Monografia - DÉBORA DE SOUZA DUARTE DEUS AMA, O HOMEM MATA: UMA ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO DA

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL CURSO DE JORNALISMO

DÉBORA DE SOUZA DUARTE

DEUS AMA, O HOMEM MATA: UMA ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO DAS MINORIAS PRESENTES NA GRAPHIC NOVEL SOB A VISÃO DA SEMIÓTICA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

São Paulo 2019

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL CURSO DE JORNALISMO

DEUS AMA, O HOMEM MATA: UMA ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO DAS MINORIAS PRESENTES NA GRAPHIC NOVEL SOB A VISÃO DA SEMIÓTICA

Débora de Souza Duarte 1633177-0

Monografia apresentada ao curso de Jornalismo da Universidade Cruzeiro do Sul, como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Jornalismo.

Orientador: Professor Me. Luiz Vicente de Lima Lazaro.

São Paulo 2019

FOLHA DE APROVAÇÃO Título do TCC: Deus ama, o homem mata: uma análise da representação das minorias presentes na graphic novel sob a visão da semiótica Modalidade: Monografia (X)

Trabalho Experimental ( )

Nome: Débora de Souza Duarte RGM: 1633177-0 Assinatura da aluna: _________________________________________ Assinatura do supervisor: _________________________________________

Nome do avaliador I

Nota

Assinatura do avaliador I

Nome do avaliador II

Nota

Assinatura do avaliador II

Dedico este trabalho a Stan Lee (1922-2018) e Jack Kirby (1917-1994), criadores dos X-Men.

AGRADECIMENTOS Agradeço a todos que me acompanharam nessa jornada, mas principalmente aos meus pais Isabel e Juarez, e aos meus avós Nina e João, que tiveram suma importância nessa jornada de 4 anos. Agradeço também às minhas tias Gerusa e Maria, meus tios José e Juarez, e minha irmã de consideração, Nathália.

Não posso esquecer também dos meus amigos Elaine Silva, Leticia Barbosa, Leila Costa, John Ferraz, Marcos Babene, Guilherme Coiado, Gustavo Bento, Bruno Cenati, Angelo Pires, Vivian Cristina, Johnny Santos e Sonia Warumby. E a todos os funcionários do Núcleo de Comunicação e Artes da Universidade Cruzeiro do Sul, que estiveram presentes em minha vida durante esses 4 anos. E ainda quem teve essencial importância para mim. Pessoas que me deram força nos últimos dois anos, Christopher Vélez, Richard Camacho, Joel Pimentel, Erick Brian Cólon e Zabdiel de Jesus.

Meus mais sinceros e calorosos agradecimentos a todos os professores que me acompanharam, mas principalmente ao Alexandre Grego, que além de professor, acabou virando um grande amigo, e ao orientador Luiz Vicente, que me ajudou nessa loucura de fazer o projeto dos meus sonhos se tornar realidade.

Mas nenhum desses agradecimentos supera o meu à minha gata, Kelsey, que me acompanha há 5 anos, e que está do meu lado em tudo.

Os quadrinhos são jornalismo.

(Jack Kirby) Os X-Men são “esquisitos” porque são minoria,

são

diferentes.

Por

isso

são

perseguidos, tais como os cristãos no Império Romano ou atualmente em um país de maioria muçulmana. Sua luta é para serem aceitos, e não serem vistos como aberrações ou monstros. O que cada integrante do grupo quer é conviver pacificamente com os demais. Neste sentido, X-Men é uma grande parábola sobre a importância da alteridade, um apelo à convivência pacífica e respeitosa com o diferente, e um libelo contra uma atitude beligerante diante do “outro”.

(Carlos Caldas)

RESUMO Esta pesquisa analisa a graphic novel “Deus ama, o homem mata”, de Chris Claremont e Brent Anderson pelo ponto de vista da semiótica peirceana. Por meio dessa teoria são analisadas as entrelinhas da narrativa dessa abordagem fantasiosa que guarda uma série de significados, que essa ciência ajuda a desvelar. Os X-Men, grupo de heróis centrais nessa história, são personagens criados em 1963 por Stan Lee e Jack Kirby para a Marvel Comics. Desde o início, estes personagens transmitem mensagens sobre preconceito e segregação em suas histórias abordando temas referentes aos negros, às mulheres e ao público LGBTQIA+. A equipe conscientiza, indiretamente, o seu público leitor. Assim, é possível notar na narrativa o quanto a ficção pode se aproximar do mundo real, pois ela denuncia um discurso de preconceito e ódio muito utilizado por líderes (sob vários aspectos) no mundo inteiro. As mensagens acabam sendo uma forma de conscientização para alertar o seu público sobre preconceito contra as minorias sociais. As histórias em quadrinhos e graphic novels não são só entretenimento e ficção, a despeito do que muitos pensam, elas podem e devem ser um instrumento de conscientização para o que acontece no mundo.

Palavras-chave: Graphic Novel. Histórias em Quadrinhos. Marvel. Minorias Sociais. Semiótica.

RESUMEN

Esta indagación analiza la graphic novel "Dios ama, el hombre mata", de Chris Claremont y Brent Anderson por el punto de vista de la semiótica peirceana. Por el medio de esta teoría son analizadas las entrelíneas de la narrativa de este enfoque fantaseado que guarda una serie de significados, que esta ciencia ayuda a desvelar.

La Patrulla X, equipo de héroes central en esta historia, son personajes creados en 1963 por Stan Lee y Jack Kirby para la Marvel Comics. Desde el inicio, estos personajes transmiten recados sobre el prejuicio y segregación en sus cuentos dirigiendo temas referidos a los negros, las mujeres y el público LGBTQIA+. El equipo crea conciencia, indirectamente, en su público lector. Así, es posible notar en la narrativa cuanto la ficción puede ser acercar del mundo real, porque ella denuncia un discurso de prejuicio y odio mucho usado por líderes (en muchos sentidos) en el mundo todo. Los mensajes terminan siendo una forma de concientización para alertar su público sobre el prejuicio contra las minorías sociales. Los cómics y graphic novels no son solo entretenimiento y ficción, a pesar de que muchos piensan, ellas pueden y deben ser un instrumento de conciencia de lo que sucede en el mundo.

Contraseñas: Graphic Novel. Cómics. Marvel. Minorías Sociales. Semiótica.

LISTA DE FIGURAS Figura 1– The Yellow Kid, criação de Richard F. Outcault ........................................ 15 Figura 2 – As Aventuras de Nhô Quim, criação de Angelo Agostini .......................... 16 Figura 3 – Li´l Abner, criação de Al Capp .................................................................. 17 Figura 4 – Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 5 de setembro de 2019 ..................................................................................................................... 22 Figura 5 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 12 de setembro de 2019 ..................................................................................................................... 22 Figura 6 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 6 de setembro de 2019 ..................................................................................................................... 23 Figura 7 - Subsecretário de Ordem Pública folheia livro na Bienal em busca de conteúdo 'impróprio' — Foto: Fernanda Rouvenat / G1 ............................................ 23 Figura 8 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 8 de setembro de 2019 ..................................................................................................................... 24 Figura 9 e 10 – Capa do jornal Folha de S. Paulo do dia 7 de setembro de 2019 e a capa da revista Veja ed. 2652 ................................................................................... 25 Figura 11 - Batman #33, DC Comics......................................................................... 25 Figura 12 – Cena da HQ Batman Vol. 1 #84 ............................................................. 26 Figura 13 – Cena da HQ Piada Mortal, 1988 ............................................................ 26 Figura 14 – Análise das cenas na versão impressa (original) e na versão digital (censored) da HQ Batman: Damned ......................................................................... 27 Figura 15 – Selo que vinha na capa das histórias em quadrinhos para sinalizar se elas eram aprovadas pelo Comic Code Autorithy ............................................................. 27 Figura 16 – The Marvel Super Heroes (1966) ........................................................... 35 Figura 17 e 18 – Homem-Aranha (1967) e Os Quatro Fantásticos (1967) ................ 36 Figura 19 – Marvel Animê, 2011 ............................................................................... 37 Figura 20, 21 e 22 – Os Vingadores (1999), Guardiões da Galáxia (2015), Marvel's Spider-Man (2017) .................................................................................................... 37 Figura 23 - Spidey Super Stories (1974) ................................................................... 38 Figura 24 e 25 – O Incrível Homem-Aranha (1977), O Incrível Hulk (1978) .............. 38 Figura 26 e 27 - Captain America: Death Too Soon (1979), The Incredible Hulk Returns (1988) .......................................................................................................... 39 Figura 28, 29 e 30 - Homem-Aranha (2002), Demolidor (2003), Quarteto Fantástico (2005) ........................................................................................................................ 40

Figura 31 - Homem de Ferro (2008)......................................................................... 41 Figura 32 – Infográfico com os filmes da Marvel em ordem de lançamento ............. 42 Figura 33 – Infográfico com as séries da Marvel em ordem de lançamento ............. 43 Figura 34 – The X-Men #1 (1963) ............................................................................. 45 Figura 35 - Giant-Size X-Men n.1, 19755 .................................................................. 47 Figura 36 - X-Men: A Saga da Fênix Negra, 2019 .................................................... 48 Figura 37, 38 e 39 – Dias de Um Futuro Esquecido (2014), Massacre de Mutantes (2013) e The Uncanny X-Men And The New Teen Titans (1982) ............................. 49 Figura 40, 41 e 42 – X-Men: A Série Animada (1992), X-Men: Evolution (2000) e Wolverine e os X-Men (2008) .................................................................................... 50 Figura 43 – Geração X (1996) ................................................................................... 50 Figura 44 – Infográficos com filmes e séries dos X-Men por ordem de lançamento . 53 Figura 45 – Deus ama, o homem mata (2014) .......................................................... 54 Figura 46, 47 e 48 – X-Men, Magneto e William Stryker ........................................... 57 Figura 49 – Manchete sobre a morte da vereadora Marielle Franco em 2018, G1 ... 61 Figura 50 – Manchete sobre os cinco anos após a prisão de Rafael Braga que ocorreu em 2013 .................................................................................................................... 61 Figura 51 – Manchete sobre o caso de homofobia em um jovem de Pernambuco em 2019 .......................................................................................................................... 62 Figura 52 – Kitty Pryde discutindo com um homem sobre a Cruzada Stryker .......... 73 Figura 53 – Membros da Cruzada Stryker vigiando os mutantes e seus simpatizantes .................................................................................................................................. 73 Figura 54 – William Stryker contando sobre a morte do filho, parte um .................... 76 Figura 55 - William Stryker contando sobre a morte do filho, parte dois ................... 77 Figura 56 – Membro da Cruzada Stryker se autonomeando “purificador” da raça humana ..................................................................................................................... 78 Figura 57 – William Stryker recitando Deuteronômio, 17:2-5 .................................... 79 Figura 58 - William Stryker recitando Deuteronômio, 7:2 .......................................... 80 Figura 59 - William Stryker recitando João 3:3, João 3:17 e João 3:18 .................... 80 Figura 60 - William Stryker recitando Mateus 10:34-37............................................. 80 Figura 61 - William Stryker recitando Apocalipse 13:16 ............................................ 81 Figura 62 e 63 - William Stryker recitando Apocalipse 13:11 e 13:15, e Ezequiel 18:20 .................................................................................................................................. 81

Figura 64 – Magneto respondendo ao discurso de Stryker e seus seguidores revoltados contra o mutante ...................................................................................... 82 Figura 65 – Funcionários do canal assustados com as falas de Stryker ................... 83 Figura 66 – X-Men preocupados com o discurso de Stryker ..................................... 83 Figura 67 – Stryker justificando que é um instrumento do Senhor e por isso pode discriminar os portadores do gene X ......................................................................... 84 Figura 68 – Scott questionando quem é a verdadeira raça humana ......................... 84 Figura 69 – Stryker questionando se o Noturno é um humano por sua aparência .... 85 Figura 70 – Crianças mutantes mortas e penduradas em um balanço ..................... 85 Figura 71 - Wolverine falando sobre os genocídios justificados com o nome de Deus .................................................................................................................................. 86 Figura 72 – Placa com mensagem que incita a violência ao público LGBTQIA+ Foto: Ministério Público........................................................................................................87 Figura 73 – Cena em que o Professor Xavier aparece crucificado igual Jesus Cristo .................................................................................................................................. 87 Figura 74 – Versão distorcida do Scott (Ciclope) falando com o Professor Xavier ... 88 Figura 75 – Os X-Men atacando o Professor Xavier ................................................. 88 Figura 76 – Stryker afirmando com base em sua crença que o Professor Xavier é o Anticristo.................................................................................................................... 89 Figura 77 – Cena em que o jornalista do ABC Notícias fala sobre o questionamento de alguns líderes sobre a Cruzada Stryker ............................................................... 89 Figura 78 – Stryker questionando se algo poderia lhe acontecer por ser um servo de Deus .......................................................................................................................... 90 Figura 79 e 80 – Stryker discursando sobre os homo sapiens serem a raça de Deus e os homo superior terem vindo do Inferno .................................................................. 90 Figura 81 - William Stryker recitando Eclesiastes 12:13, Levítico 26:21 e Isaías 1:4 91 Figura 82 - Stryker descobrindo que seu braço direito é uma mutante ..................... 91 Figura 83 – Stryker matando Anne após descobrir que ela é uma mutante .............. 92 Figura 84 – Telespectador descobrindo que William Stryker é a verdadeira ameaça .................................................................................................................................. 93 Figura 85 – Scott e seu discurso para que os X-Men continue tentando parar o Reverendo William Stryker ........................................................................................ 93 Figura 86 - Deus ama, o homem mata (2003) ...........................................................94 Figura 87 – Stryker questionando a humanidade do Noturno ...................................94

Figura 88 e 89 - Noturno e representações de demônios datadas de 1450 ..............95 Figura 90 e 91 – Comparação de William Stryker com o imaginário do que seria um homem bem-sucedido ...............................................................................................95 Figura 92 e 93 – Kitty Pryde com a sua correntinha com estrela de Davi e uma corrente judaica com a mesma característica ..........................................................................96 Figura 94 e 95 – Professor Xavier crucificado e Crucificação de Peter Paul Rubens (1610-1611)................................................................................................................96

LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Lista de séries animadas......................................................................36-37 Tabela 2 – Lista de filmes da Marvel feitos pelos estúdios Fox, Sony e Universal 39-40 Tabela 3 – Quadro geral da semiótica peirceana........................................................69

SUMÁRIO Introdução .........................................................................................................14 1. Histórias em quadrinhos e Graphic Novel.................................................15 1.1 História em Quadrinhos versus Graphic Novel ................................. ......15 1.1.1 Censura nas HQs ............................................................................. 21 2. História da Marvel Comics .......................................................................... 29 2.1 O começo de tudo ............................................................................... 29 2.2 Produções audiovisuais....................................................................... 35 2.2.1 Primeiras aparições audiovisuais................................................... 35 2.2.2 Séries animadas e live-action ........................................................ 36 2.2.3 Filmes ............................................................................................ 38 2.2.3.1 Universo Cinematográfico Marvel ............................................ 40 2.2.3.1.1 Séries .................................................................................... 42 3. História dos X-Men ....................................................................................... 45 3.1 Produções audiovisuais...................................................................... 49 3.2 Direitos pela 20th Century Fox ........................................................... 50 4. Deus ama, o homem mata .......................................................................... 54 4.1 Sinopse ............................................................................................... 55 4.1.1 Desenvolvimento .......................................................................... 55 4.1.2 Personagens ................................................................................ 56 5. O que são as minorias sociais? ............................................................... 58 5.1 Classes sociais ..................................................................................... 58 5.2 Minorias sociais .................................................................................... 61 6. Semiótica .................................................................................................... 64 6.1 O que é semiótica? ................................................................................ 64 6.2 Teoria Peirceana ................................................................................... 65 7. Análise........................................................................................................ 70 7.1 Como foi feita a análise ......................................................................... 70 7.2 Análise ................................................................................................... 71 8. Considerações finais ................................................................................ 97 9. Referências .............................................................................................. 100

INTRODUÇÃO As histórias em quadrinhos estão presentes na vida de várias pessoas, principalmente de crianças e jovens. Muitas vezes, as editoras como Marvel Comics e DC Comics, trazem em suas histórias narrativas parecidas com a realidade.

Pensando nisso, decidi estudar pelo ponto de vista semiótico peirceano a graphic novel “Deus ama, o homem mata”, de Chris Claremont e Brent Anderson, a fim de analisar a representação das minorias sociais e o discurso de ódio destinado à classe mutante.

O intuito é descobrir se a narrativa da história pode ser considerada uma analogia ao desrespeito dos direitos humanos, onde através de metáforas e signos leva o leitor à reflexão daquilo que foi lido. A semiótica peirceana, baseada nas pesquisas de Charles Sanders Peirce, aparece para ajudar a entender as entrelinhas contidas na graphic novel.

O objetivo dessa monografia é mostrar que as histórias em quadrinhos e as graphic novels não são apenas um entretenimento, mas que acabam servindo para informar algo, seja indiretamente ou diretamente. Quero demonstrar às pessoas que esse meio de comunicação, pode ajudar a associar personagens fictícios aos da vida real, e os discursos utilizados por elas.

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1. HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E GRAPHIC NOVEL 1.1 História em Quadrinhos versus Graphic Novel

Os quadrinhos marcaram os acontecimentos do século XX, principalmente com os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, como as histórias do Capitão América. Por ser um produto com raízes populares, as histórias em quadrinhos são um meio de comunicação de massa que surgiu nas empresas jornalísticas norteamericanas.

Para a divulgação em um grande veículo de massa norte-americano, surgiu o The Yellow Kid, de Richard F. Outcault, em 1895 para o New York World. Sua origem se deu para testar a tinta amarela na impressão de jornal (SILVA, 2011). Foi a primeira vez que o quadrinho foi usado do modo que conhecemos como balão e foi veiculado para tantas pessoas.

Figura 1– The Yellow Kid, criação de Richard F. Outcault

As histórias em quadrinhos no início tiveram um reconhecimento mundial e por isso, possuem nomes em vários idiomas. Nos Estados Unidos, surgiu com o nome de comic strips, já que era um conteúdo de caráter humorístico. Até hoje as tiras possuem esse nome, mas também se usa comics, comix ou funnies. Já para as revistas, que contém uma narrativa maior precisando de mais páginas, é muito utilizado o nome de comic books1.

1

Revistas em quadrinhos.

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No Brasil, somos muito acostumados a usar o nome "gibi". O termo é explicado pela pesquisadora Sonia M. Bibe-Luyten, em sua obra O Que é História em Quadrinhos.

Poucas pessoas se lembram de que a palavra "gibi" significa "moleque". É que houve uma revista com este nome, nas décadas de 30 a 40, que, de tão difundida, emprestou seu nome a todas as revistas de quadrinhos do país.

(BIBE-LUYTEN, 1985, p. 11)

A primeira história em quadrinhos veiculada como conhecemos hoje em dia, com balões de fala, foi graças ao Yellow Kid de Outcault, mas ele não foi o inventor da lógica dessas narrativas. Até então, os desenhistas transmitiam a mensagem que queriam através da ilustração apenas. O leitor tinha que perceber apenas pela imagem qual era a mensagem específica que era ali transmitida. É o caso, por exemplo, de As Aventuras de Nhô Quim, que surgiu no Brasil em 1869, criada pelo italiano radicado no Brasil Angelo Agostini. As histórias eram publicadas pela revista Vida Fluminense. As histórias eram sobre um caipira na cidade grande. A principal novidade, para a época, eram as histórias com um personagem fixo.

Figura 2 – As Aventuras de Nhô Quim, criação de Angelo Agostini

Os balões trouxeram, sem dúvida, um dinamismo maior para as histórias em quadrinhos. Os personagens passaram a se comunicar com mais naturalidade e perdeu-se a necessidade de um narrador e de um rodapé. Sonia M. Bibe-Luyten conta que os balões colaboraram para a construção de uma linguagem peculiar.

Com essa autonomia, cada quadrinhos ganhou uma incrível agilidade, porque passou a contar em seu interior, integradas à imagem, com todas as informações necessárias para o seu entendimento. Os personagens passam

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a expressar-se com suas próprias palavras, e surgem as onomatopeias acrescentando sonoridade às imagens. (BIBE-LUYTEN, 1985, p. 19)

Logo após as tiras cômicas, surgiram as tiras seriadas. Esse tipo de tira trazia a função de capítulo diário de uma história única para deixar o leitor interessado no capítulo do dia seguinte (BIBE-LUYTEN, 1985, p. 22). Nessa época surge o Li´l Abner, criado por Al Capp como uma forma de sátira às tiras seriadas.

Figura 3 – Li´l Abner, criação de Al Capp

Com a quebra da bolsa de Nova York, no ano de 1929, vários operários acabaram ficando desempregados. As revistas em quadrinhos foram um modo de entreter as pessoas em seu tempo vago. Nesse contexto, deu-se a criação do gênero Aventura. É talvez por isso que se explica como o gênero "Aventura" chegou ao auge e um turbilhão de histórias surgiu nessa época, explorando ao máximo esta nova mina de ouro. A aventura indica um desejo de evasão e a criação de mitos, de heróis positivos. Revela a necessidade de novos modelos nos quais se inspirar para a conduta humana. (BIBE-LUYTEN, 1985, p. 26)

Vários personagens aparecem nessa época, como Tarzan, Flash Gordon, Fantasma e o Príncipe Valente. Os heróis apareceram para suprir um certo vazio que existia nas pessoas. No final da década de 1930, a política começaria a aparecer nas narrativas.

Com a explosão da Segunda Guerra Mundial, surge uma nova era para as histórias de aventura: os super-heróis. É no ano de 1939 que aparece pela primeira vez na revista Action Comics, o Superman.

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Criado por Joe Shuster e Jerry Siegel, o personagem kryptoniano Kal-El, ainda bebê, é enviado para a terra por seus pais para fugir da explosão de seu planeta natal, Krypton. Sua nave cai em uma fazenda no Kansas, nos Estados Unidos, onde ele acaba sendo adotado por Martha e Jonathan Kent, passando a ser chamado de Clark Kent (Man of Steel, 2013). Por causa da exposição ao sol amarelo da terra, Clark Kent desenvolveu superpoderes, os quais usa para proteger a terra e salvar as pessoas que precisam de ajuda.

Os quadrinhos ajudaram muito quando os muito quando os Estados Unidos entraram na guerra contra a Alemanha Nazista. Várias mensagens ideológicas circulavam nos balões. Quando a democracia americana estava sendo ameaçada, surgiu um novo herói, dessa vez, um patriota: o Capitão América!

Conhecido como Steve Rogers, o Capitão América fez de tudo para servir a sua pátria de forma heroica, inclusive se submeteu a uma experiência para se tornar um super soldado (Captain America: The First Avenger, 2011). Steve ganhou fama e notoriedade por, nas páginas de suas histórias em quadrinhos, aparecer combatendo nazistas e inclusive desferindo um soco em Adolf Hitler.

As histórias em quadrinhos foram um sucesso na era dos heróis, e são até hoje.

Todo esse cenário contribuiu para o surgimento de um novo formato: as graphic novels.

Mesmo não tendo sido o criador do termo graphic novel, Will Eisner é sempre lembrado quando se trata do assunto. Em sua biografia escrita por Michael Schumacher, é relembrado quando Eisner usou o termo para conseguir vender Um Contrato com Deus à Oscar Dystel da Bantam Books.

“Pensei e percebi que, se eu dissesse 'uma história em quadrinhos', ele ia desligar", lembrou Eisner. "Era um cara muito ocupado numa editora de alto nível”. "É uma graphic novel", disse ele a Dystel. "Humm, muito interessante", respondeu Dystel. "Traga aqui”. Eisner correu até a sede da Bantam, mas Dystel deu uma olhada no manuscrito e o recusou. "Isso aqui ainda é gibi, sabe?", declarou, olhando para Eisner por cima dos óculos. "A gente não publica esse tipo de coisa. Procure uma editora menor."(SCHUMACHER, 2013, p. 236)

Em “Will Eisner Um Sonhador nos Quadrinhos”, fica claro que Eisner acreditava ter sido o inventor das graphic novels. Não se sabe ao certo quem foi o primeiro a utilizar esse termo, mas sabe-se que ele tinha uma ideia completamente diferente da ideia de Eisner para a definição.

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Apesar não ter sido o inventor do termo Will Eisner foi o criador do modelo de graphic novel que conhecemos nos dias de hoje ao lançar em 1978 “Um Contrato com Deus”. A história captura os dramas da cidade de Nova York e seus habitantes através de quatro histórias – Um Contrato com Deus, O Cantor de Rua, O Zelador e Cookalein -, examinando o mundo dos imigrantes do Bronx durante a década de 1930.

Como nessa época graphic novel não tinha uma definição, muitas questões ainda estavam em aberto. No livro “A arte dos quadrinhos: uma história estética”, Robert C. Harvey utiliza a declaração de Töpffer que parece valer como definição de graphic novel. Ele dizia que os desenhos sem o texto teriam um significado vago: o texto, sem os desenhos, não teria significado algum. A combinação de ambos cria uma espécie de romance (SCHUMACHER, 2013, p. 238 apud HARVEY, 1996, p.

106).

Nos dias atuais, a definição de graphic novel já está com o significado fechado em comparação ao final dos anos de 1970 quando Will Eisner começou a usar de fato o termo. Hoje podemos entender que o termo graphic novel pode ser definido como: Uma história mais longa e elaborada, semelhante às obras literárias compostas no gênero conhecido como prosa. Embora os tradicionais gibis consumidos principalmente pelas crianças sejam também insistentemente rotulados de histórias em quadrinhos, este formato se caracteriza hoje por abrigar igualmente narrativas mais densas e complexas. (SANTANA, s. a.)

Geralmente usam o termo para histórias longas que serão fechadas como livros. No mundo das histórias em quadrinhos, é muito comum as editoras usarem para trazer arcos importantes dos personagens sem alterar a linha do tempo das histórias que são lançadas com frequência e não tem ligação direta com a narrativa da graphic novel.

As histórias em quadrinhos são "um veículo de cunho ideológico" (BIBELUYTEN, 1985, p. 35) e com as graphic novels não poderia ser diferente. Muitas narrativas vêm como uma forma de alertar o público-leitor do que se passa no mundo.

Muitas histórias trouxeram grandes "Maus: a história de um sobrevivente” de Art Spiegelman.

Lançada em duas partes, a primeira em 1986 e a segunda em 1991, “Maus” conta a história de Vladek Spiegelman, um judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz, sendo narrada por seu próprio filho Art. Spiegelman ganhou em 1992 o Prêmio Pulitzer de literatura pela obra.

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No começo da década de 1920, as histórias em quadrinhos e os outros meios de comunicação de massa começaram a receber atenção dos intelectuais da época, através de estudos feitos nas universidades.

Na Alemanha, surge então a Escola de Frankfurt, e sua teoria traz a reflexão da cultura em mercadoria e a transmissão da ideologia pelos meios de reprodução técnica. Os principais pensadores dessa corrente são Theodor Adorno, Walter Benjamin, Max Horkheimer, Erich Fromm e Hebert Marcuse.

Eles acreditavam que os meios de comunicação são subordinados por vários contextos, como economia, social e cultura. A mensagem passa em sua maioria pelos meios de comunicação, fazendo com que o espectador seja colocado para assimilar as ordens propostas por essas exposições. Por serem grandes saudosistas, eles criticavam arduamente os produtos da cultura de massa.

Na década de 1940, o Funcionalismo ganha força na Escola Americana Positivista logo após a teoria Hipodérmica. A Escola Americana tinha como objeto principal de pesquisa os efeitos dos meios de comunicação, tendo influência de várias áreas e três fases: Teoria Hipodérmica, Funcionalismo e Estudos dos Efeitos em Longo Prazo.

O funcionalismo pode ser compreendido como uma corrente teórica, com base no pensamento sociológico, no qual os processos sociais são estruturados em sistemas, tendo em vista a manutenção do funcionamento da sociedade de forma equilibrada. (SILVA, 2011, p. 15)

Nesse cenário, a comunicação tem um papel importante em troca de informações, indicando posturas e condutas na sociedade e por conta disso, os funcionalistas possuem uma preocupação para entender como os meios de comunicação de massa influenciam as pessoas e descobrir o papel da mídia no coletivo.

Harold Lasswell é o autor mais famoso da corrente Funcionalista, e o seu modelo de 1948, indica que a comunicação consiste na resposta de cinco perguntas: Quem? Diz o que? Em que canal? Para quem? Com que efeito? Esse processo demonstra que a comunicação é uma atividade intencional, por meio da qual as pessoas influenciam no comportamento das outras a partir da disseminação de suas mensagens. (SILVA, 2011, p. 15 apud RÜDIGER, 2004, p. 55).

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Logo a visão funcionalista dos teóricos dessa corrente, torna evidente a capacidade do ser humano em apreender, criar, transmitir e entender que as convenções utilizadas na comunicação é condição básica para a transformação e evolução positiva da sociedade. (SILVA, 2001, p. 15 apud SANTOS; CARDOSO, 2008, p. 39).

Para olhar esse o meio entre o Funcionalismo e a Escola de Frankfurt com outros olhos, surge a Escola Sociológica Europeia na década de 1960. Seu time de pesquisadores possuíam um olhar crítico a esses elementos, e não preconceituoso.

Era comum usar elementos da semiologia2 para analisá-los e divergir das posturas funcionalistas (positiva) e das frankfurtianas (negativa). Entre os pesquisadores dessa escola se encontra Roland Barthes, Edgar Morin, Jean Baudrillard, Julia Kristeva, Christian Metz e Umberto Eco. “Apocalípticos e Integrados” de Umberto Eco, traz uma base dos estudos dos produtos da cultura de massa. O livro é uma crítica aos apocalípticos, que seriam os frankfurtianos, e ao integrados que seriam os funcionalistas. Ele também traz em seu conteúdo o modo de análise em que acreditava ser o certo para poder criticar a cultura de massa, e que a mensagem deveria ser analisada, e não o meio de comunicação em que foi veiculada.

1.1.1 Censura nas HQs

Os quadrinhos eram considerados "um dos melhores meios de informação de conceitos" (BIBE-LUYTEN, 1985, p. 37) e até hoje é comum serem levantadas mensagens sobre preconceito, violência etc., nas narrativas.

Em setembro de 2019 no Brasil, ocorreu o caso da censura de uma história em quadrinhos na Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Por conta de um beijo entre pessoas do mesmo sexo em uma página da história em quadrinhos "Vingadores - A cruzada das crianças", da Marvel Comics. O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, ordenou a apreensão dos exemplares da história que estavam no evento.

2

Segundo o linguista suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913), ciência geral cujo objeto é o estudo de todos os sistemas de signos no meio da sociedade, incluindo os ritos e costumes. (SEMIOLOGIA, 2019)

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Figura 4 – Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 5 de setembro de 2019

Apesar de não ser destinada ao público infanto-juvenil, “A cruzada das crianças” acabou causando muita controvérsia com os religiosos. A ação de Marcelo Crivella foi motivada por um discurso do vereador Alexandre Isquierdo no dia 4 de setembro e foi divulgado em seu perfil oficial o vídeo no dia 12 de setembro.

Figura 5 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 12 de setembro de 2019

Marcelo Crivella ordenou o lacre em saco preto da história e de outros livros considerados impróprios para crianças. Ele usou como base o Estatuto da Criança, o ECA, para justificar essa ação.

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Figura 6 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 6 de setembro de 2019

Como resposta, a organização da Bienal do Livro disse que não iria retirar os livros e que iria dar voz "a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser". Na manhã do dia 6 de setembro, todos os exemplares da história criticada por Crivella se esgotaram em menos de meia hora. No período da tarde, fiscais da prefeitura são encaminhados para o evento com o motivo de identificar e lacrar produtos que sejam considerados "impróprios".

Figura 7 - Subsecretário de Ordem Pública folheia livro na Bienal em busca de conteúdo 'impróprio' — Foto: Fernanda Rouvenat / G1

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Durante o dia 6 e 7 de setembro, vários recursos foram feitos pela Bienal e pela prefeitura. A prefeitura do Rio de Janeiro chegou a pedir o lacre dos livros, citando o ECA, mas em nenhum parágrafo dele é mencionado alguma coisa contra a homossexualidade.

Figura 8 - Prefeito do Rio de Janeiro em sua rede social oficial no dia 8 de setembro de 2019

O caso foi noticiado nos veículos de notícia mais importantes do mundo, como por exemplo o The New York Times. O jornal americano noticiou o acontecimento dando ênfase ao fato de Marcelo Crivella ser um pastor evangélico e por ele querer apreender uma obra que esta contém "dois homens se beijando".

A tentativa de evitar que crianças e adolescentes vissem a obra, acabou sendo falha. A imagem acabou sendo veiculada no jornal Folha de S. Paulo, na edição do dia 7 de setembro em sua primeira página.

No caderno Ilustrada do jornal na mesma edição, Renan Quinalha, explica que o "recolhimento de HQ viola o Estado de Direito". No artigo 5°, inciso IX da Constituição Federal de 88 é assegurado que Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. (Constituição Federal de 1988)

A Revista Veja fez uma reportagem especial sobre o assunto, inclusive trazendo em sua capa a imagem dos personagens com o dizer "censurado" e uma comparação à “idade das trevas”.

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Figura 9 e 10 – Capa do jornal Folha de S. Paulo do dia 7 de setembro de 2019 e a capa da revista Veja ed. 2652

A matéria especial traz uma série de análises do que ocorre no Brasil e no mundo, como uma série de retrocessos. Os jornalistas Rinaldo Gama, Filipe Vilicic e Marcelo Marthe chegam a comparar o lacre dos livros na Bienal à queima de livros na Alemanha durante o regime nazista.

Essa não é a primeira história em quadrinhos a ser censurada no mundo, várias histórias já passaram por isso, inclusive histórias do famoso morcego de Gotham, o Batman.

Figura 11 - Batman #33, DC Comics

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As histórias do herói já foram acusadas de propagarem a homossexualidade, já que a perspectiva da cena fez com que Batman (Bruce Wayne) e o seu ajudante, Robin (Dick Grayson), parecessem dormir na mesma cama.

Figura 12 – Cena da HQ Batman Vol. 1 #84

Uma de suas histórias em quadrinhos mais famosas, A Piada Mortal, também sofreu e foi impedida de ser vendida por uma suposta apologia ao estupro, protagonizada pelo antagonista da obra, Coringa, e por Barbara Gordon, a Batgirl.

Figura 13 – Cena da HQ A Piada Mortal, 1988

No ano de 2018, a número #1 da edição Batman: Damned, que é uma linha de quadrinhos da DC Comics voltada para o público adulto, trouxe uma cena de nu frontal de Bruce Wayne. A cena gerou muita repercussão, e a editora acabou cedendo as reclamações e censurou a imagem na versão digital da revista.

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Figura 14 – Análise das cenas na versão impressa (original) e na versão digital (censored) da HQ Batman: Damned

Durante os anos de 1950, o psiquiatra Frederic Wertham dizia que a culpa pela delinquência juvenil vinha das histórias em quadrinhos. Por conta de sua famosa publicação “A Sedução do Inocente”, foi criado um código regulador pela Associação Americana de Revistas em Quadrinhos, o famoso Comic Code.

O código tinha o intuito de garantir uma certa qualidade nas histórias em quadrinhos, a fim de que os pais soubessem que não havia ali nenhum conteúdo inapropriado para os seus filhos. As histórias não podiam conter textos que gerassem simpatia para com criminosos, desrespeitar casamentos e suas capas não poderiam conter as palavras “horror” ou terror”, bem como imagens de zumbis, lobisomens, vampiros e fantasmas. Estes monstros não poderiam ser encontrados em nenhum quadrinho das revistas.

Para saber se o código aprovava aquela história, a edição trazia um selo na capa sinalizando a liberação para os jovens. O código funcionou até a década de 1970 e diziam que as suas regras eram para “o bem sempre triunfar sobre o mal” (HOWE, 2013, p. 40)

Figura 15 – Selo que vinha na capa das histórias em quadrinhos para sinalizar se elas eram aprovadas pelo Comic Code Autorithy

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Com um caso parecido com o do Rio de Janeiro, a graphic novel Sandman, de Neil Gaiman teve problemas quando foi lançada em 1989. As bibliotecas americanas reclamavam que obra continha linguagem ofensiva e ideias "contra a família". Diziam que a série era imprópria para o grupo juvenil, mesmo sendo a história destinada aos adultos.

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2. HISTÓRIA DA MARVEL COMICS

2.1 O começo de tudo

Com o surgimento do Superman no final da década de 1930, ficou concorrido o mercado para novos heróis nas histórias em quadrinhos. Trabalhando para a empresa Funnies Inc., Carl Burgos e Bill Everett foram encarregados por Lloyd Jacquet para criarem novos personagens. Em uma reunião para criar planos para super-heróis, decidiram criar personagens com base nos elementos água e fogo. Foi assim que surgiu o androide Tocha Humana3 e o príncipe submarino Namor.

Burgos veio com a ideia de um cientista brilhante, mas avarento, o Professor Phineas T. Horton: ele cria um homem sintético dentro de um tubo de ensaio gigante, mas o vê entrar em chamas ao tomar contato com oxigênio. O Tocha Humana não precisava de uniforme: seu rosto sem traços e a anatomia vaga, ambos enrubescidos e obscurecidos por tufos de chamas, são cercados por eclosões dispersas, como gotas de suor escarlate, e as labaredas que se formam no alto da cabeça sugerem intenções diabólicas. Em outras palavras, é uma criatura bruxelante de medo e fúria. Quando foge, ele começa a lançar bolas de fogo das mãos e a deixar tiras e criminosos de cabelo em pé. (...)

A contribuição de Everett – que tomava de empréstimo as aventuras marítimas de Jack London, a Balada do Velho Marinheiro de Coleridge e o Mercúrio de Giambologna – foi Namor, o Príncipe Submarino. Depois que uma expedição no ártico provoca destruição involuntária em colônias submersas de uma raça aquática, o imperador anfíbio manda sua filha espionar os humanos. A princesa casa-se com o comandante da expedição, recolhe informações para a sua terra natal e, antes de voltar ao oceano, engravida. Dezenove anos depois, Namor – de orelhas pontudas, sobrancelhas pontudas e bico de viúva, trajando apenas sunga e agraciado com pés alados – é “um ultra homem das profundezas... que voa ao vento... tem a força de mil” e quer vingança dos EUA. Ele usa seus poderes para fins diabólicos: mata dois mergulhadores (com apunhaladas rancorosas em um e esmagando a cabeça do outro) e joga o navio deles contra um recife. (...)

Irrepreensivelmente violento, e caprichosamente incorreto, o maquiavélico Príncipe Submarino era o inverso do heróis-imigrante Superman. (HOWE, 2013, p. 21 - 22)

Por meio de um dos seus contatos, o agente da Funnies Inc., Frank Torpey, vendeu a ideia do Tocha Humana e de Namor para Martin Goodman e os heróis foram publicados em uma nova antologia, sob o título de Marvel Comics. A revista foi a primeira a ser publicada pela Timely Comics em 31 de agosto de 1939. A edição 3

A editora possui duas versões de herói com o mesmo nome. O primeiro foi um androide criado em 1939, e o segundo é o membro do Quarteto Fantástico, Johnny Storm.

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chegou a vender 80 mil exemplares no mês de setembro, e em sua reimpressão, chegou à impressionante marca de 800 mil exemplares.

Na segunda edição, a revista em quadrinhos teve seu nome alterado para Marvel Mystery Comics. Tocha Humana acabou “seguindo” os passos de Superman, ganhou o codinome Jim Hammond e trabalhava como policial no período diurno.

Namor manteve a sua essência, mas se apaixonou por uma policial amiga de Jim chamada Betty Dean, que acabou sendo a ligação entre os dois personagens.

Goodman decidiu procurar novas pessoas que pudessem criar novos heróis de sucesso para a sua editora, como Joe Simon, que após alguns fracassos junto com Jack Kirby, criou o patriota Steve Rogers: o Capitão América.

“Passei a noite inteira rabiscando”, lembrou Simon. “Camisa cota de malha, músculos protuberantes no peito e no braço, roupa colante, luvas e botas com abas dobradas embaixo do joelho. Desenhei uma estrela no peito, faixas que iam do cinto até uma linha sob a estrela, e colori o uniforme de vermelho, branco e azul. Acrescentei um escudo.” Na parte inferior da página, escreveu Super Americano. Depois repensou e mudou o nome para Capitão América.

Enquanto Superman, Batman e outros heróis continuavam enfrentando aliens, vilões fantasiados e ladrões de banco, as estrelas mais vivazes, espalhafatosas e raivosas da Timely já puxavam as manguinhas para combater vilões reais da Segunda Guerra Mundial. (...) A guerra na Europa, porém, estava ganhando novos tons: a França havia tombado, e a ameaça de o mando nazista espalhar-se pelo mundo começou a entrar na cabeça dos norte-americanos. O Capitão América estaria focado em uma só missão: derrubar o Terceiro Reich. (HOWE, 2013, p. 26 - 27)

A revista Capitão América número 1 foi lançada em 20 de dezembro de 1940, trazendo a história de um garoto chamado Steve Rogers. Após ser recusado várias vezes no alistamento militar, Rogers consegue participar de um programa para ser cobaia de um soro experimental que o transformaria em um “super soldado”. O experimento lhe deu músculos e resistência. Rogers passou a portar um escudo e o seu uniforme era totalmente patriótico, remetendo à bandeira americana. A aventura trazia ainda o seu parceiro mirim, Bucky, e a sua primeira edição chegou a vender um milhão de exemplares.

Joe Simon viria a se tornar editor na Timely, e logo convidou Jack Kirby para ser um dos freelancers da editora. Na mesma época, o primo de Jean Goodman, Stanley Lieber, foi também contratado. Enquanto Kirby era responsável por desenhos das revistas, as funções de Lieber eram varrer o chão, buscar café, entre outras funções do dia a dia. Simon decidiu então dar-lhe uma função para que ele se mantivesse ocupado: escrever uma história do Capitão América.

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Foram entregues no total de vinte e seis parágrafos sob o título de “Capitão América desbarata a vingança do traidor”, e para não arruinar o desejo de ser um escritor no futuro, Lieber assinou o conto com o pseudônimo: Stan Lee. Logo começou a escrever para personagens como Destroyer, o Demolidor e Jack Frost.

Jack Kirby havia sido demitido junto com Joe Simon no começo da década de 1940, isso fez com que ambos trocassem a editora pela rival, a DC Comics, e com o passar dos anos, até 1956, a Timely Comics havia passado por muitos cortes de orçamento, fazendo com que vários profissionais fossem demitidos. Stan Lee foi o único que continuou, visto que era considerado um dos melhores do ramo. Era dele a responsabilidade de demitir os seus colegas de trabalho.

No início da década de 1960, Stan Lee decidiu entrar em contato com Kirby, que estava passando por dificuldades na DC Comics, mesmo criando desenhos para histórias de sucesso, como do personagem Arqueiro Verde, por exemplo.

Os dois decidiram se juntar, e com a ajuda do irmão mais novo de Stan Lee, Larry, novos títulos foram surgindo. Inclusive o personagem Groot, muito conhecido por ser um membro dos Guardiões da Galáxia, foi criado nessa parceria e teve a sua primeira aparição em 1960 na revista Tales to Astonish #13.

No ano de 1961 surge então a primeira edição do Quarteto Fantástico, completamente diferente do que Lee e Kirby estavam acostumados a fazer com histórias de monstros em Strange Tales. A primeira edição da equipe liderada pelo Dr. Reed Richards chegou às bancas em 8 de agosto de 1961.

Na página de abertura de Quarteto Fantástico n. 1, um homem de têmporas grisalhas atira um sinalizador, o que chama a atenção de grande parte da genérica Central City, mas em particular de três pessoas: a patricinha Susan Storm, que fica invisível e sai sorrateiramente de seu chá vespertino; uma figura anônima que descarta sobretudo, óculos de sol e chapéu antes de sair correndo de uma loja para Homens Grandes, revelando que é um colosso alaranjado e meio barrento; e o adolescente Johnny Storm, irmão de Sue, que abandona seu carango num posto de gasolina ao entrar em chamas e sair voando. Eles se encontram no apartamento do primeiro homem, e passase a um flashback desconcertante... (HOWE, 2013, p. 46)

A equipe seria então o retorno triunfal da Timely ao mercado, e quando Goodman viu o sucesso do quarteto, cancelou Teenage Romance para dar vaga ao Incrível Hulk, considerado a versão nuclear de “O médico e o monstro”, clássico de Robert Louis Stevenson.

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As fronteiras da ciência na Guerra Fria eram mais uma vez vitais à trama: o Dr. Bruce Banner prepara o teste de uma Bomba Gama para as forças armadas dos EUA quando um jovem inconsequente chamado Rick Jones entra com seu conversível no campo de testes deserto, só para cumprir uma aposta. Banner pede adiamento do teste até que Jones esteja em segurança, mas um espião comunista no laboratório dá sequência a explosão, e Banner é bombardeado por radiação. (HOWE, 2013, p. 48)

Com a chegada de Hulk às bancas, no início de 1962, a dupla inventou mais três personagens para as histórias: o deus do trovão da mitologia nórdica, Thor; Hank Pym, o Homem-Formiga; e Peter Parker, o Homem-Aranha. Thor foi escrito para a revista Journey Into Mystery¸ um título anterior dedicado a personagens monstruosos, Homem-Formiga para a revista Tales to Astonish; e Homem-Aranha para a Amazing Fantasy. A editora também passaria a ter, a partir de então, outro nome: Marvel Comics.

O irmão de Stan Lee, Larry, alterou a sinopse até então prevista para Peter Parker, que no início era um órfão adolescente com um anel que o transformava em um herói adulto. Com a alteração, Peter passou a ter a história que conhecemos hoje, e diferente dos outros personagens, foi desenhado por Steve Ditko.

Amazing Fantasy n. 15, que traz a primeira aparição do Homem-Aranha, chegou às bancas em junho de 1962. Passava longe das convenções superheroísticas, ainda mais que o Quarteto Fantástico. Diferente de Kirby, cujos heróis tinham a corpulência majestosa, Ditko povoou as histórias de rebeldes raquíticos e vesgos, situando o protagonista, Peter Parker, numa constelação de zombarias, dedos em riste e sobrancelhas em fúria. Na primeiríssima página, Parker – gravata, colete, óculos grandes e redondos, cabelo escovinha – é rejeitado pelos colegas que têm letras estampadas no suéter. (...) Os amigos de Parker limitam-se aos idosos Tio Ben e Tia May, que o mimam como se fosse uma criancinha, e a sua pilha de livros. Depois de ser mordido por uma aranha de laboratório, ele ganha força e agilidade acima do normal, assim como o poder de escalar paredes (o “sentido aranha” viria mais tarde). Então Parker entra num concurso de luta livre para tirar alguns trocos. (...) Seus feitos rendem uma participação num programa de TV, para o qual ele mesmo costura um uniforme azul e vermelho, com teias sob os braços, insígnias de aranha no peito e nas costas e uma máscara de olhos brancos.

As roupas, porém, não fazem o herói: depois da gravação, um criminoso passa por Parker nos corredores do estúdio, e ele dispensa a oportunidade de intervir. Só quer saber da sua vida – até que uma noite chega em casa e descobre que um ladrão matou o santo Tio Bem. Parker, vestido de HomemAranha, sai à procura do ladrão, captura-o e percebe que é o mesmo criminoso que ele deixou fugir do estúdio. Abalado e tomado de culpa, ele enfim compreende seu destino. “Com grandes poderes”, a narração de Lee diz aos leitores, “vêm grandes responsabilidades!”. (HOWE, 2013, p. 50-51)

A história do herói não surpreendeu Goodman, e logo Amazing Fantasy foi cancelada. O público não aceitou muito bem a decisão do presidente da Marvel 32

Comics e todo o entusiasmo causado pela história aos leitores, fez com que o personagem ganhasse um título próprio: The Amazing Spider-Man. O universo dos heróis começava a tomar forma. A revista Strange Tales trouxe aventuras solo do Tocha Humana; as histórias de Linda Carter, Student Nurse pararam de serem veiculadas para dar espaço à história do Homem-Aranha e a série de monstros Tales of Suspense trouxe um novo rosto: Tony Stark, o Homem de Ferro.

Tony Stark não tinha problemas de autoestima nem dificuldade em pagar o aluguel, tampouco era tímido com as garotas. Era um industrial mulherengo, que tinha contrato com as forças armadas e usava bigode. Ferido e sequestrado por Wong-Chu, o “Tirano da Guerrilha Vermelha”, Stark recebe ordens para desenvolver uma arma para o inimigo comunista. Em vez disso, constrói uma roupa de metal que vai manter seu coração debilitado na ativa e também servir de armadura para sua fuga. (...) O personagem de Tony Stark também evoluiria, mas até então seu problema mais envolvente era ser um playboy hipersexualizado que “nunca pode aparecer de peito nu” por conta da chapa mecânica sobre o coração. (HOWE, 2013, p. 52-53)

Novos personagens apareceram, como Doutor Estranho e a Vespa, tudo para preparar a chegada dos Vingadores, uma equipe de super-heróis composta com os maiores nomes da Marvel: Homem de Ferro, Homem-Formiga, Vespa, Thor e Hulk se juntaram para derrotar Loki, o irmão maléfico de Thor. A equipe passou a ter uma revista de periodicidade mensal, e no mesmo período, surgia a equipe dos X-Men. Mais tarde, em 1964, Stan Lee decidiu dar uma nova cara a um personagem que estava parado há muito tempo: o Demolidor. Bill Everett, criador do primeiro Tocha Humana, ficou responsável por repaginar o personagem e foi assim que surgiu a figura do advogado cego Matt Murdock. (...) Matt Murdock, estudante esforçado e filho de um boxeador – pai solteiro nas últimas, salva um cego de um caminhão de entregas dos Laboratórios Atômicos Ajax – e é cegado por um cilindro radioativo. Como ele vivia no Universo Marvel, a radiação também aguçou seus outros sentidos, que vêm bem em conta quando ele precisa vingar o assassinato do pai. Murdock cresce e vira advogado, satisfazendo o ganho forçado de Lee para “a justiça é cega” e dando ao Demolidor acesso fácil às ocorrências criminosas.

(HOWE, 2013, p. 61)

Demolidor foi seguido por outros personagens, entre eles, a espiã soviética Natalia Alianovna "Natasha" Romanova, conhecida por Natasha Romanoff e seu codinome, Viúva Negra. A espiã teve a sua primeira aparição em Tales of Suspense #52 em abril de 1964.

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Clint Barton, o Gavião Arqueiro também viria a aparecer em Tales of Suspense, na edição de número 57. No começo, foi um vilão nas histórias de Tony Stark, mas logo teve sua redenção ao virar herói e entrar para a equipe dos Vingadores.

A Marvel Comics decidiu inovar, e trouxe a família real dos Inumanos para as histórias do Quarteto Fantástico e fazer uma ponte com o universo cósmico.

Os Inumanos eram diferentes de tudo o que já se vira. Tinham intenções ambíguas, e seus corpos - um tinha cascos que provocavam terremotos, outra tinha cabelos que eram tentáculos, outro tinha guelras e barbatanas – pendiam para o grotesco. Raio Negro, seu líder, tinha uma voz que podia literalmente destruir o mundo ao seu redor – e por isso ficava mudo. Dentinho, bicho de estimação da família, era um imenso cão com bigode e antenas.

(HOWE, 2013, p. 81)

Um novo vilão apareceu para confrontar a equipe titular da revista e seus novos aliados, Galactus, o devorador de mundos, sempre acompanhado por seu arauto, o Surfista Prateado (Norrin Radd). O vilão na época era a maior força do Universo Marvel.

Norrin Radd, o Surfista Prateado, era um astrônomo do planeta Zenn-La, que com a chegada de Galactus, se ofereceu para servir como arauto do vilão, a fim de salvar o amor de sua vida, Shalla Bal. O primeiro super-herói negro a ser lançado ao grande público só viria em 1966.

Na região do Alabama, havia surgido um partido político chamado Organização pela Libertação do Condado de Lowndes. O partido era liderado por Stokeley Carmichael e pelo Comitê Estudantil de Coordenação Antiviolência. Sua marca mostrava uma pantera negra. Por ser um símbolo tão marcante, acabou sendo vinculado ao partido, fazendo com que ficasse conhecido por Partido Pantera Negra.

Kirby e Lee tinham uma ideia que estava há muito tempo parada de um herói negro que se chamava Tigre de Carvão. Com o aparecimento desse partido político, logo ele teve seu nome alterado para Pantera Negra.

Quando não estava fantasiado, o Pantera Negra era um príncipe africano chamado T’Challa, que governava o fictício país Wakanda. Não era um nobre selvagem do Continente Negro, mas um gênio da ciência que impressionava até Reed Richards. Esqueça as explosões gama e as aranhas radioativas; as criações da Marvel agora refletiam um interesse crescente pela colisão entre civilizações antigas e tecnologias futuristas. (HOWE, 2013, p. 95)

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No começo da década de 1970, com a saída de Jack Kirby da Marvel e o seu retorno para a rival DC Comics, terminava a chamada Era de Ouro da Marvel Comics.

2.2 Produções Audiovisuais

A Marvel Comics já era um sucesso no final da década de 1960, e conforme esse sucesso ia aumentando cada vez mais, foi aberto o espaço para outras representações dos personagens, além das histórias em quadrinhos: as produções audiovisuais.

2.2.1 Primeiras aparições audiovisuais

A primeira animação da Marvel Comics foi The Marvel Super Heroes, indo ao ar no dia 1 de setembro de 1966. O desenho animado trazia os heróis clássicos da editora, como Capitão América, Namor, Homem de Ferro, Thor e Hulk. Cada episódio tinha em torno de 15 minutos, as aventuras dos heróis se dividiam em blocos de 5 minutos cada, e cada bloco adaptava alguma de história dos heróis escolhido para estrelar a série. The Marvel Super Heroes teve uma única temporada, com 65 episódios, tem o seu último exibido no dia 1 de dezembro do mesmo ano de sua estreia.

Figura 16 – The Marvel Super Heroes (1966)

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Em 1967 foi a vez de outros personagens ganharem a suas próprias animações: Homem-Aranha e o Quarteto Fantástico. Ambos ganharam desenhos pelo canal televisivo ABC. Os episódios do Homem-Aranha tinham a duração de 25 minutos e eram produzidos pela produtora Grantray-Lawrence Animation. O desenho teve três temporadas, com o total de 52 episódios, indo ao ar de 9 de setembro de 1967 a 14 de junho de 1970.

Apesar do Quarteto Fantástico ser veiculado pela mesma emissora do Homem-Aranha, foi feito pela produtora Hanna-Barbera Productions. Cada episódio tinha duração de 22 minutos e apenas uma temporada foi produzida, num total de 20 episódios. Foi ao ar no dia 9 de setembro de 1967 e teve o seu fim em março de 1970.

No Brasil, ficou conhecida pelo nome de Os Quatro Fantásticos.

Figura 17 e 18 – Homem-Aranha (1967) e Os Quatro Fantásticos (1967)

2.2.2 Séries animadas e live-action

A partir da década de 1970, a Marvel começou a investir mais no ramo de animações. E até hoje é possível ver as séries animadas de seus personagens serem veiculadas por diversos meios. Abaixo, uma lista com algumas dessas animações desde o final dos anos 1970, até os dias atuais, em ordem de lançamento.

Animações

Ano

O Quarteto Fantástico

1978

A Coisa

1979

Homem-Aranha e Seus Incríveis Amigos

1981 - 1983

O Incrível Hulk

1982 - 1983

Quarteto Fantástico

1994 - 1996

Homem-Aranha

1994 - 1998

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Homem de Ferro

1994 - 1996

O Incrível Hulk

1996 - 1997

Os Vingadores

1999 - 2000

Homem-Aranha: Ação Sem Limites

1999 - 2001

Homem-Aranha: A Série

2003

Quarteto Fantástico: Os Maiores Heróis da Terra

2006-2007

O Espetacular Homem-Aranha

2008 - 2009

Iron Man – O Homem de Ferro

2008-2011

Esquadrão de Heróis

2009 - 2011

Vingadores: Os Super-Heróis Mais Poderosos da Terra

2010 - 2012

Marvel Animê

2011 - 2012

Ultimate Homem-Aranha

2012 - 2017

Hulk e os Agentes da S.M.A.S.H.

2013 - 2015

Os Vingadores Unidos

2013 - presente

Guardiões da Galáxia

2015 - presente

Marvel's Spider-Man

2017 - presente

Marvel Future Avengers

2017 - presente

Tabela 1 – Lista de séries animadas

Figura 19 – Marvel Animê, 2011

Figura 20, 21 e 22 – Os Vingadores, (1999), Guardiões da Galáxia (2015), Marvel's Spider-Man (2017)

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Os heróis da editora também tiveram as suas representações em live-action4, sendo a primeira do amigo da vizinhança, o Homem-Aranha, em 1974 chamada Spidey Super Stories. O elenco da série contava com Danny Seagren, Skip Hinnant e Morgan Freeman, e trazia o herói lutando contra os bandidos da região. Teve três temporadas e 29 episódios, sendo finalizada em 1977.

Figura 23 - Spidey Super Stories (1974)

O herói ganhou uma nova versão no canal de TV CBS, sob o nome de “O Incrível Homem-Aranha”, e foi ao ar de 1977 a 1979. Bruce Banner, o Hulk, também ganhou um programa de TV de 1978 a 1982 pela mesma emissora.

Figura 24 e 25 – O Incrível Homem-Aranha (1977), O Incrível Hulk (1978)

2.2.3 Filmes

A Marvel Comics também logo entrou no universo cinematográfico, mesmo seus primeiros filmes não indo para os cinemas, eram veiculados em formatos 4

Ação que envolve pessoas e animais reais, e não modelos, imagens desenhadas ou geradas por computador. (LIVE ACTION, 2019) 38

televisivos. Os filmes do Capitão América e do Hulk ganharam destaque. Steve Rogers ganhou dois telefilmes, Captain America e Captain America: Death Too Soon.

Hulk ganhou três, The Incredible Hulk Returns, The Trial of the Incredible Hulk e The Death of the Incredible Hulk.

Figura 26 e 27 - Captain America: Death Too Soon (1979), The Incredible Hulk Returns (1988)

A Marvel no início da década de 1990, criou um departamento responsável por adaptação cinematográfica de seus personagens, Marvel Studios. Para escapar de uma crise financeira, vendeu os direitos de seus personagens, estúdios como a New Line Cinema, Sony Pictures Entertainment e 20th Century Fox ficaram responsáveis por personagens como Homem-Aranha, Homem de Ferro e X-Men. O começo do século XXI abriu as portas do cinema para os personagens da editora. Vários ganharam as suas versões live-action cinematográficas, e outros heróis voltaram repaginados com outras histórias e atores. São mais de 15 filmes produzidos por diversos estúdios. Na lista de filmes podem ser encontrados personagens inéditos como também personagens que passaram por uma nova adaptação. A seguir, a lista dos filmes contendo o nome e o ano de lançamento.

Filme

Ano

Homem-Aranha

2002

Hulk

2003

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Demolidor

2003

Homem-Aranha 2

2004

Elektra

2005

Quarteto Fantástico

2005

Homem-Aranha 3

2007

Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado

2007

Motoqueiro Fantasma

2007

Motoqueiro Fantasma: Espírito de Vingança

2011

O Espetacular Homem-Aranha

2012

O Espetacular Homem-Aranha 2

2014

Quarteto Fantástico

2015

Venom

2018

Tabela 2 – Lista de filmes da Marvel feitos pelos estúdios Fox, Sony e Universal

Figura 28, 19 e 30 - Homem-Aranha (2002), Demolidor (2003), Quarteto Fantástico (2005)

2.2.3.1 Universo Cinematográfico Marvel

Nos personagens vendidos na década de 1990 para os estúdios, o Homem de Ferro foi um deles. Os direitos cinematográficos de Tony Stark foram readquiridos em 2006 e a Marvel decidiu produzir de maneira independente com a Paramount Pictures o filme do herói. O filme foi lançado em 2008, abrindo as portas para o Universo Cinematográfico da editora.

O filme foi dirigido por Jon Favreau, com Robert Downey Jr. no papel do playboy Tony Stark, e trazia no elenco nomes como Terrence Howard, Jeff Bridges, Gwyneth 40

Paltrow, Leslie Bibb, Shaun Toub, Clark Gregg e Paul Bettany. Foi indicado em 2009 ao Oscar de “Melhor Edição de Som” e “Melhores Efeitos Especiais”.

Com um orçamento de U$140 milhões, o filme arrecadou em sua semana de estreia US$ 98,618,668 e a bilheteria mundial alcançou a marca de US$ 585,174,222.

Figura 31 - Homem de Ferro (2008)

Homem de Ferro foi um sucesso e acabou chamando a atenção da Disney, e acabou comprando a editora e todos os personagens que a Marvel ainda possuía os direitos. Assim, começou o império cinematográfico da Marvel Comics.

Mais de 20 filmes já foram produzidos pela Marvel Studios e muitos já foram confirmados. Seus filmes possuem uma ordem cronológica para entender todos os fatos que levaram o universo ao seu ápice em “Vingadores: Guerra Infinita” e “Vingadores: Ultimato”.

Kevin Feige é o presidente da Marvel e desde o início do Universo Cinematográfico Marvel. Ele compartilha da mesma ideia de Stan Lee e Jack Kirby nos quadrinhos, com os heróis interagindo um com o outro em vários momentos.

A seguir, um infográfico com a ordem e ano dos filmes da Marvel Studios em ordem de lançamento.

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Figura 32 – Infográfico com os filmes da Marvel em ordem de lançamento

2.2.3.1.1 Séries

A Marvel também investiu em séries televisivas de seus personagens, para assim aumentar ainda mais o número de representações de seus heróis. A primeira 42

série foi Agents Of S.H.I.E.L.D. em 2013. Um dos maiores sucessos televisivos da Marvel, a série trazia a volta do agente Phill Coulson comandando um time de elite para investigar acontecimentos estranhos no planeta.

A série acompanhou vários arcos dos filmes, inclusive mostrando a queda da S.H.I.E.L.D. logo após “Capitão América: O Soldado Invernal”, e introduziu a mitologia dos Inumanos abrindo as portas para a série da família real. Agents Of S.H.I.E.L.D. será finalizada em sua sétima temporada.

Todas as séries são produzidas pela Marvel Television em parceria com canais ou serviços de streaming como ABC, Netflix e Hulu. Ao todo já foram lançadas 11 séries trazendo personagens repaginados e inéditos em live-action.

Figura 33 – Infográfico com as séries da Marvel em ordem de lançamento

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Em 2018, a Disney anunciou o seu próprio serviço de streaming chamado Disney+, e com isso, passou a assumir o comando das séries em live-action. A chegada do streaming ressaltou a ligação da TV com os filmes, e séries de personagens que já apareceram e outros personagens inéditos foram confirmadas.

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3. HISTÓRIA DOS X-MEN

A criação dos X-Men sucedeu a primeira edição dos quadrinhos dos Vingadores. A equipe foi criada por Stan Lee e Jack Kirby em 1963 e trazia personagens, até então, inéditos.

Figura 34 – The X-MEN #1 (1963)

A sua narrativa girava em torno de um grupo de mutantes adolescentes com superpoderes que frequentavam a escola do Professor Charles Xavier, cujo poder é a telepatia. A primeira edição trazia os personagens Scott Summers (Ciclope), Hank McCoy (Fera), Bobby Drake (Homem de Gelo), Jean Grey (Garota Marvel), Warren Worthington III (Anjo) e o vilão Magneto.

A primeira história em quadrinhos trouxe apenas o título The X-Men, mas durante muito tempo, o nome da equipe vinha acompanhado da palavra uncanny na capa. Essa palavra possui o sentido de “estranho”, “incomum” e “esquisito” e pode ser considerada uma referência aos poderes dos portadores do gene X, que dependendo, têm a sua aparência muito diferente do padrão dos não portadores.

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Os X-Men são liderados pelo Professor Xavier, que está sempre engajado na meta de fazer com que os homo sapiens e os homo superior vivam em paz na sociedade. A equipe tenta conquistar a compreensão da humanidade, que os teme, e de outros mutantes, que desejam dominar o homem comum.

Na época da criação dos heróis, os Estados Unidos se encontravam no auge da Guerra Fria e a tensão racial explodia por todo país. O Professor Xavier e Magneto podem ser vistos como metáforas das figuras das lutas raciais naquele período: Martin Luther King Jr. e Malcolm X. Professor Xavier tem os mesmos ideais de Martin Luther King Jr., ele acredita que os diferentes podem viver em paz. Enquanto Magneto pode ser ligado à figura de Malcolm X, pois sugeria a luta armada contra os opressores.

No final da década de 1960, os quadrinhos da equipe eram os menos vendidos, mas com Roy Thomas e Neal Adams à frente do roteiro e dos desenhos, as edições ficaram sérias e trouxeram uma reflexão mais sombria, diferente do estilo de Kirby e Lee. Quase todos os rostos que Adams desenhava pareciam estar à beira das lágrimas ou do paradoxismo, e os diálogos de Thomas tiravam proveito do drama entre adultos passando sermões e gritando um com os outros.

(HOWE, 2013, p. 109)

A série atraía uma pequena parte do público e cerca de um ano após a dupla assumir as histórias da equipe, os X-Men deixaram de circular. Mas isso mudaria no meio da década de 1970.

A editora queria adentrar no mercado internacional com personagens asiáticos e europeus, e mesmo tendo perdido a série dos X-Men anteriormente, Roy Thomas viu a possibilidade de trazer de volta narrativas inéditas da equipe.

A principal ideia era de substituir os personagens antigos e transformar os XMen em uma equipe multiétnica. Thomas, Mike Friedrich e Dave Cockrum ficaram responsáveis e assim apareceram os heróis Noturno, Colossus, Tempestade, Pássaro Trovejante e a volta do Wolverine. Inclusive, a revista da esquipe foi aprovada pelo Comic Code.

Giant-Size X-Men n.1 começa com a introdução de cinco indivíduos, um de cada vez, em demonstração de seus poderes. Kurt Wagner (Noturno) é caçado por uma turba bavariana, saltando e escalando prédios; o agente especial canadense Wolverine desembainha uma garra de metal da mão quando bate de frente com seu superior numa base militar; no Quênia, Ororo Monroe (Tempestade) é louvada como deusa por controlar o vento e chuva;

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o fazendeiro siberiano Piotr Rasputin (Colossus) transforma-se num poderoso homem de aço para salvar sua irmã de um trator errante; o apache John Proudstar (Pássaro Trovejante) enfrenta um búfalo numa reserva no Arizona. Cada um deles, além dos parceiros de outras ocasiões Banshee e Solaris, recebem visitas particulares do Professor X, que fez apelo às suas consciências com o bom e velho argumento do poder e da responsabilidade.

Ele os reúne numa mansão no Condado de Wesrchester, onde lhes dá uniformes; e Ciclope, sem opção, explica que os X-Men – Homem de Gelo, Anjo, Garota Marvel, Destrutor e Polaris – estão perdidos em Krakoa, ilha no Pacífico Sul. (HOWE, 2013, p. 167)

Figura 35 - Giant-Size X-Men n.1, 1974

No final da década de 1970, Chris Claremont ficou responsável pelas histórias da equipe, e as novas edições foram um sucesso com os leitores. Ao lado de John Byrne, os X-Men “eram inegavelmente especiais, a mistura mais perfeita de angústia e exaltação que a Marvel já vira desde o Homem-Aranha de Lee e Ditko.” (HOWE, 2013, p. 224) A primeira revista em quadrinhos que Claremont e Byrne trabalharam juntos foi a Uncanny X-Men #108, e após alguns passos incertos, a dupla ganhou força e começou a fazer aventuras que impulsionaram a equipe.

Os dois escritores se complementam com habilidade: Claremont administra com eficiência um grande elenco de personagens e tramas longas, enquanto Byrne contém os piores exageros de seu colega, garantindo que as histórias

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tenham conclusão e que os enredos das edições individuais sejam interessantes o bastante para os leitores desejaram acompanhar as sagas maiores. Byrne também era grande fã dos antigos X-Men e consegue que quase todos os integrantes da equipe original protagonizem participações especiais. (HUNTER, 2003)

A “Saga da Fênix” viria ser a história mais aguardada pelos leitores. Lançada nas edições de X-Men n. 129 a 137 no ano de 1979, a narrativa trazia Jean Grey sendo a escolhida pela entidade cósmica Fênix para ser a sua hospedeira e conseguir poderes absolutos. A heroína se tornou alvo da raça alienígena Shiars, que pretendiam destruir a Fênix; e acabou tendo seus pensamentos manipulados por Mestre Mental, que pretendia usá-la para atingir seus objetivos malignos. Jean Grey se transformou na Fênix Negra e ameaçou consumir o Universo.

Figura 36 - X-Men: A Saga da Fênix Negra, 2019

Chris Claremont esteve por trás de grandes arcos dos portadores do gene X além da “Saga da Fênix” (1980), como “Dias de Um Futuro Esquecido” (1981) e “Massacre de Mutantes” (1986). Também foi responsável pelo crossover dos X-Men com a equipe da DC Comics, Os Novos Titãs em (1981) e a graphic novel “Deus ama, o homem mata” (1982), que será tratada no capítulo 4.

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Figura 37, 38 e 39 – Dias de Um Futuro Esquecido (2014), Massacre de Mutantes (2013) e The Uncanny X-Men And The New Teen Titans (1982)

3.1 Produções audiovisuais

A equipe também recebeu produções audiovisuais de suas histórias, começando com animações no início da década de 1990 após o sucesso das revistas em quadrinhos na década passada. O primeiro desenho da equipe foi “X-Men: A Série Animada”, produzida pela Marvel Entertainment Group e Saban Entertainment, trouxe grandes arcos clássicos dos quadrinhos, como a “Era do Apocalipse” e a “Saga da Fênix Negra”.

Os personagens centrais da animação eram Ciclope, Vampira, Jubileu, Wolverine, Tempestade, Fera, Gambit e o Professor Xavier; também contava com a participação de outros mutantes e heróis da editora, como Doutor Estranho e Capitão América. A série teve 5 temporadas, sendo exibida de 1992 a 1997.

Em 2000 os mutantes ganhariam outra adaptação, dessa vez a série “X-Men: Evolution”, em uma parceria da Marvel Comics com a Disney e foi ao ar até o ano de 2003. A série teve 4 temporadas, e alguns personagens foram criados especialmente para a adaptação, como a X-23, que viria a ser adaptada para os quadrinhos logo após isso. No ano de 2008 é lançado “Wolverine e os X-Men”, produzida pela Marvel Animation. A animação só teve uma temporada, sendo cancelada em 2009.

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Figura 40, 41 e 42 – X-Men: A Série Animada (1992), X-Men: Evolution (2000) e Wolverine e os X-Men (2008)

3.2 Direitos pela 20th Century Fox No ano de 1994, a 20th Century Fox adquiriu os direitos cinematográficos dos X-Men. A equipe teve a sua primeira aparição no live-action “Geração X” em 1996, um piloto para uma série que mais tarde viria a se tornar um telefilme. A história era baseada na HQ “Generation X” lançada em 1994.

Figura 43 – Geração X (1996)

A saga dos mutantes só viria a chegar aos cinemas nos anos 2000, com “XMen: O Filme”. A produção contava com Patrick Stewart, Ian McKellen, Hugh Jackman, Anna Paquin, Halle Berry e James Marsden. A adaptação foi fiel aos 50

quadrinhos e um sucesso para o estúdio, que lançou a continuação “X-Men 2” em 2003 e o final da trilogia em 2006, com “X-Men: O Confronto Final”.

Em 2009 o estúdio decidiu desenvolver uma série de spin-off 5dos mutantes. A ideia era criar filmes contando as histórias dos personagens, e o escolhido foi o Wolverine, interpretado por Hugh Jackman. “X-Men Origens: Wolverine” foi lançado em 2009, e o personagem ganharia outro título solo em 2013, “Wolverine: Imortal”.

A Fox decidiu que a saga dos X-Men sofreria um reboot6. Em 2011 era lançado “X-Men: Primeira Classe”, o primeiro filme da nova saga, que traria a origem de diversos personagens, como Professor Xavier e Magneto. O longa trouxe nomes como James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence e Rose Byrne que viriam a repetir seus papéis na franquia.

Em 2014 é lançado a continuação de “X-Men: Primeira Classe”, e o novo filme adaptaria o arco “Dias de Um Futuro Esquecido”. Os X-Men mandam o Wolverine ao passado para tentar alterar a história e impedir que os homo sapiens e homo superior sejam extintos. Hugh Jackman, Patrick Stewart e Ian McKellen voltam a franquia reprisando os seus papéis da primeira trilogia. E no terceiro filme na nova saga dos mutantes, é adaptado o arco de “A Era do Apocalipse”. “X-Men: Apocalipse” foi lançado em 2016.

No mesmo ano, é lançado um outro spin-off dos mutantes, que traz a adaptação do mercenário tagarela Wade Wilson, o Deadpool, para os cinemas. O elenco conta com nomes como Ryan Reynalds, Morena Baccarin, Ed Skrein, Gina Carano e T. J. Miller. O filme ganhou uma sequência em 2018. O filme aumentou ainda mais o número de mutantes já representados em live-action e conta com os heróis Míssil Adolescente Megassônico, Colossus, Dominó e o vilão Cable.

Depois de 17 anos no papel de Wolverine, Hugh Jackson se despediu do personagem em “Logan”. O filme se passa em 2029, e traz o Wolverine cuidando do Professor Xavier, que é feito também pela última vez por Patrick Stewart e sendo procurado para cuidar de Laura Kinney, uma garota que foi gerada a partir do seu DNA. A produção é inspirada na minissérie “Velho Logan” lançada em 2008.

O grande arco já adaptado em animação, “A Saga da Fênix” foi adaptada de maneira cinematográfica e em 2019 foi lançado “Fênix Negra”. É o 12º filme dos

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Obra derivada. (SPIN OFF, 2019) Reinício da franquia. (JUNIOR, 2018)

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mutantes e é estrelado por James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Sophie Turner e Jessica Chastain. Com a compra da Fox pela Disney, esse é o último filme dos mutantes a ser lançado pelo estúdio.

A Fox também adaptou os mutantes para séries televisivas em 2017, era lançado “Legion” e “The Gifted”. “Legion” traz a história de David Haller, um rapaz diagnosticado com esquizofrenia e que vive em um hospital há 5 anos. Haller é um mutante de nível ômega e filho do Professor Xavier. A série teve 3 temporadas, sendo finalizada em 2019.

Em “The Gifted”, o governo está perseguindo os mutantes, o que leva dois pais a fugirem com seus filhos que possuem habilidades especiais e se juntarem a um grupo de portadores do gene X que vivem às sombras. O grupo é composto por heróis como Polaris, Eclipse, Blink e Pássaro Trovejante. A série tem apenas 2 temporadas, sendo cancelada em 2019.

A seguir, um infográfico com os filmes e séries feitos pela 20th Century Fox por ordem de lançamento.

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Figura 44 – Infográficos com filmes e séries dos X-Men por ordem de lançamento

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4. DEUS AMA, O HOMEM MATA

Figura 45 – Deus ama, o homem mata (2014)

Lançada em 1982, Deus ama, o homem mata é uma das primeiras graphic novels lançadas pela Marvel Comics. Ela traz os X-Men como personagens principais da história e o Reverendo William Stryker como antagonista.

A obra foi parte de uma série de histórias publicadas nesse formato pela Marvel.

No Brasil foi publicada pela primeira vez em janeiro de 1986 com o nome de O conflito de uma raça pela editora Abril, que trouxe várias histórias para uma série de graphic novels. Foi a primeira a ser publicada, diferente dos Estados Unidos que foi a quinta.

Em 2003 ela voltou às bancas pela editora Panini e dessa vez com o nome de Deus ama, o homem mata.

A obra foi escrita por Chris Claremont, desenhada por Brent Anderson e colorida por Steve Oliff. É considerada como o enredo perfeito da natureza dos XMen. (...) essa história mostra, melhor do que qualquer outra, a força que as aventuras da equipe mutante têm como uma metáfora para a superação da intolerância. Uma das primeiras graphic novels autocontidas da Marvel, a obra foi criada para explorar uma abordagem mais madura das histórias dos X-Men e faz um duro alerta de como é fácil as pessoas serem controladas pelo ódio. (HAMMOND, 2015)

A Marvel Comics viu as graphic novels como uma forma de entrar nas livrarias como outros autores de HQs estavam fazendo, como Will Eisner. A ideia principal era 54

lançar edições inspiradas nos livros europeus em um formato maior, com papel, cores e impressão superiores aos que eram utilizados nas revistas em quadrinhos americanas.

As narrativas seriam fechadas para não confundir os leitores com a cronologia das personagens. “Deus ama, o homem mata” é uma das maiores e melhores histórias dos mutantes. A obra inspirou o filme feito em 2003, “X-Men 2”.

4.1 Sinopse “Se um homem não crê, ele já está condenado”. Por anos a fio, os Fabulosos X-Men e Magneto, o mestre do magnetismo, têm sido os mais acirrados inimigos. Mas agora eles precisam juntar suas forças contra um novo adversário que os ameaça, e, talvez, o mundo todo… em nome de Deus. Os membros da Cruzada Stryker estão preparados para purificar a Terra, sem se importar com as consequências sangrentas de sua causa. Tendo o Professor X como inimigo e Magneto como aliado, os X-Men são submetidos a uma provação ordenada por um pastor enlouquecido!”

4.1.1 Desenvolvimento

Apesar de ser um desafio escrever histórias fechadas, Chris Claremont foi eficiente em escrever Deus ama, o homem mata sem deixar um enredo aberto, como era o seu hábito de escrever para as revistas mensais da equipe.

Ao site Vox.com, Claremont conta que a história foi planejada para aqueles que, não acompanhavam as histórias regulares dos X-Men, mas quisesse descobrir sobre o que é a história dos mutantes, os conceitos, os personagens e a realidade deles.

Ele também diz que queria fazer algo diferente por ser a primeira graphic novel da equipe, já que por causa do público-leitor, eles não tentavam em uma edição regular das histórias em quadrinhos dos X-Men. Mais importante, eu queria fazer uma história que fosse totalmente independente, para que se pudesse ir a um leitor e dizer, ou [ir] ao público e dizer: "Se você nunca leu uma edição dos X-Men antes, se você nunca mais quiser ler uma, mas quiser ler uma história, um projeto que engloba tudo o que, para mim, talvez os X-Men, como personagens e conceitos, o que é, a

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luta deles, a luta pessoal, sua luta temática, o conflito de heróis, vilões - seria isso”. (CLAREMONT, 2017)

Também para desenvolver a narrativa de “Deus ama, o homem mata”, Claremont conta em um conteúdo exclusivo que saiu junto com a história reeditada em 2014, pela Panini, que estudou a fundo a bíblia para criar a base da história.

4.1.2 Personagens

A narrativa tem como personagens centrais Professor Xavier, Ciclope, Tempestade, Ariel, Colossus, Noturno, Wolverine, Magneto e o vilão William Stryker.

Charles Xavier é o líder dos X-Men, e o mutante mais poderoso do mundo. Seu poder é a telepatia, sendo capaz de ler a mente das pessoas e projetar seus próprios pensamentos em até 400 quilômetros. Também possui a habilidade de manipular mentalmente os outros, podendo até mesmo apagar memórias totais ou parciais de alguém.

Scott Summers, alter ego de Ciclope, é um dos membros originais da equipe.

Ele possui a capacidade de emitir poderosas rajadas de seus olhos, e para controlar o seu poder, usa um visor de quartzo rubi. Seus poderes vêm de uma outra dimensão, chamada de “dimensão vermelha”, e Scott metaboliza a energia ambiente para abrir os portais, fazendo com as rajadas ópticas sejam liberadas.

Descendente de uma antiga linhagem real de sacerdotisas africanas possivelmente mutantes, Ororo Munroe é uma das X-Men mais poderosas e pode controlar o tempo, sendo capaz de fazer chover, criar relâmpagos e os manipular como ataque. Tempestade é considerada uma mutante de nível Ômega.

Kitty Pryde nessa história usa o nome de heroína Ariel, mas possui outros nomes, sendo popularmente conhecida como Lince Negra. Kitty pode passar por qualquer metal sólido já que o seu corpo é capaz de separar as moléculas e durabilidade orgânica. Também tem a habilidade de teletransporte temporal, podendo transportar a consciência de numa pessoa para o seu corpo mais jovem no passado.

Piotr Rasputin é um mutante russo, que atende pelo nome heroico de Colossus.

Seus poderes fazem com que ele seja capaz de transformar os tecidos corporais em um tipo de metal orgânico altamente resistente, e quando ativa o seu estado de armadura, ganha força e resistência sobre-humana.

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Noturno é filho dos mutante Mística e Azazel, nascido na Alemanha e que possui a aparência de um demônio, tendo uma camada espessa de pelos azuis escuros, orelhas pontiagudas, três dedos em cada mão, dois dedos em cada pé e uma cauda. Kurt Wagner é conhecido pelo seu poder de teletransporte, podendo viajar até mesmo para outra dimensão. Ele também consegue fundir-se as sombras, possui uma superagilidade, visão noturna, percepção aguçada e aderência física, que lhe permite andar em tetos e paredes.

Nascido na segunda metade do século XIX no Canadá, Wolverine foi recrutado na última metade do século XX pelo governo do país para participar do projeto Arma X. No projeto foi introduzido em seus ossos o metal adamantium beta, que permite que o metal se adapte e funcione com a capacidade de regeneração rápida do Logan.

Magneto é o maior vilão dos X-Men, mas nessa história acaba sendo um aliado para derrotar o inimigo em comum. Nasceu na Alemanha sob o nome de Max Eisenhardt e tem a origem judia, tanto que passou até pelo campo de concentração de Auschwitz. Após fugir, alterou seu nome Erik Magnus Lehnsherr. O personagem possui a habilidade de controlar campos magnéticos; e é pai dos mutantes Feiticeira Escarlate, Mercúrio e Polaris.

William Stryker é um ex-sargento do exército americano, que mais tarde veio a se tornar um reverendo que se apoiou a bíblia para criar a Cruzada Stryker após a morte de sua esposa e filho em um acidente de carro.

Figura 46, 47 e 48 – X-Men, Magneto e William Stryker

A problemática apresentada na história e em seus personagens, reflete a realidade dos fatos que as minorias sociais passam diariamente há vários séculos.

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5. O QUE SÃO AS MINORIAS SOCIAIS?

5.1 Classes sociais

A sociedade em si compreende os indivíduos e os agrupa em situações comuns de existência. A pessoa "pertencendo a determinada categoria social, os indivíduos têm participação coletiva dentro dessa categoria social, que, por sua vez, se integra ao todo da sociedade" (GOMES, 2017, p. 45).

E a maioria da sociedade em si nos dias de hoje, é completamente desigual, que se "evidencia com extrema clareza nas sociedades modernas, capitalistas, através de uma categoria social chamada classe social" (GOMES, 2017, p. 45).

Especialistas dizem que a divisão das classes sociais se estabelece por conta da força e do interesse distinto pela diferença econômica entre as categorias sociais.

As classes sociais estão presentes desde a criação da agricultura. A sua invenção 12 mil anos atrás alterou as relações entre os humanos. O homem mais influente de determinada tribo se aproveitava e tinha controle sobre o trabalhador, para poder ganhar às custas do outro por estar cedendo a terra explorada. Foi aí que começou a exploração do homem pelo homem e o surgimento das classes sociais.

Na sociedade suméria já existia classes organizadas por volta de 5 mil anos atrás. Desde o nascimento, as pessoas já sabiam a qual classe pertenciam, através de um sistema bastante hierárquico. O antigo Egito também. Governantes, sacerdotes, soldados, camponeses e escravos formavam grupos fechados, e era impossível uma pessoa passar para outro grupo.

O status era muito importante no mundo dos antigos, na Roma Antiga, os homens livres eram divididos em duas classes: os patrícios, que eram os nobres que controlavam a terra e os assuntos de estado, e os plebeus, que eram homens fadados ao trabalho manual e frequentemente rebaixados a escravos.

A primeira luta de classes sociais da história foi durante o Império Romano, em 494 a.C. quando os plebeus fizeram uma greve geral, e com isso ganharam alguns tipos de proteção, acesso a magistratura e ao senado.

Enquanto Roma criava um grande e elaborado império, as oportunidades para os romanos de todas as posições sociais aumentavam. As posições mais baixas do Império foram preenchidas por pessoas de fora da linhagem étnica romana. A 58

distinção de classe entre os romanos foi reduzida, fazendo com que surgisse novas oportunidades de promoção no serviço militar, oportunidades para obter propriedades, e mais plebeus subiam no sistema.

Com a queda do Império Romano em 500 d.C. por conta das invasões dos povos germânicos, surgiu uma onda de insegurança na Europa que permaneceu por diversos séculos. As pessoas para se proteger da pobreza e adquirir segurança, iam atrás dos senhores feudais. Em troca de proteção, as pessoas aceitavam servir os senhores pelo resto de suas vidas. Assim, era repetido o tipo de relacionamento feito de dominação e obrigação em todas as camadas da sociedade.

Tudo isso mudou com a Revolução Francesa em 1789. O ato revolucionário marcou o fim do absolutismo na França. Foi nesse movimento que surgiu os direitos sociais e as liberdades individuais.

A causa da revolução foi a crise política, econômica e social que estava acontecendo na França no final do século XVIII. Foi o fim da monarquia absolutista governada pelo rei Luís XVI. Naquela época a sociedade francesa era dividida por três classes sociais, conhecidas como estados. O primeiro estado era o clero (igreja), o segundo estado a nobreza, e o terceiro estado era o povo (burgueses e camponeses).

A sociedade francesa era uma sociedade completamente desigual, e isso foi a raiz da crise no século XVIII. A nobreza e o clero aproveitavam de seus privilégios, e com medo de perdê-los por conta do avanço do capitalismo, os franceses do alto escalão eram completamente resistentes a essa ideia e a França vivia num atraso econômico.

O governo francês gastava muito nessa época, e por um envolvimento na Revolução Americana, acabou entrando numa crise econômica que impactou nas relações sociais. A nobreza começou a explorar mais o povo, aumentando os impostos e ocupando os cargos que eram destinados à burguesia.

Os Estados Gerais foram convocados por conta da crise que havia sido instalada. Os Estados Gerais eram um tipo de assembleia e só era convocada em momentos de crises.

Os representantes dos três Estados franceses eram convocados para debater soluções para a crise. Depois, as soluções passavam por uma votação que era realizada pelo Estado, e não pelo indivíduo. O primeiro e o segundo Estado sempre se reuniam para derrotar o terceiro Estado, e por isso os burgueses começaram a 59

exigir que o voto fosse individual. Sendo negado o pedido do terceiro Estado, foi criada a Assembleia Nacional Constituinte.

Com o apoio do povo que já se encontravam enfurecidos com o rei, piorou quando foi ordenado o fechamento da Constituinte. Parisienses rebelaram-se e atacaram a Bastilha (prisão para onde eram enviados opositores da nobreza francesa). A Queda da Batilha marcou o começo da Revolução Francesa, que se estendeu por dez anos.

Os dez anos da Revolução Francesa geraram implicações para a França e para o mundo. Foi dado o fim dos privilégios de classe na França, consolidou o capitalismo no país, início da queda do absolutismo na Europa, popularizou a república como modo de governo, separação entre os poderes, os homens passaram a ser iguais perante a lei. A revolução também inspirou movimentos de independência na América.

Além de tudo isso, houve o aumento do abismo de classe entre os mais pobres e os burgueses.

Na Revolução Industrial que começou na Inglaterra na segunda metade do século XVIII, muitas famílias saíram da zona rural e foram para a cidade atrás de uma melhoria de vida. Com o trabalho em indústrias, os trabalhadores recebiam um baixo salário, e tinham que lidar com uma alta carga horária, que podia chegar até 16 horas por dia. Os trabalhadores chegaram a se mobilizar atrás de condições de trabalho melhores, e isso levou à criação dos sindicatos.

A ideia de classe surgiu com o crescimento das cidades, e a revolta do proletariado contra os patrões por benefícios melhores, chamou a atenção de intelectuais da época, como o Karl Max. Karl Marx defendia uma mudança radical na sociedade. Em sua obra conjunta com Friedrich Engels, "Manifesto Comunista" foi encomendada em novembro de 1847, sob o olhar de que a Europa estaria às vésperas de uma revolução. A encomenda foi feita pela Liga dos Comunistas, e mesmo com ameaças a Marx por conta da demora, o Manifesto coincidiu com o início da revolução esperada no final de fevereiro de 1848.

Marx começa dizendo que "a história de todas as sociedades até hoje existentes são as histórias das lutas de classes" (MARX, ENGELS, 2010, p. 40). Ele traz as mais diversas variações de classes sociais durante a história, desde a Roma Antiga até a Idade Média. Apesar de nos dias de hoje, é muito comum que as classes 60

sociais sejam divididas pelo poder aquisitivo, mas isso não quer dizer que não exista distinções por outros motivos.

5.2 Minorias Sociais

Mesmo recebendo o nome de minorias sociais, não significa que elas sejam minorias no geral, apenas no poder. É comum no poder encontrar homens, héteros e brancos. Enquanto mulheres, negros e LGBTQIA+ possuem só uma pequena parcela de participação nesse cenário.

As minorias sociais sofrem diversos tipos de violência frequentemente, que vão desde abusos psicológicos a agressões físicas. Aqui no Brasil, é muito comum ver manchetes catastróficas ligadas à essas classes nos jornais.

Figura 49 – Manchete sobre a morte da vereadora Marielle Franco em 2018, G1

Figura 50 – Manchete sobre os cinco anos após a prisão de Rafael Braga que ocorreu em 2013

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Figura 51 – Manchete sobre o caso de homofobia em um jovem de Pernambuco em 2019

Pode-se, então, agora, definir o que são essas relações de violência como toda e qualquer relação social caracterizada pela imposição realizada por um indivíduo ou grupo social a outro indivíduo ou grupo social contra a sua vontade ou natureza. (BAYLÃO, 2001, p. 216 apud VIANA, 1999, p. 224)

A violência contra a minoria pode ser dividida em três tipos com a violência econômica, violência simbólica e violência material.

1) violência econômica: aquela que visa à imposição de uma transferência injustificada de valores econômicos, seja através da exploração direta da força de trabalho, seja por meio da depreciação impositiva de bens destinados ao mercado, ou por outro mecanismo qualquer de transferência de renda; 2) violência simbólica: consiste na imposição de valores culturais e ideológicos, o que pode acontecer tanto na forma de uma sutil dominação cultural e ideológica, quanto tomar a forma mais agressiva do preconceito, e 3) violência material: é a violência em sentido estrito, que se baseia na imposição da vontade pela ameaça ou pelo próprio uso da força física.

(BAYLÃO, 2001, p. 217)

A maioria acredita que possui uma visão correta, e que tudo que foge de sua crença, está errado. As pessoas costumam utilizar o termo "vontade de Deus", como se justificasse os seus atos contra aqueles que são diferentes, gerando atos de opressão.

As minorias, por seu lado, abrigam aqueles grupos socialmente oprimidos, para os quais a eliminação das relações de violência a que estão submetidos não implica, necessariamente, em uma transformação que transborde os limites estruturais da ordem socioeconômica vigente. A essência da definição, como veremos adiante, é uma relação de opressão que tem como causa primeira um fenômeno específico, distinto da existência de uma sociedade de classes. (BAYLÃO, 2001, p. 219)

A minoria social pode se caracterizar em dois grupos: os socialmente vulneráveis e os socialmente ameaçados. O grupo socialmente vulnerável sofre a 62

partir do momento que seus opressores tomam como negativa, características partilhadas por seus membros.

Pode ser classificado por minorias de gênero, minorias etárias, minorias raciais, portadores de deficiência física, homossexuais, portadores de doenças e minorias religiosas.

1) minorias de gênero: a característica relacionada é o sexo e o grupo oprimido são as mulheres; 2) minorias etárias: a característica relacionada é a faixa etária e os grupos oprimidos são as crianças, os adolescentes e os idosos; 3) minorias raciais: a característica relacionada são os sinais fenotípicos dos indivíduos dos grupos. No Brasil, a opressão racial dirige-se contra os negros; 4) pessoas portadoras de deficiência: a característica relacionada é qualquer deficiência física ou mental e os grupos oprimidos são os indivíduos portadores dessas deficiências; 5) homossexuais: a característica relacionada é a orientação sexual e os grupos oprimidos são os homossexuais do sexo masculino e do sexo feminino; 6) pessoas portadoras de doenças: a característica relacionada é a ocorrência de doenças estigmatizadas socialmente, como, por exemplo, a lepra e a AIDS; os grupos oprimidos são os portadores de tais doenças; 7) minorias religiosas: a característica relacionada é a profissão de fé religiosa e os grupos oprimidos são os seguidores de uma determinada religião.

(BAYLÃO, 2001, p. 222-223)

De acordo com Baylão (2001), o grupo de socialmente ameaçados contém a mesma classificação do anterior, só que as relações de violência que caem sobre eles se encontram na própria situação de alteridade que eles se encontram à frente da formação social dominante.

Referidos por esta como marginais, periféricos, arcaicos, atrasados, eles são vistos como “o outro”: confusos, estranhos e, se não perigosos, um obstáculo a ser afastado. Assim, as construções ideológicas do grupo dominante são muito mais complexas e difíceis de serem desconstruídas, o que torna a opressão, muitas vezes, dificilmente perceptível, mesmo para os indivíduos que a sofrem. (BAYLÃO, 2001, p. 223)

Esses grupos recebem um ódio gratuito por serem diferentes da maioria social.

O maior exemplo desse ódio, pode ser citado como a perseguição aos judeus, negros e homossexuais na Alemanha Nazista em na década de 1930.

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6. SEMIÓTICA

6.1 O que é semiótica?

Semiótica é a ciência de toda e qualquer linguagem, seja ela verbal ou não verbal, a fim de desvendar a ação do signo. “A Semiótica é a ciência que tem como objeto de estudo todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido.” (SANTAELLA, 2007, p. 13) O termo semiótica "vem da raiz grega semeion, que quer dizer signo. Semiótica é a ciência dos signos.” (SANTAELLA, 2007, p.7) e essa teoria teve um surgimento peculiar. “A primeira peculiaridade reside no fato de ter tido três origens ou sementes lançadas quase simultaneamente no tempo, mas distintas no espaço e na paternidade.” (SANTAELLA, 2007, p.15). A semiótica possui três correntes, a semiótica francesa de Argildas Julien Greimas, a semiótica russa de Iuri Lotman, e a semiótica peirceana, de Charles Sanders Peirce.

Antes de dar enfoque na teoria de Charles S. Pierce que será utilizada como base da análise do objeto escolhido (graphic novel), é importante saber um pouco das outras correntes semióticas.

A semiótica francesa, conhecida também como semiótica da Escola de Paris, foi criada para ser uma metalinguagem por A. J. Greimas. Ela se dedica ao estudo do conteúdo e a sua arquitetura, analisando a organização do texto para exprimir o conteúdo.

Nascida na década de 1960, a semiótica greimasiana surgiu no auge do estruturalismo e tem como precursores os linguistas Ferdinand de Saussure e Louis Hjelmslev. Teve também como grandes influências além da linguística, a antropologia e a filosofia.

A semiótica russa, ou semiótica da cultura, surgiu durante década de 1960 na antiga União Soviética por meio de um grupo de pesquisadores que tinham o intuito de estudar a comunicação.

Essa corrente abrange um legado enorme de discussões, que se dobra sobre aspectos sociais, filosóficos, tecnológicos que, de alguma forma, têm influência sobre a produção sígnica de determinada cultura e dão conta dos processos de significação e de comunicação de um grupo social; isto é, tenta

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entender como são os registros, as representações da cultura nos diferentes suportes que ela dispõe e em diferentes momentos histórico-sociais.

(VELHO, 2009, p. 250)

O intuito da pesquisa era estudar o papel da linguagem em variadas manifestações culturais, que até então estava circunscrito à Linguística e à Literatura (VELHO, 2009, p. 250). Tudo começou com Iuri Lotman, que por conta da censura do governo de Stalin, acabou imigrando para a Estônia com a finalidade de conseguir publicar os seus estudos.

Na Estônia, Lotman se juntou a outros pesquisadores e surgiu a Escola de Tartu (ETM), o grupo responsável pela semiótica da cultura. Os principais representantes dessa teoria são Vyacheslav Ivanov, T. V. Civ’jan, M. B. Mejlax, A. M. Piatigorsky, B. Ogibenin, I. I. Revzin, O. G. Revzina, V. N. Toporov e Boris. A. Uspenskij e outros (KIRCHOF, s. a., p. 64 apud SEBEOK, 1988).

Esse grupo de estudo priorizava a cultura a partir do viés semiótico. A semiótica russa não é uma teoria semiótica unificada. Os temas abordados são bastante diversificados. A ETM tem como característica a proximidade das ciências humanas e exatas, estudo da literatura no pensamento social, interesse pela história russa, tipos de comunicação humana, tratamento das formas de comunicação como linguagem ou sistemas de signos, e a sua interdisciplinaridade.

6.2 Teoria Peirceana

A semiótica peirceana, também conhecida como semiótica americana, foi criada por Charles S. Peirce. Peirce é considerado um cientista. Ele fez estudos em diversas áreas da ciência, como matemática, física, astronomia, química, biologia, geologia, psicologia, filologia, história e linguística.

Apesar de ser um cientista que havia feito descobertas importantes nos mais diversos campos da ciência, Peirce tinha uma paixão pela lógica, mais precisamente pela lógica das ciências. Durante 60 anos de sua vida, lutou pela consideração da lógica como uma ciência. (SANTAELLA, 2012, p.27) Desde o começo do despertar do seu interesse pela lógica, Peirce a concebeu como nascendo, na sua completude, dentro do campo de uma teoria geral dos signos ou Semiótica. Primeiramente, ele concebeu a lógica propriamente dita (aquilo que conhecemos como lógica) sendo um ramo da Semiótica. Mais tarde, ele adotou uma concepção muito mais ampla da lógica

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que era quase coexistiva a uma teoria geral de todos os tipos possíveis de signos. Na última década de sua vida, estava trabalhando num livro que se chamaria Um Sistema de Lógica, considerada como Semiótica.

(SANTAELLA, 2012, p. 31)

A função da semiótica é classificar e especificar os mais diversos signos logicamente possíveis e para Peirce existia dois tipos de semiótica: a geral e a especial. A semiótica geral abrange as designações da lógica, filosofia da lógica, filosofia de ciência e epistemologia. O objetivo que ele possuía era de dar a concepção do pensamento como um processo de interpretação do signo com base numa relação triádica entre signo, objeto e interpretante (COELHO NETTO, 2014, p. 53).

A semiótica especial para Peirce surgia quando o homem ia em busca da verdade, para ter consciência de si mesmo e ser capaz de promover a autocrítica.

Esta atividade 'comum' serve-se de uma lógica (ou método) natural para cuja designação Peirce utiliza a terminologia medieval logica utens, ou lógica-emuso. Esta é instintiva no homem e permite a satisfação das necessidades revelam-se de uma ordem superior, a logica utens apresenta-se como base, indispensável, para uma lógica mais complexa ou logica docens, uma lógica que pode ser ensinada e que significa um método teoricamente desenvolvido de buscar a 'verdade'. Aquela ciência psíquica ou semiótica especial pode então, agora, receber a designação simples de Lógica; como o próprio Peirce reconheceu, a Lógica era apenas um outro nome para Semiótica, e viceversa. (COELHO NETTO, 2014, p. 54)

Para entender a semiótica, é necessário entender o seu objeto principal: o signo. Para Peirce, o signo é qualquer coisa que representa uma outra coisa.

Dirigindo-se a essa pessoa, esse primeiro signo criará na mente (ou semiose) dessa pessoa um signo equivalente a si mesmo ou, eventualmente, um signo mais desenvolvido. Este segundo signo criado na mente do receptor recebe a designação de interpretante (que não é o intérprete), e a coisa representada é conhecida pela designação de objeto. Estas três entidades formam a relação triádica de signo (...). (COELHO NETTO, 2014, p.56)

O signo tem relações causais com o interpretante, o interpretante com o objeto, mas o signo e o objeto não possuem relação entre si (apenas em determinados casos). A relação do signo com o interpretante se dá pela referência que ele causa por conta de fatores sociais e psicológicos, através dos efeitos causados pelo signo sobre o receptor.

A relação entre o interpretante e o objeto, pode ser direta ou indireta. A direta se dá pelo campo de visão, quando você observa algo, já a indireta é quando se pensa 66

sobre algo. Signo e objeto só possuem relação em casos específicos, em sua maioria não se interligam.

Quando eles não estão relacionados, funciona assim: O meu entendimento sobre alguma coisa, pode ser diferente de sua representação. Entre eles não existe nenhuma relação casual ou de obrigatoriedade: nada liga uma coisa à outra (COELHO NETTO, 2014, p. 57).

Para Peirce, os signos possuem classes e ele os dividiu em dez tricotomias e sessenta e seis classes de signos. Mas dentre todas as tricotomias, apenas três foram escolhidas por Peirce para ter explorações precisas. As demais classes nunca chegaram a ter muitos detalhes.

A primeira tricotomia traz o qualissigno, o sinsigno e o legissigno. Essa classificação diz respeito ao signo considerando a si mesmo. Um qualissigno é entendido por uma qualidade que é um signo. Como por exemplo a percepção das cores.

Um sinsigno é entendido quando coisas ou eventos existentes são considerados signos, como por exemplo um diagrama de algo em particular. O sin inicial de seu nome indica que se trata de algo singular, no sentido de como se fosse apenas uma vez. Para Peirce, o sinsigno só pode existir através da qualidade.

O legissigno, tem a sua inicial remetendo a palavra lei. Ele não se trata de nenhuma coisa ou evento singular, mas sim de uma convenção ou lei estabelecida pelo homem, como as palavras.

A segunda tricotomia é a mais conhecida, e traz o ícone, índice e símbolo. Ela relaciona o signo e o objeto. O ícone é um signo que tem semelhança com o objeto representado, como por exemplo um boneco de algum personagem famoso, uma fotografia de um livro.

O índice é um signo espontâneo, como a fumaça que indica que tem fogo, a janela molhada que indica que choveu. O índice também pode ser um pronome demonstrativo, um número, uma seta, entre outras coisas. O símbolo refere-se ao objeto denotado e sendo marcado por sua arbitrariedade. Como por exemplo o símbolo do Superman, a cor vermelha como símbolo da paixão, a bandeira de algum país.

Peirce observa que o símbolo é de natureza geral, tanto quanto o objeto denotado; mas, como aquilo que é geral deve existir também nos casos

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determinados, pode-se dizer que esses casos indiretamente afetam o símbolo, razão pela qual há no símbolo uma certa espécie de índice. Mesmo assim, a razão da existência do símbolo não deve ser procurada nessa afetação, mas em seu caráter convencional, arbitrário. (COELHO NETTO, 2014, p. 58)

A terceira tricotomia considera a relação do signo com o interpretante. Ela é dividida em rema, dicissigno e argumento. O rema é um signo que funciona para o interpretante como uma hipótese que pode ou não acontecer. Ele não é passível de julgamento, sendo nem falso nem verdadeiro, e uma palavra isolada pode funcionar como rema.

Um dicissigno, também conhecido como dicente, é um signo de existência real, como expressão de ideias passíveis de julgamento. Ele pode aparecer em frases simples e diretas com sujeito e predicado, sem necessariamente serem concluídas, como por exemplo a frase "o gato mia".

O argumento é um signo de razão. Ele possui definições precisas, correspondendo a um juízo. Muito presente em leis de física, previsões acertadas e silogismos.

As três tricotomias foram reunidas por Peirce em categorias chamadas de primeiridade, secundidade e terceiridade. A primeiridade traz o nível do sensível e do qualitativo e abrange o qualissigno, o ícone e o rema. A secundidade traz o nível da experiência, da coisa ou do evento, como no sinsigno, índice e do dicissigno. A terceiridade traz referência à mente, ao pensamento, à razão, envolvendo o legissigno, o símbolo e o argumento.

A primeiridade não possui referência a nada mais, traz a qualidade de perceptiva ou de sensação. Ela não pode ser explicada, afirmada ou pensada. Tem como exemplo a qualidade absoluta de uma cor, sem remetê-la a uma sensação ou comparação a algo.

A secundidade é o que é por causa de outro. Ela envolve reação a algo, resposta, e só existe porque é um fenômeno provocado por alguma coisa. Ela é correspondida através da percepção de fatos atuais, sendo a constatação da origem ou do motivo da sensação.

A terceiridade se dá pelo lugar de um outro. É a representação em si, tendo os pensamentos em formato de signos. Diz respeito à percepção de leis e regras que dominam os fenômenos e permitem que eles sejam generalizados para obter uma compreensão maior. A tabela abaixo demonstra um quadro geral da semiótica 68

baseado nos livros de Lucia Santaella, “O Que É Semiótica?” e “Semiótica, Informação e Comunicação” de J. Teixeira Coelho Netto.

Signo em relação a

Signo em relação ao

Signo em relação ao

si

objeto

interpretante

1°

Qualissigno

Ícone

Rema

2°

Sinssigno

Índice

Dicissigno

3°

Legissigno

Símbolo

Argumento

1ª tricotomia

2ª tricotomia

3ª tricotomia

Tabela 3 – Quadro geral da semiótica peirceana

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7. ANÁLISE

7.1 Como foi feita a análise?

As histórias em quadrinhos não são inocentes, sobretudo quando se leva em conta os discursos ideológicos transmitidos por suas narrativas na época da Segunda Guerra Mundial. Segundo Gelson Vanderlei Weschenfelder, as histórias se expõem de forma perspicaz às questões referentes à ética e moral, que todo “ser normal” enfrenta em seu dia a dia.

Estas histórias introduzem e abordam de forma vivida as questões de suma importância enfrentadas pelos seres humanos, as questões referentes à ética, à responsabilidade pessoal e social, à justiça, ao crime e ao castigo, à mente e às emoções humanas, à identidade pessoal, à alma, à noção de destino, ao sentido de nossa vida, ao que pensamos da ciência e da natureza, ao papel da fé na aspereza deste mundo, à importância da amizade, ao significado do amor, à natureza de uma família, às virtudes clássicas como coragem e muitos outros temas.

(WESCHENFELDER, 2012)

Todo o caminho percorrido até o momento é importante para facilitar a compreensão sobre essa parte do trabalho. Tudo que foi dito nos capítulos anteriores e no início desse, possui uma ligação direta com a análise que será apresentada. Sem esses referenciais, é impossível compreender o que está nas entrelinhas da história.

A semiótica foi escolhida para auxiliar nesse percurso para poder reparar se a graphic novel em questão, age como representação do contexto real em que minorias são disseminadas frequentemente e, também, são violados os direitos humanos.

Com auxílio do livro “Apocalípticos e Integrados”, de Umberto Eco, a análise será construída com base nos pontos impactantes da graphic novel, do contexto apresentado pelo autor da obra e a história “oculta” dos portadores do gene X. Aliada do argumento, elemento da terceira tricotomia da semiótica peirceana que retrata o signo em relação ao interpretante. O argumento será o ponto chave para conseguir compreender e comparar a história com a realidade.

Ao final, trarei demonstrações da história sendo analisados e comparados com a segunda tricotomia da semiótica peirceana, que relaciona o signo e o objeto. Essa tricotomia traz os elementos ícone, índice e símbolo.

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O problema questionado é se a narrativa da graphic novel “Deus ama, o homem mata” pode ser entendida como uma analogia ao desrespeito às minorias sociais. As possíveis respostas são:

1. Sim, a graphic novel demonstra em sua narrativa metáforas e analogias contra as minorias sociais, e podem conduzir os leitores à reflexão e ao respeito.

2. Não, a graphic novel não inspira à reflexão, é apenas entretenimento puro.

7.2 Análise Como citado anteriormente, a graphic novel “Deus ama, o homem mata”, foi publicada em 1982 pela Marvel Comics, nos Estados Unidos. A narrativa foi escrita por Chris Claremont, o nome responsável pelos maiores “clássicos” dos X-Men. O próprio Stan Lee, um dos criadores da equipe, confidenciou que os X-Men são uma metáfora para o preconceito racial. Em sua criação da década de 1960, o contexto histórico dos Estados Unidos marcou muito a concepção da ideia dos heróis mutantes. Principalmente Martin Luther King Jr e Malcolm X, que viriam a servir de inspiração, como já foi dito, à criação do Professor Xavier e de Magneto.

Na época, milhares de pessoas marchavam para Washington para os protestos contra a falta de empregos e a preservação dos direitos civis para os negros, demonstrando que o país americano deveria rever o seu conceito de política. A primeira edição dos X-Men foi lançada um mês após o famoso discurso de Martin Luther King Jr, na famosa Marcha sobre Washington (The March on Washington).

Talvez a grande urgência em se falar sobre os conflitos causados pela discriminação, na época, tenha alavancado o sucesso de X-MEN, cujo criador já era muito bem-sucedido (...). Diferente dos outros heróis, os mutantes lutavam contra a segregação. É compreensível que num país onde o preconceito era respaldado por instituições como a Ku Klux Klan, histórias acerca de aceitação e pertencimento causassem, pelo menos, polêmica.

(GONÇALVES, 2008, s. p.)

Por possuírem poderes que os fazem diferentes dos demais e serem considerados como homo superior – (a evolução do homo sapiens), os portadores do gene X acabam sendo vítimas de discursos de ódio, a exemplo do que acontece com a população LGBTQIA+, negros, mulheres e deficientes.

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Visto que estes são rechaçados pela elite conservadora da sociedade, caçados e condenados por fanáticos religiosos e estão sempre no plano de discussão das políticas públicas havendo quem os apoie e quem queira seu controle ou até mesmo seu extermínio. (SILVA, 2017, p. 628)

As suas histórias são um modo de mostrar ao seu público leitor as questões que mais acontecem na sociedade, e alertar sobre o discurso de ódio contra os diferentes. Além do mais, eles trazem um recado de aceitação em suas narrativas.

Mesmo que os seus poderes tragam essa alusão à representação das minorias sociais, os X-Men possuem membros representantes delas. Ororo, por exemplo, a “deusa” Tempestade, é uma mulher negra; o Professor Xavier é paraplégico e, o Estrela Polar (por mais que não se encontre na graphic novel) é assumidamente gay.

Também em uma de suas histórias percebe-se uma alusão ao vírus HIV, quando o Vírus Legado foi liberado por Conflyto, um clone terrorista de Cable, dizimando grande parte dos mutantes. Em algumas edições, é possível ver metáforas a acontecimentos da vida real, principalmente fatos da história dos Estados Unidos.

São muitas as ligações entre as histórias dos X-MEN e a história dos Estados Unidos, talvez as mais notáveis estejam nos primeiros números. Em 1965, por exemplo, na edição de número onze, o intolerante Magneto é neutralizado, perdendo uma batalha para outro mutante, essa edição foi lançada em maio, mais ou menos três meses após o separatista Malcolm X ser assassinado por membros da Nation of Islam, grupo do qual Malcolm X foi membro. Já em 1968, na edição de número quarenta e três, os X-MEN encontram uma mensagem póstuma do Professor Charles Xavier, na qual ele pede a seus alunos que continuem a lutar. Essa edição foi lançada em abril, mesmo mês em que Martin Luther King Jr foi assassinado. (GONÇALVES, 2008, s. p.)

Em “Deus ama, o homem mata” vemos o antagonista da obra, William Stryker, proferir uma caçada aos portadores do gene X com os seus grandes discursos, muitas vezes sendo até transmitidos pela televisão para atingir mais pessoas que possuem o mesmo pensamento. Isso pode ser notado logo no primeiro capítulo, onde Kitty Pryde e um homem discutem por ele ser membro da “Cruzada Stryker” e propagar mensagens de intolerâncias sobre os “mutunas”.

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Figura 52 – Kitty Pryde discutindo com um homem sobre a Cruzada Stryker

Os integrantes desse grupo também não aceitam as pessoas que são simpatizantes dos mutantes. Um bom exemplo disso é na cena em que uma pessoa quer matar a personagem Dona Hunter, por considerar ela “traidora”.

Figura 53 – Membros da Cruzada Stryker vigiando os mutantes e seus simpatizantes

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A Cruzada Stryker, relembra muitos fatos históricos que aconteceram no mundo em diferentes épocas, como o Macarthismo, o Nazismo e, mais distante no tempo, a Caça às bruxas na Idade Média.

O movimento político norte-americano personificado pelo senador republicano Joseph McCarthy, o Macarthismo foi um modo polêmico que violava o direito civil previsto na Constituição, para combater o comunismo no país no auge da Guerra Fria entre a União Soviética e os Estados Unidos. Foi um dos maiores episódios de repressão política no país, durando de 1946 a 1956.

O nazismo surgiu logo após a Primeira Guerra Mundial. A Alemanha havia perdido a guerra e passava por muitas dificuldades econômicas, e em 1919 surgiu o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores, que ficou conhecido como Partido Nazista. O partido foi governou o país sob a liderança de Adolf Hitler de 1933 e 1945, iniciando a Segunda Guerra Mundial.

A ideologia nazista não valorizava a democracia, os direitos humanos e a paz.

Eles acreditavam que eram superiores a determinadas raças, e por conta desse pensamento, deu início ao maior genocídio da história. O povo germânico considerava raças inferiores os afrodescendentes, ciganos, pessoas com deficiência, e principalmente, os judeus. O regime nazista matou mais de 10 milhões de pessoas, e a sua maioria era de origem judaica.

O acontecimento mais semelhante à Cruzada Stryker é a caça às bruxas que chegou ao seu auge entre os séculos XV e XVII. Era comum na Idade Média benzedeiras e curandeiras serem respeitadas pela sociedade, mas com o decorrer do tempo, elas começaram a ser consideradas bruxas por conta de sua ligação com ervas medicinais.

A corrida para acabar com as bruxas começou devido à crença de que as mulheres que praticavam rituais deveriam ser punidas. Eles possuíam a ideia de que as bruxas, benzedeiras e curandeiras recebiam o auxílio de espíritos que se transformavam em forma de animais, e viajavam para reuniões noturnas onde supostamente faziam ritos de adoração ao diabo.

Durante 400 anos, as autoridades religiosas da Europa prenderam, torturaram e assassinaram pessoas pelo crime de feitiçaria. A maioria das vítimas eram mulheres que ganhavam a vida fazendo feitiços, simpatias e remédios naturais.

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A perseguição às mulheres acusadas de bruxaria, só acabou quando a amante do rei francês Luís XIV, marquesa de Montespan, foi acusada de satanismo. O rei interviu proibindo a perseguição às bruxas na França, e logo outros reis o seguiram nesse decreto.

William Stryker passa por algo semelhante ao rei Luís XIV, mas a sua atitude é completamente contrária. Na graphic novel o vilão descobre que a sua esposa está grávida e que seu filho é portador do gene X. Ele então decide matá-los por conta de seu preconceito ao que é diferente de sua crença.

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Figura 54 – William Stryker contando sobre a morte do filho, parte um

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Figura 55 - William Stryker contando sobre a morte do filho, parte dois

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O reverendo Stryker e seus seguidores ferem completamente vários direitos assegurados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos ao condenar os mutantes por serem diferentes, como por exemplo os artigos I, II e III. Artigo I Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Artigo II 1 - Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.

2 - Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania.

Artigo III Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

(DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS)

Eles sequer reconhecem a integridade do outro e se autodenominam “purificadores”. Para eles, os mutantes não são um ser, mas sim menos que um ser humano e não possuem, assim, nenhum direito à existência.

Figura 56 – Membro da Cruzada Stryker se autonomeando “purificador” da raça humana

Segundo Amaranta Vasconcelos Silva (2017), todas as publicações dos X-Men, sem exceção, trazem o levantamento dos heróis sobre várias questões, confrontando os fundamentos do discurso de ódio contra o diferente do cidadão de bem.

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Considerado um ótimo orador, William Stryker abusa de sua condição para difamar os mutantes e fazer com que a população se rebele contra os homo superior.

Ele utiliza citações bíblicas completamente distorcidas em seus discursos, só usando as passagens que dão alusão a violência a guerra e textos que se adequam ao seu projeto de extermínio.

Figura 57 – William Stryker recitando Deuteronômio, 17:2-5

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Figura 58 - William Stryker recitando Deuteronômio, 7:2

Figura 59 - William Stryker recitando João 3:3, João 3:17 e João 3:18

Figura 60 - William Stryker recitando Mateus 10:34-37

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Figura 61 - William Stryker recitando Apocalipse 13:16

Figura 62 e 63 - William Stryker recitando Apocalipse 13:11 e 13:15, e Ezequiel 18:20

A narrativa é recheada de citações bíblicas feitas por Stryker em suas falas e discursos. Curiosamente, todas falam de guerra, agressão física e violência.

Em nenhum momento Stryker cita textos bíblicos que apresentam perdão, tolerância, misericórdia e a acolhida do “outro”, do diferente. Curiosamente também as citações são todas descontextualizadas, e, por isso, servem como pretexto para os planos de extermínio mutante de Stryker. (CALDAS, 2017, p. 82)

Em determinada parte da graphic novel, Magneto confronta o Reverendo a fim ato de expor a premissa preconceituosa e hipócrita de seu discurso. Seus seguidores 81

ficam revoltados com a fala do mutante, já que compactuam dos mesmos pensamentos de Stryker ou foram manipulados por suas palavras.

Figura 64 – Magneto respondendo ao discurso de Stryker e seus seguidores revoltados contra o mutante

É muito fácil ver “Strykers” espalhados pelo mundo todo, principalmente quando se analisa não só a sua narrativa preconceituosa, mas também a sua fisionomia.

Mesmo tendo sido escrita na década de 1980, a graphic novel pode ser comparada ao discurso de líderes mundiais dos dias de hoje, como o presidente americano Donald Trump e o seu preconceito com imigrantes e o próprio presidente Jair Bolsonaro com o seu discurso contra negros, mulheres, indígenas, nordestinos e LGBTQIA+.

William Stryker é o típico “cidadão de bem”, preocupado com a vida de seus semelhantes de crenças e fisionomia. O seu medo do diferente se tornar mais visível, é gritante. Ele fala diretamente com o medo das pessoas, assim causando mais comoção no público com suas palavras.

Stryker é o típico tele-evangelista, personagem bastante conhecido da cena religiosa estadunidense que gerou clones ao redor do planeta: tem boa aparência, fala bem, está inteiramente à vontade na televisão, sabe debater e argumentar. Em suma, é um sedutor, que consegue com facilidade arregimentar seguidores para sua causa. Mas tudo isto com uma finalidade apenas, que não é fazer o bem, mas destruir os mutantes do mundo.

(CALDAS, 2017)

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Ele sabe que ao usar o medo em seu discurso, as pessoas que possuem a mesma crença, vão acreditar, pois eles temem o diferente, temem que possam ficar ultrapassados. E mesmo com todos os ensinamentos de Deus, ele prefere utilizar a violência ao invés de aceitar e procurar evoluir os seus pensamentos.

Figura 65 – Funcionários do canal assustados com as falas de Stryker

O discurso do Stryker é tão impactante e convincente, que os portadores do gene X ficam com medo do que pode acontecer se as pessoas acreditarem em suas palavras e condená-los como “não humanos”. Interessante como Noturno é alemão e faz o comentário do quadrinho abaixo.

Figura 66 – X-Men preocupados com o discurso de Stryker

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Ele quer atingir a população mutante por ser diferente, e ele não aceita nada “fora do padrão”, que não esteja de acordo com as suas crenças. A sua verdade deve estar acima de tudo e de todos. Tanto que Scott Summers chega a questioná-lo sobre em sua fala sobre quem seria a verdadeira raça humana.

Figura 67 – Stryker justificando que é um instrumento do Senhor e por isso pode discriminar os portadores do gene X

Figura 68 – Scott questionando quem é a verdadeira raça humana

Em resposta ao Ciclope, Stryker ofende Kurt Wagner, o Noturno, por sua aparência “demoníaca”. O fato cômico disso, é que o Noturno, é um católico romano

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piedoso e praticante. E o Reverendo, que “estudou” a palavra de Deus, parece não ter aprendido direito o que elas querem dizer.

Figura 69 – Stryker questionando se o Noturno é um humano por sua aparência

Stryker não se importa com quem está sendo atingido por suas palavras, ele não possui nenhum tipo de empatia pelo próximo, nem pratica a palavra dita por Deus em Mateus 22:39, “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Tanto que na primeira página da obra, é possível ver a sua Cruzada, matando duas crianças e deixando o corpo exposto como um aviso.

Claramente pode ser uma metáfora aos linchamentos que ocorriam nos Estados Unidos antes das leis de direitos civis de 1964. Além de serem mutantes, as crianças são afrodescendentes, e esse ato traz uma referência ao racismo que acontece há vários anos.

Figura 70 – Crianças mutantes mortas e penduradas em um balanço

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Como qualquer fanático religioso, utilizam o nome de Deus para justificar as atrocidades que fazem. Como se isso não fosse uma coisa ruim, e que o Senhor ficaria orgulhoso de suas atitudes. Eles fazem exatamente o que, segundo a Bíblia, fizeram com Jesus Cristo, o crucificaram por achar que estavam certos.

Figura 71 – Wolverine falando sobre os genocídios justificados com o nome de Deus

Talvez os atos de Jesus seria uma metáfora aos atos dos X-Men. Jesus deu a sua vida para pagar pelos pecados da humanidade, inclusive de seus assassinos. E os mutantes são capazes de dar a vida para proteger aqueles que os odeia e quer o seu extermínio. Os membros da Cruzada Stryker quebram o sexto mandamento que está na bíblia, que diz em Êxodo 20:13: “Não matarás”. E em 1 João 3:15, o apóstolo que carrega o mesmo nome do livro, diz que “Todo aquele que odeia a seu irmão é assassino” (1 João 3:15).

Mesmo sendo representado em uma história de ficção, é muito comum ver essa pregação de ódio na vida real. Vários casos já foram noticiados na mídia, onde as pessoas justificam seus atos contra as minorias usando o nome de Deus. Um exemplo é o caso que aconteceu em 2016 na Bahia, onde uma igreja foi autuada pelo Ministério Público por sugerir em suas mensagens, a morte ao público LGBTQIA+.

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Figura 72 – Placa com mensagem que incita a violência ao público LGBTQIA+ Foto: Ministério Público

No capítulo 3 é possível ver a representação do Professor Xavier sendo crucificado igual Jesus. Reverendo Stryker se orgulhava tanto de servir ao Senhor, que fez com o seu inimigo, a mesma coisa que fizeram com o filho de Deus. É como se o Professor passasse pela mesma coisa que Jesus passou, sendo preso, julgado e condenado.

Figura 73 – Cena em que o Professor Xavier aparece crucificado igual Jesus Cristo

Em determinada parte, aparece o Ciclope dizendo que o Professor Xavier moldou os X-Men à sua própria imagem, igual Deus fez quando criou Adão direto do barro.

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Figura 74 – Versão distorcida do Scott (Ciclope) falando com o Professor Xavier

Essa parte do ataque dos mutantes ao Professor Xavier pode ser uma metáfora ao o que os romanos fizeram com Jesus. Dependendo da religião, Deus, Jesus e o Espírito Santo são considerados a mesma pessoa. E como no início do mundo Deus criou o homem, o fim foi com o homem acabando com Jesus. Igual os mutantes fazem com o Xavier.

Figura 75 – Os X-Men atacando o Professor Xavier

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Stryker trabalha sobre a convicção de que Charles Xavier é a personificação do Anticristo, que veio para acabar com a humanidade.

Figura 76 – Stryker afirmando com base em sua crença que o Professor Xavier é o Anticristo

Felizmente, não são todos que compactuam com o mesmo pensamento de Stryker, e até aliados e amigos do Reverendo, acham que ele passou dos limites com esse seu discurso da Cruzada e comparam com outros momentos históricos que aconteceram com a humanidade.

Figura 77 – Cena em que o jornalista do ABC Notícias fala sobre o questionamento de alguns líderes sobre a Cruzada Stryker

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Stryker acredita que está acima do bem e do mal, e que nada e nem ninguém poderá atingi-lo. Ele se considera um servo do Senhor, e por isso, pode fazer e dizer o que quiser, como se a sua vontade, fosse a vontade de Deus.

Figura 78 – Stryker questionando se algo poderia lhe acontecer por ser um servo de Deus

Ele acredita também, que a verdade só pode ser encontrada num livro que foi escrito há mais de 2.000 anos, como se o mundo não evoluísse e continuasse do mesmo modo que é contado nele. Em sua percepção, e de muitos religiosos na realidade, se não está escrito na bíblia não é verdade, como a teoria da evolução, que o homem evoluiu do macaco, e os mutantes, que não estão citados e por isso devem ser considerados um “afronte” a Deus e que não veio do céu, e sim do inferno.

Figura 79 e 80 – Stryker discursando sobre os homo sapiens serem a raça de Deus e os homo superior terem vindo do Inferno

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Ele foi capaz de transformar o Professor Xavier em uma arma, para acabar com os mutantes. Ele acredita que ser portador do gene X é um pecado e utiliza vários versículos bíblicos de diferentes livros, para relevar o seu ataque genocida.

Figura 81 - William Stryker recitando Eclesiastes 12:13, Levítico 26:21 e Isaías 1:4

Ninguém está a salvo de seu ataque e de suas palavras, até mesmo sua fiel escudeira, capaz de dar a vida pelo Reverendo. O plot twist7 da história é ver que sua maior aliada, Anne, a mesma que perseguia os mutantes, é uma mutante.

Figura 82 - Stryker descobrindo que seu braço direito é uma mutante

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Reviravolta no enredo. (PLOT TWIST, 2019)

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Stryker não a perdoa por seu “pecado” e a mata, alegando ser a vontade de Deus. Todo envolvimento de Anne com a Cruzada Stryker, pode ser explicada com a frase da escritora francesa Simone de Beauvoir, “O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os oprimidos”.

Figura 83 – Stryker matando Anne após descobrir que ela é uma mutante

Mesmo chamando a atenção por seu discurso, tanto de modo negativo quanto de modo positivo, o misto de sentimentos que ele é capaz de dar, é indiscutível.

Algumas pessoas, ficam assustadas com as suas falas de ódio, e começam a reparar que o grande vilão não são os portadores do gene X e sim William Stryker.

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Figura 84 – Telespectador descobrindo que William Stryker é a verdadeira ameaça

Apesar da violência física gerada pelos “purificadores”, a narrativa da graphic novel nos atenta que a violência pode vir de diversas maneiras, inclusive pelo discurso. Mesmo após os mutantes terem conseguido salvar o Professor Xavier e ele não ser mais utilizado como uma arma, eles sabem do que Stryker é capaz através da sua oratória.

Figura 85 – Scott e seu discurso para que os X-Men continue tentando parar o Reverendo William Stryker

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Por mais que a semiótica foi utilizada para a análise com o elemento argumento, daqui em diante ela será realizada com a segunda tricotomia de Charles S. Peirce e com exemplos de cada um dos tipos de signo. Essa tricotomia consiste na representação do signo em relação ao objeto. Os elementos são o ícone, índice e símbolo.

O ícone é o signo que se parece com o objeto. Nesse ponto, a própria história em quadrinhos por sua característica, na medida que retrata o mundo e faz menção a ele, é icônica. O personagem Noturno também é um ícone, já que representa aquilo que o Stryker quer combater.

Figura 86 - Deus ama, o homem mata (2003)

Figura 87 – Stryker questionando a humanidade do Noturno

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Como exemplo de índice, podemos utilizar a aparência dos personagens Noturno e William Stryker. Noturno por possuir uma aparência quase demoníaca, pode indicar um “ser de outro mundo” ou a representação daqueles que vivem no inferno. Sua fisionomia vai além do padrão que conhecemos e com base nas crenças de muitos, o consideramos fora do normal. Ela relembra as representações demoníacas que eram feitas na Idade Média.

Figura 88 e 89 - Noturno e representações de demônios datadas de 1450

A fisionomia do Reverendo William Stryker também pode ser comparada à suas características de fala. Conforme dito no capítulo anterior, é possível ver vários líderes mundiais com falas semelhantes às do antagonista. Além do mais, Stryker é um homem “bem-sucedido” e ao pesquisar referências à essa denominação, é possível notar a semelhança gritante.

Figura 90 e 91 – Comparação de William Stryker com o imaginário do que seria um homem bem-sucedido

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Na história também é possível se notar um símbolo no colar utilizado por Kitty Pryde. A personagem é judia, e carrega em seu peito uma corrente judaica com a representação da estrela de Davi. Ao ver esse símbolo, é possível referenciar aos sofrimentos sofridos pelos judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

Figura 92 e 93 – Kitty Pryde com a sua correntinha com estrela de Davi e uma corrente judaica com a mesma característica

Outro momento que é possível reparar uma representação simbólica, é quando o Professor Xavier aparece crucificado, e conforme já dito, é uma alta referência à morte de Jesus Cristo. Nas próximas imagens, a comparação do quadrinho com a obra “Crucificação” de Peter Paul Rubens.

Figura 94 e 95 – Professor Xavier crucificado e Crucificação de Peter Paul Rubens (1610-1611)

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8.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As histórias em quadrinhos apesar de serem um escape do mundo real e um estilo da ficção, sempre trazem temas atuais, independentemente da época em que estão sendo escritas. E com isso podemos dizer que “Deus ama, o homem mata” é um exemplo disso, demonstrando em sua narrativa metáforas e analogias contra as minorias sociais que podem conduzir os leitores à reflexão sobre o assunto retratado.

Sendo uma história muito atual e, mesmo levando em consideração o ano em que foi escrita, ela demonstra que mesmo passado os anos, a sociedade ainda pôde manter o preconceito, ainda que a tendência seja evoluir.

As palavras possuem grande força, inclusive podem matar. Vários discursos são capazes de trazerem à tona o lado ruim das pessoas, ainda mais se vierem de pessoas influentes. Nos últimos anos, uma onda de discursos preconceituosos tomou forma pelo mundo, vindo de líderes políticos e religiosos.

Como a política e a religião começaram a ser aliadas na hora de ganhar votos em eleições, um grande terror psicológico começou a ser formado. As pessoas têm medo do diferente, e por conta dos discursos feitos pela minoria, elas usam a sua raiva para impedir algo que é uma alusão, uma mentira feita para tocar o terror.

Usam a religião para distribuir ódio contra as minorias, com discursos machistas, racistas e homofóbicos. Se apoiam na bíblia para condenar o diferente, como se isso justificasse os atos. Eles fazem a mesma coisa que foi feita com Jesus Cristo, que claramente pode ser dito com uma minoria em seu tempo.

Naquela época, Jesus ajudava os necessitados, não usava a própria palavra e palavra de teu Pai para incitar guerra; andava com pobres, leprosos, prostitutas; perdoava ladrões... Por ser judeu, foi condenado a ser crucificado por sua fé.

Enquanto atualmente, seus seguidores usam a bíblia para incitar violência e preconceito, igual o antagonista Reverendo William Stryker.

Stryker usa sua fala para distribuir o medo, pintando os mutantes como aberrações, animais e uma infestação na sociedade. Graças a ele, mutantes vivem com medo, o que não é diferente da vida real. Quantas pessoas hoje vivem com medo só por serem negros, mulheres, LGBTQIA+? Diariamente 12 mulheres são vítimas de

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homicídio, a cada 16 horas alguém é morto pela homofobia, e a cada 23 minutos um negro é assassinado no Brasil.

Os X-Men trabalham para um mundo melhor, em busca de quem sejam aceitos na sociedade e que os portadores do gene X possam viver em harmonia com as pessoas normais. Eles têm empatia, amor por aqueles que acham que eles são uma aberração, e tem a esperança que a humanidade deixe o preconceito de lado. O que acaba sendo uma metáfora para mostrar a luta das minorias, uma luta para seus direitos humanos, que muitas vezes são negados por pessoas como Stryker, por se acharem superiores e donos da verdade.

Apesar de sofrerem tanto por ser minoria, os X-Men mesmo assim defendem a tolerância entre as raças, defendem uma convivência pacífica entre homo superior e homo sapiens. Eles são preparados para defender a humanidade dos ataques de outros mutantes, para defender aqueles que tanto os temem e os odeiam (WESCHENFELDER, 2011). E além de lutarem por aqueles que os odeia, lutam por si mesmos, contra a discriminação e a aceitação.

A maioria sempre temeu pelo diferente, talvez por isso seja explicado tanta violência contra a minoria. Os humanos temem os mutantes pois sabem que se eles quiserem, eles podem dominar o mundo por conta de seus poderes. E mesmo assim eles mostram através de suas atitudes, visão distorcida que paira sobre eles. É questionável o motivo que leva o Professor Xavier e seus alunos a protegerem tanto os humanos, e pode ser que seja dito através de dois sentimentos: Fé e amor. Eles possuem fé que tudo pode mudar para melhor, fé que vão ser aceitos, fé que pessoas como o Stryker vão mudar seus pensamentos. E é nítido o amor que eles sintam pelas pessoas não mutantes, pois se eles não sentissem, eles não as protegeriam e teriam planos iguais aos de Magneto.

Claremont traz em sua obra, vários pontos chaves que reforçam a ideia de que os X-Men são minorias. Ele representa o racismo logo em sua página inicial com os “purificadores” perseguindo duas crianças mutantes e negras, faz uma analogia aos atos antissemitas e holocausto judeu ao usar a Kitty Pryde na história que é judia e mutante.

Essa história é muito importante e creio que todos deveriam ler, para conseguirem entender um pouco sobre as intenções de algumas pessoas contra as minorias sociais.

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A semiótica está presente na história em quadrinhos toda. Desde as mensagens que o autor quer passar até aos desenhos da história em quadrinhos. E ao fazer a análise com o auxílio dessa teoria da comunicação, é possível ver que a semiótica ajuda a reparar com outros olhos as entrelinhas e por isso, posso concluir que a graphic novel demonstra em sua narrativa metáforas e analogias que denunciam o preconceito contra as minorias sociais, e podem conduzir, assim, os leitores à reflexão e ao respeito.

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