive notícias pelas faturas dos cartões de crédito. Em agosto, só desgosto. E depois, até novembro, se bem me lembro, recebi apenas um cartão postal. Só apareceu em dezembro pra buscar o presente de natal e me desejar um feliz ano-novo. Ah, mas se ela não voltar até março, não respondo por mim. Vou logo avisando: se continuar assim, vou endurecer o jogo!

O problema

c d e

Alice, Berta, Clarice, Dalva (uma estrela!), Graça, Helena, Ilma, Joana, Kátia, Lorena, Manuela, Neuza (tão séria!), Odete, Patrícia, Quica, Rogéria, Sandrinha (a mais sincera!), Tatá, Ula, Vera, Xuxa, Walkiria, Yara, Zazá (ah, Zazá!)...

Tantas mulheres passaram pela minha vida e nunca desconfiaram.

O problema é que tem gente que não se lembra mais da gente Tem gente de quem a gente não se lembra mais Tem gente que a gente gostaria que nos esquecesse E tem gente que a gente tenta esquecer e não consegue Este é que é o problema.

Silvio Ribeiro de Castro

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a b
f g h i j k l m n o p q r s t u v w x y z
Poesia
– Poeta, cronista, contista, roteirista, ator, apresentador. Mas existem controvérsias. Membro do Grupo Poesia Simplesmente, que coordena o Festival Carioca de Poesia, já em sua 10ª edição.
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Silvio Ribeiro de Castro

VIDAREAL

Linha 1, Metrô do Rio de Janeiro, sentido Zona Sul. Sílvia pega o metrô na Uruguaiana com destino a Estação Siqueira Campos, em Copacabana. Na Estação Glória, entram duas mulheres. Uma mais humilde, pele morena de sol, aparentando uma certa idade e a outra mais jovem, com um certo peso, pele clara, bastante maquiada, cabelo louro oxigenado e falando compulsivamente ao celular

As duas sentam no banco em frente à Sílvia. Passa a Estação Catete, a loura tenta falar mais alto no celular do que a locutora do metrô. Passa a Estação Largo do Machado, a loura desliga o celular, depois de um rápido intervalo se lembra de alguma coisa e torna a ligá-lo.

Quando chega a Estação Flamengo, a senhora, olhando para a loura, que continua a falar no celular, pergunta: –Aqui é Flamengo ou Botafogo?

Sílvia responde: –Aqui é Flamengo. A próxima é Botafogo. – Mas aqui não é a Marquês de Abrantes? – Isso mesmo. A Estação Flamengo fica na Marquês de Abrantes. – É que uma vez eu me distraí, tive que saltar na CardealArcoverde, em Copacabana, pra voltar para Botafogo.

O metrô continua e pára em Botafogo. As duas mulheres se levantam.Agorda ainda ao celular, sem ouvir a observação da outra: – E eu sou o personagem...

NÃO PASSARÁ!

O passado, simplesmente passa. O futuro é sempre incerto Mas aí que está a graça De ter o presente aqui e agora, Sempre por perto

O passado é história O futuro, sonhos e desejos a realizar. É no presente que existe a memória do que passou E esperança daquilo que vai passar

Tão certo como a morte Que a todos levará É o momento presente E este sim, não passará!

- carioca,

Coordenadora do evento literário Sarau João do Rio - Sarau do

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Selma Wandersman poeta, jornalista. Publicou: “Persona”. Membro da APPERJ. Marquês/RJ.
Poesia
Selma Wandersman

ODE AO POETAS

Poetas deviam ser presos, amordaçados num lugar em segredo, a sete chaves, longe dos meus medos. Impedidos de alquimizar palavras, e todos os poemas rasgados.

Poetas deviam ser abortados! Por que cismam de nascer teimosos e revirar entranhas, abusados? Por que vivem de invadir intimidades e revelar pensamentos roubados?

Poetas, criaturas estranhas, sonhadores, inúteis, coitados! Aranhas presas em suas próprias teias, veneno que corre em suas próprias veias.

Poetas, por que os quero? Já não basta a vida a que me obrigo? E a poesia que trago comigo? Poetas, indecentes, bandidos, caiam fora do meu umbigo!

AUTOFAGIA

Lapidar frases, trazer o tempo certo a cada verso, viajar por metáforas, cultivar imagens, descobrir a palavra exata e sempre numa nova abordagem... Ofício de poeta!

O resto? A emoção, o conteúdo? Coisa de ser humano!

O poema? Filho bastardo desta grande putaria. Santa promiscuidade: o poeta devorando o homem, e o homem a se alimentar do poema.

Autofagia!

LUA CHEIA E EXIBIDA

Todos os dias, já faz um bom tempo, naquela praia distante, um grupo enorme de pessoas se reúne e espera que lua cheia e exibida nasça do ventre de uma sereia Mas lua quando nasce, nasce espremidinha e sem cor. Não sabem, os coitados, que lua cheia e exibida, só nasce para os poetas, ou então para os loucos!

Mas, não fique triste, tão pouco se sinta excluído, a sereia me disse que se você conhece este poema, ou é um ou é outro! Ás vezes, até os dois.

MEU VÍCIO

Viciado em lamber madrugadas, principalmente as insones, fico todo excitado, dano de falar bobagens, e quando percebo: escrevo um poema. Mais uma ou duas lambidas, e escrevo outra vez... Amanheço remelento de versos, pleno de embriaguez.

Naldo V

elho: Poeta, letrista, artista plástico, músico (compositor); com inúmeras participações em eventos de poesia nas cidades de Niterói e do Rio de Janeiro; com um livro editado, de título “Mania de Colecionador” e diversas participações em antologias e publicações literárias; criou e produziu o evento Músicos Recebem Poetas, realizado junto à Secretaria de Educação e Fundação Municipal de Cultura de Niterói, durante todo o ano de 2004 e produziu com os poetas Márcia Leite e Sérgio Gerônimo o evento Todas Elas e Alguns Deles.

Revista Literaria: Plural —— 40 ´
Poesia Naldo Velho

NARCISO HODIERNO NARCISO HODIERNO NARCISO HODIERNO NARCISO HODIERNO NARCISO HODIERNO

Ele tinha 35 anos. Ele tinha anos. Ele tinha 35 anos. Ele tinha anos. Ele tinha 35 anos. Fizera dois anos de Fizera anos de M M M M Medicina mas desistiu e optou por Direito. edicina mas desistiu e por Direito. mas Direito. Formado, trabalhando, enfim, vivendo. T Formado, trabalhando, Formado, Taciturno, reservado e misógino. aciturno, reservado e misógino. e Não mantinha relações sexuais com mulheres nem homens. Não mantinha relações sexuais com mulheres nem Não mantinha relações sexuais com mulheres nem homens. Não mantinha relações sexuais com mulheres nem Não mantinha

TT Tinha, porém, mórbido vício: inha, porém, mórbido vício: inha, porém, mórbido vício: inha, porém, mórbido vício: inha, porém, mórbido vício: Quando se excitava e entrava em ereção, tomava de uma gilete (a navalha) e dava um Quando excitava entrava em ereção, tomava de uma (a navalha) e dava um Quando se excitava e entrava em ereção, tomava de uma gilete (a navalha) e dava um Quando excitava entrava em ereção, tomava de uma (a navalha) e dava um dava ínfimo pique na sua glande e ejaculava com prazer inenarrável! ínfimo pique na e ejaculava com prazer inenarrável! ínfimo pique na sua glande e ejaculava com prazer inenarrável! ínfimo pique na e ejaculava com prazer inenarrável! inenarrável!

Fazia o curativo e aguardava a cicatrização para o próximo prazer Fazia o e aguardava a cicatrização para o próximo prazer a prazer.. .. .

TT Tinha boa saúde física, e logo estava pronto para outra. inha boa física, e logo estava pronto outra. inha boa saúde física, e logo estava pronto para outra. inha boa física, e logo estava pronto outra. boa e logo pronto Assim foi bastantes vezes. Assim bastantes vezes.

Sua glande estava ficando deformada e já agora a cura era mais demorada. Sua glande estava ficando deformada e já agora a cura era demorada. Sua glande estava ficando deformada e já agora a cura era mais demorada. Sua glande estava ficando deformada e já agora a cura era demorada. glande e era Até que um dia, solitário em seu quarto, deu o pico mais profundo e sangue e Até que um dia, solitário em seu quarto, o pico mais e um dia, pico esperma jorraram em ondas. esperma jorraram em ondas. jorraram

Não pediu socorro. Não pediu ...E lá se foi o estranho Narciso... ...E lá se foi o Narciso... ...E lá se foi o estranho Narciso... ...E lá se foi o Narciso... Narciso...

O fio da navalha, a dor O fio navalha, a dor O fio da navalha, a dor O fio navalha, a dor dor, o prazer , o , prazer, o amor , o , o amor , o , amor, a loucura e a morte. , a loucura e a morte. , a loucura e a morte. , a loucura e a morte. , loucura e morte.

No amor No amor amor, há sempre um quê de loucura, mesmo aquele a si próprio! , há sempre um quê loucura, mesmo a si próprio! ,

VIV VIV VIV VIV VIVA, A, A, A, A, AA AA A

CANET CANET CANET CANET CANETAA AA A

Não é Bic, é uma Parker 51, negra e elegante! é Bic, é uma Parker 51, negra e elegante! Bic, é e Investe sobre a branca e virgem folha de papel! Investe sobre a de papel! Investe sobre a branca e virgem folha de papel! Investe sobre a de papel! Investe papel!

Ela, amorosa e inocente, Ela, amorosa e Ela, amorosa e inocente, Ela, amorosa e

Se rende à caneta potente. Se rende à caneta potente. Se rende à caneta potente. Se rende à caneta potente. Se rende à caneta potente.

Agora, ela não é somente um símbolo fálico. Agora, ela não é somente um fálico. Agora, ela não é somente um símbolo fálico. Agora, ela não é somente um fálico. não fálico. É o próprio! É próprio!

E goza e procria com a folha virgem e pura... E goza e com a folha virgem e pura... E goza e procria com a folha virgem e pura... E goza e com a folha virgem e pura... goza folha pura...

Depois de nove páginas, Depois de nove páginas, Depois de nove páginas, Depois de nove páginas, Nasce o fruto daquele encontro: Nasce o fruto encontro: Um belo poema de amor belo de amor amor, sangue e dor! , sangue e e

Revista Literaria: Plural ´
Poesia Helena Quental —— 41
HELENA QUENTAL, brasileira, viúva, bacharel em Direito pela Candido Mendes, museóloga, diplomada pela Uni-Rio. 7 filhos, incursões esporádicas em canto e música. Iniciou seus poemas em 1994. Atividade principal: mãe de família.

NA PRAIA, SEM ELA

Sozinho e triste, nesta praia extensa, por onde, outrora, alegres caminhamos, nada me encanta sem sua presença, nem a paisagem que nós dois fitamos.

Vem-me a saudade, que é profunda, intensa, e que dói tanto! Tudo o que sonhamos reconstituo, com clareza imensa, sem me esquecer dos beijos que trocamos.

O sol desmaia. Olho o mar tranqüilo; a onda se espreguiça num cochilo, no seu vaivém se move indiferente.

Se os olhos fecho, só me fica a imagem da minha amada, meiga personagem, que sempre amei e amo ardentemente.

O LENÇO ESQUECIDO

Abri-lhe a porta, e ela, ao entrar, sorriu; veio trazer-me seu amor intenso. Horas mais tarde, em lágrimas, partiu; mesmo em soluços se esqueceu do lenço.

Peguei-o então; senti que ela não viu o que deixara no sofá, extenso. Guardei-o atento, assim que ela saiu, em minha mesa, com carinho imenso.

Dias depois, olhando-o com mais calma, senti um frio a estremecer-me a alma, pois parecia que ela estava aqui.

E eu desejei demais que ela voltasse para abraçá-la e, após beijar-lhe a face, dizer que a amo e nunca a esqueci.

MÃOS AVELUDADAS

As suas mãos, que sinto aveludadas quando em meu rosto pousam suavemente, parecem painas, plúmulas lançadas pela mulher que eu amo intensamente.

Ambas semelham finas mãos de fadas, se acariciam o meu peito ardente. Sejam benditas essas mãos rosadas com seus afagos, seu ardor crescente!...

Como me encantam palmas tão sedosas! Lembram olor de pétalas de rosas ao deslizarem sobre os lábios meus.

Ao céu suplico, imploro, comovido, que as leves mãos, de fino colorido, jamais me acenem, tristes, um adeus.

FINAL DA VIDA

Na hora em que o meu fim se aproximar, quando eu sentir sinais de chamamento, para iludir-me, vou rememorar o meu passado, sem nenhum lamento.

Recordarei – é doce recordar!... –que a vida, para mim, não foi tormento. Tive aventuras. Como é bom lembrar!... Nunca pensei, porém, em casamento.

A muitas jovens me apeguei tranqüilo... E o que fizemos – tudo no sigilo –eu não revelo (e até seria o cúmulo!).

Mil confidências de mulheres belas guardo comigo (prometi a elas). Quantos segredos levarei pro túmulo!

Edmo Rodrigues Lutterbach. Procurador de Justiça, aposentado; presidente daAcademia Fluminense de Letras, sede em Niterói (RJ), membro de mais de duas dezenas de instituições congêneres, integrante do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro, do Instituto Histórico e Geográfico de Niterói, do qual é co-fundador, presidiu-o em três ocasiões diferentes, membro de vários outros. Eleito “Intelectual do ano 2001”; autor de livros e opúsculos publicados.

Revista Literaria: Plural —— 42 ´
Poesia
Edmo Rodrigues Lutterbach

Ao rés do chão

Eu o quero –meu pequeno meu anjo roliço e doce infante –no embaraço dos cachos no verde dos olhos na boca em beijos no chilrar do encanto Eu o quero –meu menino –ao rés de um chão amigo que sustente seus passos arteiros e os proteja dos deslizes e tropeços Eu o quero nos flashes de um agora no tempo pra sempre criança E eterna seja em plenitude a infância que lhe oferto neste momento

Do gosto de flor

A rosa olhava para mim Não sei se me gostava Sei que alguém a meu lado disse que eu estava rosa Acho que a flor me fez espelho

Das verdades

Não quero a verdade ambígua tampouco incertezas Não quero meus pés no chão em falsas suspeitas Quero aquela verdade de falas e gestos de flor –a verdade meio magia que me ajuda a viver Afinal que verdade é essa se não vivo a verdadeira?

Caminhante

Tenho os pés nus em suor das caminhadas ao buscar fontes sem cheiro de cloro mas verde do mato Tenho os pés nus para saciá-los na umidade encontrada próxima às águas onde derramo meus olhos E nos chãos molhados estes pés se refazem entre a doçura dos rios e o salitre das lágrimas Retorno caminhante sempre ao encontro de águas que batizem meus pés

Senectude

Meu rosto em rugas e um corpo trêmulo Arrastando os passos feri o chão de velhas pontes E os olhos debruçados molhavam rios que transbordaram Cúmplices misturamos nossas águas Carpe diem quando se espreguiça a alma para acordar o dia ao alongar do tempo em despir a tarde no humor do corpo ao buscar a noite na madrugada em sonho do prazer-magia quando se torna ao chão de um novo amanhecer

ELISA FLORES. Escritora, musicista, professora da UFRJ e UNIRIO.Autora de textos poéticos, crônicas, prefácios, apresentações, artigos publicados em antologias, revistas, boletins, jornais especializados e dos livros “Joganças”, ”Pulsações”, “De pedra e de flor” e “Muros e rumos”, no prelo: “50 Poemas Escolhidos pelo Autor”. Recebeu vários prêmios em concursos de poesia e de trovas (Jogos Florais 2005 e 2006) da UBT Teve sua coluna no jornal Rio Letras. Apresentações públicas lítero – musicais na UFRJ, no Fórum da UFRJ e Casa de Cultura Julieta de Serpa. É membro do SEERJ e da APPERJ.

Revista Literaria: Plural —— 43 ´
Caminhante
Poesia ELISA FLORES

PERFUME DE MULHER

(premiado no concurso-relâmpago da APPERJ/2005)

É mais que tátil o sentido quando contorno o desenho da tua boca. Efêmera é a razão, também os artifícios da paixão. Estou cego por ti. Minha vontade louca dança em descompasso o fácil tango da libido.

É mais que múltiplo o aroma do teu corpo-fêmea úmido de sândalo! Pergunto se, entre os teus cheiros, posso dissolver o bálsamo dos anseios? Mistura de almíscar e sexo, natural escândalo! Tens na alma a essência das raízes e rizomas.

És mais que mágica qualquer! És poética. Assim viceja a pura rosa do amor. Perto ou longe de ti, sinto solta a tua fragrância. Estás em mim como fé e sei que de toda distância os amantes exalam o cheiro da rara poesia em flor. E a rara poesia cheira sempre a perfume de mulher!

Emoldurados

Emoldurados

A laranja cortada à faca sobre a mesa (gomos e gumes) não exala mais o cheiro das manhãs

móveis da sala cozinha e quarto abrigam tardes e noites imóveis como cestas de nozes e avelãs

restam flores palavras secas migalhas rostos tristes expectativas inanimadas

afora o sol pela porta pintada a óleo o silêncio dos olhos e a certeza de que a natureza agora é morta.

Palco de Eros

(a Flávio Dórea)

Pausas e poses luz da ribalta cores seda do púbis gregos e negros tônus e dorsos olhos alma de Eros atos tão vastos corpos de astros divas seio da noite falos bem raros boca de cena falas ponta da língua belas e feras palco de mitos onde mais poesia?

Jorge Ventura, poeta apperjiano, é ator, jornalista e publicitário. Atualmente, é Diretor Suplente de Comunicação Social do Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro (SEERJ) e Diretor de Criação da DMAZ/B Comunicação. Já publicou três livros: dois de poesia, Turbilhão de Símbolos (2000) e Surreal Semelhante (2003), pela Imprimatur-Rio; e um ensaio jornalístico, Sock! Pow! Crash! – 40 anos da série Batman da TV, pela Opera Graphica-SP Atuou, dirigiu e produziu várias peças, curtas-metragens e encenações poéticas. Além de colaborar para sites, jornais e revistas do segmento literário, Jorge participa, freqüentemente, dos principais saraus pela cidade.

Jorge Ventura

Revista Literaria: Plural —— 44 ´
Poesia

GOTAS POÉTICAS

pisei em nuvens... escorreguei pelo arco-íris... banhei-me em raios de luar sorvi, gota a gota, a chuva que caía... não pense que vivo de magia, apenas... escrevo poesia!...

* * * * *

Eu queria tanto poder voar!... Sentir a liberdade que um vôo permite, sem amarras nem limites...

* * * * *

Onde a paz que embala os anjos? Onde os anjos que embalam a paz?

* * * * *

Apesar de todos os desencontros, desencantos e desilusões, apesar de todas as loucuras, devaneios e desatinos, ainda creio que podemos mudar nossos destinos...

* * * * *

Lembre-se, amor, eu jamais disse adeus... Foi você quem partiu, não fui eu...

* * * * * *

sua partida deixou-me sem alento... suas juras de amor, promessas de fidelidade... não foram mais que palavras ao vento!...

* * * * *

São doces as águas dos rios, as do mar são salgadas e minhas lágrimas, amargas...

* * * * *

Moro onde o vento faz a curva, só para brincar com seus cabelos...

* * * * *

A lua cheia não tem o brilho de teus olhos plenos de sol!...

* * * * *

Fazer o quê? Me perdi no exato momento em que te encontrei.

* * * * * no canto do armário ou no fundo da gaveta, a velha foto abandonada fala tanto sem dizer nada...

* * * * * *

Revista Literaria: Plural —— 45 ´
P
ANGELA MARIA CARROCINO – Artista Plástica, Pedagoga, POETA. Integra o Grupo Poesia Simplesmente, que coordena o evento poético Terça ConVerso no Café e é Diretora Cultural do Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro (SEERJ), onde coordena o CHARAU – um sarau com chá e charme.
oesia
ANGELA MARIA CARROCINO

Anti-épico

As armas e os barões assinalados Já foram tão cantados na epopéia Que ao cruzar esses mares navegados Não me acorre nenhuma nova idéia

Não possuo, ó ilustre e bom Camões, Tua Calíope a inspirar-te a bela pena Mea culpa, pôr a mão onde tu pões Desejando que a musa entre em cena

Perdoa-me, ó poeta, a pretensão De trilhar-te os caminhos primorosos Já que vivo em um mundo em mutação Em que os feitos nada têm de gloriosos

Não mais, poeta, não mais Já que a musa é há muito prostituta Naufragando, em oceanos de jamais, Eu resisto, e o poema vai à luta

Harpoesia

Minha língua viva e sedenta Saliva Maldita

Manhã de Inverno Chuva branda Um grande nevoeiro

Pequenas lágrimas Palavras não entendidas Clima frio Sem possibilidade de sol Olhar de desprezo Amor perdido no tempo

Tudo cinza aos meus olhos Manhã de inverno

Amanhã será primavera... Talvez...

Abysmo

yLanço-me contra mim Busco o estranhamento Disperso em gotas Fragmentado em palavras

Duvido de mim Um passado-pesadelo escorre Não o toco... Presente memória

No

ardor de uma mão-boba A poesia se toca Harpoesia

Tatiana Alves é poeta, contista e ensaísta. Participou de diversos concursos literários, tendo obtido mais de cem prêmios. É colaboradora da Coluna Momento Lítero-Cultural, do site Anjos de Prata e da Revista Literária Eletrônica Desfolhar. É filiada à APPERJ, à Academia Cachoeirense de Letras e ao Clube dos Escritores Piracicaba. Publicou em 2005 o livro de contos O Legado de Cronos e, em 2006, O segredo da caixa, em colaboração com o grupo Encantadores de Histórias, em concurso promovido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. É Doutora em Letras pela UFRJ e leciona Literatura em três universidades.

Liberto-me de mim Caio em um abismo Minh’alma, guerreira, Alcança o Paraíso Vejo, ouço e suspeito Um pensamento aflige Uma voz anônima sussurra Não sou eu... nem ninguém.

André Caldas é Mestre e Doutorando em Literatura Portuguesa pela PUC-Rio. É professor universitário, professor do Estado do Rio de Janeiro, pesquisador e coordenador do curso de Letras da Faculdade Paraíso. É ator profissional, tendo produzido alguns espetáculos teatrais. Como poeta, já foi agraciado em diversos concursos literários. É filiado à APPERJ e colaborador da Coluna Momento Lítero-Cultural.

Revista Literaria: Plural —— 46 ´
E roça em profanas palavras Minhas mãos suadas e errantes Tateiam Malditas E tocam profanas palavras
Por entre línguas e mãos Toma forma a poesia Sádica Lúdica Lúbrica
prazer do trava-língua No
Poesia
Tatiana Alves

Tereré

Certa ocasião estive dez dias em Campo Grande, minha terra natal. Após tantos anos, visitando minha irmã encontro meus dois sobrinhos já adultos, e o adolescente superdotado. No aprendizado de clarinete, também canta, dedilha muito bem o violão, imita a fala de imigrantes nas anedotas. Enfim, um entretenimento.

Noite silenciosa de setembro calorento. Em seu quarto cumprindo o dever de colegial, o artista.

No sofá da sala de visitas, absorta na leitura de um livro, ergo os olhos aos sons de passos na copa. Uma figura de botas, roupas soltas, capacete, meia máscara no rosto, luvas, se aproxima da sala de jantar, a pouca distância, à minha frente, em atitude agressiva. Ante meu pavor, dá boas gargalhadas. É ele, o astro. Retira a indumentária, senta-se ao meu lado. Zombeteiro.

– Nunca fiz esse tipo de trabalho. A cuia é oval, escura, nem vai dar destaque.

– Não! Não é cuia de chimarrão. É do tereré, de chifre de boi. É mate gelado pra espantar o calor. Companheira no prosear com os amigos. Vou buscar pra senhora ver

Sou apresentada a uma pequena, linda cuia de chifre de bezerro, creio eu.

Logo após, estamos sentados à mesa da sala de jantar, forrada com jornais.

Tereré

– Titia, a senhora assusta à-toa! Tem perigo, não! Brincadeira.

– Acontece que não estou acostumada com este tipo de brincadeira!

Já desisti da leitura. Melhor conversarmos até a volta de minha irmã. A sobrinha está mais perto, deve chegar primeiro.

– Tia, a senhora sabe usar pirógrafo, não é mesmo?

– É verdade. Por que?

–Ah, podia marcar minha cuia, pôr meu nome.Todo mundo cobiça. Com meu nome, ninguém vai furtar!

A Goiabeira

Prêmio Especial 25º Concurso LiterárioYoshioTakemoto

Já não me induz esta ramagem às tachadas de verões passados.

À sombra e luz insetos na voragem carga tombada entre meus passos tardos de cansaço em tempos sem coragem.

Nojardim Fria brisa matinal Entre amarílis e prímulas, das avencas, as folhas trêmulas buscam o sol hibernal após despertar das gêmulas.

Feijão com arroz

És sisudo, sou risonha. És menta, eu sou mel. És tabaco, eu alfavaca. És financista. Sou consumista. Teus argumentos

...sou ciumenta! Contrastes à parte, há beleza e paz no hífen da paixão.

Nossos dias, afloração de alegrias, são artes que o amor faz.

– Espera, preciso antes escrever seu nome para depois usar o pirógrafo. Escolha o lugar, a cuia é sua.

Ele gira devagar a cuia de tereré. Aqui, deste lado.

Tudo bem. Sete letras dispostas em gosto e arte.

– Pode ligar, agora. De leve, cada decalque faz fumaça fétida! Pronto!

Cuia na mão, admira seu nome. Sorriso largo.

– Ah, tia você é mesmo muito legal!

– Recomendo. Guarda o pirógrafo de sua mãe no lugar onde encontrou.

Sem pestanejar, ele obedece. Daí a minutos entra minha sobrinha.

– Credo, que fedor! Esse vizinho deve estar fazendo macumba! Abram as portas, as janelas, está demais!

Tudo se esclarece. Chega minha irmã, damos boas risadas. Saboreamos o café feito na hora com a rosca de mandioquinharetiradadoforno,poucoantes,pormim.

– Titia, de outra vez, faça duas roscas; essa uma não deu nem pra tapar o buraco do dente!

...sou ciumenta! Contrastes à parte, há beleza e paz no hífen da paixão. Nossos dias, afloração de alegrias, são artes que o amor faz.

Bolsas de valores

O investidor tem em mente o nobre metal – o ouro em alta, diariamente, curto prazo, patamar.

O poeta tem em mente a nobre trama de ouro, idéia resplandecente para um soneto fechar

Haicais

Domingo de sol morro acima, capim alto oh, o jequitibá.

Atmosfera suave –crianças brincam de pique o idoso relembra.

Céu de nuvens densas clarão da lua de outono um instante só.

Cai a tarde. O frio aumenta. Sem teto senta junto ao meio fio.

2005);

haicai e Revoada, haicai (2008). Entre tantos outros prêmios, recebeu também o Prêmio Especial do 25º Concurso Literário Yoshio Takemoto, Categoria Poesia Livre em Português/2007 e Prêmio Especial, categoria Haicai, no 10º Festival do Japão.

Revista Literaria: Plural ´
Olga Amorim – Publicou DEDOS DE PROSA, crônicas – duas edições (1992 e Passa Poesia, poesia; Aventuras do sapo Januário, infanto-juvenil; Vôo de Libélulas,
Poesia
Olga Amorim
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Eu sou maravilhosa

Eu sou maravilhosa

Por saber que estou quando precisas

Por não sucumbir quando estás triste Por saber dividir tua angústia Valorizar teu sorriso

Te alimentar quando estás com fome Saciar tua sede

Por achar graça nas tuas piadas sem graça Te mostrar o horizonte, Saber chegar até ti. Por tolerar tuas rabugices Ignorar tuas faltas Saber te amar do jeito que és, Eu sou maravilhosa por tudo isso. Mas por ainda poder sorrir Ao te ouvir dizer; Fazes tão pouco por mim

Feitiço

Algemaram meu amor com feitiço lá da roça a mocinha maldosa ocultava veneno, no corpinho gorduchinho. Desceu à cidade para fazer valer sua maldade sorriso de anjinho presa fácil agarrou. De camarote a amada observou, Suspeitou... Tolices de seu amado.

Preocupada, seu coração em fogo foi procurar ajuda.

Correu ao dono d’água, ao rei da terra dos céus e do fogo.

Via Láctea percorreu, passou entre as estrelas onde a lua não resolveu.

Ao Netuno se ajoelhou e a Zeus pediu sua bênção.

A Minerva perguntou: onde achar o caminho da cura de seu amado. Não posso permitir, que por feitiço meu amado vá se perder Quando a cura vier, ele terá livre-arbítrio de escolher Me ajudem por favor, a desfazer o feitiço!

Sou justa, quando acordar da maldição Descansarei e lavarei minhas mãos. Meu sofrimento dia-a-dia dá um nó no coração.

Sou a paz e a ela clamo! Sou amor e a ela chamo!

Sou filha de Hércules – tento ser forte Zeus, te imploro, quero achar este remédio.

Cantei para as sereias, elas ouviram meu pranto Sigo por cidades, povoados atrás da cura do meu amado Seguirei caminho

Ao se curar Deixarei que reflita, aos ventos pedirei que o encaminhe na trilha da luz, do amor verdadeiro em noite de lua cheia em seu caminho encontrará pedras brilhantes com esmeraldas livre-arbítrio possuirá.

E aí sossegada esperarei para ver aonde o vento o levara

Rei Midas das Mentiras,

A mulher que é tocada por ti, sofre metamorfoses; alegrias, paixão e finalmente confusão. Vens com arsenal de promessas juras de amor, casamento

O amor vem em branco Logo a chuva... O martírio Tudo, tudo mentira... Ah... Como a verdade machuca!

Homem escuta: Se pudesses entender a dor profunda que causas o inferno que deixas Palavras de amor fincam em almas crédulas, teu beijo, veneno raro, tuas falas embalam Logo, a verdade pousa Em outros corpos ousastes o mesmo repouso Na arena do circo elas palhaças de cena choram debaixo de suas máscaras fingem alegria No trapézio mãos te estendem em diferentes corpos indiferente... Distante qualquer mão te serve se esforçam para vir ao teu encontro nela, o controle de tua força mortal! Acreditando que seguras estarão

Algemas sobre ti pairam Lutas internas de culpa e sombras que te fazem fugir... Faltar É coisa de vilão Relâmpagos cruzam em mentes inocentes Teu crânio blindado comandando teu circo Nada te detém Como nômade procuras tuas presas Capitão Midas das Mentiras, aonde vais? São tantas mentiras

9ª Lua Cheia

Nela você encontrou um porto seguro. Amparo para suas angústias todas transformadas em amenidades, dissolvendo-se em gotas de alegria. Resolve suas tristezas, pedindo às nuvens que as levem, e o vento as carreguem.

Alegrias divide com amigos Embala cristais e os penduram na árvore de natal, doando amor e serenidade.

Seu colo é seu descanso lhe leva a sonhar Na 9ª lua cheia a onda vai lhe levar Saudade vai apertar lágrima vai rolar sentirá, vontade de voltar

Revista Literaria: Plural —— 48 ´
LEVKOVITS
“Perfil2000a2006”ena“RevistaLiteráriaPluralnº1”.DiretoradeDivulgaçãodaCasadoCompositorMusical(CCM);diretoradaAPPERJ.
RACHEL
–participouda“AntologiadePoetasBrasileiros”,dos“CadernosdePoesiaOFICINA29e30”,
Poesia RACHEL LEVKOVITS

Apelo

Preciso confiar

Que a vida continua. Sem você na minha, Sem eu na tua.

Tenho certeza de que nem tudo se perpetua, mas O que é que eu faço com tanto desejo?

O pior de tudo é o seu desprezo e Sem você sou completamente indefeso. Volte, para que possamos perpetuar

O amor contido em nós, E resgatar tudo o que ficou perdido.

Retalhos

Da roupa desfeita

O aroma do perfume ainda impregnado Nos retalhos de uma vida mal feita Mas que ainda pode ser refeita!

Separação

De um passado bem vivido

Até o presente, Do qual somos sobreviventes, E nos fizemos confidentes; De uma vida construída a dois, Como ficar sem o depois? Não é com assinaturas Em papéis no cartório Que as nossas vidas se farão ausentes!

Metáfora

Ella es una flor ¿Cómo puede? No tiene la belleza, la suavidad, ni mismo el color, ¿Cómo puede? No llama Rosa, Margarita, Hortensia. ¿Serán las espinas? La amargura, el resentimiento, el desdén, el tiempo fijado. Ni siquiera la esencia, ¿Cómo puede?

Ella es una flor. El lenguaje lo transformó.

BENEDITO CESAR S

ILVA (Camanducaia/MG, 12/03/1969) – é graduado em Administração de Empresas, Especialista em Administração Escolar, Pós-graduando em Gestão de Pessoas e Projetos Sociais, Técnico em Secretariado, Professor e Escritor. Sempre atrelado à linguagem e a seu movimento. Publicou os livros: Arena em Versos (2007) e Por entre caminhos afetivos (2007). Integrou 12 antologias no Brasil, Argentina, Itália e, ainda, trabalhos divulgados em Portugal e Austrália.

Revista Literaria: Plural ´
Poesia
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Benedito Cesar Silva

Do livro O passeio do duque a cavalo e outros poemas.

OS SÁBADOS PASSADOS

há muitos sábados atrás nos anos de celi campelo vendiam-se sofás-camas a prestação as praias eram desertas e inacessíveis há muitos sábados atrás quando uma viagem era uma viagem compravam-se os livros ainda virgens e a lâmina da adaga estalava ao abrir cada página do romance

há muitos e muitos sábados atrás quando um passeio era uma aventura éramos felizes e ninguém percebia seu vestido de bolero meus sapatos bicolores o clube de campo os anjinhos de bochechas atrás do campo de golfe um matinho as formigas as salsichas de mentira as bolachas com manteiga éramos felizes como ursos de pelúcia

há muitos sábados atrás íamos ao aeroporto só para tomar café há muitos e muitos sábados atrás o cinema oásis era um teto de ventiladores os anéis de saturno nossos dropes salva-vidas há tantos e tantos sábados atrás quando celi campelo era uma menina de saia rodada nem eu nem você havíamos nascido

UM CENÁRIO DE CINEMA

como numa natureza-morta de folhinha tudo estava ali o leque flutuando no ar calado do quarto a noite dormindo sentada em sua poltrona confortável as paredes geladas de equívocos um feixe de flores desengonçadas arremessando sua luz dentro do jarro repleto de pranto mas os nossos lábios tão secos enquanto os ladrilhos cheios de lágrimas choviam do teto

do outro lado da janela o vento imóvel ao longe os limites incolores do horizonte desmaiado mas são detalhes fluídos escorridos como num cenário opaco de cinema

LUIZ CARLOSDE MOURA AZEVEDO

QUATRO HÉLICES

destampo um frasco de acqua velva e o escritório do meu avô surge voando baixo o vôo do besouro pesado do zepelim pegando fogo os recortes da guerra o prato onde comeu o imperador as gravuras francesas a caixinha do egito o escritório do meu avô era uma nau de três mastros rebocada sem pressa por bailarinas de louça alemã dançando suspensas por uma só perna

“ ” ”

aquele sofá de palhinha e veludo o quadro sobre a lareira com volumosos seios redondos era esse o escritório do meu avô cheio dos cheiros de baralho usado tabaco e vermute aquela estante com leões coroados e patas de elefante era esse o escritório do meu avô os peões comendo a rainha atrás do tabuleiro era esse o escritório do meu avô como se fosse um hidroplano de quatro hélices pousado de barriga durante o cochilo do piloto a aranha nua na banheira em caxambu poesias declamadas na fonte dos amores as águas sulfurosas os gramados de estátuas o escritório do meu avô era maior que o hotel palace o tapete voador o tinteiro de duas cores as tesouras escondidas em cada gaveta o escritório do meu avô era um bazar de istambul o museu do ipiranga e a loja dos dois mil réis

nasceu (1947) e reside em São Paulo, Capital, onde é antiquário e cursa doutorado, na USP, com uma tese sobre a poesia portuguesa pós-1990. Premiado em cerca de 30 concursos nacionais de poesia, com quatro primeiros lugares, publicou o livro O passeio do duque a cavalo e outros poemas (São Paulo, 2ª. edição, 2004) e participa de várias antologias, inclusive Paixão por São Paulo (São Paulo: Terceiro Nome, 2004). Segundo Marcelo Coelho, da Folha de S. Paulo, Luiz Carlos de Moura Azevedo escreve com “um humor comedido, muito agudo e hábil em deixar o leitor suspenso pelas palavras”.

Revista Literaria: Plural —— 50 ´
Poesia LUIZ CARLOS DE MOURA AZEVEDO

Da janela

só registrei o tempo Percebi que a vida é um labirinto sem rumo onde a felicidade faz ponto, é um desafio Da janela senti a incrível sensação que o poente se fez auroras em meu mundo me seduziu seria mera ilusão ou minha natureza insiste em ser poeta?

Letras ensandecidas...

Escrevem dores

Hoje acordei com as letras querendo sair de mim. Elas estavam encarceradas Todas dementes pela dor. Não as deixava sair para não compactuar versos tristes Onde amor fosse ridicularizado A dor sublimada.

Prendi todas as letras sem medo e sem pesar Até que minha mente voltasse a ser sã

Letras ensandecidas Só nos fazem escrever dores Tristezas Decepções

Amanhã quando eu acordar Quem sabe as letras Tenham vontade de ser feliz E se componham em rimas De versos líricos e mágicos Eu as deixarei então escapar de mim

O abraço

Antes que desse o 1º passo Perdi-me no espaço Quando ia à sua direção.

De mãos calejadas, sofridas... Acende um cigarro E já se percebe tantas pontas lançadas ao chão

Parou-me o coração de bater. O 1º passo em sua direção Ficou suspenso no ar. Observava de longe sua figura, não tão miúda, Fora alto, esguio na juventude. A pouca curvatura percebida Nem sequer demonstrava Tantas feridas no ombro a carregar. Quis falar... Mas seu silêncio... Constrangeu-me E interrompeu-me todo o argumento.

Ficamos mudos, olhos nos olhos... O tempo apagara o brilho Notava-se a desesperança.

Quis abraçá-lo, Mas senti-me rejeitada Ao perceber que abaixara o olhar Passos perdido no ar... Sem abraços Você se foi Para nunca mais voltar.

Da janela só registrei o tempo Percebi q ue a vida é um labirinto sem rumo onde a felicidade faz ponto, é um desafio Da janela senti a incrível sensação que o poente se fez auroras em meu mundo meseduziuseriamer a ilusão ou minha natureza insiste em ser poeta?

Da janela só registrei o tempo Percebi q ue a vida é um labirinto sem rumo onde a felicidade faz ponto, é um desafio Da janela senti a incrível sensação que o poente se fez auroras em meu mundo meseduziuseriamer a ilusão ou minha natureza insiste em ser poeta?

Da janela só registrei o tempo Percebi q ue a vida é um labirinto sem rumo onde a felicidade faz ponto, é um desafio Da janela senti a incrível sensação que o poente se fez auroras em meu mundo meseduziuseriamer a ilusão ou minha natureza insiste em ser poeta?

Denize Vieira

Cálida manhã

Cálida manhã Com hálito de outono Inebria-me Imagens passam Flashes de sonhos

Perdida em devaneios Degusto o sabor amargo da saudade Que me fere.

Imagens guardadas

Lembranças jamais esquecidas Misturam-se ao meu sorriso... As lágrimas Caminho entre folhas úmidas de outono Sem caminho de volta Repasso e repenso a vida

Memória de mim

Busquei entre todos os meus guardados Retalhos de minhas arranhaduras Que ao longo do tempo ficaram desenhadas Em versos borrados com lágrimas Manchadas pela alegria e pela dor Difícil momento, reflexo, avaliação...

Precisava compactar minhas recordações Lembranças vivas em cada linha mal escrita Em cada verso feito poesia Companheiro no meio do vendaval

Tudo agora se resumia Era transcrito com cuidado Sem que se perdesse o traço marcado Nem da felicidade e nem da dor Deixava tudo arquivado Para que em tempo, a chegada do fim Faça memória de mim.

A poesia não me rejeita

Poesia não me rejeita Aceita-me Insana, com rimas irregulares, Com erros singulares. A poesia me abraça, embala-me e me deixa livre para em meus versos sonhar. Deixa meu olhar com mais brilho Coração em festa. A poesia não me rejeita Aceita-me ensina-me a ser poeta

, carioca, Jornalista, Coordenadora cultural da ABRACI, colunista colaboradora da Revista Day By Night. Escreve poemas desde 10 anos, dois livros lançados:AFORÇADOAMOR, 2003, editora KNOW HOW, em Salvador/BA e MISCELÂNEA, pela Multifoco em 2006, Rio/RJ. Premiada pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 2000, com o poema ‘Lembranças’. Atua em projetos sociais, culturais e de capacitação. Participou de algumas coletâneas: ABRACI 2006, AGENDA CULTURAL 2007. Tema da vida “Busco nas entrelinhas aprendizados, buscando aperfeiçoamento”, “considero “obstáculos”, desafios a minha capacidade de jogar o jogo da vida,por isso ainda continuo no jogo”.

Revista Literaria: Plural —— 51 ´
P
oesia Denize Vieira

¡Quenoquieroverla!

quero que você viaje sempre e se não quiser voltar — que não volte. busque outros programas — de preferência algum que seja mais extenso. e vá visitar os seus museus e viver nas regiões mais inóspitas: que tal o Musée du Panthéon National Haïtien? ou o Museu de Serra Leoa, em Freetown?

afinal essas viagens são um imperativo do trabalho. e Rodin já dizia: o trabalho é tudo. sem trabalho as pedras continuariam pedras — e os trançados da vida não estariam aqui no traço talhado. o que importa é trabalhar para transformar nosso olhar mudar a direção da alma e viver na concentração do corpo. não dissipar nada nem diluir o vinho nem preservar a esquálida integridade dos medos e do pouco pão dividido. resguardar apenas as funduras desse ser habitante dos precipícios e dos despenhadeiros, neblina da minha alma, entroncamento de caminhos.

não, eu não quero me habituar as suas partidas nem as vestimentas cotidianas. também não quero trajes apertados nem sininhos no pescoço. sei que a vida é uma contínua queimação de etapas, de imagens e de clareiras. Atropelos fazem parte — e astrosbelos também. mas quem perde ali a aliança não lamenta o fogo cruzado nem os colapsos isolados.

questões sempre postas nas mesas nas camas — e onde a resposta? perguntas dissolvem-se em soluções retilíneas. mas se as retas não existem e se já não existem os júbilos e as celebrações o que fazer com essa angústia: chamar Kierkegaard? ou afinar os ouvidos para ouvir Holderlin e a solidão absoluta de Rainer? claro que a vida não é só proximidade. encontro desencontro reencontro. faz parte da vida esse capinar sozinho faz parte da vida esse capinar faz parte da vida faz parte faz e o que é que eu fiz diante de você naquela tarde de desorientadas navegações bússolas quebradas que retornam retorcidas caminhos da minha alma em agonia (se não fossem os meus erros se não fossem os seus se não fossem será que essas feridas queimavam desse jeito?) não, não há nenhum touro em minha frente. também não há nenhuma arena em minha memória. mas por que meu relógio permanece parado a las cinco en punto de la tarde? pura coincidência de um verso que a-tingiu meu universo de vermelho vermelho como la sangre de Ignacio sobre la arena. ou como suas unhas pintadas que eu não quero ver que eu não quero ver o aceno de suas mãos em mais nenhuma despedida.

¡Que no quiero verla!

Revista Literaria: Plural —— 52 ´
Poesia

ACHEGADAEMSANTORINI

O barco aportou em Santorini e o tumulto despertou meu coração menino. “Para Thira? Sim, nós te levamos para Thira. Venha conosco.” Preso à minha língua, e ao cativeiro de meu corpo, não sei para onde vou. Só sei que vou por aí, celebrando sinais antiqüíssimos, indícios da sentença délfica entre o fogo divino e a taça repleta.

Apesar disso, um burburinho de vozes preenche meus ouvidos. São sons familiares. Vestígios de imagens que saltam de poemas antigos. Mas tudo isso é intraduzível diante da turbulência desse cais.

Onde os mitos, os monastérios, as tumbas, e as mensagens dos deuses?

Onde a triunfal cidade, os negociantes de azeite e vinho? Onde os tronos, os templos e os vasos cheios de néctar?

Acho que o amigo poeta tinha razão: eu também fui visitar a Grécia e ela não estava lá.

Estavam turistas de todas as partes, mochilas, walkmans, câmeras fotográficas, filmadoras, laptops, celulares e até os últimos e inúteis desafios da razão moderna.

Mas cadê a presença da lira melodiosa, da gaita pastoril e da ária de Himeneu?

Os antigos erguiam deuses, catedrais e trabalhavam com arados, bigornas e charruas.

E o que fazemos nós com as chaves perdidas, as portas ausentes, e os deuses mortos que saíram da terra e das nossas almas e ficaram suspensos entre a imagem e a palavra a abstração e o objeto, a idéia e a coisa.

RECORRÊNCIAESURPRESA

Será assim o meu grito diante da boca agonizante de Apolo? Ou invocarei Dionísio, o deus bailarino para uma contradança?

Por incrível que pareça estou aqui agora, 2003, e sinto que não vou mais achar a água limpa para lavar os meus olhos. Meu destino está suspenso entre a entrega e a reserva entre o grito e o silêncio, entre a festa e o velório. e todas as coisas solitárias que amo sem compreender

Entro no ônibus, absolutamente lotado. Turistas de todas as partes do mundo não confraternizam comigo. Estou mais sozinho e inútil do que os dourados carros de combate ou os antigos e sacros teatros que se calaram para sempre.

Rubens J

ATODEAMAR

Finalmente o teu corpo ressurgirá diante da inquietação das coisas. E tua face não mais estará voltada aos espaços que não aprisionamos juntos. Conheceste uma outra Paris e eu uma outra São Paulo.

E estas duas cidades nunca estiveram tão próximas. Sempre havia algo vindo em nossa direção: papéis, palavras flutuantes, e este corpo desancorado no bateau ivre de Rimbaud.

Poetas amados reconduziram os trens inexistentes aos trilhos de uma travessia difícil. Mas sem tirar nada do lugar encontramos as mesmas coisas em seus lugares essenciais.

Tu aí e eu aqui. E entre nós milhares de palavras milhares de quilômetros milhares de escolhas e nesse desalojamento do ato de amar o cinzeiro continua sempre no mesmo lugar

SONETODACELEBRAÇÃO

Toda mulher é uma viagem ao desconhecido. Igual poesia avessa ao verso e à trucagem, mulher é iniciação do dia, promessa, surpresa, miragem. De nada adiantam mapas, guias, cenas ensaiadas ou pilhagens. Controverso ser, mulher é via

de mão única, abismo, moagem. É também risco máximo, magia, caminho íngreme na paisagem.

Simplificando: mulher é linguagem, palavra nova, imagem que anistia o ser, o vir-a-ser e outras bobagens

SONETODAREPARAÇÃO

Aqui se cruzam os caminhos de épocas remotas e atuais. Neste espaço finco os beirais desta casa onírica. Meu ninho

é esta escrita em pergaminho. São as fantasmagorias banais, os sons obsessivos das vogais e as libações efêmeras do vinho.

Não falo de casas em burburinho, nem de monumentos e catedrais. Registro, apenas, nesta escrivaninha o invisível poema em redemoinho, capturando o lido e o olvido e os ais escutados na partição dos caminhos.

ardim, 61 anos, jornalista. Publicou poemas em várias coletâneas. As mais divulgadas: Poesia del Brasile D’oggi (1969, Itália), Antologia Poética da Geração 60 (2000, SP), Letras de Babel (2001,Uruguai), Rayo de Esperanza (2004, Espanha). Promoveu e organizou o Ano Jorge de Lima (1973) e publicou Jorge, 8O Anos (1973). Integrou o movimento Catequese Poética, iniciado por Lindolf Bell em 1964, cujo lema era: o lugar do poeta é onde possa inquietar. O lugar do poema são todos os lugares.

Poesia Rubens Jardim

Revista Literaria: Plural —— 53 ´

As flores

As flores adornam; Embelezam; Enfeitam e Perfumam os ambientes.

As flores... Encantam o Mundo na primavera Os mais belos jardins floridos são o quê de uma mansão.

As flores...

Até nos momentos tristes se fazem presentes. De uma só cor ou multicolorida, elas deixam, como disse o filósofo chinês, sempre há um pouco de perfume nas mãos de quem as recebe.

As flores... Quase sempre expressam o desejo de quem as envia.

As flores...

Estão em sua vida desde o seu nascimento a sua 25ª hora. Portanto, aprenda a escolher, apreciar e conviver com as flores de sua vida.

Numpiscardeolhos

Os raios cruzam o céu. As águas dos rios caminham em direção ao mar As gerações passam sem percebermos. Acordamos de nossas quimeras

O poeta vislumbra sua poesia Nascemos para a vida A nossa história se constrói Dizemos adeus.

Pipocam os flashes dos holofotes Nesse instante, muda-se de vida Matamos ou morremos na guerra

Tudo acontece na eterna dualidade

As neves e nuvens se dissipam E chega a nossa 25ª hora.

Tempovazio

Perdido na imensidão da noite Está o boêmio a meditar. Vislumbra o tempo perdido e esquecido

Tem tudo e não tem nada

É só um imenso vazio a lhe atormentar A madrugada passa e lá vai ele sofismar No momento há pouca luz em seu destino

Ovalsardosventos

No valsar dos ventos sopraram minhas saudades Foi só uma quimera ardente... Por muito tempo foi uma lenha incendiando meu coração.

25ª hora

O imenso dragão que nos fulmina, o tempo... Conselheiro fiel dos insensatos e insanos, acordou-me e arrefeceu tão louco amor. O vulcão adormeceu! Quando voltará a jorrar lavas de amor e felicidade?

Farick (Francisco Evandro de Oliveira), natural de Fortaleza/CE. Oficial da Reserva do Exército, Professor de Matemática e Física com Especializações em Planejamento Educacional e Medidas de Aceleração de Aprendizagem. Pós-Graduado em Matemática pela Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro-RJ e Pós-Graduado em Psicopedagogia pela Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro-RJ. É também Escritor e Poeta com as seguintes obras publicadas: “Momentos Poéticos”, Editora Luzes Comunicações Arte e Cultura, Rio de Janeiro, 2001; “Reflexões do Amanhã”, ZMF Editora, Rio de Janeiro, 2002; “A Voz do Coração”, Scortecci Editora, São Paulo, 2004; “Costumeira Caminhada – Contos e Poesias”, Editora aBrace – Edições Pilar, Brasília/ Uruguai, setembro de 2005; “Mãe Ana, a filha de Xangô”, Editora aBrace-Edições Pilar, Rio de Janeiro, agosto de 2006 e Convivências, Editora Abrace, 2006. É membro titular do ConselhoAcadêmico e do ColegiadoAcadêmico do Clube dos Escritores Piracicaba; membro correspondente daAcademia Cachoeirense de Letras; acadêmico da Academia Internazionale II Convívio-Sicília – Itália; membro correspondente daAcademia de Letras e artes Paranapuã (ALAP).

Poesia

Revista Literaria: Plural —— 54 ´
Francisco Evandro de Oliveira (Farick)

Estes dias

Agora vê o que busca tão aflito nestas horas ermas que sofria: — caminho louco, noite em pleno dia, sussurrando seus males em seu grito. Chora um pouco de cada vez, maldito! Por que, nesta manhã, não choraria vendo claro este mal, que não queria, no vazio do estômago constrito?

Chora males que teu choro ri de ti, te esperando a espreita pela porta... Chora, em ti, o triste mundo! Chora aqui!

Abrindo sulcos pela tua veia morta... Fere entranhas, que teu choro cai em si, nestes dias que a pouca gente importa!...

O beijo

Um beijo foge à razão — aquilo que eu mais temia: Amálgama de fantasia palpita em meu coração!...

Um dardo na contramão, que o cupido esculpia e que ao meu peito queria, surpreende minha afeição!

A que amor se devia a tanto ardor e paixão, que no começo nem via, nem me chamava a atenção? Por certo, se escondia, no beijo dela! Ou não?...

Bolo de fubá

Bolo de fubá

Dorme um sono inocente lá por ilhas escondidas, busca no revés da vida sua sorte penitente.

E na morte inclemente — de seu cerco sem saída, onde a dor é mais doída — dorme um sono inocente...

Mais um dia amanhecia; agora sem o caminho que levava aonde eu queria:

ao seu bolo amarelinho — desculpas, que eu já sabia, por seu amor e carinho!...

Dorme um sono inocente lá por ilhas escondidas, busca no revés da vida sua sorte penitente. E na morte inclemente — de seu cerco sem saída, onde a dor é mais doída — dorme um sono inocente... Mais um dia amanhecia; agora sem o caminho que levava aonde eu queria: ao seu bolo amarelinho — desculpas, que eu já sabia, por seu amor e carinho!...

Mágica fantasia

Insensata sensação vazia que encerra um amor interrompido! confronta meu coração sofrido e conforta minha alma que expia!...

Diz-me tudo que, num quieto dia, à volta de um jardim quase florido como num outono, estranho, já perdido, eu possa ouvir de forma tão tardia!?...

Devolve-me o tempo esquecido... onde dourava a mágica que eu vivia, formando o que em mim é mais querido... e contempla neste canto o que devia para este antigo tempo adormecido retornar minha mágica fantasia!...

JulioMacielT JulioMacielT JulioMacielT JulioMacielT JulioMacielTreiguer reiguer reiguer reiguer reiguer. Poeta premiado participa de revistas, antologias e agendas literárias de editoras, associações, academias e sindicatos. Membro da ACL, SEERJ, APPERJ, CPAC e Clube Amigo das Letras. 1º lugar no CTCL 2007, livro “46 POEMAS”, Taba Ed., 2º lugar na Seleção “E por falar em amor”, Litteris Ed., classificado no XI e XII CNPFJ, APPERJ, menção honrosa na AVLAC, 5º lugar no XXIII CILO da AG Ed., destaque no V CNB de Poemas da ACL.

Revista Literaria: Plural —— 55 ´

TRANSFIGURAÇÃO

O escritor se solta e divide com o papel sua mágoa... Derrama o conteúdo de seu potencial criativo com ou sem motivo. Em lírica linguagem assume a condição de poeta e interpreta seu pensamento, seu momento. Assume com coragem, em densa linguagem, a temática social. Recria situações de sua natural vivência: a essência de suas emoções transfigura-o em solitário ao viajar no itinerário da idéia. Registra epopéia ou cenas banais em falas coloquiais. Solta sua mensagem, desnuda sua angústia. Na tentativa de solucionar conflitos, invade áreas não conhecidas das vidas, plenas de alegria ou tormento e se enleia em tramas emocionais, em textos fictícios ou reais! Apenas escreve (à máquina ou a próprio punho) para dar testemunho da realidade de seu tempo.

MAQUINAÇÕES

Não trema ante a trama. Passe com passo forte, passaporte para o fracasso? Não! Porto seguro, assegurado com fé, segurança nos objetivos seus Felicidade (feliz idade) forjada na confiança (fiança de si) das pessoas. Boas. Acima de tudo em DEUS! E não nas que sibilam nos tímpanos ocupados: eternos desocupados que vagueiam seu eterno tempo vago em montar estrago e maledicência, sem clemência. Personas non gratas que não deixam intatas prestigiadas reputações, em ações forjadas, maquinadas!...

NO DIA DA MULHER

O ESCULTOR PRIMEIRO, que do barro fez humano ser, presenteou-o com a inspiração-poema, musa eterna do Dia a dia (ou não) DA MULHER.

Revista Literaria: Plural —— 56 ´ CSA Poesia CÉLIA SIQUEIRA ARANTES

SONHARESNOVOS

Viajo para rumos diversos, até para rumos de versos, conduzida pela idéia. Transito pelo pensamento, pelo sentimento. Planto palavras que germinam contos, poemas, crônicas, confrontos. Nada de odisséia ou epopéia: registros de um tempo, de calma ou de contratempo. Idéias resultantes do envolvimento, do momento ou de outras épocas, lugares de folguedos: riachos, arvoredos, pomares... Vez por outra, tempo sem sol, de bruma revestido,ou respingo de chuva em arco-íris refletido... Conduzida pela vontade, embarco em novos sonhares ou em outros luares. Rotas, traçadas por instrumentos,cortam os ares, engolem mares, serpeiam terra, contornam serra, cruzando cidade... Esquecida a idade, travo conhecimento com países, raízes de nossa História. Vislumbro fatos mágicos, ou trágicos, de derrota ou vitória... Paradas, encruzilhadas, mudanças de fusos horários, novos itinerários sonhados e concretizados. Afivelada a bagagem, o regresso à terra de origem. Feliz o reencontro. E, no ponto de partida da esperada viagem, abraços, sorrisos me acolhem... Saudade vencida, beleza da vida!

CÉLIASIQUEIRAARANTES

OGRANDEBANQUETE

Chegado o DIA do banquete esperado na casa do PAI, cada um vai vestido de alegria! A PAZ estará presente: sem fome, sem guerra sem luta por terra, nem diferença de classe. E a euforia geral de ver, afinal, DEUS face a face

ROTADOPENSAMENTO

Só porque a chuva cai o cinzento se instala e trescala o olor que no vento vagueia não quer dizer que a vida seja feia. O pensamento em viagens, visões, miragens, rememora fatos inusitados, supostamente olvidados.

– goiana, professora, contabilista e poeta. Publicou “Chão Livre” (poemas), e “Fios da Memória” (contos), este agraciado com o Prêmio Alejandro Cabassa, concedido pela UBE do Rio de Janeiro. Tem um livro de crônicas, inédito: “Rumos” e integra dezenas de antologias de diversas partes do Brasil. Componente do Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras, de Nelly Novaes Coelho. Participou de encontros de escritores no Chile e no Peru, onde foi palestrante.

Revista Literaria: Plural —— 57 ´
CSA
Poesia CÉLIA
SIQUEIRA ARANTES

DESENLACE

A mão agonizante Buscando vida Untada em óleos Escorrega, perpassa Sofre a despedida

Ameaçadora, assassina

A mão fere, invade a vida Labaredas flutuam Regurgita a partida

Indiferente de nojo Rejeita a fome De desvalidos Mão estendida Escárnio da vida.

FURTO

Roubaram, de mim, a alma Roubaram a alegria desmedida Foi-se o riso adolescente Grinalda e véu Imaculada lembrança perdida

Roubaram de minhas entranhas Os filhos paridos sem dor Duas taças sobre a mesa E os lençóis perderam a cor

Ficou no coração somente

A angústia dolorida Roubaram, de mim, sem dó A verdade intermitente Onde está a minha vida?

PALAVRAS Palavras perdidas Palavras não ditas Palavras sentidas Sábias palavras Palavras doídas Sofridas Insanas Tristes palavras Arrependidas

Palavras de luto Simples gemidos Soluços de dor Quantas palavras Perdidas Sentidas Tristes suspiros de amor.

LEGADO

Se nada tiver deixado De tristeza ou alegria Quando me for desta vida Deixo a minha poesia

Aos meus filhos, mãe, amigos A todos a quem amei Deixo tristeza e alegria Deixo a minha poesia

Se não for de todo bastante O ali posto sentimento Peço reler num instante O meu profundo lamento

Se mesmo assim não bastar O sentimento derramado Deixo o ato de amar Desse jeito registrado.

Eloisa Machado. Carioca da gema e professora que, apesar de aposentada, continua contribuindo para a causa da educação pública. Escreve poesia desde a juventude, sem ter tido, ainda, o prazer de concretizar o sonho de ver um livro seu publicado. Tem participado de encontros poéticos, onde compartilha seus poemas e renova o gosto de se encantar sempre.

Revista Literaria: Plural —— 58 ´
Poesia Eloisa
Machado

Rio de março (um poema mutante)

Manheceu outono meio verão dia de guarda-chuva de músculo? Por aqui o calor é pra sempre esse asfalto é calafrio. O jornal estampa favelas de ratos molhados bolsa-fraude-dengue-cartão furado a menina do sexto andar vai sonhando seu abismo (em São Paulo) o povo pinta punhais nas camisetas pega pega pega arrasta! Um ladrão dominado no meio-fio. Sobretudo ele é negro é franzino usa sandálias de dedo umas papoulas na bermuda cicatrizes salpicadas lábios pulsos joelhos. Fim de março de chuva de faca essa porra de estação que não se morre e nas imediações da praça Tiradentes um ladrão ali cinzento sobretudo agradecido enquanto espera a Pê-Eme.

Até lá dentro

Quando eu ainda pensava em felicidades, felicidade era gesto despachado de me despir amassando peças de cima de dentro de baixo, ninguém recolher! O pessoal lá gritando, tira, tira, tira! tira mais!, eu nuinha até lá dentro da silva e incólume, isso incólume!, de bunda arrepiada na praça, o mundo cheio de roupa no colo. Teve dia, teve dia de meu sorriso escorrer por baixo. Menstruei abertamente meus perfumes de gardênia, meus abraços mal curados. Fazia mal não, era um bálsamo o sabonete barato do lavatório da cidade, eu me banhava, me felicitavam, essa mulher vai longe vai longe!, não fui. Nem cheguei a recolher meu porta-seio-cor-de-carne lá na calçada.Violeta-genciana-malva-permangantoerva-cidreira-beladona não me aliviaram no seio esquerdo o cansaço. Passou passou passou, passou. Uso sutiã, anágua e meia dessas de liga todo santo dia. Quanto me dá na telha uso combinação. Tenho sido feliz algumas vezes me usando no avesso, ainda me dou ao luxo de exibir-me alinhavos.

Beatriz Escorcio Chacon é carioca da Piedade, vive em Itaipu, Niterói, onde começou a mostrar poemas pra colocar na parede, com desenhos de Miguel Coelho, em 1987. Jornalista pela UFF, é autora dos livros de poemas ‘Mesa Posta’ e ‘Veios do Corpo’, e do infantil ‘Surpresa de Quintal’. Aposentada, avó, aparentemente dona vadia de casa, faz performances poéticas, eventos de arte, prepara novo livro – uma novela de vozes femininas. Orienta a Oficina Literária da Univ. 3ª Idade e participa da Associação Niteroiense de Escritores. Entre as Coletâneas – Prêmios, Crítica, Participação: ‘I Concurso Jornal Balcão de Poesias’, Rio, 1988. ‘Saciedade dos Poetas Vivos’. Ed. Blocos, Rio, 1991 e 1995. ‘Prêmio Stanislaw Ponte Preta’, Crônica, Rioarte, 1992 e 1994. ‘Além do Cânone-Vozes Femininas Cariocas Estreantes na Poesia dos Anos 90’, org. Helena Parente Cunha, Ed. Tempo Brasileiro, 2004. ‘Contos do Rio’, Prosa e Verso de o Globo, Ed. Bom Texto, 2005. ‘Poesia Sempre’ nº 24, cap. Poesia Inédita, Fundação Biblioteca Nacional, Rio, 2007. e mail biachacon@uol.com.be

Revista Literaria: Plural —— 59 ´
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oesia
Beatriz Escorcio Chacon

Quaseninguém

Sou parte sem parte sou palavra muda inútil mãosamarradas péssangrando sem força sem estrutura sem armas paradefender amparar levantar acriançaabandonada a favela encurralada o homem que carrega

a marmita na mão o trabalho mal remunerado a guerra das balas perdidas.

AsimplicidadedoAmor

Existempessoas que não se amam que não amam o outro que não sabem amar

Sãopessoas malamadas nadaqueridas muito sozinhas

AVidaéVida

Nãopodesofrersoluçãodecontinuidade noamor naação na vontade de vencer de ser de crescer de viver

Caso contrário chega depressa a destruição a decadência o rompimento com o belo

O melhor será para sempre amar até o último minuto agir sem pensar no fim burilar o pequeno ser

Tentaresquecer a existência da morte os limites da idade o que de cruel o mundo oferece.

AVIOLÊNCIAVELADA

Nãoparte dasbalasperdidas dosassaltos dasagressõesfísicas

Essas pessoas não aprenderam o exercício do amor olhar as flores no caminho contemplar um recém nascido voltar-se para o belo

Quandoaprenderem,vãoconseguir impregnar-se de amor emanaramor amar-se.

HELOISA IGREJA

Aviolênciaveladaataca noolhardepoucocaso napalavrainjusta notratamentoofensivo

quemsabeumdia despojadosdaviolênciavelada estaremoslivres

dasbalasperdidas dosassaltos dasagressõesfísicas.

é carioca, Graduada em: Pedagogia, Português e Literaturas, Bacharel em Filosofia. Pós-graduada em: Educação e Literatura Brasileira. Autora do livro Sonho & Realidade (poesia). Participante de várias Agendas e Antologias. Publicou artigos na Revista Delfos da UERJ. Premiada pela Universidade Castelo Branco, Litters Editora e pelo Centro de Estudos do Hospital Servidores do Estado do Ministério da Saúde. Recebeu Moção de Congratulação e Louvor da Câmara dos Vereadores do Município do Rio de Janeiro pelo Vereador Dr. Carlos Eduardo.

Revista Literaria: Plural —— 60 ´
P
oesia
HELOISA IGREJA

A Vida é uma leitura

A vida é uma leitura permanente Para quem a costuma apreciar. Cada sinal que a Natura apresente Tem sempre uma lição para ensinar.

As árvores, não há quem as atente Que não se deixe logo penetrar Pelo que são de símbolo latente: Fecundidade, vidas a gerar.

Os animais ensinam movimento, Disposição, coragem pra vencer; Devemos reparar no sentimento

Que aos humanos vem oferecer. Sem esquecer o caminho do vento Aconselhando a nunca esmorecer.

Lento Despertar

Sem cuidados, feliz, aquele povo Alternava o trabalho com o lazer, Muitas vezes trocando seu sofrer Pela risada de algum caso novo.

Dessa maneira é mais fácil viver As tarefas cumprindo com tal zelo, Porém sem desprezar qualquer apelo Que conduza à alegria e ao prazer.

Embora fosse sempre espoliado, Parecia aceitar esse mau fado Até o momento em que pesou demais.

Foi lento despertar, desesperado, Que o fez exigir a justiça aos demais, Pois todos os homens devem ser iguais.

Tarde de Domingo

Vejo aqui tanta gente reunida Que apenas ocupa o mesmo espaço Mas que não vê o irmão, não dá guarida, Nem percebe sequer seu embaraço

Nada vale seguir igual compasso, A alegria de todos é fingida. Ninguém enxerga a dor, mágoa ferida Que o outro oculta sem estardalhaço.

Juntos embora, mas que importa isso? Cada qual tem seu ar mais solitário, E aquele que está perto... está distante.

Mesmo o mais infeliz agonizante Com seu jeito de triste e de enfermiço Não encontra um só gesto solidário.

Por que você não está aqui? Paródia de As Pombas de Raimundo Correia

Evasão

Vai-se o primeiro sócio apressado... Vai-se outro mais... mais outro... enfim dezenas De sócios vão-se, quando à noite, apenas Suspeita-se o metrô já ter passado.

E lá ficamos nós, extasiados, Ante humilhante, lamentável cena; Ver o salão vazio, abandonado, E ninguém do poeta sentir pena.

Também nossas idéias se evaporam, Os desolados olhos já não choram Ao comprovar desoladora sina;

As pessoas adoram fantasias Mas preferem, a ouvir nossas poesias, Obedecer ao medo que as domina.

Revista Literaria: Plural —— 61 ´
P
úcia
LR
osadas .Professora de literatura. Publicou em poesia: Rosas vermelhas; Sem começo nem fim; Tempo imperfeito; Canto da terra e Voz do vento, estes três mais recentes pela Oficina Editores. Associada à APPERJ, onde exerceu a função de presidente no biênio 94/95. oesia Lúcia Rosadas

Sob o luar

Cheia, plena de luz, a Lua rompe a escuridão, prateia o céu, excita o mundo.

Num segundo, se esconde Em meio das nuvens beija a noite e desperta o amor Namorados enlouquecidos trocam carícias

Enlaçados dançam e se amam sob a magia do luar

A vida

Do mundo colorido, sugo o néctar da vida do bem viver.

Num gesto distraído, sem pensar nos cabelos cinza mesclados de neve, colho as surpresas do dia a dia.

Solto o olhar à luz da manhã ensolarada, coração aberto para o amor Palpita em mim, o sorriso da criança na riqueza do viver na viagem da vida.

Na igreja, os sinos tocam para o repouso divino.

Os pássaros fazem o ninho a vida, é a vida! É o amanhã...

E

LSE

O

LIVEIRA

O barco voltou

Em pleno mar escrevia.

As ondas balançavam a inspiração fluente e ele escrevia...

De repente o vento sopra! Leva as idéias, os versos, que aos poucos submergem...

Um lenço branco balança no ar, ao longe, na areia...

O barco retorna aos olhos contemplativos que absorvem toda a inspiração da poesia cheia de amor

A Natureza

A noite surge serena e calma. Os pássaros procuram o ninho. As folhas se inclinam sob o orvalho e tudo adormece.

Toda a natureza repousa. O todo, sem perceber a plenitude da beleza dos astros.

É a vida inebriando vidas! O mundo não dorme ele desperta o ser!

E a lua, translúcida Permanece...

– nasceu no Amazonas em 1916. Bacharel em Farmacologia, artista plástica e poetisa. Medalha de bronze do Salão Nacional de Belas Artes. Classificada entre os vinte melhores poetas em concurso pelo jornal Poesia Viva/Uapê. Premiada no V Concurso Nacional de Poesia Francisco Igreja/APPERJ. Apperjiana desde 2001. Membro da ADABL (2° lugar no Concurso Tobias Barreto de Menezes). Medalha de bronze no XXI Salão do Atmaísmo/2004. Medalha de prata no II Salão de Letras e Artes/ANLA. Premiada nos concursos relâmpago/APPERJ. Participou da Revista Literária Plural n° 1, OFICINA Editores/2004. Condecorada na Ordem do Mérito pela ABD, na Assembléia Legislativa/ RJ, com o título de Comendadora – Grande Oficial/2005.

Revista Literaria: Plural —— 62 ´
Poesia

ESQUELETO

(PassatempoVerbal)

D’outro,sim,dane-seafunerária! Levou meu corpo vivo aos consertos metafísicos dos ditames, que conclames, servirá à pele estulta que o encobre aos poros soltos. Éoexterno,intradérmicodascostelas, Aos perônios conclamados pelas tíbias, Em desuso.

São calcâneos inflamados aos tarsos e metatarsos nos compassos arqueológicos dos pés já sepultados.

São falanges, falanginhas e falangetas nas punhetas ritmadas dos ócios amorosos que invernos musculosos pesquisam veraneios nos verões climatizados.

São occipitais e omoplatas que escutam serenatas Nas inatas convivências aos percursos musicais. O fêmur? Dos ossos, os solitários. Bacia? Conteúdo de vivências horizontais Guardam ângulos poli formes nos deitados sexuais. Rodam rótulas ajoelhadas aos deuses comerciais Nos místicos rituais aos cânones não sagrados.

ESQUELETO2

(PassatempoVerbal)

Nasais,parietais?Criaturasdeorigem sem fins genealógicos, tal a lógica paranóica. IgualaoHomem,semsersapiens. Homoemváriaspartes. Hemo de alguns recados. Vermelhodemetaescura. Cu ou co tovelo? Um novelo. Empíricasdoresmatamalmas como joelhos de coqueiro. Úmerosemnúmero.Globalsilêncio No total dos frutos secos.

Rádio!!! Vulcão de surdos sons. São notícias de jornais aos apupos Pessoais na vã procura de absurdos. Outros ossos? Esqueci! Decúbito dorsal –Segue,pois,ofuneral!!!

CoisaCurta

OvelóriodoOnório teve coisas singulares sem plurais de morte súbita. Morreulindoomiserável! Aocompridoelejazia no silêncio, já esquecido, pois que morto nada vale. Além disso os além bares. Brincadeira de defunto que na vida viveu junto mas, depois, mal dos pesares quebeleza!Quetristeza os segredos desta vida. De nada se tem certeza. Paratal,oscemitérios.

FLÁVIO RUBENS FLÁVIO RUBENS FLÁVIO RUBENS FLÁVIO RUBENS

Ensaio

AárvorevemdaTerra, mas a terra não vem da árvore. Árvore e terra são plurais damesmaorigem comsimilitudesdiversas.

É ponto de raciocínio ver duas, como verdugos, sugando a água da terra. De que água é feita a terra se a árvore é a concebida como virgens defloradas ao sabor da meninice.

Se adulta, frutos dá. Se morena, a sombra é boa. Semarroménamorico. Se sem folhas é galho só. Ambíguaporématerra que de água não tem nada mas nada na água irmã comofamílialiquefeita pela terra satisfeita de servir semente líquida como seca é a da árvore.

EnsaioII

Enfim, é o espanto que da fruta vira folha como bolha de confeito noarrarefeito pelas circunstâncias do ato. Mas que até é nascer árvore se outra coisa não seria onde a terra é água pura e a fruta é gomo seco. Não se pode abstrair o que não ama para ser ao contrário da postura da terra impura inadjetivada pela água. Quem dos três traiu o fato? O ato, a concepção ou a natureza. Quebeleza!!! Sem namoro, sem contato, sem abraços, lá estão.

EnsaioIII

O galho saiu para lá ao contrário do de cá. Pouco importa à água, em terra, o destino destes galhos. Mas, à terra importa por que nelas elas caem. Cadência de arritmias fazem crescer os galhos por isso são díspares, e fazem a beleza da árvore. A água e a terra, não. Tanto faz ser para lá ou para cá, tudo é a mesma coisa: árvore. Mas será que a terra sabe? Ou será que a água ignora? Igual pergunta faz a junta que rejunta os três fatores. Blocos sólidos de naturas casca grossa, água pura e terra dura.

Como se fosse uma o que aos olhos são três. Uma delas não se vê, qual será se estão juntas? E que é a origem de tudo.

A água, a terra, a árvore comoSantíssimaTrindade. Três santas sem vivências quenasimplesexistência causa espanto.

EnsaioIV

A raiz. A quarta hipótese.

- jornalista, poeta co-fundador da APPERJ. Prêmios nacionais e internacionais. Romancista, contista. É membro da UBE. Publicou em inúmeras coletâneas, vários livros solos. Mais recente sucesso o conto O Perneta, (OFICINA Editores, 2007) lançado na XIII Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro.

Revista Literaria: Plural —— 63 ´
Poesia FLÁVIO RUBENS

ALERTA

carpediem amortenãoéconvidada paracelebraçãoalguma

jibóiaàesperadobote penetraosbecos àespreitadossonhos quevirampó carpediem enquantohátempo oscoveirosnemseimportam emrepetiroseuofício

ROTA

entreoespaçoquemehabita eavozquesopranoouvido hásilênciosintumescidos

natrajetóriadoimpossível ogritoédelírio noarealdepedras

amooqueestáforademim eoquemesustém éoverbojamaisconjugado

In:Foradeórbita,EditoradaPalavra, RJ,2007.

PARTILHA

amãoestendida abençoaotrigo àprocuradoponto ágeisdedos manipulamamassa domundo

masavidasófazsentido quandosereparteopão

MÁGICA

ÀJoanaMariaGuimarães

ilusionistadepalavras opoeta commalabarismo opicadeiroencanta dacartola,tiraoverso

INQUIETAÇÃO

naguerradepalavras – fogo cruzado –avitóriadoverso

CASTIÇAL

demaciçaprata seiosbundacoxas queroservela eluz

Luiz Otávio Oliani

é graduado em Letras e Direito. Participou de diversas antologias e tem poemas publicados em jornais do País e do exterior. Com incursões no teatro e no jornalismo, freqüentou oficinas e atua no movimento literário da cidade desde 1990, período em que obteve mais de 40 premiações. Publicou “Fora de órbita”, Editora da Palavra, poesia, 2007. http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_de_janeiro/luiz_otavio.html http:// www.blocosonline.com.br/literatura/poesia/obrasdigitais/saciedigpv/05/looliani01.php

Luiz Otávio Oliani

Revista Literaria: Plural —— 64 ´
Poesia

DISFARCE

Existe farsa na luminosidade da face que disfarça, a obscura cor, domínio oculto da dor Face. Farsa. Disfarce. Repetição contínua. O conceito da vida redefinido está no limiar.

Misericórdia, Senhor, para a face que vive na farsa e a dor disfarça.

AMANHECEREM JURUJUBA

O hálito das ondas do mar na leveza do vento a soprar Momento de lirismo à beira mar

A cantilena dos motores das traineiras sincronizada à barulhada das garças. Estranha marujada. É Jurujuba a despertar Amanhece. O céu se abre.

Todo prédio, toda rua, tudo é magia. Retrato de um passado. Mais presente que o próprio presente, Jurujuba é poesia.

GIESTA

No gramado recém-aparado, uma giesta majestosa engalanava o jardim.

Seus talos delgados plenos de flores, sem perfume, ostentavam a beleza misteriosa de flores singelas semelhantes às borboletas amarelas.

Quando envelhecem, estas flores amarelas ao apelo da brisa aquiescem, volteiam no ar e, fenecem.

SAUDADES

Sinto saudades do suave aroma da casa da minha avó.

Dos lençóis alvos, macios, perfumados de alfazema. Do dia-a-dia. Da leveza lúdica da vida nas asas da fantasia.

Quando perfumamos nossa alma com o aroma do passado unimos o céu à terra. A casa da minha avó era o caminho perfumado para o céu.

Sinto saudades da casa da minha avó.

Z

Edna

ambão da

S

ilva. Natural de Niterói/RJ. Professora, poetisa, cronista e artista plástica. Titular da Academia Brasileira de Estudos e Pesquisas Literárias. Membro correspondente da Academia de Letras Rio-Cidade Maravilhosa. Filiada à Associação Niteroiense de Escritores (ANE) e à APPERJ, Prêmio Niterói Cultura 2004. Medalha de Mérito Acadêmico da Academia Brasileira de Estudos e Pesquisas Literárias. Suas obras são publicadas em antologias nacionais, internacionais e revistas literárias.

Revista Literaria: Plural —— 65 ´
P
oesia Edna Zambão da Silva

CAMINHOS DE VIDRO

Perco-me no tempo dos dilemas amorosos... nos telhados da vida os beirais sem ninhos, o canto sem pássaro apenas no imaginário sobrevive a espera, a face no espelho, o compasso na canção O pranto entristece meu sonho Mas ainda resta entender o impossível... o silêncio do amor na intensidade do gesto a dimensão descoberta na saudade... o grito manifesto no desejo incontido... e nas ruas do acaso o poema adormecido

ELEGIA

VEJO O SOL DO PRANTO ATRAVESSAR O PRISMA DA SAUDADE... É PRECISO DIALOGAR COM O TEMPO RASGO A MEMÓRIA DE TUDO E ESCREVO NAS ALGEMAS DO TÉDIO O PERGAMINHO DO AMANHÃ.... E ACOLHO AS ASAS DO IMPOSSÍVEL NAS FATIGADAS RUAS DA TERNURA... QUERO O VÔOOOOO DO PÁSSARO SEM NOME, A TRANSFERÊNCIA DA LÁGRIMA PARA O BERÇO DA POESIA... E OFERECER A ROSA ELETRÔNICA AO MEU AMOR VIRTUAL.... E VER O REFLEXO DO ÚLTIMO POEMA NO ESPELHO DO INIFINITO!...

SENSATEZ ESQUECIDA

Agora, depois da fluidez do tempo, teu amor é uma imagem inerte dentro das lembranças... Tudo se reduz a um plano ultrapassado de sonhos havidos, de mortas esperanças, de pouca sensatez... A saudade habita o subsolo da poesia... Mas isso tudo, afora o silêncio da euforia, são metáforas que se escondem na ante-sala da imaginação, dos dias sucedidos, da semente sem cair no chão E tão somente, do arremedo hilário desta paixão sem nome, no escapulário da indignação!

Larissa

L

oretti

– Poeta (associada à APPERJ), cronista e trovadora. Prêmios em 2007: 1° lugar-Medalha de Ouro no Concurso Nacional de Crônicas da Academia Pan-Americana de Letras e Artes; Troféu Marcos Andriani no concurso de poesias do GALMA-Grêmio Artístico e Literário Mércia de Aloan ; Troféu Olavo Bilac (1° em crônicas) no Concurso do CEBLACenáculo Brasileiro de Letras e Artes; Menção Especial no concurso de Trovas da União Brasileira de Trovadores-UBT; 1° em Crônica no concurso realizado pelo Conselho Comunitário de São Paulo e 2° lugar no concurso de poesias de Angra dos Reis.

Revista Literaria: Plural —— 66 ´
Poesia

Vou

Vou... semquealguémvenha me impedir de ser feliz.

Vou... muito além pra onde sempre quis.

Vou... deixando o medo pra traz e a vontade de vencer me guiar Vou... em busca da liberdade para viver, deixandoopassado aos poucos se esquecer Vou a um lugar ondenãoháninguém pra me fazer chorar

Vou... Somente isso.

Realvida

Pensar que a vida é só um momento faz dela breve, mas acreditar que a vida é mais que um sonho de feitos possíveis, torná-la-á eterna. Todos os “ontens” que chegarão serão sempre um brilho inapagável, pois a realidade não é apenas o que vivemos, a realidade é aquilo que acreditamos.

A

Tudo

Vislumbro-me... com a imensidão da beleza que vejo Quandoparoeolhoprati todososmeussentidosamolecem, emudecem, ensurdecem...

Eeumepercodomundo emefechonocírculoquesefechaemnós Teus olhos brilham... faíscas de estrelas Teusorrisocintila...noexpressar“–querotê-la...” Tua pele me chama... Eemchamasardentesdebeijo,eumeentrego...

Devoltaàsovelhas

Voltar a amar... É preciso um dia voltar, e, se eu voltei, é porque um dia amei... Sem limites amei! Fui tão longe... que me perdi. Em alto mar me perdi! E por sereias fui levada para o fundo do mar Mar de lágrimas! No qual me afoguei... Delirei tua ausência por não te alcançar Decorei o teu cheiro impregnado em tuas vestes... Vestes que eu dormia agarrada pra jamais de ti me largar Era tão puro esse amor Mas tu não destes sequer valor!

S

AVOLDI. www.lesavoldi.com. lesavoldi@hotmai.com. Pequena biografia: Com apenas 23 anos é autora de “Apenas isso e algo mais” – Litteris/07; colaboradora em várias antologias poéticas, entre elas “Com a palavra, os professores do Brasil” – Litteris/08; premiada em mais de 17 concursos literários, entre eles o Troféu Coruja pela obra “Cinzas de Poemas”; integrante do Conselho Acadêmico do Clube dos Escritores Piracicaba; free-lancer da Amigos da Bíblia Editora; membro da APPERJ e da UBE; Licenciada em Letras.

NDRESSA LE

Revista Literaria: Plural —— 67 ´
AS
Poesia ANDRESSA LE SAVOLDI.

1ª hora

havia um semáforo luminoso na curva fechada da boca estranho o percurso proposto a linha pontilhada me indicava alternativas à margem dos lábios, ambos os lados limites desgarrados de qualquer ética a via em si não me dizia de línguas a lugar algum salivavam fiquei em um loopingesperando no tempo por soluços como eles sempre passam... nunca resistirei pegarei carona no próximo bocejo desejo de expansões quando na 1ª hora você sorrir

Ego

um livro não agüenta rivais ser um best-sellertemporário é uma ficção um livro quer estantes distantes preferem mãos que afagam que alisem seus contos e poemas um livro quer uma babel de livres traduções as tradições que se penalizem um livro ousa amar-se não tem piedade ou auto-ajuda precisa... precisa... de um outro para diferenciar-se um livro já nasce best-seller!

De cisão

pegar palavra – vida dissecá-la fonema a fonema tecido a tecido construir fibras e músculos e a coragem (covarde) da decisão? simples a execução espontânea – remediável difícil é decidir/por palavras pela vida qual tortura será menos leviana? despir os dias em seus significados agendar respostas de portas-abertas respeitar enigmas em parapeitos arrepiados condescender em hipocrisias de rotina

não é difícil decidir o livro final está em seus discurso epílogo de suspiros a predeterminação de alma inflada a farsa da contradança em linhas outonais estações repletas de vazios a próxima onda é sentinela de seus braços não importa palavra não importa vida eu nunca sonhei me abandonar ao insólito por que sempre acordei ao abrir os olhos?

Revista Literaria: Plural —— 68 ´
ωω ωω ω
Poesia
SÉRGIO GERÔNIMO Editor-chefe da OFICINA. Ensaísta, contista, poeta. Publicou em poesia: “Profanas & afins”; “Outras profanas”; “Enfim afins (livro virtual); “Coxas de cetim”; “PANínsula” (2ª edição); “Bela un” – poesia & humor. “Código de barras/poeta” – poesia. Coordenador dos eventos poéticos: Te Encontro Na APPERJ e Todas Elas & Alguns Deles, no Rio de Janeiro/RJ. Co-fundador da APPERJ, atual Presidente. Membro do Pen Clube, do SEERJ e Diretor Social da UBE/RJ.
SÉRGIO GERÔNIMO

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