Ho Chi Minh - Vida e Obra do Lider da Libertaçao Nacional do Vietna

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TIO HO! Tio Ho! É assim que todos os vietnamitas se referem ao presidente Ho Chi Minh. E é como expressam o amor e a afeição que têm pelo velho Pai da Nação, homem de cultura da humanidade, que sacrificou toda a sua vida e liderou com sucesso a luta pela independência nacional e pela reunificação do Vietnã, contribuindo para o movimento de libertação nacional no mundo inteiro. Os artigos apresentados no livro “Ho Chi Minh – Vida e Obra do líder da libertação nacional do Vietnã” e muitos outros de seus textos foram pesquisados e resumidos pelo Partido Comunista do Vietnã em “Pensamento de Ho Chi Minh” e consagrou em sua Plataforma e em seus Estatutos “O Partido toma o Marxismo-Leninismo e o Pensamento de Ho Chi Minh como base do pensamento, uma diretriz para a ação”. Os pesquisadores concordam que o pensamento de Ho Chi Minh constitui uma ciência. O conteúdo de suas reflexões abrange um sistema amplo e profundo de perspectivas sobre as questões fundamentais da revolução vietnamita e da revolução de libertação nacional. Na base da visão do mundo e da metodologia dialética do Marxismo-Leninismo, e com conhecimentos profundos, uma alta capacidade intelectual, graças à análise e ao resumo dos movimentos patrióticos vietnamitas do final do século XIX ao início do século XX – com o raciocínio independente, autônomo e criativo em experiências práticas internacionais –, Ho Chi Minh construiu seu sistema ideológico que inclui pensamentos sobre questões étnicas, relações de nação-classe; a libertação nacional; o socialismo e o período de transição para o socialismo; a grande unidade nacional; a combinação da força nacional com as forças da humanidade; o Partido Comunista do Vietnã; a construção do Estado do povo, pelo povo, para o povo; a moralidade; o humanismo e a cultura. A simplicidade e a proximidade de Ho Chi Minh com seus compatriotas também são refletidas em cada página escrita, com um estilo muito simples, usando palavras compreensíveis para leitores de todas as camadas sociais. E foi isso que transformou o presidente Ho Chi Minh em um líder próximo do povo vietnamita, a quem todos chamam de Tio Ho. Por fim, expresso meus sinceros agradecimentos ao jornalista Pedro de Oliveira e à editora Anita Garibaldi pela cooperação na publicação deste livro.

Do Ba Khoa Embaixador do Vietnã no Brasil Dezembro 2019


VIDA E OBRA DO LÍDER DA LIBERTAÇÃO NACIONAL DO VIETNÃ

São Paulo 2020


para Augusto Cezar Buonicore (in memoriam)


Organizador PEDRO DE OLIVEIRA

HO CHI MINH VIDA E OBRA DO LÍDER DA LIBERTAÇÃO NACIONAL DO VIETNÃ

1a Edição

São Paulo 2020


HO CHI MINH

VIDA E OBRA DO LIDER DA LIBERTAÇÃO NACIONAL DO VIETNÃ

Organização e edição: Pedro de Oliveira Revisão: Maria Lucília Ruy Capa: Cláudio Gonzalez , com ilustração de poster histórico. Projeto gráfico e diagramação: Laércio D’Angelo Impressão: PlenaPrint Tiragem: 500 exemplares

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD H678

Ho Chi Minh: vida e obra do líder da libertação nacional do Vietnã / organizado por Pedro de Oliveira. - São Paulo, SP : Anita Garibaldi, 2020. 280 p. : il. ; 16cm x 23cm. ISBN: 978-65-990905-9-2 1. Política. 2. Ho Chi Minh. 3. Vietnã. 4. Marxismo-leninismo. 5. Imperialismo. 6. Unificação do Vietnã. 7. Socialismo. I. Oliveira, Pedro de. II. Título. CDD 320.532 CDU 321.74

2020-611 Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410

Índice para catálogo sistemático: 1. Marxismo-leninismo 320.532 2. Marxismo-leninismo 321.74

• CONSELHO EDITORAL • Ana Maria Prestes • Augusto Cesar Buonicore • Cláudio Gonzalez • Fábio Palácio de Azevedo • Fernando Garcia de Faria • João Quartim de Moraes • Júlio Vellozo • Manuela D’Ávila • Mariana de Rossi Venturini • Nereide Saviani • Nilson Araújo • Osvaldo Bertolino


SUMÁRIO

Apresentação Prefácio Renato Rabelo

Imagens Ho Chi Minh, líder da Libertação Nacional

Intodução Pedro de Oliveira

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Cronologia

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Textos de Ho Chi Minh

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• Reivindicações do Povo Anamita

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• Discurso no Congresso de Tours

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• Indochina

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• Manifesto da “União Intercolonial” – Associação dos povos originários de todas as colônias

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• Algumas considerações sobre a Questão Colonial

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• Os Civilizadores

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• Mulheres anamitas e a dominação francesa

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• Civilização assassina!

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• O movimento dos trabalhadores do Extremo Oriente

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• Lênin e os povos colonizados

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• Intervenção sobre a Questão Nacional no 5º Congresso Mundial da Internacional Comunista

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• Linchamentos: aspecto pouco conhecido da sociedade estadunidense

84

• Lênin e os povos coloniais

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• Lênin e o Oriente

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SUMÁRIO • Apelo por ocasião da fundação do Partido Comunista da Indochina • A linha do Partido durante o período da Frente Democrática • Carta ao Partido Comunista da Indochina • Apelo à insurreição geral

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• Declaração da Independência da República Democrática do Vietnã

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• Discurso no início da guerra de resistência no sul do Vietnã

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• Apelo à luta contra a fome

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• Contra o Analfabetismo

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• Ao povo vietnamita, ao povo francês e aos povos aliados

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• O Aniversário da fundação do Exército de Libertação do Vietnã

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• Doze recomendações

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• Apelo à Emulação Patriótica

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• Resposta sobre a intervenção ianque na Indochina

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• Recomendações ao I Congresso Nacional de Educação dos Quadros

121

• Relatório Político entregue ao II Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores do Vietnã

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• Ao Congresso para a fusão das Ligas Viet Minh e Lien Viet

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• Os imperialistas jamais escravizarão o povo vietnamita!

154

• Economizar e lutar contra a corrupção, o desperdício e a burocracia

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• Relatório à VI Conferência do Comitê Central do Partido dos Trabalhadores do Vietnã

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• Discurso de encerramento do Congresso da Frente Única Nacional

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• O Leninismo e a libertação dos povos oprimidos

186

• Orientações dadas à Conferência sobre educação de massas

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• Consolidação e desenvolvimento da unidade ideológica entre os partidos marxistas-leninistas • Sobre a moral revolucionária

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• Relatório sobre o projeto de revisão da Constituição

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• Trinta anos de luta do Partido

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• Discurso inaugural do III Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores do Vietnã

242

• O Caminho que me levou ao Leninismo

249

• A Revolução Chinesa e a Revolução Vietnamita

251

• Alocução por ocasião do XX Aniversário da fundação do Exército Popular 254 • Apelo à Nação

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• A grande Revolução de Outubro abriu a via para a libertação dos povos

260

• Testamento

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Entrevista Sr. Do Ba Khoa – Embaixador da República Socialista do Vietnã Um olhar retrospectivo, e também prospectivo, sobre as últimas três décadas 273

Poema Ao fim de quatro meses - Escrito por HO CHI MINH na prisão

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APRESENTAÇÃO

A

Embaixada da República Socialista do Vietnã no Brasil e a Editora Anita Garibaldi oferecem ao público brasileiro este livro sobre a vida e obra do revolucionário internacionalista Ho Chi Minh, que se insere na tradição de relatos de grandes experiências históricas de luta pela libertação nacional dos povos oprimidos da Ásia, África e América Latina. Em maio deste ano, comemora-se os 130 anos do nascimento deste líder que organizou e levou à vitória o povo vietnamita diante de 3 gigantes do sistema de exploração colonial e imperialista, que foram a França, o Japão e os Estados Unidos. Não seria possível trazer à luz esta obra sem o apoio decidido da Embaixada do Vietnã – juntamente com a diretoria da Associação de Amizade Brasil–Vietnã, a Abraviet, que procuram cada uma com suas particularidades específicas, desenvolver as relações entre os dois países, nos planos diplomáticos, comerciais, culturais e militares. Neste sentido, destacamos a breve mas ao mesmo tempo instigante reflexão publicada na orelha deste livro. Intitulada Tio Ho! e assinada pelo então embaixador em exercício no Brasil, o senhor Do Ba Khoa. Nela, o diplomata vietnamita destaca que o 9


Ho Chi Minh

conteúdo dos pensamentos de Ho Chi Minh abrange um sistema amplo e profundo de perspectivas sobre as questões fundamentais da revolução vietnamita e da revolução de libertação nacional. No final deste volume, publicamos uma entrevista concedida pelo embaixador, muito informativa sobre as relações entre o Vietnã e o Brasil na atualidade. No prefácio, o presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, traça um perfil político, ideológico e militar de Ho Chi Minh, caracterizando em grandes linhas a contribuição inestimável do líder vietnamita para a estratégia e tática de luta de resistência ao colonialismo e ao imperialismo. Em seguida o jornalista Pedro de Oliveira delineia a trajetória seguida pelo dirigente vietnamita desde sua formação básica, passando pelas viagens realizadas por ele pelo mundo, onde procurou compreender e estudar as formas de dominação e exploração dos povos coloniais, e depois a luta titânica empreendida por Ho para conscientizar a maioria das lideranças do movimento comunista internacional quanto à relevância da luta anticolonialista para o próprio desenvolvimento do movimento socialista nos países centrais, e seu trabalho prático de organização e direção da luta pela libertação nacional e a construção de uma sociedade moderna e socialista no Vietnã. Por fim, a obra dedica seu maior espaço às contribuições essenciais escritas pelo próprio Ho Chi Minh, ao longo de sua vida. Destacamos nesta relação de artigos, conclamações e intervenções em reuniões importantes, vários textos que ajudam a compreender o caminho seguido pelo autor na construção de seu pensamento político, social e ideológico. As contribuições no trabalho executivo deste livro foram essenciais para que pudesse ser editado, como o trabalho de edição gráfica, a cargo de Claudio Gonzales e Laércio D’Angelo, as revisões e adaptações de Lucília Ruy, feitas a partir de publicações das obras de Ho Chi Minh na – Marxists Internet Archive, Seção em Português e em inglês. A capa foi produzida por Cláudio Gonzales. Eventuais observações críticas podem ser dirigidas ao e-mail polive65@ gmail.com e serão respondidas com a devida presteza. Os Editores

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PREFÁCIO

Ho Chi Minh, revolucionário exemplar do século XX Renato Rabelo

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m 19 de maio de 2020, o povo vietnamita e os revolucionários de todo o mundo celebram os 130 anos do nascimento de Ho Chi Minh (“aquele que ilumina”), nascido como Nguyen Sinh Cung em 1890, no vilarejo de Kim Lien, região central do Vietnã. Tio Ho – como é carinhosamente conhecido no Vietnã – deu curso à extraordinária trajetória histórica de seu povo, que jamais se submeteu à dominação estrangeira e soube enfrentar sucessivamente as invasões no século XIX de mongóis e de dinastias chinesas e, na era moderna – sob a liderança de Ho Chi Minh –, lutou pela independência nacional, enfrentando três imperialismos: o francês, o japonês e o norte-americano. Seu legado permanece atual e, sob sua contribuição, a República Socialista do Vietnã mira, em meados do presente século, expressar as gloriosas jornadas de luta empreendidas por seu povo sob a égide de um grande Estado socialista moderno, industrial e democrático. Ho Chi Minh foi – sem margem para dúvidas – um dos mais sofisticados revolucionários surgidos no século XX. Se para Maquiavel a política ganha status de ciência, em Lênin a tática – movimento imediato da luta dos trabalhadores – foi alçada ao grau de ciência. Em Ho Chi Minh, essa ciência da tática ganha contornos práticos que merecem destaque em fun13


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ção da complexidade e do nível de barbárie impostos pelo capitalismo ao socialismo, sobretudo na Ásia. Ho Chi Minh é causa e consequência do que Lênin chamou em 1913 de “O Despertar da Ásia”, onde ele desenvolve sua tese sobre o imperialismo, apontando o seu continente como o local em que o imperialismo toma contornos mais trágicos e sanguinários. Nesse contexto de luta de classes acirrada na Ásia é que Ho Chi Minh e seu legado devem ser localizados. Ho Chi Minh foi um homem que acordou para a realidade cruel de seu país em contato com seu povo e o mundo. Desde 1911 viajando como cozinheiro de um cargueiro francês – tendo passado inclusive muitos dias no litoral brasileiro, no bairro de Santa Tereza, no Rio de Janeiro –, Ho Chi Minh toma consciência da junção entre racismo e imperialismo. Viveu até 1915 em Londres e em 1917 partiu para a França, exercendo o ofício de jardineiro, onde no final deste mesmo ano contribui para a fundação do Partido Comunista Francês. Em meio a debates e crises ideológicas da esquerda francesa sobre o papel do país na Ásia e na África, Ho Chi Minh corajosamente expõe o caráter reacionário da ocupação francesa da Península da Indochina. Cônscio do papel de seu país na luta anti-imperialista internacional, em 1923 parte para a URSS onde se forma em táticas militares e se torna um militante do Comintern. Participação de Ho Chi Minh na Internacional

Em sua trajetória revolucionária, Ho Chi Minh ou Nguyen Ai Quoc (um de seus 174 codinomes clandestinos) participou da 22ª sessão do V Congresso da Internacional Comunista, em 1º de julho de 1924, onde tomou a palavra depois da intervenção de Manuilski – então dirigente da Internacional e do Comitê Central do PC da União Soviética –, que havia criticado a atividade insuficiente do PC da França na propaganda nas Colônias e mesmo em Paris em favor da independência colonial: “– Contento-me em complementar as críticas do camarada Manuilski. Os nove países colonizadores, quer dizer, Grã-Bretanha, França, Estados Unidos, Espanha, Itália, Japão, Bélgica, Portugal e Holanda, possuem juntos, uma população de 320 milhões e 657 mil habitantes e uma superfície de 11 milhões e 470 mil km2. Estes países exploram um domínio colonial cuja extensão supera os 55 milhões e 500 mil km2, com uma população de 560 milhões de almas. Os países colonizados são, pois, cinco vezes maiores 14


Prefácio

que os países colonizadores, e a população destes últimos é 3/5 inferior à dos primeiros”. “Portanto, é absolutamente necessário que nossos partidos de Grã-Bretanha e França tenham uma política mais ativa e enérgica para as Colônias; senão a consigna “ação de massas” continuará sendo estéril. Melhor dizendo, até hoje têm sido inoperantes. A imprensa do Partido não destaca este grave problema no espaço e importância que merece”. A fundação do PC da Indochina

Após essa participação na Internacional, na União Soviética, Ho Chi Minh foi enviado para Cantão, na China, onde organizou um movimento revolucionário entre os exilados vietnamitas. Foi forçado, na ocasião, a deixar o país quando as autoridades locais passaram a reprimir as atividades comunistas na região. Mas Ho voltou à China onde fundou com outros revolucionários o Partido Comunista da Indochina em 1930. Permaneceu em Hong Kong como representante da Internacional. Voltou ao Vietnã e passou a organizar a resistência, do ponto de vista político e militar. Depois de conquistada a liberdade, Ho Chi Minh ainda cumpriu tarefas como conselheiro militar das forças armadas da China e, com a invasão do Vietnã pelas tropas japonesas em 1941, organizou o movimento pela independência nacional, conhecido como Viet Minh, para lutar contra os japoneses. Quando o Japão se rendeu e perdeu a guerra em 1945, o Viet Minh assumiu o poder e proclamou a República Democrática do Vietnã, em Hanói. Ho Chi Minh tornou-se o presidente do país. A França, entretanto, não concedeu independência ao Vietnã e por longos oito anos ainda o Viet Minh lutou contra as tropas francesas a partir das montanhas e dos campos de cultura do arroz. Finalmente, na famosa batalha de Dien Bien Phu, em 1954, os vietnamitas, sob a direção do general Vo Nguyen Giap, expulsaram as tropas francesas do país, dando fim a uma ocupação colonial que se estendeu por 96 anos. Na Conferência de Paz de Genebra, no entanto, o Vietnã foi dividido em dois. O Norte, sob comando do Viet Minh e de Ho Chi Minh, passou a construir o socialismo, enquanto o Sul, ligado aos interesses geopolíticos dos Estados Unidos, tinha capital em Saigon. A partir de 1960, a guerra de guerrilhas estalou no Sul contra o regime títere. Ho Chi Minh a esta altura apresentava uma saúde muito precária 15


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e faleceu em 3 de setembro de 1969, passando suas tarefas para novos dirigentes como Phan Van Dong e Vo Nguyen Giap. Em sua honra, o Partido Comunista do Vietnã nomeou a antiga cidade de Saigon como Ho Chi Minh. Ho, o fundador do comunismo no Vietnã, foi a verdadeira alma da revolução. Suas qualidades pessoais, seu exemplo de simplicidade, integridade e determinação revolucionária influenciam ainda hoje as gerações do movimento progressista e avançado do mundo. O pensamento militar de Ho Chi Minh

Pela própria natureza de suas tarefas históricas, Ho Chi Minh teve de se especializar nas artes militares – e desenvolver esta capacidade a partir das experiências dos povos e da doutrina marxista-leninista, tendo em vista a aplicação concreta nas condições do Vietnã. Mais especificamente Ho Chi Minh precisou enfrentar a questão do domínio colonial, das lutas contra o imperialismo. Partiu em sua elaboração também da herança tradicional de luta do povo vietnamita e indochinês contra todo tipo de invasão estrangeira. A percepção fundamental de seu pensamento militar foi a de conceber a luta contra o colonialismo e o neocolonialismo no contexto mundial de luta dos povos por sua libertação. A luta no Vietnã contra a invasão japonesa, os 98 anos de domínio colonial francês e sua substituição pela invasão imperialista norte-americana sofreram a influência internacional da luta dos povos contra seus respectivos dominadores, como também a resistência na Península indochinesa exerceu impacto importante no mundo inteiro. A vitória vietnamita na batalha de Dien Bien Phu, por exemplo, teve uma projeção extraordinária na luta contra o colonialismo. O período de 1954 ao final dos anos 60 do século passado foi palco para mais de 40 nações que se tornaram independentes. A ofensiva contra o colonialismo libertou mais de um bilhão de pessoas em mais de 100 países. Ante a tomada de consciência dos povos oprimidos e as derrotas e o fracasso do velho colonialismo, os imperialistas, encabeçados pelo imperialismo estadunidense, viram-se obrigados a recorrer a um colonialismo disfarçado: o neocolonialismo. O neocolonialismo se constitui assim numa política imperialista dirigida a salvar o colonialismo de sua liquidação total e impedir os países de alcançarem sua independência verdadeira, a frear o movimento de libertação nacional e as tendências rumo ao socialismo. 16


Prefácio

Nessa mesma esteira, já citada acima, de compreensão dos conceitos de imperialismo e neocolonialismo, outra grande ideia foi desenvolvida por Ho Chi Minh: a revolução pela libertação nacional deve ser travada pari passu com a luta pela libertação social. Nesta questão Ho Chi Minh procurou destacar ser preciso uma aplicação criativa das teorias revolucionárias em cada país – de acordo com suas particularidades históricas e culturais. Seguindo esta orientação foi possível explorar as contradições estratégicas entre as grandes potências, inclusive entre as tendências internas reacionárias dominantes nos próprios países imperialistas agressores. Assim foi possível descortinar a possibilidade de vitória de um pequeno país dominado pelo colonialismo sobre um império colonial poderoso, mais forte e melhor equipado do ponto de vista militar. Ho Chi Minh concebeu a resistência como uma guerra insurrecional – uma guerra de todo o povo oprimido. A luta de resistência deveria levar em consideração as posições de força, as oportunidades, as condições do terreno e de clima e a união do povo. Este último fator foi fundamental em função do patriotismo, da tradição de luta contra os agressores estrangeiros, a consciência política e organizativa que se transformou numa verdadeira muralha de aço contra os inimigos da pátria. De uma forma mais abrangente, a luta se desenvolveu em várias frentes ao mesmo tempo: na esfera militar propriamente dita, no plano político, econômico, cultural e diplomático. Por fim, o pensamento militar de Ho Chi Minh se baseou no conceito segundo o qual a construção de um exército revolucionário antes de tudo é uma tarefa política. Ho Chi Minh sempre destacou a necessidade de o Exército estar sob estrito comando do Partido em todos os sentidos. O fator decisivo neste sentido é construir e consolidar o sistema de organização partidária desde as células de base até o Comitê Central, com quadros políticos e instâncias de direção sendo o Exército vinculado diretamente ao trabalho político. Os quadros políticos e militares devem estar unidos por laços de companheirismo e solidariedade. Ho Chi Minh concebia o povo como a base e o verdadeiro pai do Exército. Por isso, o Exército deveria lutar e ajudar o povo em suas tarefas. E vice-versa. O povo é chave na sustentação popular das atividades militares, com o apoio decisivo das organizações de massa. Disse Ho Chi Minh: “Todos vocês, do Comitê Central até as organizações de base, devem preservar a unidade partidária como se fosse a menina de seus olhos”, e que a realidade histórica de décadas de atividade do Parti-

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Ho Chi Minh

do Comunista do Vietnã mostrou que sempre que a organização partidária primou pela solidariedade interna, mesmo quando havia dificuldades de ação de suas lideranças entre as massas, foi possível superar todos os problemas. Ao contrário, se não houvesse solidariedade real no Partido, ele não teria as condições de liderar o movimento de massas, tornando-se fraco, com seu prestígio em queda, e perderia a fé do povo em sua capacidade política. Ao lado desta preocupação com a construção partidária, Ho Chi Minh procurou desenvolver a solidariedade com os países vizinhos, com as nações socialistas e com os países da comunidade internacional, inclusive com os movimentos progressistas e democráticos dos próprios países imperialistas. Esta sempre foi uma questão vital do pensamento político e militar do líder vietnamita. Na atualidade mundial – na busca pela paz e na luta contra as guerras de ocupação neocolonial e imperialista, as bandeiras da independência nacional, pela democracia e o progresso social, nas tarefas do desenvolvimento econômico –, é fundamental este espírito de cooperação internacional entre os povos em desenvolvimento, adotado pelos companheiros vietnamitas. O legado de Ho Chi Minh

Ho Chi Minh foi um revolucionário exemplar. Foi um homem de gênio suficiente para colocar em xeque não somente o poder imperialista sobre seu país, mas também influenciou o movimento progressista e avançado no mundo. Capaz de perceber a diferença entre uma superestrutura putrefata e uma sociedade pulsante, Ho Chi Minh teve o mérito de colocar o povo norte-americano contra uma guerra cruel, injusta e sem fundamentação racional. Esse seu exemplo guarda grande significado. Uma ditadura militar internacional foi montada nos Estados Unidos como consequência de ataques terroristas contra não somente o Estado imperialista, mas também contra os próprios habitantes do império. Eis uma diferença de Ho Chi Minh: trabalhar a luta política partindo de uma concepção científica da luta em si. Por outro lado, fica uma questão: o que é o Vietnã hoje? Apesar de mais de um quarto de seu território estar inutilizado para a prática da agricultura – resultado de ataques selvagens por aqueles que hoje defendem os “direitos humanos” –, o Vietnã em termos absolutos é o país do mundo com 18


Prefácio

maior média de crescimento econômico da última década. Seu objetivo para 2020 está na eliminação da miséria, porém sob uma larga base econômica. Sua pauta de exportações sofreu uma enorme mudança nos últimos anos, transitando largamente de um país exportador de arroz, café e outros gêneros alimentícios para outro perfil econômico, pronto para acrescentar o “valor agregado industrial” em sua pauta de exportações. Se a própria revolução vietnamita por ele dirigida foi uma demonstração da capacidade do marxismo em se adequar a diferentes realidades, o recente desenvolvimento do país acelerado após 1986 é expressão desta forma não dogmática de se enfrentar a realidade. Na luta diária dos povos do mundo, no exemplo heroico de luta do povo vietnamita e no robusto desenvolvimento desse lindo país é que se encontra a historicidade deste grande homem e revolucionário exemplar. Muito nos honra ser signatários das bandeiras defendidas por Ho Chi Minh à frente de seu povo e da nação vietnamita! Nós, do Partido Comunista do Brasil, temos em grande conta o legado deste artesão genial da política revolucionária! José Renato Rabelo Presidente da Fundação Maurício Grabois

A versão original deste texto foi apresentada ao seminário Patrimônio do pensamento de Ho Chi Minh na época atual, realizado em 12 de maio de 2010 no Instituto de Política e Administração de Hanói, na capital do Vietnã. No evento, o PCdoB foi representado pelo secretário de Relações Internacionais, Ricardo Alemão Abreu. À época, Renato Rabelo presidia o Partido. Ver em: <https://url.gratis/0iP2X>.

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IMAGENS Ho Chi Minh

Ho Chi Minh, líder da libertação nacional Ho participa em 1920 da fundação do PC da França

Giap e Ho em 1945 antes da Proclamação da Independência

Ho Chi Minh declara a República Democrática do Vietnã, em 1945

Rara foto tirada antes da Proclamação da Independência em que Ho e Giap aparecem ao lado de oficiais dos EUA

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Ho Chi Minh passou a ser reconhecido como tal a partir de 1945 depois de usar cerca de 174 codinomes para fugir do controle da Polícia francesa, uma das mais violentas do mundo ocidental

A Conferência de Postdam com a Inglaterra, Estados Unidos e URSS decide os destinos do mundo no pós Segunda Grande Guerra

1961: Mao Tsé-tung e Ho Chi Minh em Pequim

Nikita Kruschev, Mao Tsé-tung e Ho Chi Minh encontram-se em Moscou

Ho Chi Minh e o primeiro Ministro Zhou Enlai da República Popular da China Acima: Capa do livro O Processo da Colonização Francesa – escrito por Ho Chi Minh em 1921 e publicado na França em 1925

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INTRODUÇÃO

O pensamento revolucionário de Ho Chi Minh Pedro de Oliveira

O pensamento de Ho Chi Minh constitui-se em um sistema de critérios políticos integrais e profundos sobre os problemas fundamentais da Revolução Vietnamita. Este pensamento, por sua vez, é resultado da aplicação e desenvolvimento criador do marxismo-leninismo nas condições concretas do Vietnã. É herança, também, e apropriação do legado cultural da humanidade” (Partido Comunista do Vietnã)

Nesta introdução pretendemos analisar como se deu a formulação das ideias políticas de Ho Chi Minh, especialmente no que se refere às teses sobre a Questão Nacional e Colonial.

H

o Chi Minh foi o mais proeminente líder da história moderna da República Socialista do Vietnã. Notabilizou-se internacionalmente por defender a luta contra o colonialismo, contra o imperialismo e pela revolução socialista. Viveu por 79 anos, nascido em maio de 1890, com o nome de Nguyen Sinh Cung, no vilarejo de Kiem Lan, ao centro do seu país. Desde a juventude, engajou-se na atividade de luta contra o colonialismo e pela autodeterminação dos vietnamitas. Tornou-se o principal dirigente 23


Ho Chi Minh

da Nação e soube elaborar uma estratégia de luta contra o colonialismo francês, contra a invasão japonesa e depois pela libertação nacional contra o imperialismo estadunidense. Suas ideias fundamentadas no marxismo-leninismo e o Partido Comunista do Vietnã foram referências essenciais para que o povo vietnamita pudesse se libertar dos agressores externos, pois o Vietnã havia conquistado a Independência em 1945 e mais tarde fora dividido, por três décadas, em função do acordo de paz celebrado em julho de 1954 em Genebra, que reconheceu Ho Chi Minh, na Presidência da República Democrática do Vietnã, ao Norte, e o governo do chamado Vietnã do Sul – submisso à potência colonial francesa – sob o domínio do imperador Bao Dai. Ho Chi Minh não viveu até o final efetivo da guerra contra o imperialismo estadunidense, em 30 de abril de 1975, quando as tropas da Frente de Libertação Nacional libertaram Saigon, a então capital do Vietnã do Sul, reunificando definitivamente o país. Para compreender a trajetória do pensamento de Ho Chi Minh, no entanto, é preciso levar em conta cada uma das fases da sua formação política e ideológica. A etapa inicial, após seu nascimento, compreende toda a formação básica (1890 a 1911) até o período em que deixou o Vietnã para realizar um verdadeiro périplo pelo mundo (1911 a 1920). O próximo estágio abarca o tempo em que Ho Chi Minh morou em Paris, na França, quando, sob o nome Nguyen Ái Quoc (adotado para se proteger do controle exercido pelos órgãos de segurança franceses), teve acesso ao pensamento progressista e avançado do mundo ocidental, e teve sua formação marcada pela obra de Lênin, especialmente no que diz respeito à questão colonial. O período seguinte (1921 a 1930) trata do seu envolvimento com as atividades políticas socialistas, quando se filiou ao Partido Socialista Francês e depois se tornou um dos fundadores do Partido Comunista da França. Em seguida, participou de vários congressos e trabalhos da Internacional Comunista e da organização do Partido Comunista da Indochina. Na penúltima fase (1931 a 1940) – em que assumiu o nome de Ho Chi Minh –, desenvolveu os esforços e os preparativos para colocar em prática suas ideias e seus pontos de vista no teatro da guerra de libertação no Vietnã. Ho Chi Minh viveu em Moscou (na URSS) e depois na China em Guangzhou e no nordeste do Sião (Tailândia), onde se preparou e se formou política e ideologicamente para o novo tipo de partido que iria protagonizar. Em outubro de 1930, em Hong Kong, na primeira reunião de todos os três principais grupos comunistas da Indochina, seguindo uma orientação da Internacional Comunista, deci-

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Introdução

diu proclamar o nome de Partido Comunista da Indochina (PCI). Formalmente dissolvido em 1945, o Partido reapareceu em 1951 como o Partido dos Trabalhadores do Vietnã. Nessa ocasião, constituíram-se também partidos independentes no Laos e no Camboja. Somente em 1976, no seu 4º Congresso, o partido voltou a assumir o nome Partido Comunista do Vietnã. (1) Finalmente temos o período 1941-1969 que compreendeu o seu retorno ao Vietnã, onde liderou a Independência do país em 1945 e a ação prática concreta do exercício de Chefe de Estado e de sua liderança em seu próprio país. Assim, com base em sua experiência de vida, partimos da concepção de que os homens e mulheres são fruto de seu tempo. Desta maneira, podemos dizer que as três principais fontes da gênese de seu pensamento foram o patriotismo e as tradições culturais e humanísticas do Vietnã, nos períodos iniciais de sua formação, particularmente a influência do confucionismo; os aportes do pensamento ocidental mais avançado do ponto de vista social na Europa do início do século XX; e os escritos sistematizados por Karl Marx e Friedrich Engels, e depois o pensamento de Vladimir I. Lênin sobre a questão colonial. Influências Políticas e Ideológicas na formação do Pensamento de Ho Chi Minh

Em sua adolescência, Ho Chi Minh aprendeu a escrever em caracteres chineses e sofreu o forte impacto do espírito de luta anticolonialista, especialmente em relação à dominação francesa (2). Seus professores confucionistas, de tendência nacionalista, foram muito importantes em sua (1) Em 1945 a decisão de “dissolver” o PC do Vietnã teve um caráter tático apenas, para que isso não prejudicasse o esforço de reconhecimento da independência pela comunidade internacional. (2) No ano de 1858, a Marinha francesa desembarcou no porto de Da Nang (na região central do Vietnã) e logo em seguida invadiu a cidade de Saigon, mais ao sul da península da Indochina. Em 1862 o rei Tu Duc assinou um acordo com os franceses, cedendo-lhes três províncias para formar um território colonial. Em 1867 a França ocupou mais três províncias, formando a Colônia a que deu o nome de Cochinchina. De 1873 a 1886, os colonialistas franceses ocuparam todo o Vietnã. Em junho de 1884, a dinastia Nguyen firmou o tratado de Patenôtre, reconhecendo o protetorado da França sobre o Vietnã. Nesse período, os franceses implementaram um programa de exploração colonial em grande escala, para aproveitar plenamente os recursos naturais, explorar a mão de obra nativa, expropriar a terra dos camponeses e transformar o Vietnã e a Indochina em um grande mercado colonial francês.

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formação. Na então capital imperial do Vietnã, Hué (situada ao centro do país), Ho Chi Minh adquiriu conhecimentos de ciências sociais e ciências naturais, entrando em contato com a cultura da chamada civilização ocidental. Todo esse manancial de conhecimento deu-lhe a possibilidade de dialogar com novas orientações e ideias, bem diferentes daquelas de seus antigos professores. Este período de sua formação foi marcado pela violenta repressão policial exercida pelos colonialistas franceses, que haviam consolidado o seu domínio econômico, político e ideológico sobre o Vietnã. O contraste social teve grande impacto em sua percepção da sociedade, caracterizada pela miséria dos trabalhadores em contradição com as luxuosas condições de vida dos comandantes coloniais franceses e do mandarinato feudal vietnamita da região. Entretanto, o fracasso do movimento nacionalista no Vietnã nos primeiros anos de século XX mostrava a necessidade de se estabelecer um novo patamar na organização da luta revolucionária de seu país para se obter algum êxito. Desta forma, Ho Chi Minh foi educado na escola oriental, além de tomar consciência profunda dos danos da dominação colonial, e das consequentes difíceis condições de vida do povo e das massas trabalhadoras. Estes foram os fatores básicos que o levaram a buscar um novo caminho para o que considerava a salvação nacional em seu país. Sobre os valores espirituais da sociedade vietnamita, Ho Chi Minh (1995, p. 171) escreveu: Nosso povo desenvolveu um ardente patriotismo, que constitui uma valiosa tradição. Até agora, sempre que o país precisou enfrentar agressões externas, este espírito veio à tona e se tornou extremamente forte, criando uma onda capaz de superar todos os perigos e dificuldades no enfrentamento de todos os invasores e traidores internos. Podemos nos orgulhar das gloriosas páginas da história escritas pelas irmãs Trung, a Senhora Thieu, Tran Hung Dao, Le Loi, Quang Trung, entre outros. Eles se tornaram símbolos de uma Nação heroica e devemos sempre ter em mente suas realizações e conquistas. A formação política e ideológica de Ho Chi Minh, entretanto, teve um desenvolvimento mais acentuado na França, após ter viajado como ajudante de cozinha no navio mercante francês Amiral Latouche-Tréville, que 26


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fazia a linha Haiphong-Marselha, em 5 de junho de 1911. Nessas viagens, conheceu vários países, inclusive o Brasil, onde passou algum tempo na cidade do Rio de Janeiro; chegou a morar nos Estados Unidos de 1912 a 1913 e depois na Inglaterra, de 1913 a 1917. Nos Estados Unidos, Ho Chi Minh morou em Boston e Nova Iorque. Em Boston trabalhou no Parker House Hotel – considerado até hoje o mais antigo hotel em funcionamento contínuo nos Estados Unidos –, fundado em 1855. Em Nova Iorque morou no Brooklyn, onde visitou muitas vezes o Harlem (onde viviam as populações mais pobres da cidade). De acordo com o general Vo Nguyen Giap (que foi o comandante em chefe do Exército vietnamita), o chamado “Novo Mundo” o impressionou profundamente. Neste período, Ho teve acesso à Declaração de Independência de 1776, onde se lê: “Todos os homens foram criados iguais e são dotados de certos direitos inalienáveis, dentre os quais o direito à vida, à liberdade e o direito à felicidade”. Passou a admirar fortemente esse desejo de independência e liberdade do povo americano. Tornou-se um estudioso das ideias de George Washington, Thomas Jefferson e Abraham Lincoln. Ao mesmo tempo, verificou os paradoxos que estas ideias escondiam sobre liberdade e igualdade, e também como milhões de trabalhadores não reconheciam aquela igualdade de direitos e viviam na miséria, além da violenta discriminação contra os negros americanos(3). O escritor italiano Domenico Losurdo (2010, p. 34), em seu livro A linguagem do Império, publicado em 2010, faz o seguinte relato: Em 1924, um jovem indochinês (Nguyen Sinh Cung) (...), que chegou à República estadunidense em busca de trabalho, assistiu horrorizado um linchamento. Deixemos os detalhes de lado, pois já os conhecemos ou podemos imaginá-los, e vejamos sua conclusão: “No chão, cercada de um cheiro de gordura e fumaça, uma cabeça negra mutilada, assada, deformada, faz uma careta horrível e parece perguntar ao sol que se põe: Isto é civilização?”. Sobre a Revolução Norte-Americana, Ho Chi Minh (em livro publicado apenas em 1995) concluiu que, apesar de sua vitória 150 anos antes, os (3) Sobre o assunto, Ho Chi Minh escreveu um artigo intitulado The KKK Party. De acordo com Losurdo, o que mais impressionara Ho Chi Minh foram as barbaridades do capitalismo americano, as mobilizações da Ku Klux Klan e o linchamento de negros. Em 1924, Ho Chi Minh editou um opúsculo, intitulado La Race Noire, sobre as práticas raciais nos Estados Unidos e na Europa.

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trabalhadores das cidades e do campo ainda se encontravam na miséria e pensavam numa segunda revolução. Sobre esse período de formação e de influências doutrinárias e religiosas em seu pensamento, Ho Chi Minh escreveu: O lado bom do Confucionismo é a lição de ética pessoal. O lado bom do Catolicismo é a benevolência. O lado bom do marxismo é o método dialético. O lado bom de Sun Yat-sen é que seu pensamento se adapta às condições concretas do Vietnã. Confúcio, Cristo e Marx buscavam a felicidade e o bem-estar da sociedade. Se eles estivessem vivos ainda hoje certamente estariam conversando juntos. E eu acredito que eles viveriam em perfeita harmonia como bons amigos. Estou tentando aprender com eles como um aluno aplicado. (Citado in GIAP, 2011, p. 52). É preciso lembrar que, quando o confucionismo penetrou no Vietnã, o patriotismo já havia se tornado a ideologia dominante no país. Desta maneira um novo tipo de confucionismo patriótico – resultante da fusão dessas duas correntes – acabou por se transformar num confucionismo próprio, vietnamita (GIAP, Ibidem). Mesmo assim, Ho Chi Minh criticou e rejeitou os elementos negativos e conservadores dessa corrente de pensamento. Sobre esse tema, Ho Chi Minh (1996, p. 320) escreveu: A nova ética é muito diferente da que se concebia antigamente. Aquela velha ética se parece com uma pessoa que tem a cabeça enfiada na terra e as pernas voltadas para o ar. A nova ética é como uma pessoa com os pés bem postados no chão e a cabeça encarando firmemente o céu. Ainda a respeito das influências asiáticas sobre o pensamento de Ho Chi Minh, consideramos importante destacar o papel do movimento nacionalista chinês – e de seu líder Sun Yat-sen –, que culminou com a vitória da revolução nacionalista da China, dirigida pelo Kuomintang em 1911. Ho Chi Minh, em um artigo sobre esta questão, intitulado Os países imperialistas e a China, escreveu que Sun Yat-sen, o pai e fundador da Revolução Nacionalista chinesa, sempre se guiou por seus princípios, mesmo quando teve de enfrentar grandes dificuldades. A plataforma política de seu partido, explicou Ho Chi Minh, é reformista; o que supõe oposição ao imperialismo

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e ao militarismo além de expressar a solidariedade com as nações oprimidas nas colônias e com o proletariado no mundo, o que significava simpatia pela Revolução Russa (GIAP, 1996). Mas com a morte de Sun Yat-sen – depois que o próprio Ho Chi Minh havia participado do 2º Congresso do Partido Nacionalista Chinês –, houve uma mudança radical na orientação protagonizada pela nova direção desse partido que havia substituído Sun Yat-sen por Chiang Kai-shek, um dirigente de pensamento direitista, contrarrevolucionário. Compreendemos, desta forma, que o patriotismo assumido por Ho Chi Minh foi consequência da histórica luta anticolonialista, que marcou a própria formação da Nação vietnamita nas lutas pela defesa do país de invasões mongóis, de exércitos chineses da dinastia Han, e depois do colonialismo francês, presença esta que perdurou por mais de 80 anos. Por fim, devemos destacar a influência importante, nessa fase da vida de Ho Chi Minh, do pensamento nacionalista chinês, protagonizado por Sun Yat-sen. Os 8 pontos do povo Anamita(4) versus os 14 pontos de Woodrow Wilson

O ambiente político internacional do início do século XX estava impregnado pelos debates em torno das consequências do final da Primeira Guerra Mundial. Nesta conflagração Interimperialista, morreram cerca de nove milhões de pessoas, entre civis e militares. Outras 30 milhões ficaram feridas e/ou mutiladas. Durante o conflito, três impérios se desintegraram: o Austro-Húngaro, o Otomano e a Casa imperial czarista na Rússia. Ao mesmo tempo, ocorreu o fortalecimento dos Estados Unidos no cenário estratégico e militar mundial. O presidente dos EUA, naquela ocasião Woodrow Wilson, havia sido reeleito sob a bandeira de que os americanos não deveriam entrar na guerra. Mas, após eleito, levando em conta a nova situação, chegou à conclusão de que o melhor para os interesses do establishment dominante em seu país seria mesmo participar da guerra na Europa, a favor dos Aliados. Foi então que, com a massiva participação dos soldados americanos, o equilíbrio começou a ficar mais favorável aos Aliados. Para os Estados Unidos, a guerra era um grande negócio, pois a indústria bélica americana produzia a pleno vapor, fabricando armas e munições (4) Anamita era uma etnia que abarcava uma boa parte da Indochina. Interessante observar que não havia nestes povos nenhum que explicitamente exigisse a Independência do Vietnã.

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para a França e a Inglaterra, a crédito, para serem pagas depois do conflito terminado. Acontece que essa política denominada de isolacionismo chegou a um limite, na medida em que, se a guerra se prolongasse, poderia ocorrer uma vitória das chamadas Potências Centrais, a Alemanha e a Áustria – o que acarretaria a destruição econômica dos países aliados, impedindo assim o pagamento dos créditos concedidos pelos bancos estadunidenses. Desta forma, os EUA entraram na guerra para decidir, apesar de Wilson ter sido eleito com a bandeira contra a guerra. Em 18 de janeiro de 1918, o presidente Wilson pronunciou um importante discurso diante do Congresso dos EUA, defendendo uma plataforma que depois ficou conhecida como os 14 pontos de Woodrow Wilson. Na prática, este programa foi um primeiro esboço de política exterior sistematizado pelos Estados Unidos. Mais de um ano depois, Wilson levou o seu programa para tentar garantir os interesses dos EUA na Conferência de Versalhes, nos arredores de Paris, sendo o último ponto a proposta de criação da Liga das Nações. O objetivo era fazer com que os acordos de paz não sacrificassem demasiadamente a Alemanha, pois poderia em seguida criar fortes tensões na Europa, proporcionando novamente condições para outras conflagrações; o que na realidade ocorreu com a Segunda Grande Guerra. Os Estados Unidos, na verdade, saíram como os grandes vencedores dessa Primeira Guerra Mundial, e o fator novo foi a Revolução de Outubro de 1917, na Rússia, que levou o povo russo e os comunistas ao poder. Vamos aqui tocar rapidamente nos primeiros pontos dessa plataforma até a questão que mais interessava a Ho Chi Minh. O primeiro dos 14 pontos de Woodrow Wilson defendia que os pactos de paz deveriam ser negociados abertamente, e após isso os seus termos finais não poderiam ser alvo de entendimentos secretos. A ação da diplomacia precisava ser feita, segundo Wilson, sempre francamente, à vista do grande público. O diplomata Harold Nicolson, em seu livro O Tratado de Versalhes, contesta a eficácia desse ponto, constatando que os acordos de paz, inclusive o Tratado de Versalhes, não foram negociados com transparência. O ponto número dois afirmava explicitamente a liberdade de navegação sobre os mares, além das águas territoriais dos diferentes países, tanto na paz quanto na guerra. Também neste caso, Harold Nicolson (2014) afirma que a liberdade dos mares não foi assegurada. O terceiro ponto da plataforma do presidente Woodrow Wilson propugnava a remoção, até onde fosse possível, de todas as barreiras econômicas.

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Sabemos que até os nossos dias essas barreiras continuam de pé e, como Harold Nicolson (IBIDEM, p. 30) constatou, “longe de se estabelecer o livre comércio, levantou-se uma barreira de tarifas maior e mais numerosa do que jamais se vira antes”. O quarto ponto defendia garantias adequadas, dadas e recebidas, de que os armamentos nacionais deveriam ser reduzidos ao mais baixo nível compatível com a segurança interna de cada país. Mas constatou-se, ao contrário disso, que se ampliaram os níveis dos armamentos nacionais. O próximo ponto foi o de maior impacto para os defensores do fim do colonialismo e para o próprio Ho Chi Minh. Este quinto item do programa de Wilson defendia um ajuste livre, aberto, razoável e absolutamente imparcial de reivindicações coloniais, com base na estrita observância do princípio segundo o qual, na solução de todas essas questões de soberania, os interesses das populações concernentes deveriam ter o mesmo peso das reivindicações dos governos cujo domínio estaria em causa. Na obra já citada, Harold Nicolson observa que as colônias alemãs foram distribuídas entre os vencedores de uma forma que não se caracterizou pela liberdade, nem pelo desprendimento e tampouco pela imparcialidade. Mesmo assim, em junho de 1919, Ho Chi Minh e alguns amigos vietnamitas rascunharam uma plataforma de oito pontos, para tentar submetê-la à Conferência de Paz de Versalhes, exigindo liberdade e direitos democráticos para o povo anamita (vietnamita). Na verdade, essa espécie de manifesto não obteve maior repercussão nessa Conferência, mas conseguiu grande impacto nos movimentos de libertação nacional e nos círculos revolucionários vietnamitas. Este episódio – que levou Ho Chi Minh a tentar entregar o documento a Woodrow Wilson na Conferência que se realizava a alguns quilômetros de Paris – também o ensinou que a doutrina consagrada por Wilson em seus 14 pontos, especialmente no que se refere ao direito à autodeterminação dos povos, deveria depender principalmente da capacidade e da força dos próprios povos colonizados. Não se tornaria uma dádiva dos países coloniais. Os oito pontos alinhados pelos patriotas anamitas e que foram levados à Conferência de Paz por Ho Chi Minh apresentavam reivindicações melhor detalhadas na tabela a seguir:

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Os oitos pontos de reivindicações do povo anamita 1. Anistia geral para todos os prisioneiros políticos nativos. 2. Reforma do Judiciário da Indochina, estabelecendo que os nativos deveriam ter os mesmos direitos e garantias legais dos europeus em solo vietnamita. Abolição total dos tribunais especiais que eram utilizados como instrumentos de repressão e opressão dos setores honestos do povo anamita. 3. Liberdade de imprensa e de opinião. 4. Liberdade de associação e de reunião. 5. Liberdade de viajar ao exterior e de viver em países estrangeiros. 6. Liberdade de estudar e de constituir escolas técnicas e profissionais em todas as províncias para os naturais do Vietnã. 7. Revisão da promulgação de decretos pela promulgação de leis. 8. Permissão para que os naturais elejam seus representantes na Assembleia Nacional Francesa, para que os deputados franceses ficassem informados das aspirações do povo vietnamita. Fonte: Elaborado pelo autor.

Em um livro dedicado ao estudo das negociações levadas a cabo na Conferência de Versalhes, Paris, 1919, Margaret Macmillan (2003) mostra de forma clara como os elegantes representantes das grandes nações vitoriosas da Primeira Grande Guerra viam os representantes de nações vítimas do colonialismo. Ela relata que, entre tantas pessoas que se esmeravam em chamar a atenção do Conselho Supremo, destacou-se a presença de um garoto de recados (sic) que enviou uma petição de independência para seu pequeno país, que era desconsiderado demais para receber resposta. De acordo com os biógrafos, Ho Chi Minh foi despachado da Conferência de Versalhes sem cerimônias. É possível perceber, nos textos escritos por Ho Chi Minh naquele período, a percepção sobre algumas questões relevantes como, por exemplo, o fato de em todas as colônias, do início do século XX, o povo trabalhador estar sujeito à exploração e à repressão, vivendo basicamente na miséria, e todas as nações oprimidas lutarem de uma forma ou de outra pela sua libertação. As colônias eram a origem de seu senso de internacionalismo. Além disso, percebeu que, nos países capitalistas desenvolvidos da época – que se autodenominavam como “o mundo civilizado” –, as elites viviam na abundância e a grande maioria dos trabalhadores estava cada vez mais 32


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empobrecida. A compreensão dessa situação o levou gradualmente a uma consciência de classe, expressa nos seus escritos e relatada por seus biógrafos. Ho Chi Minh e a concepção de Lênin sobre a Questão Nacional

Em Londres, Ho trabalhou como limpador de neve e como ajudante de cozinha, sob a orientação de Escoffier, chef de cuisine do Hotel Carlton, que se propôs a ensinar-lhe a arte de cozinhar. No entanto, preferiu a política. Filiou-se à Associação Internacional de Operários (Overseas Workers Association) e se tornou admirador da insurreição irlandesa, frequentando os ambientes Fabianos. O socialismo denominado Fabiano foi um movimento político-social inglês, que surgiu no fim do século XIX liderado pela Sociedade Fabiana, e propunha como objetivo levar a classe operária ao controle dos meios de produção. Neste período, Minh leu vários livros, e aprendeu o que significava a palavra “Revolução” (GIAP, 2007). Depois da experiência em Londres, voltou para a França e viveu em Paris, de 1917 a 1923, um centro econômico e político da Europa. Esta fase se mostrou importante para que o vietnamita pudesse superar o preconceito que havia nutrido durante anos no Vietnã a respeito da grande metrópole colonialista francesa. Em Paris Ho Chi Minh viveu o período mais longo nessa primeira década de viagens. Nele, sofreu a maior influência humanista das ideias de liberdade, igualdade e fraternidade do iluminismo, principalmente dos trabalhos de Voltaire, Diderot, Montesquieu, Jean-Jacques Rousseau e também das ideias que brotaram da revolução burguesa na França. De forma particular, Minh estudou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1791. Em relação à Revolução Francesa, Ho (1995, p.273) escreveu: “A Revolução Francesa foi similar à Revolução Americana, foi uma revolução burguesa, uma revolução incompleta. A França é formalmente uma República e uma Democracia; mas internamente os trabalhadores e os camponeses estão destituídos de seus direitos, e do ponto de vista externo a França oprime e explora suas colônias”. E concluiu: “A Revolução Vietnamita deve levar em conta estes fatos”.

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Em Paris, Ho Chi Minh encontrou um engenheiro químico vietnamita, Nguyen The Truyen, que o apresentou a exilados de seu país e de outras colônias francesas que haviam fundado um movimento chamado União Intercolonial. Este grupo editava o jornal Le Paria, para o qual Minh passou a colaborar. Logo, Ho Chi Minh assumiu a direção dessa publicação, como gerente-geral e editor chefe. Esse órgão se tornou o porta-voz da luta anticolonial, pela independência e a liberdade. O seu projeto editorial era a luta pela “emancipação dos seres humanos”. Esta visão mostra que a libertação do homem havia estabelecido profundas raízes no pensamento de Ho Chi Minh. Outro órgão também fazia parte das publicações desse movimento, o Viet Nam Hon (A Alma do Vietnã), que era enviado pelos marinheiros e tripulantes de navios que faziam a rota Vietnã-França, e era distribuído nas principais cidades vietnamitas. Assim, Ho Chi Minh coletou material suficiente para escrever seu primeiro livro, O Processo da Colonização Francesa, que se transformou numa importante peça de acusação ao colonialismo francês. Na França, Ho Chi Minh passou a estudar as ideias socialistas quando se filiou ao Partido Socialista Francês e depois quando participou da fundação do Partido Comunista da França. Naquela época Ho instintivamente proclamara sua solidariedade à Revolução de Outubro na Rússia, mas ainda não percebia a dimensão histórica do acontecimento, como relata em seu artigo Como escolhi o Leninismo, publicado na revista soviética Problemas da Ásia em 1960. “Admirava Lênin porque era um grande patriota que havia libertado seu povo, mas nunca havia lido qualquer de suas obras. Havia me tornado membro do Partido Socialista Francês pela simpatia que nutriam em favor da luta dos povos oprimidos. Mas não sabia direito o que era um Partido, um sindicato, nem a diferença entre socialismo e comunismo. Havia também uma grande discussão apaixonada no interior do Partido Socialista para definir se eles deveriam continuar participando da II Internacional ou se deveriam se juntar à III Internacional(5) de Lênin. Participei de várias reuniões, duas ou três vezes por semana, e assistia atentamente aos debates”. Foi então que Ho Chi Minh entrou em contato direto com os textos de Lênin. “O que me interessava mais – e que não (5) A Internacional Comunista (do inglês Communist International, Comintern; ou Komintern; do alemão Kommunistische Internationale), ou também conhecida como Terceira Internacional (1919-1943), foi uma organização internacional fundada por Vladimir Lênin e pelo PCUS (bolchevique), em março de 1919, para reunir os partidos comunistas de diferentes países.

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era muito tratado nas reuniões — era saber qual das Internacionais era solidária aos povos coloniais. Eu fiz a pergunta – a mais importante em minha opinião – em uma reunião, alguns camaradas responderam: ‘Foi a III Internacional’. E outro camarada me deu para ler a Tese sobre Questões Coloniais e Nacionais de Lênin, publicada no jornal L’Humanité (Órgão do PSF que depois se tornou jornal oficial do PCF). Era difícil para mim entender toda a terminologia política desta tese. Mas, pelo hábito de lê-la e relê-la, eu pude finalmente captar o sentido da maior parte de seu conteúdo. Que emoção, que entusiasmo, que lucidez e que segurança ela me transmitiu! Ficava emocionado, até chorava. Quando estava sozinho no quarto, eu declamava em voz alta, como se estivesse diante de uma grande multidão. ‘Caros compatriotas mártires! Nós precisávamos disto, é o caminho da nossa libertação!’”. Depois da leitura do texto, Ho adquiriu uma confiança completa em Lênin e na III Internacional, passando a participar ativamente dos debates e a atacar os detratores do líder soviético e da Internacional Comunista com o argumento: “Se vocês não condenam o colonialismo e se vocês não se solidarizam com os povos colonizados, que tipo de revolução vocês querem então?”. A partir desse momento, Ho começou a participar de várias atividades partidárias até que o Partido Socialista aderiu à III Internacional no 18º Congresso de Tours. O movimento socialista já levava em consideração as concepções de Marx e Engels a respeito do colonialismo. Em Karl Marx, podemos ler que: “Uma nação não pode ser livre e ao mesmo tempo continuar a oprimir outras nações”. Isso foi proclamado em 1847 num ato de solidariedade à Polônia. Em outro texto – lembra o historiador Augusto Buonicore –, Marx (1869) analisa que: “Um povo que subjuga outro povo forja suas próprias cadeias”, a “escravização da Irlanda” impede a “emancipação da classe operária inglesa”. E condena duramente a postura de parte da classe operária inglesa que é solidária com a sua própria burguesia. Essas fórmulas têm validade universal e não só na Europa. Em 1857, num verbete para a Enciclopédia Americana sobre a Argélia, Engels denunciou “os horrores e a brutalidade” e a “guerra bárbara” levados pelos franceses contra os povos nativos. Para estes povos, a independência seria “um bem precioso” e “ódio à dominação estrangeira, o primeiro imperativo de sua vida”. Essa teoria crítica desenvolvida por Marx e Engels, ainda na segunda metade do século XIX, é que permitiria a construção de uma concepção e de uma sólida política anticolonialista, anti-imperialista e antirracista no século

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XX, conclui Buonicore. E relata ainda que o tema colonial esteve ausente nos primeiros congressos da II Internacional. Contudo, em 1900, ela conclamou os trabalhadores a lutarem contra a expansão colonial e apoiou a criação de partidos socialistas nas colônias. Em 1904, defendeu que os partidos socialistas se posicionassem contra os créditos à política colonialista e criou um escritório das colônias no seio da Internacional. Mas existia uma corrente que tinha um pensamento contrário a esta orientação. Em 1907, Heinrich Van-Kol, responsável pelo relatório sobre as colônias, afirmou que os socialistas não podiam desconhecer que os impérios coloniais existiam desde o início da civilização e continuariam existindo mesmo no socialismo. Por isso, seria preciso apresentar propostas concretas para melhorar a vida dos nativos e garantir o aproveitamento dos recursos naturais das colônias em benefício da humanidade. Tentou-se aprovar uma moção que afirmava: “O congresso, afirmando que o socialismo necessita de forças produtivas do mundo inteiro, que elas estão destinadas a ser postas a serviço da humanidade (...), vê na colonização (...) um elemento integrante dos fins universais da civilização perseguidos pelo movimento socialista”. Bernstein – considerado o primeiro revisionista da teoria marxista e ideólogo da Social Democracia – advogou: “nem todas as lutas das populações dominadas contra os seus dominadores são, por si mesmas, lutas de emancipação. (...) Povos incivilizados e inimigos da liberdade não têm direito algum à nossa simpatia, se se levantam contra a civilização (...). Somente pode reconhecer-se um direito condicionado aos selvagens sobre a terra que ocupam. Uma civilização superior pode, em definitivo, apelar para alguns direitos superiores. Não é a conquista, e sim o cultivo do país, o que dá o título histórico de uso”. Contra tal posição se levantou o socialista Belfort Bax, declarando: “Sob nosso ponto de vista, todo o progresso da colonização constitui um recuo para a causa socialista. Igualmente, sob o mesmo ponto de vista, toda derrota de uma potência civilizada em sua luta contra as populações bárbaras e selvagens deve ser considerada pelo Partido Socialista, se quiser ser consequente, como bem-vinda. A causa dos nativos, vista sob este aspecto, é de fato a nossa causa”, lembra Buonicore. A proposta revisionista-colonialista acabou sendo rejeitada por 108 votos contra 127. Uma prova de quanto a Internacional Socialista, em 1907, estava dividida em torno de um tema tão essencial. Foi a esquerda socialista que fez as críticas mais acentuadas ao caráter opressivo, e não civilizador, da expansão do capitalismo na sua

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fase imperialista. Reforçou a ideia de que a busca de novos mercados pelas potências capitalistas aumentava o risco de conflitos armados entre povos e nações. Lênin, invertendo a lógica predominante, afirmou que a revolução dos povos coloniais é que poderia impulsionar as revoluções socialistas no Ocidente. Pedra angular deste eurocentrismo era ver o mundo pela perspectiva ocidental, o que implicava a crença, consciente ou subconsciente, da proeminência da cultura ocidental – o conhecimento, as preocupações e os valores –, em detrimento das não ocidentais (MGONJA; MAKOMBE, 2008). Esse tipo de concepção revelou-se incapaz de interpretar o conjunto dos problemas mundiais; daí o fracasso das elites europeias em dar solução prática aos problemas da Primeira Guerra Mundial, que acabou desaguando na Segunda Grande Guerra em 1939. Esse período entre guerras foi caracterizado por muitos autores como uma fase de predomínio do idealismo sobre o realismo nas relações entre as Nações. Como já vimos – em sua busca por caminhos novos –, Ho Chi Minh visitou e residiu em várias colônias e em vários países da Ásia, África e América Latina, testemunhando as péssimas condições de vida dos povos. Neles, Ho Chi Minh leu inúmeros livros, jornais e outros documentos, e entrou em contato com figuras destacadas nas esferas política, social e cultural daquela época. Conheceu organizações sociais que investigavam as condições sociais dessas respectivas sociedades, o que lhe possibilitou verificar o que havia de mais avançado e também o que se mostrava mais contraditório em cada um desses povos (GIAP, 2011). Naquele início de século XX, o mundo já se encontrava totalmente sob o domínio do capitalismo. Apenas 45 países se apresentavam independentes, enquanto o colonialismo dominava 84% de toda a área terrestre. Os indianos se levantaram muitas vezes contra o domínio da Inglaterra, mas foram barbaramente reprimidos. Ao final de 1911, os chineses nacionalistas se revoltaram contra o colonialismo, mas não foram capazes ainda de promover reformas estruturais. Somente em 1949 é que, sob a liderança de Mao Tsé-tung, a nação chinesa começou a se libertar do jugo do feudalismo e do imperialismo (VISENTINI, 2007). No 18º Congresso do Partido Socialista da França, ocorrido em Tours, interior da França, Ho Chi Minh votou pela III Internacional e filiou-se ao Partido Comunista Francês, que nascia naquele momento como uma dissidência do PSF. A chamada III Internacional, também cognominada

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Comintern, havia sido fundada em 3 de março de 1919 para substituir a II Internacional, à época acusada de seguir o caminho do reformismo. Ho Chi Minh, que nessa época utilizava o nome Nguyen Ai Quoc (Nguyen o Patriota), acabou se ligando a dirigentes sindicalistas revolucionários, como Monatte e Bourderon, e pacifistas, como Marcelle Capy, conforme relata Lacouture (1968). O jornalista Paul Vaillant-Couturier ofereceu-lhe as colunas do jornal L’Humanité, no qual passou a publicar Souvenirs d’un Exilé (Lembranças de um Exilado) e uma crônica humorística, Le Dragon de Bambou (O Dragão de Bambu). Nesse período, conheceu Jean Longuet, neto de Karl Marx, e o convidou a escrever no Le Populaire (GIAP, 2007). Ele próprio, Ho Chi Minh, argumentou, nesses debates em torno do problema colonial, que podia não entender uma palavra de estratégia, mas havia compreendido muito bem uma questão: A III Internacional se preocupava muito com a questão colonial, e seus delegados se comprometiam a ajudar os povos oprimidos a recuperarem sua independência e liberdade. Enquanto isso, os aderentes da II Internacional não diziam uma palavra sobre o destino das colônias. Foi então que se inscreveu na Juventude Socialista, da qual foi o primeiro adepto vietnamita. Ho Chi Minh foi o primeiro vietnamita a se aproximar do leninismo. Ele escreveu: “Para salvar o país e libertar a Nação, não existe outra alternativa a não ser a revolução proletária”, e “somente o comunismo poderá salvar a humanidade e implantar a liberdade, a fraternidade, a solidariedade, o bem-estar, o emprego e a alegria, a paz e a felicidade para todos os seres humanos independentemente de sua raça e origens”. Ele foi o primeiro cidadão vietnamita a disseminar e divulgar o marxismo-leninismo no Vietnã, a plantar as sementes do comunismo e a diretamente tomar parte na preparação política e organizativa do povo para garantir a vitória da revolução vietnamita. Ho Chi Minh também foi o primeiro dirigente político das colônias a dar contribuições importantes ao estudo do colonialismo e da questão da libertação nacional nas colônias. Desde os primeiros artigos em 1919 aos textos publicados em 1926-1927, Ho Chi Minh concentrou seus trabalhos para desvendar a natureza dos crimes do colonialismo, na descrição dos sofrimentos do povo em suas batalhas pela independência nacional, pela libertação e na luta contra o colonialismo não apenas no Vietnã, mas na península indochinesa e em outros países colonizados por França, Grã-Bretanha, Holanda, Portugal... em vários continentes. Esses artigos foram

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reunidos e depois publicados em dois livros em 1925: Colonialismo Francês no Tribunal e Aqui está a justiça do Colonialismo Francês na Indochina. Ho Chi Minh procurou analisar nesses textos a estratégia do capitalismo e do imperialismo na sustentação do colonialismo da seguinte forma: “Eles (os colonialistas) utilizaram o proletariado branco para conquistar o proletariado nas colônias. Eles usaram o proletariado em uma colônia para lutar contra o proletariado de outra colônia. Finalmente, eles se apoiaram no proletariado nas colônias para oprimir o proletariado branco (nas metrópoles)”. A partir daí chegou a uma conclusão teórica: “O Capitalismo é uma espécie de sanguessuga que, por um lado, suga o proletariado nas colônias e, por outro, suga o sangue do proletariado das metrópoles (...), e se quisermos matar a sanguessuga não basta matar um lado somente, pois ela se alimentará pelo outro até que recomponha a parte que foi morta”. Ele continuou seu raciocínio, concluindo que o colonialismo não era apenas o inimigo das nações oprimidas, mas também o inimigo da classe operária das metrópoles e das classes trabalhadoras das colônias igualmente. Partindo dessa famosa proposição leninista sobre as relações entre a revolução na metrópole e a revolução nas colônias, Ho Chi Minh defendeu a posição de Lênin no Congresso do Partido Comunista da França e no 5º Congresso da III Internacional, onde ele firmemente criticou os comunistas europeus por terem subestimado a questão colonial e dedicado pouca atenção à revolução nas Colônias. Em sua intervenção na Internacional Comunista, ele levantou a seguinte questão: “Em relação aos nossos Partidos Comunistas na Grã-Bretanha, Holanda, Bélgica e outros países, o que é mesmo que fizeram contra as invasões burguesas perpetradas pela classe burguesa de seus países?” A resposta a esse questionamento foi “Nada”, e ele criticou sinceramente o Partido Comunista da França: “Em relação a mim, nasci em uma colônia francesa e sou membro do Partido Comunista da França. E sinto muito em dizer que o Partido Comunista da França não fez praticamente nada em favor das colônias!”. De fato, em 1925, ocorreram mudanças evidentes na atitude do Partido Comunista da França em relação ao colonialismo. Na opinião do historiador francês Charles Fourniau, quando o PCF estava praticamente se constituindo, na luta contra o legado da Segunda Internacional, “Ho Chi Minh contribuiu substancialmente para a emergência da tradição anticolonialista, uma tradição que se tornou uma das glórias do PCF”. E o pensador francês conclui: “Ho Chi Minh deveria ser encarado como um dos professores do Partido Comunista Francês na questão colonial”.

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Ho Chi Minh acabou desenvolvendo aspectos teóricos criativos nesse problema, como por exemplo: “A Revolução nas Colônias está para irromper e conquistar vitórias antes mesmo que a revolução proletária nas metrópoles centrais, e este fato poderá impactar a promoção da revolução nas metrópoles. O povo vietnamita poderá desencadear a iniciativa e se levantar utilizando suas próprias forças para se libertar e não precisará ficar dependente da eclosão da revolução nas metrópoles”. Assim, foi neste ambiente europeu, em investigações e atividades nas colônias e no Ocidente, que Ho Chi Minh adquiriu a percepção sistematizada nas Teses Leninistas sobre a Questão Colonial. A este respeito, Ho Chi Minh (1960) declarou que no começo foi o patriotismo e não o comunismo que o levou a acreditar em Lênin e na III Internacional. Mas pouco a pouco, explicou ele, progredindo passo a passo na luta e combinando estudos teóricos e atividades práticas, veio a compreender que o socialismo e o comunismo seriam capazes de emancipar os trabalhadores e os povos oprimidos. Poderia se dizer que Ho Chi Minh havia encontrado finalmente uma saída para o que chamava de salvação nacional, ou seja, a libertação nacional associada com a revolução, seguindo no rumo de uma revolução socialista. Lia com grande voracidade os clássicos da literatura russa, inglesa e francesa como Leon Tolstói, William Shakespeare, Victor Hugo, Anatole France, Émile Zola, e também os textos de Karl Marx e Vladimir Lênin, passando a dominar fluentemente o francês, inglês, alemão, russo e chinês. Foi em função da leitura da obra de Lênin, entretanto, que Ho Chi Minh procurou se aprofundar no estudo da questão colonial. Entre outros, o artigo de Lênin (1979, p. 23) sobre o Congresso Socialista Internacional de Stuttgart aborda essa questão: Não é a primeira vez que se trata da questão colonial nos congressos das Internacionais. Até agora as decisões destes congressos têm consistido sempre em uma condenação categórica da política colonial burguesa como política de rapina e de violência. Desta vez, a comissão do congresso estava composta de maneira tal que prevaleceram os elementos oportunistas, com o holandês Van Kol na direção. No projeto de resolução foi incluída uma frase, em que que se dizia que o congresso não condenava em princípio toda a política colonial que, em um regime socialista, poderia desempenhar um papel civilizador.

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Introdução

Contra essa opinião de conciliação com o colonialismo defendida por Van Kol, Ho Chi Minh lutou de forma contundente durante todo o período em que trabalhou na Internacional Comunista. Lênin (1907, p. 31) assim fez o balanço da política colonialista das grandes potências: A vasta política colonial conduziu parte do proletariado europeu a uma situação tal que a sociedade não se mantinha com o trabalho deste último, mas com o esforço dos trabalhadores quase escravizados, das colônias. A burguesia inglesa, por exemplo, obtinha mais lucros das dezenas e centenas de milhões de habitantes da Índia e de outras colônias que dos operários ingleses. Em tais condições, se cria em certos países a base material, econômica, para que o proletariado de tal ou qual país se contamine com o chauvinismo colonial. Naturalmente, isto somente pode ser um fenômeno transitório, porque devemos ter clara a consciência do mal, compreender suas causas, a fim de saber coesionar o proletariado de todos os países para a luta contra semelhante oportunismo. Foi em textos como este que Ho Chi Minh encontrou respostas iniciais para sua indagação de como estabelecer as formas para a libertação de seu país do jugo do colonialismo. A questão colonial no âmbito da Internacional Comunista

Fazendo um rápido retrospecto das primeiras Internacionais, pode-se dizer que a I Internacional lançou as bases do movimento comunista internacional. Foi fundada em Londres no ano de 1864 e contou com a participação de Karl Marx e Friedrich Engels. A Associação Internacional dos Trabalhadores, como era chamada, funcionou até 1876. Pregou, entre várias bandeiras, a abolição dos exércitos nacionais, o direito de greve e a coletivização dos meios de produção. Nesse curto período, entretanto, não foi possível tratar da questão colonial. Com a derrota da Comuna de Paris em 1871, a Internacional somente retoma os trabalhos em 1889 no Congresso de Paris, já sob o nome de II Internacional. Em 1914, os dirigentes desta Internacional aderiram às posições imperialistas nas possessões coloniais, traindo o lema de fundação “Proletários de todos os países, uni-vos”.

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Ho Chi Minh

Em 1917, a Revolução de Outubro na Rússia foi vitoriosa, inaugurando novo ciclo do movimento comunista internacional. Em 1919 instalou-se, sob a liderança de Lênin, a III Internacional. Poucos anos depois, em 1922, Ho Chi Minh foi pela primeira vez a Moscou como delegado ao IV Congresso da Internacional Comunista (de 30 de novembro a 5 de dezembro), onde o tema central dos debates versou a respeito da política de “Frente Única”, além de discutir as questões ligadas à luta dos negros pela igualdade, assim como a questão do trabalho nos sindicatos e a situação dos comunistas na Ásia e no Pacífico. Por coincidência ou não, esse Congresso criou uma Seção Sul-Asiática. Ho Chi Minh voltou à França em seguida e somente retornou a Moscou em 1923 quando da realização do Congresso Internacional dos Camponeses. Foi nessa ocasião que ele permaneceu na capital da URSS por mais de ano, quando participou de um curso de organização política. Esse período foi marcado por alguns eventos importantes. De 1920 a 1923, Ho Chi Minh foi o dirigente do Subcomitê do Partido Comunista Francês para as Colônias e participou dos I e II Congressos do PCF nos quais criticou a insuficiente atenção dada pelo partido às questões coloniais. Em um discurso preparado por Ho Chi Minh para a IC em 1924, ele apresentou um quadro que acabou ganhando grande repercussão:

Comparativo entre população e superfície País

Metrópoles

Colônias

Superfície (km²)

População

Superfície (km²)

População

Grã-Bretanha

115.000

45.500.000

34.910.000

403.600.000

França

536.000

39.000.000

10.250.000

56.600.000

Estados Unidos

9.420.000

100.000.000

1.850.000

12.000.000

Espanha

504.500

20.700.000

371.600

853.000

Itália

286.600

38.500.000

1.460.000

1.623.000

Japão

418.000

57.070.000

288.000

21.249.000

Bélgica

29.500

7.642.000

2.400.000

8.500.000

Portugal

92.000

5.545.000

2.062.000

8.738.000

Holanda

93.000

6.700.000

2.046.000

48.030.000

Fonte: Intervenção Ho Chi Min no 5º Congresso da IC.

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Introdução

Ao apresentar os dados constantes da Tabela acima durante sua intervenção, no 5º Congresso da Internacional Comunista, em Moscou, Ho Chi Minh mostrou a discrepância entre a população dos nove países colonialistas alinhados que, “somados, perfazem 320 milhões e 657 mil habitantes repartidos em 11 milhões e 470 mil e 200 km², (este foi o dado proclamado por Ho Chi Minh em seu discurso mas que não corresponde exatamente à soma total. N.E.) e exploram um total de 560 milhões e 193 mil habitantes repartidos em 55 milhões e 637 mil km²”. O delegado vietnamita continuou sua fala, destacando que mais eloquentes eram os dados se se considerasse a Inglaterra isoladamente: “a população das colônias britânicas é oito vezes maior do que a população da Inglaterra e o território colonial 232 vezes maior do que a da Metrópole. Em relação à França, ela ocupa território 19 vezes maior do que o seu próprio território e a população de suas colônias perfaz 76 milhões e 924 mil habitantes, enquanto a Metrópole possui apenas 39 milhões de pessoas”. Ao apresentar esse quadro da realidade colonialista da época, Ho Chi Minh procurou mostrar que as atenções dadas pelas políticas dos Partidos Comunistas das metrópoles não condiziam com a realidade prática das questões coloniais, pois os programas e plataformas desses partidos, no que se refere às possessões coloniais, estavam relegados à letra morta. E o delegado da tribuna do Congresso mostrou que essa orientação não correspondia à política defendida por Lênin. No trabalho de Lênin (1914) Sobre o Direito das Nações à Autodeterminação, o conceito de autodeterminação das nações é encarado como a separação estatal das coletividades nacionais estrangeiras, entendendo-se a formação de um Estado nacional independente. De fato, a partir de seus artigos sobre a questão colonial, Ho Chi Minh acabou por aportar uma importante contribuição ao estudo do colonialismo e às questões da luta pela libertação das nações do jugo colonial. O foco desses artigos era justamente a forma de exploração que acontecia naqueles países sob domínio não apenas da França, mas também de Inglaterra, Holanda, Portugal e Espanha, entre outros. Esses artigos foram selecionados e reunidos depois em dois livros: Bán án chê dô thúc dân Pháp (O julgamento do colonialismo francês, em tradução livre), publicado em 1925, e Dây công lý cúa thúc dân Pháp ò Dông Duon (Aqui está a Justiça do Colonialismo Francês na Indochina, em tradução livre). Neles, Ho Chi Minh (2011, p. 243) estudou a natureza e a violência das leis com as quais o colonialismo operava nas colônias:

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Ho Chi Minh

A história de todas as conquistas coloniais foi escrita do começo ao fim com o sangue das populações nativas. E as colônias são a concretização da forma bárbara e sem piedade com que os colonialistas se impuseram sobre milhões de nativos. E continua sua análise da seguinte maneira: Boa parte da força vital do capitalismo internacional advém das colônias, onde o capitalismo explora as riquezas naturais, onde eles investem, vendem suas mercadorias de consumo, recrutam os trabalhadores por baixos salários e ainda constituem com eles suas forças militares contrarrevolucionárias. O mais importante nesse esforço teórico de Ho Chi Minh foi deslindar um tipo de análise que se difundia entre os dirigentes dos partidos comunistas da Europa, especialmente no que se refere às relações entre o que concebiam como tarefas do chamado proletariado dos países centrais e as tarefas do proletariado dos países coloniais. Segundo Ho Chi Minh, o imperialismo havia desenvolvido uma estratégia de dominação do proletariado das Metrópoles e também de controle do movimento operário nas colônias. E desse modo mostrou que o colonialismo não se tratava de um inimigo apenas das nações oprimidas, mas também de um inimigo das classes operárias das próprias metrópoles coloniais. Com base nessa análise, Ho Chi Minh criticou fortemente a posição de vários partidos comunistas europeus – como já foi referido acima – de subestimação generalizada da questão colonial, e a pouca atenção que se costumava dar, à época, aos problemas da revolução nas colônias. A crítica mais severa feita por ele (p. 274), nesse 5º Congresso da Internacional Comunista, entretanto, ocorreu quando acusou os partidos comunistas europeus de subestimarem a importância da luta anticolonial para a correlação de forças internacional: Discutindo a possibilidade e os meios para realizar a revolução, preparando o seu plano de guerra, vocês, camaradas ingleses e franceses, e vocês também, camaradas de outros países, perderam completamente de vista esse importante ponto estratégico. Por isso, grito aqui com todas as minhas forças: cuidado! Neste sentido, Ho Chi Minh contrastou a tese do Manifesto da Inter-

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Introdução

nacional Comunista dirigida aos proletários de todo o mundo em 1919, quando afirmou: A emancipação das colônias é possível apenas com a conjugação articulada da emancipação da classe trabalhadora das metrópoles. Os trabalhadores e camponeses não somente da região de Anam, da Argélia e de Bengali, mas também da Pérsia e da Armênia conquistarão sua oportunidade de conquistar a independência somente quando os trabalhadores da Inglaterra e da França derrubarem Lloyd George e Clemanceau e tomarem o poder com suas próprias mãos (RAKOVSKY et al, 1919, p. 32). Sobre essa posição da Internacional Comunista, Ho Chi Minh (2011, p. 275) argumentou que a emancipação vietnamita somente poderia ser vitoriosa a partir dos próprios esforços dos vietnamitas. E afirmou: Se a revolução nacional do Vietnã conquista a vitória, os capitalistas franceses se enfraquecerão, e desta maneira ficará mais fácil para os trabalhadores franceses e os camponeses conquistarem sua própria revolução. Em 1945, o Japão se rendeu aos Aliados, e se apresentou a oportunidade para a revolução no Vietnã. A partir desse momento, Ho Chi Minh (V Internacional Comunista, p. 554) conclamou a Nação para que todos se colocassem de pé e utilizassem sua força para conquistar a emancipação. Sua conclusão a respeito das perspectivas da luta emancipatória na Indochina o levou ao seguinte apelo às forças que pretendiam a libertação do país no Congresso de fundação do Partido Comunista do Vietnã: A opressão desumana e a exploração perpetrada pelo imperialismo francês tornaram claro para nossos irmãos vietnamitas que se houver uma revolução eles poderão viver, mas sem a revolução será impossível continuar vivo. Como resultado disso, o movimento revolucionário poderá se tornar mais forte a cada dia que passa (2011, p. 9). Assim Ho Chi Minh proclama em seu testamento político: “O meu último desejo é que todo o nosso Partido e todo o nosso povo se unam e lutem pela edificação de um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero, e que contribuam dignamente para a causa revolucionária mundial”. 45


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BIBLIOGRAFIA BORTON, Lady. Ho Chi Minh, a Journey. The Gioi Publishers. 2009 CPV, 85 Years of the Communist Party of Vietnam (1930-2015) The Gioi Publishers, Hanói. 2015 GIAP, Vo Nguyen. Ho Chi Minh Thought and the Revolutionary Path of Viet Nam, Hanoi, 2011. _____. History of Vietnam, Questions and Answers. The Gioi Publishers, 2018 HO CHI MINH. Obras Completas. Hanoi: National Political Publishing House, 1995. _____. Revista soviética Problemas da Ásia. Moscou, 1960. LENIN, Vladimir Ilitch. La Lucha de los Pueblos de las Colonias y Paises dependientes contra el Imperialismo, 1979. LINH, Do Hoang & DUONG, Nguyen Van. President Ho Chi Minh’s Foreign Activities. The Gioi Publishers, 2014 LOSURDO, Domenico. A linguagem do Império. São Paulo: Boitempo, 2010. MACMILLAN, Margareth. A Conferência de Versalhes. Paris, 2003. McNAMARA, Robert. In Retrospect The Tragedy and Lessons of Vietnam. Vintage Books, 1995 NICOLSON, Harold. O Tratado de Versalhes (A Study in Allied Unity: 1812-1822), 1946. RAKOVSKY et al. Sobre a Internacional. Moscou, 1919. THANH, Song. Ho Chi Minh, A Brilliant Thinker. Hanoi: The Gioi Publishers, 2012. TRANG, Nguyen Dai. Escritos de Ho Chi Minh, Sobre paz, democracia e igualdade de gênero. Ciudad de México. 2019 VIZENTINI, Paulo Fagundes. A Revolução Vietnamita. São Paulo: Unesp, 2007. XANH, Pham. Ho Chi Minh, the Nation and the Times. Hanoi: The Gioi Publishers, 2008.

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CRONOLOGIA

1890: Em 19 de maio nasce numa aldeia vietnamita da província de Nghê An, filho de um professor rural, seu nome verdadeiro era Nguyen Sinh Cung, mas também foi chamado de Nguyen Tat Thanh, Nguyen Ai Quoc e Ly Thui, somente mais tarde seria mundialmente conhecido como Ho Chi Minh (ou “aquele que ilumina”). 1858 a 1884 – Primeira invasão do Exército francês até a consolidação da ocupação francesa do Vietnã. 1859 até 1930 – Inúmeras tentativas vietnamitas de resistência ao colonialismo francês, todas elas infrutíferas. 1911 – Ho Chi Minh deixa o Vietnã numa viagem pelo mundo em busca da salvação nacional de seu país. Ele viaja para a França, tendo visitado várias colônias francesas na África. Visitou os Estados Unidos e muitos países latino-americanos, inclusive o Brasil. Foi também para a Inglaterra, a Alemanha e Rússia, e em seguida retornou para a França. 1914 a 1919 – Nguyen Ai Quoc testemunhou a Primeira Guerra Mundial imperialista e a redivisão dos territórios coloniais. Conheceu a exploração capitalista. 1919 – Nguyen Ai Quoc filiou-se ao Partido Socialista Francês. Teve, então , a oportunidade de estudar a teoria social, as revoluções francesa e norte americana, a Comuna de Paris e a Revolução de Outubro, na Rússia. Em junho de 1919 apresentou uma plataforma de 8 pontos durante a Conferência de Paz em Versalhes.

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Ho Chi Minh

CRONOLOGIA 1920 – Nguyen Ai Quoc tem acesso ao texto de Lênin – Teses Sobre a Questão Colonial e Nacional – publicado no jornal L’Humanité, órgão do Partido Socialista Francês que teve profundo impacto em suas convicções políticas. Em dezembro deste mesmo ano, Nguyen Ai Quoc participa do 18º Congresso do PSF no qual foi fundado o Partido Comunista Francês (PCF), tornando-se o primeiro comunista vietnamita. 1921 a 1925 – Em França, Nguyen Ai Quoc funda a União das Colônias e em 1922 publica o jornal Le Paria, como editor-chefe. Em 1923 Nguyen viaja para a União Soviética iniciando o processo que o levaria de volta à sua terra natal, o Vietnã. 1924 – Nguyen Ai Quoc viaja para a China, e se instala na cidade de Cantão. Juntamente com outros revolucionários da Ásia – da própria China, da Coreia, da Índia, Tailândia, Indonésia e Malásia –, funda a Associação dos Povos Oprimidos da Ásia. 1925 – Nguyen Ai Quoc constituiu a Associação da Juventude Revolucionária do Vietnã, que se tornou o embrião do futuro Partido Comunista do Vietnã. 1925 – Nguyen Ai Quoc publica seu livro O colonialismo francês no tribunal . Foi o primeiro texto teórico sobre a revolução, contribuindo para a propaganda do marxismo-leninismo no Vietnã. 1927 – Publica-se o livro reunindo as palestras de Nguyen Ai Quoc em Cantão, na escola de quadros políticos, sob o título O caminho revolucionário, detalhando a estratégia e tática da Revolução no Vietnã. 1927 a 1930 – A Associação da Juventude Revolucionária do Vietnã, o livro O Caminho revolucionário e outros documentos marxistas obtiveram um grande impacto na intelectualidade patriótica e no movimento operário vietnamita. Foi desencadeada a preparação ideológica, política, teórica e organizativa para a criação de um partido de tipo novo, um partido proletário, no Vietnã. Em 1929 foi fundado o Partido Comunista de Annam (na região Central do país). 1930 – Em janeiro, o Partido Revolucionário Tan Viet decidiu fundar a União Indochinesa dos Comunistas. A existência destas 3 ultimas organizações comunistas foi um grande impulso para depois unificar o movimento comunista. Foi então que Nguyen Ai Quoc passou a organizar esta unificação para a fundação, em 1930, do Partido Comunista do Vietnã. Na plataforma deste partido, estava gravado que seu objetivo deveria ser “Levar adiante a revolução democrática burguesa e a revolução agrária, para eventualmente conquistar a sociedade comunista”.

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Cronologia

1930 a 1931 – O PCV que atuava na clandestinidade – e por isso teve de se reunir em Hong Kong – passou a ser violentamente perseguido no Vietnã. Dezenas de milhares de patriotas e comunistas foram presos, encarcerados e mortos ( inclusive 8 membros do Comitê Central). 1931 – Ho Chi Minh foi preso em junho pela polícia de Hong Kong a pedido da França. O prisioneiro se defende com o apoio dos advogados britânicos Francis Loseby (1883-1967) e Francis Jenkin (1912-1967). Ho apela ao Tribunal Supremo Privado da Corte, o mais alto tribunal britânico naquela ocasião. O advogado Denis Noel Pritt (1887-1972) e o senhor Stafford Cripps (18891952) conseguem, enfim, libertá-lo. 1932 – Em junho foi publicado um programa de ação para os comunistas indochineses e a organização partidária recuperou o seu vigor nas 3 principais regiões do país. 1935 – Foi realizado o primeiro Congresso Nacional do PCV. Em março deste ano, a Frente Popular da França foi vitoriosa na França – com a participação do Partido Comunista, do Partido Social, e do Partido Socialista Radical – que elegeu Leon Blum para o cargo de Primeiro-Ministro. Esse fato implicou mudanças necessárias na estratégia e tática dos comunistas vietnamitas. 1936 – O novo governo tentou implementar mudanças importantes na política externa da França, como por exemplo a libertação dos presos políticos nas colônias, entre outras medidas de caráter social para os trabalhadores. 1936 – O Partido volta à legalidade, com o regime de Frente Popular na França. 1939 – Os revolucionários vietnamitas voltam à clandestinidade com a queda do regime progressista. Em setembro deste ano a Alemanha invade a Polônia dando início à Segunda Guerra Mundial. 1940 – Tropas do Exército japonês atacam Lang Son (uma província fronteiriça do Vietnã). Resistência se levanta em algumas províncias contra o Japão. 1941 – Criação do Movimento Viet Minh em Bac Bo (ao norte do Vietnã). Nguyen Ai Quoc retorna ao Vietnã e se estabelece em Cao Bang (província vietnamita da fronteira com a China). 1942 – As contradições no Vietnã entre a França e o Japão se tornam críticas. Nguyen Ai Quoc propõe ao Partido uma Frente Aliada pela Independência Nacional. 1943 – Início da agitação política no Vietnã do Norte.

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CRONOLOGIA 1944 a 1945 – O Exército Vermelho da União Soviética liberta Leningrado do Exército nazista. Em dezembro deste mesmo ano o General Vo Nguyen Giap passa a ser o comandante do Exército de Libertação do Vietnã. A Segunda Grande Guerra entra em sua fase final com o avanço das tropas soviéticas na Alemanha e a derrota do Japão no Pacífico. 1945 – O Exército japonês dá um golpe na ocupação francesa e abre caminho para a libertação do próprio Vietnã. O Exército de Libertação do Vietnã prepara o levante nacional pela Independência. 1945 – O Exército Vermelho da URSS toma Berlim e a Alemanha se rende incondicionalmente aos aliados. Em agosto o Exército Vermelho derrota o Japão na Manchúria. 1945 – Em setembro, na praça de Ba Dinh (Hanói) centenas de milhares de vietnamitas assistem a proclamação pelo presidente Ho Chi Minh – como passou a ser chamado desde então – da Declaração de Independência, anunciando o nascimento da República Democrática do Vietnã. 1945 – Os japoneses derrubam o regime francês no Vietnã. Segue-se a capitulação do Japão diante das bombas atômicas lançadas pelos EUA em Hiroshima e Nagasaki. O Viet Minh forma um governo provisório em Hanói e ocorre a dissolução do Partido Comunista da Indochina. 1946 – Intensa negociação entre Ho Chi Minh e a França em torno de uma Federação Indochinesa como Estado associado à União Francesa. Acordos são rompidos e reiniciadas as hostilidades. Para consolidar o poder no Vietnã independente são realizadas eleições em todo o país para a eleição da nova Assembleia Nacional da República Democrática do Vietnã. Em novembro é aprovada a primeira Constituição da República Democrática. 1950 – A França é derrotada nas batalhas de Lang Son e Cao Bang e a República Popular da China reconhece o governo liderado por Ho Chi Minh no Vietnã. 1951 – Ho Chi Minh apresentou um informe político no Congresso Nacional de Representantes e o Secretário-Geral Truong Chinh leu seu ensaio sobre a Revolução Vietnamita. O nome do Partido foi alterado para Partido dos Trabalhadores do Vietnã – Lao Dong – e o Congresso decidiu que tanto o Laos quanto o Camboja deveriam estruturar seus próprios Partidos. Assim o Partido Comunista da Indochina deixou de existir.

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Cronologia

1953 – O Partido dos Trabalhadores do Vietnã designou o general Vo Nguyen Giap comandante da campanha para expulsar os colonialistas franceses do Vietnã. Durante dois anos, o general francês Henri Navarre construiu uma base na região de Dien Bien Phu que servisse de apoio a todas as operações aéreas e terrestres no Vietnã. Da mesma forma – e com planos diametralmente opostos – o general Giap organizou várias linhas de transporte clandestinos na selva, tendo o objetivo de implantar uma sólida rede de artilharia nas montanhas que circundavam a base francesa. No dia 7 de maio de 1954, foi então desencadeada a ofensiva das forças vietnamitas, que por 55 dias seguidos bombardearam a base do exército francês, destruindo as pistas de pouso dos aviões e as instalações de apoio do Exército francês. Durante a batalha, milhares de soldados foram presos e mortos na que se constituiu a maior derrota militar francesa no sudeste asiático. 1954 – Tem início a Conferência de Genebra sobre a Indochina no dia 8 de maio e em 21 de julho foram assinados os acordos de cessação de hostilidades no Vietnã, Laos e Camboja. Durante a Conferência foi acordado também que o Vietnã seria temporariamente dividido em dois, no paralelo 17. Ao norte o país seria administrado pelo governo da República Democrática do Vietnã, e a parte ao Sul ficaria sob controle do governo submisso a forças do Exército dos Estados Unidos, que tinha interesse em substituir as forças colonialistas francesas na região. 1954 – No mês de agosto, o Conselho de Segurança Nacional dos EUA sob o comando do Presidente Eisenhower decidiu invadir o Vietnã para apoiar o governo sulista de Ngo Dinh Diem e do Imperador Bao Dai. 1955 a 1959 – Em apenas quatro anos, nove ou dez dos membros do Partido no Vietnã do Sul foram mortos ou presos, restando 5 mil dos 60 mil militantes partidários. Ao final de 1955, 466 mil pessoas foram presas, das quais 400 mil se tornaram presas políticas e 66 mil foram assassinadas. 1959 – Em janeiro o Partido dos Trabalhadores vietnamita decidiu que a principal tarefa do Partido seria libertar o Vietnã do imperialismo e do regime feudal. 1961 – O presidente John F. Kennedy foi eleito e defendeu uma nova estratégia militar para seu governo: “Resposta flexível”. A guerra do Vietnã foi encarada como “guerra especial”. Essa guerra seria caracterizada pelo uso de conselheiros militares e armamento pesado. O trabalho duro seria realizado pelas tropas locais. Com essa política, os estadunidenses esperavam acabar com a guerra em 18 meses.

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Ho Chi Minh

CRONOLOGIA 1963 a 1965 – Um Comando Especial para liderar a guerra ao sul do paralelo 17 foi constituído pelo Comitê Central do Partido no Vietnã. Doze mil comunidades das 17 mil existentes foram libertadas do domínio do Exército sulvietnamita em coordenação com o exército dos EUA. Cinco milhões de pessoas dos 14 milhões da população sul-vietnamita escaparam do controle reacionário das tropas do governo lacaio de Saigon. 1963 – Em função das contradições internas do governo títere, o general sul-vietnamita Duong Van Minh liderou um golpe contra o seu presidente Ngo Dinh Diem, que foi assassinado junto com seu irmão. Em novembro deste ano, o presidente estadunidense John Kennedy também foi assassinado na cidade de Dallas, nos EUA. O vice presidente Lyndon Johnson assume o governo e dá continuidade à guerra especial no Vietnã. 1964 – Aviação norte-americana ataca bases aeronavais no Vietnã do Norte. Lyndon Johnson é reeleito presidente dos EUA e U Thant secretário-geral da ONU propõe negociações de paz. Hanói aceita negociar e Washington rechaça os contatos para a negociação. 1965 – Bombardeios sistemáticos dos aviões americanos B-52. Desembarque em massa de forças armadas americanas no Vietnã. 1966 – Missões de paz foram enviadas a Hanói e Ho Chi Minh condiciona as negociações ao fim dos bombardeios americanos. 1967 – Tropas americanas atingem o número de meio milhão de homens em campos de batalha. Hanói aceita negociar com Washington. A revolta popular liderada pelos universitários nos EUA ganha repercussão internacional. Os meios de comunicação nos EUA passam a transmitir batalhas ao vivo, envolvendo a opinião pública contra a guerra. 1968 – De janeiro a agosto foi desencadeada a chamada Ofensiva do Tet, em que as tropas da Frente de Libertação Nacional enfrentaram 150 mil soldados sul-vietnamitas e mais de 40 mil americanos. Foram atacados 30 campos de pouso de aviões americanos e centenas de cidades, inclusive 5 grandes centros populacionais. Esta ofensiva teve um impacto poderoso nos Estados Unidos e em todo o mundo. 1969 – Richard Nixon tornou-se presidente dos EUA e resolveu colocar em ação um novo plano para o Vietnã: o processo de vietnamização da guerra. Desta forma foi fortalecido o exército sul-vietnamita e incrementado o volume de material bélico despachado para a península indochinesa.

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Cronologia

1969 – Em 3 de setembro, falece Ho Chi Minh em Hanói. Ele não viveu para assistir a vitória de um pequeno país sobre a maior potência militar do Planeta, o Exército dos Estados Unidos foi derrotado em 1975. 1975 – Cai o domínio americano em Saigon e termina a Guerra. 1976 – O Vietnã se reunifica. 1987 – A Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – promulgou uma resolução afirmando Ho Chi Minh como “Herói libertador do povo vietnamita e um homem de cultura para a Paz”.

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Textos de Ho Chi Minh

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Textos

Reivindicações do povo anamita Escrito para ser apresentado durante a Conferência de Paz de Paris em 1919, após a Primeira Guerra Mundial

Depois da vitória dos Aliados, todos os povos escravizados vibram de esperança diante da perspectiva da era do direito e da justiça que deve se abrir para eles em virtude dos compromissos formais e solenes tomados diante do mundo inteiro pelas diferentes potências da Entente na luta da civilização contra a barbárie. Na esperança de que o princípio das nacionalizações passe do domínio do ideal ao da realidade pelo reconhecimento efetivo do direito sagrado, para os povos, de dispor de si próprios, o povo do antigo império de Anam, hoje Indochina Francesa, apresenta aos respeitáveis governos da Entente, em geral, e ao respeitável governo francês, em particular, as seguintes humildes reivindicações: 1) Anistia geral em favor de todos os presos políticos vietnamitas, (ou anamitas como eram chamados. N.T.); 2) reforma da justiça indochinesa pela concessão aos nativos das mesmas garantias jurídicas que aos europeus e a supressão completa e definitiva dos Tribunais de Exceção que são instrumentos de terrorismo e de opressão contra a parte mais honesta do povo anamita; 3) liberdade de imprensa e de opinião; 4) liberdade de associação e de reunião; 5) liberdade de emigração e de viajar pelo estrangeiro; 6) liberdade de ensino e criação, em todas as províncias, de escolas de ensino técnico e profissional no hábito dos habitantes locais; 7) substituição do regime de decretos pelo regime de leis; 8) delegação permanente de anamitas eleitos junto do Parlamento francês para o ter à corrente das necessidades dos povos naturais da região. Às nossas reivindicações, juntamos as homenagens aos povos e aos sentimentos humanistas. Mas, ao fim de um tempo de espera e de estudo, apercebemo-nos de que a “doutrina de Wilson” não era mais do que uma mistificação. A libertação do proletariado é a condição necessária da libertação nacional. E ambos só poderão ser o resultado do comunismo e da revolução mundial. Fonte: Arquivo da Internet de Ho Chi Minh (marxist.org)

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Ho Chi Minh

Discurso no Congresso de Tours Pronunciado por Ho Chi Minh durante o 18º Congresso do PSF, na cidade de Tours em 26 de dezembro de 1920

O presidente: “A palavra à Indochina”. [Aplausos] O delegado da Indochina: “Camaradas, gostaria de vir hoje colaborar convosco na obra da revolução mundial, mas é com a maior tristeza e a mais profunda desolação que eu venho hoje, como socialista, protestar contra os crimes abomináveis cometidos em meu país de origem”. [Muito bem!] “Sabeis que há meio século o capitalismo francês se estabeleceu na Indochina. Ele nos submeteu com a ponta das baionetas e em nome do capitalismo. Desde então, não só somos vergonhosamente oprimidos e explorados, como também terrivelmente martirizados e envenenados pelo ópio, pelo álcool etc. É impossível, em alguns minutos, mostrar-lhes todas as atrocidades cometidas na Indochina pelos bandidos do capital. Mais numerosos do que as escolas, as prisões estão sempre abertas e horrivelmente povoadas. Todo indígena conhecido por ter ideias socialistas é aprisionado e por vezes fuzilado sem julgamento. É a tal justiça dita indochinesa, pois lá funcionam dois pesos e duas medidas; os anamitas não têm as mesmas garantias que os europeus ou os europeizados. A liberdade de imprensa e de opinião não existe para nós, assim como a liberdade de reunião ou de associação. Não temos o direito de emigrar ou de viajar para o estrangeiro, vivemos na mais brutal ignorância, pois que não temos a liberdade de ensino. Na Indochina, faz-se tudo o que se pode para nos intoxicar com o ópio e para nos embrutecer com o álcool. Morreram vários milhares de anamitas e muitos milhares de outros foram massacrados por defenderem interesses que não são os deles. Eis, camaradas, como mais de vinte milhões de anamitas, que equivalem a mais da metade da população da França, são tratados. E, contudo, esses anamitas são protegidos da França. [Aplausos] O Partido Socialista deve cumprir uma ação eficaz de apoio aos nativos oprimidos”. Jean Longuet: “Intervenho para defender os indígenas”. O delegado da Indochina: “Impus, no início, a ditadura do silêncio... [Risos] O Partido deve fazer uma propaganda socialista em todas as colônias. Vimos na adesão à III Internacional a promessa formal do Partido Socialista em dedicar, finalmente, às questões coloniais, a importância que elas merecem. Temo-nos sentido muito felizes por participar na criação de uma

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delegação permanente para a África do Norte e amanhã sentir-nos-emos felizes se o Partido enviar um camarada socialista para estudar no próprio local, na Indochina, os problemas que se apresentam e a ação a conduzir”. Um delegado: “Com o camarada Enver Pacha?” O delegado da Indochina: “Silêncio, parlamentares!” [Aplausos] O presidente: “E agora silêncio aos outros delegados, mesmo não parlamentares!” [Aplausos] O delegado da Indochina: “Em nome de toda a humanidade, em nome de todos os socialistas, os da direita e os da esquerda, nós lhe dizemos: camaradas, salvai-nos!” [Aplausos] O presidente: “O representante da Indochina pode ver, pelos aplausos que lhe foram enviados, que o Partido Socialista por inteiro está com ele para protestar contra os crimes da burguesia”. Extraído do processo verbal estenografado do 18º Congresso do PSF

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Indochina Dizer que este país – com a população de mais de 20 milhões de explorados – está prestes hoje a uma grande revolução, é falso. Mas dizer que não a deseja e está contente com o regime – como pretendem os nossos patrões – seria ainda mais falso. A verdade é que o indochinês não possui nenhum meio de educação e de ação. A imprensa, as reuniões, as associações, as viagens são-lhes interditadas. A posse de jornais ou de periódicos estrangeiros que têm ideias um pouco avançadas ou de um jornal pertencente à classe operária francesa é um verdadeiro crime. O álcool e o ópio completam a obra do obscurantismo governamental, assim como a imprensa vendida colonial, a soldo dos dirigentes. A guilhotina e a prisão fazem o resto. Assim, envenenados moral e fisicamente, amordaçados e subjugados, ter-se-ia podido crer que este rebanho humano está para sempre destinado ao altar do bom deus capitalista, que já não vive, que não pensa e não influencia em nada na transformação social. Não! O indochinês não está morto, ele ainda vive, ele sempre viveu. O envenenamento sistemático do capitalista colonial não chega a ponto de matar toda a sua vitalidade e menos ainda a sua consciência. Os ventos vindos da Rússia proletária, da China revolucionária ou da Índia combatente curam-no da intoxicação. Ele não se educa – é uma verdade – por livros ou por discursos, mas recebe a sua educação de outra forma. O sofrimento, a miséria e a opressão brutal são os seus únicos mestres e, se os socialistas negligenciam em dar-lhe educação, a burguesia colonial e indígena – os mandarins – ocupam-se afetuosamente dela. Ele progride maravilhosamente e saberá, quando a ocasião lhe permitir, mostrar-se digno dos seus mestres. Sob a máscara de uma docilidade passiva, esconde algo que ferve, que cresce e que, chegado o momento, explodirá formidavelmente. É a hora de apressar este momento. A tirania do capitalismo preparou o terreno, o socialismo não tem mais a fazer senão lançar neste campo fértil a semente da emancipação. Trechos de um artigo de Nguyen Ai Quoc, publicado na revista soviética Comunista, n. 14, de 1921

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Manifesto da “União Intercolonial” Associação dos nativos de todas as colônias, fundada na década de 1920, tendo como órgão o jornal O Pária do qual Ho Chi Minh se tornou editor-chefe

Irmãos das colônias! Em 1914, os poderes públicos, envolvidos com um terrível cataclismo, voltaram-se para vós e vos pediram então o vosso quinhão de sacrifício para a salvaguarda de uma pátria que diziam ser vossa e da qual, até então, não conhecíeis senão o espírito do domínio. Para convencer-lhes, não deixaram de acenar aos vossos olhos com as vantagens que a vossa colaboração proporcionaria. Porém, passada a tormenta, vós permaneceis como antes submetidos ao regime do indigenato, aos Tribunais de Exceção, privados de direitos que compõem a dignidade da pessoa humana: liberdade de associação e de reunião, liberdade de imprensa, direito de circulação, mesmo no vosso país; isto pelo lado político. No aspecto econômico, vós permaneceis submetidos ao impopular e pesado imposto de capitação e de portagem, ao imposto sobre o sal, ao envenenamento e ao consumo forçado de álcool e do ópio, como na Indochina, à vigília noturna, como na Argélia, para velar pelos bens dos tubarões coloniais. Em trabalho igual, os vossos esforços são ainda menos remunerados que os dos vossos camaradas europeus. Enfim, prometeram-vos mundos e fundos. Vós apercebei-vos agora de que não eram senão mentiras. O que é preciso fazer para chegar à vossa emancipação? Aplicando a fórmula de Karl Marx, nós vos dizemos que a vossa libertação não pode vir senão através dos vossos próprios esforços. É para vos auxiliar nesta tarefa que a União Intercolonial (UI) foi fundada. Ela agrupa, com o concurso de camaradas metropolitanos simpatizantes da causa, todos os originários das colônias, residentes na França. Meios de ação: para realizar esta obra de justiça, a UI pretende colocar o problema diante da opinião pública, com o auxílio da imprensa e pela palavra (conferências, comícios, utilização das tribunas das assembleias deliberativas, pelos nossos amigos detentores de mandatos eletivos) e, enfim, por todos os meios ao nosso alcance. Irmãos oprimidos da metrópole! Logrados pela vossa burguesia, vós fostes os instrumentos da nossa conquista. Praticando essa mesma política maquiavélica, vossa burguesia pretende hoje servir-se

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de nós para reprimir na vossa terra toda a veleidade de libertação. Face ao capitalismo e ao imperialismo, nossos interesses são idênticos. Lembrai-vos das palavras de Marx: “Proletários de todos os países, uni-vos!” A União Intercolonial Trecho do livro de Nguyen Ai Quoc O processo da Colonização Francesa, de 1921-1925.

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Algumas considerações sobre a Questão Colonial Publicado no jornal Le Paria em 1° de julho de 1922

Desde que o Partido Socialista Francês aceitou as “21 condições” de Moscou e se integrou à III Internacional, há entre os problemas que surgiram um de especial delicadeza: a política colonial. Diferentemente da I e da II Internacional, ele não pode ser resolvido com expressões de posicionamento puramente sentimentais que não levam a nada. Ele deve ter um programa de trabalho bem-definido, uma política prática e efetiva. Nesse ponto, mais do que em outros, o Partido se depara com várias dificuldades, sendo as maiores delas as seguintes: 1. A enorme extensão das colônias Contando agora com os novos “protetorados” adquiridos após a guerra, a França possui: 450.000 km² na Ásia, 3.541.000 km² na África, 108.000 km² na América e 21.600 km² na Oceania, totalizando 4.120.000 km² (oito vezes seu território) e uma população de 48 milhões de habitantes. Essas pessoas falam mais de vinte línguas diferentes e a diversidade traz dificuldades para a propaganda. À exceção de algumas antigas colônias, um propagandista francês necessita de um intérprete para se fazer entender. Entretanto, as traduções têm um valor limitado, e nesses países de despotismo administrativo é um tanto difícil encontrar um intérprete para traduzir discursos revolucionários. Existem outras inconveniências: embora os nativos de todas as colônias sejam igualmente oprimidos e explorados, seu desenvolvimento intelectual, econômico e político difere fortemente de uma região para outra. Entre Anam e o Congo, Martinica e Nova Caledônia, não há nada em comum, exceto a pobreza. 2. A indiferença do proletariado das metrópoles perante as colônias Em suas teses sobre a questão colonial, Lênin afirma claramente que “os trabalhadores dos países colonizados estão propensos a dar o mais forte

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apoio aos movimentos de libertação dos países dominados”. Para isso, os trabalhadores da metrópole devem saber o que é realmente uma colônia, devem estar cientes sobre o que de fato acontece por lá e do sofrimento – mil vezes mais intenso que o deles – imposto a seus irmãos, os proletários coloniais. Em resumo, eles devem se interessar pela questão. Infelizmente, existem militantes que ainda pensam que colônia é nada mais do que um país com um monte de areia para andar e de sol para queimar a cabeça, mais algumas poucas palmeiras e pessoas de cor, e só. E eles não demonstram o menor interesse pelo assunto. 3. A ignorância dos nativos Nos países colonizados – tanto na velha Indochina como no novo Daomé –, a luta de classes e a força proletária são fatores desconhecidos pela simples razão de que lá não existem grandes indústrias ou empresas comerciais, nem organizações de trabalhadores. Aos olhos dos nativos, o bolchevismo – uma palavra bastante vívida e expressiva por ser frequentemente utilizada pela burguesia – significa tanto a destruição de tudo como a emancipação do domínio estrangeiro. A primeira acepção da palavra afugenta a massa ignorante e temerosa de nós; a segunda os orienta rumo ao nacionalismo. Ambos os sentidos são igualmente perigosos. Apenas uma pequena fração da elite intelectual sabe o que significa comunismo. Mas essa nata, por pertencer à burguesia nativa e apoiar os colonizadores burgueses, não tem interesse de que a doutrina comunista seja entendida e disseminada. Pelo contrário. Como o cachorro da fábula, eles preferem ornar uma coleira e ter seu pedaço de osso. Generalizando, as massas são profundamente rebeldes, mas completamente ignorantes. Elas querem se libertar, mas não sabem como. 4. Preconceitos A mútua ignorância dos dois proletariados resulta em preconceitos. Os trabalhadores franceses veem os nativos como humanos inferiores e insignificantes, incapazes de entender e muito menos de agir. Os nativos consideram todos os trabalhadores franceses como exploradores perversos. O imperialismo e o capitalismo não hesitam em tirar vantagem dessa desconfiança mútua e dessa hierarquia racial artificial para frustrarem a propaganda e dividirem as forças que deveriam se unir. 5. Ferocidade de repressão Os colonizadores franceses podem não ter a habilidade de ampliar seus

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recursos coloniais, mas são mestres na arte da repressão selvagem e na sustentação de uma lealdade feita para quem os serve. Os Gandhis e os De Valeras teriam ido para o paraíso há muito tempo se tivessem nascido numa das colônias francesas. Cercado por todos os refinamentos de cortes marciais e tribunais especiais, um militante nativo não pode educar seus irmãos oprimidos e ignorantes sem correr o risco de cair nas garras de seus civilizadores. Frente a tais dificuldades, o que o Partido deve fazer? Intensificar a propaganda para superá-los. Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 1, Foreign Languages Publishing House.

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Os civilizadores 1º de julho de 1922

Sob o título de Piratas coloniais, nosso camarada Victor Meric nos contou sobre a incrível crueldade perpetrada por um administrador francês nas colônias: derramou borracha derretida na genitália de uma pobre mulher negra. Depois a fez carregar uma enorme pedra sobre a cabeça debaixo do sol escaldante, até que ela morreu. O sádico oficial continua com seus abusos, agora em outro distrito, mas ainda com a mesma patente. Infelizmente, tais atos abomináveis não são raros, o que a prezada imprensa chama de “França ultramarina”. Em março de 1922, um oficial de alfândega, em Baria (na Cochinchina), simplesmente decretou a morte de uma carregadora de sal anamita[1] porque esta perturbou sua sesta ao fazer barulho do lado de fora da varanda de sua casa. O pior disso é que a mulher foi ameaçada de demissão do pátio de construção onde trabalhava caso ela registrasse uma reclamação. Em abril, outro oficial de alfândega que assumiu o lugar do oficial mencionado acima provou estar à altura de seu predecessor em matéria de brutalidade. Uma velha anamita, também carregadora de sal, teve uma discussão com uma supervisora a respeito da suspensão de parte dos seus ganhos. Ao ouvir a reclamação da supervisora, o oficial, com frieza, assumiu a queixa e deu dois fortes tapas no rosto da carregadora. Enquanto a pobre mulher se curvava para pegar seu chapéu, o civilizador, não satisfeito com os tapas que acabara de lhe dar, chutou furiosamente a parte inferior de seu abdômen, provocando-lhe de imediato uma intensa hemorragia. Quando a infeliz anamita caiu no chão, o colaborador do senhor Sarraut[2], ao invés de socorrê-la, chamou o prefeito da vila para levá-la embora. Mas este nobre indivíduo se recusou. Então o oficial chamou o marido da vítima, que era cego, e ordenou-lhe que levasse a esposa dali. A pobre senhora está agora no hospital. É estranho como, da mesma forma que seu colega administrador na África, nossos dois oficiais de alfândega não ficaram preocupados. Eles podem até mesmo receber uma promoção.

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Notas do Tradutor: [1] Anamita é a pessoa natural da região de Anam, no centro do Vietnã. [2] Sarraut foi Governador-geral da Indochina entre 1912 e 1919 e Ministro das Colônias entre 1920 e 1924. Posteriormente, foi primeiro-ministro da França em duas ocasiões.

Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 3, Hanoi: Foreign Languages Publishing House, 1960-1962.

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Mulheres anamitas e a dominação francesa Colonização por si só é um ato de violência contra o mais fraco. Esta violência se torna ainda mais odiosa quando exercida sobre mulheres e crianças. É irônico descobrir que a civilização — simbolizada em suas várias formas, como, por exemplo, liberdade, justiça etc., pela imagem delicada da mulher e dirigida por homens bem conhecidos por serem campeões de galanteria — impõe ao seu emblema vivo o mais desprezível tratamento e a aflige vergonhosamente em suas maneiras, sua modéstia e até sua vida. O sadismo colonial é inacreditavelmente generalizado e cruel, mas nós devemos nos conter aqui para relembrar alguns exemplos vistos e descritos por testemunhas sem suspeita de parcialidade. Estes fatos permitirão que nossas irmãs ocidentais percebam a natureza da “missão civilizatória” do capitalismo e os sofrimentos das suas irmãs nas colônias. “Na chegada dos soldados”, relata um colono, “a população fugiu; permaneceram apenas dois homens e duas mulheres: uma solteira e uma mãe amamentando um bebê e segurando uma menina de oito anos pela mão. Os soldados pediram dinheiro, álcool e ópio”. “Como não conseguiam se fazer entender, ficaram furiosos e derrubaram um dos idosos a coronhadas de espingarda. Depois, dois deles, que já estavam bêbados quando chegaram, se divertiram por muitas horas ‘assando’ o outro idoso numa fogueira. Enquanto isso, os outros estupraram as duas mulheres e a menina de oito anos. Então, cansados, mataram a menina. A mãe, então, conseguiu escapar com seu bebê e, a cerca de 100 metros de distância, escondida em uma moita, assistiu sua companheira ser torturada. Ela não sabia por que o assassinato foi perpetrado, mas ela viu a jovem garota deitada de costas, amarrada e amordaçada e um dos homens, vagarosamente, enfiar muitas vezes a baioneta em seu estômago e, muito lentamente, retirá-la novamente. Então ele cortou o dedo da garota morta para pegar seu anel e sua cabeça para roubar seu colar. “Os três cadáveres ficaram no chão de um antigo pantanal: a menina de oito anos nua, a garota estripada, seu antebraço esquerdo enrijecido, com um punho cerrado levantado ao céu indiferente, e o idoso, horrível, nu como as outras, desfigurado pelo fogo com sua gordura correndo, derretida e grudada à pele de sua barriga, que estava inchada, grelhada e dourada, como a pele de um porco assado”. Publicado no jornal Le Paria, em agosto de 1922. Fonte: FALL, Bernard B. (ed.). Ho Chi Minh on Revolution Selected Writings, 1920-1966, p. 62.

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Civilização assassina! Há muito tempo, divulgamos por esta plataforma uma série de assassinatos perpetrados por nossos “civilizadores”, que continuam impunes. A sombria lista negra cresce a cada dia. Recentemente, um anamita de 50 anos, empregado há 35 no Departamento Ferroviário da Cochinchina, foi assassinado por um oficial branco. Aqui seguem os fatos. Le Van Tai tinha sob sua supervisão outros quatro anamitas que trabalhavam prevenindo os trens de cruzarem uma ponte enquanto ela estivesse elevada para a passagem de embarcações. A sua função era fechar a ponte para a navegação dez minutos antes de os trens passarem sobre ela. No dia 2 de abril, às 16h30, um dos anamitas foi fechar a ponte e abaixar a sinalização. Foi então que uma lancha do governo apareceu com um oficial naval das docas que retornava de uma caçada. A lancha apitou. O empregado nativo foi até a metade da ponte e acenou com uma bandeira vermelha para indicar ao barco que o trem estava para passar e que a navegação estava, desta forma, suspensa. Eis o que se sucedeu. A lancha se aproximou de um dos pilares da ponte. O oficial saltou e foi atrás do empregado anamita. Prudentemente, este fugiu em direção à casa de Tai. O francês o perseguiu, atirando-lhe pedras. Quando ouviu a agitação, Tai saiu da casa para se encontrar com o representante da civilização, que a ele se dirigiu assim: “Seu troglodita estúpido, por que não levantou a ponte?” Em resposta, Tai – que não sabia francês – apontou para o sinal vermelho. Este simples gesto deixou o colaborador do senhor Long irritado, que friamente saltou sobre Tai e, depois de longo espancamento, jogou-o dentro de um forno próximo. Terrivelmente queimado, o funcionário anamita foi levado ao hospital, onde morreu depois de seis dias de sofrimento atroz. O oficial francês não foi processado. Em Marselha, a prosperidade oficial da Indochina está em relevo; em Anam, as pessoas morrem de fome. Aqui a lealdade é louvada, lá assassinatos são perpetrados. O que vocês nos dizem disso, ó mil vezes grande Majestade Khai Dinh e Excelentissimo Sr. Sarraut? PS – Embora a vida de um anamita não valha um centavo, por um arranhão no braço, o senhor inspetor geral Reinhardt recebeu 120 mil francos como compensação. Igualdade! Amada igualdade! Publicado no jornal Le Paria, em agosto de 1922 Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 1, Foreign Languages Publishing House.

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O movimento dos trabalhadores do Extremo Oriente Osaka é um dos maiores centros industriais japoneses a permanecer intacto após o último terremoto. A desgraça de outros japoneses passou a ser a boa fortuna dos fabricantes desta cidade, que estão no momento aproveitando-se de uma prosperidade sem precedentes. Apesar do rápido aumento no custo de vida, que pesa severamente sob a magra renda dos trabalhadores, os salários permaneceram os mesmos após a catástrofe. Colocados nessa situação impossível e em face da recusa dos patrões de realizarem as melhorias exigidas, os trabalhadores das fábricas de algodão estão em greve desde o fim de novembro. As demandas da greve são: 1. Aumento de 20% nos salários; 2. Redução do preço das refeições oferecidas pela fábrica; 3. Melhorias nos refeitórios e vestiários; 4. Pagamento de 50% dos salários aos trabalhadores ausentes em decorrência de doença; 5. Recontratação dos trabalhadores recentemente demitidos. Recentemente trabalhadores da Oriental Hemp e Nagosi Co. obtiveram um aumento nos salários por meio de uma greve. Os da Senchu Co. obtiveram os mesmos ganhos assim que a greve foi comunicada ao corpo gestor. Outras empresas resistiram, alegando que, apesar do acúmulo de pedidos, não vêm conseguindo grandes lucros por conta do aumento do preço das matérias-primas e que, por outro lado, havendo pouca oferta de algodão em rama, não estariam de modo algum preocupados com a greve. De fato, estão tomados pelo pânico. Tiveram a cidade ocupada pela polícia local, reforçada por outras de cidades vizinhas. Eles tentaram enfraquecer o movimento ao prenderem o secretário-geral e muitos outros membros da Federação Sindical. Os resultados das tentativas dos patrões são nulos porque a greve continua sendo conduzida com a mesma energia que possuía em seu primeiro dia, e os trabalhadores estão decididos a continuar lutando até o fim.

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Eletricistas e mecânicos entraram em greve em solidariedade. Os trabalhadores das fábricas estatais prometeram usar todos os meios disponíveis para ajudar na luta dos seus camaradas. Com tal apoio, os grevistas estão cheios de ímpeto e não têm dúvida alguma da vitória. Na luta entre o capital e o trabalho no Extremo Oriente, ocorrem coisas estranhas que são impossíveis de se entender nos países ocidentais, mas que não deixam de realmente acontecer. Por exemplo, para impedir seus trabalhadores de se juntarem aos seus camaradas em greve, a Kishiwada Company simplesmente parafusou as portas de saída. A Knawada Eletrical Engineering Work, incapaz de chegar a um acordo com seu pessoal na questão dos salários, decidiu por um lock-out. Mas, antes de demitir os trabalhadores, pagou-lhes quatro dias inteiros de salário e mais dois de compensação! Greve antimilitarista Para quebrar a organização que os trabalhadores recentemente conseguiram, a gerência da Shuikaoshun Mines (China) chamou pelos soldados do general Chao. Imediatamente após sua chegada, os mesmos começaram a ocupar o sindicato dos trabalhadores. Para protestar contra esse ato da tropa, três mil mineiros espontaneamente entraram em greve. Eles cercaram os soldados e tentaram desarmá-los. Os soldados atiraram contra eles, ferindo diversos grevistas. A coisa foi além do que era desejado pela gerência, que então passou a pregar pela lei e pela ordem. Mas os mineiros responderam que retomariam os seus trabalhos apenas quando as compensações fossem garantidas para as vítimas, e suas demandas – compostas por nove cláusulas – fosse aceita. Publicado no jornal La Vie Ouvrière, em janeiro de 1924 Fonte: Ho Chi Minh Internet Archive (marxists.org) 2003

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Lênin e os povos colonizados! “Lênin está morto!” Estas notícias deixaram os povos perplexos. E se espalharam a cada canto, das planícies férteis da África aos verdejantes campos da Ásia. É verdade que os povos africanos e asiáticos(1) ainda não sabem claramente quem é Lênin ou onde se localiza a Rússia. Os imperialistas deliberadamente os mantiveram nesse estado de ignorância. A ignorância é um dos mastros principais de sustentação do capitalismo. Mas todos eles, dos camponeses vietnamitas aos caçadores das florestas no Dahomey(2), secretamente aprenderam que, em uma distante região do planeta, uma nação obteve sucesso em derrubar seus exploradores e está gerenciando seu próprio país sem a necessidade de senhores e Governadores Gerais(3). Eles também ouviram que este país se chama Rússia e que lá habita um corajoso povo e, dentre este, o mais bravo de todos: Lênin. Isto era suficiente para preenchê-los com profunda admiração e calorosos sentimentos por este país e seu líder. Mas isto não é tudo. Eles também aprenderam que este grande líder, depois de haver libertado seu próprio povo, desejou libertar outros povos. Ele convocou os povos para colaborarem com os asiáticos e com os africanos para libertá-los do jugo de seus agressores estrangeiros, de todas as potências ocupantes, dos Governadores Gerais etc. E, para atingir esta meta, ele delineou um programa definitivo. Inicialmente eles não acreditaram que, em algum lugar do mundo, pudesse existir um homem como esse e tal programa. Mas posteriormente eles ouviram falar vagamente de partidos comunistas, de uma organização chamada Internacional Comunista, que estava lutando pelos povos explorados incluindo eles próprios. E eles aprenderam que Lênin era o líder desta organização. E isto foi o bastante para fazer com que esses povos – apesar de seus precários conhecimentos – fossem gratos e mantivessem afeição pelo respeitável Lênin. Eles olharam para Lênin como seu libertador... No entanto, com sua morte, surgem dúvidas: “Lênin está morto, e agora o que será de nós? Haverá outras pessoas corajosas e generosas como Lênin que despenderão seus esforços para contribuir com nossa libertação?” Eram as preocupações que se somavam com os povos em regimes coloniais.

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Nós, profundamente comovidos por essa perda irreparável, compartilhamos o luto com todos os povos como seus irmãos e irmãs. Mas cremos que a Internacional Comunista e seus ramos, que incluem ramificações nos países sob o regime colonial, irão triunfar na implementação das lições e dos ensinamentos deixados por nosso líder. Não é seguir seus conselhos a melhor maneira de demonstrar nosso afeto por ele? Durante sua vida, ele foi nosso pai, nosso mestre, camarada e conselheiro. Hoje é uma estrela iluminando o caminho da revolução socialista. Lênin viverá eternamente em nosso trabalho! Notas do tradutor: (1) Por opção, adotei a expressão africanos e asiáticos, ao invés de negros e amarelos, como constava na versão em inglês. (2) Antigo nome da República de Benin, país africano e feito uma das muitas colônias da França. (3) Administrador nomeado pela potência colonizadora.

Publicado no jornal soviético Pravda, na edição de janeiro de 1924 Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 1, Foreign Languages Publishing House.

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Intervenção sobre a Questão Nacional e a Questão Colonial no 5º Congresso Mundial da Internacional Comunista A mesa dos trabalhos convoca para falar o camarada Nguyen Ai Quoc Camaradas, gostaria somente de complementar a crítica do camarada Manuilski a propósito da nossa política na questão colonial. Mas, antes de abordar o assunto, creio necessário apresentar alguns números que nos permitirão apreender toda a importância do problema. METRÓPOLES

COLÔNIAS

PAÍSES

Superfície (km2)

População

Superfície (km2)

População

Grã-Bretanha

151.000

45.500.000

34.910.000

403.600.000

França

536.000

39.000.000

10.250.000

55.600.000

EUA

9.420.000

100.000.000

1.850.000

12.000.000

Espanha

504.500

20.700.000

371.600

853.000

Itália

286.600

38.500.000

1.460.000

1.623.000

Japão

418.000

57.070.000

288.000

21.249.000

Bélgica

29.500

7.612.000

2.400.000

8.500.000

Portugal

92.200

5.545.000

2.062.000

8.738.000

Holanda

93.000

6.700.000

2.046.000

48.030.000

Assim, pois, nove países com a população de 320 milhões de habitantes e com a superfície de 11.407.600 Km² (sic), exploram colônias totalizando 560 milhões e 193 mil habitantes, divididos por uma superfície de 55.637.000 quilômetros quadrados. A superfície do conjunto dos territórios coloniais é cinco vezes superior à das metrópoles cuja população global representa apenas 3/5 da das colônias. Esses números são ainda mais eloquentes se consideradas isoladamente as maiores potências imperialistas. A população das colônias britânicas é oito vezes e meia superior à da Inglaterra e a sua superfície total representa cerca de 252 vezes a da metrópole. Quanto à França, ocupa territórios dezenove vezes maiores do que ela e a população das suas colônias ultrapassa a sua em 16 milhões e 600 mil habitantes. Pode-se, pois, dizer, sem exageros, que, enquanto o Parti-

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do Comunista Francês e o Partido Comunista Inglês não aplicarem uma política verdadeiramente ativa nas questões coloniais e não estabelecerem contatos com as massas das colônias, seus programas máximos permanecerão sempre letra morta. Esses programas permanecerão letra morta pois serão contrários ao leninismo. Eu me explico. Na sua palestra sobre Lênin e a questão nacional, o camarada Stálin ressaltou que os reformistas e os líderes da II Internacional não ousaram pôr no mesmo pé de igualdade os povos de raça branca e os povos de raça de cor, que Lênin rejeitou essa desigualdade e aniquilou o obstáculo que separava os escravos civilizados do imperialismo e os povos escravos não civilizados. Segundo Lênin, o sucesso da revolução na Europa ocidental está estritamente ligado ao movimento de libertação nacional e anti-imperialistas nas colônias e nos países subjugados e, como nos ensinou, a questão nacional é uma parte do problema geral da revolução proletária e da ditadura do proletariado. O camarada Stálin referiu-se ao ponto de vista segundo o qual a vitória do proletariado seria possível sem uma aliança direta com o movimento de libertação das colônias. E acusou essa visão de contrarrevolucionária. Todavia, se nós procedermos a um exame teórico, a partir dos fatos, temos o direito de considerar que, à exceção do partido russo, o ponto de vista de que falava Stálin subsiste ainda nos nossos grandes partidos proletários, visto que eles não fazem absolutamente nada nesse domínio. O que fez a burguesia dos países colonizadores para manter sob a sua opressão as amplas massas dos povos colonizados? Tudo. Ela conduz uma propaganda ativa, utilizando todas as possibilidades que lhe proporciona o seu aparelho de Estado. Por todos os meios – pelas conferências, cinema, imprensa, exposições, para citar apenas os mais importantes –, ela organiza junto aos povos metropolitanos uma lavagem cerebral sistemática com ideias colonialistas, fazendo faiscar a seus olhos as perspectivas de uma vida plena de facilidades, de glória e de abundância que parece esperá-los nas colônias. Quanto aos nossos partidos comunistas de Inglaterra, Holanda, Bélgica e outros países cuja burguesia invadiu as colônias, que fizeram eles? O que realizaram desde que assimilaram as teses de Lênin para educar o proletariado dos seus países no espírito do verdadeiro internacionalismo proletário e da aproximação com as massas trabalhadoras das colônias? Tudo o que os nossos partidos puderam fazer nesse domínio não foi muito longe. Quanto a mim, cuja pátria é colonizada pela França, e que sou membro do Partido Co-

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munista Francês, lamento imensamente ter de dizer que o nosso Partido fez muito pouco pelas colônias. É dever da nossa imprensa comunista familiarizar os nossos militantes com os problemas coloniais, despertar as massas trabalhadoras das colônias e as conquistar para a causa do comunismo. O que nós dizemos sobre essa questão? Absolutamente nada. Se compararmos o lugar reservado nas suas colunas às questões coloniais pelo L’Humanité, órgão central do nosso Partido, a que lhe consagram os jornais de diversas tendências, como Le Populaire e La Liberté, é preciso reconhecer imediatamente que a comparação não nos é favorável. O ministro das Colônias elaborou um plano para converter vastas superfícies da África em imensas concessões atribuídas a particulares e os seus habitantes em verdadeiros escravos presos à terra dos nossos senhores e, todavia, a nossa imprensa não disse uma palavra. Nas colônias da África ocidental francesa, recorreu-se a meios sem precedentes para operar o recrutamento obrigatório e a nossa imprensa não reagiu. Os governantes da Indochina, transformando-se em traficantes de negros do novo gênero, venderam os tonquineses aos concessionários das ilhas do Pacífico: aumentaram a duração do serviço militar para os nativos de dois para quatro anos, concederam a maior parte das terras da colônia aos tubarões do capitalismo financeiro, aumentaram em 30% os impostos que já excediam as capacidades fiscais dos contribuintes e tudo isso no preciso momento em que as populações nativos eram arrastadas para a falência e morriam de fome quando não por causa de inundações. E, todavia, nossa imprensa guarda segredo. É, pois, de se espantar que as populações nativas se voltem para as organizações democráticas liberais, como a Liga dos Direitos do Homem e para outras organizações análogas, que se ocupam ou parecem ocupar-se delas? Se nós levarmos as coisas um pouco mais longe, constataremos pelos fatos que ultrapassam a imaginação e que levam a crer que o nosso Partido despreza sistematicamente tudo o que diz respeito às colônias. É assim, por exemplo, que o L’Humanité nunca pensou em inserir o apelo que a Internacional camponesa lançou aos povos coloniais por intermédio da Internacional Comunista. Na sua tribuna de discussão, às vésperas do Congresso de Lyon, publicou todas as teses, à exceção das teses sobre o problema colonial. L’Humanité ressaltou muitas vezes as vitórias do boxeador senegalês Siki, mas não levantou sua voz quando os estivadores do porto de Dakar, irmãos de Siki, foram presos em pleno trabalho, lançados para caminhões, conduzidos à prisão e depois à caserna onde os forçaram a vestir o unifor-

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me para se tornarem à força os “guardas da civilização”. O órgão central do nosso Partido manteve cotidianamente os seus leitores informados sobre as explorações do piloto de Oisy que fez a primeira travessia França-Indochina. Mas quando governantes colonialistas da Indochina pilham os habitantes de Anam, extorquindo-lhes as suas terras para passá-las aos especuladores franceses, quando eles se divertem ao fazer chover as bombas sobre a cabeça dos pobres nativos expropriados para tentar conduzi-los à razão, não julgam necessário informá-los acerca disso. Camaradas, a imprensa burguesa sabe claramente que a questão nacional e a questão colonial são inseparáveis uma da outra. Mas isso, creio que o nosso partido não compreendeu ainda. A lição de Ruhr quando os destacamentos de atiradores indígenas, enviados para “consolar” os operários alemães esfomeados, cercaram companhias de soldados franceses suspeitos; o exemplo do Exército do Oriente onde os atiradores nativos receberam armas automáticas para “levantar a moral” dos soldados franceses fatigados com as dificuldades e o prolongamento da guerra; os incidentes de 1917 nos aquartelamentos russos na França; os ensinamentos da greve dos operários agrícolas dos Pirineus contra os quais os soldados nativos se viram constrangidos a desempenhar o vergonhoso papel de fura-greves; e, por fim, a presença de 207 mil soldados nativos no próprio solo da França, são todos fatos que não puderam ainda conduzir o nosso Partido a refletir, ver a necessidade de realizar uma política clara e enérgica nas questões coloniais. Ele deixou escapar, por diversas vezes, boas oportunidades de propaganda. Os novos órgãos de direção reconheceram a passividade do partido nesse domínio. Eis um bom sinal, porque, a partir do momento em que os dirigentes do partido constatam e reconhecem essa falha na sua política, cada qual tem o direito de esperar que doravante o Partido se aplicará com todas as forças a corrigir seus erros. Estou convencido de que este Congresso marcará uma mudança e que impulsionará o nosso Partido a colmatar a passividade destes últimos anos. Ainda que as considerações do camarada Manuilski sobre as eleições argelinas sejam muito justas, devo, para maior objetividade, dizer que é precisamente nisso que o nosso partido errou, mas que em seguida corrigiu-se, mandando apresentar uma lista de delegados coloniais no distrito do Sena. É pouco, certamente, mas isso pode ser um início. Fico contente por constatar que o nosso Partido acaba de tomar excelentes decisões, que está pleno de vigor – o que é uma coisa nova para nós –, e que lhe basta traduzir tudo isso por atos para chegar a uma política justa nas questões coloniais.

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Neste caso, como passar à ação? Não basta, como se fez até aqui, apresentar longas teses e adotar resoluções sonoras que se deixa adormecer em seguida, depois do Congresso, no pó dos museus. O que nos falta são medidas concretas. Eis o que proponho sobre esse assunto: 1. Abrir uma rubrica no L’Humanité (pelo menos duas colunas por semana) para inserir regularmente artigos que tratem de questões coloniais. 2. Reforçar a nossa propaganda e recrutar novos aderentes ao Partido entre os nativos nas colônias, onde a Internacional Comunista pode fundar células. 3. Enviar os nossos camaradas das colônias à Universidade do Oriente em Moscou. 4. Estabelecermos relações com a Confederação Geral Unitária dos Trabalhadores para organizar os trabalhadores coloniais emigradas na França. 5. Dar a diretiva a todos os membros do Partido para se familiarizarem cada vez mais com as questões coloniais. São, na minha opinião, propostas lógicas que, caso forem adotadas pela internacional Comunista e pelo nosso Partido, a nossa delegação, no próximo Congresso Mundial estará no direito de declarar que a Frente Unida do povo Francês e dos povos coloniais se tornou um fato. Camaradas, na medida em que somos discípulos de Lênin, devemos concentrar nossas forças e nossas energias na questão colonial tal como em outras questões a fim de traduzir em atos os seus ensinamentos. O camarada Douglas (delegado inglês) [...] O camarada Smeran [...] O camarada Nguyen Ai Quoc As colônias da França estendem-se por uma superfície de 10 milhões e 250 mil km2, com a população de 55 milhões e 571 mil habitantes divididos pelos quatro continentes. A despeito das diferenças de raça, de clima, de costumes, de tradições, de nível econômico e social, têm dois pontos comuns que podem permitir-lhes marchar para a unidade, para lutar conjuntamente: 78


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1. Em todas as colônias francesas, a indústria e o comércio estão muito pouco desenvolvidos e a população dedica-se quase exclusivamente à agricultura; 95% dos nativos são camponeses; 2. Em todas as colônias, os nativos estão submetidos a uma exploração permanente por parte dos imperialistas franceses. O tempo é pouco para me entregar a uma análise aprofundada da situação dos camponeses, em cada colônia particularmente. Limitar-me-ei a alguns exemplos típicos para dar uma ideia geral da sua vida nas colônias. Começarei pelo país que melhor conheço, o meu, a Indochina. Durante a conquista, as operações militares expulsaram os nossos companheiros das suas aldeias. No regresso aos seus lares, encontraram os seus arrozais entre as mãos dos concessionários que vieram nos furgões dos exércitos de ocupação e que não hesitaram em dividir entre eles as terras que os nossos camponeses trabalharam há gerações. De repente, os nossos camponeses se tornaram servos reduzidos à condição de trabalhar seus próprios arrozais por conta dos patrões estrangeiros. Muitos destes infelizes, incapazes de suportar as condições draconianas impostas pelos seus espoliadores, abandonaram as suas terras para levar uma vida errante através do país, perseguidos pelos franceses como se fossem piratas. Esta espoliação, como já dissemos, efetuou-se por conta dos concessionários que, bastava dizerem uma palavra, para obterem superfícies que ultrapassavam por vezes 20 mil ou 25 mil hectares. Não satisfeitos em obter gratuitamente o solo, recebem ainda gratuitamente todos os meios de produção para a sua exploração, compreendendo aí também a mão de obra. A administração fornece-lhes um certo número de condenados a trabalhos forçados que trabalham por nada, ou então obriga as comunas a dar-lhes a mão de obra necessária. Ao lado destes lobos do governo, convém assinalar o papel desempenhado pela igreja. A missão católica possui um quarto das terras aráveis da Cochinchina. O meio de adquirir essas terras é muito simples: a corrupção, a chantagem, o constrangimento. Eis alguns exemplos esclarecedores. A missão aproveita-se das colheitas ruins para emprestar dinheiro aos camponeses, obrigando-os a hipotecar suas terras como garantia. Sendo a taxa dos empréstimos exorbitante, os anamitas não podem, dentro do prazo, liquidar a dívida, e as terras hipotecadas passam para a Missão. A igreja não recua perante nada para se apropriar de documentos secretos comprometedores e 79


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é assim que, ao fazer chantagem com os oficiais, consegue fazê-los atender aos seus desejos. Ela se associa à grande finança para explorar as concessões adquiridas a título gratuito e aos arrozais roubados dos camponeses. Ela tem homens que ocupam postos no governo colonial. Para a exploração das suas ovelhas, a Missão não se perde em nada aos concessionários mais cruéis. Eis um outro dos seus comportamentos. Ela reúne pobres para o arroteamento das terras e compromete-se a distribuí-las em seguida. Mas, ao aproximar-se a época da colheita, reivindica a propriedade desses domínios e expulsa aqueles mesmos que as valorizaram. Espoliados pelos seus “protetores” (religiosos ou laicos), nossos camponeses foram progressivamente impedidos de trabalhar em pequenos lotes de terras restantes. Mas isso não é tudo. O serviço de registro aumenta artificialmente a superfície das parcelas de terreno para coletar mais pesadamente os contribuintes. A administração aumenta impostos de ano a ano. Recentemente, depois de ter desapossado os anamitas da região alta de milhares de hectares, para os dar aos especuladores, as autoridades mandaram sobrevoar a região com bombardeiros a fim de tirar os expropriados à menor veleidade de rebelião. Se esses camponeses espoliados, arruinados e perseguidos encontram forma de arrotear terras incultas, a administração apropria-se desses domínios, apesar de terem sido os camponeses que as valorizaram, e obriga-os a resgatar terras aos preços homologados. Sem o que, serão expulsos. No último ano, os impostos sobre os arrozais foram aumentados em 30%, mesmo com o fato de que as inundações tenham arrasado colheitas em todo o país. Para além desses impostos injustos que os arrastaram para a falência, nossos camponeses suportam ainda múltiplas cargas, particularmente as corveias, o imposto “per capita”, a taxa sobre o sal, os empréstimos nacionais, as subscrições, os contratos desiguais que são obrigados a assinar. Os capitalistas franceses aplicam a mesma política de banditismo e de espoliação na Argélia, na Tunísia e em Marrocos, onde foram açambarcadas as terras mais férteis e melhor irrigadas. Os nativos expulsos dos seus lares tiveram que se instalar nas regiões vizinhas às montanhas em terras ingratas para aí ganharem sua vida. Associações Financeiras, especuladores, e altos funcionários repartem entre si as terras destas colônias. Em 1914, diversas transações trouxeram aos bancos da Argélia e da Tunísia 12 milhões e 258 mil francos de lucros para um capital não superior a 25 milhões de francos.

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O Banco de Marrocos colocou em caixa, em 1921, 1 milhão e 753 mil francos de lucro para um capital de 15 milhões e 400 mil francos. A Companhia Franco-argelina apropriou-se de 324 mil hectares de terra entre as mais férteis do país. A Companhia Argelina, de 100 mil hectares. Uma sociedade privada tornou-se proprietária a título gratuito de .50 mil hectares de floresta, enquanto a Companhia de Fosfatos e de Ferrovias de Capzer se apropriou de 50 mil hectares que contêm ricas jazidas e obteve um direito de propriedade sobre 25 mil hectares no entorno dessa concessão. Um antigo deputado atribuiu a si próprio um domínio de 1.125 hectares, rico em jazidas minerais, em um valor de 10 milhões de francos e com rendimento anual de 4 milhões. Quanto aos nativos, donos incontestáveis dessas jazidas, cada hectare não lhes rende mais do que um franco por ano. A política colonial da França substitui a propriedade privada pela propriedade coletiva. Ela liquidou igualmente a pequena propriedade privada em benefício da grande apropriação latifundiária. Retirou dos camponeses das colônias mais de 5 milhões de hectares das melhores terras. No espaço de 15 anos, os camponeses de Kabylie foram expropriados de 192.090 hectares. Desde 1913 que se rouba todos os anos 12mil e 500 hectares de terras aráveis aos camponeses marroquinos. Desde que a França ganhou a guerra “de direito”, este número subiu para 14 mil e 540 hectares. Atualmente, em Marrocos, 1 mil e 70 franceses são proprietários de 500 mil hectares. Tal como seus irmãos de Anam, os camponeses da África levaram uma vida inimaginável, são obrigados a múltiplos trabalhos obrigatórios e esmagados pelos impostos. A sua miséria é enorme. Eles são obrigados a se alimentarem de grãos estragados, de ervas e de plantas selvagens, e se tornaram presa fácil do tifo e da tuberculose. Mesmo nos anos de boa colheita, vê-se, nas cidades, camponeses que escavam nos montes de lixo e disputam sua alimentação com cães vadios. Nos anos de má colheita, os cadáveres cobrem as ruas e os campos. As condições de vida das populações rurais da África Ocidental e da África Equatorial francesa são ainda mais terríveis. Quarenta companhias que repartem entre si colônias, apropriaram-se de quase todas as fontes de riqueza: terras, riquezas naturais e até a vida dos indígenas. Estes já nem mesmo têm o direito de trabalhar por conta própria e se veem obrigados a trabalhar para as companhias e nada mais do que para as companhias. Para não ter que pagar a mão de obra, as sociedades não recuam perante

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nada. Depois de se apropriar das terras, só as fornecem em pequenos lotes àqueles que aceitam suas condições de trabalho. No seguimento da subalimentação, esses escravos de novo tipo são vítimas de todas as espécies de doenças, a mortalidade fez, entre eles, particularmente entre as crianças, estragos horríveis. Além disso, as companhias obrigam os idosos, as mulheres e as crianças a se empregarem como domésticos. Alojados em casebres, tratados com desprezo e brutalidade, recebem rações de fome e as companhias não hesitam, se necessário, em liquidá-los. Em certas localidades, os domésticos, presos permanentemente a serviço dos patrões, para prevenir os delitos de fuga, são tão numerosos como os operários agrícolas. Na época das lavras e da ceifa, os nativos não são autorizados a se ocuparem das suas terras antes de terem assegurado o trabalho para as companhias. Daí, a fome e as epidemias endêmicas que castigam rigorosamente as colônias. Se algumas alcançam as florestas para se subtraírem à cruel exploração dos concessionários, são condenadas a levar ali uma vida de animal selvagem, alimentando-se de folhas e tubérculos, e são finalmente ceifados pela malária que abunda nesses climas insalubres. Enquanto isso, os patrões brancos arrasam seus campos e suas vilas. Eis um estrato significativo do diário de um oficial que conta, com uma concisão das mais explícitas, os procedimentos da repressão contra os camponeses das colônias: (...) Operação de limpeza na vila de Kolowau. Contra os Fans de Cuno, vila incendiada, plantações destruídas. Contra os Bekamis: vila de novo incendiada, 300 plátanos abatidos. Contra a vila de Kua: vila incendiada, plantações arrasadas. Contra Alcun, vila bombardeada, depois destruída junto às plantações. Limpeza Esamfami: vila destruída. A região de Bome posta em chamas e em sangue. O mesmo regime de pilhagem, de espoliação, de massacre, de devastação abate-se nas possessões italianas, espanholas, inglesas e portuguesas na África. No Congo belga, a população diminuiu de 25 milhões, em 1891, para 8,5 milhões em 1911. Os hereros e os comards desapareceram completamente das possessões alemãs da África, sendo 80 mil massacrados na ocupação alemã e 15 mil na época da “pacificação”, em 1914. Os 20 mil nativos que habitavam o Congo Francês, 1894, não eram mais de 9.700 em 1911. Uma província de 10 mil habitantes, em 1910, não contava com mais de 1.080 oito anos mais tarde. Em uma outra província de 40 mil negros, 20 mil foram massacrados no espaço de dois anos, e 6 mil outros mortos ou feridos nos seis meses seguintes. Bastaram quinze anos para tornar desertas regiões ribeirinhas onde vi82


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viam populações bastante densas. Os esqueletos dos nativos branqueiam o solo dos oásis e das vilas arrasadas. Quanto aos sobreviventes, levam uma vida das mais trágicas: os camponeses são desapossados dos pequenos pedaços de terra que adquiriram com as suas economias, os artesãos perdem o seu ofício e os pastores o seu gado. Os grandes criadores de gado, que são os matabéles, cujo arrendamento de gado se elevava a 200 mil animais de chifres, antes da chegada dos ingleses, não possuíam mais de 40.900 após dois anos de colonização. Em 12 anos, os colonialistas alemães roubaram metade do montante gado dos hereros, que contavam com 90 mil cabeças de gado. Tais fatos não têm conta nos países onde os negros entraram em contato com a civilização dos brancos. Para concluir, citarei o testemunho de um negro. René Maran, o autor de Batouala. Lê-se sob a sua caneta: “a África Equatorial era uma região populosa e rica em cauchu, onde se encontrava toda espécie de pomares e de herdades para a criação de aves e de cabras. Bastou sete anos para que tudo fosse arrasado. As vilas foram destruídas, os jardins e as quintas abandonados, as galinhas e as cabras desapareceram. Os habitantes, esgotados por trabalhos extenuantes e não remunerados, não possuem mais forças nem tempo para trabalhar a terra. Desencadeiam-se epidemias, a fome faz estragos, a mortalidade sobe. É preciso que se saiba, contudo, que estes homens descendem de uma tribo de raça forte, cujas resistência e combatividade já foram provadas. Hoje nada mais há quem mereça o nome de civilização nesses lugares”. Para completar esse quadro já bastante trágico, acrescentarei que o capitalismo francês não hesita em lançar regiões inteiras na miséria e na fome se isso lhe for vantajoso. Em numerosas colônias, na Reunião, na Argélia, em Madagascar etc., tende-se a substituir os cereais por culturas que interessam à indústria francesa e que sejam mais lucrativas para os concessionários. Daí resulta uma subida vertical do custo de vida nas colônias, sendo a fome lá frequente. Em todas as colônias francesas, o descontentamento sobe, paralelamente à miséria e à fome. A sublevação das colônias é iminente. Já se insurgiram em diversas colônias, mas em todas as vezes suas revoltas foram afogadas em sangue. Se neste momento parecem resignados, é devido unicamente à falta de organização de dirigentes. A Internacional Comunista deve trabalhar para a sua união, fornecer-lhes os quadros dirigentes e guiá-los na via da revolução e da libertação. Discurso proferido como militante anticolonialista no Congresso que ocorreu de 17 de junho a 8 de julho de 1924, em Moscou. Fonte: extraído da apresentação oral estenografada do Congresso

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Linchamentos: aspecto pouco conhecido da sociedade norte-americana Publicado no órgão La Correspondence Intenationale, número 59, em 1924

É bem conhecido o fato de a raça negra ser a mais oprimida e a mais explorada do gênero humano. É bem conhecido que a expansão do capitalismo no mundo e a descoberta do Novo Mundo tiveram como resultado imediato o renascimento da escravidão, que foi, por séculos, um flagelo para os negros e uma terrível desgraça para a humanidade. O que talvez nem todos saibam é que, após 65 anos da dita emancipação, os negros norte-americanos ainda enfrentam sofrimentos morais e materiais atrozes, dos quais o mais cruel e horrível é a prática do linchamento. A palavra “linchamento” vem de Lynch””. Lynch era o nome de um fazendeiro da Virgínia, um latifundiário e juiz. Valendo-se dos problemas da Guerra de Independência, ele assumiu o controle de todo o distrito para si. Ele praticava as punições mais selvagens, sem julgamento ou processos legais. Graças aos comerciantes de escravos, à Ku Klux Klan e a outras sociedades secretas, a prática bárbara e ilegal do linchamento vem se espalhando e prossegue amplamente nos Estados da União. Tornou-se mais desumana desde a emancipação dos negros e se dirige especialmente contra estes últimos. Imagine uma horda furiosa. Punhos cerrados, olhos vermelhos de sangue, boca espumando, gritos, insultos, jogando pragas. Esta horda é motivada pelo prazer selvagem de cometer um crime sem risco nenhum. Estão armados com paus, tochas de fogo, revólveres, facas, tesouras, ácido, punhais, com tudo o que pode ser usado para matar ou ferir alguém. Imagine, neste mar humano, carne negra sendo puxada, espancada, pisoteada, rasgada, mutilada, jogada para lá e para cá, manchada de sangue, morta. A horda são os linchadores. O farrapo humano é o negro, a vítima. Em uma onda de ódio e bestialidade, os linchadores levam o negro a uma árvore ou algum local público. Eles os amarram em uma árvore, jogam querosene sobre o seu corpo, o cobrem com material inflamável. Enquanto esperam o fogo acender, quebram seus dentes um por um. Então, arrancam seus olhos. Pequenos tufos de cabelo crespo são arrancados de sua cabeça, levando pedaços de pele junto com eles, expondo um crânio sangrento. Pequenos pedaços de carne saem de seu corpo, já contundido após os golpes. 84


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O negro não pode mais gritar: sua língua foi inchada por um ferro em brasa. Todo o seu corpo murmura, tremendo como uma cobra esmagada. Uma facada: uma de suas orelhas cai no chão. Oh! Vejam com o ele é negro! Que terrível! E as senhoras choram em seu rosto... “Acende!” – grita alguém – “o suficiente para cozinhá-lo bem devagar”, outro acrescenta. O negro é torrado, queimado, carbonizado. Mas ele merece morrer duas vezes ao invés de uma. Portanto, ele é enforcado ou, para ser mais exato, o que restou de seu corpo é enforcado. E todos aqueles que não conseguiram ajudar a incendiá-lo agora aplaudem. Viva! Quando todos já se cansaram, o corpo é derrubado. A corda é cortada em pedaços que serão vendidos cada um por três ou cinco dólares. Lembranças e amuletos da sorte disputados entre as mulheres. A “justiça popular”, como eles dizem, foi feita. Com tudo mais calmo, a multidão parabeniza os “organizadores” e então anda de forma leve e alegre, como se estivessem voltando de uma festa, fazendo comentários uns com os outros sobre a próxima. Enquanto isso, no chão, fedendo a gordura e fumaça, uma cabeça negra mutilada, queimada, deformada ri sarcasticamente e aparenta perguntar ao sol se pondo: “é isto a civilização?” Algumas estatísticas De 1889 até 1919, 2 mil e 600 negros linchados, incluindo 51 mulheres e meninas e dez ex-soldados da Grande Guerra. Entre os 78 negros que foram linchados em 1919, 11 foram queimados vivos, três queimados após serem mortos, 31 baleados, três torturados até a morte, um mutilado, um afogado e 11 sentenciados à morte por vários meios. A Geórgia lidera a lista com 22 vítimas. Mississipi vem logo em seguida, com 12. Ambos também têm na lista três soldados linchados. Dos 11 queimados vivos, o primeiro Estado tem quatro e o segundo dois. Dos 34 casos de linchamentos sistemáticos, premeditados e organizados, ainda é a Geórgia que mantém o primeiro lugar com cinco. Mississipi vem logo em seguida com três. Entre as acusações levadas contra as vítimas de 1919, notamos: 1. Uma por ter sido membro da Liga dos não Partisans (agricultores independen-

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tes); 2. Expressar muito livremente sua opinião sobre os linchamentos; 3. Ter distribuído publicações revolucionárias; 4. Ter criticado os confrontos entre brancos e negros em Chicago; 5. Ser conhecido como líder da causa dos negros; 6. Não ter saído da rua e, portanto, ter assustado uma criança branca que estava em um carro. Em 1920, houve 50 linchamentos e, em 1923, 28. Estes crimes foram todos motivados pela cobiça econômica. Ou os negros nos lugares eram mais prósperos que os brancos, ou os trabalhadores negros não se deixariam ser explorados completamente. De qualquer forma, nunca acontecia nada aos principais culpados, pelo simples motivo de que eram sempre incitados, encorajados, estimulados e depois protegidos pelos políticos, financistas e autoridades e, acima de tudo, pela imprensa reacionária. Quando ia ocorrer ou tinha ocorrido um linchamento, a imprensa aproveitava aquilo como uma boa chance de aumentar as vendas. O caso seria relatado com grande riqueza de detalhes. Sem a menor condenação dos criminosos. Nenhuma palavra de piedade pelas vítimas. Nenhum comentário. O New Orleans States, de 28 de junho de 1919, publicou uma manchete na capa em letras grandes: “Hoje um negro será queimado por 3 cidadãos”. E, imediatamente abaixo, em letras muito pequenas: “Sob uma grande escolta, o Kaiser pegou o avião com o príncipe herdeiro”. O Jackson Daily News, do mesmo dia, publicou, entre as duas primeiras colunas de sua capa, em letras grandes: “Negro J. H. a ser queimado por multidão em Ellistown esta tarde, 5 p.m.” O jornal apenas se recusou a acrescentar “toda a população está encarecidamente convidada a comparecer”. Mas o espírito disto está lá. Alguns detalhes “Esta tarde às 7:40 da noite, J. H. foi torturado com uma barra de ferro em brasa vermelha, e depois queimado. Uma multidão de mais de 2 mil pessoas, muitas sendo mulheres e crianças, estava presente no ocorrido... Após o negro ser amarrado por trás, se acendeu o fogo. Um pouco mais longe dali, outro incidente com uma barra de ferro ocorria. Quando a barra ficava vermelha, um homem pegava e a aplicava no corpo do negro. O segundo, aterrorizado, pegava a barra com suas mãos e enchia o ar com o odor da pele queimada. Com a barra de ferro quente aplicada em várias partes de seu corpo, seus gritos e choros podiam ser ouvidos de muito lon-

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ge. Após vários minutos de tortura, homens mascarados despejaram gasolina nele e ateavam fogo em uma estaca. As chamas subiam e cobriam o negro que implorava que o matassem. Suas implorações provocaram gritos de escárnio” (Chatanooga Times, 13 de fevereiro de 1918). “15 mil pessoas, homens, mulheres e crianças aplaudiram quando a gasolina foi derramada sobre o negro e o fogo ateado. Eles lutaram, gritaram e se empurraram para chegarem mais perto do negro... Dois deles cortaram suas orelhas enquanto o fogo começava a queimá-lo. Outro tentou cortar seus pés. A multidão surgiu e mudou de lugar para que todos pudessem ver o negro queimar. Quando sua pele estava inteiramente queimada, os ossos desnudados e o que tinha sido um ser humano agora era um farrapo deformado e queimado, todos ainda estavam lá observando” (Memphis Press, 22 de maio de 1917). “Homens de todas as classes sociais, mulheres e crianças estavam presentes no cenário. Muitas mulheres da classe alta seguiram a multidão de fora da prisão, outros se juntaram a ela de pátios vizinhos. Quando o cadáver do negro caiu, os pedaços de corda foram calorosamente disputados” (Vicheburg Evening Post, 4 de maio de 1919). “Alguém cortou suas orelhas e outro removeu seu órgão sexual. Ele tentou se agarrar à corda, seus dedos foram decepados. Enquanto estava sendo içado a uma árvore, um homem enorme esfaqueou seu pescoço: ele recebeu ao menos 25 golpes. (...) Ele foi içado várias vezes e em seguida puxado para dentro de um fogareiro. Finalmente, um homem o amarrou em um cavalo, que arrastou o negro pelas ruas de Waco. A árvore em que havia ocorrido o enforcamento estava bem debaixo de um janela da casa do prefeito. Enquanto a multidão agia, o prefeito assistia. Por todo o caminho, todos tomavam parte no mutilamento do negro. Alguns o feriam com pás, picaretas, tijolos, pedaços de pau. O corpo ficou com marcas da cabeça aos pés. Um grito de alegria escapou de milhares de gargantas quando atearam fogo no cadáver. Algum tempo depois, o corpo foi jogado para o ar para que todos o olhassem, o que gerou grandes aplausos” (Crisis, julho de 1916). Vítimas brancas dos linchamentos Não são apenas os negros, mas também os brancos que ousam defendê-los, como a Senhora Harriet Beecher Stowe – autora de Cabana do Pai Tomás –, que sofrem com isso. Elijah Lovejoy foi assassinado. John Brown

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enforcado. Thomas Beach e Stephen Foster foram perseguidos, atacados e presos. Aqui o que Foster escreveu na prisão: “Quando eu olho para meus membros danificados, eu penso que, para me manter aqui, a prisão não será mais necessária por muito tempo. Nestes últimos 15 meses, abriram as grades para mim quatro vezes e por 24 vezes meus compatriotas me expulsaram de suas igrejas, duas vezes me jogaram do segundo andar de suas casas, causaram danos em meus rins; em outra vez tentaram me marcar a ferro; outra vez 100 mil pessoas tentaram me linchar, e deram 20 socos em minha cabeça, braços e pescoço”. Em 30 anos, 708 brancos, incluindo 11 mulheres, foram linchados. Alguns por terem organizado greves, outros por defenderem a causa dos negros. Entre a coleção de crimes da “civilização norte-americana”, certamente o linchamento tem um lugar especial. Fonte: Ho Chi Minh Reference Archive

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Lênin e os povos coloniais Lênin colocou as premissas de uma nova era, autenticamente revolucionária, nos países coloniais. Foi o primeiro a criticar resolutamente os preconceitos que, nesta matéria, ainda persistiam em numerosos revolucionários da Europa e da América. Todos conhecem as teses da Internacional Comunista acerca da questão colonial. Em todos os congressos da Internacional Comunista, dos sindicatos internacionais da Juventude Comunista do mundo, a questão colonial vinha à cabeça da ordem do dia. Lênin foi o primeiro a considerar todo o alcance da questão que consiste em levar os povos coloniais ao movimento revolucionário. Foi o primeiro a mostrar que, sem a participação dos povos coloniais, não poderia haver a revolução socialista. Desenvolveu métodos eficazes no trabalho dos países coloniais e pôs a tarefa de desenvolver o movimento revolucionário nacional. Os delegados dos países coloniais presentes nos congressos da Internacional Comunista recordam-se da atenção que Lênin prestava a estes países. Sabia aprofundar as condições de trabalho mais complexas e que se revestiam um caráter especificamente regional. Cada um de nós tem agora tempo necessário para se convencer da justeza das suas observações para dar-se conta do inestimável valor dos seus ensinamentos que, com a habilidade inerente a estes métodos, despertaram as massas populares ainda inconscientes e extremamente atrasada das colônias. Sua tática para este problema foi posta em prática pelos partidos comunistas, os melhores elementos dos países coloniais. O modo pelo qual Lênin resolveu a extremamente complexa questão nacional na Rússia Soviética constituiu uma excelente arma de propaganda para as colônias. No que diz respeito à história dos povos coloniais privados dos seus direitos e fartos de sofrimento, Lênin foi o criador de uma nova vida, o farol que ilumina a via de libertação de toda a humanidade oprimida. Fonte: Ho Chi Minh (Marxist Archive)

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Lênin e o Oriente A I Internacional estabeleceu deu base ao movimento Comunista Internacional, mas, por conta da sua curta existência, conseguiu formular apenas as linhas básicas de ação do movimento. Portanto, a questão das colônias não foi completamente estudada pela I Internacional. Quanto à II Internacional, com representantes como MacDonald, Vandervelde, Henderson, Blum etc., há apenas alguma atenção a esta questão. Seus líderes não simpatizavam com a luta por autolibertação travada pelos povos coloniais. Além disso, após assumir o gabinete, MacDonald não era menos ativo do que Baldwin e Chamberlain em oprimir os povos da Índia, do Sudão e de outras colônias que corajosamente se opunham aos opressores estrangeiros. Sob as ordens desses cavalheiros, vilas nativos foram bombardeadas e povos coloniais foram oprimidos da maneira mais cruel e implacável que o mundo pode descrever. Todos sabem que os oportunistas criaram uma política para segregar os trabalhadores brancos dos trabalhadores de cor e que os sindicatos, sob a influência destes astutos socialistas, não querem admitir trabalhadores de cor diferente em suas fileiras. A política colonial da II Internacional expôs, mais do que qualquer outra coisa, a verdadeira face, nua, dessa organização pequeno-burguesa. Portanto, até a Revolução de Outubro, teorias socialistas eram consideradas como teorias particularmente reservadas aos Brancos, uma nova ferramenta de trapaça e exploração. Lênin inaugurou uma nova era, verdadeiramente revolucionária, em várias colônias. Lênin foi o primeiro homem que, de forma determinada, denunciou todos os preconceitos contra os povos coloniais, instaurados profundamente nas mentes de muitos trabalhadores Europeus e Americanos. As teses de Lênin sobre a questão das nacionalidades, aprovadas pela Internacional Comunista, levaram a uma revolução momentânea todos os países oprimidos ao redor do mundo. Lênin foi o primeiro a perceber e enfatizar toda a importância de uma solução apropriada para a questão colonial: uma contribuição à revolução mundial. A questão colonial foi levantada em todos os congressos de Comunismo Internacional, ao corpo sindical mundial e à Juventude da Internacional Comunista.

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Lênin foi o primeiro a perceber e aferir toda a importância de atrair povos coloniais ao movimento revolucionário. Ele foi o primeiro a perceber que, sem a participação dos povos coloniais, a revolução socialista não poderia acontecer. Com sua natural clareza de visão, Lênin se deu conta de que, para realizar o trabalho com sucesso nas colônias, era necessário saber como tirar vantagem do movimento de libertação nacional que ganhava terreno nestes países. Ele percebeu que, com o suporte do proletariado mundial a este movimento, teremos novos e fortes aliados na luta pela revolução socialista. Todos os delegados de países coloniais que participaram de vários congressos do movimento comunista internacional nunca esquecerão a preocupação que Lênin, seu líder e camarada, mostrou por eles. Eles para sempre lembrarão da perspicácia com que ele olhou para as condições da maioria das mais complexas tarefas peculiares ao Oriente. Logo, cada um de nós vai poder entender profundamente o quão correto os julgamentos de Lênin são e quão valiosos são seus ensinamentos. Apenas a atitude sábia de Lênin para com as questões coloniais pode despertar os povos coloniais mais atrasados. A estratégia de Lênin nesta questão é aplicada por vários Partidos Comunistas pelo mundo e conquistou os melhores e mais positivos elementos nas colônias para tomar parte nos movimentos Comunistas. A solução de Lênin à extremamente complexa questão de nacionalidades na Rússia Soviética, e sua aplicação prática pelo Partido Comunista, é arma de propaganda mais afiada para as colônias. Em relação aos povos oprimidos e escravizados, Lênin deu uma reviravolta na história da pobreza de vidas escravizadas e simbolizou um futuro brilhante. Publicado no Le Sifflet, Paris em 21 de janeiro de 1926 Fonte: FALL, Bernard B. (ed.). Ho Chi Minh on evolution. Selected Writings, 1920-1966, p. 62.

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Apelo por ocasião da fundação do Partido Comunista da Indochina Operários, camponeses, soldados, jovens, estudantes, compatriotas oprimidos e explorados, amigos, camaradas. As contradições do capitalismo no seu estágio imperialista provocaram a guerra mundial de 1914-1918. Depois desta horrível carnificina, o mundo dividiu-se em duas frentes: de um lado, a frente revolucionária que engloba os povos coloniais oprimidos e o proletariado mundial explorado, cuja vanguarda é a URSS. Por outro l ado, a frente contrarrevolucionária do capitalismo internacional e do imperialismo, cujo Estado-Maior é a Sociedade das Nações. Esta guerra causou aos povos perdas incalculáveis em homens e bens. Foi o imperialismo francês quem teve maior perda. É por isso que, a fim de restaurar as forças na França, os imperialistas franceses recorreram aos meios mais pérfidos para intensificar a exploração capitalista na Indochina. Criam novas fábricas para explorar operários, pagando-lhes um salário de fome. Roubam as terras dos camponeses para criar plantações, tornando sua vida cada vez mais miserável. Esmagam sob tributação exorbitante – e obrigam a comprar títulos de empréstimo. Em resumo, encurralam o nosso povo para a miséria. Eles aumentam suas forças militares. Em primeiro lugar, para asfixiar a Revolução Vietnamita. Em segundo lugar, para preparar uma nova guerra imperialista no Pacífico, para conquistar novas colônias. Em terceiro lugar, com vistas a reprimir a Revolução Chinesa. Por fim, em quarto lugar, para atacar a União Soviética, porque esta auxilia os povos oprimidos e o proletariado explorado a fazerem a revolução. A Segunda Guerra Mundial rebentará. É certo que os imperialistas franceses conduzirão então o nosso povo a uma matança de um horror sem precedentes. Se nós lhes deixássemos as mãos livres para preparar esta guerra, se nós o deixarmos combater a Revolução Chinesa, atacar a URSS e degolar a Revolução Vietnamita, não seria isso deixá-los varrer a nossa raça da face da Terra e afogar a nossa nação no oceano Pacífico? Todavia, a opressão bárbara e a exploração feroz dos colonialistas franceses despertaram a consciência dos nossos compatriotas. Nós todos tomamos consciência de que só a revolução nos permitirá viver e que, sem 92


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a revolução, estamos condenados a uma morte lenta, que o movimento revolucionário se desenvolve e se reforça todos os dias; os operários fazem greve, os camponeses reclamam a terra, os estudantes fazem a greve às aulas e os comerciantes a greve do mercado. Por toda parte, as massas se levantam contra os imperialistas franceses que tremem diante da revolução crescente. Por seu lado, utilizam, não só os feudais e os burgueses compradores, para oprimir e explorar os nossos compatriotas, como também aterrorizam, lançam na prisão e massacram em massa os revolucionários vietnamitas. Mas se julgam poder degolar a Revolução Vietnamita pelo terror, cometem um erro grosseiro. Em primeiro lugar, a Revolução Vietnamita não está isolada, se beneficia do apoio do proletariado internacional, e particularmente da classe operária francesa. Em segundo lugar, é precisamente no momento em que os colonialistas redobram suas atividades terroristas que os comunistas vietnamitas, antes divididos, se unem todos em um só partido, o Partido Comunista Indochinês, para dirigir a luta revolucionária de todo o nosso povo. Operários, camponeses, soldados, jovens, estudantes! Compatriotas oprimidos e explorados! O Partido Comunista Indochinês está fundado. É o partido da classe operária. Sob sua direção, o proletariado dirigirá a revolução no interesse de todos os oprimidos e explorados. A partir de agora, nosso dever é aderir ao partido, ajudá-lo a realizar as seguintes palavras de ordem: 1) Derrubar o imperialismo francês, o feudalismo e a burguesia reacionária do Vietnã; 2) conquistar a independência completa da Indochina; 3) formar o governo dos operários, camponeses e soldados; 4) confiscar os bancos e outras empresas imperialistas e colocá-las sob o controle do governo dos operários, camponeses e soldados; 5) confiscar todas as plantações e outras propriedades dos imperialistas e burgueses reacionários vietnamitas para distribuir aos camponeses pobres; 6) aplicar a jornada de trabalho de 8 horas; 7) abolir os empréstimos forçados, a captação e as taxas injustas que se abatem sobre os pobres; 8) efetivar as liberdades democráticas para as massas; 9) conceder a instrução a todos; 10) realizar a igualdade entre o homem e a mulher. Publicado pela primeira vez em Hong Kong em 18 de fevereiro de 1930 Fonte: Ho Chi Minh (Marxist Archive)

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NOTA DO EDITOR Em junho de 1929, o Partido Comunista da Indochina foi oficialmente fundado, com a Declaração programática e os Estatutos, utilizando como órgão central o jornal Bua Liem (Foice e Martelo) como porta-voz, além de várias seções espalhadas em outras cidades do Vietnã. Ao mesmo tempo, a comissão executiva deste partido e a Organização Regional da Liga ao norte de Vietnã do Sul decidiram fundar o Partido Comunista de Anam, Em Saigon (atual Ho Chi Minh City) os membros progressistas do Partido Revolucionário do Novo Vietnã também decidiram criar a Liga dos Comunistas da Indochina. O nascimento de três organizações revolucionárias da classe operária vietnamita durante a segunda metade do ano de 1929 constitui um salto no movimento revolucionário do Vietnã, mostrando que a ideologia comunista havia adquirido uma hegemonia no movimento político nacional e que as condições estavam ficando maduras para a construção de um Partido Comunista de todo o país. Deve-se notar que todas estas organizações anunciaram o apoio ao movimento comunista internacional e clamavam por um genuíno partido revolucionário. Mas no processo de agitação e propaganda de suas ideias acabaram entrando em uma competição e luta de ideias entre as organizações. Por exemplo, o Partido Comunista da Indochina acusava o Partido Comunista de Anam de ser “oportunista e composto de falsos revolucionários”. Enquanto o Partido Comunista de Anam acusava o Partido Comunista da Indochina de ser “organização não genuinamente comunista” e de não ser “bolchevique”. Diante desta situação, em outubro de 1929, a Internacional Comunista enviou aos comunistas da Indochina uma Carta para que acabassem com as divisões e ataques mútuos, pedindo para acelerar a realização do encontro marcado para estabelecer a unidade dos comunistas na Indochina. Em vista da emergência de 3 organizações revolucionárias no Vietnã – em janeiro de 1930 – Nguyen Ai Quoc (Ho Chi Minh) foi orientado pela III Internacional a viajar a Hong Kong e organizar um encontro para estabelecer as bases de um Partido Comunista do Vietnã unificado. Esta Conferência teve a participação de cinco delegados, já que se tratava de uma atividade rigorosamente clandestina diante de uma situação de cerco por parte das forças reacionárias na Ásia, que tentavam impedir o desenvolvimento do movimento progressista e revolucionário no pós-Segunda Guerra Mundial. Dos cinco representantes presentes, três eram comunistas dos movimentos revolucionários da Indochina e dois delegados do Partido Comunista de Anam (região central do Vietnã). Sob o comando de Nguyen Ai Quoc, estes delegados decidiram em 3 de fevereiro de 1930 unificar o Partido Comunista da Indochina e o Partido Comunista de Anam em um único Partido: o Partido Comunista do Vietnã. O PCV então, aprovou uma plataforma, um Programa e uma tática sintetizada por Nguyen Ai Quoc. Em 24 de fevereiro de 1930, pela proposta feita pela Liga dos Comunistas da Indochina, o Comitê Executivo provisório do Partido Comunista do Vietnã admitiu a Liga dos Comunistas da Indochina como um só Partido. Completou-se desta forma a unificação das três organizações comunistas do Vietnã. Deste momento em diante a classe operária vietnamita entra em cena para liderar a revolução de libertação nacional e a Independência do Vietnã.

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A Plataforma adotada naquela reunião afirmava que o Partido Comunista do Vietnã” se constituíra na vanguarda do proletariado”, e que a política do partido era “liderar a revolução burguesa e a revolução agrária de forma a ingressar na direção da sociedade comunista”. Este texto está publicado no volume dos documentos oficiais do Partido Comunista do Vietnã publicado em Hanói, em 1997. O objetivo da revolução estava estabelecido no documento: expulsar o imperialismo francês e liquidar o sistema feudal vietnamita, conquistar a independência nacional, estabelecer um governo de operários, camponeses e soldados (que iriam confiscar a terra dos imperialistas e dos senhores feudais e distribuir aos camponeses pobres), nacionalizar as empresas, desenvolver e industrializar a produção agrícola e garantir as liberdades democráticas, a igualdade de gênero e as oito horas de trabalho diárias. Com esta plataforma sintética, a conferência fundadora do Partido ofereceu a direção básica para a revolução no Vietnã. Assim, o programa do Partido se tratava de conquistar a libertação nacional e caminhar para a revolução socialista. Esta linha política foi o resultado da combinação do patriotismo e do internacionalismo proletário, além de ser uma combinação das ideias comunistas adaptadas à realidade da revolução vietnamita. E se poderia perguntar: por que o nome do Partido Comunista do Vietnã foi mudado para Partido Comunista da Indochina? Em outubro de 1930, o Comitê Central provisório do Partido Comunista do Vietnã realizou seu primeiro pleno em Hong Kong sob a direção de Tran Phu (1904–1931) que havia acabado de se formar na Escola do Partido da União Soviética e havia sido cooptado pelo Comitê Central do Partido Comunista do Vietnã. De acordo com os princípios do marxismo-leninismo e as teses da III Internacional sobre a Revolução nas colônias, a plataforma política esboçada por Tran Phu analisou a situação internacional e a situação da Indochina, e decidiu a estratégia e a tática da Revolução na Indochina. Na plataforma política registrava-se que desde o final da Primeira Grande Guerra até 1929 o capitalismo experimentava uma relativa estabilidade. Mas com a grande depressão de 1929, contradições entre os países imperialistas ficaram mais agudas com “violentas e agressivas buscas por mercados, que tornaram inevitável a proximidade de nova guerra”. A União Soviética tornou-se uma realidade e construiu um grande bastião da revolução mundial e da luta da classe operária dos países capitalistas e os movimentos de libertação nacional das colônias tiveram um grande impulso. O movimento revolucionário dos povos da Indochina estava intimamente relacionado com a revolução internacional e contribuiu para a expansão do front anti-imperialista pelo mundo inteiro. A plataforma dizia: “Na atualidade, as forças revolucionárias da Indochina têm participado da vigorosa luta mundial e tem alargado o movimento dos operários e camponeses contra o imperialismo. A revolução mundial e a revolução na Indochina estão estreitamente ligadas”. Sobre as características da situação na Indochina, a plataforma política destacava: “Institucionalmente, a Indochina é uma colônia do Imperialismo francês; no plano social, as contradições (na Indochina) cresceram fortemente entre – de um lado – os operários, os camponeses e o povo trabalhador – e de outro – os senhores feudais, os capitalistas e os imperialistas”. “A Indochina é uma economia agrícola na qual os interesses feudais ocupam um lugar importante. Todas estas condições não permitem que a economia indochinesa se desenvolva de uma forma independente”.

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Sobre a natureza da revolução na Indochina e suas tarefas, a Plataforma política constata: “A revolução na Indochina é uma revolução burguesa dirigida pela classe operária. A burguesa é o período de transição para uma sociedade revolucionária. Após a vitória da revolução burguesa, a revolução continuará a se desenvolver, superando o capitalismo, e se orientando diretamente para o socialismo”. Por fim, de acordo com a plataforma aprovada, apoiada em instruções da II Internacional, o pleno decidiu mudar o nome do Partido Comunista do Vietnã para Partido Comunista da Indochina, além de acelerar as preparações para o Primeiro Congresso Nacional do Partido. O pleno também elegeu um novo Comitê Central composto de seis membros, indicando Tran Phu como Secretário-Geral do Partido. Estas foram as razões da mudança de nome do Partido nesta ocasião. Quais foram, no entanto, as limitações desta plataforma política aprovada e apresentada por Tran Phu? A plataforma política do Partido Comunista da Indochina de 1930 foi uma importante contribuição para o arsenal teórico da revolução vietnamita, e transformou-se numa arma para combater as variadas concepções não proletárias que prevaleciam naquela época. Mas continha, também, inúmeras inadequações porque não levava em conta condições históricas específicas da Indochina – uma sociedade colonial – em que a plataforma política não enfatizava a contradição principal, e com isso não destacava a tarefa anti-imperialista e a luta pela libertação nacional. Ao contrário, de forma primária, a plataforma dava ênfase na luta de classes e na revolução agrária. A plataforma política não analisava corretamente o papel da pequena burguesia, da burguesia nacional, e de determinados setores dos senhores feudais na revolução nacional democrática e popular. Por esta razão o Partido não conseguia reunir todos os setores em uma Frente nacional para lutar contra as elites coloniais dominantes e os servos nativos. Todas estas inconsistências e limitações da plataforma de 1930 foram gradualmente corrigidas pelo Partido Comunista da Indochina pela realidade da luta revolucionária. Durante o levante do Soviete de Nghe Tinh, Nguyen Ai Quoc – que estava no exterior naquela ocasião – escreveu cartas ao Comitê Central do Partido nas quais enfatizava a necessidade de construir o Partido na dimensão política, ideológica e organizativa; construir as organizações de massas, como as centrais sindicais e as organizações camponesas; fortalecendo o Partido dos operários e dos camponeses. Ele também criticou as fraquezas e erros do Partido na condução do levante. Fonte: History of Vietnam, Questions and Answers. The Gioi Publishers, 2018

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A linha do Partido durante o período da Frente Democrática Trechos de um relatório enviado por Nguyen Ai Quoc à Internacional Comunista, em julho de 1939

1. Atualmente, o Partido não deve avançar pedidos demasiado exigentes (independência do país, parlamento etc.). Isso seria deixar-se cair nas armadilhas dos fascistas. Deve formular exigências por direitos democráticos: liberdade de expressão, anistia total para presos políticos; lutar pela legalização do Partido. 2. Para atingir este objetivo, deve fazer todos os esforços para organizar uma grande Frente Nacional Democrática. Esta frente deve compreender não só os indochineses como os franceses progressistas da Indochina, não só as camadas trabalhadoras do país, como a burguesia nacional. 3. Com esta última, o Partido deve agir com muito cuidado e flexibilidade: é preciso fazer tudo para atrair e reter na Frente, levá-la a agir se possível, isolá-la se necessário. Não é conveniente deixá-la fora da Frente. Deixá-la de fora da Frente seria empurrá-la para os braços de reação, seria reforçar a reação. 4. Com os trotskistas, nenhum acordo, nenhuma concessão, é permitido. É preciso desmascarar por todos os meios estes agentes do fascismo, é preciso exterminá-los politicamente. 5. Para desenvolver e consolidar suas forças, ampliar a influência e tornar suas atividades ainda mais eficazes, a Frente Democrática Indochinesa deve manter relações bastante estreitas com a Frente Popular Francesa que também luta pelas liberdades democráticas e que pode prestar-lhe auxílios preciosos. 6. O Partido não deve pretender ser o dirigente da Frente Democrática, deve demonstrar-se como um dos partidos mais devotados, ativos e sinceros. O lugar de dirigente virá quando, na luta e no trabalho cotidiano, as largas massas reconheceram a justeza da sua política e da sua capacidade de direção. 97


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7. Para levar a bom termo estas tarefas, o Partido deve combater impiedosamente o sectarismo e elevar o nível cultural e político dos seus membros através do estudo organizado e sistemático do marxismo-leninismo, deve também ajudar a formar quadros entre os sem partido. Deve manter relações estreitas com o Partido Comunista Francês. 8. O Comitê Central deve fiscalizar os jornais do Partido, a fim de evitar os erros técnicos e políticos (por exemplo: ao publicar a biografia do camarada R., o “Trabalho” relatou onde este camarada esteve, como voltou etc. O mesmo jornal publicou também, sem comentários, a carta deste camarada, considerando trotskismo como produto da vaidade pessoal etc.). Fonte: Ho Chi Minh (Marxist Archive)

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Carta ao Partido Comunista da Indochina Carta enviada de Kwelin – cidade do nordeste da província de Guangxi, na China – em maio de 1939

Queridos camaradas: No passado, segundo minha opinião e de um bom número de camaradas, o trotskismo aparece para nós como uma questão de luta entre as tendências no seio do Partido Comunista da China. Por isso quase não lhe prestamos atenção. Mas, pouco antes do estalar da guerra, mais exatamente desde o fim do ano de 1936, e sobretudo durante a guerra, a propaganda criminosa dos trotskistas fez com que nós abríssemos os olhos. Depois, pusemo-nos a estudar o problema. E nosso estudo nos levou às seguintes conclusões: 1. O problema do trotskismo não é uma luta entre as tendências no seio do Partido Comunista da China. Porque entre comunistas e trotskistas não existe qualquer laço, absolutamente nenhum. Trata-se de um tema que concerne ao povo inteiro: a luta contra a pátria. 2. Os fascistas japoneses e estrangeiros o conhecem. Por isso buscam criar falácias para enganar a opinião pública e prejudicar o nome dos comunistas, fazendo com que as pessoas pensem que comunistas e trotskistas pertencem ao mesmo campo. 3. Os trotskistas chineses (assim como os trotskistas de outros países) não representam um grupo, muito menos um partido político. Não são mais do que uma corja de criminosos, de cães de caça do fascismo japonês (e do fascismo internacional). 4. Em todos os países, os trotskistas se deram belos apelidos para mascarar sua tarefa suja de bandidos. Por exemplo, na Espanha, se chamam Partido Operário de Unificação Marxista (POUM). Vocês sabiam que são eles que constituem ninhos de espiões em Madri, em Barcelona e em outros lugares, a serviço de Franco? São eles que organizam a célebre “quinta coluna”, um organismo de espionagem do exército dos fascistas italianos e alemães. No Japão, se chamam Liga Marx-Engels-Lênin (MEL). Os trotskistas japoneses atraem os jovens para sua organização e logo os denunciam para a polícia. Buscam penetrar no Partido Comunista Japonês com o objetivo 99


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de destruí-lo por dentro. Segundo minha opinião, os trotskistas franceses, atualmente organizados em torno do Revolução Proletária1, estabeleceram como meta sabotar a Frente Popular. Sobre este assunto, penso que vocês estarão mais informados que eu. Em nosso país, os trotskistas se agrupam em organizações como La Lutte, Guerra contra os Japoneses, Cultura e Bandeira Vermelha. 5. Os trotskistas não são apenas inimigos do comunismo, mas também inimigos da democracia e do progresso. São os traidores e os espiões mais infames. Talvez vocês tenham lido as atas de acusação dos processos na União Soviética contra os trotskistas. Se ainda não leram, aconselho-os a lerem junto com seus amigos. É uma leitura muito útil. Ajudará vocês a ver a verdadeira face repugnante do trotskismo e dos trotskistas. Aqui, deixem-me reproduzir algumas passagens – o verdadeiro rosto repugnante do trotskismo – relacionadas diretamente à China. Frente ao tribunal, o trotskista Rarovsky confessou que, em 1934, quando estava em Tóquio (como representante da Cruz Vermelha soviética), um alto personagem do governo japonês lhe dissera: “Temos o direito de esperar dos trotskistas uma mudança de estratégia. Não quero entrar em detalhes. Só que eu queria dizer que esperamos da parte dos trotskistas ações que favoreçam nossa intervenção nos assuntos da China’’. Respondendo a este japonês, Rarovsky disse: “Vou escrever a Trotsky a respeito disso’’. Em dezembro de 1935, Trotsky enviou aos seus partidários, na China, instruções em que enfatizava várias vezes esta frase: “Não criar obstáculos à invasão japonesa na China’’. E como vêm atuando os trotskistas da China? Estão com pressa de saber, não é? Mas, amados camaradas, não poderei responder-lhes mais que em minha próxima carta. Vocês não me recomendaram escrever cartas curtas? Espero vê-los em breve. (1) Revolução Proletária: jornal publicado por um grupo de sindicalistas franceses.

Fonte: Fundación Andreu Nim

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Apelo à Insurreição Geral Este Apelo foi aprovado ao final do Congresso Nacional do Viet Minh, em agosto de 1945, às vésperas da Proclamação da República Democrática do Vietnã, fazendo um chamamento ao povo vietnamita a se levantar para recuperar sua independência

Caros compatriotas! Há quatro anos, conclamei-vos à união, pois a união faz a força, e a força é a chave da conquista da independência e da liberdade do nosso país. Atualmente, as tropas japonesas estão desagregadas. O Movimento pela Salvação Nacional mobiliza todo o país. A Liga para a Independência do Vietnã (Viet Minh) conta com milhões de aderentes de todas as camadas sociais – intelectuais, camponeses, operários, comerciantes, soldados – e de todas as nacionalidades: Tho, Nung, Nuong, Man. Nas suas fileiras, os nossos compatriotas, jovens e idosos, homens e mulheres, vão ombro a ombro sem distinção de religião e de fortuna. A Liga convocou recentemente o Congresso Nacional do Povo e este elegeu o Comitê de Libertação Nacional para dirigir todo o país em sua firme luta pela independência. Isso constituiu um grande passo à frente na história da luta conduzida pelo nosso povo há quase um século pela sua libertação. É para os nossos compatriotas um poderoso estímulo e, para mim, uma imensa alegria. Mas nós não podemos ficar por aqui. A nossa luta será ainda dura e longa. A derrota dos japoneses não nos torna por si só livres e independentes. Temos de redobrar os esforços. É apenas graças à união e à luta que nosso país poderá recuperar a sua independência. O Viet Minh serve atualmente de base à União e à luta do nosso povo. Associai-vos ao Viet Minh, levai-lhes o vosso apoio e fazei com que eles se reforcem ainda mais. O Comitê Nacional de Libertação do Vietnã equivale neste momento a um governo provisório. Uni-vos em torno dele, vigiai para que sua política e ordens sejam executadas em todo o país. Assim, infalivelmente, nossa pátria recupera a sua independência e o nosso povo, a sua liberdade. Caros Compatriotas! Chegou a hora decisiva para os destinos do nosso povo de pé! Compatriotas! Libertemo-nos por nossas próprias forças! Numerosos povos oprimidos, no mundo inteiro, lutam com ardor pela sua independência. Nós não nos deixaremos ficar para trás. Avante, compatriotas! Em frente corajosamente sob a bandeira do Viet Minh! Fonte: Ho Chi Minh, Sobre a Revolução, Seleções de textos de 1920 a 1966, edição de 1968, Nova Iorque, EUA

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Declaração de Independência do Vietnã Um milhão de pessoas estavam reunidas na praça Ba Dinh, em Hanói, para ouvir a Declaração de Independência escrita pelo líder Ho Chi Minh, exatamente às 14h30 da tarde do dia 2 de setembro de 1945. Criteriosamente escolhidas pelo autor, a Declaração vietnamita cita as Declarações de Independência dos Estados Unidos, de 1776, e a Declaração da Revolução Francesa, de 1791 – exatamente os dois países que mais violentamente se aprofundaram na exploração colonial e imperialista no Vietnã.

“Todos os homens são criados iguais. Eles são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, entre eles a Vida, a Liberdade e a busca pela Felicidade”. Essa imortal afirmação foi feita na Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, em 1776. Em um sentido mais amplo, quer dizer que todas as pessoas da Terra são iguais ao nascer, que todas as pessoas têm o direito de viver, de serem felizes e livres. A Declaração da Revolução Francesa, feita em 1791 sobre os Direitos do Homem e do Cidadão, também afirma: “Todos os homens nascem livres e com direitos iguais, e devem permanecer para sempre livres e sempre terem direitos iguais”. Essas são verdades inegáveis. Mesmo assim, por mais de oito anos os imperialistas franceses, abusando da bandeira da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, violaram nossa Terra-Mãe e oprimiram nossos companheiros cidadãos. Eles agiram contrariamente aos ideais de humanidade e justiça. No campo da política, eles privaram nosso povo de toda liberdade democrática.

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Eles criaram leis inumanas; eles estabeleceram três regimes políticos distintos entre o Norte, o Centro e o Sul do Vietnã com o intuito de fragmentar nossa unidade nacional e de impedir nosso povo de se unir. Eles construíram mais prisões do que escolas. Eles massacraram impiedosamente nossos patriotas, afogaram nossas insurreições em rios de sangue. Eles agrilhoaram a opinião pública, praticaram o obscurantismo contra nosso povo. Para enfraquecer nossa raça, eles nos forçaram a consumir o ópio e o álcool. No campo econômico, eles nos roubaram tudo o que foi possível, empobreceram nosso povo e devastaram nossa terra. Eles roubaram nossas plantações de arroz, nossas minas, nossas florestas e nossas matérias-primas. Eles monopolizaram a emissão de cédulas e a exportação. Eles inventaram inúmeros impostos injustificáveis e reduziram nosso povo, principalmente o campesinato, a um estado de extrema pobreza. Eles reprimiram a prosperidade da nossa burguesia nacional, exploraram sem pena nossos trabalhadores. No outono de 1940, quando os fascistas japoneses violaram o território da Indochina para estabelecer novas bases para combater os Aliados, os imperialistas franceses se ajoelharam e entregaram-lhes nosso país. Portanto, a partir daquele dia, nosso povo foi duplamente sujeito ao jugo dos franceses e dos japoneses. Nosso sofrimento e nossa miséria aumentaram. O resultado foi que, do final do ano passado até o início deste ano, da província de Quang Tri até o Norte do Vietnã, mais de dois milhões dos nossos companheiros cidadãos morreram de fome. No dia 9 de março, as tropas francesas foram desarmadas pelas japonesas. Os colonialistas franceses fugiram ou se renderam, mostrando que não apenas eram incapazes de nos “proteger”, mas também que, num espaço de cinco anos, eles venderam duas vezes nosso país aos japoneses. Em algumas ocasiões anteriores a 9 de março, a Liga Viet Minh tentou convencer os franceses a se aliarem a ela para enfrentar os japoneses. Ao invés de aceitar a proposta, os colonialistas franceses intensificaram as atividades terroristas contra os membros do Viet Minh e, antes de fugirem, massacraram inúmeros de nossos prisioneiros políticos detidos em Yen Bai e Cao Bang. Não obstante tudo isso, nossos companheiros cidadãos sempre manifestaram uma atitude tolerante e humana em relação aos franceses.

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Mesmo depois do putsch japonês de março de 1945, a Liga Vietminh ajudou vários franceses a cruzar a fronteira, resgatou alguns deles das prisões japonesas e protegeu vidas e propriedades francesas. A partir do outono de 1940, nosso país de fato deixou de ser uma colônia francesa para se tornar uma possessão japonesa. Depois que os japoneses se renderam aos Aliados, todo o nosso povo unido se levantou para recuperar nossa soberania nacional e para fundar a República Democrática do Vietnã. A verdade é que lutamos pela independência dos japoneses e não dos franceses. Os franceses fugiram, os japoneses capitularam, o imperador Bao Dai abdicou. Nosso povo rompeu os grilhões que por quase um século o aprisionaram, e conquistamos a independência de nossa Terra-Mãe. Nosso povo ao mesmo tempo derrubou o regime monárquico que reinou supremo por doze séculos. Em seu lugar foi estabelecida a presente República Democrática. Por essas razões, nós, membros do Governo Provisório, representando todo o povo vietnamita, declaramos que a partir de agora rompemos todas as relações de caráter colonial com a França; nós revogamos todos os compromissos internacionais que a França estabeleceu até hoje em nome do Vietnã; e abolimos todos os direitos especiais que os franceses adquiriram ilegalmente em nossa Terra-Mãe. Todo o povo vietnamita, animado por um objetivo comum, está determinado a lutar até o fim contra qualquer tentativa dos colonialistas franceses de reconquistar nosso país. Nós estamos convencidos de que as nações Aliadas, que em Teerã e São Francisco reconheceram os princípios de autodeterminação e igualdade, não irão se recusar a reconhecer a independência do Vietnã. Um povo que se opôs corajosamente contra o domínio francês por mais de oito anos, um povo que lutou lado a lado com os Aliados contra os fascistas durante estes últimos anos, esse povo deve ser livre e independente. Por essas razões, nós, do Governo Provisório da República Democrática do Vietnã, declaramos solenemente ao mundo que o Vietnã tem o direito de ser um país livre e independente e que de fato já o é. Todo o povo vietnamita está determinado a mobilizar toda sua força física e mental, a sacrificar suas vidas e propriedades de forma a preservar sua independência e liberdade. Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 3, Hanoi: Foreign Languages Publishing House, 1960-1962.

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NOTA DO EDITOR Em 1945, o Comitê Central do Partido Comunista da Indochina divulgou uma posição política sobre a dissolução voluntária do Partido, com o propósito de fortalecer a união nacional independentemente de classes sociais e facções políticas, para mostrar que os membros do Partido Comunista estavam prontos para colocar os interesses nacionais acima dos interesses de classe. Esta atitude foi uma demonstração do PCI de sacrificar os seus próprios interesses em favor dos interesses comuns da nação, e também para dissipar mal-entendidos fora do país. Essa declaração dizia que o Partido Comunista da Indochina voltaria a operar como uma “Associação para o Estudo do Marxismo na Indochina”. Na verdade o Partido Comunista da Indochina mergulhou na clandestinidade. Tratou-se de uma tática inteligente de Ho Chi Minh e da liderança partidária durante o período em que o movimento de libertação nacional do Vietnã enfrentava sérias dificuldades ameaçado por um fio. Entretanto, os militantes do PCI continuaram a ser o coração e a alma da guerra de libertação. Era a liderança da Associação de Estudos do Marxismo na Indochina que elaborava a linha e as políticas da resistência nacional e liderava a nação para executá-las. Fonte: History of Vietnam, Questions and Answers, The Gioi Publishers, 2018

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Discurso no início da Guerra de Resistência no Sul do Vietnã Discurso pronunciado em novembro de 1945

Compatriotas! Durante a Segunda Guerra Mundial, os franceses venderam duas vezes nosso país aos japoneses. Eles traíram as nações aliadas e ajudaram os japoneses a gerar perdas aos aliados. Enquanto isso, traíram nosso povo, expondo-nos à destruição de bombas e balas. Os franceses se retiraram por vontade do lado aliado e rasgaram os tratados que tinham nos compelido a assinar. Mesmo com a traição dos franceses, nosso povo estava empenhado a ficar do lado dos Aliados e se opor aos invasores. Quando os japoneses se renderam, nosso povo transformou nosso país em uma República Democrática e elegeu um Governo Provisório, que deve preparar um Congresso Nacional e elaborar nosso projeto de Constituição. Não apenas agimos alinhados com o Atlântico e com as cartas patentes de São Francisco, proclamadas pelos Aliados, como também agimos conforme os princípios que o povo francês sustenta, ou seja, Liberdade, Igualdade e Fraternidade. É claro que, no passado, os colonialistas traíram os Aliados e o nosso país ao se renderem aos japoneses. À sombra das tropas britânicas e indianas e atrás dos soldados japoneses, estão agredindo o Sul de nossa pátria. Sabotaram a paz que a China, os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a Rússia conquistaram à custa de milhões de vidas. Violaram as promessas de democracia e liberdade que as potências aliadas proclamaram. Por conta própria, deturparam os princípios de liberdade e igualdade. É por uma causa justa, da justiça mundial e pelo povo e a pátria do Vietnã, que nossos compatriotas se levantaram para a luta e estão determinados em manter sua independência. Nós não odiamos o povo francês, nem a França. Estamos contra a escravidão e a política do colonialismo francês. Não estamos invadindo outro país. Apenas defendemos nosso país contra os invasores franceses. Não estamos sozinhos. Os países que amam a paz e a democracia e as nações mais fracas simpatizam conosco. Com a unidade do povo no país e simpatizantes afora, temos certeza da vitória. Os franceses se comportaram no Sul do Vietnã ilegalmente por quase um mês e meio. Nossos compatriotas do Sul sacrificaram suas vidas em luta. 106


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A opinião pública da China, dos Estados Unidos, da Rússia e da Inglaterra apoiou nossa causa. Compatriotas de todo o país! Os que resistem no Sul darão seu melhor para resistir contra o inimigo. Os que estão no Centro e no Norte se empenharão para ajudar seus compatriotas do Sul e ficarão alertas. Os colonialistas franceses deveriam saber que o povo vietnamita não quer derramamento de sangue, que ama a paz. Mas estamos determinados a sacrificar milhões de combatentes e lutar uma longa guerra de resistência para defender a independência do Vietnã e libertar seus filhos da escravidão. Estamos certos de que nossa resistência será vitoriosa! Que todo o país se engaje na guerra de resistência! Viva o Vietnã independente! Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh, Vol. 3, Hanoi Foreign Languages Publishing House, 1960-1962

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Apelo à luta contra a fome Pronunciamento feito por Ho Chi Minh em 1945, tendo em vista o contexto pósSegunda Grande Guerra e seus reflexos no Sudeste asiático. A fome, além do debilitamento da população e os dois milhões de mortos que causou no Vietnã, provocou grande migração dos que trabalhavam no campo para as cidades.

Mais de dois milhões de nossos compatriotas no Bac Bo morreram de fome, durante os primeiros meses deste ano, em consequência da política bárbara dos colonialistas franceses: requisição do Paddy, cultura forçada da juta etc. A população sofreu ainda com inundações e secas. Por outro lado, a guerra desencadeada pelos colonialistas franceses em Nan Bo trava o transporte do arroz do Sul para o Norte. A fome é mais perigosa ainda do que a guerra. Assim, em seis anos de guerra, a França perdeu menos de um milhão de homens e a Alemanha cerca de três milhões; enquanto que, com a fome, em seis meses, foi ceifada a vida de mais de dois milhões dos nossos compatriotas, que continuam a morrer de fome. Contra a guerra é preciso mobilizar e organizar todas as forças do país para se oporem ao agressor. Para acabar com a fome, também é necessário mobilizar e organizar todas as forças dos nossos compatriotas por todo o país. Entre nós, a fome castiga já com rigor. Se não procurarmos combatê-la imediatamente por todos os meios, em alguns meses ela abater-se-á com todo seu peso sobre o nosso povo. As medidas a serem tomadas contra a fome são de várias ordens, pode ser a proibição de utilizar o arroz e o milho na destilação do álcool, de confeccionar doces etc., para economizar os cereais; pode ser ajuda que uma região levará às outras, cedendo-lhes uma parte dos seus víveres, ou tomando-as sob a sua proteção; pode ser desenvolvimento da cultura dos legumes, dos tubérculos etc. Em resumo, é necessário empreender tudo o que possa atenuar a fome neste momento e impedir a falta de mantimentos que poderá surgir na próxima campanha do arroz. A luta contra a fome, tal como as outras tarefas importantes, exige, para além da determinação, o esforço dos sacrifícios visando à coesão moral de todo o povo. A proibição durante alguns meses de destilar álcool, de confeccionar doces, por exemplo. Lesará certamente os que exercem estes ofícios. Mas esses estão certamente prontos para sacrificar os seus interesses pessoais para salvar os seus compatriotas da fome. Cer108


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tamente ninguém se sentirá bem ao pensar só no seu bem-estar deixando seus compatriotas morrer à fome. Tal como a nossa resistência à agressão estrangeira, a nossa luta contra a fome será coroada de sucessos, pois todos os nossos compatriotas estão plenos de ardor. Os comitês responsáveis das regiões devem fazer um bom trabalho de propaganda e de esclarecimento junto da população para que ela compreenda e execute as diretrizes sobre este assunto. Eles devem dar provas de iniciativa para conduzir o trabalho a bom termo e sem desagradar ao povo. Por isso, a divisa trabalho-espírito de economia-integridade-justiça deve ser, em primeiro lugar, aplicada por esses comitês para dar exemplo à população.

Fonte: Ho Chi Minh, The first 474 Days of Independence, Do Hoang Linh, 2013, Hanoi, Vietnã

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Contra o analfabetismo Apesar das grandes dificuldades do momento, o novo Governo da República Democrática do Vietnã procurou mobilizar todas as forças da Nação para superar a fome e o analfabetismo da população. Cidadãos vietnamitas! Os colonialistas franceses que nos governavam praticaram uma política de obscurantismo: limitaram o número de escolas, não queriam que nós nos instruíssemos a fim de poderem nos enganar e nos explorar mais facilmente. Noventa e cinco por cento dos Vietnamitas não podiam frequentar a escola; o que quer dizer que quase todos eram analfabetos. Nestas condições, como falar em progresso? Agora que a independência foi reconquistada, uma das tarefas urgentes é elevar o nível de instrução. O governo decidiu que, daqui a um ano, todos os vietnamitas saberiam o quoc ngu, nossa escrita nacional romanizada. Ele insistiu numa direção do ensino popular para este efeito. Vietnamitas! Para consolidar a independência nacional, para reforçar e enriquecer o país, é preciso que cada um de nós saiba exatamente quais são seus direitos e deveres, possua novos conhecimentos para poder participar da edificação nacional. Antes do mais, é preciso que todos saibam ler e escrever o quoc ngu. Que aqueles que já o sabem ensinem aos outros; que deem a sua contribuição ao ensino popular. Os analfabetos farão esforços para se instruir, o marido ensinará à sua mulher, o mais velho ao mais novo, as crianças aos pais, o chefe da família aos que vivem sob o seu teto. Os ricos instalarão nas suas casas aulas para os analfabetos. Quanto às mulheres, devem estudar com tanto mais ardor quanto mais entraves as impediram até hoje de se instruir. Chegou a hora em que elas se tornem iguais aos homens e se tornam dignas de serem cidadãs integralmente. Espero que a nossa juventude, rapazes e moças, se empenhe nesta tarefa. Fonte: Ho Chi Minh: The first 474 Days of Independence, Do Hoang Linh, 2013, Hanoi, Vietnã

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Ao povo vietnamita, ao povo francês e aos povos aliados Pronunciamento feito em 21 de dezembro de 1946 – em nome do novo Governo da República – diante das ações dos ultra colonialistas franceses que não aceitaram a Independência e continuaram a provocar massacres e prisões de vietnamitas, atacando a capital Hanói e criando um governo fantoche ao Sul.

O povo do Vietnã e seu governo estão resolvidos a lutar pela independência e pela reunificação do país, mas prontos a colaborar amigavelmente com o povo da França. É por isto que assinamos a convenção preliminar de 6 de março e o modus vivendi de 14 de setembro de 1946. Mas a reação colonialista francesa, faltando com sua palavra, considerou esses acordos farrapos de papel. No Nam Bo, os ultracolonialistas continuaram a prender e a massacrar os patriotas vietnamitas e a fazer provocações. Zombam dos franceses de boa vontade, defensores do respeito à palavra dada. Eles criaram, com todas as peças, um governo fantoche para semear a divisão entre nós. Ao sul da Trung Bo, prosseguem a repressão contra nossos compatriotas, as operações contra o exército vietnamita e a invasão do nosso território. Em Bac Bo, provocaram incidentes para se apoderarem de Bac Ninh, Bac Giang, Lang Son e várias outras localidades. Bloquearam o porto de Haiphong, paralisando assim as atividades comerciais dos vietnamitas, dos chineses e dos outros cidadãos estrangeiros, entre os quais os próprios franceses. Procuraram estrangular a nação vietnamita e quebrar nossa soberania nacional. Puseram em ação os blindados, a aviação, a artilharia pesada e a Marinha de guerra para massacrar nossos compatriotas e apoderar-se do porto do Haiphong, assim como outras cidades ribeirinhas. E não ficaram por aí. Puseram em ação as suas forças de terra, de mar e de ar e nos enviaram ultimatos. Eles massacraram idosos, mulheres e crianças mesmo em pleno coração de Hanói. Em 19 de dezembro de 1946, às 2O horas, atacaram Hanói, capital do Vietnã. Os colonialistas franceses pretendem reocupar nosso país. Isto é evidente e inegável. Atualmente, a nação vietnamita encontra-se perante duas alternativas: cruzar os braços e baixar a cabeça para cair novamente na escravidão, ou lutar até o fim para reconquistar sua liberdade e sua independência. Não! A nação vietnamita não aceitará uma nova dominação! Não! A nação vietnamita não aceitará cair de novo na escravidão. Antes morrer do que perder a independência e a liberdade. 111


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Povo Francês! Nós somos teus amigos, nós desejamos colaborar sinceramente no seio da União Francesa porque temos um mesmo ideal, liberdade, igualdade e independência! Foram os ultracolonialistas franceses que desonraram a França, que procuravam dividir-nos, provocando a guerra. Que a França demonstre compensação ante nossas aspirações à independência e à reunificação; que retire os colonialistas belicistas, e as boas relações de colaboração se restabelecerão entre nossos dois povos. Soldados Franceses! Não há ódio entre nós, apenas interesses egoístas impeliram os ultracolonialistas a provocar as hostilidades; para eles os lucros, para vós os riscos e a morte! As condecorações para os militares, para vós e, para as vossas famílias, sofrimentos e a miséria. Refleti bem. Podereis aceitar de bom grado vosso sangue pelos revolucionários? Vinde para junto de nós e sereis recebidos de braços abertos como amigos. Povos dos países aliados! Após a Segunda Guerra Mundial, no momento em que as democracias se empenhavam para organizar a paz, os colonialistas franceses tentam espezinhar a Carta do Atlântico e a Carta de São Francisco. Desencadeiam no Vietnã uma guerra de agressão, da qual têm inteira responsabilidade. O povo vietnamita solicita vossa intervenção. Compatriotas! A nossa resistência será longa e penosa. Quaisquer que sejam os sacrifícios, seja qual for a duração da resistência, nós combateremos até o final, até o dia em que o Vietnã esteja completamente independente e reunificado. Somos 2O milhões contra 1OO mil colonialistas. A nossa vitória é certa. Em nome do governo da República Democrática do Vietnã lanço esta diretiva ao exército, aos membros e aos corpos de autodefesa, às milícias populares e a toda a população dos três Ky: 1. Se as forças francesas atacarem, contra-atacar energicamente, com todos os meios de que dispõe. Que toda a nação vietnamita se levante para defender a pátria! 2. Protegei a vida e os bens e os cidadãos estrangeiros e tratai corretamente os prisioneiros de guerra; 3. Castigar quem oferecer assistência às forças inimigas. A pátria mostrar-se-á reconhecida para com todos os que apoiam ou conduzem o combate pela defesa do país. Compatriotas! A pátria está em perigo, todos de pé! Viva o Vietnã independente e reunificado! Viva a vitória à resistência! Fonte: Ho Chi Minh (Marxist Archive)

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O Aniversário da fundação do Exército de Libertação do Vietnã Em dezembro de 1944, Ho Chi Minh redigiu a “Instrução sobre a criação da Brigada Armada de Propaganda para a Libertação do Vietnã”. Em cumprimento a esta instrução, em 22 de dezembro Vo Nguyen Giap organizou a cerimônia de fundação da Brigada Armada de Propaganda.

Das tropas de libertação do Exército de Defesa Nacional. O primeiro destacamento das tropas de libertação não era senão uma pequena semente que se desenvolveu para formar uma grande floresta que é o Exército de Defesa Nacional de hoje. Um observador superficial, ao assistir o nascimento das tropas de libertação, teria comparado a um jogo de crianças ou a uma invenção de alguns “utópicos”. E não teria deixado de ironizar a este respeito: “um punhado de fedelhos estudantes ou camponeses, uns Tho ou Nung, outros Trai ou Kinh armados com algumas caçadeiras e uma dezena de algemas, e é isto que ousam chamar-se de tropas com tarefas de libertar a nação”. Mas o nosso partido estava decidido a realizar, custasse o que custasse, o plano de formação das tropas de libertação e confiou a execução desta tarefa ao camarada Vo Nguyen Giap. Os resultados obtidos comprovam a justeza desta política do nosso partido, política justa porque nos inspiramos em uma das mais simples realidades: a nação vietnamita deve ser e será libertada. Para se libertar, deve combater os fascistas japoneses e franceses e, para combater os fascistas, deve possuir forças armadas. Para ter tais forças, deve organizá-las. E isso só se alcançará trabalhando com determinação e método. No princípio tudo faltava: os víveres, o armamento, o vestuário e os medicamentos. Os combatentes eram obrigados a jejuar com frequência, mas estavam sempre cheios de alento e de bom humor. Os seus efetivos, de algumas dezenas de homens, elevaram-se a centenas. Os jovens afluíam para pedir o seu alistamento, decididos a ajudar a tropa compatriota do Viet Bac chegavam mesmo a vender seus búfalos e suas terras. Os compatriotas de outras regiões também traziam o seu apoio. Graças a esta ajuda e graças a suas próprias vitórias alcançadas ininterruptamente, as nossas unidades viram aumentar constantemente seus efetivos e seu poder. A zona libertada foi criada, foram edificadas bases por todos os lados. O ardor e a disciplina exemplar conquistaram a estima e o carinho dos nossos compatriotas. 113


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Na primeira etapa, a tarefa das tropas de libertação era contribuir para fazer a Revolução de Agosto e para edificar a República Democrática. Na etapa seguinte, eles deixaram como legado, ao Exército de Defesa Nacional, bons quadros que lhe transmitiram gloriosas tradições. Ao comemorar hoje, em plena resistência, a fundação das Tropas de Libertação, tiremos alguns ensinamentos: 1. O Exército de Defesa Nacional e as milícias de guerrilha devem continuar a manter a disciplina de ferro, a moral de bronze, a determinação de vencer e as outras virtudes de libertação, como a inteligência, a coragem, a integridade e a fidelidade. 2. Ainda há bem pouco tempo partindo do nada, nós conseguimos edificar forças de libertação bastante poderosas para derrubar os agressores japoneses e franceses. Atualmente, só temos que defrontar um único inimigo, os colonialistas reacionários, agora que temos o Partido, a Assembleia Nacional, a Frente, as imensas forças do Exército de Defesa Nacional e as milícias de guerrilha. Nós nos beneficiamos, para além disso, do apoio dos compatriotas e da opinião mundial. É por isso que a nossa resistência vencerá. Nesta ocasião, envio os meus agradecimentos aos nossos compatriotas do Viet Bac, pela ajuda que deram às Tropas de Libertação e pelo seu apoio devotado à resistência na hora atual. Envio as minhas calorosas saudações, expressão da nossa determinação de vencer, aos veteranos, às Tropas de Libertação que agora combatem corajosamente as fileiras do Exército de Defesa Nacional. Fonte: Pensamento Militar de Ho Chi Minh, Ministério de Defesa Nacional, Instituto de História Militar

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Doze Recomendações Orientações de Ho Chi Minh para o trabalho político dos militares e quadros partidários em luta contra os invasores em 1948

As raízes da nação estão no povo. Na guerra de Resistência e na reconstrução nacional, a principal força está no povo. Assim, todas as pessoas no exército, na administração e nas organizações de massa que estão em contato ou que convivem com o povo devem lembrar e levar consigo as seguintes doze recomendações. Seis proibições: 1 – Não danificar de maneira nenhuma a terra e as plantações ou as casas e os bens do povo. 2 – Não insistir em comprar ou tomar emprestado o que o povo não deseja vender ou emprestar. 3 – Não levar galinhas vivas para as casas das pessoas nas montanhas. 4 – Nunca faltar com a palavra. 5 – Não ofender a fé e os costumes do povo (como mentir perante o altar, levantar os pés mais alto que o coração, tocar música em casa etc.) 6 – Não fazer ou falar coisas que façam as pessoas pensar que as desprezamos. Seis permissões: 1 – Ajudar o povo em suas tarefas diárias (colher, juntar lenha, carregar água, costurar etc.). 2 – Sempre que possível comprar mercadorias para aqueles que vivem longe dos mercados (facas, sal, agulhas, fios, canetas, papel etc.). 3 – Nas horas livres, contar pequenas estórias divertidas e simples úteis à Resistência, mas não revelar segredos. 4 – Ensinar à população a escrita nacional e a higiene básica. 5 – Estudar os costumes de cada região para se familiarizar com eles, de forma a criar uma atmosfera de simpatia no início e então explicar às pessoas gradualmente que diminuam suas superstições. 6 – Mostrar às pessoas que você é correto(a), diligente e disciplinado(a).

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Um poema estimulante: As doze recomendações expressas Estão ao alcance de todos. Os que amam seu país Nunca as esquecerão. Quando o povo têm um hábito, todos são como uma só pessoa, Com bons combatentes e boas pessoas Tudo será recompensado com o sucesso. Apenas quando tem uma raiz firme pode uma árvore viver muito E a vitória é construída com o povo como seu alicerce. Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh. Vol. 3, Foreign Languages Publishing House.

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Apelo à emulação patriótica Em 1948, o Exército francês encontra-se literalmente atolado. Três quartos do Rio Vermelho já estão sob o controle do Viet Minh. Ho Chi Minh, em 11 de junho de 1948, faz esta conclamação ao povo para vencer o invasor.

O estímulo patriótico tem um triplo objetivo: vencer a fome, vencer a ignorância, vencer o invasor. O meio, ei-lo: apoiar-se nas forças do povo, na moral do povo, a fim de criar o bem-estar do povo. É por isto que cada cidadão, qualquer quer seja o seu ofício, quer seja intelectual, camponês, artesão, comerciante ou combatente do exército, tem o dever de participar no estímulo para fazer depressa/fazer bem/fazer muito. Todo vietnamita, independentemente da idade, do sexo, da riqueza, da posição social, deve tornar-se um combatente em uma dessas frentes: militar, econômica, política ou cultural. Cada um deve colocar em prática a palavra de ordem “resistência de todo o povo, resistência total”. No estímulo patriótico, realizamos a reconstrução nacional paralelamente à resistência. Tanto quanto aos resultados do estímulo, ei-los: Todo o povo se alimentará e se vestirá decentemente. Todo o povo saberá ler e escrever. Todo o exército terá víveres e armas para derrotar o inimigo. A nação ficará inteiramente independente e unificada, é assim que obteremos: a independência pela nação, a liberdade para os cidadãos, o bem-estar para o povo. Para conseguir chegar a estes objetivos radiosos, convido a participar no estímulo: Os velhos: que eles encorajem a juventude a participar com ardor em todos os trabalhos! As crianças: que elas rivalizem entre si no trabalho da escola e na ajuda aos adultos! Os comerciantes e os industriais: que eles desenvolvam os seus negócios! Os camponeses e operários: que eles desenvolvam a produção! Os intelectuais: que eles criem! Os técnicos: que eles inventem! Os funcionários: que eles sirvam o povo com toda devoção! O exército regular e as formações de guerrilheiros: que inflijam as mais pesadas perdas ao inimigo e apreendam um importante espólio de guerra! Em resumo, toda gente deve participar no estímulo, tomar parle na existência e na reconstrução nacional. Quanto mais entusiasta for o movimento, mais o estímulo galvanizará nas camadas sociais e ganhará em

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extensão e em profundidade em todos os domínios, e nós poderemos transpor as dificuldades, aniquilar os projetos pérfidos do inimigo para chegar à vitória final! Com o espírito indomável e as imensas forças do nosso povo, com o amor da pátria e a vontade resoluta do povo e do exército, o nosso estímulo patriótico será um sucesso: nós podemos e nós fá-lo-emos. Compatriotas e combatentes! Em frente! Fonte: Ho Chi Minh (Marxist Archive)

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Resposta sobre a intervenção ianque na Indochina Na Conferência de Londres sobre a Indochina (abril de 1950), os Estados Unidos decidem enviar mais dinheiro e armas aos franceses, além de missões militares para a destruição do movimento de libertação. Nesta entrevista de Ho Chi Minh ao jornal Cu Quoc, órgão da Frente Viet Minh, em julho de 1950, o líder vietnamita trata desta questão.

Pergunta: Senhor presidente, quereis informar o estado atual da política de intervenção do imperialismo americano na Indochina? Resposta: Desde muito tempo que os imperialistas americanos intervieram na Indochina. Os colonialistas franceses prosseguem a guerra ao Vietnã, ao Camboja e ao Laos, sob as ordens americanas e graças aos dólares e armas dos EUA. Mas, ao mesmo tempo, os imperialistas americanos procuraram cada vez mais afastar os colonialistas franceses para estabelecerem sua dominação exclusiva na Indochina. Eles intervêm cada vez mais direta e ativamente nos domínios militar, político e econômico, e é por isso que as contradições se multiplicam entre imperialistas ianques e colonialistas franceses. Pergunta: Senhor Presidente, quais são as consequências da intervenção americana para os povos da Indochina? Resposta: Os imperialistas fornecem armas para massacrar os povos da Indochina. Introduzem suas mercadorias a fim de impedir o desenvolvimento da pequena indústria local. Propagam a sua cultura depravada para envenenar nossa juventude na zona provisoriamente ocupada. Praticam uma política de corrupção de promessas e de divisão. Esforçam-se por arrastar criminosos para seus serviços, para empreender conjuntamente a conquista do nosso país. Pergunta: Qual será a nossa resposta, Senhor Presidente? Resposta: Para reconquistar sua independência, os povos da Indochina devem estar dispostos a abater seu inimigo número um: os colonialistas franceses. Ao mesmo tempo, devemos lutar contra os intervencionistas americanos. Quanto mais reforçarem sua intervenção, mais devemos unir-nos e combatê-los energicamente. Devemos desmascarar seus desígnios e mais particularmente na zona provisoriamente ocupada. Devemos desmascarar os criminosos que se ofereceram como lacaios dos imperialis119


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tas estadunidenses para procurar arrastar, enganar e dividir o nosso povo. A união estreita entre o povo vietnamita e os irmãos do Camboja e do Laos dar-nos-á bastante força para destruir completamente os colonialistas franceses e os intervencionistas. Os imperialistas americanos fracassaram completamente na China. Terão a mesma sorte na Indochina; nós nos chocamos com diferentes dificuldades, mas venceremos. Fonte: Cu Quoc, órgão da Frente Viet Minh

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Recomendações ao I Congresso Nacional de Educação dos Quadros Diante do enorme desafio para tornar vitoriosa a Revolução de Libertação Nacional e Social, Ho Chi Minh deu grande importância à preparação dos quadros e à Educação do povo vietnamita, como revela nesta orientação escrita em maio de 1950.

I — O trabalho de educação deve ser realista e consciencioso A educação dos quadros não é um trabalho simples; para conduzi-la com êxito, é necessário conhecê-la bem. Agora vou responder sucessivamente às vossas perguntas: 1 — A quanto se elevou o número de quadros que nossas organizações formaram? Não sabemos exatamente o número, mas podemos ainda assim fazer um cálculo aproximado: os relatórios da juventude da 5ª Zona assinalam que foram abertos 2.713 cursos de educação. Esta cifra parece muito “científica” para que nela possamos acreditar inteiramente. Então, nós podemos desprezar 713 e tomar somente 2.000 cursos. Quanto às outras organizações, na mesma zona (operários, camponeses, mulheres etc.), elas puderam abrir 3.000. Assim somente para a 5ª Zona, cuja população é rarefeita, podemos já organizar 5.000 cursos. Suponhamos que cada curso comporte 10 pessoas, então o número total de indivíduos recebendo uma formação de quadros em todo o setor elevar-se-ia a 50.000. No Nam Bo, nas 3ª e 4ª Zonas, e no Viet Bac, a população é mais densa e, em certas localidades, o trabalho de educação pôde se realizar de maneira mais intensa. Se nós tomarmos uma média de 50.000 pessoas, ou seja, 250.000 quadros. E, no entanto, queixa-se da falta de quadros! E por que isto? Porque o trabalho de educação se faz mais pela forma do que pelo fundo: prende-se a quantidade sem fazer o trabalho de massas realista e consciencioso. 2 — Quem devemos nós formar? Nós devemos formar: – os quadros; – os membros das organizações populares; – os quadros técnicos do governo; – a população.

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Tomemos primeiro os quadros, porque eles “formam o capital das organizações populares”. É preciso ter um capital para poder fazê-lo frutificar. Para a aplicação de uma política, para a execução de um trabalho, com bons quadros, chega-se ao sucesso; isto é a rentabilidade. Sem bons quadros, o trabalho fracassa ou, dito de outra maneira, há perda de fundos. 3 — Quem deve educar? Não se deve dizer que não importa quem faça o trabalho de educação. Para preparar ferreiro ou ajustadores, o educador deve ser realmente experiente no ofício de ferreiro ou ajustador. O educador nas organizações populares deve ser um modelo sob todos os pontos de vista: ideologia, moralidade, método de trabalho. O educador deve sempre [aprender] mais para poder assegurar sua tarefa. Lênin nos estimulou a: “Aprender, aprender e ainda aprender sempre”. Cada um de nós deve se lembrar deste conselho e pô-lo em prática; o educador mais que qualquer outro. O educador que pretende tudo saber é o último dos ignorantes. A palavra de ordem: “Instruir-se, instruir-se ainda, ensinar, ensinar ainda”, afixada nas salas de reunião, vem de Confúcio. Confúcio era um feudal e, em sua doutrina, há muitas coisas que não são justas, mas nós podemos tirar proveito dos bons ensinamentos que ele abrange. “Somente os revolucionários autênticos sabem aproveitar o precioso legado das gerações passadas”, disse-nos Lenin. 4 — O que é preciso ensinar para a formação dos quadros? a) Pela teoria. É preciso inculcar em todos a teoria marxista-leninista. Mas não adianta nada conhecer a teoria sem aplicá-la. Não se aprende a teoria para falar dela. Conhecer a teoria sem aplicá-la, é cair na teoria oca. Aprende-se a teoria aplicando-a em nossas ações. Agir sem nada conhecer de teoria é marchar as apalpadas na noite, lenta e inseguramente. A teoria ajuda a compreender tudo o que se passa na sociedade, no movimento; o que nos permite tomar medidas justas e aplicá-las corretamente. b) Para o trabalho prático. Além da teoria, é preciso ensinar o trabalho prático. Por exemplo, para a mobilização geral, para o incentivo patriótico, para o recolhimento do imposto do arroz em casca etc., é preciso saber como explicar claramente à população, como mobilizá-la no plano moral,

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como organizar o trabalho. Por nossos recentes sucessos diplomáticos, há ocasião de examinar sua influência sobre nós, sobre o inimigo, sobre a situação interior do país, sobre a situação internacional, examinar o que é preciso fazer para explorar a fundo a influência destes sucessos. Convém ensinar tudo isto a nossos quadros e a nossos camaradas. c) Pela cultura. Dar uma cultura geral aos camaradas que não a têm, para ajudá-los a progredir em matéria de teoria e trabalho. d) Pela qualificação profissional. Cada um deve saber exercer uma profissão para viver. Os quadros que dirigem um ramo de atividade devem ter a qualificação profissional requerida. Assim, os camaradas diretores das estradas de ferro devem ser qualificados na técnica ferroviária. Não é senão com esta condição que eles podem garantir uma direção eficiente. 5 — Como educar os quadros? a) É preciso preferencialmente ser realista e consciencioso a correr atrás da quantidade. O essencial é fazer compreender a fundo a matéria pelos que a estudam. Mas há várias maneiras de compreender a fundo: pode-se fazer compreender a fundo, entrando-se em todos os detalhes, mas isto exige muito tempo. Em compensação, pode-se também ensinar de uma maneira geral e igualmente fazer compreender o assunto a fundo. Assim, para ensinar a alguém o que é um elefante, pode-se descrever minuciosamente seu esqueleto, sua dentição, seu modo de existência, indicar a duração de sua vida etc. Entretanto, se não se pode ainda ensinar esses detalhes, pode-se sempre fazer compreender o que é um elefante, descrevendo-se sumariamente: sua altura – três a quatro vezes a de um búfalo –, suas patas — tão volumosas como os pilares de uma casa –, suas orelhas — como dois leques –, sua cabeça — com uma tromba e duas presas etc. Isso de tal sorte que os alunos não confundam um elefante com um camarão, um gato ou um boi. Melhor ainda, quando eles ouvirem falar de caça ou captura do elefante, eles não possam imaginar erroneamente que se possam servir de anzóis para pescá-lo ou de junco ou de varas para abater a fera. Desta maneira, eles podem utilizar mais ou menos o seu saber em seu trabalho. Pelo contrário, se com o pouco tempo disponível e com um nível cultural ainda baixo, nos alongarmos sobre o estudo das presas de marfim, os alunos, chegando em casa, confundirão o elefante com o marfim, o que não será de nenhuma utilidade.

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b) É necessário assegurar a educação de alto a baixo. Os comitês de educação dos quadros não devem ser muito ambiciosos. Eles educam os quadros de um nível inferior que, por sua vez, se encarregarão de ensinar os quadros de um nível mais baixo. O Comitê Central forma quadros para as zonas e as províncias; estes asseguram em seguida a educação dos quadros de distrito e de aldeia. Far-se-á assim uma economia de força e de tempo e colocar-se-á melhor ao alcance dos camaradas do nível imediatamente inferior. Todavia uma educação empreendida dessa maneira deve ser conduzida muito conscienciosamente. É necessário evitar o “deixa pra lá”; se a negligência reina num nível superior, quanto mais descermos para os níveis inferiores, veremos que os erros se acentuarão. c) Ligar estreitamente a teoria com o trabalho prático. O Comitê Central fornece as diretrizes referentes às medidas a tomar no painel da política do partido. O comitê de educação deve explicar estas medidas por uma documentação concreta tomada da situação real e da experiência prática. Não será senão desta maneira que a teoria não estará dissociada da realidade concreta. d) A formação deve visar às necessidades reais. O comitê de educação deve se pôr em contato estreito com os organismos de propaganda, de agitação e de poder. A formação dos quadros tem por fim essencial fornecer aos diversos ramos – organizações populares, Frente Nacional Unida, Serviços Públicos e Exército – esses elementos. Aqueles ramos consomem. O comitê de educação fabrica. O fabricante deve satisfazer as exigências do consumidor. Se fabricarmos bules de chá em quantidade quando quase todos os pedidos são de veículos, ninguém comprará os primeiros. e) A formação dos quadros deve dar toda a importância necessária à transformação ideológica. É preciso compreender bem os alunos para poder desenvolver suas aptidões e eliminar seus defeitos. É preciso ensinar e inventar. Ensinar é fazer aprender, forjar é desembaraçar o cérebro de seus vícios. Por exemplo: atualmente os nossos quadros são afligidos por um defeito grave: o orgulho e a insolência. É preciso extirpá-lo a qualquer preço. Senão o saber adquirido pelo estudo seria até nefasto. É por orgulho e presunção que os quadros ambicionam as altas funções. Exemplo: um quadro servindo no nível zonal se queixará e se desencorajará se a organização o transferir para o nível distrital. Ele considera esta transferência indigna de suas capacidades que deveriam normalmente lhe valer um posto mais elevado! Esta inclinação para os altos postos deve ser extirpada. É necessário fazer todo trabalho útil à revolução, ao Partido: não existe trabalho nobre nem trabalho vil.

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6 – Documentação a utilizar a) Em primeiro lugar, é preciso tomar os textos do marxismo-leninismo como documentos de base. Entretanto, deve-se fazer uma escolha e reclassificar os textos porque há diferenças de nível entre alunos e, para cada categoria, é preciso documentos adequados. É inútil estudar textos que não convêm. Uma vez, ao regressar de uma reunião, encontrei um grupo de jovens e de mulheres sentados, no campo, descansando, no alto de uma ladeira. Como eu perguntei sobre seu deslocamento, eles me informaram que voltavam de um curso de formação de quadros, embora estivéssemos em pleno período dos trabalhos da colheita. Eles tinham se esforçado para terminar seus afazeres a fim de poder ir seguir o curso, tendo cada um levado uma provisão de arroz para dez dias. E eu insisti: — Tiveram prazer em seguir este curso? — Muito prazer. — E o que estudaram? — Carlos Marx. — Compreenderam alguma coisa? Eles mostraram-se perturbados. — Não. Assim, eles tinham perdido seu tempo e seus víveres. b) Além dos documentos sobre o marxismo-leninismo, há também os documentos tirados da prática. Trata-se dos efeitos de experiências trazidos pelos próprios ouvintes, experiências de sucessos como experiências de fracassos. O intercâmbio destas experiências lhes dá preciosos ensinamentos. Não é necessário, para que haja uma lição a aprender, que um camarada de um escalão superior venha a fazer uma palestra. O intercâmbio e o acúmulo de experiências vividas devem ser cuidadosamente organizados, eles não devem ser uma ocasião para alguém fazer a própria promoção. c) As instruções, as resoluções, as leis, as ordens da Organização e do Governo são documentos dignos de estudo. II – Elevar o nível dos estudos pessoais e guiá-los O aprendizado na escola da Organização não se assemelha ao aprendizado nas escolas do tipo antigo onde se estudava somente na presença do mestre e se divertia durante sua ausência. É necessário se tomar a iniciativa de estudar por si próprio. Também deve-se perguntar:

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1. Por que estudar? a) Estudar para se corrigir ideologicamente: entregar-se à revolução com ardor é elogiável. Mas enquanto não se tem ainda ideias exatamente revolucionárias, é necessário estudar para retificar. Somente quando a ideologia é justa que a ação é isenta de erro e que se pode levar em bom termo sua tarefa revolucionária. b) Estudar para cultivar a moral revolucionária: é necessário possuir as virtudes revolucionárias, saber devotar-se até o sacrifício pela revolução, para poder dirigir as massas e conduzir a revolução à vitória. c) Estudar para ter confiança: confiança na Organização, no povo, no futuro da nação, no futuro da revolução. É preciso ter fé para se mostrar firme e ardente na ação, resoluto em todos os sacrifícios diante das dificuldades. d) Estudar para agir: o estudo e a ação devem-se acompanhar. Não há estudo útil sem ação. Não há ação que tenha bom êxito sem estudo. 2. Onde estudar? Aprender na escola, nos livros, aprender uns com os outros, junto das massas. Seria uma grande falha não aprender junto das massas. Eis uma história muito interessante a este propósito. A heroína dela é a camarada Thai, originária de Son La. Quando ela estava com 15 ou 16 anos, os quadros da Revolução tinham lhe confiado uma tarefa no trabalho de propaganda, mas ela apenas repetia o que eles lhe diziam e não compreendia muita coisa. Um ano mais tarde, o inimigo ocupou Son La. A população e os quadros de Son La se refugiaram em Hoa Binh. Aí a população local lhes mostrou seu desprezo acusando-os de ter medo do inimigo, o que os determinou a ingressar em seus lares reconquistando suas aldeias. No caminho de volta, se defrontaram com toda espécie de dificuldades e tiveram de suportar numerosos sofrimentos, mas sempre continuavam amigos e se auxiliavam reciprocamente. Aconteceu um dia que uma camarada caiu doente, a seção fez tudo por ela; inclusive lava sua roupa. Os quadros se devotavam para ajudar a população em todas as suas ocupações e assim ganharam sua estima. Assim restabeleceu-se a união da população com os quadros. As bases foram reconstituídas. Os quadros viviam misturados com a população e conseguiram, pouco a pouco, reorganizar a produção e a luta armada. Um dia, quatro milicianos chegaram na aldeia: as aldeãs, faceiramente embelezadas, serviram-lhes bebidas alcoólicas que continham um narcótico, e

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os milicianos, tendo ingerido a beberagem, caíram entorpecidos. As mulheres então chamaram os guerrilheiros, e estes despojaram-lhes de suas armas. Ao recuperarem o conhecimento e vendo que haviam perdido seus fuzis, os soldados fugiram. Prevendo represálias, os quadros discutiram com a população sobre os meios de esconder o arroz em casca e os outros bens na floresta. Mas ainda não chegaram a ousar aconselhar a técnica da “terra queimada”. Foram justamente os velhos da aldeia que primeiro sugeriram a ideia de queimar as casas a fim de que o inimigo não encontrasse nada para se abrigar quando lá chegasse. Esta ideia foi aprovada por todos. Quando o inimigo chegou, suas próprias armas (tomadas aos milicianos) serviram para que os habitantes pudessem resistir e repelir os assaltantes. Desde então, a população está cheia de confiança em suas próprias forças e nos quadros, e o movimento cresce dia a dia. A camarada Thai, que este ano completou vinte anos e ainda tem pouca instrução, contou esta estória de maneira muito clara e dela tirou uma conclusão bastante marxista em três pontos: - “Primeiro, nós estamos muito unidos. - Segundo, nós somos benquistos pela população. - Terceiro, nós recebemos lições das experiências da população”. Isto significa o quê? Quando unidos, os quadros levam a bom termo tudo o que tiveram de fazer. Os quadros devem se fazer benquistos pelo povo, ganhar sua confiança e sua estima. Os quadros devem se manter junto das massas e aprender ao redor delas. III – Um defeito a corrigir imediatamente na formação dos quadros O defeito geral é que se visa muito à quantidade e não se faz o trabalho de maneira conscienciosa. Esquece-se de que “mais vale boa qualidade do que grande quantidade”. Isto é particularmente visível na organização dos cursos de formação de quadros. 1) O efetivo das classes é muito elevado. Daí resultados limitados tanto do lado dos instrutores como do lado dos alunos, porque suas diferenças quanto ao nível teórico os impedem de ter a mesma capacidade de assimilação. O programa não responde às necessidades reais pelo fato de que os alunos são quadros ocupados em tarefas de nível diferentes.

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2) Abrem-se cursos um pouco aleatoriamente. No momento atual, grassa uma epidemia de abertura de escolas. Por exemplo, ao lado da escola de Organização há aquelas de ação popular, camponesa, feminina, operária e aquela de ação junto aos jovens. Se não importa qual escola da Organização deve ensinar a ação popular, por que abrir outras com o mesmo fim? Em razão do grande número de cursos, chega-se a ter falta de instrutores, o que desencoraja os alunos. Por falta de instrutores, obriga-se os existentes a “trabalhos forçados”, o que faz com que eles estejam sempre apressados e sejam obrigados a passar logo de uma classe para outra “como libélulas tocando a água com suas patas”. Seus ensinamentos não respondem às exigências da situação. Quando se tem falta de instrutores, é necessário “tapar os buracos” e o “tapa-buracos” não está à altura de sua tarefa, ele comete erros; o que prejudica aos alunos, isto é a Organização. Finalmente desperdiça-se arroz e aprende-se ao “vai levando”. Então como fazer? É necessário racionalizar a formação dos quadros, isto é: Ao abrir-se um curso, é necessário que ele tenha as condições requeridas. É preciso que não se abram cursos aleatoriamente. Eu não falo exclusivamente dos cursos. A imprensa deve ser igualmente racionalizada. Nada de muitas folhas. Fazer pouco, mas com seriedade. Se não se racionalizar, a imprensa fornecerá artigos que não acham leitores e que custam muito caro. A organização paga somas enormes enquanto os jornalistas se divertem a fazer pastiches que não interessam a ninguém. Eis, em resumo, o que eu tenho a dizer-lhes.

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Relatório Político entregue ao II Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores do Vietnã O Partido dos Trabalhadores do Vietnã foi a denominação que o Partido tomou no Vietnã com a dissolução do anterior Partido Comunista da Indochina – ao tempo em que também foram criados partidos independentes para o Laos e o Camboja. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã é a expressão da continuidade do PCI, que em vietnamita se diz Lao Dong, com uma ênfase maior na luta pela resistência e a questão nacional, além do alargamento da base social da Revolução.

I. A situação no decurso desses últimos 50 anos Estamos no ano de 1951, que concluiu a primeira metade do século XX e inaugura a segunda, em um momento de extrema importância na história da humanidade. Estes últimos cinquenta anos viram transformações mais rápidas e mais importantes do que vários séculos passados em seu conjunto. Esta metade de século foi testemunha de numerosas invenções, como o cinema, o rádio, a televisão e a energia atômica. Assim, a humanidade deu um grande passo no domínio das forças da natureza. Durante este período o capitalismo passou da fase da livre concorrência para a do capitalismo monopolista e para o imperialismo. Durante estes cinquenta anos, eclodiram duas guerras mundiais, as duas guerras mais terríveis que a história conheceu, provocadas pelos imperialistas. Ao mesmo tempo, em virtude destas conflagrações, os imperialismos russo, alemão e italiano foram arrasados; os impérios inglês e francês caíram em decadência; enquanto o capitalismo norte-americano se tornou o chefe da fila do imperialismo, da reação. Mas o acontecimento principal é a vitória da Revolução Russa de Outubro. A União Soviética, Estado socialista, viu o dia cobrindo a sexta parte do Globo. Quase metade da humanidade se comprometeu na via da Nova Democracia; os povos oprimidos levantaram-se ano após ano contra o imperialismo, reivindicando a independência e a liberdade. A Revolução Chinesa triunfou. O movimento operário nos países imperialistas cresce a cada dia. No mesmo período, no Vietnã, o nosso Partido nasceu e tem hoje 21 anos. Nosso país é independente há seis anos. A nossa resistência prolongada progrediu rapidamente e entra no seu quinto ano. 129


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Em resumo, a primeira metade do século XX foi marcada por acontecimentos de importância extrema. Mas podemos prever que, com o esforço dos revolucionários, a segunda metade verá mudanças ainda mais consideráveis e ainda mais gloriosas. II. O nascimento do nosso Partido Depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), para compensar suas pesadas perdas, os colonialistas franceses investiram no nosso país importantes capitais para explorar e pilhar ainda mais nossas riquezas e intensificar a exploração da nossa mão de obra. Por outro lado, a vitória da Revolução Russa e a ebulição da Revolução Chinesa tiveram uma influência extremamente grande e profunda. Foi assim que a classe operária do Vietnã ganhou maturidade, começou a tomar consciência de si mesma, entrou na luta e sentiu necessidade de uma vanguarda, de um Estado-Maior para a direção do seu movimento. No dia 6 de janeiro de 1930, o nosso Partido viu à luz do dia(1). Depois de um trinfo da Revolução Russa de Outubro, Lênin dirigiu a criação da Internacional Comunista. Desde então, o proletariado mundial não foi mais do que uma grande família da qual nosso Partido é um dos últimos filhos. O nosso Partido viu nascer a luz do dia em uma situação muito dura, criada pela política selvagem de terror dos colonialistas franceses. Contudo, mal nasceu, dirigiu imediatamente contra estes últimos uma luta feroz que atingiu o seu ponto culminante durante o período dos sovietes do Nghe An. Pela primeira vez, nosso povo tomava o poder no nível local e começava a aplicar uma política democrática, embora com limites. Apesar do seu fracasso, os sovietes de Nghe An tiveram um grande alcance. O seu espírito heroico, que permaneceu sempre ardente na alma das massas, abriu a via às vitórias ulteriores. De 1931 a 1945, o movimento revolucionário no Vietnã, sempre dirigido pelo nosso partido, teve altos e baixos. Estes quinze anos de luta podem ser divididos em três períodos: 1) Período 1931-1935; 2) Período 1936-1939; 3) Período 1939-1945. III. O Período 1931-1935 De 1931 a 1933, os colonialistas franceses exerceram um terror selva(1) Uma resolução do III Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores do Vietnã retificou a data da fundação do Partido Comunista da Indochina e fixou-a para 3 de fevereiro de 1930.

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gem. Os nossos quadros e os nossos compatriotas foram em grande número presos e mortos e as organizações do Partido e de massas quase todas destruídas. Em decorrência disso, houve um recuo momentâneo do movimento revolucionário. Graças à fidelidade e ao desenvolvimento sem limites dos restantes camaradas, a determinação do Comitê Central, a ajuda dos partidos amigos desde 1933, o movimento retomou, pouco a pouco, sua marcha. O nosso Partido ocupa-se então, por um lado, em consolidar as organizações clandestinas e, por outro lado, em coordenar o trabalho clandestino com as atividades legais, a propaganda e a agitação pela imprensa, os conselhos municipais, o conselho colonial etc. Em 1935, realizou-se o primeiro Congresso do Partido em Macau. Este fez a análise da situação no país e no mundo, procedeu ao exame crítico do trabalho realizado e fixou um programa de trabalho para os anos futuros. Contudo, a política traçada pelo Congresso de Macau não estava de acordo com o movimento revolucionário no mundo e no nosso país nessa época (projetava distribuir terras aos operários agrícolas, não se via a necessidade da luta contra o fascismo e o perigo da guerra fascista etc.). IV. O Período 1936-1939 Em 1939, quando ocorreu o Primeiro Congresso Nacional do Partido, os camaradas Le Hong Phong e Ha Huy Tap corrigiram esses erros e definiram uma nova política baseada nas resoluções do 7º Congresso da Internacional Comunista (criação da Frente Democrática, ativa, semiclandestina, semilegal, do Partido). A Frente Popular detinha então o poder na França. O nosso Partido iniciou uma campanha de ação democrática e fundou a Frente Democrática Indochinesa. O movimento da Frente Democrática alargava-se e ganhava força, o povo lutava na legalidade. Estava bem. Mas havia lacunas; por vezes, o trabalho da direção não ligava bem com a realidade e, em muitos locais, os quadros pecavam por estreiteza de espírito, cediam à tendência para a ação legal, deixavam-se envaidecer por sucessos parciais, negligenciando em consolidar as organizações clandestinas do Partido. Este não explicou claramente sua posição sobre a questão de independência nacional. Alguns camaradas colaboravam, violando os princípios, com os trotskistas. Depois do fracasso da Frente Popular na França e do rebentar da Segunda Guerra Mundial, o movimento da Frente Democrática no nosso Partido encontrou-se, por algum tempo, em uma situação embaraçosa.

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Contudo, este movimento legou ao nosso Partido e à nossa atual Frente Nacional preciosas experiências. Ele nos ensinou que o que responde às aspirações do povo tem o apoio das massas populares, e estas prosseguem energicamente. Só assim na luta se obtém um verdadeiro movimento de massas. Ele nos ensinou também que é preciso fazer tudo para evitar o subjetivismo, a estreiteza de espírito etc. V. O Período 1939-1945 As mudanças consideráveis sobrevindas no país e no mundo, durante este período, não datam de mais de 100 anos. Muitos dentre nós fomos testemunhas e numerosos são os que se lembram disso. Aqui, limito-me a recordar os principais acontecimentos. a. No mundo Em 1939, estourou a Segunda Guerra Mundial. No começo, foi uma guerra imperialista: os imperialistas fascistas alemães, italianos, japoneses batiam-se contra os imperialistas ingleses, franceses e norte-americanos. Em junho de 1941, os fascistas alemães atacaram a União Soviética que, obrigada a defender-se, devia aliar-se com a Inglaterra e os Estados Unidos contra o campo fascista. Desde então, a guerra tornava-se uma guerra entre o campo democrático e o campo fascista. Graças às forças poderosas do Exército Vermelho e do povo soviético e à justa estratégia do camarada Stálin, a Alemanha foi derrotada em maio de 1945 e o Japão capitulou no mês de agosto do mesmo ano. O campo democrático alcançava uma vitória total. Nessa vitória, a maior parte – tanto nos aspectos militares e políticos, como no aspecto moral – cabia à União Soviética. Foi graças à vitória da URSS que os países da Europa Oriental – há pouco bases ou territórios da Alemanha fascista – se tornaram países de Nova Democracia. Foi graças à vitória da União Soviética que o movimento de libertação nacional cresce cada vez mais nos países coloniais. Os Estados Unidos ganharam do ponto de vista financeiro, enquanto os outros países lançavam todas suas forças na guerra e eram arrasados por esta. Os EUA aproveitaram para lucrar somas fabulosas. Depois da guerra, os fascistas alemães, italianos e japoneses estavam derrotados. Os impérios francês e inglês entraram em decadência. A União Soviética concluiu rapidamente sua restauração e retomou a construção do

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socialismo, enquanto os EUA, marchando nas pegadas dos fascistas alemães, italianos e japoneses, se tornavam o chefe dos imperialistas fascistas de hoje. b. Em nosso país Depois da eclosão da Segunda Guerra Mundial, o Comitê Central do Partido, reunido em novembro de 1939, definiu a política do Partido: criação da Frente Nacional Única contra os colonialistas franceses e contra a guerra imperialista, preparação da insurreição. Não se avançava na palavra de ordem “confisco e distribuição das terras dos latifundiários aos camponeses” para poder unir os latifundiários à Frente Nacional. Como os franceses capitularam perante os fascistas alemães, foram suplantados pelos japoneses na Indochina, que se serviram deles para reprimir a revolução na nossa pátria. Três sublevações populares demarcaram este período: as de Bac Son, do Nam Ky e Do Luong. Em maio de 1941, reuniu-se o 8º Plenário do Comitê Central. Importava, em primeiro lugar, considerar a revolução no Vietnã como sendo, no imediato, uma revolução de libertação nacional e criar a Liga para a Independência Nacional (Frente Viet Minh). As principais palavras de ordem eram: “unir todo o povo”, “resistir aos japoneses e aos franceses”, “reconquistar a independência”, “adiar a revolução agrária”. Liga para a independência do Vietnã era um nome muito claro, realista e conforme às aspirações de todo o povo. Além disso, o programa simples, realista e completo da Frente só compreendia dez pontos, assim como o recorda a canção de propaganda: “O programa composto por dez pontos: No interesse do país e no interesse do povo”. Entre os dez pontos, uns aplicavam-se a todo o povo, outros diziam respeito à luta pelos interesses dos operários, dos camponeses e das outras camadas sociais. É isto que explica o caloroso acolhimento reservado ao Viet Minh por todo o povo. E, graças aos esforços desenvolvidos pelos quadros para se manterem em estreito contato com o povo, o Viet Minh teve um desenvolvimento rápido e vigoroso. Este resultou de um enorme impulso do Partido. Este ajudou os jovens intelectuais progressistas a criarem o Partido Democrático Vietnamita, para unir os jovens intelectuais e os funcionários e apressar a desagregação do bando pró-nipônico Dai Viet. No exterior, a URSS e os Aliados alcançavam vitórias sobre vitórias. No país, japoneses e

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franceses entravam em conflito. A Frente Viet Minh, dirigida pelo Partido, se reforçava. Nesta conjuntura, em março de 1945, o Birô permanente do Comitê Central reuniu-se em plenário. A principal resolução preconizava “impulsionar rigorosamente o movimento antijaponês e preparar a insurreição geral”. Neste momento, os fascistas japoneses já tinham extorquido o poder dos colonialistas franceses. Em maio de 1945, os alemães capitularam. Em agosto foi a vez dos japoneses. A URSS e os Aliados tinham alcançado a vitória total. No princípio de agosto, reuniu-se a II Conferência Nacional do Partido em Tan Trao, para se pronunciar sobre o programa de ação e a participação na Assembleia dos Delegados da Nação convocada pelo Viet Minh, no mesmo mês em Tan Trao. A Assembleia dos Delegados adotou o programa do Viet Minh e a diretiva de insurreição geral, e elegeu o Comitê Central de Libertação Nacional que se tornaria, mais tarde, o governo provisório do Vietnã. Graças à justa política do Partido e à sua aplicação flexível e oportuna, a insurreição geral de agosto foi coroada de êxito. VI. Da Revolução de Agosto aos nossos dias Graças à direção clarividente e enérgica do Partido, à união e à firmeza de todo o povo – membros e não membros da Frente Viet Minh –, a Revolução de Agosto triunfou. Camaradas: Não só as classes trabalhadoras e o povo do Vietnã, mas também as dos outros países oprimidos, podem orgulhar-se de que, pela primeira vez na história da revolução dos povos coloniais e semicoloniais, um partido que só tem 15 anos de existência dirigiu a revolução até a vitória e tomou o poder em todo o país. Pela nossa parte, não devemos esquecer que o sucesso se deve à grande vitória alcançada pelo Exército Vermelho Soviético sobre os fascistas japoneses, ao apoio fraternal do internacionalismo proletário, à estreita união de todo o nosso povo, ao sacrifício heroico dos nossos predecessores na revolução. Os nossos camaradas Tran Phu, Ngo Gia Tu, Le Hong Phong, Nguyen Thi Minh Khai, Ha Huy Tap, Nguyen Van Cu, Hoang Van Thu, e milhares de outros ainda, colocavam acima de tudo e em primeiro lugar o interesse do Partido, da revolução, da classe, da nação. Eles nutriam uma fé profunda e inabalável nas forças imensas e no futuro glorioso da classe e da nação.

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Eles superaram com sucesso todos os sacrifícios, mesmo o da sua vida pelo partido, pela classe, pela nação. Eles regaram com seu sangue a árvore da revolução que, graças a eles, ostenta hoje tão belos frutos. Para sermos revolucionários dignos deste nome, devemos todos seguir estes modelos de heroísmo, modelos de desapego total e de devoção absoluta ao interesse público. A Revolução de Agosto derrubou a monarquia mais que milenar, quebrou as velhas algemas colonialistas de quase um século, deu poder ao povo, lançou os fundamentos da República Democrática do Vietnã, cuja divisa é Independência-Liberdade-Felicidade. Isto constituiu imensa transformação na história do nosso país. Pela vitória da Revolução de Agosto, tornamo-nos membros da grande família democrática mundial. A Revolução de Agosto exerceu uma influência direta e considerável sobre duas nações amigas: o Camboja e o Laos. Depois da sua vitória, os povos cambojano e laosiano ergueram-se igualmente contra o imperialismo e reivindicaram sua independência. Em 2 de setembro de 1945, o governo da República Democrática do Vietnã proclamou perante o mundo inteiro a independência do Vietnã e levou a cabo a consolidação das liberdades democráticas do país. Aqui, convém sublinhar um ponto: no momento em que se organizava o governo provisório, camaradas membros do Comitê central, eleitos pela Assembleia dos Delegados da Nação, deveriam fazer parte dela, mas retiraram-se por sua própria vontade a favor de personalidades patrióticas não membros do Viet Minh. Foi um excelente gesto de desinteresse da parte destes camaradas, que demonstraram não terem a ambição dos altos postos hierárquicos, colocam o interesse da nação, da união e do povo, acima do interesse pessoal. Foi um gesto digno de elogios e de respeito que deve servir-nos de exemplo. VII. As dificuldades encontradas pelo Partido e pelo Governo Mal nasceu, o poder popular já se deparou imediatamente com grandes dificuldades. A política de pilhagem desavergonhada, aplicada pelos japoneses e pelos franceses que parasitavam o nosso povo até a medula, fez morrer de fome em seis meses (de fins de 1944 até meados de 1945) mais de dois milhões dos nossos compatriotas.

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Não havia ainda decorrido um mês desde a proclamação da nossa independência quando as forças armadas dos imperialistas ingleses invadiram o Sul do nosso país, sob o pretexto de desarmar as tropas japonesas, e se comportaram como verdadeiro corpo expedicionário, dando um golpe de mão aos colonialistas franceses na sua tentativa de reconquista. No Norte, entravam as Tropas do Kuomintang chinês. Sob este mesmo pretexto de desarmar as tropas japonesas, elas tinham três objetivos pérfidos: liquidar o nosso partido; aniquilar o Viet Minh; ajudar os reacionários vietnamitas a derrubar o poder popular para instaurar no seu lugar um governo reacionário de sua simpatia. Face a esta difícil e urgente situação, o Partido recorreu a diversas medidas para se manter, lutar e desenvolver para exercer uma direção mais discreta e mais eficaz e ter tempo para reforçar progressivamente o poder popular e a Frente Nacional Única. O Partido não podia hesitar. Hesitar era comprometer tudo. Ele tinha de decidir rapidamente, tomar as medidas – mesmo dolorosas – próprias para salvar a situação. A despeito das imensas e numerosas dificuldades, o Partido e o governo dirigiram nosso povo e conduziram nosso país através de recifes e escolhas perigosas, e assim realizaram numerosos pontos do programa da Frente Viet Minh. • Organização das eleições gerais para a Assembleia nacional, elaboração da Constituição; • Edificação e consolidação do poder popular; • Liquidação dos reacionários vietnamitas; • Edificação e consolidação do Exército Popular;- realização da palavra de ordem “povo em armas”; • Instituição da Legislação do trabalho; • Redução das taxas de arrendamento e de juros; • Desenvolvimento da cultura popular; • Ampliação e consolidação da Frente Nacional Única (fundação da Frente Lien Viet). Aqui, importa recordar o acordo preliminar de 6 de março de 1946 e o modus vivendi de 14 de setembro de 1946 que pareceram pouco compreensíveis a poucas pessoas que os consideram como manifestações de uma política direitista. Contudo, nossos camaradas e nossos compatriotas do Sul acharam

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esta política justa. Ela de fato o era, com efeito, porque eles souberam aproveitar esta ocasião para se colocarem de pé e desenvolverem as suas forças. Assim como disse Lênin: se fosse vantajoso para a revolução ter que transigir com os bandidos, o faríamos. Tínhamos necessidade da paz para reconstruir nosso país; para a salvaguardar, fomos obrigados a fazer concessões. Ainda que os colonialistas tivessem violado logo em seguida os compromissos firmados e provocado a guerra, após quase um ano de paz, deu-nos tempo de edificar as nossas forças de base. E, quando recomeçaram deliberadamente as hostilidades, nossa paciência estava no fim: a resistência rebentou em todo o país. VIII. A resistência prolongada O inimigo tentava travar uma guerra relâmpago. Queria combater rapidamente, vencer rapidamente, resolver rapidamente o problema. Do nosso lado, o Partido e o governo lançaram a palavra de ordem “resistência prolongada”. O inimigo tentava dividir-nos, nós lançávamos a palavra de ordem “União de todo o povo”. Assim, desde o princípio, nossa estratégia sobrepôs-se à do inimigo. Para uma resistência prolongada, o exército tinha que estar suficientemente equipado, os soldados e o povo deviam ter o que comer e vestir. Nosso país era pobre, nossa técnica, fraca. As nossas cidades, por pouco industrializadas que fossem, estavam ocupadas pelo inimigo. Nós devíamos suplantar a insuficiência material pelo ardor de todo o povo. O Partido e o governo lançaram, desde então, a palavra de ordem “estímulo patriótico”. O estímulo alcança todos os aspectos, mas visa a três aspectos principais: liquidar a fome, liquidar o analfabetismo, liquidar o invasor. Os nossos operários entraram em estímulo para fabricar armas destinadas ao exército. O exército fez todos os esforços para treinar e vencer o inimigo; assim obteve resultados satisfatórios. Os nossos recentes sucessos provam-no. O nosso povo entrou em estímulo com entusiasmo e obteve resultados apreciáveis: com uma economia atrasada, resistimos há mais de quatro anos e continuamos a suportar esta prova, sem sofrer demasiada fome ou falta de vestuário. A maioria da população está liberta do analfabetismo, isto constitui um brilhante resultado que tem a admiração do mundo inteiro. Proponho ao Congresso o envio dos nossos afetuosos agradecimentos e as nossas felicitações ao exército e à população.

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Contudo, no que diz respeito à organização do estímulo, a seguir os resultados, a troca de experiências e as lições tiradas, não somos brilhantes. Está aí nosso erro. Se conseguirmos corrigir isso, nosso movimento de estímulo alcançará ainda melhores frutos. A atividade militar é a tarefa principal da resistência. No início da resistência, o nosso exército estava ainda nos seus começos. Não lhe faltava coragem, mas armas, experiência, quadros e muitas outras coisas. O exército inimigo tinha reputação no mundo. Dispunha de forças navais, terrestres e aéreas. Além disso, era ajudado pelos imperialistas ingleses e norte-americanos, sobretudo por estes últimos. Em virtude deste desequilíbrio das forças, alguns consideravam, na época, a nossa resistência como a luta do “gafanhoto contra o elefante”. Para um olhar limitado, que não vê senão o lado material das coisas e o seu aspecto momentâneo, a situação parecia ser assim mesmo. Para resistir aos aviões e aos canhões do inimigo, não tínhamos mais do que lanças de bambu. Mas nosso Partido é um partido marxista-leninista, nós não vemos só o presente, mas também o futuro, nós empenhamos nossa confiança na moral e na força das massas e do povo. Assim respondemos resolutamente aos hesitantes e aos pessimistas: “hoje é mesmo o gafanhoto que se mete com o elefante; amanhã, o elefante deixará aí a sua pele”. A realidade demonstrou que o “elefante” colonialista começa a perder a faculdade de respirar, enquanto nosso exército se desenvolve e se torna um tigre majestoso. Ainda que no início o inimigo fosse tão poderoso e nossas forças tão modestas, nós não o combatemos com menos energia e não alcançávamos sobre ele menos sucessos, com a certeza de chegar à vitória final. Por quê? Porque a nossa era causa justa, nosso exército corajoso, nosso povo unido é indomável, porque o povo francês e o campo mundial da democracia nos apoiam. Mas é também porque nossa estratégia é justa. O Partido e o governo consideravam que a nossa resistência comporta três fases: 1ª- fase: manter firme e desenvolver o exército regular. Esta fase ia de 23 de setembro de 1945 ao fim da campanha do Viet Bac, no outono/ inverno de 1947; 2ª fase: lutar energicamente pelo equilíbrio das forças e preparar a contraofensiva geral. Essa fase começou após a Campanha do Viet Bac (1947) e continua atualmente; 3ª fase: contraofensiva geral. A respeito desta última fase, um certo número de camaradas tem uma concepção errônea, pelo fato de que não compreendem exatamente a política

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do Partido e do governo. Uns consideram prematuro “prepararmo-nos para a contraofensiva geral”. Outros queriam saber a data e a hora desta. Outros ainda pensaram que nós a colocaríamos em marcha infalivelmente em 1950 etc. Estas concepções errôneas influíram de forma negativa no nosso trabalho. Em primeiro lugar, devemos ter em conta que a resistência será prolongada e penosa, mas que vencerá. A resistência deve ser prolongada porque nosso território é estreito, nosso povo pouco numeroso, nosso país, pobre; não devemos fazer longos preparativos e todo o nosso povo deve estar pronto em todos os domínios. Por outro lado, não esqueçamos que o agressor, comparado conosco, é um inimigo bastante poderoso e se beneficia da ajuda dos norte-americanos e dos ingleses. O agressor francês é como a “pele espessa do mandarim”, é-nos preciso tempo para “afiar nossas garras” para rasgá-la em pedaços. Nós devemos compreender ainda que cada fase da luta está diretamente ligada às outras, que uma continua a fase que a precede e cria as premissas da que a segue. Produzem-se transformações de uma fase para outra. Cada fase comporta também as suas próprias transformações. É possível basear-se na situação geral para determinar cada fase importante, mas é impossível separar completamente as diversas fases como se corta um bolo em várias partes. A duração de uma fase depende da situação no país e no mundo, das mudanças intervenientes nas forças do inimigo e nas nossas. Nós devemos compreender que a resistência prolongada está estreitamente ligada à preparação da contraofensiva geral. Posto que a resistência é prolongada, a preparação da contraofensiva também o é. O fato de esta surgir mais tarde ou mais cedo depende das mudanças intervenientes nas forças do inimigo e das mudanças que intervirem nas forças do inimigo e nas nossas e, por outro lado, da evolução da conjuntura internacional. De qualquer modo, quanto mais cuidada e completa for a preparação, mais a contraofensiva se beneficiará das condições favoráveis. A palavra da ordem, “preparemo-nos para passar vigorosamente à contraofensiva geral” foi lançada no início de 1950. No discurso deste ano, fizemos preparativos? Sim, o governo decretou a mobilização geral e apelou ao estímulo patriótico. O exército e o povo fizeram preparativos intensos e obtiveram resultados satisfatórios como todos sabem.

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Operamos, nós, esta passagem? Sim. Começamos e estamos em vias de operar esta passagem. Nossos excelentes sucessos diplomáticos (no início de 1950) e militares (aproximadamente no fim de 1950) são provas evidentes disso. Mas conduzimos já a contraofensiva geral? Nós continuamos os preparativos, mas não desencadeamos ainda a contraofensiva geral. Imporia compreendê-lo bem. Quando a preparação estiver verdadeiramente completa, desencadear-se-á contraofensiva geral. Quanto mais completa estiver a preparação, mais cedo soará a hora da contraofensiva geral, e mais esta se beneficiará de condições favoráveis. Devemos evitar toda precipitação, toda impaciência. O exército, o povo, os quadros, toda a gente, todos os ramos devem rivalizar de ardor para uma preparação completa. Quando os preparativos estiverem prontos, nós desencadearemos a contraofensiva geral e, então, ela será necessariamente vitoriosa. IX. Remediar as lacunas e os erros O nosso Partido alcançou numerosos sucessos, mas não é isento de erros. Devemos fazer autocrítica sinceramente para nos corrigirmos, esforçarmo-nos por nos corrigirmos para progredir. Antes de passar em revista os nossos erros e as nossas insuficiências, reconheçamos primeiramente que o nosso Partido conta – sobretudo na zona ocupada – com quadros muito corajosos e devotados que se colocam sempre ao lado do povo apesar dos riscos e perigos, se dedicam firmemente às tarefas que lhe são confiadas, não têm medo, nunca se queixam de nada, sacrificam sua vida sem lamento. São dignos combatentes do povo, dignos filhos do Partido. De maneira geral, nosso Partido praticou uma política justa desde a sua fundação até hoje. Senão, como teria podido obter sucessos tão consideráveis? Contudo, teve erros e insuficiências: nossos estudos teóricos são insuficientes, numerosos quadros não chegaram à maturidade no plano ideológico e o seu nível permanece baixo. A aplicação da política do Partido e do governo deu lugar a desvios de “esquerda” ou de “direita” (por exemplo, na aplicação da política agrária, da política da frente, das minorias nacionais, das religiões, do poder popular etc.). O trabalho de organização que permaneceu medíocre não pode garantir sempre uma aplicação correta da política do Partido e do governo.

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É por isso que estudar a teoria, aperfeiçoar-se no plano ideológico, elevar o nível teórico, ratificar a organização são as tarefas urgentes. Além disso, as diversas instâncias dos organismos dirigentes, o estilo de trabalho, as medidas defendidas e a maneira de dirigir ainda têm erros bastante disseminados e graves. Eles são: subjetivismo, burocracia, autoritarismo, estreiteza de espírito, defeito de se orgulhar dos méritos passados. O subjetivismo manifesta-se na tendência em acreditar que a resistência prolongada pode tornar-se uma resistência de curta duração. A burocracia manifesta-se no gosto pela papelada, pelo afastamento das massas, pelo estudo insuficiente dos problemas, pela ausência do controle na execução das tarefas, pela recusa de tirar a lição da experiência das massas. O autoritarismo manifesta-se na tendência em apoiar-se no poder para constranger o povo, negligenciando o trabalho de propaganda e de esclarecimento para obter a colaboração consciente e voluntária do povo. A estreiteza de espírito manifesta-se em uma severidade excessiva face aos sem partido, na tendência em não lhes prestar nenhuma atenção, em não discutir com eles, em não perguntar a sua opinião. O exagero dos méritos pessoais traduz-se assim: – Gabando-se dos serviços prestados, mostra-se orgulhoso e presunçoso considerar-se como “a providência” do povo, o “homem de mérito”’ do Partido. Reclama-se para si postos importantes e honras. Embora seja incapaz de cumprir tarefas importantes, não se pode contentar com funções modestas. O exagero dos méritos pessoais é extremamente nocivo à união tanto no interior, como fora do Partido. – Gabando-se da sua qualidade de membro do Partido, despreza-se a disciplina e a ordem hierárquica nas organizações populares e nos organismos do governo. Os camaradas atingidos por este mal não compreendem que cada militante deve ser exemplar na observação da disciplina e da ordem hierárquica nas organizações populares e nos organismos do governo. Os camaradas atingidos por este mal não compreendem que cada militante deve ser exemplar na observação da disciplina – não só do Partido, mas também das organizações populares e dos organismos do poder revolucionário. Estas doenças e ainda outras existem no Partido, o Comitê Central tem uma parte de responsabilidade nisso, porque não prestou toda a atenção indispensável ao trabalho de controle. A educação ideológica não foi feita nem em todo lado, nem de forma suficiente. A democracia no Partido não

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foi realizada de forma bastante ampla, a crítica e a autocrítica não se tornaram um hábito. Contudo procuramos remediar este estado de coisas. Os exames de consciência e o movimento de crítica e de autocrítica empreendidos nestes últimos tempos deram bons resultados, ainda que comportem, por vezes, desvios. Tal como disse Stálin: “o Partido revolucionário tem necessidade de crítica e de autocrítica como o homem tem necessidade de ar. É um controle estreito que permite evitar erros graves”. Daqui para diante, o Partido deve procurar difundir amplamente a doutrina para elevar a consciência política dos seus membros. É preciso pôr a tônica no estilo de trabalho coletivo, consolidar os elos entre o Partido e as massas, elevar o sentido da disciplina, o respeito pelos princípios, o espírito de partido, junto de cada membro. É preciso intensificar o movimento de crítica e de autocrítica no seio do Partido, nos serviços públicos, nas organizações, na imprensa e até no povo. A crítica e a autocrítica devem ser feitas de cima para baixo e de baixo para cima. Enfim, o Partido deve exercer um controle estreito. Desta forma, os erros diminuirão e os progressos serão rápidos. X. A nova situação e as tarefas a. A nova situação Todos sabem que na hora atual, o mundo está dividido em dois campos nitidamente distintos. O campo democrático dirigido pela União Soviética compreende o país socialista e os países oprimidos em luta contra o imperialismo agressor, assim como as organizações democráticas e as personalidades democráticas nos países capitalistas. O campo democrático é uma força gigantesca que vai crescendo. Alguns pontos bastam para o demonstrar. Vejamos o mapa do mundo. A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e os países de Nova Democracia formam, da Europa oriental à Ásia oriental, um vasto bloco de 800 milhões de habitantes. Neste bloco, os povos unidos seguem um mesmo objetivo, não estando divididos por nenhuma contradição. Eles representam o progresso, o futuro radioso da humanidade. Essa é uma força extremamente poderosa. No decurso do 2º Congresso da Frente da Paz, reunido em Varsóvia, em novembro de 1950, os delegados de 500 milhões de combatentes da paz

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em 81 países juraram defender energicamente a paz mundial e combater a guerra imperialista. É a Frente Única mundial da paz e da democracia. É uma força colossal que vai crescendo. O campo antidemocrático é encabeçado pelos Estados Unidos. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os EUA tornaram-se o chefe de fila dos imperialistas e da reação internacional. A Inglaterra e a França são, respectivamente, o seu braço direito e o seu braço esquerdo; os governos reacionários no Oriente e no Ocidente são bandos de piratas sob comando dos americanos. Com a ambição de assegurar a hegemonia sobre o globo, os Estados Unidos agitam em uma mão o dólar para seduzir as pessoas, na outra a bomba atômica para fazer pressão. Doutrina Truman(2), Plano Marshall(3), Pacto do Atlântico(4), Plano para o Sudeste Asiático são umas quantas condutas americanas que visam a preparar a Terceira Guerra Mundial. As ambições dos EUA chocam-se com um sério obstáculo: o potencial imenso da URSS, o movimento de democracia e de paz e o movimento de libertação nacional, em plena efervescência no mundo. Atualmente, a política americana visa a: – Na Ásia, ajudar as claques reacionárias Chiang Kai-shek, Syngman Rhee, Bao Dai etc., a ajudarem os imperialistas ingleses a combater a resistência vietnamita. Os Estados Unidos desencadeiam abertamente a guerra de agressão na Coreia e ocupam Taiwan na esperança de sabotar a Revolução Chinesa. (2) Visava à hegemonia americana no mundo. O seu programa em quatro pontos pretendia dar uma “ajuda” aos países subdesenvolvidos, mas na realidade tendia a ingerir econômica e politicamente nos assuntos internos destes países, a transformá-los em colónias americanas. A doutrina Truman foi adotada pelo Congresso dos EUA em 3 de junho de 1930. (3) Plano de invasão econômica preconizado pelo secretário de Estado americano Marshall, em 5 de junho de 1947, sob a forma de “ajuda” econômica aos países da Europa após a Segunda Guerra Mundial. Países da Europa Ocidental aceitaram este plano com o compromisso de reconhecer aos EUA prerrogativas econômicas de acordo com as suas exigências de cortar todas as relações comerciais com a URSS e os países de democracia popular. Os EUA serviram-se do Plano Marshall para ingerir nos assuntos internos dos países da Europa Ocidental. (4) Ou Pacto do Atlântico Norte (OTAN). Assinado em 4 de abril de 1949, em Washington, entre os Estados Unidos, a Bélgica, o Canadá, a Dinamarca, a França, a Inglaterra, a Islândia, a Itália, Luxemburgo, a Noruega, a Holanda e Portugal. Em 1952, juntam-se mais dois signatários: a Grécia e a Turquia. Este pacto é uma aliança militar dirigida pelos EUA, pretensamente para defender os países signatários, mas, de fato, para fazer a corrida armamentista. Visar a provocar uma nova guerra mundial, cerrar e atacar a URSS e os países socialistas.

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Na Europa, realizar o embargo militar, político, econômico sobre os países da Europa Ocidental a favor do Plano Marshall e do Pacto do Atlântico, e constrangê-los a servir de carne para canhão por conta dos Estados Unidos. Assim um plano prevê a criação de 70 divisões na Europa Ocidental, sob o alto comando de um americano. Mas o campo americano apresenta bastantes fraquezas. À potência do campo democrático junta-se para ele outra ameaça: a crise econômica. Numerosas contradições internas despedaçam-no. Eis alguns exemplos: o projeto americano de criação na Alemanha Ocidental de um exército de 1ª divisão encontra a oposição do povo francês. A Inglaterra pratica uma oposição secreta frente aos EUA, que ela considera como os seus rivais para o petróleo no Oriente Próximo e para a esfera da influência no Extremo Oriente. Os povos, sobretudo as camadas trabalhadoras dos países vítimas da “ajuda” americana, odeiam os EUA porque estes usurpam os seus interesses econômicos e tentam retirar-lhes a independência nacional. Os Estados Unidos alimentam a ambição desmedida de criar bases em todo o mundo; ajudam qualquer agrupamento, qualquer governo reacionário. A frente que eles estabelecem é demasiado longa, demasiado vasta, de forma que suas forças se encontram reduzidas. Tem-se a prova palpável disso na Coreia, onde os EUA e os seus quarenta vassalos fazem a guerra em um só país e estão em vias de serem batidos. Os EUA ajudam a reação chinesa, ou seja, o Kuomintang, mas isso não salvou Chiang Kai-shek da derrota. Auxiliam os colonialistas franceses no Vietnã, o que não impede que a resistência vietnamita vá de sucesso em sucesso. Em resumo, nós podemos conjecturar, sem medo de erro, que o campo imperialista reacionário caminhará necessariamente para a derrota, e que o campo da paz e da democracia vencerá. O nosso país, o Vietnã, faz parte do campo mundial da democracia. Atualmente, é um bastião contra o imperialismo, contra o campo antidemocrático encabeçado pelos EUA. Desde o início da resistência, a Inglaterra e os Estados Unidos ajudaram os colonialistas franceses. Mas, a partir de 1950, os Estados Unidos intervieram abertamente no nosso país. No fim de 1950, a Inglaterra e a França preparavam-se para criar uma Frente Única para conjugar suas forças contra a resistência malasiana e a resistência vietnamita.

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Assim, a situação mundial tem relações estreitas com nosso país, cada sucesso do campo democrático é igualmente nosso. Em contrapartida, cada sucesso da nossa parte é também do nosso campo. Assim, a nossa principal palavra de ordem, na hora atual, é a seguinte: “esmagar os colonialistas franceses, derrotar os intervencionistas americanos, reconquistar a unidade e a independência total, salvaguardar a paz mundial”. b. As novas tarefas Os camaradas do Comitê Central vão se debruçar sobre questões importantes como o programa, os estatutos, a situação militar, o poder popular, a Frente Única Nacional, a economia etc. O presente relatório limita-se a sublinhar as tarefas principais entre as novas tarefas: 1. Conduzir a resistência à vitória total; 2. Organizar o Partido dos Trabalhadores do Vietnã; a) Devemos nos empenhar no desenvolvimento das forças do exército e do povo a fim de vencer ainda, de vencer sempre, e de avançar para a contraofensiva geral. Essa tarefa visa a realizar os seguintes pontos principais: – Na edificação e no desenvolvimento do exército, devemos nos empenhar em acelerar a organização e em reforçar o trabalho político e militar no nosso exército. É preciso elevar a consciência política, aperfeiçoar a tática e a técnica, reforçar a disciplina consciente e voluntária no nosso exército, proceder de forma a que este se torne um verdadeiro exército do povo. Ao mesmo tempo, é preciso desenvolver e consolidar as milícias populares da guerrilha nos aspectos de organização, instrução, comando e capacidade combativa. Devemos proceder de forma que estas forças se tornem vastas e sólidas armadilhas de aço armadas por todo lado e nas quais o inimigo cairá em todo lado que se apresente. – Desenvolver o patriotismo. O povo está animado com um ardente patriotismo. É uma das nossas mais nobres tradições. Desde tempos mais remotos, sempre que a Pátria era invadida, esta fé tornou-se um vasto e poderoso tsunami que, vencendo riscos e dificuldades, engoliu traidores e agressores. A nossa história conheceu muitos períodos de grandiosa resistência que são testemunho do patriotismo do nosso povo. Nós temos o direito de nos orgulhar das páginas gloriosas escritas pelas nossas heroínas Trung, Trieu

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e pelos nossos heróis Tran Hung Dao, Le Loi, Quang Trung. Lembremo-nos dos méritos destes heróis nacionais, eles são o símbolo de um povo heroico. Os nossos compatriotas, atualmente, são perfeitamente dignos dos nossos antepassados. Dos velhos de cabelos brancos às crianças de tenra idade, dos nossos exilados no estrangeiro aos nossos compatriotas da zona ocupada, dos habitantes da região alta aos do delta, todos estão animados com um patriotismo ardente, todos odeiam o inimigo. Dos combatentes da primeira linha que suportam dias inteiros a fome para perseguir o inimigo e arrasá-lo, aos funcionários que servem na retaguarda e jejuam para oferecer os seus víveres ao exército, das mulheres que aconselham os seus maridos e os seus filhos a se alistarem enquanto elas próprias se oferecem como voluntárias, para o serviço da Frente, como enfermeiras de guerra, que velam pelos nossos soldados como pelos seus próprios filhos; dos operários e operárias e camponeses que rivalizam de ardor para desenvolver a produção, sem olhar à fadiga, para dar sua contribuição à resistência, até os proprietários de terras que oferecem os seus arrozais ao governo. Quantos nobres gestos, sem dúvida diferentes pela forma como se manifestam, e, contudo, todos idênticos pelo patriotismo ardente que está na sua origem. O patriotismo assemelha-se aos objetos preciosos. Ora expostos em vitrines, em recipientes de cristal, o vemos facilmente. Ora são encerrados cuidadosamente no fundo dos cofres e das malas. Nosso dever é pôr à vista todos estes tesouros escondidos. Quero dizer que é preciso esforçar-se por explicar, propagandear a política do Partido, organizar, dirigir a execução desta política para que o patriotismo de todos se possa reduzir por atos patrióticos nos trabalhos de resistência. O patriotismo autêntico é absolutamente diferente do espírito “chauvinista” da reação imperialista. Este patriotismo faz parte integrante do internacionalismo. Foi graças ao seu patriotismo que o exército e os povos da URSS derrotaram os fascistas alemães e japoneses, defenderam solidamente a pátria socialista e, por este fato, ajudaram a classe operária e os povos oprimidos do mundo inteiro. Foi graças ao seu patriotismo que o exército de libertação e os povos da China derrotaram a claque do traidor Chiang Kai-shek e repeliram os imperialistas para fora do país. Foi graças ao seu patriotismo que o exército e o povo da Coreia, lutando ombro a ombro com os voluntários chineses, estão em vias de expulsar os imperialistas americanos e seus lacaios. É graças ao patriotismo que nosso exército e nosso povo, há muito tempo, suportaram milhares de provas e continuam deter-

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minados a derrotar os colonialistas agressores e os traidores, e a edificar um Vietnã independente, unificado, livre, próspero, um Vietnã de tipo novo. – Intensificar o estímulo patriótico. O Exército deve rivalizar de ardor para derrotar o inimigo e distinguir-se pelos seus feitos militares. O povo deve rivalizar de ardor para intensificar a produção. Nós devemos nos empenhar de corpo e alma para acelerar a realização das duas tarefas. – Na grande obra de resistência e de reconstrução nacional, a Frente Única Lien Viet-Viet Minh, os sindicatos, a União Camponesa e as organizações populares exerceram uma ação considerável. Devemos ajudá-los a desenvolver-se, a consolidar-se e a militar-se efetivamente. – No que diz respeito à política agrária, na zona libertada, deve-se levar à prática escrupulosamente a redução das taxas de arrendamento e de juros, confiscar os arrozais dos colonialistas franceses e dos traidores para distribuir aos camponeses pobres e às famílias dos combatentes a fim de melhorar a vida dos camponeses, de exaltar o seu espírito e o seu potencial de resistência. – No que diz respeito à economia e às finanças, importa desenvolver as bases da nossa economia e lutar contra o inimigo no campo econômico. A fiscalização deve ser equilibrada e racional. É preciso realizar o equilíbrio entre receitas e despesas para assegurar o reabastecimento do exército e do povo. – Impulsionar o trabalho cultural a fim de formar homens novos e quadros novos para a resistência e para reconstrução nacional. É preciso eliminar radicalmente toda a sobrevivência do colonialismo e toda a influência dominadora da cultura imperialista. Simultaneamente, devemos desenvolver as nossas belas tradições e assimilar o que há de novo na cultura progressista mundial, a fim de edificar uma cultura nacional, científica e popular para o Vietnã. Graças às nossas vitórias, libertaremos pouco a pouco as zonas provisoriamente ocupadas. Devemos também despender todos os nossos esforços para nos mantermos prontos para consolidar estas zonas sobre todos os aspectos, logo que forem libertadas. – A vida e os bens dos exilados estrangeiros que respeitem as leis do Vietnã devem ser protegidos. Quanto aos exilados chineses, é preciso encorajá-los a participar da resistência vietnamita. Se eles se empenharem nisto terão os mesmos direitos e obrigações que os cidadãos vietnamitas. Nós resistimos, assim como os povos amigos, do Khmer e do Laos, re-

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sistem. Os colonialistas franceses e os intervencionistas americanos são os nossos inimigos e também são os deles. Assim, devemos nos esforçar para ajudar os nossos irmãos do Khmer e do Laos em sua resistência e avançar na criação de uma Frente Comum Vietnã-Khmer-Laos. – A nossa resistência é vitoriosa, em parte graças à simpatia dos países amigos e dos povos do mundo inteiro. Devemos consolidar a amizade entre nosso país e os países amigos, entre o nosso povo e os povos do mundo inteiro. b) Para levar à prática todos estes pontos, devemos ter um partido oficial, organizado de forma adequada à situação interna e internacional, a fim de dirigir todo o povo na sua luta até a vitória. Este partido tem o nome de Partido dos Trabalhadores do Vietnã. Do ponto de vista de sua composição social, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã acolherá em seu seio operários, camponeses, trabalhadores intelectuais verdadeiramente ativos e de grande consciência revolucionária. Em matéria de doutrina, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã adota o marxismo-leninismo. No plano de organização, aplica o centralismo democrático. Quanto à disciplina, observa uma disciplina de ferro que é, ao mesmo tempo, uma disciplina livremente consentida. Como lei de desenvolvimento, usará a crítica e a autocrítica para educar os seus membros e as massas. Como objetivos imediatos o Partido dos Trabalhadores do Vietnã unirá e dirigirá todo o povo na resistência até a vitória, pare reconquistar a unidade e a independência total; dirigirá todo o povo para realizar a Nova Democracia, criar condições para avançar em direção ao socialismo. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã deve ser um grande partido, poderoso, sólido, puro, revolucionário em toda a acepção da palavra. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã deve ser o dirigente esclarecido, resoluto, fiel, da classe operária e do povo trabalhador, do povo vietnamita, para unir e dirigir a nação na resistência até a vitória total e para realizar a Nova Democracia. No período atual, os interesses da classe operária e do povo trabalhador da nação são uma única vontade. É porque o Partido dos Trabalhadores do Vietnã é o partido da classe operária e do povo trabalhador que ele deve ser o partido da nação vietnamita. Atualmente, a tarefa principal, a tarefa urgente do nosso partido, é conduzir a resistência à vitória. Todas as outras tarefas devem estar subordi-

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nadas a esta. A nossa tarefa é imensa, o nosso futuro glorioso. Mas temos ainda de ultrapassar numerosas dificuldades. A resistência tem suas dificuldades, a vitória também. Assim, por exemplo: – No aspecto ideológico, os quadros, os membros do partido e a população não estão bastante amadurecidos para fazer frente às diversas mudanças que se operam no país e no mundo. – Os imperialistas americanos podem ajudar ainda mais o agressor francês e este torna-se, por isso mesmo, ainda mais pertinente. – As nossas tarefas aumentam cada vez mais. Ora, falta a nós, quadros, porque os nossos não têm capacidade e experiência. – É preciso encontrar a solução racional mais adequada aos interesses do povo para o problema econômico e financeiro. Nós não tememos as dificuldades. Mas devemos prevê-las com justeza e nos preparar para resolvê-las. Com a unidade, a unidade de pontos de vista e de ação, e a indomável determinação do Partido, do governo e de todo o povo, venceremos todas as dificuldades para chegar à vitória total. A Revolução de Outubro triunfou. A edificação socialista na União Soviética triunfou. A Revolução Chinesa triunfou. Estes resultados grandiosos abrigam a via para a vitória da revolução no nosso país e em outros países do mundo. Nós temos um grande e poderoso partido. Grande e poderoso graças ao marxismo-leninismo, aos esforços incansáveis de todos os seus membros, ao apoio, amor e confiança de todo o exército e de todo o povo. Também estou convencido de que cumpriremos com sucesso a nossa pesada, mas gloriosa, tarefa: Edificar o Partido dos Trabalhadores do Vietnã, fazendo dele um partido extremamente poderoso; conduzir a resistência à vitória total; Construir um Vietnã de Nova Democracia; Contribuir para a defesa da democracia no mundo e para uma paz durável. Fonte: The Communist Party of Vietnam (1930-2015), The Gioi Publishers

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Ao Congresso para a fusão das Ligas Viet Minh e Lien Viet Foi neste Congresso que o Partido dos Trabalhadores do Vietnã se apresentou publicamente pela primeira vez, no dia 3 de março de 1951, denominado em vietnamita como Lao Dong. Na parte sul do país, o PTV se apresentava como o Partido Revolucionário do Povo (PRP)

Senhores, caros delegados e caros amigos, alegra-me bastante assumir a tarefa de encerrar esta sessão de abertura do Congresso Nacional para a fusão das duas ligas Viet Minh e Lien Viet. Em primeiro lugar, em nome do presidium, envio os meus afetuosos cumprimentos aos combatentes, aos quadros da Frente Viet Minh e da Frente Lien Viet, e a minha simpatia aos compatriotas das zonas provisoriamente ocupadas e aos que residem no estrangeiro [aplausos]. A nossa alegria hoje é a alegria de todo o povo, a alegria do Congresso, mas especialmente, para mim, é uma alegria ao mesmo tempo fácil de compreender e difícil de descrever. É a alegria de um homem que militou muito tempo convosco pela grande união de todo o povo e que vê hoje a floresta da unidade florir, dar os seus frutos [aplausos] e mergulhar ampla e profundamente suas raízes em todo o povo. Essa floresta tem por futuro “uma primavera que dura e desafia os anos” [risos]. A minha alegria é tanto maior quanto não é só o povo vietnamita que realiza a sua união, mas igualmente os povos dos dois países irmãos, o Camboja e o Laos [aplausos prolongados]. A boa nova da unidade entre estes dois povos foi-nos dada pelos representantes dos povos cambojanos e laosianos. Assim foram realizadas a grande união do povo vietnamita, a do povo cambojano e a do povo laosiano. Estamos certos de chegar a formar a grande união dos povos vietnamita, cambojano e laosiano [aplausos]. Fortalecida com a solidariedade e a unidade das nossas três nações, ultrapassaremos todas as dificuldades, derrotaremos os colonialistas franceses, os intervencionistas e qualquer outro agressor [aplausos]. No que diz respeito ao programa e aos estatutos da frente Lian Viet, iremos discuti-los cuidadosamente e tomar decisões clarividentes no decurso do Congresso. Levanto apenas algumas questões para vos ajudar nos nossos debates: 150


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1. A Frente deve avançar cada vez mais na via democrática. 2. “Quem tudo quer, tudo perde”, a Frente deve centrar sua atividade no aspecto essencial: o estímulo patriótico. 3. Os partidos, organizações e personalidades da Frente devem unir-se estreitamente, ajudar-se mútua e amigavelmente, sinceramente aprender uns com os outros o que cada um tem de melhor e criticar-se mutuamente, para fazerem progressos conjuntos. Nesse Congresso, participam os representantes de todas as camadas sociais, de todas as religiões e nacionalidades, de todas as idades e dos dois sexos. É verdadeiramente uma grande família, onde reinam a amizade e a solidariedade que se consolidarão e se estenderão a toda a nação, ao povo dos países amigos, ao povo francês e aos povos amantes da paz e da democracia do mundo inteiro. Essa solidariedade que constitui uma força imensa nos ajuda não só a prosseguir vitoriosamente na resistência e na reconstrução nacionais, mas também a levar a nossa contribuição à defesa da paz e da democracia em todo o mundo. Senhores, caros delegados, caros amigos. No princípio do ano passado, obtivemos um grande sucesso político: o reconhecimento do nosso governo pela URSS, pela China e pelas outras democracias populares e, a seguir, alcançamos grandes vitórias na fronteira e na região média. O princípio deste foi confirmado por outros sucessos políticos: a fundação do Partido dos Trabalhadores do Vietnã e a fusão das Ligas Viet Minh e Lien Viet: dessa forma alcançaremos, sem dúvidas, vitórias militares ainda mais brilhantes. Viva a unidade Nacional! Viva a Frente Lien Viet! Viva a União dos três países: Vietnã-Camboja-Laos! A resistência vencerá! O Campo de paz e da democracia vencerá! Fonte: Ho Chi Minh: Selected Works, Hanoi, 1962

Notas do Editor A partir da vitória da campanha militar na fronteira norte, o estado e a força da Resistência na Indochina passaram por mudanças importantes. Os líderes do Partido Comunista da Indochina consideraram a necessidade do Partido reemergir oficialmente para sinalizar claramente para o

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povo da Indochina e para o mundo sobre os objetivos da luta e o futuro da revolução no Vietnã, que estava sendo dirigido pelo PCI de acordo com o marxismo-leninismo. Neste meio tempo, o Segundo Congresso do Partido foi realizado em fevereiro de 1951, no Distrito de Chiem Hoa, província de Tuyen Quang, numa zona libertada de Viet Bac. Participaram do evento 158 delegados oficiais, 33 delegados alternadamente, que representaram 730 mil membros do Partido no Vietnã, Camboja e Laos. O Congresso ouviu o Relatório Político do Presidente Ho Chi Minh, o informe do secretário-geral Truong Chinh sobre a concretização da libertação nacional, o desenvolvimento da democracia popular e sobre o caminho para o socialismo, além de outras intervenções sobre a construção do poder da democracia popular, sobre a construção da Frente Única Nacional, sobre as Forças Armadas, sobre as atividades econômicas, sobre o campo financeiro, cultural, da literatura e das artes. O Congresso adotou uma plataforma, uma declaração sobre as regras partidárias. Enquanto o Partido reaparecia publicamente em atividades oficiais e legais, o Congresso do Partido decidiu estabelecer três diferentes partidos marxistas-leninistas para o Vietnã, para o Camboja e para o Laos, respectivamente, para que cada Partido pudesse, com base na situação e características históricas específicas de cada país, trabalhar a sua própria linha revolucionária. No Vietnã, este Partido marxista-leninista passaria ser chamado de Partido dos Trabalhadores do Vietnã. O Congresso aprovou o informe político do Comitê Central, que apontava três características fundamentais da revolução vietnamita em sua nova etapa: 1) O Vietnã está se movendo diretamente da pequena produção para o socialismo, sem passar pelo período de desenvolvimento capitalista; 2) Graças às atuais condições de paz, independência e unidade, todo o Vietnã está se encaminhando para o socialismo com muitas condições básicas, mas que também enfrenta muitas dificuldades que aparecem em função das consequências da guerra, dos restos feudais, do antigo e do novo colonialismo; 3) A situação internacional apresenta muitas condições favoráveis, mas a luta entre a revolução e a contrarrevolução no mundo é ainda muito forte e complicada. A linha política geral estava destacada no informe político da seguinte maneira: “Conceber uma boa compreensão do papel da ditadura do proletariado, tornar totalmente realizada a direção coletiva do povo, para simultaneamente levar adiante as três revoluções: a revolução nas relações de produção, a revolução técnico-científica e a revolução cultural. Destas três revoluções, a científica e técnica é a chave, e promover a industrialização socialista é a tarefa fundamental de todo o período da transição para o socialismo; construir o socialismo de forma coletiva; construir a grande produção socialista, construir uma nova cultura, um novo homem socialista, erradicar a pobreza e o atraso; reforçar a vigilância, e de maneira permanente fortalecer a defesa nacional, manter a política de segurança e da ordem social; de forma vitoriosa construir a paz, a independência, e um Vietnã socialista unificado; contribuir para a luta pela paz mundial entre os povos, a independência nacional, a democracia e o socialismo”. Para dar os primeiros passos no sentido da construção da base material e técnica do socialismo, constituindo uma nova estrutura econômica para todo o país, o componente principal deve ser a indústria e da agricultura. O Plano Quinquenal aprovado tem os seguintes objetivos:

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– Alimentos: 21 milhões de toneladas/ ano – Energia: 5 bilhões de KW/ ano – Carvão: 10 milhões de toneladas/ano – Cimento: 2 milhões de toneladas/ano – Aço: 250 mil toneladas/ano – Roupas: 450 milhões de metros/ano – Porcos: 16,5 milhões/ano O Congresso decidiu também mudar o nome do Partido dos Trabalhadores do Vietnã para Partido Comunista do Vietnã. Fonte: History of Vietnam, Questions and Answers, The Gioi Publishers, 2018

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Os imperialistas jamais escravizarão o povo vietnamita! Publicado na Revista For a Lasting Peace, For a People’s Democracy, em 4 de abril de 1952, sob o pseudômino Din

Aproveito o feriado de Ano Novo para escrever estas linhas. Com mais sorte do que os outros povos, os vietnamitas, os povos chineses e coreanos se felicitam com duas festas de Ano Novo a cada ano. Um dia do Ano Novo é celebrado de acordo com o calendário gregoriano e cai no 1º dia de janeiro. No dia do Ano Novo oficial, apenas funcionários do governo mandam saudações uns para os outros. Outra data, o Tét, se observa de acordo com o calendário lunar e, neste ano, cai em um dia da última semana de janeiro. Este Ano Novo tradicional, celebrado pelo povo, normalmente dura de três a sete dias em tempos de paz. Em nosso país, a Primavera começa nos primeiros dias de janeiro. Atualmente, uma esplêndida primavera permeia todo o país. Os radiantes raios de sol trazem com eles, uma vida feliz e saudável. Como um enorme tapete verde, as jovens plantas de arroz cobrem os campos, anunciando a vinda da safra. Os pássaros gorjeiam alegremente em arbustos verdes. Aqui o inverno dura apenas alguns dias e raramente o termômetro cai para 10°C. No que diz respeito à neve, de modo geral é desconhecida pelo nosso povo. Antes, durante o Festival do Primeiro Dia (Tét), retratos e saudações escritas em papel vermelho podiam ser vistos pendurados na entrada das portas de palácios, bem como em pequenas cabanas de palha. Hoje essas saudações e esses retratos foram substituídos por palavras de ordem exaltando a luta e o trabalho, como “intensificar o estímulo à luta armada, produção e desenvolvimento econômico!”, “a guerra de resistência será vitoriosa!”, “combater a corrupção, o desperdício e a burocracia!” “a construção nacional certamente será coroada com o sucesso!”. Durante o Festival do Primeiro Dia, as pessoas estão vestidas em suas mais belas peças de vestuário. Em cada família, os mais deliciosos alimentos são preparados. Tradições religiosas são ritualizadas na frente dos altares ancestrais. Realizam-se visitas entre parentes e amigos para trocar saudações. Os adultos presenteiam os filhos; civis enviam presentes para os soldados. Podemos dizer que é um festival de primavera. Antes de vos contar a situação 154


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do Vietnã, deixem-me enviar-lhes, e a todos os nossos camaradas, minhas calorosas saudações! Conluio entre os agressores Vamos rever a situação do Vietnã em 1951. Após a sua derrota na guerra da fronteira da China e Vietnã, em outubro de 1950 – maior contragolpe que já sofreram em toda a história de suas guerras coloniais, que implicou a perda de cinco províncias de uma vez: Cao Bang, Lang Son, Lao Cai, Thai Nguyen e Hoa Binh –, os colonialistas franceses começaram o ano de 1951 com o General de Lattre de Tassigny sendo enviado para o Vietnã. Eles recorreram à guerra total. Sua manobra foi consolidar o governo fantoche de Bao Dai, organizar tropas fantoches e redobrar atividades de espionagem. Montaram terras de ninguém com cerca de cinco a dez quilômetros de largura em torno de áreas sob seu controle e reforçaram o delta do Rio Vermelho com uma rede de 2 mil e 300 bunkers. Intensificaram operações de varredura à nossa retaguarda, efetuaram a política de aniquilação e destruição indiscriminada de nosso poderio humano e recursos potenciais, ao assassinarem nossos compatriotas, devastarem nosso campo, queimarem nossos arrozais etc. Para resumir, seguiram a política de “usarem os vietnamitas para combater os vietnamitas, alimentar a guerra por meios de guerra”. É a mando de e com a ajuda dos seus mestres, os intervencionistas norte-americanos, que os colonialistas franceses realizaram os feitos mencionados acima. Entre os primeiros norte-americanos que hoje vivem no Vietnã (claro, em áreas sob controle dos franceses), há um espião bastante notável, Donald Heat, embaixador autorizado juntamente ao governo fantoche, e um general, chefe da missão militar dos Estados Unidos. Em setembro de 1951, de Lattre de Tassigny foi a Washington para fazer seu relatório e implorar por ajuda. Em outubro, o general Collins, Chefe do Estado-Maior do Exército dos EUA, chegou ao Vietnã para inspecionar o corpo expedicionário francês e as tropas fantoches. Para mostrar a seus mestres norte-americanos que a ajuda dos Estados Unidos é usada de forma que valha a pena, atualmente – bem como fará no futuro, em novembro –, de Lattre de Tassigny atacou a capital da província de Hoa Binh. O resultado dessa “ofensiva de disparos” que a imprensa reacionária na França e no mundo comentaram estrondosamente, foi que o Exército Popular do Vietnã conseguiu capturar a esmagadora maioria das

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tropas inimigas em emboscada e as aniquilou. Mas isto não impediu que Lattre de Tassigny e seus asseclas cantassem vilória! No começo da guerra, os norte-americanos ajudaram a França com dinheiro e armamentos. Para tomar como exemplo, 85% das armas, materiais bélicos e mesmo comida enlatada, que nossas tropas capturavam, tinham o rótulo de “made in USA”. Esta ajuda foi intensificada ainda mais rapidamente a partir de junho de 1950, quando os EUA começaram a interferir na Coreia. A ajuda aos invasores franceses consistia em barcos, caminhões, equipamentos militares, bombas de napalm etc. Enquanto isso, os norte-americanos compeliam os colonialistas franceses a intensificarem a organização de quatro divisões de tropas fantoches, com cada uma das partes pagando metade da conta. Naturalmente, este conluio entre os agressores franceses e norte-americanos e a claque fantoche foi repleto de contradições e disputas. Os colonialistas franceses agora estão envolvidos em um dilema: ou recebem ajuda dos Estados Unidos para, em seguida, serem substituídos por seus “aliados” da América, ou não recebem nada, e assim serem derrotados pelo povo vietnamita. Organizar o exército fantoche mediante alistamento forçado da juventude em regiões sob seu controle seria o equivalente a engolir uma bomba quando se está com fome: virá o dia em que, finalmente, a bomba explode por dentro. No entanto, não organizar o exército dessa forma significaria morte instantânea para o inimigo, porque mesmo os estrategistas franceses têm que admitir que o corpo expedicionário francês fica cada vez mais débil e está à beira de um colapso. Mais além, a ajuda dos Estados Unidos tem um custo muito alto. Nas áreas controladas pelo inimigo, o capitalismo francês é varrido pelo capitalismo norte-americano. Os interesses norte-americanos – como da Petroleum Oil Corporation, Caltex Oil Corporation, Bethlehem Steel Corporation, Florid Phosphate Corporation e outras – monopolizam borracha, minérios e outros recursos naturais do nosso país. Os produtos dos Estados Unidos entopem os mercados. A imprensa reacionária francesa, principalmente o Le Monde, é obrigada a reconhecer tristemente que o capitalismo francês agora está dando lugar ao capitalismo norte-americano. Os intervencionistas norte-americanos têm alimentado os agressores franceses e os fantoches vietnamitas, mas o povo vietnamita não deixará ninguém iludi-lo e escravizá-lo. A China Popular é nossa vizinha. Seu brilhante exemplo nos ofe-

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rece grande ímpeto. Não muito tempo atrás, o povo chinês derrotou o imperialismo norte-americano e conquistou uma vitória histórica. O execrado Chiang Kai shek foi expulso do território chinês, embora seja mais esperto do que Bao Dai. Podem os intervencionistas norte-americanos, que foram expulsos da China e agora sofrem fortes derrotas na Coreia, dominar o Vietnã? Claro que não! Cruéis crimes dos intervencionistas norte-americanos Derrotados no campo de batalha, os colonialistas franceses vingaram-se contra pessoas desarmadas e cometeram crimes abomináveis. Abaixo vão alguns exemplos: Como em todo lugar, nas áreas controladas pelo inimigo, em 15 de outubro de 1951 em Ha Dong, soldados franceses abordaram jovens até nas ruas e os forçaram a entrar no exército fantoche. E lá, como em todo lugar, as pessoas protestaram contra tais atos. Três jovens meninas ficaram paradas em linha, no meio da rua em frente aos caminhões que carregavam os jovens, para impedi-los de ser mandados para campos de concentração. Estes atos de coragem eram dignos da heroína Raymonde Dien(1). Os colonialistas franceses ligaram o motor e, em fração de segundos, três jovens patriotas foram atropeladas. Em outubro de 1951, os invasores fizeram incursão em grande escala na província de Thai Binh. Eles capturaram mais de 16 mil pessoas — a maioria dos quais eram idosos, mulheres e crianças – e as jogaram em um campo de futebol cercado por arame farpado e guardado por soldados e cães. Por quatro dias, os prisioneiros foram expostos ao sol e à chuva, com os tornozelos presos na lama. Não recebiam nem comida, nem água. Cerca de 300 deles morreram de exaustão e doenças. Os parentes e amigos que traziam comida aos presos eram rudemente maltratados e a comida era jogada na lama e pisoteada. O senhor Phac, um cirurgião de 70 anos, que tentou salvar as vidas das vítimas, foi morto a tiros no local, como também um número de mulheres grávidas. (1) Raymonde Dien era uma patriota francesa e foi membro do Partido Comunista Francês. Em 13 de fevereiro de 1950, deitou em uma ferrovia para impedir a circulação de um trem que transportava armamentos e tanques para os colonialistas franceses para combater o povo vietnamita na Indochina. Ela foi condenada por um tribunal reacionário francês a um ano de prisão, mas devido à pressão da opinião pública e da luta travada pelas massas, o governo francês foi obrigado a libertá-la a novembro de 1950, antes de sua sentença expirar.

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Enfurecidos por estes atos bárbaros, os moradores da cidade fizeram uma greve e procuram formas e meios para ajudar os internados. A determinação da população obrigou os colonialistas franceses a deixarem a comida entrar, mas, por ordem do coronel Charton do Corpo Expedicionário Francês, foi declarado como doação dos Estados Unidos. Em outubro de 1951, Le Van Lam, de 27 anos, de Ha Coi, um soldado fantoche que foi salvo do afogamento por um velho pescador em Do Son, disse, após sua vinda: “em outubro, os franceses me mandaram para um navio junto com cem outros homens feridos a bordo de um navio, dizendo que nos mandariam para Saigon para cuidados médicos. À noite, quando o navio estava a alto-mar, nos jogaram um por um na água. Com sorte, eu consegui agarrar um pedaço de madeira flutuante e nadei até a praia. Eu estava inconsciente quando eu fui salvo”. Segue a confissão de Chaubert, um capitão francês capturado em Tu Ky em novembro de 1951: “O Alto Comando Francês nos deu a ordem de destruir tudo, para transformar esta região em um deserto”, disse ele. “Essa ordem foi seguida ao pé da letra. Casas foram queimadas. Animais e aves domésticas foram mortos. Havoc teve jardins varridos e plantas e árvores foram cortadas. Atearam fogo em arrozais e plantações. Muitos dias a fio, fumaça negra cobria o céu e não havia uma única alma viva, com exceção dos soldados franceses. A conflagração durou até 25 de novembro, quando o Exército Popular do Vietnã inesperadamente atacou e aniquilou a nossa unidade”. Os exemplos citados acima podem ser contados aos milhares e são provas suficientes para fundamentar a essência da “civilização” dos colonialistas franceses e dos intervencionistas norte-americanos. Conquistas da República Democrática do Vietnã Em 1951, o povo vietnamita deu um grande passo. No campo político, a fundação do Partido dos Trabalhadores do Vietnã, a fusão do Viet Minh e Lien Viet, a criação do Comitê de Ação para o Vietnã, Camboja e Laos, consolidando a unidade e elevando a confiança do povo vietnamita, fortaleceram a aliança entre os três países fronteiriços em sua luta contra os inimigos comuns – os colonialistas franceses e os intervencionistas norte-americanos – a fim de alcançar seu objetivo comum, isto é, a independência nacional. Então conseguimos frustrar a política aplicada pelo inimigo de “dividir e conquistar”.

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No campo econômico, o Banco Nacional do Vietnã foi criado, nossas finanças colocadas sob supervisão centralizada e unificada, e as comunicações foram reorganizadas. Anteriormente, destruímos as estradas para controlar o avanço do inimigo; agora as consertamos para conduzir o inimigo a uma derrota antecipada. Anteriormente, demos o nosso melhor para danificar as estradas, agora encontramos grandes dificuldades em repará-las, mas conseguimos completar o trabalho rapidamente. Trata-se de um trabalho difícil, principalmente quando nos faltam máquinas. No entanto, graças ao entusiasmo e ao espírito de sacrifício do nosso povo, este trabalho foi levado a cabo. Para evitar ataques aéreos inimigos, os trabalhadores fizeram isso à noite, mesmo com seus joelhos debaixo da água. À luz da tocha brilhante, centenas de homens, mulheres e jovens cavaram a terra para preencher as lacunas nas estradas, pedras quebradas, árvores derrubadas e pontes construídas. Como em qualquer outro trabalho, aqui o entusiasmo dos trabalhadores foi despertado por unidades de estímulo. Estou certo de que vocês ficariam surpresos em ver equipes de voluntários com idades de 60 a 80 anos competindo com equipes de jovens trabalhadores. Aqui deve ser apontado que, nas zonas livres, a maior parte do trabalho é feita à noite – crianças vão à escola, donas de casa vão ao mercado e guerrilhas atacam o inimigo... Grandes sucessos foram conquistados na elaboração do imposto agrícola. Anteriormente, os camponeses eram obrigados a pagar impostos de vários tipos e dar muitas outras contribuições; hoje em dia, só têm de pagar um imposto uniforme em espécie. Famílias cuja produção não exceda 60 quilos de arroz com casca por ano estão isentas de imposto. As famílias que colhem maior quantidade têm que pagar um imposto graduado. De modo geral, os impostos a serem pagos não excedem 20% do valor total da produção anual. Para a coleta de impostos em tempo, o Partido, a Frente Única Nacional e o Governo têm mobilizado grande número de quadros para examinar o novo imposto a partir dos pontos de vista político e técnico. Após o estudarem, estes quadros vão para o campo e organizam conversas e reuniões para trocar pontos de vista com os camponeses e explicar-lhes a nova política de impostos. Após este período preparatório, os camponeses de ambos os sexos nomeiam um Comitê composto por representantes da administração e várias organizações populares cujo dever é estimar a produção de cada família

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e fixar o imposto a ser pago, após a aprovação por um Congresso em que todos os camponeses participam. Esta reforma foi bem recebida pela população que entusiasticamente participou nesta cobrança de impostos. O imposto agrícola foi estabelecido simultaneamente junto com o movimento pelo aumento da produção. Atualmente o governo possui reservas adequadas de alimentos para atender os soldados e trabalhadores. Assim, frustramos a ardilosa campanha do inimigo de nos bloquear para nos jogar à fome. No que tange à educação em massa, em 1951 tivemos resultados muito válidos. Ainda que grandes dificuldades tenham sido criadas pela guerra, como frequentes mudanças de lugar da escola, aulas no período da noite, falta de material escolar, o número de escolas cresceu de 2.712, em 1950, para 3.591, em 1951, com frequência de 293.256 e 411.038 alunos em cada ano. No Sul do Vietnã, a situação é ainda mais delicada. Ali, as zonas livres existem em todo lugar, mas não estão seguras. As crianças vão para suas salas de aula – na verdade existem apenas salas de aulas individuais e não escolas no sentido estrito da palavra – com a mesma vigilância que seus pais e irmãos têm na guerrilha. Apesar disso, atualmente, no Sul do Vietnã existem 3.332 salas de aulas com 111.700 alunos frequentando-as. A eliminação do analfabetismo está sendo realizada altivamente. Na primeira metade de 1951, havia, na zona III, Zona V e zona de Viet Bac, 324 mil pessoas que se livraram do analfabetismo e 350 mil outras que estavam começando o aprendizado. No mesmo período, o analfabetismo foi eliminado em 53 vilas e três distritos (um distrito é composto de cinco a dez vilas). As organizações populares abriram 837 salas de aula com a participação de 9.800 funcionários públicos. O Partido, a Frente Única Nacional, o Governo, a Confederação Geral do Trabalho e o Exército periodicamente abriram cursos curtos de formação política (duração de cerca de uma semana). Em resumo, grandes esforços estão sendo desenvolvidos para a educação de massas. Desenvolvimento e fortalecimento das Relações Internacionais Em 1951, as relações entre o povo vietnamita e os países estrangeiros foram desenvolvidas e fortalecidas. Pela primeira vez, em 1951, várias delegações do povo vietnamita vi-

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sitaram a China Popular e a heroica República Popular Democrática da Coreia. Por meio destas, a amizade de longa data entre nossos três países foi fortalecida. A delegação da Juventude Vietnamita ao Festival da Juventude, em Berlim, a delegação da Confederação Geral do Trabalho do Vietnã ao Congresso da Federação Mundial de Sindicatos, em Varsóvia, e a delegação à Conferência da Paz Mundial, em Viena, retornaram ao Vietnã repletas de entusiasmo e confiança. Nos inúmeros encontros e na imprensa, membros destas delegações falaram ao povo vietnamita do tremendo progresso que haviam testemunhado nas democracias populares e da amizade calorosa demonstrada pelos países irmãos ao povo do Vietnã, este último que luta arduamente pela libertação e a independência nacional. Destes delegados, os que tiveram a oportunidade de visitar a União Soviética estão cheios de alegria porque puderam nos contar sobre o grande triunfo do socialismo e sobre a felicidade cada vez maior de que gozam os cidadãos soviéticos. Ao retornar do Festival da Juventude, Truong Thi Xin, uma jovem mulher operária, disse que “a juventude da União Soviética nos recebeu carinhosamente durante a nossa estadia naquele grande país”. As conversas feitas por estes delegados são lições de vida extremamente úteis para a construção do internacionalismo. “Paz no Vietnã!” e “Expulsar as tropas estrangeiras do Vietnã!” foram as palavras de ordem formuladas em uma resolução passada pela sessão plenária do Conselho de Paz Mundial realizado em Viena; palavras estas que têm dado grande entusiasmo ao povo vietnamita. Os intervencionistas sofrem derrota atrás de derrota Ano passado foi um ano de grandiosas vitórias para o nosso Exército Popular e um ano de duríssimas perdas e derrotas materiais para os invasores. De acordo com dados incompletos, e excluindo a campanha da fronteira China-Vietnã em outubro de 1950, durante a qual o exército francês perdeu mais de 7 mil homens (aniquilados e capturados), em 1951, o inimigo sofreu perdas de 37.700 oficiais e homens (incluindo prisioneiros de guerra). Nunca esquecerão a Campanha Vinh Yen – Phu Yen (no Norte do Vietnã), em janeiro do ano passado, na qual os invasores receberam um golpe mortal, executado pelo Exército Popular do Vietnã. Jamais vão esquecer dos pontos estratégicos em Quang Yen (estrada número 18), Ninh

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Binh, Phu Ly e em Nghia Lo, no Norte do Vietnã, onde nossos valorosos combatentes fizeram pedaços dos invasores em março, maio, junho e setembro. Mas a batalha mais impressionante foi travada em dezembro, na região de Hoa Binh, onde o Exército Popular vietnamita deixou ao inimigo não mais de 8 mil homens vivos. Nossos heroicos milicianos e guerrilheiros, que operaram no Norte, Centro e Sul do Vietnã, causaram grandes perdas ao inimigo. Desde o início da guerra de agressão desencadeada pelos franceses, as tropas expedicionárias destes perderam 170 mil homens (mortos, feridos e capturados), enquanto o exército regular do Vietnã e as unidades guerrilheiras têm crescido sem cessar. A guerra de guerrilhas está no processo de intensificação e ampliação nas áreas controladas pelo inimigo, especialmente no delta do Rio Vermelho. Nossas guerrilhas são particularmente ativas nas províncias de Bac Giang, Bac Ninh, Ha Nam, Ninh Binh. Ha Dong, Hung Yen, e em Thai Binh. A seguir, estão alguns fatos. Em meados de outubro de 1951, 14 regimentos inimigos levaram a cabo um assalto em larga escala nos distritos de Duyen Ha, Hung Nhan e Tien Hung. De 1º a 4 de outubro, nossos combatentes guerrilheiros se envolveram em grandes combates. Em três pontos (Cong Ho, An My e An Binh) foram aniquilados 500 soldados franceses. Todas estas vitórias foram graças ao heroísmo dos nossos soldados e guerrilheiros e ao sacrifício de todo o povo vietnamita. Em cada campanha, dezenas de milhares de trabalhadores voluntários de ambos os sexos ajudaram nossos combatentes. Tais elementos trabalharam em condições extremamente difíceis, como chuvas torrenciais, lamacentas e íngremes trilhas de montanhas etc. Milhares de patriotas tiveram que permitir ao inimigo controlar certas áreas para tomar parte nas supracitadas tarefas. Vale a pena mencionar aqui que os jovens criaram muitas unidades de choque. O exemplo a seguir irá ilustrar o grande patriotismo e iniciativa de nosso povo: Na campanha de Hoa Binh, nosso exército teve de cruzar o Rio Lo. Tropas francesas estavam estacionadas na sua margem direita, enquanto os barcos deles patrulhavam o rio continuamente. Nestas condições, como a travessia do rio poderia ser realizada sem que o inimigo pudesse nos notar? A população local descobriu um modo. Em uma localidade a algumas dezenas de quilômetros do Rio Lo, o povo local nos trouxe um grande número de embarcações e, através de caminhos sinuosos, levaram nossas tro-

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pas para o local designado no horário agendado. Assim que nossas tropas atravessaram o rio, os habitantes locais retornaram e guardaram as embarcações o mais rápido possível, para manter o sigilo e evitar ataques aéreos do inimigo. Aqui gostaria de falar sobre as mulheres que deram suporte aos soldados. A maioria é de velhas camponesas; muitas possuem netos. Ajudaram nossos oficiais e homens, cuidaram dos feridos como se fossem seus próprios filhos. Como “deusas que protegem nossas vidas”, elas tomaram conta daqueles nossos soldados que trabalharam em regiões controladas pelo inimigo. Seus feitos são altamente estimados e apreciados. Assim como foi dito anteriormente, os colonialistas franceses são forçados a instalar mais tropas marionetes, a fim de compensar as perdas sofridas pelo corpo expedicionário francês. Mas este é um método perigoso para o inimigo. Primeiro: em todos os lugares controlados pelo inimigo, a população luta ferozmente contra este, que força os jovens a ingressarem em seu exército. Segundo: o povo está tão mobilizado que estão recorrendo a ações de sabotagem. Tomemos como exemplo: uma vez, Quisling, governador de Tonking, que se autoproclamou o “senhor da juventude”, realizou uma visita à Escola de Treinamento de Oficiais do Segundo Grau, em Nam Dinh. Ao ouvir esta notícia, os cadetes prepararam, em homenagem ao governador, uma recepção “digna” e escreveram nos muros da escola as palavras de ordem “Abaixo Bao Dai!”, “Abaixo a camarilha de fantoches!’”, enquanto o nome de Bao Dai foi dado ao banheiro da instituição. Durante esta visita, os cadetes fizeram tanto barulho que o governador foi incapaz de falar. Eles então lhe fizeram uma pergunta, como: “Querido Senhor! Por que você quer nos usar como bucha de canhão dos colonialistas franceses?”. Um grupo de cadetes tentou contemplá-lo com uma surra, mas ele conseguiu fugir do local como cachorro covarde. Muitas unidades do exército fantoche enviaram cartas secretamente ao presidente Ho Chi Minh, dizendo-lhe que estavam à espera de uma ocasião propícia para “passar para o lado da Pátria” e que estavam prontos para “proceder com todas as ordens emitidas pela resistência, apesar do perigo que podem encontrar”. Fracasso total dos colonialistas franceses Assim que De Lattre de Tassigny pôs o pé no Vietnã, no início de 1951, gabou-se das eventuais vitórias das tropas francesas.

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Depois da sua derrota e desilusão, no início de 1952, logo percebeu que seu encontro com a derrota completa seria inevitável. O destino da política dos colonialistas franceses trouxe dúvidas aos círculos mais reacionários na França. No jornal Information, publicado em 22 de outubro de 1951, Daladier, um dos “criminosos” na questão Munique, escreveu: “investigando a verdadeira razão de nossa situação financeira desesperadora, veremos que uma das causas subjacentes foi a falta de consideração madura de nossa política sobre a Indochina. Em 1951, uma despesa de mais de 330 milhões de francos foi reservada oficialmente para o orçamento indochinês. Devido ao aumento constante nos preços das commodities e no crescimento dos estabelecimentos do Corpo Expedicionário Francês, que o número é de 180 mil no momento, deve-se esperar que em 1952 tal despesa aumente em 100 milhões de francos. Nós temos a impressão de que a guerra na Indochina causou um extremamente grave perigo para nossa situação financeira, bem como militar. É impossível prever uma vitória rápida em uma guerra que já dura cinco anos e em muitos aspectos lembra a guerra desencadeada por Napoleão contra a Espanha e a expedição contra o México durante o Segundo Império”. Na sua edição de 13 de dezembro de 1951, o jornal Intransigeant escreveu: “a França está paralisada pela guerra na Indochina. Temos gradualmente perdido a iniciativa da operação porque nossas principais forças estão sendo agora derrotadas nas planícies do norte de Vietnã. Em 1951, 330 milhões de francos foram destinados para o orçamento militar da guerra na Indochina, enquanto, de acordo com os números oficiais, nossas despesas ascenderam a mais de 350 milhões. Um crédito de 380 milhões de francos será atribuído ao orçamento em 1952, mas com toda probabilidade de que será atingida a marca de 500 milhões. Essa é a verdade. Toda vez que a França tenta tomar alguma medida, bem, ela imediatamente percebe que está paralisada pela guerra na Indochina”. Em seu número de 16 de dezembro de 1951, Franc Tireur escreveu: “batalhões do general Giap, que dizem ter sido aniquilados e que estão com moral abalada, neste exato momento executam contraofensivas na região de Hanói. É cada vez mais óbvio que a política que temos seguido até o presente momento falhou. Hoje está claro que se deparou com o completo fracasso”.

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A seguir temos um trecho de uma carta enviada aos seus colegas pelo Capitão Gazignoff, do Corpo Expedicionário Francês, que fora capturado por nós, a 7 de janeiro de 1952, na batalha de Hoa Binh. “Feito prisioneiro faz alguns dias, eu estou muito surpreso pela atitude gentil e correta dos homens do Exército Popular do Vietnã em relação a mim. As tropas vietnamitas certamente conquistarão a vitória final, porque lutam por um nobre ideal, uma causa comum e seguem uma disciplina autoimposta. É tão claro como a luz do dia que o Exército Popular do Vietnã esmagará o Corpo Expedicionário Francês e está preparado para receber qualquer um que queira passar para o lado deles. Oficiais franceses, oficiais não comissionados e homens que queiram se juntar ao Exército Popular do Vietnã serão considerados amigos e serão postos em liberdade”. O povo vietnamita vencerá Em 1952, o Vietnã embarcará em um programa que inclui os seguintes pontos: trabalhar arduamente na produção e consolidar a economia nacional; combater e aniquilar as forças inimigas. Intensificar a guerra de guerrilhas; expor por todos os meios a política inimiga de “usar o vietnamita para combater o vietnamita, e ‘curar’ a guerra por meio da guerra”; vincular intimamente o patriotismo com o internacionalismo; combater energicamente a burocracia, a corrupção e o desperdício. O patriotismo e o heroísmo do povo vietnamita nos permitem ter uma firme confiança na vitória final.

… O futuro do povo vietnamita é brilhante, assim como o sol na primavera. Cheios de alegria com o brilho do sol na primavera, vamos lutar para o futuro esplêndido do Vietnã, para o futuro da democracia, da paz mundial e do socialismo. Nós triunfamos no presente momento e nós triunfaremos no futuro, porque o nosso caminho é iluminado pela grande doutrina marxista-leninista. Fonte: The Communist Party of Vietnam (1930-2015), The Gioi Publishers

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Economizar e lutar contra a corrupção, o desperdício e a burocracia Diante dos gigantescos desafios de preparar o povo, o Exército e o Partido para as tarefas da resistência aos agressores da Nação e à organização institucional do novo governo Democrático, Ho Chi Minh sistematizou neste documento suas preocupações para eliminar erros e desvios no trabalho revolucionário em 1952.

Camaradas, O programa de atividade do nosso governo e do nosso partido para este ano resume-se nestas oito palavras: “resistência prolongada, contar com suas próprias forças”. Para realizar integralmente este programa, o governo e o partido avançam os seguintes pontos principais: rivalizar de ardor para derrotar o inimigo, para desenvolver a produção, para fazer economias; combater a corrupção; combater o desperdício; combater a burocracia.No que diz respeito ao movimento de estímulo para derrotar o inimigo e distinguir-se por feitos militares, o alto comando elaborou um plano completo, que foi comunicar às instâncias do partido e a todos os combatentes do Exército Nacional das forças regionais, das milícias populares e a todos os guerrilheiros, para que cada um pudesse estudá-lo, assimilá-lo e levá-lo à prática. Quanto ao movimento de estímulo de desenvolvimento da produção, o governo elaborou um plano de conjunto completo. Os diversos ramos, as diversas localidades e cada família o tomarão como base para estabelecer seus próprios planos de forma realista e coordenando com o plano do Estado. E deverão levá-los à prática custe o que custar. Os camaradas responsáveis irão expor claramente essas duas questões. Aqui limito-me a falar do problema do estímulo a fazer economias e lutar contra a corrupção, o desperdício e a burocracia. I. Fazer economia Em primeiro lugar coloquemos algumas questões: – O que se deve entender por economias? – Por que devemos economizar?

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– O que devemos economizar? – Quem deve economizar? 1. Economizar não significa ser avarento, “considerar” uma moeda como um tesouro, abster-se até de fazer o que deve ser feito, recusar despesas necessárias; economizar não significa privar os exércitos e o povo de alimentação e vestuário, ao contrário, as economias têm como objetivo ajudar a desenvolver a produção, e desenvolver a produção para elevar o nível de vida do exército, dos quadros e do povo. Para falar em linguagem científica, a prática da economia é um ato positivo e não negativo. 2. Durante 80 anos, o nosso país foi pilhado pelos imperialistas franceses, depois pelos imperialistas japoneses e, por isto, nossa economia é pobre e atrasada. Hoje, nós temos necessidade de uma economia bastante sólida para prosseguir a resistência e a edificação nacionais. Para a reconstrução econômica, é preciso fundos em dinheiro e em bens naturais. Para se procurar fundos, os países capitalistas usam três meios: 1) pedir emprestado ao estrangeiro; 2) pilhar colônias; e 3) explorar os camponeses e os operários. Nós não recorreremos a tais meios. Nós só podemos, por um lado, desenvolver a produção e, por outro lado, fazer economias, para acumular mais fundos com vista à edificação e ao desenvolvimento econômico do nosso país. 3. Nós devemos economizar nosso tempo. Por exemplo: um trabalho, que antes demorava dois dias, pode-se agora fazer em um dia graças a uma organização e uma disposição das forças mais sensatas. Nós devemos economizar nosso dinheiro. Um trabalho que antes precisava de muita mão de obra e de muito tempo custava 20 mil dongs. Agora, economizando a mão de obra, o tempo e as matérias-primas, nós não gastamos mais do que 10 mil dongs. Em resumo: é necessário chegar a uma organização apropriada para que uma pessoa possa fazer o trabalho de duas, que um dia de trabalho valha dois, que um dong valha dois. 4. Todos devem economizar. Em primeiro lugar, os serviços públicos, o exército, as empresas. Alguns dizem: o exército não pensa senão em derrotar o inimigo e realizar proezas, não é um organismo de produção; como poderia economizar? 167


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O Exército compreende a administração, o armamento, os transportes etc., que são organismos para os quais a prática da economia é necessária. Por exemplo: antes, um combatente devia utilizar, em média, 60 balas para abater um soldado inimigo. Hoje, graças a um treino mais cuidadoso, que permite melhorar o tiro, basta, em média, 10 balas para obter o mesmo resultado. Assim, o combatente economiza 80% de balas. Daí a economia de matérias-primas e de mão de obra, as quais podem então servir para fabricar outras armas. Antes, o serviço dos transportes tinha de fazer 100 carregamentos de munições, agora só tem que fazer 20. Disso a economia de carros, carburante e lubrificante. E, como os carros andam menos, há a necessidade de fazer menos reparações de estradas, e daí a economia de energia para os trabalhadores voluntários. No decurso das operações militares, conseguimos um importante espólio de guerra (munições, víveres, armamentos). Saber tê-lo em conta, usando-o com cuidado para voltá-lo contra o inimigo, é também desenvolver a produção. Qualquer serviço público deve e pode economizar. Exemplo: todos os serviços públicos utilizam envelopes. Se cada um economizar, utilizando 2 ou 3 vezes o mesmo envelope, o governo pode economizar todos os anos dezenas de toneladas de papel. Se os quadros judiciais aumentarem o seu rendimento, ajudarão os compatriotas que têm de utilizar estes serviços, a economizar o seu tempo e a consagrá-lo ao desenvolvimento da produção. 5. Os resultados da prática da economia. Os exemplos acima citados demonstram que, se soubermos economizar a nossa mão de obra, os nossos bens e o nosso tempo, poderemos, com o que dispomos, multiplicar a nossa produção e a nossa possibilidade em todos os domínios. Na URSS, graças às economias, os fundos de investimentos para o plano quinquenal (1946-1950) aumentaram em 26 bilhões de rublos, ou seja, um terço. Por exemplo: uma fábrica de confecções em Moscou economizou, em 1918, mais de 34 mil metros de tecido, isto é, o necessário para fazer 20 mil camisas. O aumento da produtividade permite economizar muito tempo. Assim, outrora, para fabricar um grande avião, eram necessárias 20 mil horas de trabalho, hoje não são necessárias mais do que 12 mil e 700. Outrora, para fabricar um grande carro, era preciso 8 mil horas de trabalho, hoje não são necessárias mais do que 3 mil e 700.

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Na China, em 1951, a produção da zona do Nordeste pôde, graças a uma produtividade maior e às economias, produzir mais de 14 milhões de toneladas de víveres. Neste ano, os operários e a produção desta zona prometeram ao presidente Mao Tsé-tung economizar, custasse o que for, 22 milhões de toneladas. Graças às economias, a zona do Noroeste dispôs de mais de milhão de toneladas de víveres, de 600 mil quintas de algodão, de 350 mil cabeças de gado bovino etc. Isso também se passa em outras zonas. A economia do tempo aumenta paralelamente com a produtividade. Antes, em duas horas um tecelão dava mais de 5 mil e 200 passos no decurso do seu trabalho. Hoje as fábricas difundiram o método Xich Kien Tu, segundo o qual não se dá mais que 2 mil e 300. Assim, a fadiga dos operários diminui enquanto o rendimento do seu trabalho aumenta. Xich Kien Tu, a quem se deve este método racional, é um jovem operário de 17 anos. O povo soviético desenvolve o estímulo simultaneamente na produção e na prática da economia. Assim, cinco anos após a Segunda Guerra Mundial, seu desenvolvimento econômico ultrapassou as normas previstas. Enquanto o custo de vida sobe nos países capitalistas e o povo tem que suportar cada vez mais privações, os preços já baixaram quatro vezes na URSS onde o bem-estar da população cresce cada vez mais. O triunfo da Revolução Chinesa data de apenas alguns anos. Ora, na China, graças ao desenvolvimento da produção e à realização de economias, a situação econômica progride, as finanças são unificadas, os preços estabilizam-se, as condições de vida do povo melhoram rapidamente. O nosso país prossegue a resistência, ele encontra-se em condições muito difíceis. Mas, estando como nós estamos decididos a desenvolver a produção e a praticar a economia, nós ultrapassaremos certamente as limitações. II. Extirpar a corrupção, o desperdício e a burocracia Para que o arroz cresça como se deve, é preciso tirar cuidadosamente as ervas do arrozal. Do contrário, mesmo que seja lavrado o gradado cuidadosamente e adubado abundantemente, o arrozal cresce pouco porque é invadido por ervas. Para conseguir desenvolver a produção e praticar a economia, é necessário igualmente tirar as ervas com cuidado, quer dizer, arrancar até a raiz a corrupção, o desperdício e a burocracia; senão estes prejudicarão nosso trabalho.

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A. O que é a Corrupção? – Do lado dos quadros, a corrupção consiste em: Apoderar-se do bem público para fazer dele bem privado, esmagar o povo com impostos, roubar o dinheiro do exército, faturar para além das despesas efetivas. Apropriar-se dos bens públicos e dos do Estado para fazer deles bens particulares da sua localidade, da sua unidade, é também prevaricar. – Do lado da população, a corrupção consiste em: roubar os bens do povo, fazer falsas declarações coletivas. B. O que é Desperdício? O desperdício apresenta-se sob diversas formas: 1. Desperdício da mão de obra: por causa de um insuficiente sentido das responsabilidades, de uma organização defeituosa e de uma má distribuição das tarefas, empregam-se muitas pessoas em um trabalho que necessita de poucas. Este erro nota-se no exército, nos serviços públicos, nas empresas. Assim, por exemplo, na reparação de estradas e pontes e nos transportes militares, desperdiçou-se muita mão de obra voluntária. 2. Desperdício de tempo: arrasta-se durante dias inteiros um trabalho que normalmente não demoraria mais do que um dia ou um meio dia. Por exemplo: uma reunião dura de três a cinco dias ao invés de um porque o responsável da organização não preparou bem o programa e porque os participantes não se prepararam suficientemente para a reunião. 3. Desperdício do Tesouro Público: existem numerosas formas, eis alguns exemplos: os serviços públicos desperdiçam material; as empresas usam mais máquinas e material que aquele que lhes faz falta; o serviço de transportes não assegura tão escrupulosamente como deveria a conservação dos veículos e a economia das carburantes e dos lubrificantes; o serviço de armazenagem do paddy (arroz), por falta de precaução na construção dos armazéns, e os guardas dos armazéns, por falta de sentido das responsabilidades, deixaram apodrecer o paddy, logo houve uma perda considerável; o comércio do Estado, por erros de cálculo, por carência, deixa as mercadorias perderem-se, o que resulta prejuízo; a banca do Estado não sabe utilizar convenientemente os seus fundos em dinheiro líquido, e não os põe a serviço do desenvolvimento da produção; os organismos econômicos elaboram planos, pouco realistas,

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não adaptados à situação, do que resultam perdas para a revolução; o povo deixa terras incultas, queima boletins de voto, hipoteca búfalos e vende os arrozais para casamentos e enterros etc. O desperdício não é roubo ou banditismo como a corrupção. No entanto, não é menos nefasto para o povo e para o governo e, por vezes, é ainda mais prejudicial do que a corrupção. E se a corrupção e o desperdício existem, é devido à burocracia. Isto porque os dirigentes e os organismos da direção, do topo à base, não abrangem a realidade dos fatos, não seguem de perto e não educam os quadros, não se mantêm em contato estreito com as massas, agarram-se à forma, mas não estudam os problemas sob todos os seus aspectos e não se aprofundam, limitam-se a ter reuniões, a redigir instruções, a ler relatórios, não controlam nada a fundo. Em resumo, por causa da burocracia que atinge os dirigentes e os organismos de direção, seus olhos não veem tudo, seus ouvidos não escutam tudo, os regulamentos não são escrupulosamente seguidos, a disciplina não é totalmente assegurada. Segue-se que maus elementos, os quadros irresponsáveis, roubam e desperdiçam o que querem. Assim, a burocracia cobre, favorece e protege a corrupção e o desperdício. Para se desembaraçar completamente da corrupção e do desperdício, é preciso, em primeiro lugar, desembaraçar-se da burocracia.

III. A corrupção e o desperdício são Inimigos do Povo A) A corrupção, o desperdício e a burocracia são inimigos do povo, do exército e do governo São inimigos perigosos. Eles não estão armados com espingardas e com espadas, mas instalam-se no seio das nossas organizações para sabotar nosso trabalho. Conscientes ou não, a corrupção, o desperdício e a burocracia são aliados dos colonialistas e dos feudais. Eles atrasam a nossa resistência e a nossa edificação nacional, tentam atingir a pureza dos nossos quadros e a sua vontade de ultrapassar as dificuldades, atacam as nossas virtudes revolucionárias: trabalho, espírito de economia, integridade e justiça. Pela vitória da resistência, pelo sucesso da reconstrução, os nossos combatentes dão a vida, os nossos compatriotas, o seu suor. Os corruptos, os desperdiçadores e os burocratas destroem a moral, dissipam as forças e arruínam os bens do governo e do povo. O seu crime é tão grave como o dos traidores e espiões.

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Por esta razão, a luta contra a corrupção, o desperdício e a burocracia é tão imperiosa e importante quanto o combate conduzido face ao agressor. Trata-se, neste aspecto, da frente ideológica e política. Como nas outras frentes, para vencer é preciso ter o seu plano e organizar-se, é necessário uma direção e militantes. B) A luta contra a corrupção, o desperdício e a burocracia é uma ação revolucionária Fazer a revolução é destruir aquilo que é mau, edificar o que é bom. Nós fazemos a revolução para aniquilar completamente o regime colonial e feudal, para construir a Nova Democracia. Se o colonialismo e o feudalismo são aniquilados e se os seus vícios (corrupção, desperdício e burocracia) subsistem, a revolução não está ainda inteiramente coroada de êxito, pois seus vícios entravam e minam sorrateiramente a obra construtiva da revolução. Há homens que, durante a luta, se sobressaem pelo seu ardor e sua fidelidade; não temem o perigo, nem as privações, nem o inimigo. Em outras palavras, foram dignos da revolução. No entanto, assim que detêm algum poder, tornam-se orgulhosos como uma burocracia inconsciente. Eles tornam-se réus frente à revolução. Nós devemos salvá-los, ajudá-los a reconquistar suas virtudes revolucionárias. Existem outros que declaram servir a pátria, servir ao povo, mas caem na corrupção, no desperdício e prejudicam a pátria e o povo. Nós devemos educá-los para conduzi-los à via revolucionária. A corrupção, o desperdício e a burocracia são vícios da antiga sociedade. Eles provêm do apego ao interesse pessoal, do amor próprio em detrimento de outrem. Eles derivam do regime da “exploração do homem pelo homem”. Nós queremos construir uma nova sociedade, uma sociedade livre onde os homens sejam iguais, uma sociedade onde reinam o trabalho, o espírito de economia, a integridade e a justiça, devemos também extirpar completamente o vício da antiga sociedade. C) A luta contra a corrupção e o desperdício é tarefa democrática Para salvar a pátria, o exército não teme perder o seu sangue, nem a população perder o seu suor. Para conduzir a resistência e reconstruir o país, os nossos combatentes põem a sua vida, os nossos compatriotas põem as suas forças, os seus bens entre as mãos do governo e do Partido. Isto é uma forma do centralismo democrático.

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O governo e o partido delegam seus poderes aos quadros para que eles dirijam o exército, disponham dos bens públicos para a resistência e a edificação nacional. Os quadros devem vigiar cada combatente e rodeá-lo de carinho; devem respeitar economizar todas as moedas, todas as tigelas de arroz, todas as horas de trabalho dos nossos compatriotas. Os nossos combatentes e os nossos compatriotas têm o direito de exigir que os quadros cumpram bem a sua tarefa, têm o direito de criticar aqueles que, entre eles, não se mostram à altura. Ser democrático é apoiar-se nas massas, seguir exatamente a linha de massas. Assim, para triunfar, o nosso movimento de luta contra a corrupção, o desperdício e a burocracia necessariamente tem que se apoiar na força das massas. As massas são o conjunto de combatentes do exército, o conjunto dos empregados em um serviço público etc., enfim, são um povo inteiro. Para esta luta, tal como para todas as coisas, é preciso mobilizar as massas, respeitar a democracia, fazer as massas compreenderem bem do que se trata, provar sua participação entusiástica. É assim que o sucesso é certo. Quanto mais as massas participarem em um grande número, mais complexo e rápido será o triunfo. O dever das massas é participar com o ardor na luta contra a corrupção, o desperdício, a burocracia. O combatente oferece as suas campanhas e o povo oferece seus bens na luta contra o inimigo pela salvação da pátria. A corrupção, o desperdício e a burocracia constituem um “inimigo oculto no interior”. Se os combatentes e o povo se aplicarem na luta contra o invasor estrangeiro, mas se esquecerem de combater o inimigo interno, não cumprem ainda inteiramente a sua tarefa. Eles também devem participar com ardor no movimenta de luta contra este inimigo. Em todos os escalões, devemos nos unir e conjugar nossas forças para vencer nesta luta. Os nossos sucessos ajudarão a nos unir mais, a elevar ainda mais nosso rendimento. Ajudarão os nossos quadros a reeducarem-se ideologicamente, a elevar sua consciência, a penetrar-se da moral revolucionária, a servir sinceramente o exército e o povo. Ajudarão nosso poder a adquirir a pureza, a merecer a confiança e os sacrifícios dos nossos combatentes e dos nossos compatriotas. Ajudarão a realizar completamente o plano de desenvolvimento da produção e da prática da economia estabelecida pelo governo e pelo Partido. E nos ajudarão a completar nossos preparativos para passar à contraofensiva geral. Fonte: Ho Chi Minh, Selected Works, Hanoi: Foreign Languages Publishing House, 1962

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Relatório à VI Conferência do Comitê Central do Partido dos Trabalhadores do Vietnã Neste informe ao Comitê Central, Ho Chi Minh analisa a situação internacional logo depois da grandiosa vitória do Exército Popular sob o comando de Vo Nguyen Giap sobre o Exército Francês de ocupação em Dien Bien Phu, e propõe novas tarefas, em 15 de julho de 1954

A VI Conferência do Comitê Central do Partido está aberta a certo número de quadros do escalão superior para deliberar sobre a situação atual e as novas tarefas. Em nome do Comitê Central, envio minhas afetuosas saudações aos combatentes e aos quadros de todas as frentes, os meus conselhos aos nossos compatriotas da zona libertada e da zona recentemente libertada, toda a minha simpatia aos nossos compatriotas da zona ainda ocupada. Em nome do Comitê Central, agradeço aos partidos irmãos e aos povos dos países amigos por nos terem ajudado em nossa resistência e em nossa luta pela paz. Os meus agradecimentos vão também para os povos amantes da paz no mundo que nos deram o seu apoio. E agora faço o resumo da situação e das novas tarefas. I. Nova Situação 1. Situação do mundo Tal como a União Soviética, a China e os países de democracia popular desenvolvem-se, consolidam-se e progridem em todos os domínios, o movimento mundial da paz e da democracia cresce cada vez mais. Como consequência da sábia e da justa política externa da URSS, os imperialistas, e em primeiro lugar os imperialistas norte-americanos, viram-se obrigados a participar das conferências de Berlim e de Genebra. O simples fato de se reunirem nestas duas conferências já foi uma vitória para o nosso campo e uma derrota para o campo imperialista. No campo imperialista, com os EUA à frente, as contradições se aprofundam e aumentam cada vez mais. Eis alguns exemplos: Contradições entre ingleses e americanos: traduzem-se pelo conflito de interesses que divide os Estados Unidos e a Grã-Bretanha no Mediterrâneo

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e no Oriente Próximo e Médio. Os americanos atraíam para si o Paquistão, a Nova Zelândia e a Austrália, que pertencem ao grupo inglês. No Extremo Oriente, a política inglesa e americana face à China e ao Japão se opõem etc. Contradições entre franceses e americanos: os americanos dão auxílio aos franceses, mas para fazer dele um meio de pressão. Os Estados Unidos fazem de tudo para forçar a França a assinar o tratado franco-alemão e o tratado sobre a organização de um exército europeu. O acordo da França equivaleria ao seu próprio suicídio. No que diz respeito à Indochina, os franceses e os americanos parecem estar de acordo sobre a guerra no Vietnã. Na realidade, os segundos querem colocar a mão sobre os fantoches para afastar os primeiros e entregarem o poder fantoche a Ngo Dinh Diem, seu fiel lacaio. A política americana no que diz respeito ao “tratado militar de defesa europeia” semeou a discórdia entre os países da Europa Ocidental e no interior destes países. As populações se opõem aos governos pró-americanos e há contradições que dividem os capitalistas pró-americanos daqueles que não o são. Na Ásia, os americanos propõem-se criar um pacto “SEATO” com vista a combater os asiáticos pelos asiáticos. A sua política é extremamente reacionária, mas eles sofrem numerosos reveses. Empregam a ”política da força”, bradam a ameaça de bombas A e H. Mas o movimento da paz que se opõe à política de violência e ao emprego das armas atômicas intensifica-se a cada dia. O próprio Papa é obrigado a condenar sua política de utilização destes engenhos de destruição massiva. O movimento da paz ganhou a grande maioria dos povos, um grande número de membros da burguesia de diferentes países e até o chefe da Igreja Católica Apostólica Romana. Antes da Conferência de Genebra e antes da vitória de Dien Bien Phu, os Estados Unidos propunham-se estabelecer uma “declaração comum” entre eles, mas a França, a Inglaterra e alguns outros países não deram seu apoio. Eles preconizam então uma “ação comum”, com vista a levar socorro aos franceses em Dien Bien Phu. Novo revés: seu projeto não recebeu e aprovação da Inglaterra, nem dos outros países. Eles fazem tudo para sabotar a Conferência de Genebra. Isto é, para boicotar a paz. O secretário de Estado dos EUA fugiu depois de ter assistido, por alguns dias, à Conferência. As delegações dos outros países não deixaram, apesar disso, de participar dos trabalhos e a conferência deu resultados. A despeito das suas derrotas, os imperialistas norte-americanos não se dão por vencidos. Eles se empenham ativamente para erguer o pretenso

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bloco para a defesa do Sudeste Asiático. São o principal inimigo da paz mundial e nós devemos concentrar nossas forças contra eles. 2. Situação no país O Vietnã, o Camboja e o Laos estão unidos e sua resistência intensifica-se cada vez mais. As nossas forças de guerrilha no Sul, no Centro e no Norte, além de serem sólidas, tomam cada vez mais um ímpeto mais poderoso. Desde a Campanha da fronteira à de Hoa Binh e do Noroeste etc., nosso exército regular conquistou vitórias sobre vitórias. Estas vitórias, às quais se somou a de Dien Bien Phu, causaram mudança considerável na situação do país. Fizemos fracassar o plano Navarre e, por isso, derrubamos o gabinete Daniel-Bidault e forçamos o corpo expedicionário francês a reduzir suas zonas de ocupação. As nossas vitórias se devem à justa política do nosso Partido e do nosso governo, ao heroísmo do nosso exército e do nosso povo, ao apoio dos povos dos países amigos e dos povos do mundo inteiro. São também as vitórias do movimento mundial da paz e da democracia. Junto aos nossos sucessos no domínio militar, começamos a alcançar outros na frente antifeudal. Se os primeiros tiverem bons efeitos na mobilização das massas para realização da reforma agrária, os segundos influenciarão de forma positiva a lida anti-imperialista. Nossos sucessos entusiasmam nosso povo e outros povos do mundo, consolidam a nossa posição diplomática em Genebra, obrigando nossos inimigos a negociar. A atitude dos franceses mudou de forma notável em relação às condições apresentadas por Bollaert, em 1947. Desde o início da resistência, nossa posição reforçou-se cada vez mais, enquanto a do inimigo se enfraqueceu a cada dia. Mas não esqueçamos que estas forças são apenas relativas e não absolutas. Não devemos cair no subjetivismo, subestimando o inimigo. As nossas várias vitórias despertaram os americanos. Depois de Dien Bien Phu, modificaram seus planos de intervenção para prolongar e internacionalizar a guerra na Indochina, sabotar a Conferência de Genebra, tentar, por todos os meios, afastar os franceses, apoderar-se do Vietnã, do Camboja e do Laos, subjugar estes três povos e aumentar a tensão internacional. Os americanos, inimigos dos povos do mundo, estão prestes a se tornarem os inimigos principais dos povos do Vietnã, do Laos e do Camboja. A Conferência de Genebra se reuniu após estas modificações sobrevindas a esta situação mundial e nacional. Ela vê acentuar ainda mais as

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contradições entre os imperialistas: se os franceses desejam negociar, os ingleses permanecem equivocados e os americanos pretendem sabotar. No momento atual, estes últimos estão cada vez mais isolados. Pelo contrário, o Vietnã, a China e a União Soviética estão mais unidos do que nunca. Como consequência das contradições entre os imperialistas e graças aos nossos esforços e aos do nosso campo, conseguimos alguns acordos bastante importantes. Estando virtualmente o governo francês nas mãos dos defensores da paz, são-nos oferecidas oportunidades para obter o fim das hostilidades na Indochina. Durante a suspensão provisória da Conferência de Genebra, os chefes das delegações regressam aos seus países, depois de terem confiado seus poderes a seus adjuntos. Aproveitando esta ocasião, o camarada Chu En-Lai, primeiro-ministro da República Popular da China, visitou a Índia e a Birmânia. Ele assinou duas declarações comuns sobre a paz. Cinco princípios enunciados nestas declarações são breves, mas importantes, claros e justos. Bem acolhidos pelos povos do mundo inteiro, particularmente pelos da Ásia, eles cercearam as manobras americanas que visavam a semear a discórdia entre os povos asiáticos. Eis o texto: 1. Respeito mútuo de soberania e de integridade territorial. 2. Não agressão. 3. Não ingerência nas ações internas de cada país. 4. Relações de amizade e de igualdade. 5. Coexistência pacífica. A minha entrevista com o camarada Chu En-Lai deu bons resultados. Seus amigáveis encontros com os representantes da Índia, da Birmânia e do Vietnã estreitaram a unidade entre os povos da Ásia. Isso foi mais um sucesso para o ativo do nosso campo. A situação no mundo, no nosso país e na Ásia faz com que nós alcancemos a paz, mas os Estados Unidos multiplicam suas atividades de sabotagem. A fração belicista ainda existe na França e os fantoches pró-americanos, por seu lado, fazem tudo para sabotar. E por isto que é possível que a guerra se prolongue. Esta é a situação. II. As nossas novas tarefas A situação impõe novas tarefas, implica novas diretrizes e uma nova

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tática. No decurso destes nove anos de resistência e de luta heroica sob direção do Partido e do governo e à custa de mil dificuldades, nosso exército e nosso povo conquistaram brilhantes vitórias. As nossas forças cresceram sob todos os pontos de vista. Os sucessos obtidos devem-se à justa política do Partido e do governo. Atualmente, tendo a situação tomado nova disposição, e não sendo as tarefas inteiramente as mesmas, nossas políticas e nossas palavras de ordem devem ser modificadas igualmente, por consequência. Até aqui, concentramos nossas forças para aniquilar as dos franceses agressores. Presentemente, os franceses entram em negociação conosco, enquanto os imperialistas americanos estão prestes a se tornarem nossos inimigos principais e diretos. É contra estes últimos que deve ser dirigido nosso golpe principal. De hoje até o restabelecimento da paz, continuaremos a combater os franceses. Mas é contra os americanos que devem convergir nossos esforços de luta, tal como os esforços dos povos do mundo inteiro. A política dos EUA é estender e internacionalizar a guerra na Indochina, a nossa é lutar pela paz, contra a política de guerra dos americanos. Há 9 anos, o programa do nosso Partido salientou os seguintes objetivos: o Vietnã, o Camboja e o Laos devem ser completamente independentes e libertados do jugo francês; não aceitação da União Francesa; expulsão do corpo expedicionário francês da Indochina; aniquilação do poder e do exército fantoche; confisco dos bens dos imperialistas e dos traidores; trabalho de agitação para a redução das taxas de arredondamento e de juros com vista à reforma agrária; realização da democracia em todo o país; resistência até a vitória final. Este programa obteve inúmeros sucessos, revelou-se justo. Mas, perante a nova situação, não pode ser mantido tal como está. A antiga palavra de ordem “resistência até o fim” deve ser substituída por “paz, unidade nacional, independência e democracia”. Contra a política americana de intervenção, de prolongamento e de ampliação de guerra na Indochina, devemos segurar com firmeza a bandeira da paz. Por consequência, nossa política deve ser modificada, anteriormente era a confiscação dos bens dos imperialistas franceses, no presente, como eles entram em negociações conosco, poderão, sob o princípio da igualdade e das vantagens recíprocas, conservar interesses econômicos e culturais no nosso país. Quando se entra em negociação, devem-se fazer concessões recíprocas razoáveis. No passado, dizíamos: perseguir e destruir totalmente o corpo expedicionário francês; agora, com as negociações, recla-

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mamos, e os franceses aceitaram a retirada do seu exército em uma data determinada. Anteriormente, nós propúnhamos aniquilar o exército e o poder fantoche com vista à unidade nacional; agora, avançamos com uma medida generosa, a reunificação nacional pela via das eleições gerais em todo o país. Para estabelecer a paz, é preciso colocar fim à guerra, chegar a um cessar-fogo. Para colocar em prática o cessar-fogo, há que se delimitar as zonas de concentração. O exército inimigo deve reagrupar-se em uma zona com vistas à sua retirada progressiva. O nosso deve reunir-se em outra. É necessário, para nós, uma vasta região reunindo as condições necessárias à edificação, à consolidação e ao desenvolvimento das nossas forças, cuja influência sobre as outras regiões levará à reunificação nacional. Delimitar as zonas de concentração não quer dizer dividir o país, é uma medida provisória para se chegar à reunificação da pátria. Com a determinação e a troca das zonas de reagrupamento, nossos compatriotas, habitantes da região até aqui livres, que o inimigo virá a ocupar, poderão ter motivos de descontentamento e de decepção, e deixar-se explorar pelo adversário. Devemos fazê-los compreender que, no interesse de todo o país, no interesse durável, é preciso saber ter paciência, que será honroso fazê-lo e a nação reconhecerá isto. Devemos proceder de forma que seja banido todo pessimismo negativo. Todos devem continuar a empregar todas as forças para exigir dos franceses a retirada das tropas, para começarmos a independência do país. Delimitar as zonas para atingir a paz e efetuar as eleições gerais em todo o país para conseguir a reunificação nacional é nosso princípio. Nós conduzimos a resistência pela independência, a unidade, a democracia e a paz. Restabelecer a paz, tendo também como objetivo alcançar a independência, a unidade e a democracia. A nova situação exige uma nova linha política para a nova conquista e novos sucessos. Mas, quer se trate de trabalhar em paz ou prosseguir a guerra, devemos conservar a iniciativa, prever e preparar o futuro. Conquistar a paz não é coisa fácil. É uma luta prolongada, dura e complexa, que tem dificuldades e fatores favoráveis. Os países amigos e os povos do mundo nos apoiam, nosso povo está fortemente convicto em nosso Partido e em nosso governo; sob uma sábia direção, ele se unirá à luta tanto na paz, como na guerra de resistência, estes são os fatores que não são favoráveis. E eis as nossas dificuldades: os americanos empenham-se em

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sabotar a paz na Indochina, os partidários da paz na França permanecem sob a influência ianque. A nova situação revela-se difícil e complexa. Exige que tomemos medidas distintas para regiões recentemente libertadas e aquelas livres há mais tempo, para nossa zona livre e para a que é reservada provisoriamente ao reagrupamento das forças inimigas. Anteriormente, tínhamos apenas tarefas rurais, agora é preciso ter uma política para as cidades. A respeito dos franceses, nossa política também não será a mesma do passado. Da mesma maneira, deve ser diferente conforme se trata de traidores pró-americanos e pró-franceses. No passado, nós não tínhamos senão a política interna e as relações diplomáticas com os países amigos; no presente, as nossas relações diplomáticas estendem-se a outros países... É necessário fazermos uma distinção entre o interesse imediato e interesse a longo prazo, entre o interesse local e o interesse geral. A situação, complexa e difícil, está em plena evolução. Disso resulta que se façam mudanças também no espírito da população e dos quadros. Na falta de uma preparação suficiente e de direção oportuna, pode-se dar origem à confusão do pensamento e na ação de alguns. Pode-se praticar os seguintes erros: desvio de esquerda – alguns embriagados pelas nossas vitórias sucessivas vão querer combater a todo custo, combater até o fim como um homem que vê a árvore, sem ver a floresta, verificam o recuo do inimigo sem prestar atenção à sua manobra, veem os franceses sem ver os americanos, apaixonam-se pela paixão militar, subestimando a diplomacia. Não compreendem que, paralelamente à luta armada, conduzimos a luta nas conferências internacionais, visando ao mesmo objetivo. Opõem-se às novas palavras de ordem que consideram como manifestações direitistas, como concessões irrefletidas. Impõem condições excessivas, inaceitáveis para o adversário. Querem precipitar tudo se não dão conta da luta pela paz que é dura e complexa; que, se excedermos ao esquerdismo, ficamos isolados, desligados do nosso povo e dos povos do mundo e assim acabaremos por fracassar. O desvio de direita traduz-se por um pessimismo negativo e por concessões sem princípios. Não tendo fé na força do povo, os direitistas enfraquecem seu espírito de luta. Eles perdem o hábito do sofrimento e já não aspiram senão a uma vida calma e fácil. Esquerdismo e direitismo são, ambos, erros. Serão igualmente explorados pelo inimigo, que se aproveitará deles, sendo ambos nocivos.

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Tarefas e trabalhos concretos A situação impõe três novas tarefas: 1) Conquistar e consolidar a paz, acabar de realizar a unidade nacional, assim como a independência em todo o país; 2) desenvolver as forças armadas do povo, edificar um exército popular poderoso que responda às exigências da nova situação; 3) continuar a realizar a palavra de ordem “a terra a quem a trabalha”; empenhar-se em reconstruir a produção e em preparar as condições para a construção nacional. Essas três tarefas exigem dez trabalhos: 1) realizar as unidades de ponto de vista em todo o partido, em todo o povo sobre a situação e as novas tarefas; 2) reforçar a direção da luta diplomática; 3) aumentar as forças do Exército Popular; 4) tomar a cargo e dirigir as regiões recentemente libertadas, particularmente nas cidades; 5) modificar a orientação da zona de trabalho e concentração das tropas inimigas; 6) continuar e consolidar a antiga zona livre; 7) impulsionar vigorosamente a mobilização das massas para a realização da reforma agrária; 8) reforçar o trabalho econômico e financeiro; preparar condições para a construção nacional; 9) contribuir para o movimento de libertação nacional dos povos do Camboja e do Laos; 10) prosseguir o trabalho de ratificação ideológica do Partido; reorganizar o Partido nas regiões recém-libertadas. O conjunto desses dez trabalhos será dirigido pelo Comitê Central. Cada localidade e cada ramo não terão que empreender todos esses dez trabalhos, mas apenas um número determinado deles. De todos eles, a direção ideológica é mais importante. Compreender a situação e as novas tarefas é a condição para que, no Partido e fora dele, se alcance a unidade de pontos de vista e a unidade de ação. As nossas tarefas e os nossos trabalhos, por mais pesados, difíceis e complexos que sejam, serão coroados de êxito se a unidade de pontos de vista e a unidade de ações se realizem da base ao topo da hierarquia, dentro e fora do Partido. Neste momento, o imperialismo americano, inimigo dos povos de todo o mundo, tornou-se inimigo principal e direto dos povos da Indochina; é por isso que todas as nossas ações devem ter em vista combatê-lo. Todas as pessoas, todos os países que não sejam pró-americanos, poderão, ainda que provisoriamente, formar uma frente única conosco. Os nossos objetivos imutáveis continuam a ser a paz, a independência, a unidade e a democracia. Permaneceremos firmes em nossos princípios, mas nossa tática será flexível. Os diferentes trabalhos devem se reordenar para estarem ligados uns aos ou-

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tros, a parte deve integrar-se no todo. Cada trabalho deve corresponder exatamente a uma localidade, a um momento e a uma situação determinada. Com a justa direção do Partido e do governo, a união e esforço de todos os quadros e do povo, e a aprovação dos povos amigos e dos povos do mundo amantes da paz, realizaremos com sucesso as três tarefas e os três trabalhos que acabo de indicar. Fonte: Ho Chi MInh, Selected Works, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Discurso de encerramento do Congresso da Frente Única Nacional O Congresso da Frente Única Nacional do Vietnã realizou-se em Hanói, de 5 a 10 de setembro de 1955. Fundou-se a Frente da Pátria do Vietnã e adotou seu programa e seus Estatutos. A criação da Frente da Pátria alargou e consolidou a União Nacional

Senhores membros do Presidium, Senhores delegados. Depois destes dias de trabalho intenso e de apaixonadas discussões, o Congresso adotou por unanimidade o novo Programa da Frente. Isto é um sucesso. Podemos afirmar que temos um programa de ampla união, cujo objetivo é lutar pela paz, pela unificação, pela independência e pela democracia em todo o país. Aos olhos de todos, o Programa da Frente apresenta-se bastante realista, muito sólido e muito amplo. É realista porque responde perfeitamente às aspirações profundas dos nossos compatriotas do Norte ao Sul. À exceção de um punhado de pessoas que se venderam aos imperialistas estadunidenses, todos os vietnamitas desejam a reunificação nacional e a reunificação pela via pacífica. Desta forma, este programa obterá acolhimento e apoio calorosos da imensa maioria da população se os membros da Frente se esforçarem por fazer compreender aos nossos compatriotas por meio de propaganda e de esclarecimentos. Este programa é amplo porque a Frente está pronta a acolher em seu seio todos aqueles que aprovem sinceramente a reunificação nacional e se oponham às manobras separatistas dos americanos e de Ngo Dinh Diem. A Frente está pronta a unir-se a todos aqueles que amam o seu país, sem distinção de tendência política e de crença religiosa etc. Englobará, pois, todas as pessoas dispostas a servir à pátria, qualquer que seja sua antiga vinculação política. Este programa é sólido porque se apoia nos operários e camponeses, que constituem a imensa maioria da população, ocupando-se de todas as outras camadas sociais. A Frente é apoiada no país pela grande maioria da população. No mundo, terá o apoio dos povos amantes da paz. Ela terá, sem dúvida, um belo futuro pelo caráter realista, amplo e sólido do seu programa. Agora comunico-vos algumas reflexões: – A frente elaborou um programa justo. Isto é muito bom para a luta no futuro. Mas não é senão um primeiro passo na via que conduz à vitória. 183


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Nós devemos lutar pela realização deste programa. A nossa luta será complexa e dura. Esta exige muita tenacidade e determinação. Nós devemos, antes de tudo e urgentemente, fazer compreender a todos este programa; é preciso uma vasta propaganda de Norte a Sul, para explicá-lo convenientemente e levar as pessoas a apreenderem seu espírito e seu conteúdo, a fim de que possam apoiá-lo logo em seguida com firmeza. – O Norte constitui, por assim dizer, a base, a origem das forças de luta do nosso povo. Uma casa só se mantém de pé se os seus alicerces forem sólidos. Uma árvore só cresce bem se as suas raízes forem vigorosas. Devemos fazer tudo para consolidar o Norte em todos os domínios, reforçá-lo e fazê-lo progredir constantemente. Nem se põe a questão de minimizar a importância desta tarefa. É tornando o Norte sólido e forte, intensificando seus progressos que nós asseguraremos efetivamente os interesses do Sul. — Alguns perguntam: a Frente tem, certamente, um bom programa, mas se os americanos e Ngo Dinh Diem opuserem a sua inércia? Nós respondemos: O rochedo é, por natureza, inerte. Mas, por maior e mais pesado que seja, rolará se o povo conjugar as suas forças para o arrastar. Nós unimos nossos corações e nossas energias, decididos a consolidar o Norte, a realizar o programa da Frente da Pátria; e isto constitui uma alavanca extraordinariamente poderosa. Diem e seus patrões estadunidenses quererão opor-lhe a sua inércia, mas não o conseguirão. Eles não querem “rolar”, mas serão forçados a fazê-lo. É por isso que não é preciso perguntar “e se os estadunidenses e Ngo Dinh Diem opuserem a sua inércia?”. Cada um de nós deve perguntar antes: “Que esforço fiz, e em que medida, para cumprir a minha tarefa?”. Sob o impulso dos nossos esforços para consolidar o Norte e realizar o Programa da Frente, e sob a pressão dos povos amantes da paz no mundo, os americanos e Ngo Dinh Diem “rolarão” sem falta. Senhores delegados, A história dos últimos anos mostrou que a força da unidade do nosso povo é invencível, e que a Frente Única Nacional alcançou frequentes sucessos. A Frente Viet Minh ajudou o triunfo da Revolução de Agosto. A Frente Viet Minh-Lien contribuiu para a vitória da resistência. Podemos ter a certeza de que graças aos esforços de todos e ao apoio do povo inteiro, a Frente da Pátria cumprirá sua gloriosa tarefa: ajudar a edificar um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero. Peço-vos o favor de transmitirem as saudações afetuosas do Governo e as

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minhas próprias saudações a todos os nossos compatriotas em todo o país, e particularmente aos do Sul que conduzem atualmente uma luta heroica. Fonte: Ho Chi Minh Selected Works, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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O Leninismo e a libertação dos povos oprimidos Este artigo foi publicado no jornal russo Pravda, em 18 de abril de 1955

Em 22 de abril de 1870, na velha Rússia despótica, nasceu o futuro dirigente e talentoso mestre das massas trabalhadoras e dos povos oprimidos de todo o mundo, Vladimir Ilitch Lênin. No final do século XIX e a princípios do século XX, o capitalismo alcançou o seu mais alto e último desenvolvimento do imperialismo e entrou na era da revolução proletária. O homem que continuou a grande obra de Marx e Engels nas novas condições históricas foi V. I. Lênin. Lutando sem trégua com os reformistas e todo tipo de desvirtuadores do marxismo, Lênin levou o socialismo científico a uma nova etapa. Enriqueceu o marxismo, a grande arma ideológica do proletariado, e contribuiu grandemente para formular a teoria da ditadura do proletariado. Desenvolveu o princípio marxista na aliança operário-camponesa, na questão nacional e colonial, no internacionalismo proletário, na construção e fortalecimento de um novo tipo de partido proletário que é a única organização capaz de dirigir a luta multiforme da classe operária e dos povos escravizados. Lênin estabeleceu uma nova teoria da revolução socialista e demonstrou as possibilidades do triunfo do socialismo num só país. Lênin ajudou os trabalhadores que sofriam com a opressão imperialista a realizarem, de uma forma mais compreensível, a lei do desenvolvimento social, os requisitos e as condições objetivas da luta política em cada etapa da revolução proletária e em todo movimento de libertação. Permitiu às massas oprimidas que se inteirassem dos intrincados e complexos desenvolvimentos do nosso tempo, deu-lhes uma arma milagrosa para lutar por sua emancipação: a teoria e táticas do bolchevismo. O Partido Comunista russo, fundado por Lênin, deu um esplendoroso exemplo aos povos do mundo. Sob a direção esclarecida do grande Lênin, o talentoso estrategista e tático, o Partido Comunista levou o proletariado russo à tomada do poder e estabeleceu o primeiro Estado das massas trabalhadoras; a fundação deste Estado levou a história da humanidade a uma nova era. Para os povos amantes da paz e da democracia, a União Soviética é um baluarte inabalável da independência e da liberdade. Depois da Segunda

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Guerra Mundial, o todo poderoso campo de paz, democracia e socialismo, dirigido pela União Soviética, tomou forma em oposição ao imperialismo. A popularidade e a doutrina de Lênin estão estreitamente ligadas a todos os êxitos do campo da paz e da democracia, que se estende do rio Elba ao Oceano Pacífico, e do polo Ártico aos Trópicos. Por isso, todos os povos oprimidos e miseráveis olham o estandarte de Lênin, que os comunistas de todos os países do mundo sustentam bem alto como um símbolo de fé e um facho de esperança. A heroica luta sustentada pelo povo soviético para construir o comunismo dá agora ânimo a todos os povos e mostra-lhes o caminho para obter um modo de vida digno do homem. A consistente política pacífica do governo soviético, claramente formulada no decreto assinado por Lênin, e promulgada imediatamente depois do triunfo da revolução socialista, estimula agora as amplas massas a lutarem para defender e fortalecer a paz contra os traficantes da guerra dirigidos pelos imperialistas dos Estados Unidos. Os princípios estabelecidos por Lênin sobre os direitos dos povos à autodeterminação, à coexistência pacífica, à não intervenção nos assuntos internos doutros países — a igualdade e as relações benéficas para as partes interessadas, princípios que são a base da política estrangeira da União Soviética — assinalam agora aos povos dos países coloniais independentes o caminho da luta para a reunificação nacional e a independência. Para os povos da Ásia, assim como para os povos de todo o mundo que lutam pela paz, a independência, pela democracia e pelo socialismo, o leninismo é como o sol que traz consigo uma vida alegre. Lênin atribuía sempre uma grande importância ao movimento de libertação nacional sustentado pelos povos da Ásia e considerava-o parte da luta empreendida pelas massas trabalhadoras de todo o mundo contra os opressores imperialistas. Lênin assinalou que o acordar da Ásia e a primeira luta mantida pelo proletariado avançado na Europa para a tomada do poder marcava uma nova era na história do mundo, uma era que começou com o século XX. Em 1913, V. I. Lênin escreveu: “Toda a Europa assume o papel preponderante, toda a burguesia da Europa está em embate com todas as forças reacionárias e medievais na China. Mas toda a parte jovem da Ásia – quer dizer, centenas de milhões de massas trabalhadoras na Ásia – tem como

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firme aliado o proletariado de todos os países civilizados. Não existe força no mundo capaz de impedir a vitória do proletariado na libertação dos povos europeus e asiáticos”. Agora, em meados do século XX, a “jovem Ásia”, à qual se referia Lênin, é precisamente a República Popular da China, a República Popular da Mongólia, a República Democrática Popular da Coreia e a República Democrática do Vietnã. Noutras regiões da Ásia, jovens forças similares levantam-se para lutar pela libertação nacional. Estas previsões científicas do grande estrategista revolucionário verificaram-se tão rapidamente que o campo imperialista ficou ansioso e temeroso. Se os povos escravizados da Ásia, sob a direção dos partidos marxista-leninistas, conseguiram êxitos práticos, é porque seguiram os ensinamentos de Lênin. No seu chamado aos revolucionários de Oriente, Lênin escreveu: “Tendes ante vós uma tarefa desconhecida para os comunistas do mundo: apoiados na teoria e na prática comum do comunismo e aplicando-as a condições específicas que não existem na Europa, deveis saber como empregá-las nas condições específicas onde o campesinato é a massa básica e a tarefa não é a luta contra o capitalismo, mas contra os vestígios medievais”. Trata-se de um ensinamento muito valioso para um país como o nosso, no qual 90% da população vive da agricultura e onde ainda existe uma grande quantidade de vestígios do feudalismo decadente e do mandarinato. Sob a direção do glorioso Partido Comunista chinês e do camarada Mao Tsé-tung, o seu dirigente esclarecido, a vitória da grande Revolução na China foi o triunfo do pensamento leninista. É precisamente por esta razão que o camarada Mao Tsé-tung disse que o cânone da Revolução de Outubro levara o marxismo-leninismo à China e libertara de uma vez por todas 600 milhões de pessoas das garras do imperialismo. Aplicando o leninismo ao internacionalismo, a União Soviética, onde triunfou o socialismo, deu constantemente uma grande assistência moral ao movimento de libertação nacional nos países coloniais e dependentes. Em particular com a sua política consistente de paz e devido ao seu grande prestígio no mundo, a União Soviética ajudou enormemente os povos da Coreia e o Vietnã na defesa das suas pátrias contra o perigo forjado pelos

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imperialistas dos Estados Unidos e os seus aliados. As atividades diplomáticas da União Soviética foram um fator decisivo para levar ao fim as guerras na Coreia e no Vietnã. O povo vietnamita, educado no espírito do internacionalismo proletário, aprecia altamente o apoio moral dos povos de todo o mundo, incluindo o dos trabalhadores franceses que lutaram para dar fim à guerra na Indochina. Lênin legou-nos, como a todos os partidos comunistas-operários, o fantástico tesouro da sua ideologia: os princípios organizativos, a teoria e a tática de um partido revolucionário. O leninismo é uma poderosa força ideológica que guia o nosso partido e torna possível que este seja a mais alta organização das massas trabalhadoras e a personificação da inteligência, da dignidade e da consciência do nosso povo. Sob a bandeira do leninismo, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã ganhou a confiança do nosso povo e é considerado como o seu partido de vanguarda. O nosso partido soube utilizar as capacidades e a iniciativa criadora do nosso povo, que nunca se resignou a suportar a escravidão e o colonialismo. Lênin personificou a unidade de consciência dentro do partido, a solidariedade das suas fileiras, o respeito à disciplina revolucionária, a fé inquebrantável na grande causa do comunismo e a firme confiança na vitória final. Tudo isto é agora um estímulo para o Partido dos Trabalhadores do Vietnã, que aplicou dia após dia e hora após hora o princípio da crítica e da autocrítica, e o considerou como o método milagroso para corrigir os erros e fraquezas e para lutar contra as manifestações do subjetivismo e da complacência. O nosso partido não tem outros interesses que não sejam os do nosso povo e da nossa pátria. Por isso dá uma grande importância a elevar o nível do seu trabalho. O nosso partido, enquanto faz o indescritível para cumprir com as suas tarefas, estuda constantemente o leninismo para melhorar a sua combatividade, o seu dinamismo político, a unidade na organização e no nível ideológico dos membros do Partido. O nosso povo e os membros do Partido foram forjados à luz da longa e dura luta para a salvação nacional e suportaram penalidades e sofrimentos indescritíveis. Por mais de oito anos, o nosso povo e o nosso partido mantiveram uma luta heroica que findou vitoriosamente a favor do povo vietnamita e do restabelecimento da paz na Indochina. Os acordos de Genebra demonstraram que a luta de libertação nacional mantida pelo povo vietnamita e pelos povos irmãos de Laos e Camboja e o seu alto sacrifício

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e heroísmo foram reconhecidos internacionalmente. O nosso partido pode orgulhar-se de ter sido, durante estes anos, afoito e perseverante e de ter levado o povo à luta com um grande espírito de sacrifício. Atualmente, ao mesmo tempo que se restaura a paz, seguimos lutando para a preparação correta dos acordos de Genebra. De acordo com números já confirmados, afirmamos recentemente que o grupo contrário violou os acordos 2.114 vezes, incluindo 46 vezes no sul do Vietnã. Eis uns números assombrosos: 806 mortos, 3.801 feridos e 12.741 pessoas detidas sem motivo. Em setembro do passado ano, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã tomou muitas resoluções sobre a ação do nosso povo, com o propósito de preparar de modo particular os acordos de Genebra e opor-se a todas as manobras de sabotagem. As nossas principais tarefas são: consolidar a paz, completar a reforma agrária, trabalhar com todos os nossos esforços para melhorar o nível econômico, estabilizar o nosso nível de vida em todos os aspectos no território ao norte do Paralelo 17 e continuar adiante na luta política sustentada por todo o povo. Lançamos as seguintes palavras de ordem para a nossa luta: consolidar a paz, conquistar a reunificação nacional, obter a independência total e estender a democracia a todo o país. Na atualidade estamos a lutar para levar a termo estas tarefas fundamentais. Ao mesmo tempo, não podemos ignorar que, depois das conferências celebradas pelos imperialistas em Manila e Bangkok, surgiu uma nova situação na Ásia. Na atualidade, os Estados Unidos intervêm abertamente nos assuntos da Indochina e levaram adiante muitas outras manobras para torpedear os acordos de Genebra. Para realizar a sua meta, os imperialistas e os seus lacaios de todos os tipos estão a fomentar o tenebroso plano de dividir permanentemente o nosso país, colocando o sul do Vietnã sob a sua influência, controlando todas as forças democráticas e sabotando as eleições gerais de 1956. Nestas condições, agora a nossa luta passa da etapa do armistício à da luta política, a fim de conquistar a reunificação nacional com as eleições em nível nacional planejadas para julho de 1956 e controlar o complô do inimigo que quer reanimar a guerra. A paz, a reunificação, a independência nacional e a democracia são problemas estreitamente ligados entre si. Se não se consolidar a paz, não haverá possibilidades de reunificar o Vietnã através das eleições gerais. Inversamente, se não houver reunificação nacional por meio das eleições gerais, não haverá possibilidade de estabelecer uma base firme para a paz.

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Os recentes desenvolvimentos e a avaliação da situação política permitem ao nosso partido ver claramente que a luta pela paz, a independência e pela democracia sustentada pelo povo vietnamita será dura, e que neste caminho o povo vietnamita achará muitas dificuldades. Porém, o nosso partido tem uma firme confiança na vitória final. Obtemos uma grande força da todo-poderosa doutrina leninista para cumprir a nossa tarefa sagrada de assegurar a paz, a reunificação, a independência e a democracia e de ganhar para o socialismo a vitória. Fonte: Biblioteca Marxista em Galego.

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Orientações dadas à Conferência sobre educação de massas Texto publicado pela primeira vez em julho de 1956

Em nome do Partido e do Governo, pergunto-lhes sobre sua saúde – quadros e lutadores da educação de massas – e parabenizo a educação de massas em suas conquistas durante os primeiros seis meses deste ano. Nos últimos seis meses, 2,1 milhões de pessoas assistiram às aulas. Isto é uma enorme conquista. Anteriormente, nos tempos de imperialismo e do feudalismo, cerca de 90% da nossa população eram analfabetos. Mais tarde, o falecido senhor Nguyen Van To e uma gama de progressistas trabalharam pela popularização da escrita nacional. Fizeram grandes esforços, mas apenas 5 mil pessoas por ano iam às aulas. Nos primeiros seis meses deste ano, havia cerca de dois milhões de alunos. É uma grande conquista, mas não devemos considerar como suficiente, deveríamos fazer maiores esforços e evitar a autopresunção e complacência. Após sete dias de discussões e troca de experiências, vocês agora provavelmente são mais experientes do que eu. Mas eu gostaria de contribuir com algumas de minhas experiências. 1) A fim de eliminar o analfabetismo entre as vastas massas, onde a esmagadora maioria são camponeses, o movimento de educação deve ser um movimento de massas. Devemos ficar junto às massas, debater com elas, aplicar formas e métodos que se apliquem na vida delas, e confiar nelas para promover o movimento. Anteriormente, uma gama de outros quadros e eu realizamos atividades revolucionárias clandestinas em Cao Bang. A maioria dos nossos compatriotas ali era Nung, Man e Tho(1), que sabiam pouco de vietnamita, viviam dispersos nas montanhas, longes umas das outras, e estavam ocupados com seus trabalhos; e tanto ensinar como estudar tinha que ser feito secretamente. Levamos a cabo a educação de massas em dificílimas condições, mas conseguimos. Os quadros elaboraram um plano, em consulta com nossos compatriotas, e estes últimos falaram o que fazer. Os letrados ensinavam os iletrados, aqueles que sabiam muito ensinavam aqueles que sabiam pouco. As aulas eram dadas nas cavernas; (1) Minorias nacionais.

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cada aldeia enviava uma pessoa para estudar por alguns dias e então este voltava e ensinava os outros da aldeia. Quando seu conhecimento se esgotava, voltava para as aulas e aprendia um pouco mais, enquanto ensinavam outros, professores também aprendiam eles mesmos. Foi assim o método que adotamos para o trabalho de educação de massas e para seu desenvolvimento em um movimento. Naquela época, apesar das restrições do inimigo e contínuas perseguições, nossos compatriotas eram muito estudiosos; mulheres e crianças sendo mais estudiosas que homens. Atualmente, em minhas visitas às aulas, eu também vejo que há mais mulheres e crianças do que homens. Muitos dos homens ainda não assistiram às aulas. Na época não havia salas ou escolas; as pessoas que iam trabalhar na terra ou recolher vegetais apontavam um lugar e iam para lá para ensinar alguém. Meninos montadores de búfalos se reuniam em um determinado lugar e aprendiam uns com os outros. Quadros que iam para os campos para trabalhar eram frequentemente interrompidos pelos moradores e pediam para os ouvirem recitar lições; se as lições fossem indevidamente lidas, os quadros os corrigiam; se tivessem sido bem aprendidas, os quadros seriam convidados a dar uma nova lição. Operários e camponeses têm muito trabalho a fazer. Se o método de ensinamento não se aplica a quem está aprendendo, a seu trabalho e modo de vida, se esperamos aulas com mesas e bancos, não podemos ser bem-sucedidos. A organização de como lecionar deve estar conforme as condições de vida dos estudantes, e assim o movimento irá durar e gerar bons resultados. Nossos compatriotas ainda são pobres e não podem pagar por papel e canetas, portanto, um pequeno livro de exercícios de bolso é suficiente para cada um. Exercícios de ler e escrever podem ser feitos em qualquer lugar, usando carvão vegetal, o chão ou folhas de bananeira como canetas e papel. Quadros clandestinos iam para lá para ensinar e fazer uma pessoa letrada a cada três meses. Naquele tempo, não havia nenhuma ajuda do governo, nenhum Ministério, ou departamento encarregado dos problemas educacionais. Mas, em condições tão precárias, o movimento continuava evoluindo e crescendo e, como petróleo jorrando, os letrados ensinando os iletrados. Tanto no aprender como no ensinar, a juventude é a força principal do movimento de educação de massas. Em todo lugar, devemos fazer com que a juventude compreenda esta tarefa. Tanto no ensinar como no estudar a juventude deve sempre estar na vanguarda.

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2) O trabalho de educação também é o trabalho de lecionar, mas não em escolas ou aulas com lâmpadas e livros, como geralmente acontece em escolas. É um movimento amplo, complexo e autossuficiente. As escolas em geral se dividem em primeiras, segundas, terceiras e quartas classes, mas, na educação de massas, há estudantes de todos os tipos, jovens, velhos, alguns sabem muito, outros sabem pouco, alguns assimilam bem rapidamente, outros lentamente; portanto, é uma tarefa dura que demanda muita paciência e esforços. O medo das dificuldades não é admissível na educação de massas. Algumas vezes, temos que ir e ensinar uma mãe de vários filhos na sua própria casa. Com os idosos que têm relutância para assistir às aulas, devemos pacientemente convencê-los a ir para as aulas, ou algumas vezes ensiná-los em suas casas. A fim de eliminar o analfabetismo entre o povo, a diligência é indispensável, o burocratismo e ordens pelo alto são impossíveis. O trabalho é inconveniente e difícil, e não dá nenhuma popularidade. Na guerra de Resistência, se conseguíssemos eliminar vários inimigos poderíamos nos tornar combatentes-modelo ou heróis; trabalhando nas fábricas, se fazemos muitas inovações ou ultrapassamos metas de produção, também nos tornamos trabalhadores destacados ou heróis operários. O trabalho de educação de massas, apesar de não nos dar fama, e nem ser um trabalho visível, é bem glorioso. Não devemos estar em um lugar e desejar estar em outro; não devemos nutrir a intenção errada de desistir do trabalho de educação de massas e entrar em uma escola técnica, ou dar aulas em uma escola tradicional ou ir para outra profissão. Na vida social, há muitas profissões, uma divisão do trabalho é, então, inevitável. Eu faço um trabalho, você faz outro. O trabalho de educação de massas é um trabalho importante, tendo grande responsabilidade na nação e na sociedade, e também na construção de nossa pátria. Ainda que não seja bem visto, famoso ou um trabalho espetacular que faz as pessoas serem vistas como heróis, é de fato um trabalho muito importante. Uma pessoa que hoje trabalha na educação de massas deve abster-se do desejo de praticar outra profissão. 3) O trabalho de educação de massas também se coloca sob liderança. Temos o Ministério, o Departamento, os serviços provinciais e zonais. Liderar não é sentar e escrever notas em uma mesa de escritório. Nos tempos de resistência, havia quadros que poderiam elaborar um bom programa de educação secundária, mas não eram capazes de assumir o comando

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de uma sala de educação de massas porque passavam todo seu tempo em escritórios. Os líderes devem se unir estreitamente com os quadros e ajudá-los a superar as dificuldades; burocratismo e ordens pelo alto devem ser evitados. Em qualquer trabalho, a conexão íntima com o povo é essencial, os trabalhadores da educação de massas em todos os níveis devem corrigir seus próprios erros, caso houver, e aprender das experiências de outros. 4) Anteriormente, pobres, operários e camponeses não podiam enviar seus filhos para a escola; apenas um pequeno número de crianças podia ir à escola, a maioria destas era de famílias prósperas que possuíam dinheiro suficiente para comida. No campo, apenas os filhos dos latifundiários e dos camponeses ricos iam à escola. Alguns quadros levantam o problema de que se os filhos dos latifundiários e camponeses ricos deveriam poder lecionar na educação de massas. Isto é colocar a questão de forma incorreta. Qualquer jovem, homem ou mulher, se recebe esta tarefa, é porque ele ou ela é bom ou boa; caso contrário, o trabalho não lhes seria entregue. Um jovem digno, que não aprova a exploração dos seus pais e não fica do lado deles para agir contra o povo, será aceito como professor ou professora em uma sala de educação de massas. Caso ele ou ela vir a cometer erros graves, o trabalho não lhes será dado, seja na educação de massa, seja em quaisquer outros trabalhos. Se um determinado jovem, cujos pais sejam latifundiários culpados, não seguir seus pais, ele ou ela não é culpado e pode manter os direitos de cidadão como qualquer outro jovem. Ele ou ela podem assistir às aulas ou tomar parte no trabalho público ou entrar em organizações populares. Este ponto deve ser bem compreendido e corretamente aplicado por vocês que vivem no campo. 5) O trabalho de educação de massas, ainda que aparentemente não seja heroico, pode ser de grande serviço para a nação, caso possa varrer o analfabetismo entre o povo em três anos. Nosso país estaria orgulhoso de ter eliminado rapidamente o analfabetismo. Nos países ditos civilizados, como Estados Unidos, Grã-Bretanha e França, ainda eA finsistem alguns analfabetos. Eliminar o analfabetismo em dois ou três anos é uma vitória espetacular. Devemos efetuar isto e ir avançando. Fazendo assim, não será um ou uma jovem que se tornará herói, mas todos os quadros e professores trabalhando por educação de massas serão heróis; e os heróis coletivos são os melhores.

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Caso o analfabetismo seja eliminado em três anos, serão postas novas tarefas para o Governo, para o Ministério da Educação e Ministério da Cultura; vocês também se depararão com novas tarefas. Não significa que, quando todos souberem como ler e escrever, vocês terão cumprido todas as suas tarefas e poderão descansar ou ir para outro trabalho. Pessoas iletradas devem aprender e se tornar letradas. Quando aprenderem a ler, devem avançar ainda mais em seus estudos. Pessoas letradas se tornarão novamente analfabetas caso não tenham materiais de leitura. O Governo e o Ministério da Educação possuem, portanto, a tarefa de providenciarem livros e jornais que sejam adequados para os padrões destes leitores. Vocês têm a tarefa de ajudar nossos compatriotas analfabetos a virarem letrados, para então avançarem nos estudos. Então vocês próprios deverão avançar em seus estudos para conseguirem lecionar a um nível superior. Nossa nação avança, quadros também devem avançar. Devem marchar na vanguarda a fim de assegurar o contínuo progresso da nação. Em conclusão, o Partido e o Governo premiarão as comunas que derrubarem o analfabetismo primeiro em um distrito; os distritos que chegarem ao mesmo em uma província; e as províncias que assim fizerem em todo o país. Caso queira ser recompensado, deve-se fazer esforços. Fazer esforços não significa a emissão de pedidos e convencer as pessoas a estudar, ou forçá-las a estudar para além das suas capacidades: você deve ser diligente, e fazer esforços de acordo com a linha de massas. Nossos compatriotas são muito dedicados aos estudos, já vivenciamos isso. Se nossos quadros se esforçarem para enriquecer suas experiências, partilhar suas visões, e discutirem as questões uns com os outros, o trabalho certamente será bem-sucedido. Distribuirei a vocês 15 emblemas como recompensas para aqueles quadros que tiverem obtido bons resultados. Ho Chi Minh Selected Works, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Consolidação e desenvolvimento da Unidade ideológica entre os partidos marxistas-leninistas Artigo publicado no jornal russo Pravda, órgão do Partido Comunista da União Soviética, em agosto de 1956

O 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética foi calorosamente recebido na República Democrática do Vietnã, como em todos os outros países, e considerado um evento histórico extremamente importante. As novas medidas tomadas após esse Congresso, nas políticas interna e externa da União Soviética, e o desenvolvimento da energia revolucionária das massas apontada pelo Congresso mostram que o significado do Congresso dos construtores do comunismo não pode ser totalmente avaliado. É inquestionável que o grande programa se traduziu nas metas do sexto plano quinquenal, o levantamento de todas as forças políticas, econômicas e sociais do país, como expostas no Congresso, a verificação do culto à personalidade e suas consequências, são sucessos brilhantes registrados pela União Soviética, Todos os importantes princípios teóricos estabelecidos pelo 20º Congresso do PCUS sobre a coexistência pacífica entre países com diferentes sistemas sociais, sobre a possibilidade de impedir a guerra na fase atual e sobre o caráter multiforme do período de transição para socialismo em vários países contribuíram para a consolidação das forças de paz, democracia e socialismo em todo o mundo. O Congresso também revelou novas possibilidades e abriu novas perspectivas ao movimento da classe trabalhadora pelo socialismo, e a todos os povos que estão defendendo sua independência nacional. A luta efetiva contra o culto à personalidade, aprovada por unanimidade pelo 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, exerce uma grande influência sobre todo o movimento comunista. A resolução de 30 de junho de 1956 do Comitê Central nos ajuda a entender mais profundamente a questão do culto à personalidade e a de superar suas consequências. Falando sobre as condições exigidas para a admissão de vários partidos na Internacional Comunista, V. I. Lênin apontou que: “Na fase atual, de

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uma feroz guerra interna, o Comitê Central só pode cumprir sua tarefa se estiver organizado nos locais mais centralizados. E se houver disciplina de ferro no interior do Partido, quase tão rigorosa quanto a disciplina militar, e se o órgão central do Partido for influente e gozar da estima geral de todos os seus membros”. Obviamente, Lênin mostrava que o estágio de guerra civil feroz e a restrição da democracia imposta ao povo soviético eram apenas provisórios e precisavam ser abolidos assim que o novo regime fosse consolidado. No entanto, nossos inimigos esperavam minar o campo socialista por dentro. Eles cometeram um grande erro ao pensar que suas esperanças poderiam se tornar realidade, confundindo o desenvolvimento da democracia socialista com um começo de desordem e perda total de espírito de organização e disciplina interna do Partido entre os partidos marxistas-leninistas. É claro que, uma vez vitorioso, o socialismo nunca pode tolerar o culto à personalidade e suas consequências prejudiciais. As medidas enérgicas adotadas pelo Comitê Central do PCUS para acabar com o culto à personalidade e suas consequências constituem um exemplo brilhante de ousadia política sem precedentes na história. A estrita implementação dessas medidas não enfraquece, mas consolida, a solidariedade ideológica entre os construtores do comunismo, centrada no núcleo principal, fiel a Lênin. O prestígio absoluto do Partido Comunista da União Soviética é cada vez mais aprimorado e consolidado. Partindo da posição de Lênin em relação à questão da crítica e autocrítica, o Comitê Central do PCUS declarou claramente que tinha mais preocupação com a necessidade de corrigir erros e educar o partido da classe trabalhadora e das massas do que com a questão do que diriam os reacionários. Lênin considerou isso o critério de um Partido correto e sério, que está claramente ciente de sua responsabilidade e compreende o fato de que os interesses futuros do movimento sempre devem estar diante de tudo. Essa política certamente aumenta agora, pois no futuro o prestígio do PCUS no campo socialista, bem como entre as massas trabalhadoras dos países capitalistas e países dependentes. Uma campanha tumultuada de calúnia – lançada por nossos inimigos, no Partido Comunista da União Soviética, por ter elaborado medidas para liquidar as consequências do culto à personalidade – prova que eles eram cegos politicamente. E a história confirmará isso em breve. O PCUS novamente demonstra que o aspecto mais importante da autocrítica é corrigir

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os erros de maneira prática e eficaz. A análise científica das condições geradoras de erros tem o efeito de impedir sua recorrência. Todos os partidos fraternos podem tirar lições valiosas dos documentos do 20º Congresso, o alto nível de desenvolvimento de um maior marxismo-leninismo. É indiscutível que as resoluções do 20º Congresso ajudarão os partidos irmãos a corrigirem seus erros e melhorarem seu trabalho. Na luta para construir um Vietnã pacífico, unificado, independente, democrático, próspero e forte, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã sempre compreendeu a identidade entre os interesses da luta pela libertação de todos os povos do jugo imperialista e os da luta pela libertação das massas trabalhadoras da exploração do capitalismo. Portanto, ele foi capaz de estabelecer as bases para uma sólida amizade entre o povo vietnamita e outros povos, como os cambojanos, laocianos e franceses. Em um sentido mais amplo, na luta pela reunificação nacional, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã nunca se isolou dos partidos fraternos; em toda a sua prática, provou que o patriotismo genuíno nunca pode ser separado do internacionalismo proletário. Enquanto os imperialistas aumentaram sua organização e criaram blocos agressivos internacionais como a Organização do Tratado do Sudeste Asiático (SEATO), a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e o Pacto de Bagdá, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã nunca se afastou de sua política de cimentar as relações com os partidos irmãos. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã está ciente de que a reação internacional vem desencadeando grandes esquemas, especialmente no Vietnã do Sul e em toda a “área do Pacífico” (Taiwan, Coreia do Sul). Também está ciente de que, através dessas tramas, a reação internacional orienta suas forças contra o movimento de libertação nacional, a classe trabalhadora e camponesa na Ásia. E, ao realizar esses esquemas, o imperialismo busca todos os meios para enfraquecer a unidade ideológica e a solidariedade fraterna entre os partidos marxistas-leninistas da classe trabalhadora em vários países. Na atual conjuntura internacional, características e condições nacionais peculiares a cada país se tornam um fator cada vez mais importante na elaboração das políticas de todo partido comunista e operário. Ao mesmo tempo, o marxismo-leninismo permanece a base inabalável da luta comum de todos os partidos. A troca de experiências nessa luta mantém todo o seu significado, e as questões que surgem para esse ou aquele partido não são de

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forma alguma a “própria preocupação” desse ou daquele partido, mas têm uma conexão vital com o proletariado internacional como um todo. Por exemplo, nós, vietnamitas, não apenas temos que definir nossos próprios métodos e medidas na luta contra os esquemas dos imperialistas dos EUA e da administração do sul do Vietnã para perpetuar a divisão de nosso país e na nossa luta para avançar gradualmente para o socialismo – isso é óbvio – mas, nosso Partido também entende claramente que nossas atividades agora e no período vindouro não podem ser confinadas dentro do mero limite nacional, pois elas estão conectadas por milhares de laços com a luta geral travada pelo mundo progressista. E entende ainda que uma solidariedade genuína demonstrada pelo campo socialista e pelos povos amantes da paz em todo o mundo é tão necessária para nós quanto antes, durante a guerra de resistência do povo vietnamita à salvação nacional. A 9ª Sessão Plenária do Comitê Central do nosso Partido, realizada de 19 a 24 de abril de 1956, fez um estudo aprofundado dos documentos do 20º Congresso do PCUS. Participaram do trabalho da Sessão membros do Comitê Central, secretários dos comitês de zonas, províncias e cidades importantes do Partido e vários quadros responsáveis nos órgãos centrais. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã registrou grandes resultados na aplicação criativa do marxismo-leninismo à realidade vietnamita. Nosso povo obteve grandes vitórias durante e após a guerra, na consolidação do Norte completamente libertado e nas esferas política, econômica e social. Além disso, o Partido poderia unir na Frente da Pátria do Vietnã todos os patriotas que lutavam pela independência e a reunificação nacional por meios pacíficos. As resoluções da 9ª Sessão Plenária do Comitê Central do Partido dos Trabalhadores do Vietnã também enfatizaram a grande importância dos princípios da liderança coletiva na construção e consolidação do Partido, cuja importância foi enfatizada no 20º Congresso da PCUS. Em geral, nosso Partido seguiu o princípio da liderança coletiva. No entanto, um estudo aprofundado destacou muitas deficiências. Devemos admitir que o culto à personalidade também existiu até certo ponto no Vietnã, dentro e fora do Partido. Embora não tenha levado a erros graves, limitou a iniciativa e o espírito de luta dos elementos ativos e das pessoas. Encontramos manifestações do culto à personalidade tanto nos principais órgãos centrais quanto nos locais. Para superar essas deficiências, decidimos melhorar o trabalho ideológico no Partido e entre o povo.

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Em uma Sessão recente, o Conselho de Ministros destacou as grandes conquistas obtidas na realização da reforma agrária e na reabilitação econômica, na elevação do padrão de vida das pessoas e na consolidação política do Estado democrático de nosso povo. O Congresso também apontou muitas falhas e muitos erros na implementação da política de aliança contra a influência feudal no campo, nos métodos de luta contra o inimigo da classe trabalhadora, na implementação da política financeira e no reajuste da organização. Na imprensa e nas reuniões do Partido, constantemente apelamos a todos os membros do Partido para que fortaleçam seus laços com as massas e levem em conta a situação no Sul, enquanto desenvolvem e executam as políticas do Partido. Nossa luta ainda não acabou. Ainda temos que superar muitas dificuldades, especialmente as decorrentes da divisão do nosso país e da execução incorreta de políticas corretas. Estamos firmemente convencidos de que essas dificuldades podem ser superadas e que seremos vitoriosos, porque nosso Partido goza da confiança do povo, do apoio dos países socialistas e da simpatia das forças progressistas em todo o mundo. Criticando severamente os erros de Stálin e iniciando uma luta resoluta contra o culto à personalidade, o 20º Congresso do PCUS nos deu um exemplo brilhante de ousadia política e profunda confiança no povo. O Partido dos Trabalhadores do Vietnã considera o criticismo do culto à personalidade como uma prova eloquente de força e uma grande vitória do PCUS e do movimento revolucionário mundial. Nosso inimigo tentou fazer uso das críticas ao culto à personalidade para atenuar a influência das grandes realizações registradas pela União Soviética e manchar o movimento revolucionário que incessantemente vem conquistando mais vitórias. Eles tentam semear confusão entre os partidos comunistas e operários e dividir as fileiras do povo trabalhador. Mas seus esforços serão reduzidos a nada. Como outros partidos irmãos, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã está claramente ciente de que a luta do PCUS e sua ajuda fraterna têm um significado muito grande para a libertação de todos os povos. Todas as manobras do inimigo do comunismo para prejudicar a União Soviética e seu Partido Comunista certamente fracassarão. Estamos claramente conscientes de que os protestos de nosso inimigo comum apenas traem seu medo diante de novas forças e novas vitórias. Diante dos esquemas cada vez mais perversos da influência reacioná-

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ria imperialista, agora mais do que nunca devemos fortalecer e desenvolver a unidade ideológica, a solidariedade entre os partidos comunistas e operários e lutar incansavelmente para defender a pureza do marxismo-leninismo, que é nosso tesouro: Estudar e aplicar corretamente os princípios teóricos do marxismo-leninismo às realidades de cada país. Estamos confiantes de que, sob a bandeira do marxismo-leninismo, a vitória certamente será nossa. Ho Chi Minh Internet Archive (marxists.org)

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Sobre a moral revolucionária Artigo publicado no livro Ho Chi Minh, Écrits (1920-1969), em 1958

Desde o começo de sua existência, a humanidade foi obrigada a lutar contra a natureza para subsistir: lutar contra as feras, contra as intempéries. Para vencer nessa luta, cada homem deve apoiar-se na força do número, ou seja, na força da coletividade, da sociedade. Reduzido unicamente a suas forças, o indivíduo não poderia dominar a natureza, nem mesmo sobreviver. A humanidade deve ainda produzir para ter o necessário para alimentar-se e vestir-se. Mas a produção também deve apoiar-se na força da coletividade, da sociedade. O indivíduo sozinho não poderia produzir nada. Nossa época é uma época civilizada, revolucionária. Em todos os aspectos, devemos, com maior razão, apoiar-nos na coletividade, na sociedade. O indivíduo não poderia permanecer isolado, devendo integrar-se à coletividade, à sociedade. É nisso que o individualismo se opõe ao coletivismo. O coletivismo e o socialismo vencerão, enquanto o individualismo será infalivelmente aniquilado. O modo de produção e as forças produtivas se desenvolvem e transformam-se continuamente, provocando o desenvolvimento e mudanças no pensamento dos homens, nos regimes sociais etc. Todos sabemos que, desde os tempos antigos até nossos dias, a produção se fazia no começo com paus e com machados de pedra e que depois se desenvolveu, empregando a máquina, a eletricidade, a energia atômica. O regime social evoluiu também, passou do comunismo primitivo à escravatura, depois ao feudalismo e ao capitalismo, e hoje quase a metade da humanidade encaminha-se em direção ao socialismo, ao comunismo. Esta evolução e este progresso ninguém pode impedir. Com o aparecimento da propriedade privada, a sociedade dividiu-se em classes, classes exploradoras e classes exploradas, quando aparecem as contradições sociais e a luta de classes. Desde então, todos pertencem a uma ou a outra classe, ninguém está fora das classes. E cada um exprime a ideologia de sua própria classe. Na sociedade antiga, os feudalistas e os latifundiários, os capitalistas e os imperialistas oprimiam e exploravam sem piedade as outras camadas sociais,

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sobretudo os operários e os camponeses. Eles monopolizavam os bens públicos, produzidos pela sociedade, para levar uma vida ociosa e dourada. Mas falavam o tempo todo só de “moralidade”, de “liberdade”, de “democracia” etc. Cansados da opressão e da exploração, os operários, os camponeses e os outros trabalhadores levantaram-se para fazer a revolução a fim de se libertarem e de transformar a antiga sociedade, tão disforme, em uma sociedade nova, melhor, em que todos os trabalhadores conhecerão uma vida feliz, e da qual a exploração do homem pelo homem será banida. Para triunfar, a revolução deve ser dirigida pela classe operária, a classe mais avançada, mais consciente, mais decidida, mais disciplinada e mais solidamente organizada. E o partido proletário é o Estado-maior da classe operária. A revolução na União Soviética e nos outros países do campo socialista provou-o de maneira incontestável. Fazer a revolução para transformar a sociedade antiga em uma nova sociedade é uma obra gloriosa, mas é também tarefa pesada, uma luta extremamente complexa, longa e árdua. É preciso ser forte para poder levar grandes cargas e ir longe. Somente tendo a moralidade revolucionária como fundamento é que o revolucionário pode cumprir sua tarefa de maneira honrosa. Tendo nascido na sociedade antiga, cada um de nós conserva em si mais ou menos sequelas dessa sociedade do ponto de vista da ideologia, dos costumes etc. O aspecto mais negativo e mais perigoso é o individualismo. O individualismo é o antípoda da moral revolucionária. Por menos que reste ainda na pessoa, o individualismo espera a ocasião propícia para desenvolver-se e eclipsar a moral revolucionária, para impedir-nos a inteira devoção à luta pela causa revolucionária. O individualismo é uma coisa astuta e pérfida: atrai insidiosamente o homem para uma descida fatal. Sabemos que descer uma ladeira é mais fácil que subi-la novamente, por isso o individualismo é ainda mais perigoso. Para eliminar as sequelas da antiga sociedade, para forjarmos em nós uma virtude revolucionária, devemos estudar, aperfeiçoar-nos, remodelar-nos para progredir sem cessar. Se não nos esforçássemos por progredir, regrediríamos e ficaríamos atrasados. Ora, o homem demorado, o homem atrasado será rejeitado pela sociedade que progride. Não é só indo à escola ou assistindo aos cursos de formação que se pode estudar, aperfeiçoar-se, forjar-se e transformar-se. Em todas as atividades

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revolucionárias, poderemos e deveremos todos estudar e corrigir nós mesmos nossos erros. O trabalho revolucionário clandestino, a insurreição geral, a resistência contra os colonialistas franceses, e hoje a edificação do socialismo no Norte e a luta pela reunificação do país, são escolas muito boas onde podemos forjar nossa moral revolucionária. Aquele que possui a moral revolucionária não tem medo, não se deixa intimidar e não recua diante das dificuldades, das provações e dos fracassos. Pelo interesse comum do Partido, da revolução, da classe, do povo e da humanidade, ele não hesita em sacrificar todo e qualquer interesse pessoal. Se for preciso, sacrificará sua vida sem lamentar-se. Essa é a manifestação mais evidente, mais nobre, da moral revolucionária. Em nosso Partido, Tran Phu, Ngo Gia Tu, Le Hong Phong, Nguyen Van Cu, Hoang Van Thu, Nguyen Thi Minh Khai e numerosos outros camaradas, que se sacrificaram heroicamente pelo povo e pelo Partido, dão-nos exemplos brilhantes de virtude revolucionária, de abnegação total. Aquele que possui a virtude revolucionária permanece simples, modesto, pronto para aceitar novas provações, mesmo que as circunstâncias lhe sejam favoráveis ou que obtenha êxitos. “Preocupar-se com as tarefas antes dos outros, descansar depois dos outros”, preocupar-se por cumprir bem sua tarefa e não se mostrar ciumento dos direitos e privilégios concedidos aos outros, não cair no narcisismo, na burocracia, no orgulho, na depravação, tudo isso constitui uma outra demonstração da moral revolucionária. Em resumo, a moralidade revolucionária consiste em: - Lutar toda a vida pelo Partido e pela revolução. Esse é o ponto fundamental. - Trabalhar com todas as forças pelo Partido, manter firme a disciplina, aplicar corretamente sua linha e sua política. - Colocar o interesse do Partido e do povo trabalhador antes e acima do interesse pessoal. Servir o povo de todo coração e com todas as forças. Lutar com abnegação. No interesse do Partido e do povo, mostrar-se exemplar sob todos os pontos de vista. - Estudar com aplicação o marxismo-leninismo, servir-se constantemente da crítica e da autocrítica para elevar seu nível ideológico, melhorar seu trabalho e progredir junto com os camaradas. Cada revolucionário deve compreender profundamente que nosso Partido é a vanguarda, a organização mais sólida da classe operária, o dirigente da classe operária e do povo trabalhador. Atualmente, apesar de não

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ser ainda muito numerosa, nossa classe operária se desenvolve a cada dia mais. No futuro, as cooperativas estarão organizadas em toda parte, utilizando muitas máquinas no campo, e os camponeses se transformarão em operários. Aos poucos, os intelectuais farão trabalho manual, e a distinção entre operários e intelectuais se apagará progressivamente. A indústria de nosso país desenvolve-se constantemente. É por isso que os operários serão cada vez mais numerosos, e suas forças cada vez mais poderosas; o futuro da classe operária é grande e glorioso. Ela reconstrói o mundo ao mesmo tempo em que aprimora a si mesma. O revolucionário deve ter isto bem presente e manter-se firme nas posições da classe operária para lutar com todas as forças pelo socialismo e pelo comunismo, pela classe operária e por todo o povo trabalhador. A moral revolucionária é a fidelidade absoluta ao Partido e ao povo. O único interesse que nosso Partido tem de servir é o interesse da classe operária e do povo trabalhador; seu objetivo imediato é lutar pelo encaminhamento do Norte ao socialismo e pela reunificação da pátria. Sob a direção do Partido, nosso povo, lutando heroicamente, sacudiu o jugo dos colonialistas e libertou completamente o Norte do país. Essa é uma grande vitória, mas a revolução não está ainda completa, sendo o objetivo atual do Partido lutar pela reunificação do país, pela realização de um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero, de modo que não reste, no país todo, ninguém que seja submetido à exploração, e que o país inteiro construa uma sociedade nova onde todos terão uma vida de felicidade. Nossa indústria está ainda atrasada. Graças à ajuda desinteressada dos países irmãos, em primeiro lugar da União Soviética e da China Popular, estamos desenvolvendo nossa indústria. Para que esta empresa seja coroada de êxito, nossos operários devem rivalizar em ardor para produzir muito e rapidamente artigos de boa qualidade e baratos, observar rigorosamente a disciplina do trabalho, participar ativamente da gestão das empresas, lutar contra o desperdício e a prevaricação. Nossos quadros devem mostrar-se trabalhadores e moderados, dar provas de integridade e retidão e participar no trabalho dos operários. Nossos camponeses receberam as terras partilhadas e sua vida começa a melhorar. Mas seu modo de produção é ainda disperso e atrasado, seus rendimentos não aumentam bastante e a melhora de sua vida ainda é pouca. É preciso ampliarmos firmemente o movimento pela constituição de

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grupos de intercâmbio de trabalho e de cooperativas a fim de aumentar a produção. Nossos camponeses poderão, assim, libertar-se da miséria e conhecer uma vida melhor. Por isso, a moral revolucionária consiste em lutar com todas as forças para realizar o objetivo do Partido, em devotar-se inteiramente e sem nenhuma hesitação à causa da classe operária e do povo trabalhador. A maioria dos membros do Partido e da União da Juventude trabalhadora, a maioria de nossos quadros agem de acordo com esses princípios, mas existem outros que não o fazem. Estes acreditam equivocadamente que, já que não existe mais o colonialismo e os feudalistas no Norte, a revolução já teria conseguido seus objetivos. Daí, neles se manifesta o individualismo. Reclamam recompensas e repouso, pedem um trabalho conforme aos seus desejos e não querem aquele que lhes é confiado. Manobram para obter postos importantes, mas temem as responsabilidades. Aos poucos, seu espírito combativo e seu dinamismo decaem, a força de alma e as belas qualidades revolucionárias neles também se alteram; esquecem que o critério número um do revolucionário é lutar decididamente a vida toda pelo Partido e pela revolução. Devemos compreender que os êxitos obtidos são apenas os primeiros passos de um percurso de dez mil léguas. Devemos avançar, a revolução deve progredir ainda; senão retrocederemos e nossos êxitos não poderão consolidar-se e menos ainda multiplicar-se. A luta para chegar ao socialismo é longa e árdua. Ela exige revolucionários porque ainda existem inimigos da revolução. Estes últimos são de três tipos: O capitalismo e os imperialistas revelam-se inimigos muito perigosos. Os usos e costumes atrasados são também grandes inimigos, pois entravam dissimuladamente o progresso da revolução. Mas não podemos reprimi-los, é melhor corrigi-los com precaução e perseverança e durante muito tempo. A terceira categoria de inimigos é o individualismo, a mentalidade pequeno-burguesa que se esconde ainda no interior de cada um de nós. Este inimigo espera a oportunidade – de um fracasso ou de uma vitória – para levantar de novo a cabeça. Ele é aliado dos inimigos das outras duas categorias. A moral revolucionária consiste em lutar decididamente em todas as circunstâncias contra os inimigos quaisquer que sejam, consiste em estar

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sempre vigilante, em manter-se pronto para combater, em dar provas de ser indomável. Só sob estas condições, pode-se dominar o inimigo e cumprir a tarefa revolucionária. Graças à sua política justa e à sua direção unificada, nosso Partido está em condições de dirigir nossa classe operária e todo o nosso povo, encaminhando-os em direção ao socialismo. E sua direção é unificada graças à unidade de opinião e de ação de todos os seus membros. Sem a unanimidade de opinião e de ação, os membros seriam elementos discordantes, puxando para todos os lados. Não seria possível dirigir as massas nem fazer a revolução. As palavras e os atos dos membros do Partido repercutem na luta revolucionária, pois influenciam muito as massas. Por exemplo, a política atual de nosso Partido é organizar em todo lugar e de maneira sólida grupos de intercâmbio de trabalho e cooperativas, é realizar a cooperação agrícola. Mas há membros do Partido e da União da Juventude trabalhadora que não aderem a eles, ou aderem, mas não participam ativamente na sua edificação e consolidação. O individualismo levou esses camaradas a agirem de maneira libertária, a infringirem as prescrições e a disciplina do Partido. Queiram ou não, seus atos prejudicam o prestígio do Partido e colocam obstáculos à sua obra e aos progressos da revolução. As medidas políticas e as resoluções do Partido inspiram-se no interesse do povo. Por isso, a moralidade revolucionária consiste, para um membro do Partido, em agir decididamente de acordo com as medidas políticas e as resoluções do Partido, em dar bom exemplo às massas, quaisquer que sejam as dificuldades. Todos os membros do Partido devem elevar seu senso da responsabilidade diante do povo, diante do Partido, devem estar vigilantes contra o individualismo e combatê-lo decididamente. Nosso Partido representa o interesse da classe operária e de todo o povo trabalhador, e não apenas o interesse de um grupo ou de um indivíduo. Todos sabem disso. A classe operária luta não só por sua própria libertação, mas para libertar a humanidade inteira da opressão e da exploração. Por isso, o interesse da classe operária se identifica com o interesse do povo. O membro do Partido representa, em nome deste, o interesse da classe operária e do povo trabalhador. É por isso que o interesse do membro do Partido deve integrar-se ao interesse do Partido e da classe e não pode colocar-se fora dele. Os êxitos e o triunfo do Partido e da classe pertencem

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também ao militante. Separado do Partido e da classe, o indivíduo não pode fazer nada de bom, por mais talentoso que seja. A moralidade revolucionária, para um membro do Partido, consiste em colocar, em qualquer circunstância, o interesse do Partido acima de tudo. Quando o interesse do Partido está em contradição com o interesse pessoal, este último deve subordinar-se ao primeiro. Por não terem ainda eliminado em si mesmos o individualismo, alguns falam ainda de “seus méritos” com relação ao Partido. Querem que o Partido lhes “agradeça”. Reclamam um tratamento privilegiado, honrarias, postos importantes. Reclamam vantagens. Como suas exigências não são satisfeitas, zangam-se com o Partido, queixam-se dizendo que não têm futuro, que são “sacrificados”. Afastam-se aos poucos do Partido e chegam inclusive a sabotar sua política e sua disciplina. Muitos quadros e combatentes se sacrificaram heroicamente durante o período de luta clandestina e durante a resistência; os heróis do trabalho e os trabalhadores de elite empenham todas as forças para aumentar a produção; não reclamam postos importantes nem honrarias, não pedem agradecimentos ao Partido. Nosso Partido tem caráter de massa, conta com centenas de milhares de membros. Em razão das condições concretas de nosso país, a maioria dos membros provém da pequena-burguesia. Isto não tem nada de surpreendente. Forjados no crisol da revolução e da resistência, os membros do Partido em geral são bons, fiéis ao Partido e à revolução, ainda que, no começo, sob a influência da ideologia burguesa, faltasse firmeza à sua plataforma, clareza às suas concepções e correção à sua ideologia. Esses camaradas compreenderam bem que, quando cometem faltas, devem corrigi-las de bom grado e em tempo, que não devem deixá-las acumular-se e agravar-se. Praticam sinceramente a autocrítica e a crítica, o que lhes permite progredir com os outros camaradas. Isso coincide com a moralidade revolucionária. Se nosso Partido, mesmo perseguido pelo implacável terror dos colonialistas e enfrentando múltiplas dificuldades e perigos durante os anos de luta clandestina, tornou-se cada dia mais forte e, se levou a revolução e a resistência à vitória, é porque soube utilizar essa arma de aço: a crítica e a autocrítica. Mas um pequeno número de membros do Partido, prisioneiros de seu individualismo, tornaram-se altivos, demasiado orgulhosos de seus méritos e passaram a ter opinião boa demais de si mesmos. Criticam os outros, “mas

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não querem ser criticados, não praticam a autocrítica ou praticam-na sem sinceridade nem seriedade. Temem perder prestígio, desacreditar-se. Não dão atenção às opiniões das massas, fazem pouco caso dos quadros sem partido. Não compreendem que é muito difícil não cometer erros quando se milita. Não temamos em reconhecer nossos erros, o que devemos temer é não estarmos decididos a corrigi-los. Para isso é necessário prestar-se de bom grado à crítica das massas e praticar sinceramente a autocrítica. Rejeitar a autocrítica e abster-se da crítica conduzirá infalivelmente à degradação moral, ao retrocesso. E aquele que cair nisso será rejeitado pelas massas. É uma consequência inevitável do individualismo”. As forças da classe operária são imensas, ilimitadas. Mas, para estar certas da vitória, devem ser dirigidas pelo Partido. Quanto ao Partido, deve estar estreitamente ligado às massas, saber organizá-las e dirigi-las para fazer triunfar a revolução. A moralidade revolucionária consiste em unir-se às massas, em ter confiança nelas, em compreendê-las, em escutar atentamente suas opiniões. Por suas palavras e seus atos, os membros do Partido, da União da Juventude trabalhadora e os quadros ganham a confiança, a admiração e o afeto do povo, realizam a união estreita das massas em torno do Partido, organizam-nas, fazem a propaganda entre elas, mobilizam-nas para aplicar com entusiasmo a política e as resoluções do Partido. Foi assim que agimos no decorrer da revolução e da resistência. Mas, hoje, o individualismo persegue alguns de nossos camaradas. Pretendendo ser muito bons em tudo, afastam-se das massas, não desejam aprender com elas, querem só ser seus mestres. Opõem-se ao cumprimento do trabalho de organização, de propaganda e de educação dedicado às massas. Caem na burocracia e no autoritarismo. Resultado: as massas não têm confiança neles, não os admiram e os amam ainda menos. No final, eles não podem fazer nada de bom. O Norte de nosso país encaminha-se, aos poucos, em direção ao socialismo. Essa é uma exigência premente de dezenas de milhões de trabalhadores. É a obra coletiva das massas laboriosas sob a direção do Partido. O individualismo constitui um grande obstáculo para a edificação do socialismo. Por isso, a vitória do socialismo não pode ser dissociada do êxito obtido na luta contra o individualismo. Combater o individualismo não significa pisotear o interesse pessoal. Cada homem possui sua personalidade, seus pontos fortes, sua vida pri-

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vada e familiar. Os interesses pessoais que não estão em contradição com os da coletividade não são interesses ilegítimos. Mas é necessário dizer a si mesmo que só sob o regime socialista cada um tem a possibilidade de melhorar suas condições de vida, de desenvolver seus pontos fortes e sua personalidade. Nenhum regime social pode igualar-se ao socialismo e ao comunismo quanto ao respeito pelo homem e à atenção dada ao exame e à satisfação de seus legítimos interesses. Na sociedade dominada pelas classes exploradoras, só interesses pessoais de uma pequena minoria são satisfeitos, enquanto os das massas laboriosas são pisoteados. Ao contrário, sob os regimes socialista e comunista, o povo trabalhador é quem governa, cada homem é parte integrante da coletividade, desempenha um papel determinado e participa da edificação da sociedade. Isto porque o interesse pessoal se acha contido no interesse coletivo, do qual é parte integrante. O interesse pessoal de cada um só pode ser satisfeito quando o interesse coletivo estiver assegurado. O interesse pessoal está ligado ao interesse coletivo. Se o interesse pessoal está em contradição com o interesse coletivo, a moralidade revolucionária manda que o primeiro seja subordinado ao segundo. A revolução e o Partido estão em constante progresso. O revolucionário também deve progredir sem cessar. O movimento revolucionário arrasta milhões e milhões de pessoas. O trabalho revolucionário comporta mil aspectos difíceis e complexos. Para pesar os prós e os contras em todas as situações, para compreender todas as contradições existentes e resolver corretamente todos os problemas, devemos nos esforçar para estudar o marxismo-leninismo. Desta forma, podemos fortalecer nossa moral revolucionária, manter firme nossa plataforma, elevar nosso nível teórico e político e prosseguir no trabalho confiado pelo Partido. Estudar o marxismo-leninismo é procurar aprender a maneira de resolver cada problema da existência, a maneira de comportar-se em todas as situações, em relação aos outros e a si mesmo, é assimilar os princípios gerais do marxismo-leninismo para aplicá-los criativamente às realidades de nosso país. Estudamos para agir. Nossos estudos teóricos devem ocorrer lado a lado com as atividades práticas. Certos camaradas aprendem de cor livros inteiros que tratam de marxismo-leninismo. Pretendem saber esta doutrina melhor que ninguém. Mas, na prova da prática, ou mostram-se

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incapazes de criar ou ficam embaraçados. Suas palavras e seus atos se contradizem. Estudam livros de marxismo-leninismo, mas não conseguem adquirir o espírito marxista-leninista. Estudam para exibir seus conhecimentos e não para aplicá-los aos problemas da revolução. Isso também é individualismo. O individualismo gera centenas de doenças perigosas: burocracia, autoritarismo, fragmentação, subjetivismo, prevaricação, desperdício etc. O individualismo amarra suas vítimas, venda-lhes os olhos. Elas se deixam guiar por suas ambições e seus interesses pessoais e não pensam no bem-estar da classe operária e do povo. O individualismo é um inimigo cruel do socialismo. O revolucionário deve aniquilá-lo. A tarefa atual de todo o nosso Partido e de todo o nosso povo consiste em envidar os maiores esforços para aumentar a produção e economizar, visando edificar o Norte, encaminhá-lo ao socialismo e fazer dele uma base sólida para a reunificação do país. Essa é uma tarefa das mais gloriosas. Que todos os membros do Partido e da União da Juventude trabalhadora, que todos os quadros, do Partido e sem partido, estejam decididos a servir, durante toda a sua vida, ao Partido e ao povo. Aí está o grande valor moral do revolucionário: sua moral, seu espírito de partido, seu espírito de classe, garantias da vitória do Partido, da classe operária e do povo. A moralidade revolucionária não cai do céu. Ela desabrocha e se consolida no crisol de uma luta cotidiana e tenaz. É como uma pérola que brilha mais vivamente quanto mais é polida, ou como o ouro que se purifica ainda mais no longo contato com o fogo. Nada é mais glorioso nem dá tanta felicidade do que cultivar sua moral revolucionária para dar uma digna contribuição à edificação do socialismo e à libertação da humanidade! Desejo que todos os camaradas, membros do Partido e da União da Juventude, quadros do Partido e quadros sem partido, redobrem seus esforços e façam progressos. Ho Chi Minh, Selected Works, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Relatório sobre o projeto de revisão da Constituição Texto apresentado por Ho Chi Minh diante da Assembleia Nacional, em sua primeira legislatura, 11ª sessão, em 18 de dezembro de 1959

Senhores membros do Presidium, Senhores deputados, No decurso da sua 6ª sessão, a Assembleia Nacional decidiu a revisão da Constituição de 1946 e nomeou uma Comissão encarregada de preparar e de apresentar um projeto de revisão da Constituição. Essa tal redação é um trabalho de longa duração que exige preparação e estudo sérios. Esse primeiro projeto foi estabelecido e submetido, em julho de 1958, à discussão dos quadros dos escalões médios e superiores do exército, das organizações populares, dos serviços administrativos e do Partido. Este projeto foi tornado público para ser discutido por todo o povo, que deve contribuir com suas ideias. Esta ampla consulta durou quatro meses. Por outro lado, tanto no campo como nas cidades, nos serviços públicos, nas empresas, nas escolas e nas organizações populares, assistiu-se a um vasto movimento que levou todas as camadas do povo a estudar e a discutir este documento com ardor. Na imprensa, tiveram lugar debates apaixonantes e cheios de interesse. Além disso, a Comissão recebeu numerosas cartas onde particulares e coletividades, entre os quais os nossos caros compatriotas do Sul e vietnamitas residentes no estrangeiro, apresentaram as suas sugestões. As opiniões recolhidas foram seriamente estudadas e discutidas pela Comissão que, com base nos resultados obtidos, reviu mais uma vez o seu trabalho. Em nome da Comissão, tenho a honra de submeter ao vosso exame o novo projeto. I. O importante significado da Constituição revista A nossa pátria, o Vietnã, edificou-se no transcurso de milênios de trabalho persistente e de lutas heroicas do nosso povo. Em meados do século XIX, os imperialistas franceses iniciaram a conquista do nosso país. Os reis e mandarins feudais capitularam e entregaram o Vietnã ao agressor. Durante quase um século, imperialistas franceses entraram em coligação com a classe dos feudais para subjugar nosso 213


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país de um modo atroz. Desde os primeiros dias, nosso povo levantou-se contra o inimigo para reconquistar a independência nacional. Graças ao espírito de luta e de sacrifício, o movimento de libertação desenvolveu-se ininterruptamente. Contudo, ao fim de quase meio século, a dominação imperialista e feudal não estava ainda derrubada e nosso país continuava sob o jugo da escravidão. Foi então que a Revolução de Outubro rebentou e triunfou brilhantemente. A União Soviética foi fundada, o sistema colonial do imperialismo começou a desmoronar-se. A URSS trouxe aos povos oprimidos um modelo de relações de igualdade entre as nações. Os povos oprimidos compreenderam que o aniquilamento dos imperialistas e a conquista da independência total e da igualdade real entre as nações só são possíveis apoiando-se no movimento da revolução socialista e seguindo a via da classe operária. A Revolução de Outubro associou estreitamente a revolução socialista e a revolução de libertação nacional em uma mesma frente anti-imperialista. No Vietnã, desde o fim da Primeira Guerra Mundial, a burguesia nacional e a pequena burguesia foram incapazes de levar até ao fim o movimento de libertação nacional. À luz da Revolução de Outubro, a nossa classe operária traçou a via da Revolução Vietnamita. Em 1930, o Partido Comunista Indochinês – partido da classe operária – foi fundado; mostrou claramente que esta revolução devia passar por duas etapas: a revolução nacional democrática e a revolução socialista. Pela primeira vez, a Revolução Vietnamita foi dotada de um programa político de conjunto traçado pelo partido da classe operária. Desde então, sob a direção unificada da classe operária e do seu partido, desenvolveu-se de forma rápida e segura. Os sovietes do Nghe Na e do Ha Tinh, em 1930, assim como o movimento de ação democrática de 1936-1939, conduziram a Revolução Vietnamita a um grau de potência cada vez mais elevado e reforçaram cada vez mais as relações entre a classe operária e o seu partido, por um lado, e, por outro, os camponeses e as outras camadas populares do país. Em 1939, rebentou a Segunda Guerra Mundial. O imperialismo francês e o militarismo japonês acordaram entre si para dominar o nosso país. Sob a direção do Partido, o nosso povo sublevou-se heroicamente contra os imperialistas agressores. As insurreições de Bac Son e da Cochinchina foram os primeiros prenúncios de um vasto movimento revolucionário. Em 1941, o Partido fundou a Frente Viet Minh e propôs-se, como objetivo, “expulsar os franceses e os japoneses para reconquistar a independência

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total do país e fundar a república Democrática do Vietnã”. Em 1945, a URSS e as forças democráticas mundiais venceram os fascistas e puseram fim à Segunda Guerra Mundial. Aproveitando a ocasião favorável, o Partido dirigiu a Revolução de Agosto e a conduziu à vitória. A dominação imperialista e feudal foi aniquilada, e fundado o poder popular em todo o país. No dia 2 de setembro de 1945, a República Democrática foi instaurada e a independência do Vietnã solenemente proclamada perante o mundo inteiro. Após aproximadamente um século de escravidão, nosso país era libertado, nosso povo tinha reconquistado sua liberdade, uma página infinitamente gloriosa tinha-se aberto na história da nossa nação. No dia seguinte à vitória, nosso povo começou a edificação do país para consolidar e desenvolver as conquistas da revolução. No dia 6 de janeiro de 1946, por eleições gerais livres, ele elegeu a primeira Assembleia Nacional. No dia 9 de novembro, esta adotou a primeira Constituição. Esta sublinhou no seu preâmbulo: “A tarefa do nosso povo na etapa atual é salvaguardar a integridade territorial, conquistar a independência nacional completa e construir o país numa base democrática. A Constituição do Vietnã deve mencionar as conquistas gloriosas da revolução e fundar-se sobre o princípio da unidade nacional, garantir as liberdades democráticas, instituir um poder poderoso nas mãos do povo”. O regime consagrado pela Constituição de 1946 garantia a independência nacional e uma ampla democracia ao povo. Logo depois da sua fundação, sob a direção do Partido, o poder popular promulgou a legislação do trabalho, aplicou a redução das taxas de arrendamento e procedeu à confiscação das terras que pertenciam aos colonialistas franceses e aos traidores vietnamitas, para distribuí-las aos camponeses. O direito de eleição e de elegibilidade e o direito de participação na gestão do Estado foram garantidos ao povo, as liberdades democráticas foram aplicadas. Era o regime da nova democracia. Mas os imperialistas franceses desencadearam uma nova guerra de agressão com vistas a reconquistar o Vietnã. Estreitamente unido à volta do Partido e do governo, nosso povo conduziu uma longa e dura resistência, resolvido a aniquilar as manobras de submissão dos imperialistas e dos traidores a seu soldo. Em 1953, enquanto o nosso povo prosseguia a luta armada, a Assembleia Nacional adotou a lei sobre a reforma agrária que aplicava rigorosamente o princípio: “a terra a quem a trabalha”.

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A vitória de Dien Bien Phu e o sucesso da Conferência de Genebra puseram fim, de forma gloriosa, à resistência heroica conduzida pelo nosso povo. Todo o Norte foi completamente libertado. Pela primeira vez na história, uma nação oprimida repeliu vitoriosamente a agressão de uma potência imperialista, reconquistou a sua independência, distribuiu a terra aos camponeses, concedeu as liberdades verdadeiramente democráticas ao povo. Estas vitórias deveram-se ao patriotismo e à combatividade do nosso exército e do nosso povo, à coesão deste último no seio da Frente Única Nacional, ao fato de que o poder popular se apoiou na aliança dos operários e dos camponeses sob direção da classe operária e do seu partido, ao apoio dos países irmãos do campo socialista e das forças da paz e da democracia no mundo inteiro. O triunfo da Revolução de Agosto e da grande guerra de resistência prova que, apesar da sua fraqueza numérica, a Frente Nacional pôde vencer infalivelmente o imperialismo agressor, com a condição de realizar uma estreita união sob direção da classe operária assim como do seu partido e de seguir exatamente a linha marxista-leninista. Uma vez a resistência vitoriosa e a paz restabelecida, a Revolução Vietnamita passou a uma nova etapa. Sob o regime da democracia popular, o Vietnã do Norte, completamente libertado, empenhou-se na etapa de transição para o socialismo. Embora o Sul se encontre ainda sob a dominação dos imperialistas e dos feudais, nosso povo deve prosseguir a revolução democrática nacional nas novas condições do país. O Norte, uma vez libertado, fez progressos rápidos em todos os domínios. Em três anos, de 1955 a 1957, nós reconstruímos as ruínas da guerra e restauramos a economia. Em 1958, começamos a realização do plano trienal de desenvolvimento e de transformação da economia nacional seguindo a via socialista. No decurso do seu XIV Plenário, o Comitê Central do Partido considerou que “atualmente, as forças do socialismo no Norte são nitidamente superiores às do capitalismo”. Sob o ponto de vista econômico e cultural, fizemos grandes progressos: Na agricultura, a produção do paddy, que era de 3.600.000 toneladas em 1955, passou para 5.200.000 toneladas em 1959. No domínio industrial, temos, em 1959, 107 empresas de Estado contra 17 em 1955. As cooperativas de produção agrícola do grau inferior agrupam 43,9% da totalidade dos lares camponeses. A maioria dos lares ainda não cooperadores aderiram aos grupos de ajuda mútua.

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Cinquenta e três por cento dos artesãos fazem parte das organizações cooperativas. Sob o ponto de vista cultural, o analfabetismo está, no essencial, liquidado. O efetivo de alunos do ensino geral duplicou em relação a 1955. O das escolas profissionais do ensino médio sextuplicou, o número de estudantes das escolas superiores aumento sete vezes, e o de doutorados em medicina 80% etc. Progredimos rumo à economia socialista. Paralelamente aos sucessos que tenho vindo enumerar, operam-se modificações nas relações de classe. A classe dos proprietários de bens de raiz foi derrubada. A classe operária aumenta a cada dia e reforça sua direção face ao Estado. Os nossos camponeses estão empenhados na via da cooperação. A aliança dos operários e dos camponeses estreita-se a cada dia mais. Os intelectuais revolucionários dão a sua contribuição à edificação nacional. Os burgueses nacionais, em geral, aceitam a transformação socialista. As diversas camadas da população unem-se ainda mais no seio da Frente Nacional Única. Se se comparar a situação atual com a de 1946, no momento em que a primeira Constituição foi adotada, verificam-se grandes e excelentes modificações no Norte. Enquanto o Norte marcha rumo ao socialismo, os imperialistas estadunidenses e seus lacaios sabotam os Acordos de Genebra, no Sul, recusam a Conferência consultiva com vistas às eleições gerais para a reunificação do país. Eles praticam uma política de ditadura de uma crueldade extrema, pilham os bens da população, exercem sobre esta uma opressão e um terrorismo de uma selvageria inaudita. Eles manobram para perpetuar a divisão do nosso país e transformar o Sul em uma colônia e em uma base militar americanas com vistas a uma nova guerra na Indochina. Porém, com um heroísmo sem igual, nossos compatriotas do Sul mantiveram o movimento revolucionário e o intensificaram. Reclamam a melhoria das suas condições de vida, o desenvolvimento da economia nacional, as liberdades democráticas, a paz e a reunificação. Eles lutam contra a opressão, a exploração, a “ajuda americana”, o terrorismo, os massacres, a intensificação do potencial militar e a preparação para a guerra. A marcha do Norte rumo ao socialismo impulsiona vigorosamente o movimento patriótico do Sul. Nossos compatriotas do Sul voltados sem cessar para o Norte, para o nosso governo, estão a cada dia mais confiantes na reunificação da pátria. Brevemente a Revolução Vietnamita passará a uma nova etapa.

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Apresentam-se novas tarefas. A conjuntura nacional e internacional atual nos é favorável. A Constituição de 1946, a primeira Constituição democrática do Vietnã, respondia efetivamente à situação e às tarefas revolucionárias dessa altura. Esta cumpriu sua missão. Mas já não corresponde à situação e aos imperativos da hora atual. É por isso que devemos revê-la. O presente projeto consagra os brilhantes sucessos conquistados por nosso povo no decorrer dos últimos anos e define nossas tarefas revolucionárias na nova etapa histórica. II. Os pontos essenciais do projeto de revisão da Constituição Vou agora apresentar-vos sucintamente os pontos essenciais do projeto de revisão da Constituição. 1. O caráter da República Democrática do Vietnã O caráter do Estado é a questão fundamenta da Constituição. É a questão do conteúdo de classe do poder do Estado. Este está nas mãos de quem e a quem serve? Esta é a questão que determina o conjunto do conteúdo da Constituição. O Estado vietnamita, fundado logo a seguir à Revolução de Agosto, é um Estado democrático popular sob direção da classe operária. O preâmbulo do presente projeto precisa: “o nosso Estado é um Estado de democracia popular, apoiando-se na aliança dos operários e dos camponeses, sob direção da classe operária”. A fim de edificar o socialismo e de conduzir a luta pela reunificação nacional, devemos reforçar incessantemente a direção da classe operária face ao Estado democrático popular. A aliança dos operários e dos camponeses constitui a base da República Democrática do Vietnã. Os nossos camponeses constituem, ao mesmo tempo, uma força produtiva e uma força revolucionária consideráveis. No decurso da revolução nacional democrática popular, eles seguiram o Partido com entusiasmo e ergueram-se lado a lado com a classe operária para derrubar o jugo imperialista e feudal. Agora, comprometem-se com ardor na via da cooperação agrícola. Isto é o fruto do seu dinamismo revolucionário e do paciente trabalho de educação conduzido de forma constante pelo Partido e pela classe operária. Também na edificação do socialismo, o nosso Estado dedica-se a ajudar os camponeses e a reforçar a aliança dos operários e dos camponeses.

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A classe operária uniu-se aos artesãos e aos pequenos comerciantes porque são trabalhadores e entram de bom grado na via da cooperação, aprovam e apoiam a revolução socialista. A revolução socialista está indissoluvelmente ligada ao impulso das ciências, da técnica e da cultura no seio do povo. Os nossos intelectuais contribuíram dignamente para a resistência. São auxiliados constantemente pelo Partido, que lhes permite fazer progressos. É por isto que eles aderem ao socialismo. A classe operária une-se estreitamente a estes para ajudá-los a servir a revolução, a servir ao socialismo. Sob a direção da classe operária, a burguesia nacional vietnamita apoiou a revolução nacional democrática popular depois de restabelecida a paz, deu sua contribuição para a restauração econômica. Hoje nós temos as condições necessárias para a transformar seguindo a via socialista. No Norte do país, as forças econômicas socialistas são claramente superiores às forças econômicas capitalistas. Nós temos o poder democrático popular, e o movimento de luta revolucionária das massas trabalhadoras intensifica-se cada vez mais. A burguesia nacional está pronta para aceitar a sua transformação para contribuir ativamente na construção nacional e na edificação do socialismo. O Vietnã é um Estado multinacional unido. Todas as nacionalidades que vivem em território vietnamita são iguais em direitos e deveres. Elas estão fraternalmente unidas em um mesmo território e, no transcurso de uma longa história, trabalharam e lutaram juntas para construírem nossa bela pátria. Os imperialistas e os feudais tentaram sabotar a união e a igualdade entre as nacionalidades, semearam ódio entre estas, aplicando a política de “dividir para reinar”. O nosso Partido e o nosso governo não pararam de conclamar as nacionalidades a liquidar todas as discórdias criadas pelos imperialistas e pelos feudais, e a unirem-se com base na igualdade em direitos e deveres. As minorias nacionais lutaram ao lado da nacionalidade majoritária contra o inimigo comum para conduzir à vitória a Revolução de Agosto e à resistência. Restabelecida a paz, o nosso Estado ajudou as nacionalidades irmãs a fazerem progressos nos domínios econômico, cultural e social. A zona autônoma de Viet Bac e do Nordeste foram fundadas. Estreitamente unidas sob direção do Partido e do Estado, as nacionalidades rivalizam com ardor para efetivar a edificação do país. A nossa política visa à realização da igualdade e da ajuda mútua entre as nacionalidades para permitir-lhes progredir conjuntamente para o so-

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cialismo. As regiões onde as nacionalidades pouco numerosas vivem em grupos compactos podem ser erigidas em zonas autônomas. 2. A linha geral para a marcha rumo ao socialismo Durante aproximadamente um século, o Vietnã foi uma colônia e um país semifeudal. A sua economia estava muito atrasada e dispersa, as suas forças produtivas estavam pouco desenvolvidas, o nível de vida material e cultural do povo era muito baixo. Para sair deste estado de pobreza, o Norte deve marchar em direção ao socialismo. O artigo 9 do projeto de revisão da Constituição definiu assim a linha geral para a marcha rumo ao socialismo: “a República Democrática do Vietnã elevar-se-á gradualmente do regime da democracia popular para o socialismo pelo desenvolvimento e transformação socialista da economia nacional que, de uma economia atrasada, passará a uma economia socialista dotada de uma indústria e de uma agricultura modernas, com uma ciência e uma técnica avançadas. O objetivo da política da República Democrática do Vietnã é o desenvolvimento ininterrupto da produção a fim de elevar constantemente o nível de vida material e cultural do povo”. Eis, atualmente, as principais formas de propriedade dos meios de produção no país: propriedade do Estado, quer dizer, de todo o povo; propriedade das cooperativas, isto é, propriedade coletiva dos trabalhadores; propriedade dos trabalhadores individuais; propriedade dos burgueses e pequeno-burgueses nacionais, englobando pequeno número de meios de produção. O nosso regime social visa à abolição das formas de propriedade não socialistas e a transformação da economia dispersa em uma economia homogênea assente na propriedade de todo o povo e na propriedade coletiva. Em conformidade com o artigo 12 do projeto, o setor do Estado da economia depende da propriedade de todo o povo, desempenha um papel dirigente na economia nacional e o Estado assegura-lhe um desenvolvimento prioritário. Segundo o artigo 13, o setor da economia cooperativa depende da propriedade coletiva dos trabalhadores; o Estado encoraja, guia e ajuda muito particularmente a cooperação agrícola ao sucesso. Nós devemos desenvolver o setor do Estado para fazer dele a base material do socialismo e impulsionar a transformação socialista. – A cooperação agrícola é o elo principal para acelerar a transformação socialista no Norte. A experiência prova que, entre nós, a cooperação agrí-

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cola deve passar pelos grupos de ajuda mútua e pelas cooperativas de produção agrícola. Isto é uma necessidade. O desenvolvimento a passos seguros dos grupos de ajuda mútua e das cooperativas conduzirá infalivelmente a cooperação agrícola ao sucesso. – Com respeito aos artesãos e a outros trabalhadores individuais, o Estado protege o seu direito de propriedade sobre os seus meios de produção, dirige-os e ajuda-os ativamente a aperfeiçoarem a sua forma de trabalho e encoraja-os a organizarem-se em cooperativas de produção segundo o princípio do livre consentimento. – Face aos burgueses comerciantes e industriais, o Estado não abole o seu direito da propriedade sobre os seus meios de produção e outros bens; ele empenha-se antes em orientar as suas atividades no sentido do interesse nacional e do bem-estar geral, combinando-os com o plano econômico do Estado. Ao mesmo tempo, ele os ajuda a se transformarem no sentido socialista pela criação de empresas mistas Estado-capital privado e por outras formas de transformação. Conforme o artigo 10, o Estado dirige as atividades econômicas segundo um plano unificado. Ele utiliza seus próprios organismos e apoia-se nas organizações sindicais, nas cooperativas e noutras organizações das massas trabalhadoras para estabelecer e realizar o plano econômico. Desde o restabelecimento da paz, no momento em que começávamos a restauração econômica, encaminhamos progressivamente a economia do Norte para a via do desenvolvimento planificado. Seguimos o programa trienal de restauração econômica (1955-1957). Agora realizamos um plano trienal para pormos em marcha o desenvolvimento da economia e da cultura, preparando as condições para o primeiro plano quinquenal. O atual plano trienal visa particularmente a acelerar a transformação socialista da economia individual dos camponeses, dos artesãos e de outros trabalhadores individuais, assim como da economia capitalista privada. Ao mesmo tempo, tem por objetivo o desenvolvimento e o reforço do setor da economia do Estado assim como o impulso cia economia no sentido socialista. 3. A organização do Estado: República Democrática do Vietnã Para cumprir devidamente suas tarefas revolucionárias, o Estado deve alargar os direitos democráticos e desenvolver as atividades políticas do povo para fazer desabrochar seu dinamismo e seu espírito criador, a fim de permitir a todos os cidadãos vietnamitas a participação efetiva na gestão

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do Estado e a inteira devoção à edificação do socialismo e à luta pela reunificação nacional. O nosso poder revolucionário foi instaurado há aproximadamente quinze anos. A Constituição de 1946 criou o “Parlamento Popular” e os “Conselhos Populares” nos diversos escalões. A Assembleia Nacional é o Conselho Popular de toda a nação. Nas localidades, existem conselhos populares locais. A Assembleia Nacional e os conselhos populares locais são compostos por membros eleitos pelo povo por sufrágio universal. A Assembleia Nacional decide sobre os assuntos mais importantes do Estado, e os conselhos populares sobre os das localidades. Durante a resistência, a Assembleia Nacional e o Governo uniram e guiaram o povo, permitindo-lhe conduzir a guerra patriótica e anti-imperialista a uma vitória brilhante. A Assembleia Nacional adotou a lei sobre a reforma agrária com vistas à conclusão da revolução antifeudal. Nas localidades, os conselhos populares conclamaram o povo a participar ativamente da revolução anti-imperialista e antifeudal. Restabelecida a paz, a Assembleia Nacional adotou o plano trienal de restauração econômica e o plano trienal para iniciar o desenvolvimento da economia e da cultura, assim como a política sobre o desenvolvimento e as transformações económicas seguindo a via socialista, as leis sobre as liberdades etc. Estas são algumas questões de alta importância para o interesse nacional e para a vida do povo. Conforme o artigo 4 do projeto de revisão da Constituição, todo o poder, na República Democrática do Vietnã, pertence ao povo, que o exerce por intermédio da Assembleia Nacional e dos Conselhos Populares dos diversos escalões, eleitos por este e responsáveis perante este. Nosso sistema eleitoral realiza a democracia e, ao mesmo tempo, a unidade nacional. Todos os cidadãos a partir dos 18 anos são eleitores e, a partir dos 21 anos, elegíveis. As eleições fazem-se por sufrágio universal, igual, direto e secreto. Os deputados à Assembleia Nacional e os delegados aos conselhos Populares podem ser revogados pelo povo quando já não mereçam a sua confiança. Isto é uma garantia do seu direito de controle em relação aos seus representantes. Está estipulado no artigo 6 que todos os órgãos do Estado se devem apoiar no povo, permanecer em estreita ligação com este, escutar suas opiniões e submeter-se ao seu controle. A Assembleia Nacional elege o Presidente da República, o Comitê Per-

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manente da Assembleia Nacional e o Conselho do Governo. Este último é o órgão encarregado da execução das leis e decisões da Assembleia Nacional e o órgão administrativo supremo do Estado. Ele é responsável perante a Assembleia Nacional e presta-lhe conta da sua atividade. Nos intervalos entre as sessões, ele é responsável perante o Comitê Permanente da Assembleia Nacional e presta-lhe contas da sua atividade. A Assembleia Nacional é o único órgão com poder legislativo. Esta decide sobre as questões mais importantes do Estado, no plano nacional. Os Conselhos Populares, nos mais diversos escalões, elegem os seus comitês administrativos. Estes, enquanto órgãos executivos dos Conselhos Populares, são responsáveis perante eles e prestam contas da sua atividade. Eles ficam simultaneamente sob a direção imediata dos comitês administrativos dos escalões superiores e sob a direção unificada do Conselho do Governo. Os assuntos locais mais importantes são submetidos à decisão dos Conselhos Populares. O nosso regime econômico e social visa à realização plena dos direitos democráticos do povo, com base no desenvolvimento constante da economia socialista, da abolição progressiva da exploração capitalista e do melhoramento gradual das condições de vida material e cultural da população. Daqui resulta que o povo goza de todas as condições necessárias para participar efetivamente na gestão do Estado. *** É precisado no artigo 4 do projeto de revisão da Constituição que o centralismo democrático é o princípio de organização do nosso Estado. A Assembleia Nacional, os Conselhos Populares, o governo central e os outros órgãos do Estado regem-se por este princípio. Sendo de caráter popular, nosso Estado desenvolve ao máximo a democracia. Só assim é possível mobilizar todas as torças do povo para promover a revolução. Ao mesmo tempo, é preciso praticar o centralismo ao máximo para unificar a direção face ao povo para edificar o socialismo. 4. Direitos e deveres fundamentais dos cidadãos O projeto de revisão da Constituição precisa os direitos e os deveres fundamentais dos cidadãos. Estas disposições mostram que o nosso regime é autenticamente democrático. Os capitalistas costumam vangloriar-se de que a sua Constituição ga-

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rante a liberdade individual, as liberdades democráticas, os direitos e os interesses de todos os cidadãos. Na realidade, somente a burguesia se beneficia dos direitos enunciados em sua Constituição. O povo trabalhador não goza efetivamente das liberdades democráticas; este é explorado durante toda a sua vida e precisa suportar pesados sofrimentos para servir a classe exploradora. Os capitalistas costumam caluniar-nos, pretendendo que o socialismo não respeita os direitos individuais dos cidadãos. Mas, com efeito, o nosso regime é o único que serve realmente aos interesses do povo, particularmente do povo trabalhador; garante seus direitos e desenvolve a democracia para permitir ao povo participar efetivamente na gestão do Estado. É por isto que nosso povo emprega todas as suas capacidades para cumprir seu dever de dono do país com vistas a edificar o socialismo e a fazer do nosso país um país forte, e do nosso povo um povo rico. No projeto é destacado: “os cidadãos da República do Vietnã usufruem do direito ao trabalho, ao descanso e à instrução, eles desfrutam da liberdade pessoal, da liberdade de opinião, de imprensa, de reunião, de associação, de manifestação, de crença, quer pratiquem uma religião, quer não pratiquem nenhuma, do direito de eleição e de elegibilidade etc.”. Todos os cidadãos são iguais perante a lei. A mulher é igual ao homem dos pontos de vista político, econômico, cultural, social e familiar. O Estado dedica-se particularmente à educação moral, intelectual e física da juventude. Em virtude do próprio caráter do nosso Estado e do nosso regime econômico e social, o Estado não consagra somente os direitos e os interesses dos cidadãos, também desenvolve as condições materiais necessárias que lhes permitam usufruí-las efetivamente. O Estado garante aos cidadãos as liberdades democráticas, mas, tal como é sublinhado no projeto de revisão da Constituição no seu artigo 38, proíbe-lhes rigorosamente de abusarem destas e atentarem contra os seus interesses e os do povo. Sob nosso regime, os interesses do Estado confundem-se com os da coletividade e do indivíduo. É por isto que, enquanto os cidadãos usufruem dos direitos que lhes são concedidos pelo Estado e pela coletividade, devem cumprir de bom grado os seus deveres para com estes. Eles têm, pois, de respeitar a Constituição, as leis, a disciplina do trabalho, a ordem pública, as regras da vida social e os bens públicos; devem

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pagar seus impostos em conformidade com a lei, cumprir suas obrigações militares e assegurar a defesa da Pátria. Só sob o regime socialista é que os direitos do indivíduo se confundem com os do Estado e os da coletividade. É por isto que só uma Constituição socialista pode suscitar nos cidadãos um ardor que lhes permita cumprir seus deveres para com a sociedade e a pátria. III. As opiniões que contribuíram para emendar o projeto de revisão da Constituição O projeto de revisão da Constituição, submetido por duas vezes ao exame das massas, suscitou discussões apaixonadas. A população usou com ardor seus direitos democráticos para participar na elaboração da Constituição. Os cidadãos das diversas localidades, dos diversos serviços, grupos populares, os conselhos populares, unidades do exército, os conselhos populares das províncias, muitos dos nossos compatriotas do Sul, ou residentes no estrangeiro, os órgãos da imprensa, deram numerosas opiniões. A Comissão de Revisão estudou-as cuidadosamente. Cabe-lhe, neste momento, enviar suas felicitações a todos os que deste modo deram sua contribuição para a preparação deste projeto. Eis, em breve resumo, as principais sugestões dos nossos compatriotas: 1. Adotando uma ideia proposta pela população, a Comissão de Revisão completou o projeto de preâmbulo para fazer realçar melhor as conquistas da revolução, a situação e as tarefas revolucionárias atuais, a lula heroica dos nossos compatriotas do Sul e a certeza da vitória da revolução socialista no Norte e da reunificação nacional. 2. O artigo 1° do projeto recebeu uma aprovação total e unânime, porque destaca, mesmo no princípio da Constituição, que nosso país é uno e indivisível. Apesar do estado de divisão provisória no qual se encontra atualmente nosso país, nosso povo inteiro, tanto no Sul como no Norte, tem uma fé inabalável na reunificação inevitável do nosso território nacional. Temos, pois, inteira razão em afirmar a nossa unidade nacional desde o primeiro artigo do projeto. 3. Muitas pessoas propõem para precisar que o nosso Estado se apoia na aliança dos operários e dos camponeses, sob direção da classe operária, porque esta é uma grande verdade histórica que traz, ao nosso povo, imen-

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sas vitórias revolucionárias, e garante a realização das tarefas da revolução na nova etapa. Mas basta dizer no artigo 2º que a República Democrática do Vietnã é um Estado de democracia popular. 4. É dito, particularmente no artigo 3º, que o Vietnã é um Estado multinacional unido e que o Estado tem o dever de manter e desenvolver a união entre as nacionalidades. 5. O centralismo democrático é o princípio de organização fundamental dos organismos do Estado sob nosso regime. Foi materializado na organização do nosso Estado. De igual modo, inúmeras pessoas propuseram que o precisássemos na nossa Constituição. Nós completamos o artigo 4º neste sentido. 6. Outras pessoas propõem que se precise a via a ser seguida por nosso país e as perspectivas de desenvolvimento da economia nacional. O artigo 9º foi completado para indicar claramente que nosso país será dotado de uma economia socialista, com uma indústria e uma agricultura modernas, uma ciência e uma técnica avançadas. 7. Muitos dos nossos compatriotas propõem que a idade mínima para ser elegível deve ser superior à exigida para os eleitores. Modificamos o artigo 3º neste sentido, fixando em 18 anos a idade mínima para o eleitorado e em 21 anos para a elegibilidade. 8. Nós estamos de acordo sobre as propostas relativas à criação de um Conselho de Defesa Nacional. O novo projeto contém que o Presidente da República Democrática Nacional, o Vice-Presidente e os outros membros deste Conselho são eleitos pela Assembleia Nacional sob proposta do Presidente. 9. Certas pessoas propõem que se precise na Constituição as comissões que serão criadas pela Assembleia Nacional. Somos de opinião que se pode mencionar a Comissão de controle dos mandatos dos deputados, a Comissão dos projetos de lei, a Comissão do planejamento e do orçamento. É estipulado, além disso, que a Assembleia Nacional poderá instituir, quando o julgar necessário, outras comissões para a ela assistir e ao seu Comitê Permanente.

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10. Numerosas pessoas são de opinião de que se mencione no projeto o direito do Presidente da República de assistir às sessões do Conselho de Governo e de presidi-las sempre que julgue necessário. Nós acrescentamos este ponto no artigo 66. Para além das sugestões que a Comissão de Revisão aprovou e sobre as quais se fundamentou para aprontar este projeto, recebemos propostas de ordem menos geral que são da competência da legislação ou dos organismos do Estado. Encarregar-nos-emos de transmiti-las aos órgãos responsáveis para que sejam estudadas. Senhores Deputados, Há 14 anos, nosso povo acolhia com alegria a nossa primeira Constituição. Hoje, uma vez mais, ele empreendeu com ardor discussões apaixonadas sobre o projeto de revisão da Constituição. No decurso destas discussões, viu claramente todas as dificuldades que nós ultrapassamos e está pleno de entusiasmo perante as brilhantes vitórias que alcançamos: libertação completa do Norte, tomada efetiva do poder pelo povo, desenvolvimento rápido da economia socialista, melhoramento das condições de vida materiais e culturais do povo, desabrochar das virtudes revolucionárias, reforço da sua unidade, intensificação das suas atividades democráticas. Em uma palavra, o povo é efetivamente o dono do país. De Norte a Sul, as diversas camadas sociais acolhem com alegria o projeto de revisão da Constituição. A nação inteira tem fé na reunificação do Norte e do Sul em uma única e grande família. Os nossos irmãos do Sul entusiasmar-se-ão com a nova Constituição: darão ainda mais atenção à Assembleia Nacional e ao Governo, e lutarão com mais ardor ainda pela reunificação da pátria. A nação inteira compreende que o presente projeto se deve ao Partido, o organizador e o dirigente de todos nossos gloriosos sucessos, o garante seguro das nossas vitórias futuras. Ela o deve igualmente à união de todo o nosso povo, à sua luta heroica para edificar o país segundo a via traçada pelo Partido. Desde que nossa Comissão foi encarregada pela Assembleia Nacional de elaborar o presente projeto, trabalhou continuamente e reuniu-se 27 vezes. Apresentamos hoje ao vosso exame o resultado dos nossos esforços. Fizemos todo o possível, mas não podemos pretender a perfeição. Esperamos que deem novas ideias quando da discussão e a Assembleia Nacional votar o projeto.

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Uma vez adotado, este texto será a nova Constituição do nosso país. Esta exaltará mais no povo o amor à pátria e ao socialismo, incitá-lo-á a reforçar sua união e estimulará ainda mais seu espírito para a construção de um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático, poderoso e próspero. Fonte: Ho Chi Minh Selected Works, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Trinta anos de luta do Partido Artigo publicado em 1960 em função do aniversário de fundação do Partido Comunista do Vietnã, em janeiro de 1930, fruto do esforço de Nguyen Ai Quoc e seus camaradas ligados à III Internacional em Hong Kong. A conferência de fundação contou com a participação de três representantes dos Comunistas da Indochina e de dois líderes do Partido Comunista de Anam.

O nosso Partido festeja este ano o seu trigésimo aniversário. Durante estes trinta anos, ele suportou a prova de lutas heroicas e conquistou brilhantes vitórias. Por ocasião deste aniversário, queremos deitar um olhar retrospectivo sobre o caminho percorrido, a fim de recolher daí ensinamentos preciosos e determinar corretamente as tarefas revolucionárias que se colocam no momento atual e no futuro próximo, para marcharmos rumo a maiores e mais brilhantes vitórias. Da mesma forma que as grandes modificações surgidas no nosso país são inseparáveis da evolução geral do mundo, o crescimento do nosso Partido está intimamente ligado ao dos partidos irmãos. A vitória da grande Revolução de Outubro na Rússia, ao destruir uma parte importante das forças do capitalismo, abrira o caminho da libertação à classe operária e aos povos oprimidos do mundo inteiro. Em 1919, sob a direção de V. I. Lênin, os verdadeiros revolucionários de todos os países fundaram a III Internacional e, desde então, foram criados partidos comunistas em numerosos países. No início, graças à ajuda direta do Partido Comunista Chinês e do Partido Comunista Francês o marxismo-leninismo e a influência da Revolução de Outubro rasgaram a cortina de ferro do colonialismo francês que atingia o Vietnã. A partir de 1924, assistiu-se ao crescimento do movimento revolucionário no Vietnã, os nossos operários levaram a cabo uma série de ações sucessivas e passavam rapidamente das lutas econômicas às lutas políticas. A aliança do marxismo-leninismo com o movimento operário e o movimento patriótico devia conduzir à criação do Partido Comunista Indochinês no início do ano de 1930 (a partir de março de 1951 – Partido dos Trabalhadores do Vietnã – N.T.). Esse acontecimento marcou uma viragem duma extrema importância na história da revolução do nosso país. Ele provou que a nossa classe operária tinha crescido e era capaz de tomar nas suas mãos a direção da revolução.

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Em linhas gerais, a história do nosso Partido passou por vários períodos: - de atividades clandestinas; - de direção do movimento revolucionário que conduziu ao triunfo da Revolução de Agosto; - de direção da guerra patriótica até a vitória; e - da fase atual de direção da revolução socialista no Norte e da luta pela reunificação da pátria e pela conclusão da revolução nacional democrática em todo o país. No início, durante quase quinze anos o nosso Partido teve de trabalhar na clandestinidade. A todo instante, tinha de fazer frente à selvagem repressão do colonialismo francês. As prisões de Poulo Condore, Lao Bao, Son La e tantas outras abarrotavam os cárceres de comunistas. Um grande número de dirigentes e de militantes sacrificou heroicamente a sua vida. Nós tínhamos, contudo, uma confiança inabalável na vitória final do Partido e da revolução, e as nossas fileiras engrossavam e reforçavam-se incessantemente. Desde os primeiros dias da sua existência, o Partido ergueu a bandeira da revolução nacional democrática e tomou a direção do movimento de libertação nacional. Nessa época, a classe feudal tinha capitulado perante o imperialismo; a burguesia, estando fraca, não esperava mais nada do que um entendimento com o imperialismo para encontrar uma saída que lhe permitisse sobreviver. As camadas pequeno-burguesas, apesar da sua efervescência, estavam encurraladas no impasse. Só a classe operária, a mais heroica e a mais revolucionária de todas, resistia sempre ferozmente aos imperialistas colonialistas. Armada com a teoria revolucionária de vanguarda e com as experiências do movimento proletário internacional, ela se mostrava o dirigente mais capaz e mais digno da confiança do povo do Vietnã. No espírito do marxismo-leninismo do qual estava impregnado, o Partido avançou uma linha revolucionária justa. Já no seu programa sobre a revolução democrática burguesa elaborado em 1930, ele definiu claramente os seus objetivos anti-imperialistas e antifeudais, para a realização da independência nacional e da palavra de ordem “a terra aos camponeses”. Este programa respondia perfeitamente às profundas aspirações dos camponeses que formam a grande maioria do nosso povo. O Partido pôde, assim, realizar a união das grandes forças revolucionárias em torno da classe operária, ao passo que os partidos das outras classes

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faliram ou ficaram isolados. O papel da direção do nosso Partido – o Partido da classe operária – não cessava de se afirmar e alargar-se. No dia imediato à sua fundação, ele organizou e dirigiu um movimento de massas duma amplitude sem precedentes no nosso país, o movimento dos sovietes do Nghe-Tinh em 1930. As massas operárias e camponesas de duas províncias, Nghe An e Ha Tinh, sublevaram-se, derrubaram a dominação imperialista e feudal, estabeleceram o poder soviético dos operários, dos camponeses e dos soldados e proclamaram as liberdades democráticas para o povo trabalhador. Ainda que mergulhado num mar de sangue pelo imperialismo, o movimento dos sovietes do Nghe-Tinh testemunhou o heroísmo e o poder revolucionário das massas trabalhadoras do Vietnã. Apesar da sua derrota, ele não deixava de temperar as forças que deviam triunfar por sua vez na Revolução de Agosto. Quando, em 1936, o perigo fascista e a ameaça duma guerra mundial se estabeleceram, o nosso Partido, aliando-se à Frente Democrática Antifascista Mundial e à Frente Popular Francesa, desencadeou um amplo movimento de massas pela Frente democrática contra o fascismo e a reação colonialista na Indochina. Ele dirigiu a ação reivindicativa das massas populares pelas liberdades democráticas e o melhoramento das condições de vida. Este movimento englobou milhões de pessoas e elevou a sua consciência política. O prestígio do Partido estendeu-se e reforçou-se entre as massas trabalhadoras. Pouco depois de rebentar a Segunda Guerra Mundial, os imperialistas japoneses invadiram o Vietnã e se reuniram com os colonialistas franceses, para estabelecerem a sua dominação sobre o nosso país. O Partido soube modificar a tempo a sua ação. Ele fundou a Liga Viet Minh e as organizações de massas para a salvação nacional (1941) para unir estreitamente todas as forças patrióticas num único bloco contra o fascismo e o colonialismo. Ele adiou provisoriamente a palavra de ordem da revolução agrária, limitando-se a preconizar a diminuição das taxas de arrendamento e de juro e a confiscação das terras dos imperialistas e dos traidores para entregá-las aos camponeses. Fazendo isto, ele procurava reunir todas as forças na luta contra os imperialistas e os lacaios, ganhar elementos patriotas entre os latifundiários, alargar a frente nacional para a salvação da pátria. Essa justa política do Partido provocou um recrudescimento do movimento revolucionário. Foram criadas bases de resistência e fundados os primeiros

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destacamentos do exército de libertação do Vietnã. Em coordenação com a guerra dos povos do mundo contra o fascismo, o Partido desencadeou a guerrilha contra os japoneses. Criaram-se, assim, as condições que permitiram ao Partido, no momento em que o glorioso Exército Vermelho soviético esmagou o fascismo, desencadear, por volta de agosto de 1945, a insurreição geral para a tomada do poder. A Revolução de Agosto triunfava. Nascia a República Democrática do Vietnã. Fundado a partir de alguns núcleos de militantes, forjado e temperado em lutas extremamente duras, o Partido possuía em 1945 cerca de 5.000 aderentes (dos quais um certo número se encontrava sempre nas prisões imperialistas). No entanto ele pôde realizar, com esses efetivos muito limitados, a união de todo o povo e tomar a direção da insurreição nacional e conduzi-la à vitória. Essa grande vitória do povo vietnamita é igualmente a primeira vitória do marxismo-leninismo num país colonizado. Quase após a vitória da Revolução de Agosto, o governo francês traiu os acordos que tinha assinado conosco e desencadeou a guerra de agressão. Nessa época, o nosso país encontrava-se em enormes dificuldades. O nosso povo não estava ainda plenamente recomposto da terrível fome provocada pelo imperialismo francês e pelo fascismo japonês. O inimigo dispunha largamente de forças armadas modernas, de terra, de mar e de ar, enquanto nós tínhamos apenas alguns regimentos de infantaria recentemente organizados, sem grande experiência e com falta de tudo. A despeito dessas extremas dificuldades, o Partido decidiu resistir resolutamente, preocupando-se ao mesmo tempo em dirigir a luta patriótica e em consolidar as forças populares. No início da resistência, o Partido prosseguiu a execução do seu programa pela diminuição das taxas de arrendamento e de juro usuário. Contudo, desde que a resistência ganhou amplitude, fez-se sentir a necessidade de consolidar ainda mais as forças populares, principalmente o campesinato; o nosso Partido empreendeu então resolutamente a mobilização da população pela reforma agrária, a fim de realizar inteiramente a palavra de ordem “a terra aos camponeses”. Esta justa política provocou um novo impulso das forças da resistência que avançaram sucessivamente de vitória em vitória.

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Durante aproximadamente oitenta anos, o nosso povo foi oprimido e explorado até a última gota de sangue pelos colonialistas franceses. O nosso exército, formado originalmente por pequenas seções, das quais várias não dispunham senão de setas de bambu, forjara-se nas provações de nove anos de resistência. O nosso povo soldou-se num bloco de aço inquebrantável. As nossas formações de guerrilha e as nossas milícias populares transformaram-se em tropas de heróis, resolutas no combate, determinadas a vencer. Essa sólida coesão, esse heroísmo, esse espírito de sacrifício de todo o exército e de todo o nosso povo é que estiveram na origem da grande vitória de Dien Bien Phu em maio de 1954. As forças armadas do imperialismo francês, incapazes de se reerguerem, tiveram de aceitar o armistício. Os acordos assinados em Genebra restabeleceram a paz com base no reconhecimento da independência, da soberania e da integridade territorial de todos os povos indochineses. Pela primeira vez na história, um pequeno país colonizado triunfava sobre uma grande potência colonialista. Esta gloriosa vitória não foi apenas a vitória do nosso povo, mas também a das forças da paz, da democracia e do socialismo do mundo inteiro. Uma vez mais, o marxismo-leninismo tinha iluminado a via da classe operária e do povo vietnamita e conduzira-os à vitória na sua resistência pela salvação da pátria e pela salvaguarda das realizações da revolução. Desde o restabelecimento da paz, o Vietnã encontra-se face a uma nova situação, estando provisoriamente dividido em duas zonas. O Norte, inteiramente liberto, edifica o socialismo, enquanto os imperialistas americanos e seus lacaios mantêm a sua dominação no Sul. Eles procuram transformá-lo numa colônia e numa base militar americana com vistas a provocar uma nova guerra, e entregam-se a uma repressão de uma sangrenta selvageria contra os patriotas. Eles violam cinicamente os Acordos de Genebra e opõem uma recusa sistemática à conferência consultiva para a discussão das eleições gerais livres e da reunificação pacífica do país. Eles são os inimigos mais ferozes de todo o nosso povo. Como consequência dessa situação, a revolução vietnamita deve atualmente levar adiante duas tarefas: Edificar o socialismo no Vietnã do Norte. Completar a revolução nacional democrática no Sul. Essas duas tarefas visam ambas ao mesmo objetivo: a consolidação da paz, a reunificação do país com base na independência e na democracia.

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Na resolução da XV Sessão, o Comitê Central do nosso Partido definiu nestes termos as tarefas comuns a todo o país: “Reforçar a união nacional, lutar energicamente pela reunificação da pátria com base na independência e na democracia, concluir a revolução nacional democrática em todo o país, consolidar custe o que custar o Norte e fazê-lo avançar rumo ao socialismo; edificar um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero; contribuir ativamente para a salvaguarda da paz na Indochina, no Sudeste Asiático e no mundo”. O Vietnã do Norte deve absolutamente marchar em direção ao socialismo. E a característica mais importante deste período de transição no Vietnã é precisamente esta passagem direta ao socialismo de um país agrícola atrasado, sem atravessar a etapa capitalista. Os imperialistas franceses legaram-nos uma economia das mais miseráveis. A pequena produção representa a maior parte de uma agricultura excessivamente atrasada. A indústria é insignificante. A agricultura e a indústria ficaram gravemente devastadas por quinze anos de guerra. E mais ainda: os colonialistas franceses juntaram-lhe ainda os malefícios da sabotagem econômica quando deviam evacuar o Vietnã do Norte. Nestas circunstâncias, a nossa tarefa mais importante é edificar a base material e técnica do socialismo, fazer avançar progressivamente o Vietnã do Norte, dotá-lo de uma indústria e duma agricultura modernas, dar-lhe uma base cultural e científica de vanguarda. Nesta revolução socialista, em que temos de transformar a velha economia e construir uma nova, o trabalho de edificação é tarefa essencial e em longo prazo. De 1955 a 1957, tínhamos como tarefa principal a restauração econômica, em que estávamos essencialmente empenhados em restaurar a agricultura e as bases industriais para curar as feridas da guerra, estabilizar a economia e começar a melhorar as condições de vida do povo. Graças aos esforços conjugados de todo o Partido e de todo o povo, graças à ajuda fraternal do campo socialista, por volta do final de 1957 esta tarefa estava no essencial realizada com sucesso. O nível da produção industrial e agrícola atingiu aproximadamente o de 1939. Os resultados eram particularmente brilhantes para as culturas alimentares: o Vietnã do Norte que não produzia senão 2,5 milhões de toneladas de arroz em 1939, produzia mais de 4 milhões em 1956. No decurso desse período, as relações de produção sofreram importantes 234


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modificações, novas relações de produção substituíram progressivamente as antigas. A reforma agrária que se acabava de completar abolia definitivamente o regime de propriedade feudal e libertava as forças de produção no campo; uma dúzia de milhões de camponeses viam realizar o seu sonho: a divisão das terras. O monopólio econômico dos capitalistas estava liquidado. O nosso Estado tomava nas mãos todas as alavancas econômicas, edificava uma economia de Estado de caráter socialista e assegurava a direção de toda a economia nacional. Graças à ajuda generosa e desinteressada dos países irmãos, em primeiro lugar da União Soviética e da China, restaurávamos 29 empresas industriais antigas e edificávamos 55 novas. Em numerosas regiões, os camponeses organizaram-se em grupos de ajuda mútua, ensejando os embriões do socialismo. Foram criadas cooperativas agrícolas a título de experiência. Numerosos artesãos aderiram a grupos de produção. A indústria e o comércio capitalistas privados começavam a empenhar-se na via do capitalismo de Estado sob formas inferiores e médias: encomendas executadas para o Estado, fornecendo este as matérias-primas, organização de comerciantes privados em depositários dos armazéns de Estado etc. Tendo sido concluída com sucesso a restauração econômica, o Partido dirige atualmente a realização do plano trienal (1958-1960). Este apoia-se na transformação socialista da agricultura, do artesanato, da indústria e do comércio capitalistas privados, sendo o elo principal a transformação socialista e o desenvolvimento da agricultura. É necessário transformar e desenvolver a agricultura para criar as condições para a industrialização do país. O desenvolvimento da indústria e das nossas exportações só é possível com base em uma agricultura socialista e próspera. No plano trienal, a transformação socialista constitui o problema-chave. E nós concentramos os nossos esforços na conclusão das reformas, precisamente para criar as condições favoráveis a uma rápida edificação do socialismo. A linha do Partido para a transformação socialista da agricultura visa a fazer passar, pouco a pouco, os camponeses individuais a grupos de ajuda mútua, portadores de embriões do socialismo, a cooperativas agrícolas de tipo inferior (semissocialistas), e em seguida a cooperativas agrícolas de tipo superior (socialistas). Nos nossos campos, uma população muito densa vive em diminutas superfícies de terra; as técnicas agrícolas são ainda antiquadas e a produti-

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vidade continua em um nível muito baixo. O simples fato de se reagrupar, de melhorar os métodos de cultura e de gestão assegura desde já uma produtividade mais elevada à das explorações individuais. Foi o que os nossos camponeses compreenderam. Eles têm, por outro lado, tradições revolucionárias, uma profunda confiança no Partido e estão prontos a responder aos seus apelos. Eles também aderem com entusiasmo aos grupos de ajuda mútua e às cooperativas agrícolas, empenhando-se na via do socialismo. No momento atual, já mais de 40% de famílias camponesas entraram para as cooperativas. A consolidação das relações de produção socialistas provocará necessariamente um bom desenvolvimento da agricultura. Este facilitará o crescimento da indústria. E, por seu turno, este crescimento da indústria fornecerá à agricultura os meios hidráulicos, os adubos, os novos instrumentos agrícolas, a energia elétrica e as máquinas agrícolas de que ela necessita. A transformação socialista pacífica da burguesia nacional é uma outra tarefa de primeira necessidade. No plano econômico, nós não confiscamos os seus meios de produção, mas aplicamos uma política de remissão. No plano político, continuamos a conceder-lhes direitos razoáveis e o lugar que ela ocupa no seio da Frente da Pátria. Devido ao caráter colonial do nosso país, a nossa burguesia nacional constituiu sempre uma classe pouco importante, travada no seu desenvolvimento pelos colonialistas e pelos feudalistas que a impediam de erguer a cabeça. É por isso que um grande número dos seus membros se juntou ao povo na luta anti-imperialista e antifeudal e participou da guerra patriótica. Este é o seu aspecto positivo. Todavia, devido ao seu caráter de classe, eles não querem abandonar a exploração e nutrem a esperança de poderem continuar a se desenvolverem na via do capitalismo. Mas no quadro da marcha do Vietnã do Norte para o socialismo, tais aspirações não poderiam de forma nenhuma realizar-se. Eles se apercebem de que devem aceitar as reformas socialistas, porque não podem fixar-se fora da grande família vietnamita. E, na sua grande maioria, eles compreenderam bem a necessidade de aceitarem sinceramente essa transformação socialista. Eles se aperceberam de que este é, para eles, o único caminho de honra de futuro. No domínio da cultura e da educação, alcançamos igualmente grandes sucessos. Sob a dominação francesa, mais de 95% da população vietnamita não sabiam ler nem escrever. Hoje, no Norte, o analfabetismo encontra-se no essencial aniquilado.

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Eis alguns números sobre os efetivos escolares:

1939 (Toda a Indochina)

Universidades

582

7.518

Escolas técnicas

438

18.100

540.000

1.522.200

Escolas de ensino geral

1959-1960 (Só o Vietnã do Norte)

E alguns dados estatísticos referentes ao serviço sanitário:

1939 (Vietnã do Norte e do Centro)

1959 (Só o Vietnã do Norte)

Hospitais

54

138

Dispensários de aldeias

138

1.500

Médicos

86

292

Enfermeiros

968

6.020

-

169.000

Quadros sanitários nas aldeias

Para falar simples e sumariamente, pode-se dizer que o socialismo visa antes de tudo a libertar o povo trabalhador do flagelo da miséria, dar trabalho a toda gente, colocar cada um ao abrigo das necessidades e proporcionar-lhe o bem-estar e a felicidade. Todo o Partido e todo o povo devem contribuir para o aumento da produção, para a prática de economias e para a aplicação, em todas as suas atividades, da palavra de ordem: produzir a um ritmo rápido, assegurando a qualidade e baixando o preço de revenda. Com base nos sucessos alcançados até aqui, devemos empreender uma séria preparação para iniciar os planos ulteriores em longo prazo. Por que alcançamos esses sucessos? 1. Porque o nosso Partido, sempre firme na sua posição de classe proletária, sempre fiel aos interesses da sua classe e do povo, soube adaptar o marxismo-leninismo às realidades do nosso país e avançar programas políticos justos. O nosso Partido dirigiu uma luta incessante contra as tendências reformistas da burguesia e o aventureirismo político das camadas pequeno-burguesas no movimento nacional, contra a fraseologia “esquerdista” dos trotskistas no movimento operário, contra as tendências de direita e de esquerda no seio do Partido, tanto na determinação como na execução da estratégia

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e da tática revolucionária nas diferentes etapas. O marxismo-leninismo ajudou-nos a superar essas provas. Ele permitiu ao nosso Partido tomar não só a direção do movimento revolucionário em todo o país, mas ainda mantê-la solidamente nas mãos, em todos os domínios, e arrasar todas as manobras da burguesia que procurava disputar-nos a direção. 2. Graças ao marxismo-leninismo, o nosso Partido pôde compreender que nas condições de país agrícola atrasado como o nosso, a questão nacional é, no fundo, a questão camponesa, a revolução nacional é essencialmente uma revolução de camponeses sob a direção da classe operária, e o poder popular é essencialmente um poder operário e camponês. É por isso que, em cada fase da sua história, o nosso Partido aprendeu e resolveu corretamente o problema camponês e consolidou a aliança dos operários e dos camponeses. Ele lutou com tenacidade contra os desvios de direita e de esquerda que subestimam o papel dos camponeses na revolução, ignoram que eles constituem o grosso das forças da revolução e são o aliado principal e o mais digno da confiança da classe operária, a força fundamental que deve construir o socialismo de acordo com a classe operária. Estes desvios não compreendem que a aliança dos operários e dos camponeses é a própria base da Frente Nacional e do poder popular. A experiência adquirida pelo nosso Partido na sua ação revolucionária mostrou-nos que, cada vez que os nossos quadros davam uma justa solução às aspirações mais ardentes dos camponeses e aplicavam devidamente o princípio da aliança dos operários e dos camponeses, a revolução dava um rápido salto em frente. 3. O nosso Partido soube reunir todas as forças patrióticas e progressistas no seio da Frente Nacional e realizar a união nacional na luta anti-imperialista e antifeudal. Sendo os operários e os camponeses a força essencial do bloco de união nacional, a sua aliança é a base sobre a qual se assenta a Frente Nacional. Na formação, na consolidação e no desenvolvimento da Frente Nacional, o nosso Partido combateu sempre o sectarismo, o isolacionismo, assim como as tendências para a união sem princípios no seio da Frente. Trinta anos de experiência no trabalho de união nacional provaram ao nosso Partido ser necessário lutar contra esses desvios para assegurar o seu papel dirigente na Frente Nacional e para consolidar a base operária e camponesa que permitiu à Frente Nacional ampliar-se e consolidar-se.

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4. O nosso Partido cresceu na conjuntura internacional favorável criada pela grande vitória da Revolução socialista russa de Outubro. Os sucessos do nosso Partido e do nosso povo não se podem dissociar do apoio fraternal da União Soviética, da China Popular e do campo socialista, do movimento comunista e operário internacional, do movimento de paz e de libertação nacional do mundo inteiro. Se o nosso Partido pôde ultrapassar todas as dificuldades, conduzir a nossa classe operária e o nosso povo aos gloriosos sucessos de hoje, é precisamente porque ele sabe ligar o movimento revolucionário do nosso país ao movimento revolucionário da classe operária mundial e dos povos oprimidos. Nós estamos sinceramente agradecidos ao Partido Comunista da União Soviética e ao Partido Comunista Chinês que ajudaram o nosso Partido a forjar-se como um partido da classe operária de tipo novo. Guardamos sempre na memória os grandes serviços que o PCUS, o PCCh e o PCF prestaram generosamente ao nosso Partido e ao nosso povo durante a luta revolucionária. De hoje em diante, no caminho que conduz a novos sucessos, na edificação do socialismo no Vietnã do Norte e na luta pela reunificação da pátria, o nosso Partido aplicar-se-á ativamente a desenvolver a solidariedade internacional da classe operária. Ele contribuirá ativamente para fortalecer o poderio do campo socialista, com a União Soviética à frente, fará o máximo de esforços para inculcar profundamente no nosso povo o sentido do internacionalismo socialista estreitamente ligado com o verdadeiro patriotismo; ele reforçará os estreitos laços já existentes entre o movimento revolucionário no nosso país e o movimento dos trabalhadores e dos povos oprimidos do mundo inteiro em luta pela paz, pela democracia, pela independência nacional e pelo socialismo. Durante os três últimos decênios, sobrevieram no mundo modificações extremamente importantes. O mesmo aconteceu no nosso Partido e no nosso povo. Há trinta anos, o nosso povo vive sob a mais dura dominação colonialista. O nosso Partido que acabava de ser fundado era heroico, mas ainda fraco. A URSS, então único país socialista, estava submetida ao cerco imperialista. O Partido Comunista Chinês e o Exército Vermelho chinês foram objeto de ataques raivosos da parte dos nacionalistas reacionários. Os outros partidos irmãos estavam ainda no seu começo. O imperialismo punha e dispunha de 5/6 da terra e estava comprometido

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na via do fascismo. Rapidamente, nessa época, a maior parte da humanidade sufocava sob a odiosa opressão capitalista. A situação internacional mudou então completamente e hoje ela é rica em perspectivas. A URSS, uma das maiores potências do mundo, está em vias de edificar o comunismo e tornou-se ao mesmo tempo a cidadela inabalável da paz mundial. O socialismo é agora um sistema mundial, imenso e forte, estendendo-se da Europa até a Ásia, englobando mais de um bilhão de habitantes. Atualmente existem no mundo 85 partidos comunistas e operários com um efetivo de 35 milhões de combatentes resolvidos a lutar pela paz, pelo socialismo e pelo comunismo. Numerosas colônias tornaram-se Estados independentes. O movimento de libertação nacional se irrompe impetuosamente por todos os lados: na Ásia, na África e na América Latina. O imperialismo afunda-se cada vez mais. O Vietnã do Norte está inteiramente liberto e a RDVN está orgulhosa de pertencer à grande família socialista, tendo à frente a União Soviética. O nosso Partido, com centenas de milhares de membros, organiza e dirige o nosso povo na edificação do socialismo no Norte e na luta pela reunificação do país. O nosso Partido está à frente da luta revolucionária de todo o nosso povo. Erguendo bem alto o estandarte do patriotismo e do socialismo, ele dirige resolutamente o nosso povo na luta pela edificação de um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero, contribuindo para a salvaguarda da paz no Sudeste Asiático e no mundo. Para levar a bom termo essa tarefa tão pesada como gloriosa, é dever do nosso Partido realizar os seguintes objetivos: Reforçar-se no plano ideológico e aperfeiçoar a sua organização. Deve ampliar as suas organizações nas massas de uma forma segura e o mais amplamente possível, principalmente nas massas operárias, para reforçar o elemento proletário no seu seio. Todos os militantes devem esforçar-se por estudar o marxismo-leninismo, reforçar o seu espírito de classe proletária e assimilar bem as leis do desenvolvimento da revolução vietnamita. Eles devem mostrar-se à altura das exigências da moral revolucionária, lutar energicamente contra o individualismo, reforçar neles o senso coletivista proletário, mostrar-se laborioso e poupado para a edificação da pátria, ligar-se estreitamente às massas trabalhadoras, entregar-se sem reserva aos interesses superiores da revolução e da pátria.

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A edificação do socialismo no Vietnã do Norte exige do nosso Partido possuir a ciência e a técnica e, por conseguinte, que os seus membros façam todos os esforços para elevar o seu nível cultural, científico e técnico. O nosso Partido deve reforçar a sua direção em todos os domínios: • A União da Juventude Trabalhadora deve ser o braço direito do Partido na organização e educação da juventude e das crianças para fazer deles, no futuro, militantes de uma fidelidade absoluta à obra da edificação do socialismo e do comunismo; • os sindicatos devem tornar-se de fato, para a nossa classe operária, a escola de gestão do Estado, de direção econômica e cultural; • a União das Mulheres deve constituir uma força poderosa, ajudando o Partido a mobilizar, organizar e dirigir as mulheres na marcha rumo ao socialismo; • as cooperativas agrícolas, sob a direção do Partido, devem tornar-se as brigadas de estímulo de mais de dez milhões de camponeses trabalhadores, no desenvolvimento da produção, na elevação do nível de vida e na edificação de uma agricultura vietnamita próspera e socialista; • o nosso exército popular deve elevar sem cessar o seu nível político e tornar-se mestre na técnica, para se transformar numa força cada vez mais potente, sempre pronta a defender a independência da nossa pátria e o trabalho de edificação pacífica do nosso povo. É sob a bandeira do marxismo-leninismo que o nosso Partido, heroico exército invencível e seguro do nosso povo, cerra ainda mais estreitamente as suas fileiras. Ele avança corajosamente na condução dos trabalhadores do nosso país a novos sucessos na luta pela edificação do socialismo do Vietnã do Norte e pela reunificação da nossa pátria. Viva o Partido dos Trabalhadores do Vietnã! Viva o Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero! Viva o socialismo! Viva a paz mundial! Fonte: Ho Chi Minh Selected Works. Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Discurso inaugural do III Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores do Vietnã Em 5 de outubro de 1960, Ho Chi Minh se pronunciou diante do III Congresso do Partido dos Trabalhadores do Vietnã, em Hanói.

Caros camaradas, Abre-se hoje o nosso III Congresso Nacional, ao mesmo tempo que nosso povo festeja com alegria o 15º aniversário da fundação da República Democrática do Vietnã. Estamos aqui, mais de 500 delegados, representando os 500 mil membros do Partido em todo o país e simbolizando suas heroicas tradições de luta no transcurso destes trinta anos. Em nome do Comitê Central, saúdo afetuosamente os camaradas delegados, todos os membros do nosso Partido que nos são tão queridos, os representantes do Partido Socialista, do Partido Democrata e das organizações de massa no seio da Frente da Pátria. O nosso Congresso aclama, com a maior alegria e o maior entusiasmo, os camaradas delegados do Partido Comunista da União Soviética, do Partido Comunista Chinês, do Partido do Trabalho da Albânia, do Partido Comunista Búlgaro, do Partido Operário Polonês, do Partido Socialista Unificado Alemão, do Partido Socialista Operário Húngaro, do Partido Popular Revolucionário Mongol, do Partido Operário Romeno, do Partido do Trabalho da Coreia, do Partido Comunista Tchecoslovaco, do Partido Comunista Francês, do Partido Comunista Indiano, do Partido Comunista Indonésio, do Partido Comunista Japonês, do Partido Comunista Canadense, e de outros partidos comunistas irmãos. Foi impregnado do mais nobre espírito internacionalista que viestes tomar parte nos nossos trabalhos e nos trazer a expressão dos sentimentos afetuosos dos partidos irmãos. Na verdade, pode dizer-se: Para lá de montes e desfiladeiros, para lá de milhares de léguas, um mesmo teto. Nos quatro horizontes, todos os proletários são irmãos. Em nome do Congresso, felicito afetuosamente os operários, os camponeses, os intelectuais, homens e mulheres, as unidades do exército, os quadros dos diferentes organismos, os jovens e as crianças, meus sobrinhos,

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que se lançaram em ardente emulação para realizar proeza em honra do Congresso do Partido e do 15º aniversário de nossa Festa Nacional. Caros camaradas, Nos últimos 30 anos, muitos dos nossos camaradas e nossos compatriotas sacrificaram-se heroicamente pela causa da revolução. Ao longo da guerra de resistência, quantos combatentes deram sua vida pela Pátria! Nestes últimos seis anos, no Sul, quantos valentes combatentes tombaram pela nação! O nosso Partido e os nossos compatriotas recordar-se-ão para sempre destes filhos, os melhores dentre os melhores que combateram até o fim pela libertação nacional e o ideal comunista. Passaram-se mais de nove anos, após o nosso II Congresso. Durante estes nove anos aplicando a linha definida pelo seu II Congresso, o Partido dirigiu nosso povo em uma guerra de resistência árdua e heroica. A grande e gloriosa vitória de Dien Bien Phu pôs fim à guerra de agressão levada a cabo pelos colonialistas franceses com o apoio dos imperialistas estadunidenses. Os Acordos de Genebra foram assinados, a paz restabelecida na Indochina com base no reconhecimento internacional da soberania, da independência, da unidade e da integridade territorial do nosso país. O Vietnã do Norte foi inteiramente libertado. Mas passaram-se seis anos e o nosso país não está, contudo, reunificado, a despeito do estipulado nos Acordos de Genebra. O nosso governo e o nosso povo mantiveram-se sempre a uma rigorosa aplicação dos acordos assinados. Porém, pelo contrário, os imperialistas estadunidenses e Ngo Dihn Diem empenharam-se deliberadamente a manter a divisão do nosso país e a sabotar desavergonhadamente os Acordos de Genebra, de modo que o Vietnã do Sul suporta ainda uma vida de sofrimento e de miséria sob a sua bárbara dominação. É por isto que o nosso povo não cessou de lutar para realizar a reunificação pacífica do país para livrar o Sul desta atuação atroz. A lula revolucionária dos nossos compatriotas do Sul prossegue cada dia mais ampla e mais possante. O Sul merece inteiramente o seu título de “’Muralha de bronze da Pátria”. Desde o restabelecimento da paz, o Norte inteiramente libertado passou à etapa da revolução socialista. Eis uma mudança plena de significado para a Revolução Vietnamita. Sob a direção do Partido, a reforma agrária foi realizada com sucesso, libertou os nossos compatriotas camponeses trabalhadores, realizando assim a palavra de ordem “a terra a quem a trabalha”.

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Nós conduzimos a bom termo a restauração econômica, e estamos em vias de realizar vitoriosamente o plano trienal de desenvolvimento econômico e cultural. Conquistamos sucessos de um carácter decisivo na transformação socialista da agricultura, do artesanato, da indústria e do comércio capitalistas privados. Obtivemos muitos resultados brilhantes na frente da produção agrícola e industrial, no trabalho cultural e educativo, e avançamos decididamente na elevação do nível de vida do nosso povo. O Norte vai-se consolidando cada dia mais e torna-se um sólido apoio para a luta com vistas à reunificação do país. Os grandes sucessos alcançados, ao longo destes nove anos, testemunham a justeza da luta e a firmeza da direção do nosso Partido. Isto é um triunfo do marxismo-leninismo, em um país oprimido e explorado pelos imperialistas. O nosso Partido é digno da confiança do nosso povo do Norte ao Sul. Caros Camaradas! O nosso Partido não conseguiu sozinho todas estas vitórias. Elas são o feito comum de todos os nossos compatriotas no conjunto do país. A revolução é obra das massas e não de um herói individual. Se o nosso Partido obteve sucesso, é porque soube organizar e exaltar a inesgotável energia revolucionária do povo, é porque soube dirigi-lo em sua luta sob a bandeira vitoriosa do marxismo-leninismo. O sucesso da Revolução Vietnamita deve-se ainda à ajuda devotada dos povos dos países socialistas irmãos, sobretudo da URSS e a da China. Nesta ocasião, nós exprimimos calorosamente nossa gratidão para com os países socialistas irmãos, tendo à frente a grande URSS. Exprimimos também sinceramente nossa gratidão para com os outros partidos irmãos, nomeadamente para com o Partido Comunista Francês, que apoiou ativamente a justa luta do nosso povo. Agradecemos sinceramente aos povos das colônias e aos povos amantes da paz no mundo inteiro, que nunca deixaram de nos aprovar e de nos apoiar. Um ensinamento se destaca da história dos 30 anos de luta do nosso Partido. Impregnar-se do marxismo-leninismo, guardar uma absoluta fidelidade aos interesses do proletariado e de nação, preservar a unidade e a coesão no seio do Partido, a unidade e a coesão entre os partidos comunistas, entre os países pertencentes à grande família socialista, é a mais sólida garantia do sucesso da revolução. Até hoje, nosso Partido agiu neste sentido. Sem dúvida que no futuro ele continuará a fazer o mesmo.

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Caros camaradas, O nosso Partido alcançou grandes sucessos, mas não está isento de erros. Todavia, nós nunca os escondemos; pelo contrário, fizemos uma autocrítica sincera e aplicamo-nos ativamente para corrigi-los. O sucesso não nos embriagou, nem nos envaideceu de modo nenhum. Hoje, vigorosos com nossa própria experiência e com a dos partidos irmãos, estamos determinados a trabalhar para avançar ainda mais, avançar sempre. A tarefa atual da Revolução Vietnamita é encaminhar o Norte em direção ao socialismo e lutar pela reunificação pacífica da Pátria, pelo cumprimento da revolução nacional democrática popular em todo o país. As decisões do Congresso guiarão todo o Partido e todo o nosso povo na edificação vitoriosa do socialismo do Norte, que será dotado de uma indústria e de uma agricultura modernas, de uma cultura e de uma ciência de vanguarda. O povo conhecerá aí cada vez mais bem-estar, uma vida radiosa. O nosso II Congresso foi o da resistência. Este Congresso é o da edificação do socialismo no Norte e da reunificação pacífica do país. O nosso povo, que se mostrou heroico na resistência, continua a sê-lo no trabalho para a reconstrução da Pátria. Não há dúvida de que conseguiremos edificar o socialismo glorioso no Norte do nosso país. O Norte, próspero, constitui um firme apoio à nossa luta com vistas à reunificação. O presente Congresso iluminará ainda mais o caminho do nosso povo na sua luta revolucionária para a reunificação do país. A nossa nação é uma, o Vietnã é um. O nosso povo saberá ultrapassar todas as dificuldades e realizar a todo custo a nossa divisa “reunificar o país, Norte e Sul sob o mesmo teto”. Caros Camaradas, A Revolução Vietnamita é parte integrante das forças da paz, da democracia e do socialismo no mundo. A República Democrática do Vietnã é membro da grande família socialista encabeçada pela grande URSS. Incumbe-nos manter firme nossa posição de posto avançado do socialismo do Sudeste Asiático, fazer de tudo para contribuir para o aumento do poder do campo socialista e defender a paz no Sudeste da Ásia e no mundo. O socialismo tornou-se hoje um poderoso sistema mundial, inabalável como uma parede de bronze, uma muralha de aço. O nosso povo levantou-

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-se entusiasmado pelos sucessos grandiosos da União Soviética na edificação do comunismo e pelas grandes realizações da China e dos outros países socialistas irmãos na edificação do socialismo. Ele apoia ardentemente a política externa de paz da União Soviética e dos outros países do campo socialista, assim como suas propostas de desarmamento. Congratula-se também, de todo o coração, pelas vitórias das nações da Ásia, da África e da América Latina na sua luta gigantesca contra os imperialistas, nomeadamente os imperialistas estadunidenses. É manifesto que as forças mundiais da paz, da democracia, da independência nacional e do socialismo sobrepõem-se já, nitidamente, ao campo imperialista. Não há dúvida de que, unindo-se estreitamente e lutando ativamente, os povos do mundo têm a possibilidade de conjurar uma nova guerra mundial e realizar uma paz durável. Não há dúvida de que a luta decidida das nações oprimidas conduzirá à vitória sobre os imperialistas colonialistas. Não há dúvida de que finalmente o socialismo conquistará, por toda parte, uma vitória total através do mundo inteiro. Nesta luta gigantesca, a união das forças dos países socialistas e a unidade e a coesão dos partidos comunistas e operários de todos os países se revestem de significado importante. Estamos convencidos de que, assim como o indica o Comunicado da Conferência de Bucareste, “os Partidos Comunistas e Operários continuarão a consolidar a solidariedade dos países do sistema socialista mundial e a preservá-la, como à menina dos seus olhos, na luta pela paz e segurança de todos os povos, pelo triunfo da grande causa do marxismo-leninismo”. Hoje, os imperialistas já não podem pôr e dispor como antes. No entanto, enquanto houver imperialismo, o perigo de guerra persiste. A Declaração da Conferência dos representantes dos Partidos Comunistas e Operários dos países socialistas, realizada em Moscou em 1957, recordou-nos que: “os partidos comunistas consideram a luta pela paz como a tarefa primordial. Os povos de todos os países devem exercer sua maior vigilância face ao perigo da guerra, criado pelo imperialismo”. E é muito importante recordar-se que “quanto mais ampla e sólida é a união das forças patrióticas e democráticas, mais certa é a vitória na luta comum”. O nosso povo que sofreu a ação dos imperialistas sofre ainda hoje a divisão do país, perpetuada pelos EUA e por Ngo Dinh Diem. Enquanto o povo não tiver expulsado os imperialistas estadunidenses, enquanto não se tiver libertado do jugo cruel de Ngo Dinh Diem e dos seus patrões ameri-

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canos, não poderá dormir tranquilo. Eis por que a luta pela salvaguarda da paz e a reunificação do país é indissolúvel da luta contra os imperialistas norte-americanos. Na luta comum pela defesa da paz e da independência nacional na Indochina, o povo vietnamita apoia resolutamente a valente luta conduzida pelo povo laosiano contra os imperialistas americanos, para integrar seu país na via da concórdia nacional, da independência, da unidade, da paz e da neutralidade. Nós desejamos de todo coração que se estabeleçam e desenvolvam favoravelmente relações de amizade entre nós e os nossos vizinhos, em primeiro lugar o Camboja e o Laos. Caros camaradas, Esta contribuição para a salvaguarda da paz no Sudeste Asiático e no mundo, que são a revolução socialista do Norte e a luta pela reunificação do Vietnã, assinala ao nosso Partido na hora atual tarefas tão pesadas como gloriosas. Para garantir a vitória da revolução, a questão decisiva é a de elevar ainda mais o poder de combate do nosso Partido e de acentuar o seu papel dirigente em todos os domínios. Até este dia, o nosso Partido esforçou-se por ligar estreitamente o marxismo-leninismo à realidade da Revolução Vietnamita. Os seus quadros e os seus membros têm, no conjunto, uma boa têmpera revolucionária. Nós temos ainda, no entanto, bastantes pontos fracos: subjetivismo, dogmatismo, empirismo, burocratismo, individualismo... estas insuficiências opõem-se ao progresso dos nossos camaradas. Para combatê-las, devemos estudar o marxismo-leninismo, reforçar a educação ideológica no Partido. Realçar ainda mais o caráter de classe e de vanguarda do Partido, reforçar sem descanso a ligação com as massas; devemos saber unir todos os patriotas e progressistas para construir vitoriosamente o socialismo e lutar pela reunificação nacional. Devemos assimilar de maneira criadora a experiência dos partidos irmãos. Defendamo-nos do orgulho e da autossuficiência, sejamos modestos como ensinou Lênin. O presente Congresso vai eleger o novo Comitê Executivo Central do Partido, em tomo do qual, estamos certos, o Partido se unirá mais estreitamente e arrastará ainda mais vigorosamente o nosso povo de uma ponta a outra do Vietnã para atingir este objetivo fundamental imediato: a edificação do socialismo no Norte e a reunificação pacífica do país.

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Viva o marxismo-leninismo! Viva a valente classe operária e o valente povo do Vietnã! Viva o Partido dos Trabalhadores do Vietnã! Viva a solidariedade e a coesão dos partidos irmãos, a solidariedade e a coesão da grande família socialista, tendo à frente a grande URSS! Viva o Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero! Viva a paz mundial!

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O caminho que me levou ao Leninismo Publicado originalmente no órgão soviético Problemas do Oriente por ocasião do aniversário dos 90 anos de nascimento de V. I. Lênin, em abril de 1960

Após a Primeira Guerra Mundial, eu levava minha vida em Paris, ora como retocador de fotografias, ora como pintor de “antiguidades chinesas” (feitas na França). Também distribuía panfletos denunciando os crimes cometidos pelos colonizadores franceses no Vietnã. Naquele tempo, eu apoiava a Revolução de Outubro apenas por intuição, não tendo em mente ainda toda a sua importância histórica. Eu amava e admirava Lênin porque ele foi um grande patriota que libertara seus compatriotas. Até então, eu não havia lido nenhum de seus livros. A razão para eu ter me unido ao Partido Socialista Francês foi porque essas “damas e cavalheiros” – como eu chamava meus camaradas na época – demonstraram sua simpatia por mim, pela luta dos povos oprimidos. Mas eu não entendia o que era um partido, um sindicato, nem mesmo socialismo ou comunismo. Discussões acaloradas aconteciam nos comitês do Partido Socialista sobre a dúvida de se deveríamos continuar na II Internacional, se deveria ser fundada uma II Internacional e Meia ou se o Partido deveria se juntar à III Internacional de Lênin. Eu comparecia aos encontros com frequência, duas ou três vezes por semana, e ouvia atentamente a discussão. No início, eu não conseguia entender o assunto por completo. Por que os debates eram tão acalorados? Seja com a II, a II e Meia ou a III Internacional, a revolução poderia ser alcançada. Qual o objetivo de discutir sobre isso? E a I Internacional, o que aconteceu com ela? O que eu mais queria saber – e o que justamente não era debatido nos encontros – era: qual Internacional está do lado dos povos das colônias? Eu levantei essa dúvida – a mais importante em minha opinião – no encontro. Alguns camaradas responderam: “é a III Internacional, não a II”. E um camarada me deu para ler a Tese sobre as questões nacionais e coloniais de Lênin, publicadas pela L’Humanité. Havia termos políticos difíceis de entender nessa tese. Mas, por meio do esforço de lê-la e relê-la, pude finalmente apreender a maior parte deles. Que emoção, entusiasmo, esclarecimento e confiança essa obra provocou em mim! Eu me regozijava em lágrimas. Embora estivesse sentado sozinho

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em meu quarto, eu gritei fortemente, como se me dirigisse a grandes multidões: “Caros mártires compatriotas! É disso que precisamos, este é o caminho para nossa libertação”! A partir dali, tive plena confiança em Lênin e na III Internacional. Formalmente, durante os encontros no comitê do Partido, eu apenas escutava a discussão, tinha uma crença vaga de que tudo era lógico, e não conseguia diferenciar quem estava certo de quem estava errado. Mas, a partir daquele momento, passei a me envolver nos debates e a discutir com fervor. Ainda que me faltassem palavras em francês para expressar todas as minhas ideias, eu rebatia energicamente os ataques feitos a Lênin e à III Internacional. Meu único argumento era: “Se vocês não condenam o colonialismo, se vocês não estão alinhados com a população das colônias, que tipo de revolução vocês estão buscando?” Eu não apenas participava dos encontros do meu comitê do Partido, mas também ia às reuniões dos outros comitês para reafirmar “minha posição”. Devo dizer que mais uma vez meus camaradas Marcel Cachin, Vaillant-Couturier, Monmousseau e muitos outros me ajudaram a expandir meu conhecimento. Por fim, no Congresso de Tours, eu votei junto com eles por nossa adesão à III Internacional. Em primeiro lugar, foi o patriotismo, e não o comunismo, que me levou a acreditar em Lênin e na III Internacional. Aos poucos, durante a luta e enquanto estudava o marxismo-leninismo paralelamente às minhas participações nas atividades práticas, eu me dei conta de forma gradativa de que somente o socialismo e o comunismo poderiam libertar da escravidão as nações oprimidas e o povo trabalhador ao redor do mundo. Existe uma lenda, tanto em nosso país como na China, sobre o milagroso “Livro da sabedoria”. Ao se deparar com grandes dificuldades, pode-se abrir o livro e encontrar a solução. O leninismo não é apenas um milagroso “livro da sabedoria”, um compasso para nós revolucionários e cidadãos vietnamitas: é também o fulgurante sol iluminando nosso caminho para a vitória final, ao socialismo e ao comunismo. Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh, vol. 4, Foreign Languages Publishing House.

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A Revolução Chinesa e a Revolução Vietnamita Artigo escrito por ocasião do 40º aniversário da fundação do Partido Comunista Chinês, a 1º de julho de 1961.

O triunfo da Revolução de Outubro na Rússia abalou o mundo inteiro. O marxismo-leninismo começou a se propagar na China, um dos maiores países do mundo, que os imperialistas qualificavam com desprezo de “leão adormecido”’. No dia 1º de julho de 1921, num pequeno quarto da luxuosa cidade de Xangai, 12 revolucionários – entre os quais, o camarada Mao Tsé-tung – reuniram-se para fundar o Partido Comunista Chinês, que contava então com 50 membros (para um efetivo atual de 17 milhões). Desde então, os destinos da China começaram a mudar. Após 28 anos de uma luta das mais heroicas sob a direção do Partido Comunista, tendo à frente o camarada Mao Tsé-tung, o Exército de Libertação aniquilou mais de 8 milhões de homens das tropas de Chiang Kai-shek, equipadas pelos Estados Unidos, e expulsou os imperialistas americanos do território chinês. Em 1949, a República Popular da China viu a luz do dia. Em 12 anos de edificação sob a direção do Partido Comunista, os 650 milhões de chineses, rivalizando de ardor e trabalhando com abnegação, fizeram da China, antes agrícola e atrasada, um país socialista poderoso. Quarenta anos gloriosos, quarenta anos de vitórias. Numerosos camaradas escreveram sobre a grandiosa história do Partido Comunista Chinês irmão. Quanto a mim, queria apenas mencionar o seguinte: O Vietnã e a China são dois países vizinhos, que há séculos têm relações estreitas entre si. É evidente que existem igualmente laços particularmente estreitos entre a revolução chinesa e a revolução vietnamita. — Foi por intermédio da China que a influência da Revolução de Outubro e o marxismo-leninismo se propagaram até o Vietnã. — Na China é que foram organizadas, com a ajuda devotada dos camaradas chineses, a Associação da Juventude Revolucionária do Vietnã (1925), a Conferência de Unificação dos diferentes grupos comunistas do Vietnã num partido marxista-leninista (1930) e o primeiro Congresso do Partido Comunista Indochinês (1935). 251


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— O esmagamento pela URSS dos militaristas japoneses no Nordeste contribuiu para a vitória da resistência chinesa, e a vitória da resistência favoráveis que permitiram à Revolução de Agosto triunfar no Vietnã. — A partir de 1946, o Partido Comunista Chinês teve de conduzir uma luta contínua contra as tropas reacionárias de Chiang Kai-shek, ajudadas pelos Estados Unidos (desde o início da guerra civil, os americanos equiparam os 4 milhões e 300 mil homens de Chiang Kai-shek com armas modernas, além das que foram tiradas a um milhão de soldados japoneses). Em 1947, Chiang Kai-shek apoderou-se de Yenan. Em condições tão difíceis, o Partido Comunista e o povo chinês apoiaram a nossa resistência nacional de todo o seu coração até a vitória total. — No momento atual, em conjunto com a União Soviética e os outros países irmãos, a China dá-nos uma assistência devotada para a nossa edificação do socialismo no Norte a fim de constituir uma base poderosa para a reunificação pacífica do país. As relações existentes entre a revolução chinesa e a revolução vietnamita firmam-se em mil laços estabelecidos pelo dever, a gratidão e a afeição. Viva a gloriosa amizade que nos une! Pessoalmente tive por duas vezes a honra de militar no seio do Partido Comunista Chinês. Encontrando-me em Kouang-tchéou de 1924 a 1927, dedicava-me a seguir o movimento revolucionário no nosso país e ao mesmo tempo cumpria as tarefas confiadas pelo Partido Comunista Chinês. Na China, o movimento operário e camponês estava em plena efervescência. A partir de maio de 1925, rebentaram greves políticas em quase todas as grandes cidades. A mais importante foi a greve contra os imperialistas britânicos, em Hong-Kong, da qual participaram mais de 250.000 operários, que durou 16 meses. O movimento camponês começava também a alargar-se, sobretudo em Hou-nan (graças ao trabalho de organização do camarada Mao Tsé-tung) e em Kouang-tung (sob a direção do camarada Pung Bai). A fim de impulsionar o movimento camponês, o camarada Mao organizou cursos de formação de quadros de propaganda chamados a militar entre os camponeses nas 19 províncias do país. Eu participava da tradução de documentos destinados ao trabalho no país, bem como da propaganda para o estrangeiro, isto é, escrevia artigos sobre o movimento operário e camponês para um jornal de língua inglesa. A segunda vez que fui à China (fins de 1938), estava-se em plena resis-

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tência antinipônica. Como soldado da 2ª classe do VIII Exército de Marcha, eu assumia as funções de responsável pelo clube de uma unidade em Gui-lin. Em seguida, fui eleito secretário de uma célula do Partido (e encarregado, além disso, da escuta do rádio) duma unidade em Heng-yang. (Assim, pude adquirir um pouco de experiência em matéria de edificação do Partido na URSS, no que tange à luta contra o capitalismo na França e contra os colonialistas e os feudalistas na China). Entretanto os camaradas chineses ajudaram-me a estabelecer ligação com o nosso país. O nosso Comitê Central enviou um camarada para se encontrar comigo em Long-tcheu. Completamente desprestigiado por um “amigo”, X teve de regressar ao país antes da minha chegada a essa cidade. Pouco depois, os camaradas chineses conseguiram ajudar-me a estabelecer ligação e a regressar ao país para continuar as minhas atividades. Assim, os comunistas do mundo inteiro prosseguem um mesmo e nobre objetivo, unem-se estreitamente e, baseando-se no marxismo-leninismo e no internacionalismo proletário, estão ligados por uma afeição fraternal. Aproveito esta ocasião para enviar em nome do Partido, do governo e do nosso povo, as minhas mais afetuosas e calorosas saudações ao grande Partido Comunista Chinês, tendo à frente o bem-amado camarada Mao Tsé-tung. Fonte: Ho Chi Minh, Escritos II (1954-1969) Edições Maria da Fonte, Portugal, 1976

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Alocução por ocasião do XX Aniversário da fundação do Exército Popular Texto publicado em 23 de dezembro de 1964

Camaradas, Por ocasião do 20º aniversário da fundação do Exército Popular do Vietnã, em nome do Comitê Central do Partido e do governo, felicito afetuosamente as forças regulares, as forças regionais, as forças de segurança popular armadas, as milícias populares em todo o país pelos seus méritos, pelos seus sucessos nos combates, pelos seus progressos nos estudos assim como no trabalho e na produção. Estou feliz por desejar boas-vindas ao general Kim Tsang Bom e aos camaradas da delegação militar da irmã República Popular Democrática da Coreia e desejo bons resultados à sua visita de amizade. O nosso exército é o exército heroico de um povo heroico. Desde sua nascença, munido simplesmente de paus e mosquetes, combateu conjuntamente com o povo os agressores franceses, depois os agressores japoneses e conduziu a Revolução de Agosto à vitória. Há dez anos, conjuntamente com o povo, alcançou a vitória de Dien Bien Phu e levou ao fracasso a guerra de agressão do imperialismo francês ajudado pelo imperialismo estadunidense. Valente na guerra de resistência, ele o é igualmente em tempos de paz. Defendeu com êxito o Norte, aniquilando todos os atos de provocação e sabotagem dos imperialistas estadunidenses e dos seus agentes. Ele ripostou vigorosamente aos imperialistas estadunidenses, como na jornada de 5 de agosto. Contribuiu também de forma ativa para a edificação econômica e para o desenvolvimento cultural, desempenhando igualmente bem as tarefas que incubem a um exército revolucionário. O nosso Exército, fiel ao Partido e dedicado ao povo, está pronto a sacrificar-se pela independência e pela liberdade da Pátria e pelo socialismo, a cumprir devidamente todas as tarefas, ultrapassar qualquer dificuldade, vencer qualquer inimigo. Quadros e combatentes estimam-se como irmãos e compartilham tristezas e alegrias. Exército e povo são como unha e carne; estreitamente unidos, aprendem um com o outro e ajudam-se mutuamente. O nosso Exército, animado de um autêntico patriotismo e de um elevado 254


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internacionalismo proletário, fortalece constantemente sua união com os povos e os exércitos dos países socialistas irmãos, com os povos dos países em luta pela sua libertação nacional e com os povos amantes da paz no mundo. O nosso Exército é invencível porque é um exército popular, fundado, educado e dirigido pelo nosso Partido. Os nossos quadros combatentes devem ser sempre modestos, procurar ultrapassar-se, desenvolver as suas qualidades e as suas tradições revolucionárias, seguir o exemplo da vontade de combater e vencer das forças armadas e da heroica população do Sul em sua luta patriótica contra os imperialistas estadunidenses agressores e a claque dos seus lacaios. O inimigo nutre sempre fins pérfidos. Nosso povo e nossas forças armadas devem exercer toda a sua vigilância, manter-se prontos para combater, participar com ardor do movimento de emulação patriótica, no espírito de “cada um trabalha por dois”, para edificar e defender o Norte socialista para torná-lo uma base sólida para a libertação do Sul e a reunificação pacífica da Pátria. A vitória será nossa. Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh, Hanoi, Foreign Languages Publishing House.

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Apelo à Nação Em 17 de julho de 1966, diante das ações belicistas e intervencionistas do Exército estadunidense, o líder Ho Chi Minh conclama o povo e o Exército Popular a resistir e conquistar a independência total do território do Vietnã

Compatriotas e combatentes de todo o país. Os imperialistas estadunidenses desencadearam, da maneira mais bárbara, uma guerra de agressão para conquistar o nosso país, mas eles estão prestes a sofrer grandes derrotas. Eles enviaram um maciço corpo expedicionário de cerca de 300 mil homens para o sul do nosso país. Sustentam uma administração e um exército fantoches, instrumentos da sua política de agressão. Utilizam meios de guerra extremamente selvagens, bombas de napalm, produtos químicos tóxicos etc. Sua política consiste em incendiar tudo. Com estes crimes, pensam vergar os nossos compatriotas do Sul. Mas, sob a firme e hábil direção da Frente Nacional de libertação, o exército e a população do Sul, estreitamente unidos e combatendo com heroísmo, alcançaram gloriosas vitórias e estão determinados a combater até a vitória total para libertar o Sul, defender o Norte e avançar à reunificação do país. Os agressores estadunidenses lançaram descaradamente ataques aéreos contra o Norte do nosso país na esperança de saírem da sua desastrosa situação do Sul e de impor-nos “negociações” sob suas condições. Mas o Norte permanece inabalável. O nosso exército e o nosso povo redobraram o seu ardor para produzir e combater com heroísmo. Até hoje, abatemos mais de 1.200 aviões inimigos. Estamos determinados a aniquilar a guerra de destruição do inimigo e a apoiar com todas as nossas forças os nossos irmãos do sul. Ultimamente, os agressores estadunidenses galgaram um perigoso degrau na sua escalada. Eles atacaram a periferia de Hanói e Haifong. Isto é um ato de desespero, o sobressalto de uma fera mortalmente ferida. Johnson e os seus acólitos que o digam: podem mandar 500 mil homens, um milhão, ou mesmo mais, para intensificar a guerra de agressão no Vietnã do Sul; podem utilizar milhares de aviões para multiplicar

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os ataques contra o Norte, mas jamais poderão abalar a nossa vontade de ferro de combater a agressão americana para a salvação nacional. Quanto mais se mostram agressivos, mais agravam o seu crime. A guerra poderá durar ainda cinco anos, dez anos, vinte anos ou mais, Hanói, Haifong, assim como um certo número de outras cidades e empresas poderão ser destruídas, o povo vietnamita não se deixará intimidar. Não há nada mais precioso do que a independência e a liberdade. Após a vitória, nosso povo reconstruirá o país, tornando-o melhor, maior e mais belo. É notório que, cada vez que se preparam para intensificar sua criminosa guerra, os agressores estadunidenses recorrem sempre ao embuste das “negociações de paz” na esperança de enganar a opinião mundial e de acusar o Vietnã de não querer “negociações de paz”. Quem sabotou os acordos de Genebra que garantem a soberania, a independência, a unidade e a integridade territoriais do Vietnã? As tropas vietnamitas invadiram os Estados Unidos e massacraram os americanos? Não, foi o governo dos Estados Unidos que enviou tropas estadunidenses invadir o Vietnã e massacrar os vietnamitas? Respondei, presidente Johnson, a estas perguntas publicamente perante o povo dos Estados Unidos e os povos do mundo! Que os Estados Unidos terminem sua guerra de agressão ao Vietnã e retirem todas as suas tropas e as dos países satélites e a paz voltará imediatamente. A posição do Vietnã é clara: consiste nos quatro pontos (1) do (1) Os 4 pontos da República Democrática do Vietnâ: 1) reconhecimento dos direitos nacionais fundamentais do povo vietnamita: paz, independência, soberania, unidade e integridade territorial. Conforme os acordos de Genebra, o governo dos EUA deve retirar suas tropas, pessoal militar e armas de todas as espécies para fora do Vietnã do Sul, liquidar bases militares que estabeleceu e abolir sua “aliança militar” com Saigon. O governo estadunidense deve pôr fim à sua política de intervenção e de agressão ao Vietnã do Sul. Conforme os acordos de Genebra, o governo americano deve pôr fim aos seus atos de guerra contra o Vietnã do Norte, cessar imediatamente todo e qualquer atentado contra o território e contra a soberania da República Democrática do Vietnã. 2) Até a realização da reunificação do Vietnã por meios pacíficos, e enquanto nosso país continuar provisoriamente dividido em duas zonas, é preciso respeitar disposições militares dos Acordos de Genebra de 1954 sobre o Vietnã, como a abstenção para as duas zonas em participar em qualquer aliança militar com um país estrangeiro, a interdição de estabelecer bases militares, de introduzir tropas e pessoal militar estrangeiro em nosso território. 3) Os assuntos do Vietnã do Sul devem ser regulados pelo seu povo, segundo o programa político da Frente Nacional de Libertação, sem intervenção estrangeira. 4) A reunificalção do Vietnã por meios pacíficos será assunto da população das duas zonas sem ingerência estrangeira.

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Governo da República Democrática do Vietnã e nos cinco pontos (2) da Frente de Libertação do Vietnã do Sul. Não há outra via! O povo vietnamita ama profundamente a paz, uma paz verdadeira, a paz na independência e na liberdade e não uma falsa paz, uma “paz americana”. Para a independência da Pátria, para cumprir nosso dever perante os povos em luta contra o imperialismo americano, o nosso povo e o nosso exército, unidos como um só homem, combaterá resolutamente até a vitória final, sejam quais forem os sacríficos e as privações. Ainda há pouco, em condições muito mais difíceis, nós vencemos os fascistas japoneses e os colonialistas franceses. Hoje, as condições nacionais e internacionais são mais favoráveis, a luta do nosso povo contra a agressão americana pela salvação nacional será certamente vitoriosa. ••• Caros compatriotas e combatentes, Estamos certos da justeza da nossa causa, da nossa união nacional de Norte a Sul, da nossa tradição de luta indomável, da simpatia e do amplo apoio dos países socialistas irmãos e dos povos progressistas do mundo inteiro. Venceremos. Perante a situação que acaba de se criar, estamos unanimemente determinados a suportar todas as privações e a consentir todos os sacrifícios para levar a bom termo a gloriosa tarefa histórica que cabe ao nosso povo: vencer os agressores estadunidenses!

(2) Os cinco pontos da Frente Nacional de Libertação do Vietnã do Sul: 1) O sabotador dos Acordos de Genebra, o favorecido da guerra, o agressor, descarado inimigo jurado do povo vietnamita, é o imperialismo ianque. 2) O povo heroico do Vietnã do Sul está decidido a expulsar os imperialistas estadunidenses para libertar o seu território, fundar um Vietnã do Sul independente, democrático, pacífico e neutro, encaminhando-se rumo à reunificação da pátria. 3) O povo e as forças de libertação do heroico Vietnã do Sul estão decididos a realizar, da forma mais completa, a missão sagrada que lhes está destinada: expulsar os imperialistas estadunidenses para libertar o Sul e preservar o Vietnã do Norte. 4) O povo do Vietnã do Sul exprime o seu profundo reconhecimento aos povos amantes da paz e da justiça do mundo inteiro pelo seu apoio caloroso a declarar-se pronto a aceitar toda a ajuda, incluindo a ajuda em armamento ou outros meios de guerra dos seus amigos dos cinco continentes. 5) Formando um só bloco, nosso povo em armas continua a avançar heroicamente, decidido a combater e a vencer os piratas americanos e os traidores, seus lacaios.

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Em nome do povo vietnamita, aproveito esta ocasião para agradecer calorosamente aos povos dos países socialistas e aos povos progressistas do mundo, incluso o povo estadunidense, por seu apoio e seu auxílio devotados. Perante as novas intrigas e os novos crimes dos imperialistas americanos, estou convencido de que os povos e os governos dos países socialistas irmãos, dos países amantes da paz e da justiça no mundo apoiarão e ajudarão ainda mais vigorosamente o povo vietnamita em sua luta patriótica contra a agressão americana até a vitória total. O povo vietnamita vencerá! Os agressores americanos serão vencidos! Compatriotas e combatentes em todo o país, avançai corajosamente! Viva o Vietnã pacifico, reunificado, independente, democrático e próspero! Fonte: Selected Works of Ho Chi MIhn, Hanoi, Foreign Languages Publishing House.

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A Grande Revolução de Outubro abriu a via para a libertação dos povos Artigo escrito por ocasião do 50º aniversário da Grande Revolução de Outubro e publicado no jornal russo Pravda, em 1967

Com o povo soviético e as populações laboriosas do mundo inteiro, o povo vietnamita festeja com alegria imensa o 50º aniversário da Grande Revolução Russa de Outubro. No auge do seu combate contra a agressão estadunidense e pela salvação nacional, firmemente decidido a vencer os agressores americanos e a conduzir a bom termo a edificação do socialismo em seu país, o povo vietnamita, com o coração pleno de gratidão e de confiança, dirige ardentemente sua atenção para a URSS, a pátria do grande Lênin e da gloriosa Revolução de Outubro. Como um sol radioso, a Revolução de Outubro ilumina o universo com sua luz e desperta milhões e milhões de oprimidos e explorados no mundo. Nunca houve na história da humanidade uma revolução de tão grande e tão profundo significado. A Revolução de Outubro foi a primeira vitória do marxismo e das teorias leninistas em um grande país, a União Soviética, cujo território cobre a sexta parte do globo. É a maior vitória alcançada pela classe operária, as populações laboriosas e os povos oprimidos sob a direção da classe operária e da sua vanguarda, o Partido Bolchevique. Usando a violência revolucionária para derrubar a burguesia e a classe feudal dos proprietários de bens fundiários, a Revolução de Outubro instaurou o poder dos trabalhadores, ergueu uma sociedade absolutamente nova, onde a exploração do homem pelo homem foi banida. A Revolução de Outubro abriu a via à libertação nacional dos povos, à libertação da humanidade inteira. Marca o início de uma nova época histórica, a da passagem do capitalismo ao socialismo à escala mundial. Sobre o alcance histórico da Revolução de Outubro, Lênin disse: “nós temos razão para estarmos orgulhosos, estamos de fato, de nos ter pertencido a felicidade de começar a edificação do Estado Soviético, de inaugurar assim uma nova época na história mundial, época do domínio de uma classe, oprimida em todos os países capitalistas e encaminhando-se por todo lado para uma vida nova, para a vitória sobre a burguesia, para a dita260


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dura do proletariado, para a libertação da humanidade do jugo do capital e das guerras imperialistas” (1). A evolução do mundo há 50 anos provou de forma eloquente a justeza da comprovação genial de Lênin. Com efeito, após o acontecimento da Revolução de Outubro, o mundo conheceu grandiosas modificações revolucionárias! A URSS, primeiro Estado da ditadura do proletariado, testemunhou a sua extraordinária força. Desde sua fundarão não somente destruiu a resistência dos contrarrevolucionários no país, como ainda esmagou a intervenção armada de 14 potências imperialistas: após menos de 30 anos, pela sua vitória completa sobre os fascistas alemães, italianos e japoneses em conluio, não apenas salvaguardou o Estado soviético, mas contribuiu consideravelmente para a libertação de outras nações e salvou a humanidade inteira do jugo fascista. Apesar das enormes devastações da guerra, apesar das numerosas privações e sacrifícios (20 milhões de mortos, 1.710 cidades destruídas e mais de 30 mil fábricas danificadas) sob a justa direção do Partido e graças aos esforços inauditos de todo o seu povo, a União Soviética pôde, em uma luta extremamente heroica, curar suas feridas em alguns anos, levar a bom termo a edificação do socialismo e passar à edificação material e técnica do comunismo. Tornou-se uma grande potência industrial dotada de uma base científica e técnica das mais modernas do mundo e encontra-se entre os pioneiros da conquista do cosmos. Após a Revolução Russa de Outubro, o trinfo da Revolução Chinesa foi igualmente de imenso alcance internacional. É uma nova grande vitória do marxismo-leninismo em um país semicolonial e semifeudal de 700 milhões de habitantes, alcançada sob a direção do Partido Comunista Chinês. Em menos de vinte anos, de um país agrícola atrasado duramente oprimido e explorado pelos imperialistas estrangeiros, pela burguesia burocrática e pelos senhores feudais, a China ergueu-se para reconquistar e consolidar sua independência nacional, construir o socialismo, para se tornar hoje uma grande potência dotada de uma indústria moderna, de uma agricultura próspera, de uma base científica e técnica de vanguarda. O triunfo das revoluções de libertação nacional e das revoluções socialistas, na Polônia, Bulgária, República Democrática Alemã, Hungria, (1) LÊNIN. Obras Completas, tomo 32, p. 17.

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Romênia, Tchecoslováquia, Albânia, Mongólia, Coreia, em Cuba e no Vietnã, foi igualmente de um enorme alcance histórico. Graças a todas estas vitórias, se constituiu um sistema socialista mundial que se estende ininterruptamente da Europa Central ao Sudeste Asiático, com um primeiro posto avançado na América Latina. O campo socialista tomou corpo e sua força cresce cada vez mais. Este é o fator determinante ao desenvolvimento da revolução mundial e o futuro radioso da humanidade. Estimulados e apoiados pelo triunfo da Revolução de Outubro e das revoluções nos países socialistas, o movimento revolucionário da classe operária dos países capitalistas e o movimento de libertação nacional das colônias aumentam impetuosamente e atingem uma escala nunca antes vista. Na Ásia, na África e na América Latina, o movimento de libertação nacional desencadeia-se como uma tempestade e faz desmoronar, pouco e pouco, o sistema colonial do imperialismo, libertando centenas de milhões de homens das algemas da escravidão, abrindo-lhes a via para a independência e para a liberdade. O campo socialista, o movimento de luta da classe operária nos países capitalistas e o movimento revolucionário de libertação nacional, conjugando suas imensas forças, constituem uma força formidável constantemente lançada contra os bastiões do imperialismo encabeçado pelo imperialismo estadunidense. No campo de batalha do mundo, as forças revolucionárias e da paz, hoje, levam a melhor sobre as forças imperialistas, reacionárias e belicistas. No conjunto, a revolução mundial encontra-se em posição de ofensiva e de vitória e vê crescer a sua força. Pelo contrário, o imperialismo e as outras forças reacionárias estão encurralados na defensiva, no declínio, na derroto e caminham para o seu aniquilamento. O socialismo, o comunismo, bons sonhos da humanidade, tornaram-se, após a Revolução de Outubro, uma realidade social dotada de uma imensa força capaz de mobilizar centenas de milhões de homens na luta revolucionária pela paz, a independência nacional, a democracia e o progresso social. A grande vitória da Revolução de Outubro deu à classe operária, às populações trabalhadoras e aos povos oprimidos do mundo inúmeros ensinamentos preciosos, que garantem o sucesso da libertação completa da classe operária, e o povo do Vietnã aprende cada vez mais os ensinamentos de Lênin e as grandes lições tiradas da Revolução de Outubro.

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- A necessidade de um autêntico partido revolucionário da classe operária, devotado de corpo e alma ao povo. Só a direção de um partido capaz de aplicar, de maneira criadora, o marxismo-leninismo nas condições concretas de um país pode conduzir a revolução de libertação nacional e a revolução socialista à vitória. - Realizar, custe o que custar, a aliança dos operários e dos camponeses, pois é a mais segura garantia da vitória da revolução. Só esta aliança, sob a direção da classe operária, permite aniquilar resoluta e totalmente as forças contrarrevolucionárias, conquistar e consolidar o poder das massas laboriosas, levar a bom termo a missão histórica da revolução nacional democrática e marchar rumo ao socialismo. - Sob direção da classe operária, e com base na aliança sempre consolidada entre operários e camponeses, é necessário em cada etapa revolucionária agrupar todas as forças revolucionárias e progressistas em uma ampla frente, realizar sua unidade de ação contra o inimigo comum das mais variadas formas. - Na áspera luta contra o inimigo de classe e da nação, é necessário opor a violência revolucionária à violência contrarrevolucionária para a conquista e a salvaguarda do poder. Há que se ter em conta a situação concreta para adotar formas de luta revolucionária adequadas, empregar de forma judiciosa e combinar habilmente a luta armada e a luta política para assegurar o sucesso da revolução. - Reforçar e consolidar sem cessar a ditadura do proletariado. Após a conquista do poder, a tarefa primordial da classe operária é reforçar a ditadura do proletariado para levar a bom termo as tarefas históricas da revolução, abolir radicalmente a exploração do homem pelo homem, estabelecer relações de produção socialista, construir o socialismo para a independência nacional e pelo socialismo. - Na luta de morte travada entre classe operária, populações laboriosas e povos oprimidos, de um lado, e imperialistas e seus lacaios, traidores à pátria, senhores feudais e burgueses reacionários, de outro, os povos dos diferentes países devem dar provas de espírito revolucionário radical, erguer bem alto a bandeira do heroísmo revolucionário e lutar com resolução até o fim, sem recuar ante provas e sacrifícios, pela independência nacional e pelo socialismo. - Aliar estreitamente o patriotismo ao internacionalismo proletário no decurso tanto da revolução de libertação nacional, como da revolução socia-

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lista. Em nossa época, a revolução de libertação nacional é parte integrante da revolução proletária em escala mundial. Para triunfar completamente, a revolução de libertação nacional deve conduzir à revolução socialista. A vitória da luta pela independência e pela liberdade dos povos está ligada à ajuda e ao apoio ativos do campo socialista e do movimento operário dos países capitalistas. “Proletários de todos os países e povos oprimidos, uni-vos!”. Este apelo sagrado de Lênin ecoa sempre em nossos ouvidos e nos recorda que é preciso preservar e reforçar permanentemente a grande união das forças revolucionárias para o bem dos interesses comuns da classe operária e da humanidade. Estas são em poucas palavras as experiências tiradas da prática da nossa revolução vietnamita. Um ditado vietnamita recomenda: “ao beber água, pensai na fonte”. Recordando-se das humilhações dos dias nos quais perderam sua independência, relembrando as diferentes etapas da luta revolucionária plena de privações e de sacrifícios, mas repleta de vitórias gloriosas, a classe operária e o povo do Vietnã não podem deixar de pensar com gratidão em tudo o que eles devem a Lênin e à Revolução de Outubro. Antes da Revolução de Outubro, o povo do Vietnã, que os imperialistas e colonialistas tinham amordaçado e cegado, ignorava totalmente o marxismo e nunca havia ouvido falar de Lênin. Com o triunfo retumbante da Revolução de Outubro, o marxismo-leninismo começou a propagar-se no nosso país. No começo de 1930, o Partido Comunista Indochinês (atualmente Partido dos Trabalhadores do Vietnã) nasceu e colocou-se à cabeça da luta revolucionária. Um movimento de libertação nacional desenvolveu-se impetuosamente e atingiu o seu ponto culminante com a criação dos sovietes do Nghê Tinh (1930-1931). Desde então, a classe operária e o povo do Vietnã descobriram a via da sua libertação. A despeito da repressão sangrenta dos colonialistas, o povo vietnamita avançava com determinação. Em agosto de 1945, aproveitando o fato de o heroico exército soviético ter derrotado sucessivamente os fascistas alemães e japoneses, o Partido Comunista Indochinês tomou a direção duma insurreição geral para conquistar o poder à escala nacional, derrubar os fascistas japoneses assim como os seus lacaios e fundar a República Democrática do Vietnã. A Revolução de Agosto no Vietnã foi a primeira revolução nacional democrática popular a triunfar no Sudeste Asiático. O jovem poder não tinha ainda um mês de existência, suas forças não tinham ainda podido

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ser erguidas e consolidadas e, no entanto, o povo vietnamita, armado de lanças de bambu, empreendeu uma longa e heroica resistência contra a agressão dos colonialistas franceses apoiados pelos imperialistas estadunidenses, conseguiu finalmente conquistar a grande vitória de Dien Bien Phu e libertar completamente o Norte do país. Os acordos concluídos em 1951, em Genebra, reconheceram oficialmente os direitos fundamentais do povo vietnamita: independência, soberania, unidade e integridade territorial. Desde 1954, nosso povo empreendeu duas missões revolucionárias de caráter estratégico: transformação socialista e edificação socialista no Norte e, simultaneamente, luta patriótica para libertar o Sul do jugo dos imperialistas estadunidenses, assim como dos seus lacaios, e encaminhar-se rumo à reunificação do nosso país. A revolução socialista do Norte alcançou grandes sucessos. Após ler levado a bom termo a reforma agrária, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã guiou o povo na transformação socialista da agricultura, do artesanato, do comércio e da indústria capitalistas, assim como do pequeno negócio, estabeleceu novas relações de produção, aboliu a explorarão do homem pelo homem. As bases materiais e técnicas do socialismo estão em plena edificação, a produção agrícola e industrial toma um impulso contínuo, o nível de vida da população não cessa de aumentar. No domínio cultural, o analfabetismo está liquidado e a educação desenvolve-se. Durante todos estes anos, apesar do terror e dos massacres bárbaros perpetrados pelos imperialistas estadunidenses e os traidores, seus lacaios, no Vietnã do Sul, nossos compatriotas, longe de se submeterem, prosseguiram uma luta política e uma luta armada extremamente heroica. A população do Vietnã do Sul aniquilou a “guerra especial” dos estadunidenses e está em vias de fazer malograr a “guerra local”, guerra de agressão de uma ferocidade inaudita empreendida por mais de um milhão de homens – perto de 50 mil soldados do corpo expedicionário US e mais de meio milhão de soldados do exército fantoche e dos países satélites –, milhares de aviões, centenas de navios de guerra, milhões de toneladas de armamento moderno e os meios de guerra mais bárbaros, como produtos químicos e gases tóxicos, napalm, bombas etc. Mais ferozes do que os fascistas hitleristas no seu tempo, os agressores aplicam por todo lado a política que consiste em queimar tudo, destruir tudo e massacrar tudo. Para sair do seu atolamento no Vietnã do Sul, desencadearam uma guerra de destruição aérea e naval cada vez mais encarniçada contra o Norte do nosso país. Bombardearam

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nossas vias de comunicação, nossas zonas industriais, nossas regiões populosas, tanto nas cidades como nos campos, nossos hospitais, escolas, igrejas, templos e pagodes, diques e obras hidráulicas etc. Eles pensam erradamente poder, com as bombas e as granadas, abalar o patriotismo e sabotar a sagrada união militante do nosso povo nas duas zonas, Norte e Sul. Pela independência e a liberdade da sua pátria, os 31 milhões de vietnamitas continuam unidos como um só homem em um combate resoluto contra o imperialismo estadunidense, para a salvação nacional, e estão inteiramente determinados a vencer os agressores. A resistência patriótica do povo vietnamita à agressão estadunidense conquistou grandes vitórias. No teatro das operações no Vietnã do Sul, apenas durante as duas últimas estações de seca (2), as perdas do inimigo elevam-se a 290 mil homens, dos quais 128 mil foram soldados dos países satélites. Durante a primeira campanha da estação de seca (1965-1966), em um total de 700 mil soldados estadunidenses, fantoches e satélites, o exército de libertação e as forças de guerrilha do Vietnã do Sul puseram fora de combate 114 mil homens. Durante a estação de seca de 1966-1967, de um total de 1,2 milhão de inimigos, 175 mil foram postos fora de combate. No Norte, de agosto de 1964 a setembro de 1967, mais de 2.300 aviões US foram abatidos. É, então, claro que, quanto mais os imperialistas estadunidenses aumentam o efetivo do seu corpo de invasão, mais pesadas serão suas perdas. Embora nos esperem ainda numerosos sacrifícios e privações, o povo vietnamita vê aumentar suas forças no seguimento dos combates e alcançará sem dúvida a vitória total. Por que a revolução vietnamita conquistou sucessos tão consideráveis? Por que o povo vietnamita vencerá infalivelmente os agressores estadunidenses muito melhor armados e equipados? Foi graças à justa direção do Partido dos Trabalhadores do Vietnã e da Frente Nacional de Libertação do Vietnã do Sul. Ao estabelecer sua linha política, o Partido dos Trabalhadores do Vietnã esforçou-se sempre para aliar os princípios gerais do marxismo-leninismo à realidade da Revolução Vietnamita e, ao mesmo tempo, aprender com modéstia as preciosas experiências dos partidos irmãos. O nosso Partido preocupou-se sempre em educar os seus quadros, os seus membros e o seu povo de forma a dar-lhes uma alta consciência (2) A estação de seca dura seis meses: de outubro a abril.

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revolucionária, a elevar sua coragem e seu espírito de sacrifício no interesse da classe operária e da nação. O nosso Partido vela constantemente para manter estreitas relações com as massas. É por isto que se beneficia sem reservas da confiança, dedicação e apoio do nosso povo; a linha e as medidas políticas que preconiza são ativamente postas em prática pelas massas. Nosso Partido conseguiu fundar uma Frente Única Nacional anti-imperialista com base na aliança operário-camponesa. Esta Frente inclui os partidos políticos democráticos, as organizações de massas, as congregações religiosas e as diferentes nacionalidades, lutando em conjunto sob a direção do Partido dos Trabalhadores do Vietnã para realizar o programa comum da Frente e edificar um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático e próspero. Nosso Partido sabe utilizar diferentes formas de luta revolucionária, segundo a amplitude do movimento, nomeadamente ao combinar a luta armada com a luta política, para derrotar os agressores em uma guerra popular prolongada, árdua e heroica. Nosso Partido sempre inculcou, nos seus quadros, nos seus membros e nas massas populares, o patriotismo autêntico e o internacionalismo proletário, reforçando constantemente os seus laços de solidariedade e de amizade com a União Soviética, a República Popular da China e os outros países socialistas irmãos. Preconiza que se conte essencialmente com as suas próprias forças, procurando, simultaneamente, a ajuda e o apoio ativo dos países socialistas irmãos e dos povos amantes da paz e da justiça em todo o mundo, inclusive do povo progressista dos Estados Unidos. Baseando-se em sua própria experiência, o povo vietnamita está profundamente convicto de que, na conjuntura atual favorável ao movimento revolucionário, qualquer povo, mesmo pequeno, é capaz de vencer todo agressor imperialista, mesmo seu chefe de fila, os estadunidenses, se estiver estreitamento unido, se combater resolutamente, seguindo uma linha política e militar justa e beneficiar-se da ajuda e do apoio ativos do campo socialista e dos povos revolucionários do mundo. ••• Seguindo a via traçada por Lênin, a da Revolução de Outubro, o povo vietnamita alcançou grandes vitórias. É justamente a razão pela qual sua estima e sua gratidão, com a gloriosa Revolução de Outubro, o grande Lênin e o povo soviético, são muito profundas.

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Recorda-se constantemente de que suas vitórias são inseparáveis da ajuda considerável que recebe da União Soviética e da República Popular da China e dos outros países socialistas irmãos, assim como do apoio ativo dos povos progressistas do mundo inteiro. Por ocasião do 50º aniversário da gloriosa Revolução de Outubro, em nome de todo o povo vietnamita, exprimo meu profundo reconhecimento ao Partido de Lênin e ao povo soviético irmão pela ajuda devotada à nossa resistência contra a agressão estadunidense, para salvação nacional. Na alegria geral experimentada pela classe operária, pelas populações laboriosas e pelos povos oprimidos do mundo ao festejarem o 50º aniversário da grande Revolução de Outubro, o povo vietnamita envia ao povo soviético irmão seus votos de brilhantes conquistas na edificação da base material e técnica do comunismo e deseja-lhes o reforço constante do seu papel na luta dos povos do mundo contra o imperialismo, pela paz, a independência nacional, a democracia e o socialismo. Viva o marxismo-leninismo! Viva a solidariedade fraterna dos povos vietnamitas e soviético! Viva a solidariedade fraterna dos países da grande família socialista e das forças do movimento comunista internacional! Fonte: Selected Works of Ho Chi Minh, Hanoi, Foreign Languages Publishing House, 1962

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Testamento Ho Chi Minh escreveu várias versões de seu Testamento e completou sua revisão final apenas quatro meses antes de falecer. O Testamento foi publicado em 1990, por ocasião do aniversário de 100 anos de seu nascimento.

República Democrática do Vietnã Independência – Liberdade – Felicidade Ainda que a luta de nosso povo contra a agressão dos Estados Unidos pela salvação nacional deva passar por mais dificuldades e sacrifícios, estamos decididos a conquistar a vitória total. Isso é certo. Pretendo, assim que isso se resolva, viajar tanto ao Norte quanto ao Sul para felicitar nossos heroicos camponeses, quadros militares e combatentes, bem como visitar os anciãos e nossas amadas crianças e amados jovens. Assim, em nome de nosso povo, irei aos países irmãos do campo socialista e aos países amigos de todo o mundo para agradecer por seu apoio de coração e a ajuda que deram à luta patriótica de nosso povo contra a agressão dos Estados Unidos. ★★★ Tu Fu, o famoso poeta do período Tang na China, escreveu: “Em todas as épocas, poucos são os que alcançam setenta anos de idade”. Esse ano, levando em consideração que tenho setenta e nove, posso considerar-me entre esses “poucos”. Mesmo assim, minha mente se conserva perfeitamente lúcida, ainda que minha saúde tenha se debilitado um pouco em comparação aos últimos anos. Quando alguém vivencia mais de setenta primaveras, a saúde se deteriora com a idade. Isso não é lá uma maravilha. Mas quem pode dizer quanto tempo mais serei capaz de servir à revolução, à pátria e ao povo? Portanto, deixo estas linhas antecipando o dia em que irei reunir-me com Karl Marx, V. I. Lênin e outros líderes revolucionários. Assim, nosso povo em todo o país, nossos camaradas no Partido e nossos amigos no mundo não serão pegos de surpresa.

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PRIMEIRO, FALAREI SOBRE O PARTIDO: graças à sua estreita unidade e dedicação total à classe operária, ao povo e à Pátria, ele foi capaz, desde sua fundação, de unir, organizar e dirigir nosso povo, de êxito em êxito, numa firme luta. A unidade é uma tradição extremamente preciosa de nosso Partido e do povo. Todos os camaradas, desde o Comitê Central até as células, devem preservar a unidade e a união do pensamento no Partido como a menina dos olhos. No interior do Partido, estabelecer uma ampla democracia e praticar a autocrítica e a crítica de maneira regular e séria é a melhor forma de consolidar e desenvolver a solidariedade e a unidade. O afeto e a camaradagem devem prevalecer. O nosso Partido é um partido no poder. Cada membro do Partido, cada quadro deve estar profundamente inspirado pela moral revolucionária e demonstrar laboriosidade, moderação, integridade, probidade, dedicação total ao interesse público e completo altruísmo. Nosso Partido deverá preservar a pureza absoluta e provar-se digno de seu papel de condutor e servente legal do povo. OS MEMBROS DA JUVENTUDE E NOSSOS JOVENS EM GERAL são bons, sempre estão preparados para se oferecer, sem temer as dificuldades, ansiosos pelo progresso. O Partido deve fomentar suas virtudes revolucionárias e prepará-los para que sejam nossos sucessores, tanto “vermelhos” como “experientes”, na construção do socialismo. A preparação e a educação das futuras gerações de revolucionários são de grande importância e necessidade. O NOSSO POVO TRABALHADOR, nas planícies e nas montanhas, resistiram durante gerações a penúrias, opressão e exploração feudal e colonial. Além disso, experimentaram muitos anos de guerra. Porém, nosso povo também mostrou grande heroísmo, valor, entusiasmo e trabalho. Sempre seguiu o Partido com lealdade incondicional desde que veio à luz. O Partido deve levar a cabo planos eficazes para o desenvolvimento econômico e cultural para melhorar constantemente a vida de nosso povo. A RESISTÊNCIA À AGRESSÃO NORTE-AMERICANA pode se prolongar. Nosso povo corre o risco de enfrentar novos sacrifícios humanos e materiais. Não importa o que passe, devemos manter nossa resolução de 270


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combater os agressores ianques até alcançarmos a vitória total. Nossas montanhas sempre existirão, nossos rios sempre existirão, nosso povo sempre existirá. Com a derrota dos invasores norte-americanos, reconstruiremos nossa terra até fazê-la dez vezes mais bonita. Independentemente das dificuldades e dos contratempos que apareçam, nosso povo está confiante de que obterá a vitória total. Os imperialistas dos Estados Unidos certamente terão de renunciar. Nossa pátria certamente será unificada. Nossos compatriotas no Sul e no Norte certamente serão integrados sob o mesmo céu. Nós, que somos uma nação pequena, obtemos a mais honrosa medalha por termos derrotado, através de uma heroica luta, dois grandes imperialismos: o francês e o norte-americano, bem como por termos dado uma valiosa contribuição ao movimento mundial de libertação nacional. NO QUE RESPEITA AO MOVIMENTO COMUNISTA INTERNACIONAL, o fato de ter sido um homem que dedicou toda a sua vida à revolução me faz sentir ainda mais orgulho do crescimento do comunismo internacional e dos movimentos operários, ainda que me doa a divergência hoje existente entre os partidos irmãos. Espero que o nosso Partido faça todos os esforços possíveis para contribuir na restauração da unidade entre os partidos irmãos que têm por base o marxismo-leninismo e o internacionalismo proletário na razão e no sentimento. Confio plenamente que os partidos e países irmãos irão se unir novamente. SOBRE ASSUNTOS PESSOAIS, por toda a minha vida servi à minha Pátria, à revolução e ao povo com todas as minhas forças e com todo o meu coração. Se agora devo deixar este mundo, não tenho nada de que me lamentar, exceto de não ter sido capaz de servir mais e melhor. Quando já tiver ido, para não desperdiçar o tempo e o dinheiro do povo, devem evitar um funeral oneroso. ★★★ Finalmente, a todo o povo, a todo o Partido, a todo o exército, a meus sobrinhos e sobrinhas, aos jovens e crianças, deixo meu amor ilimitado. Também transmito minhas cordiais saudações a nossos camaradas e amigos, à juventude e à infância de todo o mundo. Meu maior desejo é que nosso Partido e nosso povo, unindo estreitamente seus esforços, construam um Vietnã pacífico, reunificado, independente, democrático, próspero e que deem uma valiosa contribuição à revolução mundial.

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ENTREVISTA Entrevista do embaixador Do Ba Khoa ao jornalista Pedro de Oliveira, em Brasília, Brasil

Um olhar retrospectivo, e também prospectivo, sobre as últimas três décadas

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embaixador da República Socialista do Vietnã, Do Ba Khoa, na oportunidade das comemorações dos 30 anos de relações diplomáticas entre o Brasil e o Vietnã, concedeu-nos a seguinte entrevista: Senhor Do Ba Khoa, quais foram os principais marcos dessa trajetória de trinta anos das relações diplomáticas entre o Brasil e o Vietnã? Do Ba Khoa: O marco mais importante deste relacionamento teve como data relevante o dia 8 de maio de 1989 com a assinatura conjunta entre os dois países sobre o estabelecimento das relações diplomáticas. Em 1994 ocorreu a abertura da Embaixada do Brasil em Hanói, seguida da abertura do Consulado-Geral do Vietnã em São Paulo em 1998. Dois anos depois, em 2000, deu-se a abertura da Embaixada do Vietnã em Brasília. A partir de maio de 2007, estabeleceu-se a parceria bilateral abrangente, quando o Brasil passou a fazer parte do grupo de 29 países que são parceiros estratégicos/ abrangentes do Vietnã. E qual é sua avaliação desse período de cooperação e amizade? Do Ba Khoa: Desde o estabelecimento das relações, especialmente desde o estabelecimento da parceria abrangente, os laços de amizade e cooperação entre os dois países têm conhecido desenvolvimentos positivos em todos os campos e refletem o espírito da parceria abrangente, bem como aspirações do governo e do povo dos dois países, em benefício dos dois povos e pela paz, por estabilidade e desenvolvimento da região e do mundo.

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Quais seriam, em sua opinião, os resultados mais importantes alcançados durante essa trajetória? Do Ba Khoa: O aspecto que se poderia destacar é a confiança política mútua, cada vez mais fortalecida, uma compreensão estre os dois países mais aprofundada através de centenas de visitas em todos os níveis, especialmente através de encontros bilaterais de alto nível, como foi a visita de Estado do presidente Tran Duc Luong em novembro de 2004. Em seguida ocorreu a visita de Estado do Secretário-Geral do Partido Comunista do Vietnã, Nong Duc Manh, ao Brasil em maio de 2007. A partir daí, vieram a visita de Estado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Vietnã em setembro de 2010 e a visita da vice-presidente vietnamita, Nguyen Thi Doan, ao Brasil em maio de 2015. Seguiram-se a visita do ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, ao Vietnã em setembro de 2016, as visitas oficiais do ministro de Estado das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira, em setembro de 2017 e em maio de 2018. Depois, ao Brasil, tivemos a visita oficial do vice-primeiro-ministro, Vuong Dinh Hue, em julho de 2018 e a do vice-presidente da Assembleia Nacional, Uong Chu Luu, em abril de 2019. Em perspectiva teremos a visita da ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina ao Vietnã, a ser efetuada em maio de 2019. Como tem sido a cooperação entre os dois países na esfera jurídica? Do Ba Khoa: O quadro jurídico para a cooperação tem sido reforçado com a assinatura e a implementação de 14 acordos, protocolos e memorandos de cooperação na base da confiança política e do entendimento mútuo aprofundado nas seguintes áreas: realização de um acordo de cooperação cultural entre os dois governos, em outubro de 2003; acordo de Cooperação Científica e Tecnológica em fevereiro de 2008; assinatura de um memorando de cooperação entre os dois governos sobre o combate à pobreza, em julho de 2008; concretização de um acordo sobre isenção de vistos para titulares de passaportes de serviço, em novembro de 2008; memorando de entendimento para o estabelecimento da Comissão Mista entre os dois governos, em julho de 2008; assinatura de protocolo de cooperação entre os dois governos sobre a produção e o uso de etanol combustível, em fevereiro de 2008; acordo de Cooperação em Saúde e

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Entrevista

Ciências Médicas entre os dois governos em maio de 2007; acordo de cooperação no transporte marítimo em setembro de 2017; acordo de cooperação na aviação civil em julho 2018; assinatura dos seguintes memorandos de cooperação: na área de turismo em agosto de 2016, entre a Academia Diplomática do Vietnã e o Instituto Rio Branco do Brasil em maio de 2018, entre a Organização vietnamita das Associações de Amizade (VUFO) e a Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) em maio de 2018, na esfera agrícola em julho de 2018, entre a Câmara da Indústria e Comércio do Vietnã (VCCI) e a Agência Brasileira de promoção de Exportações e Investimento (APEX) em julho de 2018; o acordo de cooperação educacional entre os dois governos e o Memorando de cooperação em defesa nacional estão prontos para assinatura no momento apropriado. O acordo-quadro sobre cooperação científica e técnica também está em fase final de negociações. Quais mecanismos de cooperação bilateral estão em curso atualmente? Do Ba Khoa: Os mecanismos de cooperação bilateral, bem como a Comissão Mista dos dois governos e a consulta política entre os dois Ministérios das Relações Exteriores, foram estabelecidos e têm mantido suas atividades. Os dois países valorizaram e continuam a valorizar a tradição de prestar apoio recíproco nos fóruns das Nações Unidas e organizações internacionais, melhorando conjuntamente o seu perfil na região e no mundo. Por exemplo, podemos citar o apoio recíproco contínuo ao processo de desenvolvimento nacional; o apoio confirmado ao Brasil à candidatura como membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU para o período 2020-2021; o apoio do Brasil ao Vietnã como membro do Conselho de Direitos Humanos para o período 2014-2016 e como membro do Conselho Econômico e Social para o período 2016-2018. Já há tempos, o Vietnã tem reafirmado suporte contínuo ao Brasil em fóruns internacionais e está comprometido a apoiá-lo como candidato a membro permanente do Conselho de Segurança da ONU quando este for reformado, a membro do Conselho de Direitos Humanos para o período 2012-2015 e do Comitê de Eliminação da Discriminação contra a Mulher (CEDAW) para o mandato 2013-2016 e como presidente da Organização Mundial do Café 2017.

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Ho Chi Minh

Qual o significado concreto de uma parceria abrangente citada pelo senhor no início desta entrevista? Do Ba Khoa: Uma parceria abrangente é expressa na promoção de relações entre a Assembleia Nacional ou o Congresso Nacional dos dois países. É o caso dos intercâmbios entre a Assembleia Nacional do Vietnã e o Congresso Nacional do Brasil que tem partilhado regularmente delegações e já criaram mecanismos para estabelecer as condições para que seus deputados compartilhem informações e experiências parlamentares através das atividades do Grupo Parlamentar em cada uma de suas instâncias. A delegação da Assembleia Nacional do Vietnã, encabeçada pelo seu vice-presidente Uong Chu Luu, efetuou uma visita de trabalho ao Brasil de 20 a 24 abril de 2019. A visita do presidente do Senado do Brasil, Davi Alcolumbre, no Vietnã está sendo programada. Recentemente renovamos o Grupo Parlamentar de Amizade Vietnã-Brasil na Assembleia Nacional do Vietnã e do seu parceiro, o Grupo Parlamentar Brasil-Vietnã no Congresso Nacional do Brasil. O que o senhor teria a dizer sobre a relação entre cidades irmãs do Brasil e do Vietnã? Do Ba Khoa: A irmandade entre cidades, províncias e estados e organizações populares de ambos os países tem sido um aspecto da parceria abrangente bilateral e foi estabelecida e desenvolvida neste período de três décadas. Firmamos a parceria entre as cidades de Hue e São Luís (Maranhão); entre a província de Can Tho e o estado do Maranhão; entre as cidades de Hai Phong e Curitiba (Paraná). Está em andamento a possível parceria – a ser estabelecida num futuro breve – entre as cidades de Ho Chi Minh e a capital São Paulo. Ressaltamos igualmente a Cooperação estabelecida entre a Associação de Amizade e Cooperação Vietnã-Brasil e a AbraViet do Brasil, ambas com filiais provinciais e estaduais. Este ramo da diplomacia pública tem contribuído de forma importante para a melhoria da compreensão mútua entre os nossos dois povos, uma fundação básica para o relacionamento entre as duas nações. O senhor poderia nos informar sobre o processo de relações comerciais entre os dois países? Do Ba Khoa: A cooperação comercial é um ponto brilhante na relação entre os dois países, com o valor de troca comercial aumentando continuamente

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Entrevista

ao longo dos anos. Em apenas oito anos, de 2010 a 2018, o valor comercial bilateral aumentou mais de quatro vezes: de US$ 1,03 bilhão (2010) para US$ 4,5 bilhões (2018). A complementaridade e a não concorrência direta são as características proeminentes nas trocas comerciais dos dois países. 2004: US$ 59 milhões 2005: US$ 113,8 milhões 2010: US$ 1,03 bilhão 2011: US$ 1,53 bilhões 2012: US$ 1,6 bilhão 2013: US$ 2,1 bilhões 2014: US$ 3,17 bilhões 2015: US$ 3,91 bilhões 2016: US$ 3,05 bilhões 2017: US$ 3,93 bilhões 2018: US$ 4,51 bilhões Quais as perspectivas para o futuro destas relações, embaixador? Do Ba Khoa: Temos grandes vantagens e oportunidades para a continuidade de nossas relações, pois uma boa plataforma de relacionamento foi construída nos últimos 30 anos. Baseamos esta perspectiva na confiança mútua e na determinação política dos respectivos líderes de ambos os países. Outro fator importante é a posição dos dois países nas duas regiões e a estabilidade no crescimento econômico, além de áreas amplas para a cooperação bilateral e regional. São exemplos dessas áreas de ampliação a continuação dos mecanismos de cooperação bilaterais e tradicionais e apoio recíproco nas organizações internacionais; a cooperação científica e técnica na indústria de defesa com a participação da Avibras, no campo da agricultura, onde ambos os países têm vantagens, na agricultura de alta tecnologia, na agricultura sustentável, na adaptação às mudanças climáticas e em produtos como etanol, cana de açúcar, café, arroz, aquicultura e processamento de frutos do mar. 277


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Outro exemplo importante é a cooperação na aviação civil com participação da Embraer, e o investimento de empresas brasileiras no Vietnã, ASEAN (Associação das Nações do Sudeste Asiático), e empresas vietnamitas no Brasil-Mercosul. Fator decisivo nesse processo é a maior abertura de mercados para os produtos agrícolas dos dois países e a diversificação de produtos no intercâmbio comercial, promovendo ao mesmo tempo o comércio regional na ASEAN e no Mercosul. Em outra esfera de grande projeção para o futuro, encontra-se a cooperação educacional com intercâmbio de professores e estudantes entre universidades. Gostaria de destacar, nesta esfera do desenvolvimento entre nossos dois países, a concretização e o aprofundamento da cooperação entre as províncias e cidades do Vietnã e os estados e cidades do Brasil no planejamento, desenvolvimento e administração urbana, no comércio e investimento, e na divulgação cultural. Que medidas precisam ser implementadas para a melhoria da parceria abrangente bilateral? Do Ba Khoa: Deveremos nos esforçar para o fortalecimento do intercâmbio de delegações, incluindo delegações de alto nível e de nível ministerial. São exemplos a valorizar a delegação do vice-presidente da Assembleia Nacional da Visita ao Brasil em abril deste ano e a delegação do Ministério da Agricultura de Tereza Cristina. Os Ministérios da Defesa, da Economia, da Cultura do Vietnã, o Banco do Estado, as cidades e províncias de Ho Chi Minh, Hai Phong, Tien Giang têm plano de efetuar visitas ao Brasil em 2019. Estão em preparação também a 3ª Reunião da Comissão Mista Vietnã-Brasil e a assinatura de um acordo-quadro de cooperação científica e técnica entre os dois governos. Logo mais realizaremos as assinaturas do Memorando de cooperação em defesa (já pronto), e do Acordo de Cooperação em Educação (também pronto); a implementação do Acordo na aviação civil com a participação de Embraer; os esforços para implementar o Memorando de cooperação em turismo; a redução bilateral de barreiras técnicas e maior abertura bilateral de mercados para produtos agrícolas; concretização da possibilidade das negociações sobre o Acordo de Livre Comércio do Vietnã/Mercosul, através da reunião ministerial Vietnã-Mercosul em Buenos Aires no mês de maio do ano em curso; e a assinatura de Memorando de Cooperação entre Hai Phong e Curitiba e entre as cidades de Ho Chi Minh e São Paulo. 278


POEMA

Ao fim de quatro meses “Um dia na prisão é como mil dias fora dela...” Como estavam certos os antigos, expressando isso assim! Quatro meses numa vida que nada teve de humana Me envelheceram mais de dez anos. É, nesses quatro meses não comi uma só vez que me saciasse, Nesses quatro meses não dormi uma só noite confortável, Nesses quatro meses não mudei de roupa, e em quatro meses Não tomei banho uma única vez. Eis aí: perdi um dente, meu cabelo embranqueceu, E, magro e escuro como um demônio mordido pela fome, Estou agora coberto de sarna. Felizmente, Sendo obstinado e paciente, nunca recuando um centímetro, Embora meu corpo sofresse muito, meu espírito permaneceu inabalável.

Escrito por HO CHI MINH na prisão

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Esta publicação foi composta nas fontes Latin 725BT, Aller e Open Sans. Impressa em papel Polen Soft LD 80g pela PlenaPrint gráfica inteligente para a editora Anita Garibaldi em 2020




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