ALEXANDRE SANT’ANNA/DIVULGAÇÃO
PÉTALA LOPES/DIVULGAÇÃO
Leitura
VERSOS A poesia para além do gênero
O aumento na produção e visibilidade da nova leva de autoras é um dos responsáveis por oxigenar e polemizar o cenário da poesia contemporânea do país TEXTO Marina Moura
Em 2009, a professora de Literatura
brasileira da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Heloisa Buarque de Hollanda, organizou a antologia Otra línea de fuego: quince poetas brasileñas ultracontemporaneas (Maremoto, edição bilíngue). O livro está dividido em três etapas, de acordo com cores, para diferenciar as gerações das poetas. Na parte amarela, as nascidas entre as décadas de 1940 e 1950, a exemplo de Alice Ruiz e Ana Cristina César. Já a cor verde representa aquelas cujo nascimento data de 1960 a
1970, como Angélica Freitas. Por fim, a azul apresenta poetas mais jovens, da geração de 1980 em diante. Nessa última seção, encontramse autoras como Alice Sant’Anna, Ana Guadalupe e Bruna Beber. Otra línea de fuego talvez seja a evidência daquilo que pode ser um dos importantes fatores para oxigenar a atual poesia brasileira: o aumento da produção, presença e visibilidade femininas. Embora, entre elas, possam ser traçadas algumas semelhanças temáticas (algo como uma
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desmitificação do que seria considerado poético e uma valorização das sutilezas do cotidiano) e formais (fluidez no ritmo e na métrica, interação com a oralidade), não se pode dizer que haja uma escrita tipicamente feminina. Expressão, aliás, rechaçada por Heloisa no prefácio de Otra línea, no qual considera o rótulo “tacitamente excludente”. A opinião, aliás, vai ao encontro do que a filósofa teórica feminista estadunidense Judith Butler afirma em Problemas de gênero – Feminismo e subversão da identidade (Civilização Brasileira, 2009): “Se alguém ‘é’ uma mulher, isso certamente não é tudo o que esse alguém é.” Existe certa dificuldade entre teóricos e poetas da atual geração para definir se é dever defender uma poesia universalizante, mais aproximada do ideal feminista existencialista proposto por Simone de Beauvoir no século 20; ou se existe, de fato, uma representação, um território do gênero feminino que não pode nem deve ser ignorado. A poeta gaúcha Angélica Freitas, autora de Rilke shake (7Letras/Cosac Naify, 2007) e Um útero é do tamanho de um punho (Cosac Naify, 2009) lembra que, no começo dos