Revista PGE/RS n. 63

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218 Com efeito, o que o serviço público visa, o que tem por objeto, é algo material: fornecer água, iluminação elétrica, comunicação telefônica, telegráfica, recolhimento de lixo, tratamento médico, ministério de aulas, etc. A realização de obra pública, igualmente, é a oferta de uma utilidade material: a rua, a estrada, a ponte, o viaduto, etc. O que a ‘polícia administrativa’ visa, diversamente, é a expedição de provimentos jurídicos: atos que habilitam os administrados à prática de determinada atividade (licença de construir, licença para dirigir automóveis, autorização de porte de arma, etc.) ou que, inversamente a proíbe (denegando os atos referidos) ou a impede (expedindo ordens, como ocorre quando o guarda de trânsito o desvia, obstando a circulação por vias congestionadas por algum acidente) ou, ainda, sanciona (expedindo multas, determinando o embargo de atividades) se desatendidas as normas pertinentes, quando constatada sua violação, o que ocorre como resultado de fiscalização do comportamento dos administrados”

Em suma, eles se distinguem, resumidamente, segundo Francis-Paul Bénoit, pelo seguinte: “L’essentiel ce sont les caractéristiques propres de chaque mission: le procédé de la police, c’est la prohibition; le procédé du service public, c’est, comme on le verra, la prestation positive” (in Le Droit Administratif Français; Paris, Dalloz, 1968; p. 753). Frente aos ensinamentos doutrinários trazidos e à legislação transcrita, não há dúvida que a remoção, o depósito e a guarda de veículos apreendidos decorrentemente de infrações de trânsito é um exercício do poder de polícia estatal. Examina-se a situação hipotética: há o exercício de um direito individual, ou seja, a fruição, pelo proprietário de um veículo automotor, deste veículo; tal exercício do direito de propriedade acaba cedendo ao interesse público, e o veículo é removido, depositado e guardado, pois, por razões legais, ele não pode permanecer trafegando. É em função de determinação legal que deve a autoridade de trânsito promover os atos referidos de remoção, depósito e guarda, até que se solucione a razão ensejadora da apreensão. Com efeito, não se está fornecendo a um “usuário” uma prestação material, no sentido de oferecimento – não é uma prestação nem um oferecimento porque não há opção pelo administrado: ele deve se submeter, em virtude de lei, à apreensão do veículo - de uma utilidade – se alguma utilidade há, ao proprietário do veículo apreendido é que não é – ou comodidade material – retirar o veículo de circulação não causará a menor comodidade ao seu proprietário, ao contrário. Não se trata, portanto, de um serviço público. Ainda que se possa admitir que benefícios são usufruídos pela coletividade na medida em que um veículo que não deveria estar trafegando é retirado de circulação, isto não significa dizer que do ponto de vista do proprietário haja benefícios; pelo contrário, há restrições. E, além disso, não se olvide que sempre, em qualquer caso do exercício do poder de polícia, haverá benefícios para a coletividade (exceto ao administrado sujeito ao poder de polícia) justamente porque é da natureza do poder RPGE, Porto Alegre, v. 30, n. 63, p. 203-228, jan./jun. 2006


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