A FAVOR DA CIDADE Simei Monteiro A Liturgia, hoje entendida como o culto ou ‘serviço’ prestado a Deus, sempre esteve relacionada com o espaço público. Aliás, a própria palavra liturgia comporta a dimensão pública. O Dicionário de Liturgia esclarece: Proveniente do grego clássico ‘leitourgia’, em sua origem o termo indicava a obra, a ação ou a iniciativa assumida livremente por um particular (indivíduo ou família) em favor do povo ou do bairro ou da cidade ou do Estado.(Dicionário de Liturgia, “O termo liturgia”, São Paulo, Paulinas,1992, p.639) Liturgia, no seu primitivo uso civil, significa o serviço prestado ao povo pelo governante. Nesse contexto, ‘leitougia’ poderia significar toda e qualquer obra ou serviço providenciado com a finalidade de proporcionar à urbe e seus habitantes, uma melhor qualidade de vida; as facilidades criadas afim de que pudessem exercer suas atividades diárias, isto é, viver e trabalhar de forma mais adequada e eficiente. Mais tarde, a palavra ‘leitourgia’ passou a designar todo e qualquer ‘serviço’, mais ou menos obrigatório, prestado por um indivíduo ou por um grupo ao Estado e/ou vice versa. Neste sentido, adquire conotações relacionadas a direitos e deveres de servos e senhores. Essas liturgias se caracterizaram durante as chamadas ‘democracias helênicas’. Um dos usos mais relevantes dessa palavra, naquele contexto urbano, re-fere-se às chamadas ‘liturgias cíclicas’, atribuídas por ‘turno’ a determinadas famílias e destinadas ou a toda a cidade ou ao próprio ’demos’ e se concretizavam quase sempre no preparo de ‘jogos’ e de ‘festas’. (Marsili, S. et al., ”Liturgia, momento histórico da salvação”, São Paulo, Paulinas, 1986, p.40). Havia também as ’liturgias extraordinárias” prestadas pelos habitantes e governantes, geralmente usando a força militar, em situações de conflito ou ameaça externa. A palavra liturgia, no Novo Testamento, só aparece uma vez com o sentido estrito de ritual (At 13,2). Entretanto , liturgia será usada inúmeras vezes para designar o sacrifício espiritual da vida dos cristãos, principalmente na dimensão do testemunho. Paulo se declara disposto a que seu sangue seja “derramado em libação, em sacrifício e serviço (liturgia)da fé” (Fl 2.17). Em outro trecho do Novo Testamento, Paulo descreve, referindo-se à oferta que os cristãos da Macedônia 115