empty stories

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O vazio é um lugar cheio de nada. Porém, naquele jardim as árvores continuarão a crescer, as folhas a cair, o


os bancos cheios de histórias para contar e o coração dos fantasmas continuará a bater forte como o vento.




Vende-se: eufemismo com uma área excelente, inserida em condomínio de luxo dentro do género, boa vista de rio e pelas costas,


, marquise de última geração, espaços verdes e de outras cores à escolha. É pagar ou largar. Você decide. O diabo não entra aqui.




Eu sabia que devia ter dado ouvidos à minha mãe. Quem é que me manda cortar o cabelo e faze


er mudanças quando o calor está zangado comigo? “O problema não és tu, é o tempo”, dizia ela.




O John sempre teve um estilo de jogo muito agressivo. Nunca mais o convides para jogar connosco. O


t茅nis s贸 devia ser jogado por homens bonitos e bem comportados. Como eu, por exemplo. Game over.




É nas trincheiras da esperança que alimentamos os sonhos de uma vida. Ali, bem escondidos


entre o conforto da mentira e das promessas v達s, somos reis e trazemos o mundo nas m達os.




NinguĂŠm diz que foi ali que vivemos o grande amor das nossas vidas. Afinal, quem ĂŠ que precisa de amor e uma ca


abana, quando tem uns metros quadrados de amor concreto, longe dos olhares indiscretos dos pobres de espĂ­rito?




Foi a primeira vez que alinhei num triângulo amoroso: eu, ele e o vazio imenso do oceano. Acabou tudo no dia 21 de Setembro de 1984. “Acredita em mim. Tenho tanto am


mor para dar”, dizia-me ele. Depois disso, o corpo dele ainda estava bem quente, claro. Tarde demais. A água já estava gelada, não ia dar certo. Odeio amores de Verão.




Já não há paisagens feias. São apenas tatuagens


s mal paridas e asneiras na boca de uma mulher.




Se as portas da percepção estivessem limpas, o vizinho do 206 talvez ainda estivesse vivo. A mescalina era mais barata e o aprumadinho


o da porta ao lado diria todos os dias “bom dia, senhor”, com um leve aceno de cabeça. A droga está cara: Jim Morrison já não mora aqui.




Bati à porta e tu não respondeste. Esperei por ti e tu nunca apareceste. O desprezo é uma doença que s


se cura com o afecto do mais pr贸ximo, mas ningu茅m me disse que o pecado mora ao lado. Perdoa-me.




Pica o ponto na fábrica da utopia, não vá o diabo tecê-las e ainda perdes o teu lugar. A


As portas estão fechadas - já não há alegria no trabalho. Goza o subsídio. Não há crise.




“Vem por aqui”, disse o Zé a cantarolar com ar guloso e os olhos doces. “É velho demais para mim”, pensei eu. De repente, a noite cai e o cenário pod


de ficar negro. Não arrisco. A libido toma conta do meu corpo e ainda perco o comboio. Não arrisco. A solidão é demasiado pequena para nós os dois.




Nunca voltes a um lugar onde jรก foste feliz. Os parapeitos das janelas choram pelos teus cotovelos, os corredores imitam o barulho dos teus passos, a cozinha c


cheira aos bolinhos de côco da tua avó e nas paredes do teu quarto está escrito “OKUPA”. Já era. E nunca mais vai voltar a sê-lo. Ninguém merece morrer assim.




Todas as paisagens deviam ter uma linha do horizonte. Aquela linha que separa o terreno do etĂŠreo. Porque, afinal, dĂĄ sempre jeito saber ond


de está o céu e o inferno. De qualquer forma, desenganem-se aqueles que acreditam que a redenção está próxima - o aquecimento é global.




Para onde caminham esses passos largos que se escondem na sombra das mem贸rias do presente? Nunca subestimes o poder do ocu


ulto e do mistério. A verdade está na terra. Segue o teu caminho e acredita que o perdão é apenas um lugar que todos fingem conhecer.




Proibida a entrada a pessoas estranhas ao serviรงo. Que lindo serviรงo. Talhaste com o teu machado as tรกb


buas do meu caixão e elas vieram parar aqui. É este o meu fado: sem chão e sem céu. Enterrem-me viva.




O grande desafio daqueles que habitam a cultura pós-moderna é manter a boca fechada, por supuesto. Tudo é cultura e tudo é


é obra de arte. Sí, claro. Cada um tem o que merece: as nossas ruas deram-nos um museu efémero. Demasiado efémero, olé!




Uma janela que se fecha ao Mundo ĂŠ como um adeus perdido no olhar vazio de quem am


ma. Sem gestos ou palavras proibidas e o coração preso por um fio. Nunca te esquecerei.



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