22 A DÉCIMA TERCEIRA BALA (Baseado no conto: Mineirinho, de Clarice Lispector)
Texto de Tomzé Silva
E por que não amar um fora da lei, se a bala que o matou saiu de mim, a mais cruel das armas produzidas pelo homem?! Como não amá-lo, se ele viveu até o décimo terceiro tiro? O que eu dormia? Eu dormia o sono dos justos? Dos inocentes? Eu conseguia colocar a cabeça sobre o travesseiro todas as noites para um repouso suave? Impossível, talvez... Enquanto milhares padecem frio e fome no chão sujo e úmido, sobre uma marquise de loja, ponte ou viaduto ou até debaixo de uma árvore…
Eu me ajoelho aos pés da cruz e faço minha
oração e egoisticamente peço a Deus por mim e pelos meus. E a sua violência é inocente, não nas suas consequências, mas em si, na essência de um inocente, como a de um filho de quem o pai não tomou conta. Minha violência é maligna, que se traduz em barbárie contra os meus semelhantes, os meus iguais. Ao contrário de muitos, eu não sou condenado, pois meu comportamento social é adequado ao convívio humano. Minha humanidade perde-se ao longo dos meus dias, atravessa a minha arrogância, minha soberba, mesmo assim não sou réu, e até ganho louros por isso. Quem sou? Que espécie de humano eu sou? Não! Não pertenço a essa classificação humana! Eu sou a décima terceira bala. Aquela que já não mata, mais atinge o que já está morto.
Tomzé Silva, Cearense de Fortaleza, assume-se escritor e poeta, ator e pedagogo. Participou de algumas antologias, como Poesis 2019, Revista Ecos da Palavra e do livro Almanaque Fortaleza dos Maracatus. Foi divulgador de conteúdos literários no perfil @poeta.tomze até o início de 2022. Tem um livro publicado: Cores entre versos, escrito em 2020 e lançado em 2022