Revista Pensamento Brasileiro nº1

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insinuam uma paralela e discutível melhoria moral espiritual. Sem cairmos nessa ilusão insinuante que o mitificou, podemos tomar o progresso como a diversificada escalada da técnica e de sua crescente interferência sobre a natureza. Esse é o aspecto efetivo do progresso, agora chamado à ordem pela razão prática: a crescente, desabusada interferência sobre a Natureza. Mas qual a ordem, e em que razão prática se fundamenta o seu apelo? No respeito à Natureza? Não teria que ser este, porém, o complemento da dignidade humana? (p. 149). Tomado por um interesse profundo pela reflexão filosófica sobre a experiência temporal subjacente à configuração contemporânea da relação entre sentido da história, progresso e revolução, Nunes toma a experiência do tempo como fio condutor de sua reflexão a respeito desses problemas; e, nesse sentido, ele a considera como a pergunta filosófica fundamental, como tal reconhecida pelo menos desde o século passado. Curiosamente, nesse contexto, Nunes convoca, o testemunho de um então jovem e desconhecido filósofo italiano, cujo livro Infância e história já naquela época impressionava o pensador do Pará. Mas se a toda “concepção de história corresponde uma experiência do tempo que lhe é inerente, que a condiciona e que pode ser explicitada”, cabe indagar qual é aquela que corresponde ao historicismo e à consciência histórica moderna que o historicismo contribuiu para formar. A indagação pode resumir-se na pergunta: que relacionamento se deu entre a história e o tempo na época moderna? 74 |

Em resposta, pode-se dizer que a crise na experiência contemporânea do tempo arrasta consigo a quase perempção dos ideais de progresso e revolução que a cosmovisão iluminista moderna nutriu e manteve em suspenso como uma perspectiva escatológica para o fim da história. Crise profunda, mas que não paraliza o pensamento, antes o motiva e o impulsiona. Crise e crítica são duas faces da mesma moeda, de modo que crise, para o autêntico filósofo, não é senão o tempo e a ocasião para o aguçamento e o exercício do juízo crítico. “Hoje se nos depara a oportunidade de uma situação embaraçosa em que temos de ajuizar entre conceitos conflitantes, decidindo uma pendência do pensamento” (p. 147).


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