Correio da Jaqueira, no. 1

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Acadêmicos de Direito da Universidade Federal do Amazonas

Fevereiro

Correio da Jaqueira 2013/1

Pós-graduação na FD/UFAM

Distribuição gratuita

E a greve, serviu para que? A Universidade Federal do Amazonas passou por uma greve de professores em 2012. No final das contas, de onde saímos e onde chegamos? Nossa situação melhorou? O Ponto de Vista dá voz ao alunado da Faculdade de Direito! pág. 7

Perspectiva docente

A Jaqueira, antiga sede da Faculdade de Direito da “Universidade do Amazonas” Por muitos anos, a história da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Amazonas se confundiu com a história intelectual do Estado: pelos bancos da Jaqueira passaram

grandes governantes, parlamentares, escritores, poetas, juízes e advogados. Para uma história tão grande, é indispensável um projeto de pós-graduação fortalecido. O Correio da

Jaqueira trouxe o passado do programa de pós-graduação na FD/UFAM e os novos desafios que a Faculdade terá para o futuro. pág. 12

Seção cultural: a nova MPB

O Brasil adota um sistema jurídico que põe a legislação positivada em primeiro lugar, mas a jurisprudência vem ganhando força ano após ano. Você já ouviu falar da jurisprudência “banana boat”? pág.14

Entrevista com Héctor Valverde Você já ouviu falar da nova MPB? Quem pensa que a música brasileira foi terminantemente reduzida às expressões “tchu” e “tchererê” está redon-

damente enganado: músicos jovens e talentosos vêm surgindo com toda força e mostrando que a Música Popular Brasileira ainda tem muita lenha para

Competições Jurídicas

A experiência no curso de Direito pode ir muito além das aulas e trabalhos acadêmicos. Contudo, é preciso ser ousado: que tal participar de uma competição jurídica nos Estados Unidos da América? Ou talvez na Holanda? Nas Faculdades de

Direito por todo o Brasil, equipes de alunos e professores se reúnem em grupos de estudo para vencer competições deste tipo. Como participar? O Correio da Jaqueira responde. pág. 8

queimar. E o melhor: com o crowdfunding, os fãs podem até ajudar as bandas e artistas independentes a lançarem seus álbuns! pág. 6

Visita guiada ao COMPAJ

Acadêmicos de Direito da FD/ UFAM, em convênio com o MPE/AM, fazem visita guiada ao Complexo Penitenciário Anísio Jobim. pág. 5

Com a sociedade capitalista em pleno desenvolvimento, as relações de consumo se tornam mais complexas, e o Direito do Consumidor não pode deixar de acompanhar esta evolução. O Correio da Jaqueira traz entrevista exclusiva com o Dr. Héctor Valverde, um dos personagens mais atuantes no cenário nacional do Direito do Consumidor. pág. 10


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Expediente

Mensagem do Editorial A nossa Jaqueira sempre precisou de um informativo sério e bem executado. Embora tenhamos tido, em outras épocas, alguns boletins informativos, fruto do trabalho do Centro Acadêmico 17 de Janeiro, jamais tivemos no curso de Direito o que você possui em mãos agora: um verdadeiro jornal, mesmo que em tamanho humilde. Com o planejamento ideal, um projeto desenhado com muito zelo, um bom cronograma, conteúdo de qualidade e, fundamentalmente, uma equipe de pessoas com determinação e competência para aceitar o desafio de levá-lo até o fim, realizamos um sonho e começamos

este Correio da Jaqueira. Trazemos até o nosso público – ou jurisdicionado, se nos permitem o trocadilho – um jornal que tem opinião, cultura e Direito. Um jornal feito por nós, alunos, e endereçado a vocês, colegas, bacharéis, professores, juízes, advogados, membros do Parquet e todas as demais pessoas que merecem uma leitura dinâmica e interessante. A primeira edição tem um teor cuidadosamente preparado para leitores exigentes. Ao longo das próximas páginas, o nosso propósito é fornecer matérias atuais, temas interessantes e a opinião das personalidades jurídicas que são referência no Amazonas.

Esperamos que este jornal seja o reacender de uma chama no peito dos nascituros da Jaqueira – aqueles que ainda não são seus filhos, embora já estejam em seu ventre. É a chama do arrojo, da criatividade e da impavidez, que nos trouxe até aqui e que deve levar-nos todos sempre à invenção de novos projetos e à concretização de novas ideias. Por fim, devemos esse projeto à sociedade. O alunado da Faculdade de Direito da UFAM deve prestar contas a quem paga por nossos estudos: o povo. Que venham as próximas edições e boa leitura!

Agradecimento A organização do Correio da Jaqueira gostaria de agradecer à Direção da Faculdade de Direito, pela confiança depositada em nossas intenções; aos colaboradores diretos e indiretos deste jornal; e aos leitores. Sobretudo, gostaríamos de agradecer ao senhor Jaime Benchimol, cujo apoio tornouse essencial para a existência deste jornal e, em sua pessoa, homenagear a memória do Prof. Samuel Benchimol, emérito mestre da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Amazonas. Correio da Jaqueira

Mensagem do Diretor da FD/UFAM É com satisfação que acolhi o convite do Correio da Jaqueira para participar de sua primeira edição. Tive a oportunidade de conviver na minha época de estudante com alunos que participavam de agremiações, movimentos culturais e atividades esportivas universitárias, razão pela qual reputo auspiciosa a iniciativa da constituição desse diálogo entre as vozes que emergem do convívio da Faculdade de Direito, ou seja, professores, alunos e comunidade por meio desse canal de comunicação. Na lição de Paulo Freire, ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua própria produção.

Nessa linha de pensamento, o conhecimento não é transferido, e sim, produzido, sendo resultado da troca de experiências entre professores e alunos. No diálogo entre educador e educando, o primeiro deve conduzir os debates no sentido de que sejam fixados valores éticos sobre o papel de cada pessoa na sociedade e sobre a responsabilidade que deve permear a relação dos homens com seus semelhantes. Tanto é assim, que a preocupação norteadora na elaboração do Novo Projeto Pedagógico da FD teve como fulcro alcançar a formação humanística, técnicojurídica e prática de seus alunos como ferramentas indispensá-

APOIO:

FICHA TÉCNICA Diretor-executivo:

Paulo Bernardo Lindoso e Lima POCKETMAGAZINE

Editor de Arte: Yago Rocha

veis à compreensão interdisciplinar do fenômeno jurídico e das transformações sociais. Incluiu também, no perfil delineado para o egresso da Jaqueira, o desenvolvimento do raciocínio lógico, da argumentação, da persuasão e da reflexão crítica. A Faculdade de Direito da UFAM, por meio do ensino, pesquisa e extensão, busca formar bacharéis em Direito com amplo conhecimento jurídico nas variadas áreas, de modo a permitir o exercício da atividade profissional com competência e habilidades superiores, visão humanista e apego à ética, comprometidos com a melhoria das condições de vida da população e o ideal de Justiça.

Nesse contexto, o Correio da Jaqueira, como iniciativa dos estudantes, soma ao conhecimento jurídico dois aspectos que vêm se desvendando como instrumentos de emancipação e autonomia do cidadão que deseja entender a sociedade e atuar como reconstrutor de realidades: o conhecimento social e o desenvolvimento político. Vida longa ao Correio da Jaqueira! Que possamos multiplicar processos como esse para que FD/UFAM possa mostrar que outro mundo é possível e urgente.

Equipe Jornalística:

Articulistas:

Gabriel Coelho Rafael Frank Benzecry Pedro Paulo Lira Ronaldo Santos Adriano Gonçalves Feitosa

Sebastião Marcelice Gomes Diretor da FD/UFAM.

Laís Rebouças Alencar Ticiano Alves e Silva André Hüsgen Contato: correiodajaqueira@gmail.com @CorreioJaqueira.


CORREIO DA JAQUEIRA CHARGE DA VEZ

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Charge da vez

Guerra das togas no STF: A novela do judiciário brasileiro

Televisionadas ao vivo já há uma década, as sessões do Supremo Tribunal Federal nunca foram tão conturbadas quanto o são hoje. Acompanhar a Ação Penal 470 ao vivo na TV Justi-

ça foi quase como acompanhar o BBB. E há quem já acredite que as acaloradas discussões entre os Ministros do STF ao longo do julgamento do chamado “mensalão” tenham sido o

divisor de águas para que a suprema corte nacional se tornasse tão caricata quanto o Executivo e o Legislativo do país. Há que se considerar também que estivemos diante de um elenco muito peculiar. Dos que mais chamam atenção, temos o ministro Marcos Aurélio de Mello, primo do ex-presidente Fernando Collor (pasmem! indicado pelo próprio em 1990); o ministro Gilmar Mendes, alvo de acusações de alto calibre, entre as quais sonegação fiscal e clientelismo para com o ex-senador Demóstenes e o bicheiro Carlinhos Cachoeira; o ministro Dias Toffoli, o menino de ouro do PT – ex-advogado do partido e ex-assessor do go-

verno Lula –, que, embora tenha os mais profundos vínculos com a alta cúpula do PT, não se declarou impedido de participar do julgamento; e, por fim, o ministro Joaquim Barbosa, o irreverente semideus de quem ninguém pode discordar. A trama, que ficou basicamente no “meu saber jurídico é mais notório que o seu” ou “tenho mais mérito que vossa excelência para estar neste pleno”, nos revelou personagens de uma novela que só perde mesmo para as megaproduções da Rede Globo. Adriano Gonçalves Feitosa é desenhista e acadêmico da FD/UFAM.

Pimenta nos olhos dos outros é refresco! Bastou a crise de 2008 para que todos os Estados reestruturassem suas economias, reanimando uma criatura condenada à extinção pela Organização Mundial do Comércio: o protecionismo selvagem. Há que se entender, contudo, que medidas protecionistas nem sempre são frutos da má-fé. Em geral, são atos de desespero. Elas surgem quando a conjuntura internacional ameaça a ordem interna das nações, concorrendo para que os governos, pressionados por diversos agentes nacionais para privilegiar o produtor nacional, apliquem o dinheiro público em manobras protecionistas. No presente governo, tem-se adotado certas atitudes para se resguardar a economia brasileira. Dois exemplos: no final de 2011, as montadoras que importavam veículos tive-

ram o IPI aumentado, com a expectativa do governo de ver reduzidas as importações no setor; já na indústria nacional de petróleo e gás, o problema é similar, e exige percentuais mínimos de produtos e serviços a serem adquiridos de fornecedores autenticamente brasileiros. Por mais nobres que sejam, e ainda que estejam dentro dos parâmetros estabelecidos pela OMC, tais atitudes do governo brasileiro geram críticas no plano internacional, sobretudo dos Estados Unidos, que se julgam atingidos pela política econômica do Brasil. Ora, mas não são os EUA os maiores

especialistas no assunto? Para eles, restringir a entrada de produtos brasileiros – suco de laranja, algodão, milho etc. – e subsidiar seus insumos agrícolas domésticos, em descumprimento de tratados e convenções internacionais, seria o quê? É

como diz o ditado: pimenta nos olhos dos outros é refresco! Adriano Gonçalves Feitosa é desenhista e acadêmico da FD/UFAM.


CORREIO DA JAQUEIRA CORRESPONDENTE INTERNACIONAL

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Correspondente Internacional

Sapere aude!

André Hüsgen Acadêmico de Direito da Universidade do Porto

A primeira pergunta à qual a filosofia quis dar resposta e que consequentemente lhe deu um ponto de partida foi a pergunta de se querer saber qual a origem e a essência daquilo a que se poderia chamar “a matéria”. Há volta de 2.600 anos, Tales de Mileto seria o primeiro a interrogar-se se haveria algo como uma substância primordial, sendo a origem de todas as coisas no Universo. Através das suas observações tinha concluído que toda a existência se baseava num ciclo de transformações, de modo que a substância que ele procurava teria que preencher dois requisitos. Teria que existir em quantidades abundantes e ter a capacidade de assumir diversas formas. O grego elegera a água como essência e origem de todas as coisas, pois era uma substância vital para todas as formas de vida que ele conhecia e, para além disso, possuía diferentes estados de existência – aquilo a que hoje se chamam os estados de agregação.Rapidamente se seguiram novas e diferentes opiniões. Enquan-

to para Anaxímenes (588-524 a.C.) essa substância primordial era o ar, já para Heráclito (535-475 a.C.), ela tinha que ser o fogo. Depois foi Empédocles (495/490 - 435/430 a.C.) a agrupar o ar, o fogo, a terra e a água como as quatro substâncias universais e assim desenvolver um incipiente sistema periódico. O que se pretende alcançar com isto não será a indagação sobre o valor destes contributos para a física moderna – porque obviamente não o têm -, mas de realçar o papel de Tales, considerado o pai de toda a filosofia, no despoletar de todo um movimento que acompanhou a primeira geração de filósofos gregos. Este movimento consistiu na emancipação do pensa-

projecto da União Europeia - ou até se demonstram como obsoletos, a exigência de se desvendarem novas soluções surge cada vez mais urgente. É claro que dizer que se necessitam de novas soluções é quase tão original como dizer que a gasolina está cara ou que os autocarros chegam sempre atrasados. Por isso mesmo é que espaços de opinião, diálogo e de informação para estudantes, como este, são um primeiro passo, que, apesar de pequeno, vai no sentido certo. Vão no sentido de fomentar um certo espírito de interesse, entrega e principalmente de tomada de posição perante os problemas que nos esperam e vão esperar – que como se diz por aí, não parecem ser poucos. Um espí-

menoridade quando esta não resulta de um entendimento deficiente, mas da falta de convicção e coragem. Sapere Aude! Tem coragem de fazer uso da tua própria razão, esse é o lema do Iluminismo.” Neste sentido: Sapere Aude!

PERFIL Immanuel Kant (Königsberg, 22 de abril de 1724 — Königsberg, 12 de fevereiro de 1804) foi um filósofo prussiano, geralmente considerado como o último grande filósofo dos princípios da era moderna.

mento dos dogmas, sobretudo religiosos, que dominavam o pensamento de então. Rompeu com uma ordem de pensamento pré-estabelecida e procurou autonomamente a resposta a uma pergunta que a sociedade lhe dava por ele. Parece que um pouco desse espírito nos fazia bem agora. Num tempo em que muitos paradigmas que marcaram a sociedade se põem em causa dando o clássico exemplo do

rito que encontra máxima expressão na resposta de Immanuel Kant à pergunta que lhe é dirigida no ano de 1783 pelo jornal “Berlinische Monatsschrift”: O que é o Iluminismo? Respondeu ele: “O iluminismo representa a saída do ser humano da sua menoridade que este mesmo permite. Menores são aqueles que são incapazes de fazer uso da sua própria razão sem a tutela de outrem. É-se culpado pela sua

Depois de um longo período como professor secundário de geografia, começou em 1755 a carreira universitária ensinando Ciências Naturais. Em 1770 foi nomeado professor catedrático da Universidade de Königsberg, cidade da qual nunca saiu, levando uma vida monotonamente pontual e só dedicada aos estudos filosóficos. Realizou numerosos trabalhos sobre ciência, física, matemática, etc. (Fonte: Wikipedia)


CORREIO DA JAQUEIRA CORREIO DA JAQUEIRA NAS RUAS

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Correio da Jaqueira nas ruas

Alunos da FD/UFAM visitam o COMPAJ No mês de junho de 2012, o Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) montou para 40 alunos do 3° Período da Faculdade de Direito uma visita guiada ao Complexo Penitenciário Anísio Jobim, mais conhecido pela sigla COMPAJ, com o intuito de aprofundar os conhecimentos no sistema prisional e na situação em que se encontram os presidiários alocados no Estado do Amazonas. Organizada pelo Centro de Estudos de Aperfeiçoamento Funcional do MP-AM (CEAF) e dividida em grupos distintos, as visitas aconteceram nos dias 1°, 20 e 21 de junho, com duração de 3 horas e com o acompanhamento de um promotor público. A visita fez parte do “Programa Visitas Orientadas” do MP -AM, e os estudantes visitantes foram acompanhados por promotores públicos, que diferiram conforme o dia. Os que fizeram a visita no dia 1° de junho foram acompanhados pelo promotor Paulo Alexandre dos Santos Beriba; já os visitantes dos dias 20 e 21 de junho foram orientados pelo também promotor George Pestana Vieira. Dentro do complexo, os acadêmicos tiveram contato com diversas atividades complementares realizadas pelos detentos. Surpreendeu os alunos a montagem de contadores de energia e a reciclagem de resíduos sólidos de plástico pelos presos, o que facilita a redução da pena. Além do mais, percebeu-se no interior do COMPAJ uma sala de leitura, de vital importância para o aprimoramento intelectual e cívico dos presos, o que contribui diretamente para que estes possam se tornar mais uma vez aptos a viver dignamente em sociedade. Pelo que se sabe, há exemplos de muitos presos que conseguiram se re-

Por Rafael Benzecry

Alunos do 3º Período da FD/UFAM visitam o COMPAJ ao lado do Promotor George Pestana.

abilitar e reconduzir sua vida através de projetos culturais e educativos realizados em todo o mundo. Segundo a aluna Nicole Vasconcellos, que fez a visita no dia 1° de junho, a imagem que se tem do COMPAJ no imaginário é muito diferente da realidade lá observada. Para ela, a vida no complexo é razoável, contando com um único defeito que é o número de detentos um pouco superior ao limite máximo da capacidade. Nicole disse também que ficou feliz ao saber das atividades extras praticadas no interior do prédio, como o cultivo de hortaliças e as aulas de alfabetização. Já o estudante Victor Bastos, que também esteve no presídio no dia 1° de junho, se interessou mais pela infraestrutura do presídio e pela vasta biblioteca, que possui mais de 2.000 livros. Pelo que constatou o acadêmico, a maioria das obras pertencentes ao acervo da biblioteca foram entregues como parte de uma campanha de arrecadação de livros organizada pelo Tribunal de Justiça do Amazonas e outras organizações. Em linhas gerais, todos os estudantes visitantes acharam a visita muito positiva e interessante, contudo, acreditam que para os próximos anos, quando novos alunos visitarem o complexo, algumas simples alterações

precisam ser feitas no roteiro. Para Nicole e Victor, o “tour” não abrangeu por completo o COMPAJ, visto que algumas áreas do complexo permaneceram impenetráveis para visitantes. Para eles, o principal interesse era conhecer a ala feminina da penitenciária, que segundo dados estatísticos possui 73 detentas, das quais 53 estão em regime provisório e 20 já estão devidamente sentenciadas. Para efeito de interesse, a maior parte das mulheres que lá estão foram presas por envolvimento em tráfico de drogas, que pela lei pode gerar reclusão de 5 a 15 anos. Tal visita organizada para os alunos do 3° período de Direito da UFAM demonstra a grande curiosidade dos estudantes em entender na prática o processo de cumprimento penal nas casas de detenção. Programas como este do Ministério Público do Amazonas são uma grande contribuição que este órgão público presta à sociedade e principalmente às faculdades de Direito do estado. Procurar enxergar a vida e a infraestrutura das penitenciárias é de enorme importância porque através deste entendimento podem-se traçar políticas públicas eficazes na área dos direitos humanos, principalmente nos que dizem respeito ao preso. A administração dos presídios tem como obrigação o respeito aos

direitos básicos e fundamentais dos detentos de forma a manter e defender o livre exercício dos direitos que não foram atingidos pela sentença condenatória. Ao recluso são asseguradas por lei todas as garantias não afetadas pela sentença que o mantêm em regime de reclusão, e esses garantias só podem ser restringidas em ocasiões estritamente previstas pela lei de Execução Penal de 1984. Excessos cometidos por agentes penitenciários é crime, e somente rígida fiscalização e visitação frequente ao local podem evitar e diagnosticar qualquer abuso. Para os futuros operadores do Direito, nada mais importante do que ver a aplicação do Direito teórico na realidade social em que vivemos. A todos cabe aplaudir tal iniciativa e reivindicar às demais entidades públicas a criação de mais projetos inovadores como este “Programa Visitas Orientadas” do MP-AM. Há que se pensar também na expansão para além do campo do Direito, buscando a inclusão de outros cursos universitários e até mesmo de escolas de ensino médio. Aos futuros alunos da matéria de Direito Penal que tenham interesse em visitar o COMPAJ, esperamos que o “Programa Visitas Orientadas” ainda continue em pleno funcionamento e que possa servir de uma grande lição no entendimento e na discussão dos problemas do sistema carcerário brasileiro. No final da visita, cada participante do programa recebeu um diploma de reconhecimento pelas 3 horas de atividades complementares, assinado pelo Procurador-Geral de Justiça, Francisco das Chagas Santiago Cruz, e pelo chefe do CEAF, promotor Nasser Abrahim Nasser Netto.


CORREIO DA JAQUEIRA SEÇÃO CULTURAL

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Seção cultural

Você já ouviu falar da nova MPB? Por Gabriel Coelho

Certa vez, Chico Buarque escreveu com toda sua elegância: “Lábia é que adoça boca de mulher”. Os cantores que monopolizam as rádios hoje em dia, porém, discordam fundamentalmente de Chico - para eles, o que realmente ganha uma mulher é um Camaro amarelo. Ou, se o sujeito for bom mesmo, um Fiat Fiorino é o suficiente. As musas dos compositores foram trocadas por automóveis. A poesia, coitada, perdeu espaço para “interjeições” desprovidas de qualquer significação: é o “Tchu”, é o “Tcha” é o “Tchu tcha tcha”. Diante disso, sobretudo aqueles que viveram o período áureo da música brasileira concluem tristemente que já se foi o tempo da velha e boa MPB.

A velha MPB, de fato, já passou, mas não nos deixou em maus lençóis: ela foi a influência determinante de uma nova safra de músicos que se está convencionando chamar de a “Nova MPB”. Igualmente boa, construtiva, sem interjeições nem carros. Mas onde ela está? Na televisão e nas rádios não se vê nada com esses adjetivos. A Nova MPB, como o nome sugere, é moderna. Seu corpo é formado por artistas jovens, em sua maioria produtores independentes, sem o apoio de grandes gravadoras. Dessa forma, eles recorrem à internet para divulgar seus trabalhos. E os resultados não podiam ser melhores. É o caso dos paulistanos do 5 a Seco. O grupo surgiu inicialmente como um projeto de reunir cinco músicos, amigos entre si, para tocarem juntos: Vinícius Calderoni, Tó Brandileone, Pedro Altério, Pedro Viáfora e Léo Bianchini. O sucesso foi tão grande que eles tiveram de permanecer unidos. Divulgando suas músicas na internet, o grupo conseguiu cativar um considerável público e chamou

a atenção de nomes consagrados da música brasileira. Foi assim que conseguiram gravar seu primeiro DVD, o “Ao vivo no Auditório Ibirapuera”, que contou com a participação de artistas como Ivan Lins, Chico César e Lenine. Nos bastidores da gravação, o mestre pernambucano declarou: “Eu estou feliz. A música brasileira também!”. As músicas do DVD estão todas disponíveis para download gratuito no sítio da banda. Da mesma turma que os rapazes do 5 a Seco, a bela Thaís Bonizzi lançou um álbum primoroso em 2012, que já está merecidamente pré-selecionado para disputar o Prêmio da Música Brasileira no ano de 2013. A moça está no Soundcloud, sítio dedicado aos amantes da música, onde podem expor seus trabalhos. Ela disponibiliza o CD inteiro para ser ouvido em sua conta. Ainda entre os paulistas, também merece destaque o simpático Dani Black. O rapaz esbanja talento como músico e compositor e já tem músicas de sua autoria desfrutando o

mais pleno sucesso, como “Linha Tênue”, que até figurou na trilha sonora de uma novela da Globo na voz de Maria Gadú. Ele também já tem seu próprio CD, que é da mais alta qualidade. Tulipa Ruiz é outro nome que se sobressai dentro da Nova MPB. A artista já está no seu segundo disco, que, não obstante esteja disponível gratuitamente para ser baixado na internet, é um dos mais vendidos na gigante Livraria Cultura, conforme atesta o coordenador da categoria de música do estabelecimento, João Paulo da Silva Bueno: “O disco da Tulipa já vendeu mais do que os últimos de Caetano e Gil.”. Cumpre lembrar ainda o peculiar Léo Cavalcanti, que impressiona pela voz e pelas letras, algumas profundas, de viés notadamente filosófico. Um trabalho original e interessante, que culminou no CD “Religar”, também aferível pela internet. Com a internet, não há mais desculpa: só escuta música brasileira ruim quem quer.

Sugestões do Correio da Jaqueira

5 A SECO

THAÍS BONIZZI

TULIPA RUIZ

LÉO CAVALCANTI

www.5aseco.com.br

soundcloud.com/tha-1-1

www.tuliparuiz.com

www.leocavalcanti.com.br

Outros nomes para procurar Dani Black, Luiz Murá, Mariana Aydar, Música de dois, Cícero, Juca Chuquer, Caê Rolfsen, Bruna Caram, Dani Gurgel, Danilo Moraes, Ricardo Teté, Filipe Catto, Demetrius Lulo e Paula Mirhan, entre tantos outros.


CORREIO DA JAQUEIRA PONTO DE VISTA

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Ponto de vista

E a greve, serviu para que?

Laís Rebouças Alencar Acadêmica de Direito da UFAM As diversas entidades federais de ensino do Brasil, juntamente com o funcionalismo público federal, tiveram em 2012 a maior, mais coordenada e mais duradoura greve dos últimos tempos. Durante quatro meses, professores e técnicos da Universidade Federal do Amazonas - UFAM afastaramse das obrigações laborais e hastearam a bandeira da melhoria salarial e da dignidade nas condições de trabalho para desenvolvimento da educação. A luta tinha apelo nobre, e espelhava a revolta com o descaso

dado pelo Governo à educação pública do país. No entanto, o que se viu em concreto foi um jogo baixo de meros interesses pessoais, que seduziu alunos e emparedou profissionais de pensamentos divergentes (anti-grevista). Obviamente, por se tratar de uma instituição de ensino público, existem desagrados tanto aos profissionais quanto aos alunos, que legitimamente buscam usufruir de um ensino de qualidade, instalações modernas e suficientes à pesquisa e aprendizado. Justamente com esse compromisso de melhoria - como fazem sórdidos políticos em campanha eleitoral -, o Comando de Greve cooptou grande número de militantes dentro do corpo discente. Os alunos, acreditando na união de forças, foram às ruas com bandeiras, faixas e cartazes rústicos; promoveram atos públicos de repúdio ao descaso com a educação, inclusive de nudismo em frente ao portal da centenária UFAM; montaram acampamento e moradia dentro da Universidade, até que a pretensão do Comando de Greve fosse atendida.

Por outro lado, professores grevistas promoviam atos de intolerância e deselegância contra profissionais que não atenderam ao livre direito de filiação ao movimento. A própria Faculdade de Direito sofreu com panelaços, gritaria e baderna dos paredistas, quando seus professores não admitiram interromper as aulas no final de período. Enfim, o Comando de Greve, juntamente com cada profissional aderente, se utilizou das possíveis e mais ardilosas táticas para expansão e tonificação da massa grevista. Em meados de setembro, assistimos pasmos ao resultado da luta travada: os profissionais acataram a proposta de melhoria salarial colocada em mesa pelo Governo, que estende a evolução paulatina das remunerações durante os próximos três anos. Além disso, não houve corte no ponto dos professores e técnicos, que mesmo em greve e sem prestar serviço receberam a inteireza da remuneração. Atendidos os bolsos, os professores olvidaram a massa de manobra, e apartaram-se da

A greve de 2012 em imagens

discussão quanto à melhoria das instalações e das condições de ensino tão necessárias aos alunos. Atendido o interesse pessoal, não houve reconhecimento ou ajuda dos docentes para que as notas daqueles que continuaram em aula fossem lançadas, e com isso o período se encerra. Não houve a sensibilidade quanto aos finalistas e formandos, que têm compromissos e calendário programado, e que arcaram com prejuízos, inclusive financeiros, com o atraso na graduação. Atividades essenciais, como o Núcleo de Prática Jurídica - NPJ/UFAM, tiveram suas atividades suspensas, não recebendo novos clientes (necessitados de atuação judicial e hipossuficientes). Em conclusão, o legado desta longa greve foi tão somente a melhoria salarial dos profissionais da educação, o que por óbvio não é suficiente para o atingimento do grande choque de ordem necessário na educação pública do país. Em lamento, uma oportunidade e um belo viés revolucionário que fora desperdiçado.


CORREIO DA JAQUEIRA COMPETIÇÕES JURÍDICAS: EXPERIÊNCIA PARA VIDA TODA

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Competições Jurídicas: experiên O Direito, nós sabemos, é muito abrangente. A amplitude alcançada pela ciência jurídica permite que seus operadores tenham um verdadeiro leque de opções na hora de adentrar no mercado de trabalho. São diversas carreiras a seguir, diferentes áreas de especialização, enfim, um infinito de possibilidades! Da mesma forma, o curso de Direito é um dos que apresenta o maior número de atividades extracurriculares, tais como projetos de pesquisa, competições, simulações e afins. E o mais interessante é que tais atividades são desenvolvidas dentro e fora do país, o que possibilita ao acadêmico um olhar global sobre a temática em que está inserido. É o caso da Competição de Julgamento Simulado do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, realizada anualmente na capital dos Estados Unidos da América, Washington D.C. Organizada pela Faculdade de Direito da American University (dita Washington College of Law), a competição tem por objetivo oferecer aos seus participantes uma experiência prática sobre o funcionamento do sistema legal interamericano, através da abordagem de um caso hipotético sobre violações à Convenção Americana de Direitos Humanos praticadas por um Estado fictício. Trata-se de um evento trilíngue (comportando os idiomas inglês, espanhol e português), que exige das equipes tanto a capacidade de elaborar uma peça processual escrita (memorial) quanto a de sustentar suas teses oralmente perante uma banca de juízes. A divulgação do caso ocorre sempre nos meses de novembro ou dezembro, sendo a defesa oral seis meses após, no mês de maio, momento no qual os competidores serão arguidos

sobre a temática abordada por litigantes da área de direitos humanos, juízes, membros de Cortes internacionais, dentre outro profissionais. Eis então a dinâmica da competição: após completar o processo de inscrição, os participantes conhecerão seu papel (se Estado ou Representante das vítimas) e seu número de equipe. Com isso, eles devem começar a redigir o memorial, tendo como base o caso hipotético divulgado pela organização do evento. Terminado, o memorial deve ser enviado à Comissão Técnica avaliadora dentro de um prazo definido no regulamento oficial, sob pena de acarretar perda de pontos para as equipes que faltarem com essa exigência. Já em Washington, no ato do registro, os participantes serão notificados contra quem argumentarão (pelo número da equipe, pois o nome da universidade contra a qual se vai competir não é divulgado) e receberão o memorial da equipe adversária. Durante os três primeiros dias da semana de competição, acontecerá a Rodada Oral Preliminar, na qual todas as equipes argumentarão pelo menos duas vezes diante de uma banca de juízes que as avaliarão. As doze melhores equipes (seis representantes do Estado e outros seis das vítimas) dessa primeira fase avançam para a Rodada Semifinal. Desta última, apenas duas equipes se qualificam para a Rodada Final – naturalmente, a equipe que melhor representou o Estado e a outra que melhor representou as vítimas. Por fim, cumpre ressaltar que nesta última rodada as equipes apresentarão para um Painel de Honra, ou seja, os avaliadores serão juristas renomados, ativistas de direitos humanos reconhecidos pela sociedade civil, dentre outras personalidades eminentes. Não é necessário ter conhecimento

dos três idiomas que compõem os quadros do evento, uma vez que tanto o memorial quanto as argumentações podem ser feitos na língua pátria e, durante as rodadas orais, para eventuais adversários que falem outra língua, é oferecida a tradução simultânea. O mesmo não vale para os memoriais dos oponentes, que constituem importante instrumento na preparação dos argumentos e só são disponibilizados no idioma em que foram redigidos. Portanto, é no mínimo importante conhecer os outros idiomas, e, para quem já conhece, a experiência da competição pode ser uma ótima oportunidade de aprofundarse. No que tange a premiação, além da melhor equipe, são premiados os melhores memoriais em cada idioma e os melhores oradores. Os critérios de avaliação constam no regulamento oficial, que se renova todos os anos, a cada competição.

Washington College of Law

Como participar?

cessário conseguir uma carta com a assinatura do Reitor da universidade autorizando a participação da equipe. Por fim, exige-se o pagamento de uma taxa de inscrição, o que pode ser feito através de cartão de crédito, transferência bancária, ordens de pagamento (money orders) e cheques. Só reunindo esses três requisitos é que a inscrição se perfaz.

Para competir é obrigatório apenas estar devidamente matriculado em um curso de Direito ou Relações Internacionais, não existindo a exigência de se estar cursando um período específico. Dentro da faculdade, portanto, todos estão aptos a participar. As equipes devem ser formadas por dois estudantes, como oradores, e dois estudantes como observadores, além de dois orientadores, que devem ser pessoas com vasta experiência em direito internacional. As inscrições acontecem dentro de um período divulgado pela organização, e exigem como primeiro passo o preenchimento de um formulário disponibilizado no sítio do evento (www. wcl.american.edu/hracademy/ mcourt/). Em seguida, é ne-

Os mais pessimistas podem pensar que é muita pretensão querer sair do Amazonas e competir contra universidades do mundo inteiro em um evento nos Estados Unidos. Mal sabem eles que equipes do estado já participaram efetivamente, não uma, mas várias vezes, e até já conseguiram ser premiadas por seu desempenho! A Universidade Federal do Amazonas marcou presença nos anos de 2008 e 2009. A primeira dupla a representar a universidade foi formada pelas alunas Alichelly Carina Macedo Ventura e Catharina de Souza Cruz Estrella. Na época, ao retornarem da competição, criaram um

O Amazonas na competição


CORREIO DA JAQUEIRA COMPETIÇÕES JURÍDICAS: EXPERIÊNCIA PARA VIDA TODA

ncia para a vida toda Por Gabriel Coelho

grupo de estudos na faculdade voltado para os direitos humanos e para a jurisprudência da Corte Interamericana, com o objetivo de preparar novas equipes para a competição. Foi o chamado Grupo de Estudos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (GESIDH), que após dois anos de exercício suspendeu suas atividades, reabrindo-as no ano de 2012 para a preparação de uma nova equipe para a competição de 2013. As reuniões do grupo ocorrem semanalmente e a coordenação agora fica por conta do titular de Direito Internacional Público da casa, o professor Adriano Fernandes. Existe ainda a ideia de transformar o grupo em um projeto de pesquisa pela faculdade. A Universidade do Estado do Amazonas, por sua vez, participa recorrentemente desde o ano de 2008. Nesse mesmo ano, inclusive, uma equipe da universidade recebeu o prêmio pelo melhor memorial em português. Tivemos a oportunidade de conversar com a professora Sílvia Loureiro, que leciona Direitos Humanos na UEA e que orientou todas as equipes da universidade na competição até hoje. Ela falou um pouco sobre a preparação das equipes e a

importância desse tipo de experiência acadêmica na formação do estudante, como se vê na entrevista que segue abaixo:

CJ: O regulamento do evento permite que os alunos regularmente matriculados em um curso de Direito participem a qualquer tempo, do primeiro ao último período. No entanto, qual você acredita ser o momento ideal para tentar a competição? Quais seriam os conhecimentos prévios necessários para poder tirar o melhor proveito possível dessa experiência? Antes de tudo, o aluno que decida participar da competição deve estar preparado em uma esfera pessoal, independentemente do período acadêmico que esteja cursando. Em outras palavras, deve dispor de tempo para cumprir as horas de estudo que a preparação do caso requer e ter boa vontade de seguir as orientações e treinamentos. Em suma, não vejo que haja um período formal ideal, mas sim caso a caso, cada um deve saber o quanto pode se dedicar e o quanto tem de amor pelo tema dos direitos humanos para enfrentar todos os desafios pessoais, familiares e acadêmicos que a competição impõe. Ao longo da orientação, estes conhecimentos vão sendo repassados ao aluno que se disponha a aprender e aprofundar as pesquisas. CJ: Como é a preparação das equipes para a competição? Não há uma fórmula pré-estabelecida. Depende muito da composição e entrosamento da equipe. Mas o certo é que requer muito longo prazo e o apoio das equipes anteriores é fundamental. CJ: No ano de 2008, uma dupla sob sua orientação foi premiada pelo melhor memorial em português. O que você considera ter sido o diferencial no trabalho desenvolvido naquela ocasião? O prêmio muitas vezes pode ser pessoal, uma vitória que não é anunciada no site, mas marcada na vida de cada competidor. Vencemos nossos medos, inseguranças, falta de compreensão, e até mesmo as dificuldades financeiras. Por isso tudo, o primeiro lugar de uma equipe em especial é mais simbólico porque todas as equipes que se esforçam de verdade e saem da competição com a sensação de “fizemos nosso melhor” são campeãs. Muitas vezes os resultados dos primeiros lugares são resultados tão surpreendentes que não saberia explicar, porque envolve composição de bancas de rodadas orais, conhecimento do tema pelos julgadores e sorte. Em 2008 a UEA tinha uma equipe forte, pelo brilho do entusiasmo dos dois alunos participantes (Thalita e Eduardo), mas isso não significa que nos outros anos as duas outras equipes que orientei não foram, cada uma a seu

modo, campeãs. CJ: Você acha que esse tipo de atividade extraclasse merece maior investimento e atenção por parte das faculdades de Direito, sobretudo as amazonenses? Sem dúvida, não só para a advocacia em direitos humanos, mas para algo maior: criar uma consciência jurídica em qualquer área voltada para a aplicação dos direitos humanos no Brasil. Nossa sociedade civil e nossos profissionais da área jurídica precisam dominar esta área do conhecimento, independentemente do curso que sua vida profissional tome. Durante a competição é possível fazer contatos com várias pessoas que militam na área e conhecer alunos que possuam o mesmo interesse e depois, o curso de verão da American University é uma porta de entrada para a melhoria dos conhecimentos teóricos. É uma experiência para a vida toda.

Atividades extraclasse, como a competição aqui apresentada, podem ser importantes experiências tanto do ponto de visto acadêmico quanto profissional. Talvez a melhor definição seja a dada pela professora Sílvia Loureiro, para quem estas são “uma experiência para a vida toda”. E atividades nesse sentido acontecem o tempo todo, sendo que para participar muitas vezes o que se exige é unicamente força de vontade por parte dos estudantes. Algumas delas já foram exploradas por equipes locais, mas tantas outras ainda precisam ser desbravadas. Não parece um ótimo desafio?

Outras competições

Victor Carlos García Moreno (VCGM)

Essa também é uma competição de julgamento simulado, mas de outra instituição: do Tribunal Penal Internacional. A competição compreende três etapas: uma nacional, que o Brasil teve pela primeira vez em 2012, realizada na FGV-RIO; uma internacional, que conta com as diferentes equipes

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classificadas nas etapas nacionais e acontece na Cidade do México e seleciona as melhores equipes para irem à etapa final, que se dá na sede do TPI, em Haia, na Holanda.

Olimpíada Jurídica da FDV

A Olimpíada Jurídica é um evento realizado anualmente pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV) com o intuito de testar o conhecimento dos acadêmicos acerca de um tema definido a cada edição (em 2011, por exemplo, o tema escolhido foi Direitos Humanos). Os grupos devem ter quatro integrantes, todos devidamente matriculados em um curso de Direito. A competição consiste de três etapas: a primeira é uma prova objetiva, com trinta questões de múltipla escolha, ao passo que a segunda é discursiva, apresentando dois problemas para serem resolvidos. Essas duas primeiras etapas são online, realizadas através do sítio da FDV. A terceira e última fase, por sua vez, é presencial, tendo lugar na cidade de Vitória, no Espírito Santo. Nessa última fase os grupos têm que solucionar um caso prático e sustentar oralmente diante de uma banca composta por um misto de professores da área jurídica e de outras formações acadêmicas que tenham relação com o caso proposto. Os membros da banca são os responsáveis por avaliar e atribuir uma nota a cada equipe, revelando assim um grupo vencedor. As quatro melhores equipes são premiadas, e os prêmios vão desde artigos eletrônicos como Ipads e Iphones para cada membro até consideráveis quantias de dinheiro em livros da Editora Revista dos Tribunais (RT), que é parceira da FDV na execução da Olimpíada Jurídica.


CORREIO DA JAQUEIRA ENTREVISTA

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Entrevista

Héctor Valverde

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Diretor de Assuntos Internacionais e Ex-Presidente do BRASILCON CJ: O senhor é favorável a um tratamento mais rígido aos fornecedores que são litigantes habituais, com indenizações mais pesadas em juízo, ou acha que uma postura mais atuante dos PROCONs e das agências reguladoras é suficiente para adequar as práticas comerciais ao CDC?

Héctor Valverde

Com o avanço da sociedade capitalista e, consequentemente, a intensificação das relações de consumo, o Direito do Consumidor tende a ganhar cada vez mais espaço e importância entre os juristas e a sociedade. Por essa razão, Fábio Lindoso e Lima, advogado, articulista do Jornal do Commercio e correspondente do Correio da Jaqueira, entrevistou Héctor Valverde, juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Doutor em Direito do Consumidor pela PUC/SP e Diretor do BRASILCON. CJ: O CDC é uma lei com mais de 20 anos de idade e é tida como uma das legislações mais avançadas no mundo sobre a matéria. Qual é o balanço que o senhor faz sobre a efetividade da norma na proteção do consumidor nestes últimos anos? O Código de Defesa do Consumidor brasileiro – Lei Federal n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, é uma das leis mais avançadas do mundo quanto à proteção do consumidor. Destaco que o nosso Código de Defesa do Consumidor foi elaborado por juristas competentes e atualizados com os principais problemas jurídicos vinculados ao mercado de consumo no início da década de 1990. É certo que a elaboração do CDC contou com a valiosa contribuição de juristas internacionais, especialmente em dois congressos internacionais realizados em 1989, quando tiveram a oportunidade de apresentar diversas sugestões ao projeto de lei que tramitava no Congresso Nacional, resultando na positivação de diversos temas já bastante desenvolvidos na Europa e nos Estados Unidos da América, a exemplo da adoção da responsabilidade objetiva do fornecedor e a disciplina da publicidade, ambos os temas já àquela época regulamentados pelo direito europeu. Registro, ainda, a disciplina da cobrança indevida de dívida prevista no artigo 42 do CDC, cuja inspiração foi da lei norte-americana conhecida por Fair Debit Collection Practices Act, de 1977.

Sou favorável a uma aplicação razoável da norma jurídica. Vale dizer que a ponderação de valores e a proporcionalidade da sanção são fatores importantes no momento de concretização da norma jurídica prevista abstratamente. Assim, entendo que devemos alterar o atual tratamento jurídico dispensado aos fornecedores que descumprem sistematicamente os direitos do consumidor. É certo que temos fornecedores que são litigantes habituais, que montaram uma estrutura complexa e profissional para resistir às legítimas pretensões dos consumidores que tiveram seus direitos violados. Há um cálculo de custo-benefício por parte de alguns fornecedores quanto ao atendimento das necessidades dos consumidores, especialmente no que se refere aos lucros que os mesmos alcançam em razão das reiteradas ilicitudes praticadas no mercado. Esses fornecedores somente permanecem com estas práticas lesivas porque não temos instrumentos jurídicos hábeis a coibir estas ilegalidades, bem como as sanções aplicadas no Brasil ainda são muito tímidas e não cumprem as finalidades punitiva e preventiva (teoria do valor do desestímulo). Sou favorável à instituição da multa civil, cujo projeto de lei encontra-se em fase de elaboração na Casa Civil da Presidência da República. Lembro que a multa civil foi vetada na versão original do Código de Defesa do Consumidor pelo então Presidente da República Fernando Collor de Mello. Já é hora de cominar uma sanção para o fornecedor que lucra milhões de reais com a sua própria ilicitude, sua conduta dolosa de obter proveito econômico às custas do consumidor, especialmente nas micro-lesões coletivas e massificadas. CJ: Qual é a opinião do senhor sobre a expressão “indústria do dano moral”? Como diferenciar a verdadeira ofensa aos direitos da personalidade dos inconvenientes do cotidiano que não geram dano? Muito se fala sobre a “indústria do dano moral”. Entretanto, não vejo assim a questão. O ordenamento jurídico mundial sofreu profunda alteração a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, quando se abandona a visão extremamente patrimonialista da tutela legal para encontrar um novo valor: a dignidade da pessoa humana. Então, o dano moral representa uma vertente da visão contemporânea dos nossos valores, ressaltando a importância dos direitos da personalidade com seus atributos relacionados à vida, à integridade corporal, à integridade psíquica e aos aspectos morais de nossa existência (honra, reputação, imagem, nome, privacidade, intimidade, dentre outros). Atualmente, não se concebe a ideia de que os direitos da personalidade não estão sujeitos à reparabilidade, conforme sustentavam os adeptos da teoria ne-


CORREIO DA JAQUEIRA ENTREVISTA

gativista do dano moral. Nenhuma lesão a direito individual ou coletivo pode dispensar reparabilidade. Buscamos cada vez mais o respeito aos direitos subjetivos extrapatrimoniais e patrimoniais, levando a sérios os direitos, na feliz mensagem de Ronald Dworkin. Portanto, cuida-se de uma demanda que nunca chegava ao Poder Judiciário (a tutela dos direitos da personalidade), mas que agora o cidadão, o consumidor, já tem ciência deste importantíssimo aspecto de sua existência, resultando, naturalmente, de um crescente aumento de processos desta natureza. A diferença entre violação de direito da personalidade e inconvenientes do cotidiano é tarefa árdua, mas que a doutrina e a jurisprudência estão encarregadas de fixar limites, encontrar fundamentos e somente com a maturidade do instituto (dano moral) e o desenvolvimento dos fatos sociais poderemos alcançar uma margem segura de entendimento da questão. Nunca é demais lembrar que a matéria sempre será permeada de subjetividade, tarefa a ser resolvida pelo Poder Judiciário com base nos valores sociais reconhecidos no tempo e no espaço.

Em destaque, Héctor Valverde compondo a mesa do XI Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor (Fonte: BRASILCON)

CJ: Qual será, na opinião do senhor, o impacto das alterações do CDC, especificamente no fornecimento de crédito e na relação com as instituições bancárias, com uma série de novas exigências para os fornecedores? O Código de Defesa do Consumidor completou 22 anos. É natural que o transcurso do tempo acarrete um descompasso entre a norma e a realidade social. Reconhecendo esta particularidade, o Senado instituiu uma comissão de juristas para propor uma alteração de nossa lei consumerista. Com efeito, foram identificados três pontos principais: 1. comércio eletrônico; 2. superendividamento; 3. ação coletiva. Especificamente quanto ao fornecimento de crédito, a atualização do CDC visa evitar o superendividamento e também institui a figura do “assédio ao consumo”, muito comum hoje quanto à concessão do crédito. Atualmente verificamos uma completa abusividade por parte de algumas empresas do setor quanto à outorga irresponsável do crédito, especialmente no crédito consignado ao aposentado, com risco zero para o fornecedor, mas que tem gerado um problema social que,

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às vezes, leva, inclusive, ao suicídio de pessoas com dívidas em excesso. Em muitos casos o consumidor não tem condição de pagar a sua dívida levando em conta a sua expectativa de vida. É uma situação que o direito não pode desconhecer e a atualização do CDC vem no sentido de reforçar o dever de informação e positivar a ideia do crédito responsável, dentro do tema maior da responsabilidade social da empresa e o consumo sustentável. CJ: Recentemente os usuários de redes sociais deram grande repercussão a uma publicidade promovida no YouTube, de forma não identificada, por uma fabricante de aparelho celular, que veio a ser notificada pelo CONAR por não expor claramente a informação ao público consumidor. Na opinião do senhor, a lei de consumo ainda consegue se manter firme frente aos avanços tecnológicos de transação entre os fornecedores e consumidores ou necessita de ajustes? O comércio eletrônico é uma realidade, com expressiva quantidade nas operações mercantis realizadas em nosso país. Entretanto, o comércio eletrônico é a sede onde consumidor se mostra mais vulnerável. Primeiro porque o consumidor não sabe onde fica a sede física da empresa com quem está contratando, dificultando qualquer pretensão de reparação do dano. Segundo, é sempre uma incerteza o recebimento do produto, bem como a garantia da segurança e qualidade do mesmo. Terceiro é quanto à veracidade da informação veiculada, sendo que o consumidor se torna alvo fácil para a publicidade enganosa, aquela que veicula informação total ou parcialmente divergente da realidade. Quarto lugar é relacionado ao exíguo prazo para desistir do contrato, que atualmente é de 7 dias (art. 49 do CDC). Entendemos que o prazo deveria ser ampliado, a exemplo de outros países, para 15 dias no mínimo, concedendo maior lapso temporal para a reflexão e a comunicação de arrependimento do negócio sem que haja um vício do produto ou serviço. Por último, lembramos a difícil questão relacionada à segurança das transações via internet, com frequentes casos de apropriação de senhas e dados pessoais com as devastadoras consequências a que os consumidores estão expostos. Nessa linha de raciocínio, a atual legislação consumerista não consegue se manter firme frente aos avanços tecnológicos, necessitando de uma urgente atualização.

Membros do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor - BRASILCON no XI Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor. (Fonte: BRASILCON)


CORREIO DA JAQUEIRA PÓS-GRADUAÇÃO NA FD/UFAM

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Pós-graduação na FD/UFAM

Motivos do passado e perspectivas futuras A pós-graduação na UFAM

Depois de 104 anos de existência, o serviço oferecido pela Faculdade de Direito é a formação de bacharéis. Houve alguns cursos de especialização, atualmente paralisados. A falta de mestrado e doutorado parece ser um problema pontual do curso de Direito, felizmente com vistas a uma solução no futuro próximo. Primeiro, atente-se que a pósgraduação stricto sensu ainda é uma realidade para poucos, com raras exceções. No Brasil, independente do campo de conhecimento humano, há uma exagerada concentração de cursos no Sul/Sudeste. Norte e Nordeste ficam atrás, e o Norte ainda mais. Segundo fala o pesquisador Adalberto Val, Diretor do INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, uma das referências em mestrado e doutorado na região –, teríamos que ter muito mais doutores em toda a Amazônia. Estamos patinando, portanto. Assim, falar em pós-graduação é algo que tem que ser visto com ressalva e cuidado. No caso da UFAM, no todo, existem 34 programas de pósgraduação (contando mestrado, doutorado e mestrado profissional). É a instituição com a maior quantidade de cursos de pós-graduação no Amazonas, seguida da UEA, com nove, e do Centro Universitário Nilton Lins, com três cursos. Na UFAM há uma natural concentração de pós-graduações nos cursos das Agrárias, Ambientais e Florestais. Estas

contribuem com 19 programas; biológicas vêm em segundo com 11. Há uma explicação para isso. Os cursos das agrárias e biológicas foram beneficiados pela promoção da pesquisa no campo agropecuário. O Brasil - considerado celeiro de alimentos do mundo – passou a investir pesadamente com pesquisa neste ramo. Tanto que criou a Embrapa – Empresa brasileira de Pesquisa Agropecuária – para este fim em 1973. Para manutenção do seu destino cientifico seria necessário

Além disso, na contramão das áreas agrárias e biológicas, o próprio ordenamento jurídico – base para a tomada de decisões – é jovem no que refere ao mérito acadêmico. A admissão de juízes tendo por critério o mérito somente apareceu na Constituição de 1969, sedimentado pela de 1988. O método científico, com sólida formação acadêmica (formal) e os títulos é coisa recente, portanto. Ademais, por ser uma área das mais tradicionais, o ramo jurídico desde os primórdios já laureava com titulação de

Velha Jaqueira: antiga sede da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Amazonas (foto).

formação urgente e maciça de pesquisadores. Não à toa, na década de 70 e 80 formaram-se centenas de pesquisadores fora do Brasil com mestrado e doutorado. A consequência deste aporte de novos pesquisadores foi que houve um crescimento proporcional de cursos de pós-graduação nestas áreas, em especial agrárias. Não é diferente em nenhuma grande Instituição de ensino Brasil a fora. Somente na década de 90 outras áreas passaram a calibrar mais gente no mestrado e doutorado, como o caso das ciências da saúde e as engenharias em geral.

“Doutor” aquelas com o simples canudo, e isso já bastava. Para o aluno no Amazonas, a opção única do mestrado em Direito Ambiental da UEA é pouco ou não condiz com o que “pede o mercado”. Ou o aluno busca Fortaleza, Brasília ou Belém ou já entra em desvantagem em qualquer concurso. A professora da FD/UFAM, Ana Carolina, buscou o mestrado em outro estado da Federação “para ampliar horizontes e aprender além do que ensina na graduação”. Para ela, a pósgraduação é sempre um diferencial, principalmente quando se quer prestar concursos pú-

blicos. Para o professor José Ribamar Mitoso, também acadêmico da casa, “desde os anos 1990 a maioria dos professores não é de dedicação exclusiva porque 80% são funcionários públicos ou privados e somente 20% possuem o próprio negócio”. Isso, segundo ele, “é um fator muito importante para o enfraquecimento ou pelo menos o não fortalecimento da pesquisa”. Em segundo lugar, afirmou que a Faculdade de Direito da UFAM em mais de 100 anos de história montou uma tradição de produzir conhecimento mais para a sociedade do que para dentro da própria Faculdade. Prova disso, segundo ele, é que nós formamos na FD/UFAM sete governadores, um ministro-presidente do Supremo Tribunal Federal, e o relator-geral da Assembleia Constituinte de 1987-88. No final, questionado sobre a pecha de “curso de elite” que se dá ao Direito, o Prof. José Mitoso esclareceu que “há um poder dos operadores do Direito, e essa forma de organização da sociedade, que vem do liberalismo francês, é que dá destaque aos advogados”. Ele lembrou a origem desse poder remetendo aos advogados franceses, que foram os primeiros organizadores da Revolução Francesa. Segundo ele, essa participação dos operadores do direito no início do movimento revolucionário francês do século XVIII “criou uma elite e muitas vezes quase sempre comprometida com somente a manutenção das estruturas sociais e não com a sua transformação”.


CORREIO DA JAQUEIRA PÓS-GRADUAÇÃO NA FD/UFAM

Perspectivas para o futuro Com a posse do professor Sebastião Marcelice Gomes como novo Diretor da Faculdade de Direito – UFAM, a Diretoria da instituição traçou um plano de gestão de excelência que contempla também os programas de pós-graduação. O Correio da Jaqueira entrevistou a professora Clara Lima, integrante da equipe responsável por estruturar a Coordenação da Pós-graduação para este fim:

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O processo de implantação do programa de pós-graduação começa com o concurso para Professores Doutores. Quanto ao curso de pós-graduação lato sensu, pretendemos iniciar já no próximo ano. Vale ressaltar que não existe uma Coordenadora de pós-graduação, mas uma equipe, um time na Coordenação da Pós-Graduação. A experiência do Prof. Roque Marques é essencial na coordenação, de modo que o fato de meu nome constar na portaria é mera formalidade.

CJ: Professora Clara, tendo-a como integrante da equipe que irá fazer parte da Coordenação de Pós- Graduação, quais são as expectativas para a nossa Faculdade e quais os planos da Diretoria em relação à pós-graduação? A Faculdade de Direito preparou uma estratégia para a PósGraduação priorizando um curso permanente de Mestrado e, no futuro, de Doutorado. Essa estratégia, apoiada pela congregação, tem como primeiro passo a realização do concurso para o preenchimento de três cargos de professor com dedicação exclusiva, com titulação mínima exigida de doutorado. Esses professores, juntamente com outros professores em fase de doutoramento, deverão fazer parte do corpo docente do Programa de Pós-graduação stricto sensu da Faculdade de Direito. Entendemos que a pós-graduação lato sensu, dedicada aos especialistas, deverá ser trabalhada considerando a linha de pesquisa do futuro mestrado, que a priori, será na linha do Direito do Estado.

A Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (foto) já possui um programa de pós-graduação interinstitucional com a Universidade do Acre e é uma das instituições com a qual a FD/UFAM pretende estabelecer convênios no futuro.

CJ: Caso sejam visadas, com quais universidades a Faculdade de Direito da UFAM deseja estabelecer futuras parcerias? O programa estará aberto a qualquer Instituição pública ou privada. Não descartamos a possibilidade de adotar o sistema Minter/Dinter (Mestrado/Doutorado Interinstitucional), mas a nossa prioridade é implementar um projeto próprio. CJ: Reservamos aqui um espaço para que a senhora possa dar um recado aos nossos leitores.

A Faculdade de Direito da Universidade do Porto (foto), em Portugal: um dos objetivos da nova Diretoria da FD/UFAM é estabelecer parcerias para a pós-graduação no exterior, com mestrados e doutorados interinstitucionais

CJ: Doravante, com a nova fase da Coordenação, o foco nos cursos de pós-graduação a serem desenvolvidos será na especialização lato sensu ou stricto sensu? Em quanto tempo pretende-se que sejam implantados?

Queremos aproveitar a oportunidade para ressaltar que nesse processo de estruturação do programa, que é de longo prazo, mas pretende ser permanente, a participação dos alunos será muito importante. No início do próximo semestre pretendemos estar com os núcleos de pesquisas direcionados conforme os parâmetros a serem adotados no Mestrado, como já dito. Outro aspecto importante é que a Faculdade de Direito terá sua revista eletrônica, como forma de estimular a pesquisa, contribuindo com a divulgação da nossa Instituição. Ao final gostaríamos de parabenizar o Correio da Jaqueira pela iniciativa e desejar que o periódico se consolide e se torne um importante veículo de informação e divulgação positiva da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Amazonas.

Pedro Lira, Ronaldo Santos e Rafael Benzecry.


CORREIO DA JAQUEIRA PERSPECTIVA DOCENTE

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Perspectiva docente

Jurisprudência banana boat

Ticiano Alves e Silva Professor da UFAM. Advogado. Procurador do Estado do Amazonas.

No dia 12.04.2012, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 1.368.507, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia, reviu entendimento antigo segundo o qual a tempestividade, por força da preclusão consumativa, deve ser comprovada no momento da interposição do recurso. No caso, o STJ entendeu ser possível a prova posterior da tempestividade da impugnação recursal. Especificamente, o recorrente comprovou a existência de feriado local quando o recurso que fora inadmitido por intempestividade já se encontrava no STJ. Em síntese, o Tribunal da Cidadania decidiu que, embora o recorrente não tivesse juntado a prova da existência de feriado local quando da interposição do recurso no tribunal “a quo”, poderia fazê-lo no STJ, posteriormente, portanto, à interposição do recurso . No particular, o STJ alinhou sua jurisprudência ao entendimento recente do Supremo Tribunal Federal (STF), que, no dia 22.03.2012, no julgamento plenário do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n.

626.358, admitiu a comprovação posterior da tempestividade do recurso . A decisão do STJ - tribunal competente para uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional e, pois, do CPC – foi elogiada e bem recebida no ambiente jurídico. Cuidava-se, decerto, de um importantíssimo precedente. Ocorre que, no dia 19.04.2012, ou seja, uma semana depois, o STJ “voltou atrás”: anulou a decisão, sob o argumento de que estavam presentes à sessão apenas três dos cinco ministros que compõem a Turma. Além disso, consignou-se que o resultado representava mudança de entendimento em relação à jurisprudência já consolidada no STJ. Resultado: foi negado provimento ao Agravo Regimental, mantendo a decisão que julgou o Agravo de Instrumento intempestivo . Triste esta decisão. Primeiramente, no mérito do recurso, o primeiro entendimento – anulado- é o mais acertado. Afastava uma jurisprudência defensiva clássica em homenagem ao direito fundamental à inafastabilidade do controle jurisdicional, prestigiando de maneira bastante sensível as relações de colaboração entre as partes e o órgão jurisdicional . O mais lamentável, porém, é a forma como tudo aconteceu. Fala-se muito hoje no Brasil sobre um sistema de precedentes. A valorização pelos juízos de instâncias inferiores das decisões dos tribunais responsáveis pela uniformização do direito impõe-se por uma série de fatores, tais como segurança jurídica (estabilidade das relações interpessoais e continuidade do ordenamento), igualdade (perante as decisões judiciais),

duração razoável do processo etc. Mas o desenvolvimento de uma cultura dos precedentes passa também pela tomada de consciência de seu papel no sistema por parte dos próprios tribunais uniformizadores: afinal, um precedente chancela um entendimento que transborda do processo, determinando a conduta de pessoas que não são partes na demanda; que assumirão a partir dali comportamento em conformidade com a novel posição do tribunal. Exige-se responsabilidade decisória: não pode o tribunal dizer uma coisa hoje e depois de uma semana dizer outra completamente diversa. Isso causa insegurança. Ora, a Primeira Turma podia submeter o agravo regimental a julgamento com apenas três dos cincos ministros, caso contrário não o teria feito. Em relação a tratar-se de entendimento consolidado do Tribunal, parece, com o devido respeito, que faltou coragem para mudar, e mudar para melhor (o relator qualificou o entendimento que durou uma semana de “simpático e liberal”). Inclusive depois, quando do novo julgamento. O caso me trouxe à memória trecho do voto do Ministro Humberto Gomes de Barros proferido no julgamento do Agravo no Recurso Especial n. 383.736, em 2004, no qual se lê: “Nós somos os condutores, e eu - Ministro de um Tribunal cujas decisões os próprios Ministros não respeitam - sintome, triste. Como contribuinte, que também sou, mergulho em insegurança, como um passageiro daquele voo trágico em que o piloto que se perdeu no meio da noite em cima da Selva Amazônica: ele virava para a esquerda, dobrava para a direita e os passageiros sem

nada saber, até que eles de repente descobriram que estavam perdidos: O avião com o Superior Tribunal de Justiça está extremamente perdido. Agora estamos a rever uma Súmula que fixamos há menos de um trimestre. Agora dizemos que está errada, porque alguém nos deu uma lição dizendo que essa Súmula não devia ter sido feita assim. Nas praias de turismo, pelo mundo afora, existe um brinquedo em que uma enorme boia, cheia de pessoas é arrastada por uma lancha. A função do piloto dessa lancha é fazer derrubar as pessoas montadas no dorso da boia. Para tanto, a lancha desloca-se em linha reta e, de repente, descreve curvas de quase noventa graus. O jogo só termina, quando todos os passageiros da boia estão dentro do mar. Pois bem, o STJ parece ter assumido o papel do piloto dessa lancha. Nosso papel tem sido derrubar os jurisdicionados.” O STJ alterou sua jurisprudência para, em conformidade com o STF, considerar possível a comprovação da tempestividade do recurso posteriormente a sua interposição. Uma semana depois, voltou atrás. Tem-se, aí, a jurisprudência “banana boat.” Lamentável, porém, que o passeio tenha durado tão pouco. Post-scriptum: este artigo foi publicado na mais importante revista de Direito Processual Civil brasileira, Revista de Processo, em julho de 2012. Em setembro, o STJ, finalmente, curvou-se ao entendimento do STF, “em homenagem ao ideal de uniformização da jurisprudência nacional” .


CORREIO DA JAQUEIRA GALERIA

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Galeria

A arquitetura da Justiça

A sede do Supremo Tribunal Federal, órgão constitucional máximo do país, em Brasília.

O Palácio da Justiça, em Manaus, já foi sede do Poder Judiciário do Amazonas. Hoje, deu lugar ao Centro Cultural Palácio da Justiça.

Edifício Desembargador Arnoldo Péres, atual sede do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas.

Superior Tribunal de Justiça, em Brasília: a maior referência jurisprudencial infraconstitucional do Brasil.

Estátua da DEUS Themis, símbolo da Justiça, em frente ao Supremo Tribunal Federal, em Brasília.



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