FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO: ABRANGÊNCIA E IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO DOCENTE

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FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO: ABRANGÊNCIA E IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO DOCENTE Paulo Gomes Lima1 RESUMO Neste artigo, será desenvolvida a apresentação e relevância da articulação dos Fundamentos da Educação com as Práticas Pedagógicas na formação de professores nas licenciaturas, uma vez que é necessário situar o seu grau de abrangência na realidade escolar propriamente dita, em qualquer nível ou área de atuação do magistério, âmbito que não se esgota na formação inicial. De forma transversal e para efeitos didáticos, consideraremos os pilares dos Fundamentos Teóricos da Educação e Práticas Pedagógicas em seu conjunto, fornecendo, se não todas, pelo menos as pistas principais para o entendimento do fenômeno educacional, seus condicionantes e suas formas de aplicação no âmbito da educação escolar. Neste sentido, tais contribuições são importantes para o professor, pois apresentam elementos contextualizados para a compreensão do desenvolvimento da educação escolar em diferentes sociedades, o que possibilita uma postura recorrente frente às demandas da escola da atualidade e análise em profundidade do tipo, modalidade e qualidade de educação oferecidas às gerações que se sucedem, bem como o perfil profissional do educador que se necessita e que não deve estar à margem das competências e habilidades imprescindíveis para o desenvolvimento de trabalho pedagógico. E finalmente trazemos à luz a prática pedagógica então, conceituada como processo de intervenção na realidade educacional (abrangendo o cotidiano de sala de aula em específico e a realidade da escola como um todo) deve ser exercida com um olhar articulado às bases epistemológicas do fenômeno educativo – como uma unidade e indissociabilidade do savoir-faire (saberfazer) do educador comprometido, quer seja professor em sala de aula, da equipe do suporte pedagógico ou do corpo administrativo da escola. Palavras-chave: fundamentos teóricos da educação, formação de professores, práticas pedagógicas ABSTRACT THEORETICAL FOUNDATIONS OF EDUCATION: SCOPE AND IMPORTANCE IN TEACHER TRAINING. In this article we will develop the presentation and articulation of the importance of fundamentals of Education with the teaching practices in teacher education in degree, since it is necessary to put the degree of coverage in the school itself, at any level or area of expertise the teacher, that scope is not limited to initial training. In order for teaching and cross, consider the pillars of the theoretical foundations of education and teaching as a whole, providing, if not all, at least the main avenues for the understanding of educational phenomenon, its limitations and its forms of application under of school education. Accordingly, such contributions are important for the teacher, since they have contextualized elements to understanding the development of education in different societies, which enables a position opposite to the demands of the applicant's current school and in-depth analysis of the type, form and quality of education available to generations to come, and the profile of the professional educator that is needed and should not be on the sidelines of the skills and abilities essential to the development of pedagogical work. And finally bring to light the teaching then, conceived as a process of intervention in the educational reality (covering the daily life of the classroom in particular and the reality of the school as a whole) should be exercised with a pleading look to epistemological foundations of educational phenomenon -- as an inseparable unit, and the savoir-faire (know-how) of committed educator, whether teacher in the classroom, the teaching support staff or administrative body of the school. Keywords: theoretical foundations of education, teacher training, teaching

Introdução

Professor Adjunto da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Grande Dourados – MS. Endereço eletrônico: paulolima@ufgd.edu.br 1


2 Um dos componentes indispensáveis à formação do educador é o eixo dos Fundamentos Teóricos da Educação e sua articulação com as práticas pedagógicas. Tal importância solicita do educador alguns cuidados que lhe ajudarão na problematização, não somente das práticas pedagógicas que se construíram ao longo do tempo, mas também dos contextos e embasamentos que lhes deram sustentação. Dentre eles, ao se desdobrar o conceito de educação, não podemos esquecer que a sua compreensão não existe por si só, pois se articula a outros conceitos representativos de uma realidade que é concreta, vivenciada pelos atores sociais no tempo. Com esta preocupação, o ponto de partida para trazer à luz este componente indispensável a todo educador é a conceituação da educação e identificação dos elementos necessários para a sua compreensão, a saber: trabalho, cultura e manifestações possíveis da educação. Nesta diretriz, os Fundamentos Teóricos da Educação constitui-se um dos principais eixos da Ciência da Educação, sem o qual a prática pedagógica se perderia em fazeres técnicos, deixando de lado a reflexão sobre o processo educacional ao longo do tempo histórico. O caráter de relevância deste estudo dá-se pelas contribuições de áreas interdisciplinares que formam a sua totalidade (história da educação, psicologia da educação, filosofia da educação e sociologia da educação) e de como tais contribuições apontam pistas para entendermos o fenômeno educacional na atualidade. Neste caso, a ação do educador, quer esteja em sala de aula, quer frente ao suporte pedagógico ou quer de forma intensiva na gestão administrativa de uma unidade escolar, deve ser desenvolvida por uma ação – que é a primeira leitura da realidade escolar, de como se apresenta e de como se articulam todos os elementos e situações a ela pertinentes situando um panorama da instituição ou do aproveitamento discente-docente. A ação leitora sobre a realidade permitirá ao educador o acesso ao diagnóstico desta realidade, solicitando-lhe uma reflexão intencional sobre as problemáticas identificadas e de como aperfeiçoar o que já é proveitoso para todos os atores da escola. Esta reflexão sobre ação possibilitará a sugestão do coletivo frente às questões que se colocam no cotidiano escolar, mas também em nível individual servirá ao professor como ponto de auto-avaliação permanente quanto a validade e aproveitamento do que está desenvolvendo e como aprimorar ou mudar de direção pedagógica, se for o caso. Desta maneira, o terceiro momento dialético e concomitante do processo, será o retorno à própria prática ou ação evidenciando uma ação transformada e disposta ao processo de transformação dos fazeres e amadurecimento do educador. Não se pode destacar, neste sentido, este ou aquele elemento como o mais relevante da ação docente, pois esta deve sempre ser


3 conscientizadora

e

intencional:

a

emancipação

do sujeito

como

ator

social.

Conseqüentemente, a intervenção do educador deve tomar como eixo central a açãoreflexão-ação, daí a necessidade de considerar os Fundamentos Teóricos da Educação articulados ao contexto educacional. Para compreender a educação Cada grupo humano reúne formas distintas de produção de sua própria existência. Esta ação intencional do homem sobre a natureza é denominada de trabalho. O trabalho, portanto, é a ação transformadora, consciente e intencional do homem sobre a natureza para que suas necessidades sejam suficientemente sanadas. Desta maneira, o processo de transformação do homem sobre a natureza e sua própria realidade reunindo o que e como produz, seus costumes, vivências, linguagem, valores e demais manifestações, que se dão por meio do trabalho, é caracterizado de cultura. Dentre distintos sentidos que a palavra cultura pode assumir, certamente o sentido antropológico apresenta uma contribuição comumente aceita, isto é,

a cultura ou as

culturas como o elemento de identificação de uma comunidade, de um grupo social ou de um povo. A cultura ou as culturas podem apresentar caráter permanente ou caráter dinâmico, conforme o valor que cada agrupamento social lhe confere. Para que a cultura de um grupo social sobreviva de geração para geração, de um povo para outro povo, independentemente de seu caráter permanente ou dinâmico, é necessário que seja transmitida de alguma maneira, para que o próprio grupo não se disperse e nem perca sua identidade. Nesta direção, o processo de transmissão dos conhecimentos, valores ou ferramentas culturais será desenvolvido por meio da educação. Do ponto de vista do desenvolvimento do indivíduo, a educação o transforma, ou seja, na medida em que convive e que ocorre o seu amadurecimento de ordem física, intelectual e moral vai formando sua identidade pessoal e construindo suas competências e habilidades que lhe possibilitarão a aquisição de conhecimentos, bem como os posicionamentos frente ao conhecimento do mundo que se propõe. Neste sentido a educação pode ser entendida como a passagem de um estado para o outro, mediada pelo desenvolvimento orgânico do indivíduo, as intervenções e solicitações do meio em que vive à medida que ocorre o processo de ensino-aprendizagem em qualquer âmbito. A educação é o instrumento que vai formar e constituir a consciência do indivíduo na ação comunicativa entre si e o outro. Esta ação é o vetor da construção de normas e


4 convenções dos valores acordados e das formas legítimas de interferências nas regularidades ou irregularidades do objeto social em todas as instâncias: desde os valores do núcleo familiar, de uma grupamento de profissões, de grupos étnicos ou mesmo da organização de um Estado. Por explicitar a consciência viva de um povo ou das normas estabelecidas por ele, é que o fenômeno educacional vai se desdobrar de algumas maneiras específicas, conforme o enfoque do arranjo social, tendo como finalidade, a emancipação do sujeito como ser histórico, instrumentalizando-o para atuar a partir das relações estabelecidas nos acordos sociais, concordando com as mesmas ou propondo reformulações ao longo do seu amadurecimento como ator social ou ainda, por meios legitimamente constituídos, encaminhar formas de superação de seu desenvolvimento. Assim, observamos que sobre o enfoque social, a educação é o processo de transmissão de heranças culturais de um povo, no qual as novas gerações as aprendem, preservam ou as desenvolvem em benefício da continuidade e identidade do grupo. Conceituação de fundamentos teóricos da educação A educação, do ponto de vista formal, buscará na pedagogia os parâmetros necessários para o desenvolvimento da ação docente a partir da leitura do homem no tempo. Isto significa que ao longo do processo histórico a pedagogia alçou status de Ciência da Educação, uma vez que sua preocupação com o fenômeno educacional não se restringe tão somente ao estudo de teorias críticas em si para o seu norteamento, pois vai buscar na própria vida da escola e suas ações, as explicações e leituras das vivências, que serão problematizadas e encaminhadas à luz de sua própria solicitação e dos saberes e reflexões pedagógicas construídas no tempo. A este respeito, vale lembrar pelo menos três observações de Pimenta (1996, p.57), quando se refere a pedagogia como Ciência da Educação e não somente teoria crítica da educação, dado que sua preocupação, objeto e processos de intervenção tem caráter interativo entre base teórica e aplicação prática, como se segue: •

A Ciência da Educação tem como as demais íntima colaboração, diálogo, intercâmbio, para o que há a necessidade da revisão epistemológica, “ sem o que o estudo dos fenômenos educativos ficará irremediavelmente condenado a permanecer como receptor passivo de discursos alheios” (...) sem que se efetive uma interdisciplinaridade.


5 •

O objeto/ problema da Ciência da Educação (Pedagogia) é a educação enquanto prática social. Daí o seu caráter específico que a diferencia das demais, que é o de uma ciência prática – parte da prática e a ela se dirige. A problemática educativa e sua superação constituem o ponto central de referência para a investigação.

A educação, objeto de investigação da Ciência da Educação (Pedagogia), é um objeto inconcluso, histórico, que constitui o sujeito que o investiga e é por ele constituído. Por isso, não será captado na sua integridade, mas o será na sua dialeticidade: no seu movimento, nas suas diferentes manifestações enquanto prática social, nas suas contradições, nos seus diferentes significados, nas suas diferentes direções, usos e finalidades. Será captado por diferentes mediações que revelam diferentes representações construídas sobre si. Ao constituir sua identidade entre o rol das ciências humanas, a Pedagogia, como

Ciência da Educação, abrange pelo menos 3 eixos encadeados e bem delimitados, que de forma indissociável

lançam luz sobre o saber-fazer pedagógico, conservando,

modificando, e/ ou promovendo rupturas com os referenciais educacionais historicamente produzidos: fundamentos teóricos da educação, metodologias de ensino e o o processo de reflexão sobre a validade ou não das práticas pedagógicas frente á leitura do real, como se segue: a) os fundamentos teóricos da educação: constituem as bases para a compreensão das dimensões do fenômeno educativo ao longo da história da educação e da escola do ponto de vista histórico, filosófico, sociológico e psicológico. Trazem à luz os conhecimentos pedagógicos historicamente produzidos e sua reflexão sobre os mesmos, situando o homem como sujeito que se mobiliza na história do seu desenvolvimento educacional e mobilizase com esta mesma história, mediado pelas transformações do mundo e de si. b) metodologias de ensino: articula e desenvolve disciplinas, formas, maneiras e processos de se trabalhar a educação num plano objetivo. As metodologias de ensino são instrumentais imprescindíveis para o desenvolvimento do trabalho pedagógico, pois materializam a tipologia de educação desejada ou mesmo se propõe a encontrar os melhores encaminhamentos que sejam favoráveis ao desenvolvimento do processo ensinoaprendizagem. É oportuno lembrar que é improdutivo elaborar planejamentos metodológicos que não tenham sustentação em si e que desprezem a contribuição dos fundamentos teóricos da educação como objeto de referência, pois na educação a teoria sem a prática não tem valor e a prática sem a teoria não constituem as finalidades da


6 educação em sua totalização, pois o homem mobiliza-se no tempo a partir de suas construções sócio-afetivas, bem como de suas heranças culturais que sejam universais, regionais e/ou locais. c) o processo de reflexão sobre a validade ou não das práticas pedagógicas frente á leitura do real: o exercício da ação docente ou a sua prática pedagógica deve acontecer de maneira encadeada com os fundamentos teóricos da educação, as metodologias de ensino e a leitura que se faz sobre a realidade vivida da escola, da comunidade, do aluno e demais contexto relacionados para que se constitua uma prática pedagógica coerente e consistente e que objetive o desenvolvimento de uma formação cidadã. O processo de reflexão sobre a validade ou não das práticas pedagógicas frente à leitura do real é um elemento indispensável ao posicionamento do educador, pois dentre outros pontos lhe possibilita: •

observar o grau de pertinência entre as vivências evidenciadas no contexto educacional e o planejamento desenvolvido, propondo-se sempre a repensar a ação pedagógica, por meio de um plano flexível, que atinja objetivos convencionados, mas que não despreze as peculiaridades de sua realidade.

optar por caminhos metodológicos alternativos e diferenciadas formas de intervenção no processo ensino-aprendizagem, quando se constatar

o

distanciamento e a improdutividade de uma ação previamente delineada. •

Crescer como pessoa e como profissional. Certamente é um processo de rupturas e por isso pode causar instabilidade num primeiro momento, afinal “crescer dói’. Por outro lado, lhe possibilitará desenvolver uma ação consciente e intencional de uma leitura necessária que fará diferença na maneira de ensinar, que embora não lhe traga muitas vezes, garantias de “pleno” sucesso, certamente lhe trará a percepção de que as formas de intervenção no processo pedagógico deverão sempre ser refletidas à luz de uma realidade que solicita encaminhamentos diferenciados.

Neste sentido, vale refletirmos sobre a importância do estudo dos Fundamentos Teóricos da Educação na bagagem do conhecimento necessário ao professor para o desenvolvimento de sua ação pedagógica, bem como identificarmos a delimitação das áreas do conhecimento em que o fenômeno educativo é estudado, como proposto na próxima seção.


7

Fundamentos teóricos da educação: a delimitação das áreas do conhecimento Os Fundamentos Teóricos da Educação consistem nas contribuições de estudos dos fenômenos educativos à luz de uma ou mais áreas do conhecimento científico historicamente produzido. Eles situam de forma crítica o pensamento pedagógico de uma determinada época considerando os condicionantes históricos, filosóficos, sociológicos e psicológicos em seu conjunto no fazer cotidiano da escola, daí porque não ser possível dissociar estes conhecimentos das práticas pedagógicas, uma vez que prefiguram um todo que o educador não poderá abrir mão, sob pena de um olhar equivocado sobre o que se entende como totalidade da educação como um todo e da formal em particular, objeto de estudo deste livro. Neste sentido, tais contribuições são importantes para o professor, pois apresentam elementos contextualizados para a compreensão do desenvolvimento da educação escolar em diferentes sociedades, o que possibilita uma postura recorrente frente às demandas da escola da atualidade e análise em profundidade do tipo, modalidade e qualidade de educação oferecidas às gerações que se sucedem, bem como o perfil profissional do educador que se necessita e que não deve estar à margem das competências e habilidades imprescindíveis para o desenvolvimento de trabalho pedagógico. A seguir, para efeitos didáticos, destacaremos cada uma das áreas do conhecimento que, reunidas, compõem os Fundamentos Teóricos da Educação, a saber: a) História da Educação, b) Filosofia da Educação, c) Sociologia da Educação e d) Psicologia da Educação. Vale lembrar, no entanto, que o estudo transversal sobre o desenvolvimento da educação escolar, tomando os Fundamentos Teóricos como orientação é o posicionamento que assumimos neste trabalho, uma vez que todas as vinculações possíveis das áreas do conhecimento listadas são pertinentes ao desenvolvimento da educação do homem como sujeito de sua própria história. As contribuições da história da educação A história da

educação, como fenômeno histórico, apresenta diferenciações e

particularidades de povo para povo. Desta maneira, o seu estudo como disciplina específica pode encontrar dificuldades na sistematização do pensamento e realidade educacional historicamente situada.


8 Neste sentido a própria literatura especializada apresenta dificuldade no desenvolvimento de suas descobertas, considerando-se as peculiaridades de cada povo constituídas ao longo do tempo.

A História da Educação quando buscada como referencial da educação, principalmente da educação formal, busca na História do Pensamento Pedagógico a sua sustentação e na Pedagogia como um todo a suas interconexões, uma vez que, conceituamos a Pedagogia como a “Ciência da Educação”. Sob esta perspectiva, as construções educacionais, as idéias pedagógicas e a instituição da escola foram e estão condicionadas por fatores histórico-sociais e culturais (a partir do que ocorre a sistematização da história da pedagogia) e que, passaremos a tratar como um dos pilares indissociáveis dos Fundamentos Teóricos da Educação, por isso referir-se ao termo História da Educação como um primeiro elo deste processo é uma ação apropriada e coerente com as formas possíveis de ter acesso ao conhecimento produzido pela humanidade ao longo do tempo, não o principal ou mesmo que exista uma ordem hierárquica, antes como um dos componentes desta área de estudo que vem trazer um olhar diferenciado da educação

escolar, enquanto fenômeno que ocorre situados em

épocas e cujas convenções podem ou não perdurar condicionadas por sua validade social ou mesmo a instituição dessas. As práticas pedagógicas que se constituíram ao longo do tempo em distintas formas de organização devem ser consideradas como vetores de mão dupla: de um lado considerada o que os grupos humanos estabeleceram como educação até determinada atualidade e o que e onde se deseja chegar com novos encaminhamentos ou leituras da realidade, no que tange ao fenômeno educacional. As contribuições da Filosofia da educação A Filosofia da Educação como um dos pilares dos Fundamentos Teóricos da Educação possibilita ao educador um olhar diferenciado sobre os significados e sentidos da educação do homem e de sua condição no mundo. Neste sentido, há um olhar reflexivo intencional e recorrente sobre as práticas sociais que se desenvolvem ao longo do processo histórico-social, as relações que se travam entre os indivíduos e o papel do educador, como sujeito de intervenção no processo ensino-aprendizagem, orientado por, pelo menos, duas questões centrais: a) que homem formar ? (seus valores, sentido de pertinência, perspectivas, etc.) e b) para que sociedade ? ( o que a sociedade espera e o que o educador pode refletir para a superação ou não de anseios deterministas).


9 Com efeito, a Filosofia da Educação contribui para a reflexão filosófica do fenômeno educativo, pois tem uma sistematização na forma de tratar o objeto educacional. O olhar do educador, deve ser orientado, não pela intuição apressada de quem quer encontrar uma resposta breve problemáticas desenvolvidas no ambiente escolar, mas por, no mínimo, um tripé, representando a totalidade das dimensões da reflexão filosófica, a saber: radicalidade, rigorosidade e visão de conjunto. A este respeito Saviani (1987, p. 24) enfatiza: •

Radical: é necessário que o educador entenda as questões educacionais e suas problemáticas a partir de seus fundamentos, de sua raiz e delineie uma reflexão em profundidade.

Rigorosa: o rigor da reflexão filosófica está na necessidade de sistematização das questões levantadas por meio do método. Assim, é necessário que o educador conheça as diferenciações e ênfases tanto da sabedoria popular, quanto da ciência e manifestações pertinentes.

(Visão) de conjunto: o problema educacional deve ser analisado numa perspectiva de totalidade, isto é, estuda-se os contextos em que surgiu e os seus distintos condicionantes

e variantes sob uma perspectiva

considerada. Este tripé, como um dos encadeamentos dos Fundamentos Teóricos da Educação, contribui decisivamente para a transformação do professor, a medida que se esmera pela transformação de seus alunos. É na busca de uma postura indagativa sobre sua prática pedagógica à luz dos conhecimentos educacionais historicamente produzidos que o educador desenvolve a reflexão filosófica sobre a educação. Assim História e Filosofia da Educação se encadeiam de forma complementar, mas ainda não total na constituição do segundo elo dos Fundamentos Teóricos da Educação. Henri Giroux (1988, p.42), observa que o educador como intelectual transformador, numa perspectiva indagativa, deve colocar-se frente à algumas questões que ultrapasse a consideração da educação e do processo educacional como somente transmissão de conhecimentos, pois acredita num processo de ênfases e exclusões a partir do próprio educador e da escola: 1. O que é considerado conhecimento escolar ? 2. Como tal conhecimento é selecionado e organizado ? 3. Quais são os interesses subjacentes que estruturam a forma e o conteúdo do conhecimento escolar ? 4. Como é transmitido aquilo que é considerado conhecimento escolar ? 5. Como é determinado o acesso a esse conhecimento ?


10 6. Quais os valores e as formações culturais legitimadas pelas formas dominantes de saber escolar ? 7. Quais formações culturais são desorganizadas e tornadas ilegítimas pelas formas dominantes de saber escolar ? Knight (2001) enfatiza que a reflexão filosófica é indispensável no contexto das práticas educacionais, pois possibilita um intercruzamento de sua realidade à luz de três eixos que solicitam uma visão de conjunto: 1º) determinantes filosóficos, dentre os quais, as crenças metafísicas (estudo da natureza da realidade, o que é e como esta se apresenta em relação aos contextos por meio dos quais é considerada), as crenças axiológicas (ramos da filosofia que estuda os valores – a partir da questão: o que é valor, o que é de valor ? Quais e por que tais valores são eleitos e outros não são considerados valores para determinado agrupamento social ou povo) e as crenças epistemológicas (ramo de filosofia que estuda a natureza, recursos e validade do conhecimento – noutras palavras são e consideram a Teorias do conhecimento como fio condutor da reflexão filosófica); 2º) os fatores de mudanças contextuais – que reúne o estudo objetivos maiores dos contextos em que a escola e a educação estão inseridas: dinâmicas políticas, forças sociais, condições econômicas, expectativas familiares, valores defendidos e ideologias veiculadas, dentre outros e 3º) os temas educacionais que surgem e fundem com as práticas educacionais. Neste ponto todos os elementos que dizem respeito ao processo ensino-aprendizagem, de forma direta ou indireta são considerados entre eles: a função social da escola, a metodologia do ensino e a realidade educacional, a ênfase curricular – entre o oficial e o oculto, o papel e função do professor, a natureza do aluno enquanto sujeito que ensina-aprende.

As contribuições da sociologia da educação Um outro pilar indissociável dos Fundamentos Teóricos da Educação e Práticas Pedagógicas é a sociologia educacional. Teóricos educacionais problematizam a educação formal ou informal a partir da contribuição da sociologia.


11 A sociologia caracteriza-se como o estudo das interações sociais que ocorrem na vida em sociedade. As interações sociais acontecem por meio do contato e comunicação entre indivíduos/grupos e podem resultar modificações em seus comportamentos, quer em nível físico, cognitivo ou moral ou mesmo na forma de organizar e entender os processos sociais a partir do fato social. Os autores clássicos que contribuíram diretamente para o surgimento sociologia entendiam que a partir do estudo sistemático da sociedade, não haveria como entender o fenômeno sociológico a partir do senso comum, e sim a partir de evidências que própria realidade oferecia de forma velada ou desvelada. A sociologia da educação, como um dos pilares dos Fundamentos Teóricos da Educação e Práticas Pedagógicas, ocupa de um espaço de interconexão com outras áreas de conhecimento, buscando descrever ou explicar o fenômeno social em seu meio: econômico, cultural, social e neste sentido situa a ação pedagógica como objeto condicionado e condicionante das aspirações de determinada sociedade. Cabe-lhe entender as causas e as relações que orientam a educação em sentido amplo ou específico e como a escola lida com estas questões. Conseqüentemente, a sociologia da educação, traz ao educador a possibilidade de entender as relações que se travam no interior da escola, da comunidade extra-escolar e das políticas públicas que constituem o sistema escolar. Em se tratando da educação escolar a sociologia tem um papel relevante, uma vez que estuda os processos e condicionantes sociais relativos ao fenômeno educacional, por meio de métodos sociológicos específicos: experimentação, observação, comparação, questionário, entrevista, formulário, estudos de caso, etnografia, dentre outros. Dentre alguns pontos, que podemos identificar a sociologia da educação atua como um dos vetores centrais na formação do educador e que lhe traz pistas para uma ação pedagógica consistente e interdisciplinar enumeramos dez

que podemos observar no

quadro a seguir:

QUADRO 1 IMPORTÂNCI A DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO EDUCADOR 1.Possibilita a compreensão da vida social em si e os condicionantes interferentes,


12 2. Esclarece o processo educativo e as relações entre escola e sociedade a partir de dados e relações concretas, vivenciadas e em perspectivas, 3. Analisa a escola como grupo social de forma intrínseca e extrínseca, encaminhando questões que solicitam respostas, 4. Explica a influência da escola no comportamento e na personalidade de seus membros, a partir de uma leitura de sua realidade, 5. Estuda os padrões, as necessidades e solicitações de interação entre escola e demais grupos sociais da comunidade, 6. Analisa os sistemas escolares à luz dos sistemas sociais e políticas públicas, 7. Problematiza o papel da educação e educação escolar na sociedade e em seu desdobramento em todos os seus âmbitos 8. Propõe encaminhamentos para a consolidação de reformas educacionais a partir da leitura do real, 9. Propicia a leitura dos condicionantes e determinantes para a formação do educador numa sociedade que solicita um profissional transversal em educação, 10. Permite ao educador perceber que a educação não pode prescindir da leitura do contexto social para explicação e compreensão do fenômeno educativo e que só tem sentido numa perspectiva coletiva. Por esta perspectiva compreende-se que o

fenômeno educacional deve ser

problematizado na convergência do contexto histórico – movimenta-se no tempo e com o tempo; do contexto filosófico – pois remete à reflexão filosófica acerca da cosmovisão de educação para um grupo, para uma sociedade ou para o mundo; do contexto sociológico – uma vez que procura descrever ou explicar os fatos sociais e seus condicionantes que geraram ou impediram o desenvolvimento da educação e da educação escolar de um poço em sociedades situadas e um outro olhar que completa a unidade dos Fundamentos da Educação: o contexto psicológico - que centra como objeto o estudo dos comportamentos e processos de aquisição do conhecimento do indivíduo, identificando e encaminhando os elementos de intervenção para uma intervenção pedagógica intencional e sistematizada. A seguir este último contexto será objeto de discussão na próxima subseção.

As contribuições da Psicologia da educação A psicologia, a partir de seu status como ciência que se deu no final do século XIX, preocupa-se em estudar

os comportamentos e processos mentais na constituição da


13 identidade do indivíduo, ao longo de sua maturação orgânica e solicitação do meio. CóriaSabini (1988, p.8) observa que há uma variação no conjunto de comportamentos que um indivíduo pode apresentar, dificultando o estudo de questões específicas se, consideradas todas as possibilidades e áreas do conhecimento psicológico. Desta forma, a psicologia, seguindo a referência das demais ciências, estabeleceu-se por meio de especializações conduzindo à uma diferenciação de áreas no seio do conhecimento psicológico, por exemplo: a) área da aprendizagem: preocupa-se em estudar até que ponto o comportamento humano é determinado por eventos do meio ambiente, b) a área da motivação: identifica as forças que propulsionam a conduta humana, c) a área da cognição: estuda o processo de construção do conhecimento e da inteligência, d) a área da socialização: que trata da análise do processo de desenvolvimento das relações interpessoais e de como estas interferem n conduta do indivíduo.

A Psicologia escolar, neste sentido, orientada para o estudo do indivíduo enquanto ser que aprende, enquanto ser mobilizado pelas solicitações do meio que está inserido, por intermédio de diferentes escolas e abordagens sobre a Teoria do conhecimento e desenvolvimento (Behaviorismo, Neo-Behaviorismo, Gestalt, Psicanálise, Análise Transacional, Teoria de Jean Piaget, dentre outras), tornou-se ao longo do tempo, área indispensável à compreensão dos processos de ensino-aprendizagem aplicados à educação escolar e instrumentalização imprescindível à formação do educador no que tange ao processo de intervenção pedagógica. Dentre as escolas e abordagens da psicologia escolar que certamente contribuíram para a formação do educador, podemos citar os estudos que tiveram e ainda hoje tem por objeto as seguintes preocupações: 1. Homogeneidade e diferenças individuais no processo de aprendizagem

estudos que possibilitaram entender o indivíduo como ser único, não em bloco, como pressupunha a escola tradicional que defendia que todos os alunos tinham as mesmas competências e habilidades no desenvolvimento da inteligência 2. Amadurecimentos dos processos cognitivos ao longo das etapas do desenvolvimento do ser humano – variação das capacidades mentais de acordo com os estímulos do meio e maturação biológica. 3. O desenvolvimento da inteligência como uma possibilidade – teóricos da linh piagetiana, alicerçados no próprio Piaget, enfatizam que o desenvolvimento da


14 inteligência e dos processos cognitivos não podem ser caracterizados como potencialidades como uma plantinha que já está predeterminada para o desenvolvimento, mas como uma possibilidade de desenvolver-se condicionada pelo amadurecimento orgânico e estímulos do meio. 4. O papel da motivação e a satisfação das necessidades básicas do indivíduo no contexto de aprendizagem -

motivações intrínsecas e extrínsecas como

instrumento de desenvolvimento das aprendizagens na vida e na educação escolar. 5. Identidade e formação da personalidade do indivíduo: estudos sobre o desenvolvimento da consciência de si, da forma de agir, sentir e pensar do indivíduo em processo de desenvolvimento. 6. Inteligência emocional: a emoção como elemento que interfere no processo de aprendizagem e no ajustamento emocional. 7. O processo ensino- aprendizagem no espaço escolar : estudos sobre as maneiras distintas que podem ser exploradas situações de ensino-aprendizagem na escola e formas de encaminhamentos para motivação e interesse dos alunos. 8. Dificuldades de aprendizagem em situação escolar: estudo sobre os principais fatores que interferem no desenvolvimento da aprendizagem escolar e de como o professor pode encaminhar tais questões. 9. As inteligências múltiplas e a educação escolar: estudos sobre a complexidade das distintas inteligências discentes frente à solicitação e convenção da escola. 10. O relacionamento interpessoal no processo de socialização do indivíduo : o processo de socialização com a família, com grupos de amigos intra e extra-escola, a convivência com professores e demais atores sociais como contexto de formação e desenvolvimento da pessoa humana em situação de aprendizagem. Por abranger o estudo dos processos psicológicos do indivíduo, suas possibilidades e situações de aprendizagem ao longo de sua vida e da educação escolar, a Psicologia da Educação é o quarto elo imprescindível que orienta os Fundamentos Teóricos da Educação e Práticas Pedagógicas de maneira transversal, pois a totalidade do sujeito se inicia com a percepção de si e do mundo que o cerca.

Considerações finais


15 Estes encadeamentos possibilitam compreender o desenvolvimento da educação escolar a partir do pensamento pedagógico situado ao longo do tempo, bem como os elementos condicionadores que contribuíram para o seu desdobramento: a visão do homem como sujeito histórico; a natureza filosófica e sociológica de compreender e refletir a realidade, conhecimentos e valores construídos no mundo idealizado e vivenciado; e o desenvolvimento da visão sobre como o indivíduo aprende, como se desenvolve o seu conhecimento e se forma a sua inteligência, além de situar os elementos que dificultam a sua aprendizagem. Neste sentido, é possível compreender as práticas pedagógicas contemporâneas a partir de um olhar transversal sobre estes encadeamentos e de como contribuíram para a construção do pensamento e práticas pedagógicas da educação escolar. É necessário lembrar que tal leitura é a mais apropriada para a finalidade desta obra, sendo possível um olhar mais específico sobre a abrangência do foco que se queira explorar. Em trabalho anterior (Lima, 2000) enfatizamos a prática pedagógica como o termômetro que explicita, é mobilizada e mobiliza a realidade desenvolvida em sala de aula, revelando inequivocamente a relação de compromisso (ou sua falta) do educador para com seus alunos e do educador para com a educação. Notem que não usamos a palavra “envolvimento”, mas, “compromisso”, pois, a primeira denota um relacionamento superficial, “um entregar-se pela metade”, portanto, sem acreditar verdadeiramente em sua missão, em seus efeitos reais de transformação do homem e do mundo. O educador nesta perspectiva vai somente conformar-se pelo sentido da obrigação que a docência lhe acarreta. A segunda palavra, a qual pessoalmente temos preferência, infere

na ação

concreta de atuar de forma recorrente, consciente e intencional para a preservação, transformação ou superação dos valores que são convencionados ou em forma de gestação. Em sentido mais específico as práticas pedagógicas dizem respeito ao processo de intervenção na realidade educacional: maneiras de entender os contextos em que os conhecimentos são considerados e a ação do professor sobre a realidade escolar, de forma intencional e sistematizada. A prática pedagógica então, conceituada como processo de intervenção na realidade educacional (abrangendo o cotidiano de sala de aula em específico e a realidade da escola como um todo) deve ser exercida com um olhar articulado às bases epistemológicas do fenômeno educativo – como uma unidade e indissociabilidade do savoir-faire (saber-fazer) do educador comprometido, quer seja professor em sala de aula, da equipe do suporte pedagógico ou do corpo administrativo da escola.


16 Partindo da análise e interpretação de sua própria realidade, da reflexão-na-ação, observamos que a prática pedagógica propriamente dita, é uma das ferramentas do professor, que pode ser trabalhada através de iniciativas, de diversas leituras da realidade, e através do questionamento constante do professor sobre sua própria ação, entre outros pontos, mas nunca distanciada das contribuições dos bases epistemológicas da educação, ou como tratamos neste volume, dos Fundamentos Teóricos da Educação – que lhe dão sustentação nas suas maneiras de operacionalização. O ponto de partida e o ponto de chegada deste trabalho é propiciar ao educador, seja de quaisquer áreas do conhecimento que seja afiliado, a reflexão sobre bases da educação ao longo do tempo e as múltiplas faces em que as práticas pedagógicas foram se constituindo. Neste sentido, é necessário percorrermos a história da pedagogia situando os principais representantes ou autores clássicos do pensamento pedagógico. De forma transversal e para efeitos didáticos, consideraremos os pilares dos Fundamentos Teóricos da Educação e Práticas Pedagógicas em seu conjunto, fornecendo, se não todas, pelo menos as pistas principais para o entendimento do fenômeno educacional, seus condicionantes e suas formas de aplicação no âmbito da educação escolar.

Referências CÓRIA-SABINI, M.A. Fundamentos da psicologia educacional. São Paulo: Ática, 1988. GIROUX, H. Teoria crítica e resistência em educação: para além das teorias da reprodução. Petrópolis: Vozes, 1988.

KNIGHT, George R. Filosofia & Educação. 1.ed. Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2001. LIMA, Paulo Gomes et al. Caminhos da universidade rumo ao século XXI: pontos e estratégias para a sua orientaçào na visão de educadores. brasileiros. In Revista Paradigma (Maracay - Venezuela). , v.XXXI, p.09 - 52, 2000. LIMA, Paulo Gomes. Assim educarás a humanidade: tendências sociais, políticas e econômicas norteiam a forma como a escola educa o indivíduo. In Revista da Escola Adventista. Engenheiro Coelho/SP: 2º semestre de 2004, p. 10-11. PIMENTA, S.G. Pedagogia, ciência da educação ? São Paulo: Cortez, 1996.

SAVIANI, D. Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1987.


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