Finanças sustentáveis na Ibero-América

Page 1


FINANÇAS SUSTENTÁVEIS NA IBERO-AMÉRICA

© Secretaria-Geral Ibero-Americana (SEGIB) e Global Green Growth Institute (GGGI) Dezembro 2024

Coordenação e equipe técnica

Jorge Andrés Osorio

Jaume Gaytán

Sandra Huang

Ferruccio Santetti

Randall Joseph Hooker

Elaboração

María Belén González Palacios

Leyla Edith González Hernández

Jacob Rodrigo Hidrowoh Eguiguren

Design

Ester Alcañiz

Nota aclaratória:

As opiniões expressas na publicação são as de seus autores e não representam necessariamente as da SEGIB, de seus estados membros nem das demais instituições colaboradoras. Portanto, a SEGIB e as instituições colaboradoras não são responsáveis pelo uso que possa ser feito das informações aqui divulgadas.

O Global Green Growth Institute não: (i) oferece qualquer garantia, expressa ou implícita; nem (ii) assume qualquer responsabilidade legal pela exatidão, integridade ou uso por parte de terceiros ou pelos resultados do referido uso de qualquer informação contida neste documento; nem (iii) declara que seu uso por parte de terceiros não infringiria direitos de propriedade privada. As opiniões e os pontos de vista dos autores expressos neste documento não necessariamente expressam ou refletem as do Global Green Growth Institute.

ACRÔNIMOS

ADB Banco Asiático de Desenvolvimento

ALC América Latina e o Caribe

APP Alianças Público-Privadas

ASG Ambiental, Social y de Gobernanza

BERD Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BM Banco Mundial

BUR Biennial Update Report (Relatório de Atualização Bienal)

CBT Comissão de Títulos Temáticos

CFC Conselho Federal de Contabilidade do Brasil

CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

COP Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas

COP29 Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Baku (Azerbaijão)

CMNUCC Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima

CSRD Corporate Sustainability Reporting Directive (Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa)

DNS Debt for Nature Swaps (Trocas de Dívida por Natureza)

EBITDA Earnings Before Interests, Taxes, Depreciations and Ammortizations (Lucros antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização)

ESG Environmenta,l Social and Governance (Ambiental, Social e de Governança)

ESRS Estándares Europeos de Reporte de Sostenibilidad (Padrões Europeus de Relatórios de Sustentabilidade)

FBS Fundo de Biodiversidade Sustentável

FMI Fundo Monetário Internacional

FUNBAM Fundação Banco Ambiental

GAR Green Asset Ratio (Índice de Ativos Verdes)

GCF Green Climate Fund (Fundo Verde para o Clima)

GEE Gases de Efeito Estufa

GGGI Global Green Growth Institute (Instituto Global de Crescimento Verde)

GRI Global Reporting Initiative (Iniciativa Global de Relatórios)

GSS Green, Social and Sustainable (Verde, Social e Sustentável)

I+D Investigación y Desarrollo

ICMA International Capital Market Association (Associação Internacional do Mercado de Capitais)

IFRS International Financial Reporting Standards (Fundação de Normas Internacionais de Relatórios Financeiros)

ISSB International Sustainability Standards Board (Conselho Internacional de Padrões de Sustentabilidade)

LDCF Least Developed Countries Fund (Fundo para os Países Menos Desenvolvidos)

MINAM Ministério do Meio Ambiente do Peru

MITECO Ministério da Transição Ecológica e do Desafio Demográfico

MRV Monitoramento, Reporte e Verificação

NDA National Designated Authority (Autoridades Nacionais Designadas)

NFV National Financing Vehicles (Veículos de Financiamento Nacional)

NDC Nationally Determined Contributions (Contribuições Nacionalmente Determinadas)

NIIF Normas Internacionais de Informação Financeira

ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

PIB Produto Interno Bruto

PNIEC Plano Nacional Integrado de Energia e Clima

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolviment

PSA Pagamento por Serviços Ambientais

P&D Pesquisa e Desenvolvimento

SASB Sustainability Accounting Standards Board (Normas do Conselho de Padrões de Contabilidade de Sustentabilidade)

SCCF Special Climate Change Fund (Fundo Especial para Mudanças Climáticas)

SEGIB Secretaria-Geral Ibero-Americana

SLB Sustainability-Linked Bonds (Títulos Atrelados à Sustentabilidade)

SLL Sustainability-Linked Loans (Empréstimos Atrelados à Sustentabilidade)

SPV Special Purpose Vehicle (Veículo de Propósito Específico)

TCFD Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (Força-tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima)

UE União Europeia

UNEP-FI

United Nations. Environment Programme Finance Initiative (Iniciativa Financeira do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente)

US$ Dólar americano

PRÓLOGOS

Mensagem da SEGIB

Em um mundo cada vez mais consciente da necessidade de avançar para um desenvolvimento sustentável, a Comunidade Ibero-Americana se encontra em uma posição única para liderar o caminho para um futuro mais verde e equitativo. A Ibero-América, rica em biodiversidade e recursos naturais, enfrenta desafios significativos, mas também tem oportunidades inigualáveis para transformar suas economias e sociedades.

Conscientes disso, na XXVIII Cúpula Ibero-Americana, celebrada em março de 2023 na República Dominicana, as e os chefes de Estado e de governo da região adotaram a Carta Ambiental Ibero-Americana, um instrumento que reflete o compromisso e a determinação regional de enfrentar a triple crise planetária: a mudança climática, a poluição e a perda de biodiversidade.

Nesse contexto, o financiamento sustentável surge como uma ferramenta crucial tanto para cumprir com os objetivos estabelecidos na Carta Ambiental quanto para impulsionar o crescimento politicamente viável, socialmente inclusivo e ambientalmente sustentável que a região necessita.

A urgência e a dimensão dos desafios que a região enfrenta – secas prolongadas, inundações cada vez mais recorrentes, incêndios que ameaçam áreas povoadas e ecossistemas, entre outros – enfatizam a importância de mobilizar recursos públicos e privados, e de promover instrumentos financeiros inovadores que se adaptem ao contexto de alto endividamento e limitado espaço fiscal que atravessam vários países da região.

A Ibero-América tem importantes histórias de sucesso nesta matéria. Por exemplo, em maio de 2023, o Equador anunciou a maior troca de dívida por conservação da natureza do mundo e, em outubro de 2022, o Uruguai emitiu o primeiro título soberano indexado a indicadores de sustentabilidade. Ambas as iniciativas demonstram que é possível alinhar os interesses financeiros e de crescimento econômico com os objetivos climáticos e meio ambientais.

O presente estudo analisa esses e outros mecanismos e tendências atuais em matéria de financiamento sustentável e identifica oportunidades e desafios específicos para a região. É o fruto de um esforço conjunto entre a Secretaria-Geral Ibero-Americana e o Instituto Global de Crescimento Verde (em inglês, Global Green Growth Institute -GGGI).

Contar com o financiamento necessário e adequado para transformar os desafios em oportunidades, para avançar em direção a um futuro mais próspero e sustentável, não somente é possível, mas também é urgente e necessário. Confio em que este documento será uma valiosa ferramenta nesta tarefa, tanto para as autoridades encarregadas de formular políticas públicas quanto para os investidores, empresários e todos os interessados em promover o crescimento e a sustentabilidade na Ibero-América.

Secretário-Geral Ibero-Americano

Mensagem do GGGI

O futuro, sem dúvida, apresenta-se sombrio e incerto se o desenvolvimento global continuar com uma abordagem de “negócios como sempre”, sem prestar atenção às múltiplas advertências ao nosso redor sobre a insustentabilidade do modelo tradicional de desenvolvimento. A crise climática tornou-se uma realidade, com temperaturas recordes, incêndios florestais e uma crescente frequência e intensidade de eventos climáticos extremos, como secas, invernos gelados, inundações, furacões e tufões.

Para abordar a emergência climática que enfrentamos hoje, devemos cumprir com os compromissos do Acordo de Paris de 2015, garantindo que o aumento da temperatura global neste século permaneça bem abaixo de 1,5 °C, acima dos níveis pré-industriais.

À medida que os efeitos da mudança climática se intensificam, também temos uma janela de oportunidade para estabilizar as temperaturas globais em níveis seguros, mas devemos agir agora. Todos nós temos uma responsabilidade coletiva e um papel a desempenhar em nossos âmbitos de ação.

Existe uma pressão cada vez maior sobre os responsáveis pelas decisões públicas e privadas para que tomem medidas climáticas, porém, para tomar decisões informadas devemos primeiro compreender completamente os principais desafios e tendências ambientais que enfrentamos.

Entre esses desafios estão as tendências contextuais, como o impacto acelerado da mudança climática, a poluição do ar alcançando níveis críticos e a perda de biodiversidade; tendências relacionadas com modelos de desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo; e tendências habilitadoras, como as regulamentações e taxonomias de finanças sustentáveis, as estratégias nacionais de financiamento e a incorporação de aspectos ambientais, sociais e de governança na divulgação de informações e nas tomadas de decisão.

Desde sua criação, em 2012, o Instituto Global de Crescimento Verde (GGGI), como organização intergovernamental internacional, alcançou importantes avanços no crescimento verde e sustentável de seus países membros, muitos dos quais encontram-se na região ibero-americana.

No contexto da nossa Estratégia Institucional para 2030, o GGGI concentra suas operações em apoiar a transformação dos países membros para economias resilientes e de baixo carbono, maximizando seus resultados de crescimento verde, a implementação de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC, sigla em inglês) e os compromissos com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Além disso, busca posicionar-se como uma organização intergovernamental de classe mundial, sustentável e forte na entrega de serviços e produtos de alta qualidade.

O GGGI tem como objetivo mobilizar mais de US$ 16 mil milhões até 2030 em compromissos de financiamento verde e climático para seus países membros. De acordo com nossa avaliação de impacto ex-ante, nessa escala, o GGGI ajudaria seus países membros a reduzir aproximadamente uma gigatonelada de CO2e, gerar 2 milhões de empregos verdes e proporcionar serviços sustentáveis a 100 milhões de pessoas. Até esta data, conseguimos mobilizar mais de US$ 10 mil milhões.

Para alcançar esses objetivos e continuar gerando benefícios profundos para seus países membros, o GGGI trabalha em conjunto com sócios estratégicos, como a Secretaria-Geral Ibero-Americana (SEGIB), para implementar iniciativas que permitam o cumprimento dos compromissos internacionais em prol do desenvolvimento sustentável dos países iberoamericanos. A publicação do estudo “Finanças Sustentáveis na Ibero-América” representa um primeiro marco nessa relação, na esperança de que esse instrumento sirva como documento de referência para os tomadores de decisão e atores relevantes na construção de uma região mais sustentável.

Estamos convencidos de que este estudo será o início de uma colaboração frutífera que conduzirá a iniciativas que apoiem o desenvolvimento sustentável e inclusivo da Ibero-América.

Diretora-Geral Adjunta, GGGI

RESUMO EXECUTIVO

Este documento elaborado pela Secretaria-Geral IberoAmericana (SEGIB) e pelo Global Green Growth Institute (GGGI) oferece uma análise exaustiva sobre o estado atual e as perspectivas futuras das finanças sustentáveis no espaço ibero-americano.

Em resposta à necessidade de integrar fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) nas decisões financeiras para promover um desenvolvimento econômico sustentável e resiliente à mudança climática, as finanças sustentáveis consideram os fatores meio ambientais e sociais na tomada de decisões, enquanto as finanças climáticas se concentram em combater a mudança climática por meio da redução de emissões de gases de efeito estufa e do fortalecimento da resiliência.

As finanças sustentáveis e climáticas são essenciais para enfrentar os desafios da mudança climática e fomentar um desenvolvimento econômico a longo prazo; mudam a prioridade dos ganhos imediatos para benefícios de longo prazo, promovendo práticas de investimento que evitem futuras crises climáticas e econômicas. As políticas públicas e as estratégias nacionais focadas em finanças sustentáveis representam uma oportunidade para impulsionar o crescimento econômico sustentável nos diferentes níveis de governo de um país.

O estudo está estruturado sobre três pilares principais: condições habilitantes, instrumentos financeiros e transparência e prestação de contas:

• As condições habilitantes incluem estratégias nacionais de financiamento, taxonomias nacionais, integração e divulgação de ESG, rotulagem do orçamento climático e sistemas de monitoramento, reporte e verificação (MRV). Esses elementos são fundamentais para criar um ambiente propício para o investimento sustentável e para assegurar que os recursos sejam utilizados de forma eficiente e transparente.

• Quanto aos instrumentos financeiros, são analisados diversos mecanismos como os fundos internacionais para o clima, títulos temáticos, trocas de dívida por natureza, empréstimos sustentáveis, alianças públicoprivadas inteligentes para o clima, pagamentos por serviços ecossistêmicos e financiamento vinculado à sustentabilidade. Esses instrumentos são essenciais para mobilizar capital para projetos que contribuam diretamente para iniciativas de mitigação e adaptação à mudança climática.

• Também é abordada a importância da transparência e da prestação de contas nas finanças sustentáveis. A transparência é essencial para gerar confiança e credibilidade no mercado, e é sustentada por mecanismos de monitoramento, reporte e verificação que proporcionam informações confiáveis sobre os resultados dos projetos. Isso permite avaliar se os fluxos financeiros cumprem com os objetivos de sustentabilidade e de mitigar o risco de “lavagem verde” ou “greenwashing”.

A análise dos fluxos, necessidades e lacunas de financiamento revela que a Ibero-América é uma região altamente vulnerável às catástrofes naturais resultantes da crise climática. Para enfrentar esses desafios, é fundamental aumentar significativamente o investimento em projetos de mitigação e adaptação. Por esse motivo, ressalta-se a necessidade de mobilizar recursos públicos e privados, bem como de promover instrumentos financeiros inovadores que sejam adaptados ao contexto de alto endividamento e espaço fiscal limitado de vários países ibero-americanos.

Além disso, são apresentados casos de sucesso na região, como o Roteiro de Finanças Verdes do Peru e a Taxonomia Sustentável do México, que mostram como os países estão desenvolvendo estruturas para mobilizar recursos para projetos sustentáveis. Também se destacam iniciativas como a troca de dívida por natureza das Ilhas Galápagos no Equador e a emissão de títulos soberanos vinculados a metas de sustentabilidade no Uruguai, que demonstram o potencial desses mecanismos para apoiar a conservação ambiental e a sustentabilidade fiscal.

Finalmente, o potencial da Ibero-América para liderar o mercado de finanças sustentáveis é evidente, no entanto, enfrenta desafios como a falta de quadros regulatórios homogêneos e a necessidade de fortalecer a transparência e a prestação de contas. A cooperação regional e a inovação financeira serão fundamentais para superar esses obstáculos e atrair mais investimentos para projetos sustentáveis.

O futuro das finanças sustentáveis na Ibero-América é promissor, desde que continue avançando com uma abordagem colaborativa e estratégica entre governos, instituições financeiras e o setor privado.

INTRODUÇÃO

Finanças sustentáveis

As finanças sustentáveis são aquelas que adotam um critério ético, considerando fatores meio ambientais e sociais no processo de tomada de decisões, enquanto as finanças climáticas abrangem todas as decisões de negócio e de investimento destinadas especificamente a combater a mudança climática, procurando reduzir as emissões de gases de efeito estufa e fortalecer a resiliência a seus impactos. Embora recebam nomes diferentes, de acordo com seus objetivos específicos, é necessário entender que os esforços direcionados por ambos são complementares:

Não é possível falar de sustentabilidade sem abordar a mudança climática, e não é possível falar de mitigar e/ou adaptar estratégias de mudança climática

sem considerar a sustentabilidade.

Por meio de instrumentos financeiros específicos, as finanças climáticas alinham as economias com os objetivos globais de mitigação e adaptação, fomentando um desenvolvimento que, além de gerar retornos, impulsione a resiliência climática e minimize os riscos associados à mudança climática. Incluem uma variedade de produtos e mecanismos financeiros desenhados para mobilizar capital para projetos que contribuam diretamente com a transição para uma economia de baixo carbono e mais resiliente.

Essa abordagem reconhece que a estabilidade econômica a longo prazo depende, em grande parte, da capacidade de enfrentar e de se adaptar aos efeitos da mudança climática.

As finanças climáticas mudam a prioridade dos ganhos imediatos para se concentrar nos benefícios de longo prazo, promovendo práticas de investimento e financiamento que procuram evitar futuras crises climáticas e econômicas. Assim, as finanças climáticas contribuem para a criação de um sistema financeiro que não somente é mais robusto e adaptável, mas também ajuda a construir uma economia mais responsável e preparada para um clima em mudança.

O conceito de “climático” se refere a todas as medidas e ações necessárias para reduzir os efeitos da mudança climática. Nesse contexto, as finanças climáticas buscam assegurar, ao longo do tempo, um equilíbrio entre a necessidade de crescimento econômico e a redução da pegada de carbono. Ao impulsionar uma economia que minimize seus impactos climáticos, contribui-se para criar um ambiente no qual as comunidades e os ecossistemas possam prosperar no longo prazo sem comprometer os recursos das futuras gerações.

O conceito de finanças climáticas ganhou relevância em 2015 com o Acordo de Paris, no qual os países acordaram limitar o aumento da temperatura global até 2030, procurando mantê-la abaixo de 2 °C e, de preferência, em 1,5 °C, em comparação com os níveis pré-industriais. Esse compromisso global colocou as finanças climáticas no centro das agendas de desenvolvimento, ao reconhecer que uma economia de baixo carbono e resiliente exige uma mobilização sem precedentes de recursos financeiros.

Desde então, as finanças climáticas se tornaram um pilar fundamental no combate à mudança climática. À medida que nos aproximamos de 2030, o mundo conta com uma década para transformar suas economias, reduzir suas emissões e melhorar sua capacidade de adaptação climática. Nos próximos seis anos, espera-se que as nações demonstrem avanços significativos na transição para um mundo inclusivo, de baixo carbono e resiliente, contribuindo assim para uma verdadeira mudança de paradigma na relação da economia global com o clima.

Estrutura do documento e quadro conceitual

O estudo “Finanças Sustentáveis na Ibero-América” apresenta uma análise integral dos elementos que impulsionam e moldam o desenvolvimento das finanças climáticas e sustentáveis na região. À medida que os países ibero-americanos enfrentam os desafios da mudança climática e avançam para uma economia de baixo carbono, o fortalecimento das condições habilitantes, a implementação de instrumentos financeiros inovadores e a promoção da transparência e da prestação de contas tornamse aspectos-chave na configuração de um sistema financeiro alinhado com os objetivos de sustentabilidade.

Em conjunto, esses componentes não apenas facilitam a transição para um modelo de desenvolvimento mais verde, mas também fortalecem a resiliência econômica e social da região ante os impactos da mudança climática.

Condições habilitantes

As condições habilitantes abrangem todos os preceitos regulatórios, sejam eles obrigatórios ou indicativos, que apoiam a criação, o desenvolvimento e o sucesso das finanças climáticas. Essas incluem normas, políticas, mecanismos de mercado e capacidades institucionais que, ao serem efetivamente aplicadas, fomentam um ambiente propício para o investimento sustentável. Atuam como catalisadores da mudança dentro do setor financeiro, promovendo a integração de considerações Ambientais, Sociais e de Governança (ESG, sigla em inglês) no processo geral de financiamento.

Os quadros regulatórios e as políticas podem exigir ou incentivar a inclusão da sustentabilidade na tomada de decisões financeiras. Por exemplo, bancos centrais e reguladores financeiros emitem diretrizes que obrigam as instituições a integrarem os riscos ESG em suas carteiras de empréstimos e investimentos, guiando assim os agentes financeiros para práticas mais sustentáveis.

Os mecanismos de mercado, como o imposto ao carbono, geram incentivos financeiros que promovem a redução de emissões poluentes, causando assim um impacto nas decisões de investimento. Atribuir um custo ou imposto às emissões de gases de efeito estufa (GEE) incentiva a inovação e a transição para operações menos intensivas em carbono, criando oportunidades de investimento em projetos de energias renováveis e eficiência energética. Portanto, fomentar condições habilitantes é fundamental para definir a direção, o ritmo e a escala da transição para uma economia sustentável.

Instrumentos financeiros

Os instrumentos de financiamento climático e sustentável são ferramentas financeiras concebidas para facilitar a alocação de capital em iniciativas que contribuem para a mitigação e/ou adaptação à mudança climática e desempenham um papel essencial ao traduzir os objetivos de sustentabilidade em negócios e investimentos responsáveis e economicamente viáveis.

Um exemplo destacado são os títulos temáticos: títulos verdes, sociais ou de sustentabilidade. Os títulos verdes são instrumentos por meio dos quais são captados recursos para financiar projetos ambientais, oferecendo transparência sobre o uso dos fundos e garantindo que eles sejam destinados exclusivamente para os fins previstos. Os títulos sociais e os títulos de sustentabilidade são destinados a projetos com impacto social ou uma combinação de fins sociais e ambientais e operam sob princípios semelhantes.

Outra ferramenta são os empréstimos e hipotecas sustentáveis, desenhados para financiar projetos que apoiem a descarbonização do parque imobiliário, oferecendo condições favoráveis para empreendimentos que cumpram os critérios de sustentabilidade. Isso inclui construções e remodelações com eficiência energética e hídrica, um uso racional de recursos e a possibilidade de utilizar materiais recicláveis para minimizar o impacto ambiental.

No âmbito da renda variável, os fundos de investimento voltados para a sustentabilidade permitem aos investidores comprarem ações de empresas que lideram práticas ESG. Embora sejam ferramentas menos difundidas, a expansão desses produtos é vital, pois vinculam diretamente o capital com resultados positivos em sustentabilidade.

Transparência e prestação de contas

A transparência e a prestação de contas são sustentadas por mecanismos de monitoramento, reporte e verificação, essenciais nas finanças climáticas e sustentáveis, para proporcionar informação confiável que permita avaliar os resultados dos projetos.

O monitoramento eficaz envolve o acompanhamento contínuo dos impactos ambientais e sociais dos investimentos, permitindo que investidores e interessados verifiquem se os fluxos financeiros cumprem com os objetivos de sustentabilidade. Os relatórios de sustentabilidade, baseados em métricas e padrões como os da Iniciativa Global de Relatórios (GRI, sigla em inglês) ou da Força-tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD, sigla em inglês), comunicam esses resultados às partes interessadas, adaptando o relatório de acordo com o público.

A transparência é fundamental para gerar confiança e credibilidade no mercado das finanças climáticas e sustentáveis. Ao mostrar práticas e resultados claros, as instituições financeiras podem evidenciar seu compromisso com os objetivos de sustentabilidade, atraindo mais investimento e melhorando sua reputação. Além disso, ajuda a mitigar o risco de “lavagem verde” ou “greenwashing”, evitando afirmações exageradas ou enganosas sobre as credenciais de sustentabilidade. A divulgação honesta dos impactos reais contribui para manter a credibilidade e a integridade e assegura que o capital seja destinado a objetivos sustentáveis.

FLUXOS, NECESSIDADES E LACUNAS DE FINANCIAMENTO

Fluxos

Nos últimos anos, o financiamento climático no âmbito global ganhou destaque devido aos desafios que os países estão enfrentando em termos ambientais, econômicos e sociais, principalmente como consequência de catástrofes decorrentes da atual crise climática. Na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, celebrada em Baku (Azerbaijão) em 11 de novembro de 2024 (COP29), o financiamento foi destacado como uma das ferramentas mais relevantes para reduzir as emissões de GEE, a fim de fazer frente aos fenômenos meteorológicos extremos que afetam à população e aos meios de subsistência.

Segundo o relatório Global Financial Gap COP29 de Moody´s2 , espera-se que o financiamento climático global no final de 2024 ascenda a US$ 2.040 mil milhões, dos quais US$ 1.968 mil milhões serão destinados à mitigação e US$ 72 mil milhões à adaptação.

No caso da ALC, a estimativa para 2024 é de US$ 92 mil milhões, dos quais US$ 85 mil milhões correspondem à mitigação e US$ 7 mil milhões à adaptação, representando assim 4,5% do total do financiamento climático global. Por sua vez, a União Europeia projeta um montante de US$ 370 mil milhões, equivalente a 18,1% do financiamento climático global.

Na Espanha, o investimento climático ascendeu a US$ 26,83 mil milhões em 2022, enquanto em Portugal foi de US$ 4,2 mil milhões em 20214. Em ambos os países, esses valores representam 1,8% de seu Produto Interno Bruto (PIB).

Nota: o cálculo de fluxos, necessidades e lacunas de financiamento sustentável abrange a região da América Latina e o Caribe, Espanha, Portugal e Andorra1

Financiamento climático 2024 e Lacuna para 2030 (Mitigação) (US$- mil milhões 2024)

Financiamento climático 2024 e Lacuna para 2030 (Adaptação) (US$- mil milhões 2024)

Necessidades

A Ibero-América é uma região altamente vulnerável às catástrofes naturais pela crise climática no âmbito econômico, social e ambiental. Por esse motivo, é relevante o compromisso dos países em cumprir com as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC).

Para abordar esses compromissos, os diferentes países criaram as chamadas “mesas técnicas de finanças sustentáveis”, por meio das quais procura-se gerenciar o desenvolvimento de soluções financeiras que permitam contribuir com a execução do plano de investimento para cumprir com as NDC estabelecidas por cada país, incluindo aspectos como a definição do financiamento exigido, os fluxos de capital e as condições associadas aos diferentes instrumentos financeiros.

Embora seja certo que existe informações estimadas sobre os impactos econômicos, financeiros e creditícios da mudança climática, ainda é necessário aprofundar tecnicamente aspectos como a medição de riscos e as estatísticas ambientais, que são vitais para estimar as necessidades de financiamento, para posteriormente desenvolver os instrumentos financeiros adequados e as entidades intermediárias.

De acordo com os dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) apresentados no relatório Climate Change Challenges and Opportunities in Latin America and the Caribbean, as necessidades anuais de investimento climático da ALC variam na faixa de US$ 132 mil milhões a US$ 350 mil milhões.

Da mesma forma, no Relatório Climate Finance Needs do Climate Policy Initiative, é mencionado que dos 33 países da ALC que definiram seus compromissos com as NDC, 21 concretizaram seus requerimentos financeiros, alcançando assim 64%5 de cobertura em relação a todos os países que assumiram compromissos em relação às NDC. Em média, as necessidades financeiras da ALC alcançam a cifra de US$ 250 mil milhões, os quais se encontram distribuídos em atividades de mitigação (80,4%), adaptação (11,2%) e objetivos múltiplos (8,4%).

O Governo da Espanha, em setembro de 2024, aprovou a atualização do Plano Nacional Integrado de Energia e Clima (PNIEC) 2021-2030, alinhando seus objetivos com as metas de redução de emissões adotadas no âmbito europeu.

O plano contempla um investimento de 83,5 mil milhões de euros destinado à economia e eficiência energética e 91,8 mil milhões de euros para energias renováveis (representando 35% e 38% do PNIEC, respectivamente) somando US$ 184,16 mil milhões durante o período de execução do plano. Da mesma forma, no caso da Espanha, o Instituto Rousseau realizou um estudo no qual aponta que o país precisa de um investimento anual adicional de 40 mil milhões de euros, equivalente a US$ 42 mil milhões anuais até 2050 para descarbonizar a economia7

Em relação a Portugal, de acordo com o Plano Nacional de Investimentos 2030, o montante destinado ao setor de meio ambiente é de 7,7 mil milhões de euros, enquanto o de energias renováveis é de 12,9 mil milhões de euros, totalizando 20,6 mil milhões de euros, que equivale aproximadamente a US$ 21,6 mil milhões.

Segundo o relatório L’Andorre face aux changementes climatique, do Governo de Andorra, para alcançar os objetivos 2030 foi estimado um investimento de mais de 10% do PIB em 10 anos para reduzir o consumo de energia e a dependência de importações de petróleo, como a eletricidade. Igualmente, os investimentos para o plano 2024-2028 equivalem a 7,4% do PIB estimado de 2024, segundo o relatório Climate Change in Small Open Economies do FMI.

Finalmente, as estimativas das necessidades de financiamento variam na região em função de seus objetivos específicos e características particulares. Além disso, podem sofrer mudanças em função da situação fiscal de cada país e dos orçamentos governamentais, que estão associados ao desempenho econômico da região.

Fonte: Climate Policy Initiative

Lacunas de financiamento

Os países da Ibero-América exigirão investimento adicional para alcançar seus objetivos de mitigação e adaptação ao clima para 2030. O financiamento externo, tanto para a mitigação quanto para a adaptação, será essencial, dadas as limitações da mobilização de recursos internos na região, especialmente para os mercados emergentes, onde as necessidades de investimento climático são maiores devido à sua alta vulnerabilidade, à elevada dívida governamental e aos altos custos de financiamento. Do mesmo modo, as alocações para investimento climático competem com outras necessidades prioritárias, como as sociais, desenvolvimento, saúde, educação e infraestrutura básica.

Para o ano de 2024, considera-se que para o cumprimento das NDC para a ALC, será necessário um aumento de cerca de US$ 250 mil milhões, segundo as cifras estimadas pelo FMI para alcançar o objetivo da Agenda climática 2030, e de US$ 221 mil milhões segundo as estimativas do Moody´s.8

Em termos de PIB, os fluxos de financiamento climático para a região da ALC ascendem a 0,5% do PIB regional, portanto, para alcançar os objetivos da agenda climática 2030 é de vital importância aumentar entre 8 e 10 vezes esse percentual de 0,5% do PIB alocado atualmente para fechar a lacuna de financiamento. No caso da Espanha, o investimento público climático adicional necessário está entre 30 mil milhões de euros e 40 mil milhões de euros, equivalentes a US$ 31,5 mil milhões e US$ 42 mil milhões, aproximadamente 2.3%9 adicional do PIB atual.

Quanto à Espanha, Portugal e Andorra, para o cumprimento dos planos de investimentos ambientais descritos anteriormente, será necessário o financiamento de fontes públicas internacionais, de fontes públicas nacionais (de orçamentos públicos ou de empréstimos soberanos dos bancos multilaterais de desenvolvimento ou dos mercados financeiros) ou do setor privado, com uma variedade de formas diferentes e inovadoras.

Finalmente, para gerenciar as lacunas de financiamento será fundamental:

• A adoção de abordagens inovadoras para mobilizar recursos financeiros adicionais dos mecanismos tradicionais.

• Iniciar a disciplina de uma gestão orçamentária climática, na qual sejam avaliadas as alocações atuais de recursos de financiamento público para a adaptação. De acordo com o FMI, os países estão assumindo mais riscos fiscais climáticos que têm o potencial de reduzir as receitas, aumentar os gastos e os passivos contingentes de cada país.

• Além disso, os investimentos e o financiamento climático devem centrar-se no longo prazo e no desenvolvimento de capacidades técnicas. A maioria dos países na IberoAmérica precisa de acesso a financiamento acessível e a longo prazo, proporcionado em grande parte pelas instituições financeiras internacionais e bancos multilaterais de desenvolvimento.

CONDIÇÕES HABILITANTES

Estratégias nacionais de financiamento

As políticas públicas vinculadas às finanças verdes buscam guiar os fluxos dos diferentes instrumentos para objetivos meio ambientais e climáticos. Nesse sentido, as estratégias nacionais centradas nas finanças verdes são uma oportunidade para promover o crescimento econômico sustentável nos diferentes níveis de governo de um país.

Recentemente, essas estratégias também integraram objetivos sociais. Assim, a sustentabilidade, como conceito que integra os mesmos âmbitos ambientais e climáticos, como ESG, tornou-se o eixo central das políticas financeiras públicas vinculadas à mobilização de recursos por parte dos Ministérios de Finanças e de Meio Ambiente.

Diante da urgência climática e da grande lacuna de financiamento para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – estimada em US$ 3,9 mil milhões nos países em desenvolvimento10 cada vez mais países estão elaborando e implementando estratégias para a mobilização de recursos que lhes permitam cumprir com seus compromissos nacionais e internacionais.

Desta forma, as estratégias de finanças climáticas se tornaram uma condição habilitante dentro de uma jurisdição para que suas instituições, atores e mercados financeiros encaminhem ações – como políticas, processos, sistemas e instrumentos financeiros – para a mobilização de recursos públicos, privados, internacionais, nacionais e subnacionais para programas, projetos, produtos ou serviços que contribuam para alcançar os ODS e as NDC.

A implementação bem-sucedida de estratégias de finanças climáticas requer a participação de diferentes atores (intermediários) do mercado e de outros beneficiários, como instituições, organizações da sociedade civil, organismos internacionais e/ou outros, requerendo, adicionalmente, a identificação de indicadores de cumprimento para que todas as partes envolvidas entendam os objetivos a serem alcançados.

Estudo de caso: Roteiro de finanças verdes do Peru

Mediante o Decreto Supremo N.º 007-2023 do Ministério do Meio Ambiente do Peru (MINAM), foi aprovado em junho de 2023 o Roteiro de Finanças Verdes para o Peru: um instrumento que incorpora as considerações ambientais na gestão estratégica, operacional e de divulgação das entidades do sistema financeiro, de seguros e do mercado de valores. O roteiro tem como objetivo acelerar a transição para uma economia e finanças verdes no país e será aplicado tanto a entidades não regulamentadas quanto a entidades públicas relacionadas com as finanças verdes.

O Peru é um dos primeiros países na América Latina em contar com um Roteiro de Finanças Verdes, o qual serve como instrumento de gestão que contribui para fortalecer as ações nacionais destinadas a enfrentar a crise climática, a perda da biodiversidade e a poluição.

O MINAM estima que a implementação desse roteiro permitirá às entidades financeiras canalizarem recursos de aproximadamente US$ 2 mil milhões até 2025 (equivalente a 1,3% do PIB do país) em projetos de investimento e atividades produtivas com padrões de prevenção e/ou redução de impactos negativos no ambiente.

Fonte: Ministério do Meio Ambiente do Peru

Taxonomias nacionais

Para alcançar os objetivos do Acordo de Paris e avançar em direção a um desenvolvimento de baixo carbono, que permita melhorar a adaptação e a resiliência, é necessário aumentar os fluxos de capital para projetos resilientes à mudança climática e de baixo carbono.

As taxonomias são ferramentas que oferecem definições claras baseadas na ciência, as quais permitem identificar ou classificar os ativos, atividades econômicas ou projetos elegíveis que contribuem para alcançar objetivos meio ambientais, climáticos e/ou sociais. As definições concedidas pelas taxonomias podem ajudar os investidores e o público interessado – como empresas e entidades financeiras – a redirecionar eficientemente os fluxos de financiamento para atividades que foram identificadas e definidas como sustentáveis.

Em linhas gerais, uma taxonomia deve ter como objetivo vincular-se às melhores práticas ou padrões – como a taxonomia verde europeia – procurando, ao mesmo tempo, incorporar o contexto nacional e os planos de desenvolvimento locais. Esse alinhamento com as prioridades ambientais dos países e seus planos de desenvolvimento sustentável pode ajudar a adequar os investimentos e redirecionar o orçamento destinado do setor público para as atividades mais sustentáveis.

No âmbito internacional, há diferentes tipos de taxonomias: verde, sociais e sustentáveis. As verdes centram-se em objetivos de baixo carbono ou compatíveis com o desenvolvimento econômico de baixo carbono e/ou ambientalmente sustentáveis e que ajudem a evitar o greenwashing. As sociais, como seu nome indica, buscam direcionar os fluxos de financiamento para atividades econômicas com alto impacto social, enquanto as taxonomias sustentáveis incluem objetivos tanto meio ambientais quanto sociais.

Das mencionadas anteriormente, as taxonomias verdes são as mais comuns, com um aumento gradual em taxonomias de finanças sustentáveis que abrangem as categorias verdes e sociais. No âmbito mundial, há cerca de 35 taxonomias já elaboradas ou em processo de desenvolvimento. Na região ALC, a Colômbia foi o primeiro país a adotar uma taxonomia verde, seguido pelo México, com uma taxonomia sustentável, e pela Costa Rica e Panamá, com uma taxonomia em finanças sustentáveis. Por sua vez, países como Chile, República Dominicana, Argentina e Peru estão implementando seu roteiro para a aprovação de sua taxonomia nacional.

Por sua parte, Espanha e Portugal, como membros da União Europeia, alinham suas regulamentações à taxonomia verde europeia, que foi definida como uma ferramenta de transparência baseada em um sistema de classificação que permite traduzir os objetivos climáticos e ambientais da UE em critérios sobre atividades econômicas específicas para fins de investimento privado. A taxonomia verde europeia é a taxonomia mais exigente do mundo e é uma ferramenta de referência para investidores, reguladores e mercados de capital, já que oferece às empresas a oportunidade de medir o seu desempenho e progresso no cumprimento de seus objetivos ambientais de forma transparente e comparável. Além disso, um bom alinhamento com a taxonomia poderia melhorar a reputação das empresas e facilitar o acesso ao financiamento por parte de bancos e investidores.

Por sua parte, os gestores de ativos ou de investimento são obrigados a divulgar os Indicadores-Chave de Desempenho que mostrem o grau de alinhamento de suas carteiras com a taxonomia verde europeia, e os bancos também serão obrigados a divulgar seus Índices de Ativos Verdes (GAR, sigla em inglês).

Com o objetivo de contar com um guia regional para a elaboração de taxonomias nacionais, em julho de 2023, a Iniciativa Financeira do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP-FI, sigla em inglês) publicou o Quadro Comum de Taxonomias de Finanças Sustentáveis para a ALC, uma ferramenta desenvolvida pelo Grupo de Trabalho sobre Taxonomias de Finanças Sustentáveis da região. Esse quadro serve como documento guia para orientar os países da ALC durante o desenvolvimento de suas taxonomias de finanças sustentáveis e estabelece princípios orientadores que permitem melhorar a comparabilidade e garantir a interoperabilidade das taxonomias na região e no âmbito internacional. Também, inclui guias de elementos-chave que devem ser considerados para a elaboração da taxonomia e a orientação para estabelecer critérios de seleção baseados na ciência para atividades econômicas em todos os setores.

Estudo de caso: Taxonomia Sustentável do México11

Em março de 2023, a Secretaria da Fazenda e Crédito Público (SHCP) dos Estados Unidos Mexicanos lançou sua Taxonomia Sustentável para aumentar e reorientar o financiamento para atividades sustentáveis que contribuam para a mitigação e adaptação à mudança climática, bem como para a igualdade de gênero.

Com a participação de 200 especialistas técnicos de instituições dos setores público, privado, financeiro, acadêmico e da sociedade civil, acompanhados por representantes de organismos internacionais, foram identificadas e definidas 124 atividades econômicas que contribuem substancialmente para os objetivos de mitigação e adaptação à mudança climática, que foram distribuídas nos seguintes setores econômicos:

• Construção

• Energia e fornecimento de água

• Transporte

• Gestão de resíduos

• Manufatura

• Agropecuário e florestal

É importante mencionar que as atividades dentro desses setores somente poderão ser alinhadas com a Taxonomia Sustentável do México se tiverem salvaguardas ambientais e sociais mínimas e cumprirem com o princípio de não causar dano significativo. Outrossim, a Taxonomia Sustentável do México estabelece diretrizes transversais de igualdade de gênero para todos os setores da economia mexicana a fim de garantir o cumprimento desse objetivo por meio de princípios fundamentais de trabalho, como bem-estar e inclusão social. O cumprimento desses princípios e diretrizes pode ser medido com base no “Índice de Igualdade de Gênero”, que inclui 43 perguntas com limites que permitem definir as contribuições substanciais e as pontuações mínimas para cada pilar.

A incorporação do objetivo de igualdade de gênero na Taxonomia Sustentável do México, que incorpora suas próprias métricas de medição, foi considerada um marco para as taxonomias no âmbito global e servirá de referência para o desenvolvimento de taxonomias sociais ou sustentáveis em toda a região.

Integração e divulgação de ESG

A regulamentação da divulgação de ESG é uma política que os países utilizam para fomentar a divulgação de informação não financeira, ou seja, aquela relacionada com a sustentabilidade, a qual, por sua vez, é material para as instituições financeiras, as empresas e as emissoras de valores. A regulamentação da divulgação tem como objetivo dar segurança, transparência e contrastar dados dos mercados.

Essas regulamentações estão em ascensão e levaram ao desenvolvimento de numerosos indicadores, guias e padrões para a apresentação de relatórios de sustentabilidade. Esta abordagem incentiva que as empresas informem sobre questões econômicas, além de temas sociais e ambientais, a fim de complementar a abordagem unidimensional das demonstrações financeiras convencionais. Além disso, essa nova abordagem incentiva as empresas a integrarem aspectos ambientais, de biodiversidade e sociais na avaliação de seus riscos, ao mesmo tempo que permite a identificação de oportunidades nos processos de tomada de decisão.

Neste contexto, também estão sendo adotadas regulamentações obrigatórias para a apresentação de relatórios ESG, os quais visam orientar a ação corporativa ante os riscos climáticos. A Europa lidera essa iniciativa com a Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa (CSRD, sigla em inglês), que exige às empresas europeias ou com operações na Europa a cumprir determinados parâmetros no momento de apresentar divulgações específicas de ESG por meio dos Padrões Europeus de Relatórios de Sustentabilidade (ESRS, sigla em espanhol), que abrangem as três áreas ESG.

Para cada padrão – e, ser for o caso, com base em um estudo de dupla materialidade – as empresas devem divulgar políticas, objetivos, planos de ação e recursos específicos sobre cada padrão que seja material para suas operações, e recomendase apresentar informação sobre os impactos ao longo da cadeia de valor.

Embora tenham sido alcançados progressos significativos, a divulgação de informações ESG enfrenta desafios: a existência de mais regulamentações e múltiplos quadros de referência, as formas de revelação de informações, o que tem dificultado a interoperabilidade e a comparabilidade dos dados, um fator-chave entre jurisdições e indústrias para uma avaliação comparativa entre os diferentes setores.

Apesar desses desafios, há um interesse crescente por parte dos investidores e dirigentes empresariais de integrar e divulgar informações ESG como parte de seus resultados financeiros para entender melhor a ligação entre a rentabilidade e a sustentabilidade da empresa e suas expectativas de crescimento a longo prazo. Este crescimento foi impulsionado por uma demanda de transparência das informações por parte dos investidores, principalmente por parte dos fundos de investimento e grandes proprietários de ativos institucionais para avaliar fatores sociais e ambientais ao tomar uma decisão de investimento.

Durante o ano de 2023, como parte de um esforço global para padronizar os dados de sustentabilidade, o Conselho Internacional de Padrões de Sustentabilidade (ISSB, sigla em inglês) da Fundação de Normas Internacionais de Relatórios Financeiros (Fundação IFRS, sigla em inglês) publicou a IFRS S1, que estabelece as diretrizes gerais para a divulgação de relatórios financeiros relacionados à sustentabilidade, e a IFRS S2 para os relatórios sobre a mudança climática.

Estas normas permitirão instaurar uma linguagem comum de dados que não são financeiros e uma maior interoperabilidade com outras normas.

Normas como a IFRS S1 e a IFRS S2 serviram de catalisador para os países da região revisarem suas regulamentações em matéria ESG para que possam alinhar-se, na medida do possível, com essas normas internacionais.

As jurisdições latino-americanas estão na vanguarda ao exigir divulgações financeiras relacionadas à sustentabilidade. Tanto o Chile quanto a Colômbia ordenaram o uso das recomendações da Força-tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD) e das Normas do Conselho de Padrões de Contabilidade de Sustentabilidade (SASB, sigla em inglês), nas quais se baseiam as normas ISSB. Os organismos nacionais de padronização do México também estão discutindo publicamente planos para utilizar as normas ISSB.

Estudo de caso: Brasil - Resolução

19312

O Ministério da Fazenda do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) anunciaram, por meio da Resolução CVM N.º 193, de 20 de outubro de 2023, que as Normas de Divulgação de Sustentabilidade IFRS do ISSB serão incorporadas ao quadro normativo brasileiro, estabelecendo um cronograma de adoção de uso voluntário a partir de 2024, tornando-se obrigatório a partir de 1º de janeiro de 2026.

A adoção das normas ISSB por meio do IFRS S1 e IFRS S2 ajudarão a fortalecer os mercados de capitais brasileiros, aumentando a transparência sobre os riscos e as oportunidades relacionadas com a sustentabilidade, facilitando também a atração de capitais e investimentos globais por parte das empresas. Esses relatórios devem ser apresentados em separado das demonstrações financeiras e de outros relatórios institucionais. Outrossim, a Resolução 193 exige que os relatórios associados a aspectos de sustentabilidade sejam verificados por um auditor independente registrado na CVM, em cumprimento das normas do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) do Brasil.

Com esse anúncio, o Brasil se tornou o primeiro país do mundo a adotar normas de apresentação de relatórios de sustentabilidade seguindo os padrões IFRS S1 e S2.

Rotulagem do Orçamento Climático

A Rotulagem do Orçamento Climático (EPC, sigla em espanhol) é uma ferramenta fundamental na gestão de recursos para a mudança climática, especialmente nos países em vias de desenvolvimento e na região ibero-americana. Por meio dessa ferramenta, os governos podem identificar, classificar e monitorar os gastos relacionados com o clima dentro do orçamento público, o que, por sua vez, permite ter uma visão clara dos recursos financeiros destinados a ações de mitigação e adaptação, facilitando a transparência e o alinhamento dos gastos com os objetivos nacionais e internacionais da mudança climática.

O financiamento climático se tornou essencial para alcançar as metas do Acordo de Paris e dos ODS. No entanto, pode ser difícil para os governos entenderem quanto de seu orçamento realmente é destinado à ação climática, avaliar o impacto desses investimentos e otimizar o uso dos recursos disponíveis.

A EPC responde a essa necessidade ao proporcionar um quadro estruturado para rastrear os fluxos financeiros internos e assegurar-se de que eles sejam efetivamente destinados a combater a mudança climática. Isso é especialmente relevante nos países em desenvolvimento, onde a escassez de recursos torna crucial a maximização de cada investimento climático.

Usos e benefícios da Rotulagem do Orçamento Climático

Implementar a EPC traz vários benefícios importantes:

• Transparência e prestação de contas: facilita a transparência no uso de fundos públicos, permitindo que os cidadãos, investidores e sócios internacionais compreendam como os recursos financeiros são utilizados para combater a mudança climática. Essa clareza aumenta a confiança pública e reforça o compromisso com a ação climática;

• Tomada de decisões informada: ao analisar os padrões de gastos relacionados com o clima, os responsáveis de políticas podem ajustar e priorizar melhor as alocações de recursos, garantindo que os fundos sejam destinados às áreas de maior impacto:

• Atração de fundos internacionais: a clareza e a prestação de contas da EPC podem fazer com que um país seja mais atrativo para doadores e financiadores internacionais, que buscam garantias de que suas contribuições sejam utilizadas de forma eficaz;

• Monitoramento e avaliação de progressos: ao rastrear os gastos relacionados com o clima ao longo do tempo, a ferramenta permite avaliar o progresso em direção aos objetivos climáticos e detectar áreas de melhoria ou ajustes na alocação de recursos.

Componentes e estrutura da Rotulagem do Orçamento Climático

Para uma implementação eficaz da EPC, é importante considerar os seguintes componentes:

• Definição de gastos climáticos relevantes: é crucial estabelecer critérios claros para identificar quais gastos são considerados climáticos, como aqueles destinados à mitigação de emissões ou à adaptação aos efeitos da mudança climática;

• Classificação e ponderação: os gastos identificados podem ser classificados em categorias como mitigação, adaptação ou uma combinação de ambas. Em alguns casos, são atribuídas ponderações para refletir o grau de relevância climática de cada partida orçamentária;

• Integração em sistemas orçamentários: para garantir a eficiência, a EPC deve ser integrada nos sistemas de gestão financeira pública existentes, permitindo que o processo de rotulagem seja contínuo e esteja alinhado com outras práticas orçamentárias;

• Capacitação e fortalecimento de capacidades: é fundamental que o pessoal encarregado da EPC esteja bem capacitado para executar o processo com precisão e de forma sustentável no tempo;

• Relatório e divulgação: publicar relatórios periódicos sobre os gastos climáticos reforça a transparência e facilita o diálogo com as partes interessadas nacionais e internacionais.

Para os países em desenvolvimento, a EPC desempenha um papel essencial como uma condição habilitante para o financiamento climático:

• Alinhamento com os compromissos internacionais: ajudando os países a demonstrarem seu cumprimento com acordos globais, como o Acordo de Paris, mostrando um compromisso claro e mensurável com a ação climática;

• Acesso a financiamento internacional: ao implementar práticas transparentes e responsáveis de gestão orçamentária, os países aumentam suas possibilidades de acessar fundos de organismos internacionais e doadores que buscam apoiar esforços climáticos com um acompanhamento claro dos recursos;

• Fortalecimento de políticas climáticas nacionais: ao contar com dados precisos sobre os gastos climáticos, os governos podem elaborar políticas mais eficazes e adaptar suas estratégias de acordo com as necessidades específicas de mitigação e adaptação em seus contextos nacionais;

• Fomento da participação do setor privado: a adoção da EPC e a clareza no uso dos recursos climáticos podem incentivar os investidores privados a participarem de projetos verdes, criando sinergias entre o setor público e o setor privado para alcançar objetivos climáticos comuns.

Na prática, um sistema de EPC funciona por meio de uma série de passos e processos integrados no ciclo orçamentário de um país. Sua implementação envolve a colaboração entre várias instituições, capacitação de pessoal e ajustes nos sistemas de gestão financeira pública. A seguir estão algumas considerações adicionais às já mencionadas para sua implementação eficaz:

• Definição dos gastos climáticos: esses critérios podem variar de acordo com o país e suas necessidades, mas geralmente incluem gastos destinados à mitigação (redução das emissões de GEE) e à adaptação (melhorar a resiliência ante os efeitos da mudança climática). Nesta etapa, os governos podem trabalhar com especialistas ou adotar classificações de organismos internacionais para definir as categorias de gasto;

• Classificação e rotulagem de partidas orçamentárias: uma vez revisado o orçamento geral, deve-se proceder a atribuir as etiquetas aos gastos que se encaixam nos critérios climáticos. Essas etiquetas podem ser simples (sim/não, ou seja, classificar como “gasto climático” ou não) ou com uma abordagem mais detalhada, indicando o tipo de gasto climático (adaptação, mitigação, ambos) e, inclusive, em alguns casos podem contemplar uma ponderação baseada no impacto climático;

• Integração no sistema de gestão financeira: isso envolve programar os sistemas de contabilidade pública para permitir o acompanhamento dos gastos etiquetados como climáticos, garantindo que as informações estejam disponíveis em tempo real e sejam facilmente acessíveis para a análise e os reportes;

• Monitoramento e avaliação contínua: as equipes responsáveis revisam os gastos etiquetados e asseguram que a alocação seja mantida para objetivos climáticos. Esse monitoramento permite corrigir possíveis desvios no uso dos fundos e verificar que os recursos realmente sejam destinados às áreas prioritárias de mudança climática;

• Relatório e comunicação de resultados: os governos devem publicar relatórios periódicos que detalhem quanto do orçamento foi destinado às ações climáticas e quais foram os resultados ou impactos desses gastos. Esses reportes podem incluir análises de impacto, eficácia das políticas e recomendações para futuras alocações de recursos;

• Capacitação e fortalecimento de capacidades: a implementação de uma EPC na prática também requer que o pessoal das instituições envolvidas esteja capacitado em rotulagem, no uso dos sistemas financeiros e na interpretação dos resultados. Esta formação inclui tanto o pessoal do Ministério de Finanças e Planejamento quanto a outras agências que implementem políticas climáticas, garantindo assim que todos tenham um entendimento claro do processo e possam operar de forma coordenada;

• Retroalimentação e ajuste do sistema: finalmente, a prática da EPC envolve um processo de melhoria contínua. À medida que os dados são compilados e são identificados padrões no gasto climático, os governos podem ajustar e refinar os critérios, as classificações e os sistemas de monitoramento para aumentar a eficácia da EPC, mantendo seu dinamismo e capacidade de adaptação às novas realidades e prioridades climáticas.

É importante ressaltar que o sucesso da EPC depende da definição clara de critérios, de uma sólida integração aos sistemas financeiros, do monitoramento constante e da transparência na comunicação dos resultados.

Por último, é importante reiterar que a EPC se tornou uma ferramenta indispensável para os países em desenvolvimento que buscam fortalecer suas estratégias de financiamento climático. Ao promover a transparência, a responsabilidade e uma alocação estratégica de recursos, não apenas alinha os orçamentos nacionais com os objetivos climáticos, mas também posiciona os países para atrair e utilizar eficientemente os recursos financeiros, impulsionando um desenvolvimento mais sustentável e resiliente ante as mudanças climáticas.

Estudo de caso: HondurasRotulagem dos marcadores de Rio da OCDE

Honduras conta com uma rotulagem orçamentária de mudança climática, que está alinhada com os marcadores de Rio da OCDE. Normalmente as metodologias de rotulagem costumam ser desenvolvidas por organismos financeiros centrais em colaboração com instituições especializadas em meio ambiente ou mudança climática. No caso de Honduras, a metodologia foi desenvolvida em conjunto pelo departamento de investimento público do Ministério de Finanças e pelo Ministério do Meio Ambiente.

Embora alguns países tenham aplicado os indicadores de Rio diretamente, outros adaptaram as definições dos indicadores de acordo com suas necessidades particulares. Honduras, em particular, classifica os gastos de redução do risco de catástrofes como uma categoria distinta, que se encontra separada da categoria de adaptação.

Outro elemento relevante da metodologia de rotulagem climática é sua cobertura. As categorias gerais que devem ser consideradas para determinar sua cobertura são:

• Os setores ou instituições que participarão na rotulagem.

• As categorias orçamentárias que devem ser cobertas: geralmente as despesas recorrentes e de capital (investimento), mas também, potencialmente, as despesas diretas, as despesas fiscais e as receitas.

• As entidades não orçamentárias que devem ser incluídas: as mais importantes costumam ser os governos subnacionais e as empresas estatais.

Particularmente para Honduras, a cobertura é para todos os setores, ministérios e agências e com um investimento e orçamento recorrente incluído.

Por outro lado, Honduras limita a realocação dos gastos relacionados com o clima para outros gastos durante a execução do orçamento (com exceção da resposta a catástrofes), protegendo assim as alocações destinadas à mudança climática durante a implementação.

Finalmente, os orçamentos climáticos em Honduras são apresentados em um relatório analítico separado, que inclui planilhas orçamentárias detalhadas de todas as atividades relacionadas com o clima.

Monitoramento, Reporte e Verificação do financiamento climático

O Monitoramento, Reporte e Verificação (MRV) do financiamento climático é um sistema estruturado que permite aos países rastrearem, documentarem e avaliarem os fluxos financeiros destinados à mitigação e adaptação à mudança climática. Esse mecanismo é essencial para garantir a transparência, a prestação de contas e a eficácia no uso dos recursos alocados para as ações climáticas, proporcionando assim aos governos e a outros atores uma visão detalhada de como os fundos climáticos são distribuídos e empregados. Com um sistema MRV é possível identificar quais recursos financeiros estão sendo investidos, avaliar sua eficácia e assegurar que esses fundos sejam destinados adequadamente para cumprir com os objetivos climáticos no âmbito nacional e internacional.

No contexto do financiamento climático, o MRV se torna uma ferramenta indispensável. A necessidade de um sistema de MRV sólido surge da complexidade e da magnitude dos compromissos climáticos estabelecidos, como os do Acordo de Paris e dos ODS. Sem um sistema de MRV robusto, é difícil para os países – tanto doadores quanto receptores – medir o progresso em direção aos objetivos de financiamento climático e assegurar que os recursos sejam utilizados de forma transparente e eficiente. Além disso, um MRV adequado permite avaliar o impacto dos fundos alocados, oferecendo informações importantes para ajustar as políticas e melhorar a eficácia dos programas de ação climática.

Implementar o MRV é particularmente relevante no caso dos países em desenvolvimento, onde os recursos são limitados e onde cada investimento climático deve ser otimizado. Neste sentido, o MRV ajuda a justificar o financiamento externo, já que mostra como os recursos foram utilizados e quais resultados foram obtidos, o que é vital para atrair mais financiamento e garantir a continuidade dos investimentos climáticos a longo prazo.

A implementação de um sistema MRV no contexto do financiamento climático oferece uma série de benefícios importantes:

• Transparência e prestação de contas: proporciona clareza sobre como são alocados e utilizados os fundos climáticos. Isso permite uma maior prestação de contas para os doadores, cidadãos e outras partes interessadas, fortalecendo a confiança na gestão dos recursos e garantindo que eles sejam usados para os fins previstos;

• Tomada de decisões informada: com dados precisos e atualizados sobre os fluxos financeiros, os responsáveis de políticas podem elaborar estratégias mais eficazes e priorizar investimentos em áreas que gerem maior impacto climático. Isso permite otimizar a alocação de recursos e maximizar os benefícios de cada investimento climático;

• Atração de financiamento internacional: contar com um sistema MRV bem estruturado e transparente pode fazer com que um país seja mais atrativo para receber financiamento de doadores e organismos internacionais, que buscam garantir que suas contribuições sejam utilizadas de forma eficaz. A existência de um MRV proporciona uma maior garantia de que os fundos serão gerenciados com responsabilidade e de acordo com os objetivos climáticos;

• Avaliação de impacto e melhoria contínua: um MRV permite medir e avaliar o impacto dos investimentos em termos de redução de emissões e adaptação à mudança climática, facilitando ajustes e melhorias nas estratégias implementadas. Isso é particularmente útil para corrigir ineficiências e redirecionar recursos para áreas de maior impacto.

Componentes e Estrutura do MRV do financiamento climático

Para que um sistema MRV seja eficaz, deve ter certos componentes básicos e uma estrutura clara. Esses são alguns dos principais elementos que costumam ser integrados em um sistema MRV de financiamento climático:

• Monitoramento: esse é o primeiro passo, onde é realizada a coleta sistemática de dados sobre os fluxos financeiros destinados às ações climáticas. Nesta etapa são identificadas as fontes de financiamento, os valores alocados e as áreas específicas de investimento. É fundamental ter clareza sobre os tipos de projetos e programas que recebem financiamento e qual é sua finalidade climática;

• Reporte: nessa fase, as informações compiladas são documentadas e comunicadas por meio de relatórios detalhados que descrevem como os fundos foram utilizados e quais foram os resultados. Os relatórios devem ser claros, coerentes e acessíveis para todas as partes interessadas, incluindo tanto o público nacional quanto os doadores e atores internacionais. A transparência no reporte ajuda a demonstrar o compromisso com os objetivos climáticos;

• Verificação: esse é um processo crucial no MRV, em que uma entidade externa revisa e avalia a precisão dos dados reportados. A verificação garante que as informações sejam confiáveis e que os recursos tenham sido utilizados conforme planejado, assegurando que sejam cumpridos os objetivos de transparência e responsabilidade no uso dos fundos climáticos.

Um sistema MRV eficaz também necessita estar apoiado por:

• Marcos institucionais claros: com definições claras dos papéis e responsabilidades das entidades envolvidas no processo de MRV, o que facilita a coordenação eficiente e garante que cada ator conheça suas funções e responsabilidades;

• Capacidades técnicas e humanas: a implementação do MRV requer pessoal capacitado e ferramentas tecnológicas adequadas para coletar, analisar e reportar dados com precisão e eficiência. A formação da equipe e o fortalecimento de capacidades são essenciais para a sustentabilidade do sistema MRV;

• Quadros normativos e políticas de apoio: contar com um quadro regulatório que dê apoio ao MRV é fundamental para garantir sua continuidade e alinhamento com as políticas climáticas nacionais.

Na prática

Implementar um sistema MRV para o financiamento climático envolve uma série de passos e processos:

• Desenho do sistema: em primeiro lugar, é necessário definir os objetivos, o alcance e a metodologia do sistema MRV, adaptando-o ao contexto e às capacidades nacionais e alinhando-o com os padrões internacionais de medição do financiamento climático;

• Desenvolvimento de capacidades: para garantir uma implementação eficaz, é crucial capacitar o pessoal encarregado e fortalecer as instituições responsáveis pelo MRV. Esse processo pode incluir desde o treinamento em técnicas de coleta de dados até a formação em análise e reporte de resultados;

• Coleta de dados: são estabelecidos mecanismos de coleta de dados para o monitoramento contínuo dos fluxos financeiros climáticos, seja por meio de sistemas digitais ou formatos padronizados que permitam um registro claro de cada investimento climático realizado;

• Análise e reporte: os dados compilados são analisados para produzir relatórios que reflitam o uso dos fundos climáticos e seu impacto nos objetivos de mitigação e adaptação. Os reportes podem ser realizados periodicamente e apresentados às partes interessadas para sua revisão;

• Verificação independente: contratar uma entidade externa para verificar as informações reportadas é essencial para assegurar a transparência e a credibilidade do sistema MRV. Essa revisão independente avalia se os fundos foram empregados de acordo com os objetivos climáticos definidos;

• Retroalimentação e melhoria contínua: as descobertas e análises do MRV permitem que os responsáveis de políticas ajustem e aprimorem as estratégias de financiamento climático, aumentando assim a eficácia e a otimização de recursos em futuras alocações.

Em resumo, o MRV do financiamento climático é uma ferramenta essencial para garantir que os recursos destinados a combater a mudança climática sejam utilizados de forma transparente, eficiente e eficaz. Sua implementação fortalece a confiança entre as partes interessadas, melhora a tomada de decisões e facilita o cumprimento dos compromissos climáticos nacionais e internacionais.

Estudo de caso: MRV do Chile

O Chile desenvolveu um modelo que garante que as abordagens de MRV para ações de mitigação individuais utilizem um processo uniforme. Os dados reportados oferecem informação de qualidade para a tomada de decisões, a adoção de políticas e a apresentação de relatórios sobre a implementação de ações de mitigação no âmbito nacional, bem como insumos para a compilação do Relatório de Atualização Bienal (BUR, sigla em inglês).

Dentro do âmbito MRV internacional requerido pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), para os países em desenvolvimento é contemplada a entrega da Comunicação Nacional (CN) e do Relatório de Atualização Bienal (BUR) e a realização do processo de Consulta e Análise Internacional (ICA, sigla em inglês).

No Chile, o sistema nacional de MRV de políticas e ações de mitigação surge da necessidade de:

• Contar com diretrizes para o acompanhamento e a transparência das políticas e ações de mitigação que permitem alcançar os compromissos das NDC;

• Monitorar o progresso de implementação e eficácia dos planos e políticas nacionais;

• Gerenciar e reportar as informações relacionadas com o apoio internacional (financeiro) recebido de maneira transparente;

• Identificar e resolver falhas metodológicas.

Atualmente, o Ministério do Meio Ambiente do Chile identificou outras iniciativas que desenvolverá para fortalecer elementos relacionados com o MRV. Essas iniciativas são:

• Ferramenta de cálculo: planilha Excel ou outro formato para calcular as emissões e/ou as reduções de emissões seguindo uma metodologia de cálculo determinada. Uma ferramenta de cálculo é desenhada para que um usuário insira dados de entrada (dados de atividade, fatores de emissão ou outros) e contém as equações e suposições necessárias para realizar os cálculos de emissões e/ou redução de emissões;

• Plataforma: ferramenta digital que pode alojar um ou mais elementos de um MRV. Por exemplo, dados de atividade, fatores de emissão, cálculos, reportes, entre outros.

• Protocolo: documento que estabelece diretrizes, requisitos, regras, metodologias, procedimentos ou outros conteúdos relacionados com um sistema MRV.

OBJETIVOS E METAS

Estratégia Climática de Longo Prazo - ECLP

Planos Setoriais de Mitigação

Contribuições Nacionalmente

Determinadas - NDC

POLÍTICAS, AÇÕES E MEDIDAS

Planos Setoriais de Adaptação

NACIONAL

Planos de Ação Regional de Mudança Climática

Sistema Nacional de Inventário GEE

Sistema Nacional de Prospectiva GEE

Sistema de certificação (Pegada Chile)

Plataforma Adaptação (ARClim)

Relatório de Ação Nacional sobre Mudança Climática - RANCC

Planos de Ação Comunal de Mudança Climática

INTERNACIONAL

Relatório Bienal de Transparência (BTR, sigla em inglês)

Comunicação Nacional

Processo independente desenvolvido por uma terceira parte para verificar o cumprimento de compromissos e indicadores.

Fonte: Ministério do Meio Ambiente do Chile

INSTRUMENTOS E MECANISMOS DE FINANCIAMENTO SUSTENTÁVEL

Fundos internacionais para o clima

De acordo com a CQNUMC, as finanças climáticas provêm de fontes públicas, privadas e alternativas para apoiar ações que contribuam para a mitigação e adaptação à mudança climática. Os recursos para o financiamento de investimentos de mitigação visam reduzir as emissões de GEE, principalmente por meio de projetos de geração de eletricidade com fontes de energia renováveis e projetos de eficiência energética. Os investimentos em adaptação à mudança climática fortalecem a resiliência diante de fenômenos climáticos extremos, como a agricultura sustentável e a gestão de recursos hídricos. Através desses esforços, os países da região não apenas avançam em seus objetivos climáticos e de desenvolvimento sustentável, mas também buscam reduzir a desigualdade e promover a transição para economias de baixo carbono.

De acordo com a distribuição global de financiamento climático de recursos públicos e privados, 75% do total de desembolsos se concentrou na América do Norte, Europa Ocidental e Ásia Oriental e Pacífico (com especial liderança da China). As regiões de países de baixa e média renda receberam menos de 25% dos fluxos de financiamento climático, sendo que a região da ALC, em particular, recebeu apenas 6% do total global alocado13. Desses fundos, cerca da metade são direcionados ao Brasil, México, Costa Rica e Colômbia.

A necessidade de ampliar o financiamento climático para a região ALC torna-se ainda mais relevante quando consideramos a existência de uma lacuna significativa de investimentos, tanto para a infraestrutura de mitigação quanto de adaptação, apesar da alta vulnerabilidade enfrentada pela região. O fechamento dessa lacuna de financiamento climático para a região requer uma colaboração sólida entre governos, instituições financeiras e setor privado, assim como o desenvolvimento de quadros regulatórios e políticas que favoreçam o investimento sustentável.

Para facilitar e acelerar a provisão de financiamento climático aos países em desenvolvimento, a CQNUMC estabelece mecanismos financeiros no âmbito do Protocolo de Kyoto e do Acordo de Paris. As entidades ou fundos que funcionam como mecanismos financeiros da convenção são as seguintes:

• Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, sigla em inglês), que tem atuado como entidade operacional do mecanismo financeiro desde a entrada em vigor da Convenção, em 1994;

• Fundo Verde para o Clima (GCF, sigla em inglês), que foi estabelecido na COP16 em 2010. Esse mecanismo financeiro em particular responde perante a COP, que é a entidade que decide sobre suas políticas, prioridades de programas e critérios de elegibilidade para financiamento;

• Fundo de Adaptação, que foi estabelecido pelo Protocolo de Kyoto em 2001;

• Fundo Especial para Mudanças Climáticas (SCCF, sigla em inglês).

• Fundo para os Países Menos Desenvolvidos (LDCF, sigla em inglês).

Além desses fundos, há outros fundos ou mecanismos financeiros que contribuem com recursos para o financiamento climático, como o Clean Technology Fund, o Fundo Amazônia, o Forest Investment Program, o Programa ONU-REDD, entre outros.

Estudo de caso: Fundo Verde para o Clima

O GCF é um mecanismo de financiamento da CQNUMC que busca apoiar programas e projetos de adaptação e mitigação da mudança climática nos países em desenvolvimento, com uma abordagem transformacional capaz de promover a apropriação nacional.

Os recursos do GCF provêm principalmente dos aportes realizados pelos países desenvolvidos membros da CQNUMC, como Espanha e Portugal. No final de 2023, o GCF encerrou seu segundo ciclo de aportes dos países contribuintes, com a Espanha contribuindo com pouco mais de US$ 573 milhões e Portugal com mais de US$ 8 milhões.

Os projetos do GCF são implementados por meio das chamadas “Entidades Credenciadas”, que atendem aos padrões internacionais financeiros, às salvaguardas ambientais e sociais e aos padrões de gênero. Essas entidades podem ser públicas, privadas, não governamentais, subnacionais, nacionais ou regionais e internacionais e devem coordenar a priorização e a implementação de projetos com as Autoridades Nacionais Designadas (NDA, sigla em inglês) de cada país, para garantir o alinhamento com as políticas e os planos nacionais e o cumprimento com as NDC.

Até o final de setembro de 2024, o GCF aprovou 286 projetos que beneficiam 133 países, com um montante total de financiamento superior a US$ 15,9 mil milhões. O setor que recebeu a maior parte dos recursos desse fundo foi o de Meios de Vida e Comunidades, com US$ 2,3 mil milhões canalizados por meio de 196 projetos, seguido imediatamente pelo setor Saúde, Alimentos e Segurança Hídrica, com US$ 2 mil milhões por meio de 152 projetos.

Do total de projetos aprovados pelo GCF, 72 são para países da região ALC, equivalente a 25% do total de projetos, representando um investimento total de mais de US$ 3,72 mil milhões. Os países receptores de fundos do GCF também podem receber recursos de preparação, na forma de doação ou assistência técnica (Readiness, nome em inglês), para apoiar a apropriação e o alistamento dos países para ter acesso aos recursos do Fundo. Até o final de setembro de 2024, os países da ALC receberam mais de US$ 187 milhões em recursos de Preparação.

Antigua e Barbuda

Elaboração própria

10 Maiores receptores de financiamento para projetos . Região ALC

500.000.000

450.000.000

400.000.000

350.000.000

300.000.000

50.000.000

Elaboração própria

Fonte:
Fonte:
México Paraguai Perú Chile Argentina Barbados Equador Colômbia Costa Rica Brasil

Títulos temáticos

Os títulos temáticos são instrumentos financeiros que possibilitam o financiamento de projetos que impulsionem o desenvolvimento sustentável, buscando assim fechar a lacuna de financiamento necessária para impulsionar as economias sustentáveis. Atualmente, existem diferentes tipos de títulos temáticos: verdes, azuis, sociais, sustentáveis (Títulos GSS, sigla em inglês), de transição e atrelados à sustentabilidade (Títulos SLB, sigla em inglês), categorizados de acordo com os objetivos de financiamento.

• Títulos verdes: destinados ao financiamento de projetos com benefícios ambientais.

• Títulos azuis: destinados ao financiamento de projetos voltados para a proteção de ecossistemas marinhos e da água.

• Títulos sociais: destinados ao financiamento de atividades que beneficiem grupos vulneráveis ou que promovam o bem-estar social.

• Títulos GSS: contemplam o financiamento de projetos que visem a objetivos sociais e ambientais, ou uma combinação de ambos em uma única ferramenta.

• Títulos de transição: destinados a financiar projetos que envolvam a transição para as melhores práticas ou a transformação para modelos de negócios sustentáveis.

• Títulos SLB: diferentemente dos mencionados acima, estes títulos estão vinculados ao cumprimento de objetivos sustentáveis por parte do emissor. Caso as metas estabelecidas não sejam alcançadas, as condições do título podem variar. Nos últimos anos, os títulos temáticos se tornaram muito populares em diferentes mercados bolsistas, dado que o financiamento público é insuficiente para alcançar os objetivos e as metas estabelecidas pelos países em relação à mudança climática e às NDC.

Embora o mercado de títulos temáticos seja ainda emergente, está experimentando um rápido crescimento, especialmente nas economias em desenvolvimento, que buscam mobilizar recursos para objetivos sustentáveis: os emissores podem acessar ativos de maior prazo do que as fontes tradicionais de financiamento (empréstimos bancários), permitindo o acesso a um novo mercado de investidores com objetivos específicos de sustentabilidade, favorecendo adicionalmente a imagem de quem os emite.

Nesta seção, cabe destacar que, como o espaço iberoamericano está cada vez mais vulnerável aos eventos climáticos, é importante trabalhar para ampliar os tipos de títulos emitidos de acordo com as novas tendências do mercado: títulos de catástrofe, títulos de resiliência, títulos de biodiversidade, entre outros.

Do lado dos investidores (compradores de títulos), as vantagens de investir nesses instrumentos são inúmeras: são uma estratégia poderosa para o alcance de suas metas e objetivos ESG, permitem diversificar sua carteira ao reduzir o risco de seus investimentos e, em alguns casos, permitem o acesso a incentivos fiscais.

Diferentemente dos títulos tradicionais ou “vanilla”, os títulos temáticos incluem requisitos de transparência e relatórios de impacto, permitindo que os investidores e as partes interessadas tomem conhecimento dos resultados alcançados em matéria de sustentabilidade. Os relatórios de impacto têm quadros padronizados baseados em métricas e elementos qualitativos. Entre os principais destacam-se: os Princípios da Associação Internacional do Mercado de Capitais (ICMA, sigla em inglês), a Iniciativa Global de Relatórios (GRI, sigla em inglês) e o Grupo TCFD.

A transparência dos títulos temáticos é essencial para que exista confiança e credibilidade no tocante a este tipo de instrumentos financeiros. De acordo com os dados compilados pela Iniciativa de Títulos Climáticos (CBI, sigla em inglês), no fechamento de 2023 foram emitidos títulos GSS e SLB no total de US$ 5,5 trilhões, um aumento de 3% em comparação com as emissões verificadas no fechamento de 20226, o que indica um forte apetite por parte do mercado sobre este tipo de instrumentos financeiros. Do total emitido até o final de 2023, 66% corresponderam a Títulos Verdes, seguidos imediatamente por emissões de Títulos Sociais, GSS e SLB.

Em relação à emissão de Títulos Verdes, de um volume total emitido de US$ 309,6 mil milhões, a Espanha está no ranking dos 10 países com o maior volume de emissão, com um valor igual a US$ 21,8 mil milhões. Com relação ao mercado de títulos GSS, a região da ALC teve uma forte incidência: de um total de US$ 52 mil milhões emitidos em 2023, 6% corresponderam a essa região.

Estudo de caso: Título soberano verde da República Dominicana

Em meados de 2024, o Governo da República Dominicana, por meio do Ministério da Fazenda, emitiu Títulos Verdes pela primeira vez em sua história. Com esta operação, conseguiu-se uma emissão no valor de US$ 750 milhões a uma taxa de 6,7%, aproximadamente 15 pontos-base abaixo do que teria sido obtido com outros instrumentos de financiamento “vanilla”.

De acordo com a Segunda Opinião preparada pela S&P Global Ratings, os Títulos Soberanos da República Dominicana estão alinhados com os Princípios dos Títulos Verdes, Sociais e de Sustentabilidade da ICMA e suas despesas elegíveis estão alinhadas com as NDC do país, procurando que as Despesas Elegíveis possam contribuir para os objetivos do governo em relação às suas políticas de conservação e proteção da biodiversidade, respaldando a estratégia climática e ambiental geral do país. Os recursos obtidos por meio da emissão serão utilizados para financiar as despesas elegíveis no Orçamento Geral do Estado Dominicano, podendo ser reconhecido ou atribuído um montante igual aos fundos líquidos recebidos

de qualquer emissão realizada no âmbito do Quadro de Referência dos Títulos emitidos para despesas elegíveis correspondentes aos dois exercícios fiscais anteriores, ao exercício fiscal da emissão e aos dois exercícios fiscais seguintes.

No Quadro foram estabelecidas as atividades elegíveis a serem financiadas, com fundos de emissões, que podem incluir:

• Despesas de capital tangíveis: infraestrutura, equipamentos, tecnologia, terreno e energia;

• Ativos Intangíveis: pesquisa e inovação, capital humano e organização;

• Despesas tributárias e subsídios;

• Transferência em apoio a governos locais, agências publicitárias, empresas privadas ou públicas, instituições de ensino e de pesquisa, residências e pessoas.

Estas despesas podem ser financiadas desde que estejam alinhadas com os Critérios de Elegibilidade para Despesas Verdes e/ou com os Critérios de Elegibilidade para Despesas Sociais contemplados no quadro, tais como: mitigação e/ou adaptação à mudança climática, gestão de recursos hídricos, proteção, conservação e restauração dos ecossistemas e da biodiversidade, educação de qualidade, moradia digna, contribuição para a igualdade de gênero, entre outros.

Para selecionar e avaliar as Despesas Elegíveis, o Governo da República Dominicana designou uma Comissão de Títulos Temáticos (CBT), cuja função é garantir a coerência e a implementação adequada do programa de Emissões de Títulos Soberanos Temáticos, zelando para que as Despesas Elegíveis gerem uma contribuição significativa e adicional para a sustentabilidade e estejam alinhadas com o Quadro de Referência no que diz respeito aos princípios e melhores práticas em termos de transparência, divulgação e integridade do mercado.

A primeira emissão de Títulos Soberanos Sustentáveis da República Dominicana recebeu uma demanda nos mercados de capitais globais seis vezes superior ao montante solicitado, o que demonstra a crescente demanda e interesse por parte dos investidores em investir em atividades que promovam a proteção do meio ambiente, atendam as necessidades sociais e fomentem o desenvolvimento sustentável.

Fonte: Climate Bond Initiative

Trocas de dívida por

natureza

As Trocas de Dívida por Natureza (DNS, sigla em inglês) são transações de gestão de passivos em que são geradas economias fiscais em troca de uma série de compromissos de sustentabilidade por parte do governo soberano para alcançar objetivos e canalizar investimentos relevantes para a mudança climática ou a conservação da natureza.

As DNS podem visar a dívida oficial bilateral e comercial. Por meio de trocas de dívida bilateral, o serviço da dívida designado aos credores bilaterais oficiais é convertido em moeda nacional e o produto resultante é destinado ao financiamento de projetos conjuntamente aprovados e centrados na conservação da natureza e em iniciativas climáticas.

Nas DNS comerciais, o devedor cria um Veículo de Propósito Específico (SPV, sigla em inglês) que emite um título temático a taxas competitivas, apoiadas pela qualidade creditícia de terceiros. O capital é utilizado para comprar a dívida existente nas mãos dos detentores de títulos ao preço do mercado secundário. Portanto, as DNS comerciais são mais atrativas para os países com risco-país mais elevado, uma vez que não lhes é fácil ter acesso ao mercado de capitais através de títulos temáticos. Os títulos recomprados são posteriormente trocados por uma nova nota de impacto entre o SPV e o devedor, vinculada aos compromissos de sustentabilidade adquiridos pelo soberano.

Evolução das Trocas de Dívida por Natureza

As DNS comerciais tendem a ser maiores do que as DNS bilaterais, porque se concentram na conversão de títulos soberanos desvalorizados em uma nova dívida de impacto em melhores condições. Além disso, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), em sua publicação

“Dívida Pública e Restrições ao Desenvolvimento na América

Latina e no Caribe” mostra como os investidores privados se tornaram o credor externo mais importante dos Estados latino-americanos durante a última década. Até o momento desta publicação, não foram executadas DNS focadas na dívida multilateral.

de Dívida Soberana por Credor na América Latina 2000-2021

Há cada vez mais evidências de uma correlação existente entre as vulnerabilidades climáticas e as fiscais, que parecem estar interligadas e se reforçarem mutuamente. Ou seja, as nações que enfrentam uma maior vulnerabilidade à mudança climática também enfrentam perspectivas elevadas de crises fiscais. Como resultado, um número significativo de países com riscos climáticos, acima da média, conta também com uma probabilidade substancial de turbulências fiscais.

Embora essa conexão não indique causalidade de forma exclusiva, reflete parcialmente o fato de que muitos países em desenvolvimento – historicamente propensos à vulnerabilidade da dívida – também estejam expostos aos perigos da mudança climática.

Uma correlação bidirecional que é facilmente explicada: a mudança climática tem o potencial de piorar a vulnerabilidade da dívida ao afetar negativamente a capacidade produtiva e a base fiscal de um país. Isso, por sua vez, gera encargos fiscais, inclusive despesas de recuperação após desastres naturais (impactos climáticos), ao aumentar os custos do endividamento externo.

Em contrapartida, a deterioração da capacidade de repagamento da dívida afeta a capacidade do país para levantar novos capitais, o que reduz o financiamento disponível para investimentos na adaptação e mitigação da mudança climática.

Categorização do risco fiscal dos países e vulnerabilidade climática

Riscos climáticos versus riscos fiscais

Média ponderada do índice de risco climático

Fonte: Elaboração própria. 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8

Fonte: Elaboração própria.

Número de países com risco climático acima da média, por probabilidade de risco de crise fiscal

Risco fiscal para países com alto risco climático

Risco fiscal Alto risco climático (acima do 50º percentil)

Número de países

Dadas essas interconexões, juntamente com os US$ 95 mil milhões14 necessários para que os mercados emergentes implementem uma transição justa, o instrumento de finanças climáticas de troca de dívida por natureza é visto como um mecanismo viável para abordar, simultaneamente, os desafios climáticos e da dívida.

Estudo de caso: Troca de dívida por natureza nas Galápagos

Em janeiro de 2022, o presidente da República do Equador anunciou a criação da Reserva Marinha Hermandad, de 60.000 km², entretanto, um declínio acentuado na produção de petróleo e um lento crescimento da economia equatoriana deixaram o governo sem capacidade de alocar recursos financeiros para a preservação dessa reserva marinha. Esses fatores, além dos protestos sociais em meados de 2022, tornaram o Equador o segundo país mais propenso a não honrar suas obrigações financeiras na região e, em junho de 2022, os títulos de 2035 do Equador tiveram o pior rendimento de todos os títulos soberanos do mundo, de acordo com Bloomberg15.

O Equador se encontrava em uma situação crítica, pois estava impossibilitado de conseguir capital a taxas inferiores a 20%: a combinação do reconhecimento mundial das Ilhas Galápagos, o crescente risco de inadimplência do Equador e a estrutura da dívida externa pendente do país (composta por 25% de eurobônus) criaram as condições perfeitas para executar uma Troca de Dívida por Natureza Comercial.

Em maio de 2023, o Governo do Equador, juntamente com a Corporação Financeira Internacional para o Desenvolvimento dos Estados Unidos, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Credit Suisse, a Oceans Finance Company, o Pew Bertarelli Ocean Legacy Ecuador e o apoio do GGGI, da Lazard e da Climate Fund Managers, fechou a maior Troca de Dívida por Natureza Comercial de todos os tempos. Essa transação de gerenciamento de passivos envolveu uma redução líquida do estoque da dívida de pelo menos US$ 972 milhões em troca de um compromisso de proteger 60.000 km² da reserva marinha “La Hermandad”, fazendo com que esta operação seja a maior troca de dívida por natureza na história do mundo.

Além disso, foi estabelecido o fundo de conservação “Galápagos Life Fund”, dado que a conversão da dívida gerará mais de US$ 450 milhões para a conservação marinha nas Ilhas Galápagos, incluindo mais de US$ 18 milhões de novos fundos anuais por 18,5 anos (mais de US$ 324 milhões) e a criação de um fundo patrimonial que está previsto alcançar mais de US$227 milhões até 2041. O fundo patrimonial será uma fonte permanente de financiamento para que o GLF continue apoiando projetos de conservação marinha além do prazo de término da transação.

A Troca de Dívida por Natureza Comercial do Equador nas Ilhas Galápagos é um exemplo de como mecanismos financeiros inovadores podem ser utilizados para apoiar a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável das economias emergentes, que enfrentam cada vez mais graves desafios fiscais.

Empréstimos sustentáveis

Nos últimos anos, o compromisso dos países de combater a mudança climática e desenvolver economias resilientes fez com que a prática de incorporar fatores ESG nas decisões de investimento se torne uma tendência cada vez mais comum. Os empréstimos sustentáveis são uma ferramenta fundamental para ajudar a atingir esses objetivos, disponibilizando fundos destinados especificamente para atividades ou projetos que promovam a transformação sustentável nos ecossistemas de clientes comerciais, permitindo, por sua vez, que as instituições financeiras tenham acesso a uma série de benefícios tangíveis, entre os quais se destacam:

• Criação de valor

• Diversificação de riscos

• Diferenciação de marca

• Acesso a novas fontes de financiamento

• Acesso a novos mercados que, na maioria dos casos, apresentam necessidades de financiamento não atendidas, principalmente nos países em vias de desenvolvimento.

Os empréstimos vinculados à sustentabilidade aumentaram de US$ 5 mil milhões em 2017 para US$ 120 mil milhões em 202016. Apesar desse crescimento exponencial, eles ainda representam uma gota no oceano do mercado global de empréstimos no valor de mais de US$ 6,8 mil milhões por ano17.

Os paralelos com o investimento sustentável são instrutivos: após vários anos de forte crescimento, cerca de 45% do total de ativos sob gestão europeia e quase um terço do total de US$ 51,4 mil milhões de ativos sob gestão dos Estados Unidos; hoje são administrados como considerações ESG. Os empréstimos sustentáveis estão em uma trajetória semelhante. No entanto, apesar do impulso que está sendo gerado por trás das finanças climáticas, os bancos estão optando por uma postura cautelosa. De acordo com o BankTrack18, 50 dos 60 bancos analisados em todo o mundo foram classificados como retardatários em termos de financiamento sustentável.

Nos últimos anos, a regulamentação dos empréstimos sustentáveis está ocorrendo em três direções. Em primeiro lugar, estão sendo incorporadas às leis e regulamentações bancárias.

Por exemplo, uma resolução recente da Autoridade Bancária Europeia19 especifica que os bancos da União Europeia (UE) deveriam publicar, a partir do próximo ano, um “Índice de Ativos Verdes” (GAR, sigla em inglês), o que permitiria aos investidores compararem os bancos, pelos empréstimos, antecipações e títulos de dívida amigáveis com o clima em seus balanços, como uma proporção dos ativos totais.

Em segundo lugar, os clientes bancários estarão sujeitos a uma regulamentação cada vez mais rigorosa em relação às especificações da indústria. Por exemplo, o Depósito Centralizado de Valores Mobiliários (CSDR, sigla em inglês) ou as IFRS S1 e S2, recentemente publicados pelo ISSB, aproximarão os atores do mercado ao seu objetivo, que é dar o mesmo peso e importância à apresentação de relatórios de sustentabilidade que aos financeiros. Os primeiros requisitos serão aplicados a todas as grandes empresas listadas em bolsa da UE, enquanto os segundos serão adotados por todas as empresas também listadas e que agora utilizem os padrões contábeis IFRS. O CSRD exige a auditoria das informações reportadas, introduz requisitos de relatórios mais detalhados e exige que as empresas informem de acordo com as normas obrigatórias de informação de sustentabilidade da UE20.

Por último, o financiamento subsidiário ou incentivos públicos impulsionarão uma nova demanda de empréstimos sustentáveis. Um exemplo é o fundo de recuperação NextGeneration da UE, que tem como objetivo reconstruir uma Europa mais verde, mais digital e resiliente. Os bancos incapazes de lidar com essas novas regulamentações podem sofrer uma crescente pressão por parte dos clientes e investidores institucionais, no sentido de mudar ou verse obrigados a aceitar condições desfavoráveis para o financiamento.

O vínculo direto entre ESG e desempenho financeiro – e sua ligação indireta com o risco creditício – está se tornando cada vez mais evidente a partir de uma perspectiva de curto e longo prazo. De acordo com a Accenture21 , as organizações que incluem a sustentabilidade em seu DNA empresarial têm maior probabilidade de aumentar sua margem de EBITDA (sigla em inglês) e alcançar um impacto sustentável. Em média, as empresas com maior abordagem em temas de ESG alcançaram um EBITDA de 19,6%, enquanto aquelas com menor abordagem ESG alcançaram uma média de 16,2%.

Estudo de caso: Quadro de Empréstimos Sustentáveis do Governo da Baixa Califórnia, no

México

No ano de 2023, o Governo do Estado da Baixa Califórnia identificou a necessidade de mobilizar recursos para projetos e programas que contribuam para a mitigação e adaptação à mudança climática, a fim de contribuir para o cumprimento dos compromissos assumidos pelo país. Por esta razão, lançou uma ferramenta chamada “Financiamento Sustentável”, que promove o financiamento de projetos prioritários alinhados com os ODS, o Plano Nacional de Desenvolvimento do país e, adicionalmente, com as NDC do México.

Para esse fim, o Governo trabalhou no desenvolvimento de um Quadro de Empréstimos Sustentáveis que permite a priorização da carteira subjacente de projetos e a justificativa do Quadro ante investidores e autoridades nacionais.

Por meio desse instrumento financeiro, o Governo poderá financiar despesas verdes e/ou sociais elegíveis e/ou refinanciar despesas desta natureza já existentes e que contribuam para facilitar: o acesso a serviços essenciais de saúde, acesso à água e saneamento, moradia acessível, educação, desenvolvimento de capacidades voltado para populações vulneráveis, empoderamento e participação das mulheres no mercado e na sociedade, construção verde, agricultura sustentável, manejo sustentável de resíduos, investimento em energia renovável, medidas de eficiência energética e outros.

Com o objetivo de determinar a elegibilidade, realizar a avaliação e a seleção dos projetos e despesas elegíveis, foi designada a Secretaria de Fazenda do Estado, que também é responsável pela entrega dos relatórios aos financiadores.

Em 2023, o NADBank e o Governo do Estado da Baixa Califórnia acordaram um financiamento de US$ 160 milhões (MXN 3 mil milhões) para o financiamento da ampliação da capacidade da Estação de Tratamento de Águas Residuais, a melhoria da infraestrutura de saneamento e o reuso de água residual tratada de estações adjacentes. Esse investimento levará à melhoria do saneamento e acesso para 3,2 milhões de pessoas que vivem em áreas propensas à secas no Estado da Baixa Califórnia.

Veículos de financiamento

nacional

Os Veículos de Financiamento Nacional (NFV, sigla em inglês) são entendidos como fundos públicos ou público-privados, ou facilidades que têm a função e a capacidade de gestão fiduciária. Eles são alocados pelo governo nacional para receber e manter recursos financeiros sustentáveis, verdes e climáticos de fontes internacionais e nacionais. Também redistribuem esses recursos para as prioridades nacionais estabelecidas pelo governo, por meio de entidades públicas e privadas, nacionais e estatais, elegíveis para implementar e monitorar projetos verdes e de ação climática por meio de subvenções, dívida e capital, além de instrumentos de redução de riscos.

O volume de financiamento climático no âmbito internacional cresceu rapidamente nos últimos anos, entretanto, esse crescimento foi acompanhado por uma operação complexa devido à variedade de regras e à grande quantidade de fundos multilaterais existentes.

Enquanto os governos, as entidades públicas, as organizações não governamentais (ONG) e as entidades do setor privado têm dificuldade para acessar esses recursos, as organizações internacionais e as instituições financeiras globais têm capacidade para fazê-lo. Essa situação levou a um descompasso entre a arquitetura de financiamento climático multilateral e as ações de âmbito nacional e estatal dos países. Como resultado, há grandes desafios de coordenação global, pois o financiamento climático tende a fluir por meio de grandes projetos de organizações internacionais e instituições financeiras globais.

Embora haja espaço para todos, o problema é a falta de capacidade dos governos dos países em desenvolvimento, o financiamento insuficiente para pequenos projetos e a pouca participação dos atores públicos na agenda da mudança climática. Isso fica evidente quando se observa a execução da carteira do GCF. Em maio de 2022, a maior parte do financiamento desse fundo (81%) era canalizada através de Entidades de Acesso Internacional22.

As cinco principais foram o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), o Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB), o Banco Mundial (BM) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)

Juntas, estas cinco entidades representaram 46% do financiamento total desembolsado pelo GCF. Daí a importância de contar com NFV que permitam receber e administrar recursos financeiros climáticos, a fim de direcioná-los para apoiar projetos definidos pelos países.

Em uma avaliação recente dos NFV, a CQNUMC concluiu que: “Os fundos climáticos nacionais contribuem para desenvolver a capacidade para o desenvolvimento e a implementação de projetos climáticos, podendo se beneficiar de apoios financeiros e técnicos sustentáveis, previsíveis e acessíveis. Prevalecem os desafios para cumprir com os critérios e requisitos dos provedores de recursos na mobilização de recursos financeiros para repor os fundos climáticos nacionais”.

A criação de um NFV inclui a identificação das ações, programas ou projetos que exigem financiamento e a definição de como o capital será mobilizado. Isso envolve esforços focados em:

• Fortalecer a gestão fiduciária;

• Cumprir as normas de salvaguardas ambientais e sociais;

• Estabelecer ou aprimorar métodos de monitoramento e apresentação de relatórios;

• Fortalecer as capacidades; e

• Determinar como fazer tudo isso de maneira rentável.

A capacidade de gestão fiduciária de um NFV é essencial para garantir que o financiamento concedido seja administrado de forma eficaz, eficiente e transparente. É importante que o NFV esteja alinhado com altos padrões e práticas internacionais que garantam que os recursos sejam destinados às atividades acordadas, a fim de evitar repercussões para o próprio financiador.

Portanto, é fundamental que os NFV sejam entidades nacionais ou estatais estabelecidas pelos governos (muitas vezes também estabelecidas por lei) para evitar problemas de governança e de sustentabilidade. Tudo isso dota o NFV de uma missão realista e sustentável no que se refere aos impactos que deveria buscar para poder trabalhar em planos a curto e longo prazo que lhe permitam alcançar esses objetivos.

Estudo de caso: Costa Rica, FUNBAM

A Fundação Banco Ambiental (FUNBAM) é uma entidade costa-ricense que trabalha sob o esquema de VFN, de caráter privado, criada de acordo com a Lei de Fundações n.º 5.338, de caráter instrumental e iniciativa pública sem fins lucrativos. Sua criação foi autorizada pela Lei n.º 8.640, de 5 de junho de 2008, e constituída pelo Notariado do Estado da Costa Rica.

O objetivo da FUNBAM é apoiar as atividades de conservação dos ecossistemas nacionais e internacionais por meio de diferentes tipos de processos financeiros de gestão e provisionamento de recursos financeiros. Igualmente, apoia programas governamentais ou privados de conservação, entre os que destacam o pagamento de serviços ambientais que oferecidos pelas florestas, plantações e outros que possam ser estabelecidos no futuro.

Dentro de seus eixos estratégicos estão a biodiversidade, recurso hídrico, paisagem produtiva sustentável e cidades sustentáveis. Seus principais aliados são o Ministério do Meio Ambiente e Energia, o Fundo Nacional de Financiamento Florestal, o Banco Nacional e o Ministério da Agricultura e Pecuária da Costa Rica.

Por meio desse mecanismo, foram promovidas, financiadas e facilitadas iniciativas sustentáveis que permitem a conservação de ecossistemas, gerando benefícios para pequenos e médios empresários ou associações de empreendimentos que trabalham para o desenvolvimento sustentável ou apoiando ações de mitigação e adaptação à mudança climática para a conservação da natureza. A maior experiência desenvolvida pela Fundação Banco Ambiental foi a administração do Fideicomisso Fundo de Biodiversidade Sustentável (FBS), sob a assistência do Fundo Nacional de Financiamento Florestal.23

Alianças público-privadas inteligentes para o clima

As Alianças Público-Privadas (APP) inteligentes para o clima são colaborações entre os setores público e privado para contribuir com a mitigação da mudança climática e favorecer a ação climática, mediante a geração de oportunidades econômicas e a melhoria da qualidade de vida das comunidades.

Como signatários do Acordo de Paris, os países da IberoAmérica estabeleceram suas NDC para reduzir suas emissões e adotar estratégias de adaptação à mudança climática. A transição da região para uma economia resiliente à mudança climática requer investimentos significativos, portanto, as APP são fundamentais para financiar essa transição. Essas alianças têm como objetivo catalisar fundos para esse tipo de iniciativas, buscando, adicionalmente, unir esforços no sentido de aproveitar as sinergias de recursos, capacidades e conhecimentos de ambos os setores para obter um impacto maior, tornando-se assim uma ferramenta poderosa para acelerar a mitigação e a adaptação à mudança climática.

Ao criar um modelo integrado de colaboração com o setor público, é possível ampliar o escopo e a eficiência das iniciativas, garantindo que elas estejam respaldadas e alinhadas com os objetivos nacionais de sustentabilidade, ao mesmo tempo que transferem elementos para o setor privado que permitam garantir sua continuidade. Embora esse seja um dos principais benefícios das APP, elas também permitem:

• Alcançar soluções inovadoras: ao trabalhar com diversas partes interessadas, novas perspectivas e pontos de vista podem surgir durante o processo de construção de projetos e, por sua vez, permite ser mais ambiciosos com os objetivos definidos, atendendo a expertise de cada uma das partes que compõem as APP;

• Gerar incentivos para ambas as partes: o setor público poderá gerar incentivos fiscais, quadros regulatórios que apoiem os projetos e conceder garantias para os projetos, enquanto o setor privado pode conceder facilidades de pagamento ao Governo, em condições mais favoráveis em comparação com os financiamentos clássicos;

• Favorece a transparência: uma vez que são estabelecidos mecanismos de prestação de contas e delimitadas as responsabilidades, os recursos e as competências de cada uma das partes envolvidas na APP;

• Princípio da replicação: os projetos realizados por meio da criação da APP, normalmente estabelecem as bases para serem posteriormente adaptados a outros cenários;

• Promoção de P&D: quando os projetos resultantes das APP são suficientemente inovadores, normalmente promovem e impulsionam a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico, podendo assim dar origem a novas oportunidades de APP.

Estudo de caso: Experiência da

Espanha

Um exemplo de destaque de uma APP na Espanha com foco em finanças sustentáveis é o Projeto Clima. Esse projeto é uma iniciativa do Ministério da Transição Ecológica e do Desafio Demográfico (MITECO) em colaboração com o setor privado, que busca reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE), mediante o financiamento de projetos sustentáveis.

O principal objetivo do Projeto Clima é promover a redução das emissões de GEE em setores não sujeitos ao comércio de direitos de emissão, como transporte, agricultura, gestão de resíduos e setor residencial.

O projeto seleciona anualmente iniciativas que contribuam para a redução de emissões e lhes proporciona financiamento por meio da compra das reduções verificadas de emissões. Essas reduções se integram ao inventário nacional de emissões, ajudando a Espanha a cumprir seus compromissos internacionais em matéria de mudança climática.

O Projeto Clima é um exemplo claro de APP, pois envolve tanto entidades públicas quanto privadas. As empresas privadas apresentam seus projetos de redução de emissões, e o MITECO fornece o apoio financeiro necessário para sua implementação.

Desde sua criação em 2012, o Projeto Clima financiou numerosos projetos que conseguiram reduzir milhões de toneladas de CO2. Isso não apenas contribui para a luta contra a mudança climática, mas também promove a inovação e o desenvolvimento de tecnologias limpas na Espanha. Além disso, o projeto assegura a transparência e a eficácia por meio de medições como a redução de emissões de GEE, monitoramento e reporte, auditorias e verificação externa, e o impacto socioeconômico.

Exemplos de projetos financiados:

• Projetos de mobilidade sustentável: iniciativas que promovem o uso de veículos elétricos e a melhoria do transporte público;

• Agricultura sustentável: projetos que implementam práticas agrícolas que reduzem as emissões de GEE;

• Gestão de resíduos: iniciativas que melhoram a gestão de resíduos com vistas a reduzir as emissões de metano;

• Eficiência energética em edifícios: projetos que melhoram a eficiência energética em edifícios residenciais e comerciais.

O Projeto Clima é um exemplo bem-sucedido de como as APP podem ser usadas para financiar projetos sustentáveis e contribuir para os objetivos de redução de emissões de GEE. Este tipo de iniciativas demonstra o potencial da colaboração entre o setor público e o privado para impulsionar a transição para uma economia mais sustentável.

Pagamento por serviços ecossistêmicos

Os Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA) são instrumentos econômicos que representam uma alternativa para a conservação e a gestão sustentável do território. Formalmente, eles são definidos como uma transação por um serviço ecossistêmico claramente estabelecido ou um uso da terra, entre um comprador e um ofertante, de forma voluntária e condicionada ao cumprimento de ações acordadas entre ambas as partes. (Wunder, 2015).

Os PSA são promovidos e financiados por governos, por atores privados ou mistos, sejam os acordos de vontades de natureza individual ou coletiva, e até mesmo com base no grau de maturidade ou no tempo de implementação dos projetos no âmbito territorial. De acordo com a Avaliação Ecossistêmica do Milênio (2005), a tipologia dos serviços ecossistêmicos é composta pelas quatro categorias seguintes:

Fonte: United Nations Environment Programme

No caso da Colômbia, por exemplo, as regulamentações definem os PSA como “incentivos econômicos, em dinheiro ou espécie, que reconhecem os interessados dos serviços ambientais aos proprietários, possuidores ou ocupantes de boa-fé pelas ações de preservação e restauração em áreas e ecossistemas estratégicos mediante a celebração de acordos voluntários24”. Alguns serviços ecossistêmicos que podem ser gerados ou mantidos por meio dos PSA são a regulação e a qualidade hídrica, a regulação do clima por meio da redução e da captura de emissões de GEE, a conservação da biodiversidade e os serviços culturais.

Os PSA têm apoiado a gestão do uso do solo e o controle do desmatamento, trabalhando com as comunidades e mudando as atividades econômicas de tradicionais para sustentáveis. Nesse sentido, o instrumento pode ser usado para fazer uma primeira aproximação a um território, desenvolver uma análise das condições atuais e propor ações para melhorar a conservação dos ecossistemas estratégicos e a restauração das áreas degradadas por atividades tradicionais.

Além disso, têm o potencial de controlar o desmatamento ao apresentar outras opções de produção e fontes de renda adicional para os proprietários de terras próximas à fronteira agropecuária.

O incentivo é compatível com outros instrumentos ou atividades, como os negócios verdes, apoiando o empreendedorismo em áreas não convencionais. Uma vez consolidado o relacionamento com a comunidade beneficiária do PSA, abre-se a porta para novos trabalhos conjuntos, devido ao reconhecimento dos serviços ecossistêmicos e ao conhecimento das medidas de conservação e restauração.

Dessa forma, os PSA ajudam os países ibero-americanos a cumprirem com os ODS e suas metas de adaptação e mitigação dentro das NDC, ao mesmo tempo em que melhoram a qualidade de vida das comunidades por meio da geração de empregos verdes.

Estudo de caso: Colômbia - Resolução 907 da Comissão de Regulação de Água Potável

Os instrumentos econômicos para a gestão e proteção ambiental consistem em ferramentas que geram incentivos que visam cumprir objetivos ambientais25. EEste é o caso da Resolução 907 de 2019, que estabelece um instrumento econômico que busca gerar incentivos aos prestadores do serviço de água potável para favorecer os investimentos ambientais na proteção deste recurso26

Igualmente, por meio deste instrumento pretende-se internalizar as externalidades associadas à prestação do serviço de abastecimento de água e incentivar o financiamento de investimentos social e ambientalmente responsáveis que contribuam para a segurança hídrica. A arrecadação gerada é usada para financiar investimentos ambientais que contribuam para a proteção das bacias hidrográficas e dos recursos hídricos.

A Resolução CRA 907 de 2019 estabelece um mecanismo de recuperação de custos, introduzindo no quadro tarifário, tanto de grandes quanto de pequenos prestadores, o reconhecimento dos custos médios gerados pelos investimentos ambientais adicionais realizados pelos prestadores para a proteção de bacias hidrográficas e fontes de água.

Essa resolução modifica os quadros tarifários do serviço público de abastecimento de água. É assim como a tarifa reconhece, dentro da tarifa fixa do serviço de abastecimento de água, o custo médio de administração por investimentos ambientais adicionais para a proteção de bacias hidrográficas e fontes de água, e dentro da tarifa de consumo, inclui o custo médio variável por investimentos ambientais adicionais para a proteção de bacias hidrográficas e fontes de água, que é calculado com o custo médio operacional por investimentos ambientais adicionais e o custo médio de investimento por investimentos ambientais adicionais para a proteção de bacias hidrográficas e fontes de água.

Financiamento vinculado à sustentabilidade

O objetivo do financiamento vinculado à sustentabilidade é criar soluções financeiras que sejam suficientemente atrativas para aumentar a escala e o impacto desses instrumentos.

Esses tipos de soluções financeiras diferem de um financiamento clássico por terem objetivos claros de sustentabilidade no momento de sua criação, os quais, por sua vez, determinam as características financeiras e/ ou estruturais que as ferramentas de financiamento terão, conforme o alcance, ou não, dos objetivos de sustentabilidade estabelecidos.

Normalmente, o financiamento vinculado à sustentabilidade é realizado por meio de empréstimos ou da emissão de títulos, que devem ser periodicamente reportados e verificados por terceiras partes.

No caso da emissão de títulos, eles são chamados de Títulos Atrelados à Sustentabilidade (SLB, sigla em inglês), em que os emissores assumem compromissos explícitos e determinados de futuro em relação ao seu desempenho em sustentabilidade, dentro de um prazo estabelecido. Esses objetivos são medidos por meio de indicadores-chave de desempenho (KPIs, sigla em inglês) e são periodicamente avaliados em função dos objetivos de desempenho de sustentabilidade definidos no momento da emissão. No caso dos SLB, estão concebidos para serem utilizados com fins corporativos gerais, de modo que o uso específico não é determinante para serem categorizados como tal; no entanto, devem ter um processo claro e um compromisso transparente para que os investidores, agentes de colocação e supervisores possam acessar informações relacionadas ao impacto dos Títulos.

Semelhante aos SLB, os Empréstimos Atrelados à Sustentabilidade (SLL, sigla em inglês) consistem em empréstimos vinculados a objetivos ESG pré-estabelecidos e cujas condições financeiras e/ou econômicas variam de acordo com o alcance, ou não, dos objetivos ESG pré-estabelecidos. No caso dos SLL – e de forma semelhante aos SLB – o uso dos recursos não é determinante em sua categorização, ou seja, eles podem ser utilizados para fins corporativos gerais, já que seu objetivo é melhorar os resultados em matéria de sustentabilidade do prestatário.

Esse tipo de financiamento ganhou uma relevância especial nos últimos anos: países como Uruguai, Equador e Chile emitiram títulos soberanos atrelados a metas de sustentabilidade, enquanto países como Espanha e Portugal optaram por emitir títulos soberanos verdes, no valor de 5 mil milhões de euros e 3 mil milhões de euros, respectivamente, com o objetivo de financiar projetos ambientais, reforçando seu compromisso com o meio ambiente e estabelecendo as bases para assumir compromissos de sustentabilidade.

Estudo de caso: Título atrelado à sustentabilidade do Uruguai

Em outubro de 2022, o Uruguai emitiu os primeiros títulos soberanos associados a indicadores ambientais, com a finalidade de alinhar a estratégia de financiamento público com os compromissos nacionais assumidos em termos de sustentabilidade e desenvolvimento econômico de baixo carbono. Esses títulos foram considerados uma inovação no mercado de dívida pública, pois foram os primeiros desse tipo a serem emitidos no âmbito global, com condições financeiras vinculadas diretamente ao grau de cumprimento de metas/objetivos de sustentabilidade estabelecidos no quadro de referência. A emissão atingiu um montante de US$ 1,5 bilhão a uma taxa de 5,75%, com vencimento em 2034.

Diferentemente dos títulos verdes, sociais ou tradicionais, que financiam projetos específicos, o título uruguaio não financia diretamente atividades específicas, mas seu rendimento ou taxa de juros encontra-se diretamente vinculado ao cumprimento dos compromissos assumidos no âmbito nacional. Para esse caso específico, foram estabelecidos dois objetivos de sustentabilidade, que, por sua vez, estão alinhados com os compromissos assumidos pelo país no âmbito do Acordo de Paris e das NDC: (i) a redução das emissões de GEE e (ii) a conservação da área de bosque nativo em relação ao ano de 2012.

Em relação ao indicador de redução de emissões de GEE, foi definida como meta “Reduzir a intensidade das emissões de GEE por unidade de PIB”, que é medido em toneladas de CO2 equivalente geradas por cada milhão de dólares do PIB do país. No que diz respeito ao segundo indicador, foi estabelecido como meta “Manter pelo menos 3,6 milhões de hectares de bosques nativos no Uruguai, um número crítico para garantir a conservação dos ecossistemas florestais”, que é medido pelo monitoramento da superfície total de áreas florestais nativas protegidas dentro do território nacional.

Os prazos estabelecidos para o cumprimento de ambas as metas são 2025 e 2027, quando será realizada uma segunda avaliação.

Caso o Uruguai consiga atingir os dois objetivos nos prazos estabelecidos, a taxa de juros será reduzida, diminuindo assim o custo do título para o país.

Entretanto, se o Uruguai não conseguir atingir qualquer uma das metas, a taxa de juros será aumentada, o que elevará o custo do financiamento. Este mecanismo de pagamento por metas oferece um incentivo direto para que o país faça maiores esforços para alcançar os objetivos.

O exemplo do Uruguai serviu de inspiração para outros países, como o Chile e o Equador, que emitiram títulos soberanos vinculados a metas climáticas com indicadores focados na redução das emissões de GEE, no aumento das energias renováveis e na proteção e conservação da biodiversidade.

O FUTURO

DAS FINANÇAS SUSTENTÁVEIS NA IBERO-AMÉRICA

O futuro das finanças sustentáveis na Ibero-América apresenta um panorama repleto de oportunidades e desafios. A crescente conscientização sobre a urgência de abordar a mudança climática e promover um desenvolvimento mais inclusivo posiciona a região como um ator-chave com enorme potencial para se tornar uma referência global em investimentos sustentáveis, intercâmbio de experiências e geração de sinergias. Fatores como a abundância de recursos naturais, a biodiversidade única e o avanço em direção a economias mais verdes fazem com que os países ibero-americanos sejam um destino estratégico para capitais orientados para a sustentabilidade.

Alcançar esse objetivo exigirá uma ação conjunta entre governos, instituições financeiras e o setor privado para superar barreiras importantes, como a falta de quadros regulatórios homogêneos, a incorporação limitada de critérios ESG (ambientais, sociais e de governança) nas estratégias corporativas e a necessidade de fortalecer a transparência e a confiança nos mercados.

O fortalecimento de políticas públicas, o acesso ao financiamento internacional e as transformações estruturais nos modelos de produção serão fundamentais para acelerar essa transição. Nesse contexto, a América Latina e o Caribe devem avançar para uma maior harmonização regulatória na região, procurando o alinhamento com iniciativas globais como a Taxonomia da União Europeia. Isso pode ser alcançado por meio da criação de espaços de convergência com países como Espanha, Portugal e Andorra, fomentando assim o intercâmbio de conhecimento e boas práticas.

Em suma, o sucesso das finanças sustentáveis na IberoAmérica dependerá da capacidade da região para equilibrar a proteção do meio ambiente, o desenvolvimento social e o crescimento econômico, estabelecendo uma base sólida para um futuro resiliente e equitativo.

A análise revelou que a Ibero-América conta com experiências valiosas na implementação de ferramentas regulatórias e financeiras no âmbito das finanças sustentáveis. Exemplos destacados incluem a taxonomia sustentável do México, a adoção da Resolução 193 no Brasil, o roteiro de finanças verdes no Peru, a troca de dívida por ação climática no Equador, o Título Atrelado à Sustentabilidade do Uruguai, a APP climaticamente inteligente na Espanha e o Quadro de Empréstimos Sustentáveis do Governo da Baixa Califórnia no México. Essas iniciativas refletem as capacidades técnicas e os conhecimentos que os países ibero-americanos já desenvolveram, oferecendo uma oportunidade única para o intercâmbio de experiências e aprendizados.

Oportunidades Desafios

• Inovação financeira: a criação de novos instrumentos financeiros, como os títulos de resiliência e as trocas de dívida por natureza, pode atrair uma ampla gama de investidores interessados na sustentabilidade.

• Fortalecimento de capacidades: investir em capacitação técnica e no desenvolvimento de capacidades em finanças sustentáveis é crucial para implementar melhores práticas e atrair mais investimentos.

• Colaboração ibero-americana: a cooperação entre os países ibero-americanos pode facilitar o intercâmbio de conhecimentos e experiências, bem como a criação de quadros regulatórios comuns para impulsionar o mercado de finanças sustentáveis.

• Atração de investimento internacional: melhorar a transparência e estabelecer quadros regulatórios claros pode atrair um maior investimento internacional, interessado em projetos que gerem tanto retornos financeiros quanto benefícios ambientais e sociais.

• Desenvolvimento de infraestrutura verde: a necessidade de uma infraestrutura resiliente ao clima apresenta uma oportunidade significativa para financiar projetos que atenuem os efeitos da mudança climática e promovam o desenvolvimento sustentáv

• Homogeneidade regulatória: a falta de quadros regulatórios homogêneos na região dificulta a comparabilidade e a interoperabilidade dos investimentos sustentáveis.

• Integração de critérios ESG: embora haja avanços, muitas empresas ainda não integram plenamente os critérios ESG em suas operações devido à falta de capacidades técnicas e à resistência à mudança.

• Transparência e prestação de contas: a implementação de sistemas de monitoramento, reporte e verificação (MRV) é crucial para assegurar a confiança dos investidores e garantir o uso eficaz dos fundos.

• Acesso ao financiamento: as MPMEs e os projetos em estágio inicial enfrentam dificuldades para acessar o financiamento sustentável devido à percepção de alto risco e à falta de garantias.

A análise do mercado de finanças sustentáveis na IberoAmérica revela um panorama dinâmico e em evolução, com múltiplas oportunidades e desafios. A região demonstrou um compromisso crescente com a sustentabilidade, refletido no aumento da emissão de títulos temáticos, na integração de critérios ESG, no desenvolvimento de taxonomias nacionais e no fortalecimento de alianças público-privadas.

A Ibero-América conta com experiências valiosas na implementação de ferramentas regulatórias e financeiras no âmbito das finanças sustentáveis. Essas iniciativas refletem as capacidades técnicas e o conhecimento que os países da região já desenvolveram, oferecendo uma oportunidade única para o intercâmbio de experiências e aprendizados. Em suma, o futuro das finanças sustentáveis na Ibero-América é promissor, desde que continue avançando na direção correta, com uma abordagem colaborativa e estratégica.

NOTAS DE RODAPÉ

1 Global Climate Finance Gap COP29

2 Andorra não é membro da União Europeia.

3 Tipo de cambio tomado fecha 25 de noviembre 2024 – Bloomberg – EURUSD: 1.05

4 Database European Statistics – European Comission.

5 O cálculo é a proporção das NDC com investimento estabelecido em relação a todas as NDC estabelecidas pelos países.

6 Taxa de câmbio do dia 25 de novembro 2024 – Bloomberg – EURUS$: 1,05

7 La financiación climática será clave en la COP29

8 Global Climate Finance Gap COP29

9 La financiación climática será clave en la COP29

10 GGGI. Acerca do GGGI. https://gggi.org/about/

11 Secretaría de Hacienda y Crédito Público de México (2023). Taxonomía Sostenible de México. https://www.gob.mx/shcp/ documentos/taxonomia-sostenible-de-mexico?state=published

12 https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/resolucoes/resol193.html

13 COMMON FRAMEWORK OF SUSTAINABLE FINANCE TAXONOMIES FOR LATIN AMERICA AND THE CARIBBEAN. (n.d.). Available at: https://www.undp.org/sites/g/files/zskgke326/files/2023-07/common-framework-of-sustainable-financetaxonomies-lac.pdf [Accessed 14 Nov. 2024].

14 Why net zero without a ‘just transition’ is not an option | World Economic Forum (weforum.org)

15 https://www.bloomberg.com/news/articles/2022-06-17/ecuador-bonds-slump-as-protests-revive-memories-of-2020default

16 Environmental, Social, And Governance: How Sustainability-Linked Debt Has Become A New Asset Class | S&P Global Ratings (spglobal.com)

17 Worldwide Lending Industry (2020 to 2030) - Identify Growth (globenewswire.com)

18 BankTrack – Banking on Climate Chaos 2021: World’s 60 largest banks have poured USD 3.8 trillion into fossil fuels since Paris Agreement

19 EBA advises the Commission on KPIs for transparency on institutions’ environmentally sustainable activities, including a green asset ratio (europa.eu)

20 Sustainable Finance Package (europa.eu)

21 Building Sustainable Organizations | Accenture

22 Fondo Verde para el Clima (2022). Estado de la cartera del GCF: proyectos aprobados y cumplimiento de condiciones, gcfb32-inf08-rev01.pdf (greenclimate.fund)

23 Fundación Banco Ambiental | Fondo de Biodiversidad Sostenible

24 Pagos por Servicios Ambientales - Ministerio de Ambiente y Desarrollo Sostenible (minambiente.gov.co)

25 https://repositorio.cepal.org/server/api/core/bitstreams/3c220f39-febd-49ae-ad82-8bec29caa14f/content

26 https://bdigital.uexternado.edu.co/server/api/core/bitstreams/f1d2ff15-f87a-4a20-9f28-0f2d1bdedd60/content

BIBLIOGRAFIA

Climate Policy Initiative, Global Landscape of Finance Climate, Barbara Buchner et al., November 2023.

Comisión Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL). Deuda pública y restricciones para el desarrollo en América Latina y el Caribe (LC/TS.2023/20), Santiago, 2023

Comisión Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL); Necesidades de Financiamiento y objetivos climáticos en América Latina y el Caribe (LC/TS.2024/47), Carlos de Miguel et al., 2024

Comissão de Valores Mobiliários. Resolución CVM 193. https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/resolucoes/resol193.html

Fondo Verde para el Clima (2022). Estado de la cartera del GCF: proyectos aprobados y cumplimiento de condiciones. gcf-b32inf08-rev01.pdf

Global Green Growth Institute (GGGI). Acerca de GGGI. https:// gggi.org/about/

International Monetary Fund, Climate change challenges and opportunities in Latin America and the Caribbean; Ana Ivanova et al., 2024

Ministerio de Ambiente y Desarrollo Sostenible de Colombia. Pagos Por Servicios Ambientales. www.minambiente.gov.co/ negocios-verdes/pagos-por-servicios-ambientales/. Accessed 14 Nov. 2024.United Nations Environment Programme, Adaption GAP Report 2024,2024.

Organización de las Naciones Unidas (ONU). Iniciativas para la acción climática [online] Disponible en: Iniciativas para la acción https://www.un.org/es/climatechange/climate-action-coalitions.

Secretaría de Hacienda y Crédito Público de México (2023). Taxonomía Sostenible de México. https://www.gob.mx/shcp/ documentos/taxonomia-sostenible-de-mexico?state=published

United Nations Environment Programme Finance Initiative (UNEP FI). Common Framework of Sustainable Finance Taxonomies for Latin America and the Caribbean. (n.d.). Available at: https://www.undp.org/sites/g/files/zskgke326/files/2023-07/ common-framework-of-sustainable-finance-taxonomies-lac.pdf [Accessed 14 Nov. 2024].

Watson, C., Schalatek, L. and Evéquoz, A. (n.d.). Informe regional sobre financiamiento para el clima: América Latina. [online] Available at: https://climatefundsupdate.org/wpcontent/uploads/2022/03/CFF6-America-Latina_ESP-2021.pdf [Accessed 14 Nov. 2024].

Winters, Bill. Why Net Zero without a Just Transition” Is Not an Option. World Economic Forum, 18 May 2022, www.weforum. org/stories/2022/05/why-net-zero-without-a-just-transition-isnot-an-option/. Accessed 14 Nov. 2024.

Ministerio para la Transición Ecológica y el Reto Demográfico. Plan Nacional Integrado de Energía y Clima 2021- 2030 (PNIEC). Gobierno de España, 2020

República Portuguesa. Declaração Ambiental, Avaliação Ambiental Estratégica do Programa Nacional de Investimentos 2030, Gobierno Portugal, 2023.

International Partnership on Mitigation and MVR, Chilean MRV framework for mitigation action, 2017.

World Bank Group, Climate Change Budget Tagging: A Review of International Experience, february 2021.

Universidad Externado de Bogotá, Análisis de la Resolución CRA 907 de 2019 como incentivo para la protección del recurso hídrico desde la prestación del servicio público de acueducto, María Fernanda González Martínez, 2021

Global Center on Adaptation, Climate- Resilient Infrastructure Officer Handbook: Knowledge Module on Public-Private Partnerships for Climate-Resilient Infrastructure

Accenture, Shaping the Sustainable Organization. https:// www.accenture.com/content/dam/accenture/final/a-commigration/thought-leadership-assets/accenture-shaping-thesustainable-organization-report.pdf

ANEXOS

Sustainable Debt Global State of the Market 2023

https://www.climatebonds.net/resources/reports/globalstate-market-report-2023

Marco de Referencia Bonos Verdes, Sociales y Sostenibles de la República Dominicana

https://www.creditopublico.gob.do/emisiones/asg

SPO- Marco de Bonos Verdes, Sociales y Sostenibles de República Dominicana

https://www.creditopublico.gob.do/Content/emisiones_de_ titulos/asg/opiniondesegundaparte/01Opini%C3%B3n%20 de%20Segunda%20Parte%20Bonos%20Verdes,%20 Sociales%20y%20Sostenibles%20de%20la%20 Rep%C3%BAblica%20Dominicana.pdf

Marco de Bonos / Financiamiento Sostenibles

https://bajacalifornia.gob.mx/Documentos/ transparenciafiscal/convenios/2023/Anexo%20G%20 Marco%20de%20bonos%20Financiamiento%20Sostenibles. pdf

Sustainable Bond Report https://files.unsdsn.org/sustainable-developmentreport-2023.pdf

Taxonomía Sostenible de México

https://www.gob.mx/shcp/documentos/taxonomiasostenible-de-mexico?state=published

Common Framework of Sustainable Finance Taxonomies for Latin America and the Caribbean

https://www.undp.org/sites/g/files/zskgke326/files/2023-07/ common-framework-of-sustainable-finance-taxonomies-lac. pdf

Informe regional sobre financiamiento para el clima: América Latina

https://us.boell.org/sites/default/files/2022-03/CFF6%20 -%20America%20Latina_ESP%202021.pdf

Shaping the Sustainable Organization

https://www.accenture.com/content/dam/accenture/final/ a-com-migration/thought-leadership-assets/accentureshaping-the-sustainable-organization-report.pdf

EU Green Taxonomy

https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/ TXT/?uri=CELEX%3A32020R0852

GGGI Strategy 2030

https://gggi.org/wp-content/uploads/2019/12/Strategy2030-EXTERNAL-191212_FINAL.pdf

Good Practice Analysis 3.0 on LEDS, INDCs, NAMAs and MRV Chilean MRV framework for mitigation actions

MRV DE FINANCIAMIENTO CLIMÁTICO

https://alianzapacifico.net/wp-content/uploads/MRV_de_ Financiamiento_Climatico_en_Chile.pdf

Debt for climate swaps: exploring avenues and opportunities https://www.greenclimate.fund/document/debt-climateswaps-exploring-avenues-and-opportunities

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.