Desenho – ação em ensino Por Ana Lúcia Beck Uma pequena introdução Este texto traz algumas considerações sobre a prática do desenho e sua aprendizagem de acordo com o observado em alguns anos em que ministrei disciplinas de desenho. A observação do processo de aprendizagem dos alunos e alunas que comigo estiveram são pertinentes e exemplares para a reflexão sobre o potencial e as dificuldades da aprendizagem do desenho, dimensionando também o a disciplinas no âmbito mais largo do ensino. Estas reflexões originam-se portanto na observação da interação dos alunos com as propostas lançadas por mim, bem como da avaliação de sua produção, mas, principalmente a partir do diálogo estabelecido entre a turma no qual se explicitavam dificuldades, êxitos, dúvidas, traumas e alegrias. A título de prólogo, seguem assim 3 pequenas histórias verídicas. Cena 1: Regina chega à escola após uma caminhada de alguns quilômetros por estrada de chão batido. Em seu caderno, faceira, carrega um desenho feito no dia anterior. Na sala de aula, orgulhosa, mostra o desenho para sua professora. – Mas Regina, onde já se viram flores azuis?! Só na tua cabeça mesmo para existirem flores azuis! Regina com todo o orgulho ferido e mágoa possíveis para uma criança de sete anos, coloca o caderno embaixo do braço e, sem dizer uma palavra, ruma de volta à casa em meio ao período de aula. Em casa, sua mãe trabalhava no jardim quando vê Regina entrando pelo portão no meio da manhã. – O que houve Regina? A aula terminou mais cedo hoje? Regina relata o ocorrido à mãe que prontamente caminha até um canteiro do jardim onde corta três das suas raríssimas gérberas azuis. Volta, abre o caderno e coloca as flores azuis entre as páginas. Entrega o caderno à filha e lhe diz: – Volte agora mesmo à escola e mostre isto para a sua professora. Regina percorre todo o caminho de volta à escola e coloca o caderno, aberto com as flores azuis – as verdadeiras e as desenhadas – sobre a mesa da professora. A professora, sem dizer uma palavra, fecha o caderno e devolve-o à Regina. Jamais, disse o que quer que seja sobre o assunto. Regina contou-me este episódio de sua vida mais de 30 anos depois do ocorrido. Cena 2: Clara, orgulhosa, caminha até a professora e exibe seu desenho. – Mas Clara, diz a professora, teu desenho está errado! Está faltando o chão. Clara murcha. Inconscientemente, parece ainda escutar a professora a dizer: tu não sabes desenhar! Muitos anos depois, Clara é professora das séries iniciais. Seu aluno Guilherme, orgulhoso, lhe exibe um desenho. – Guilherme, teu desenho está errado; está faltando o chão! Guilherme, com toda a coragem de seus oito anos, olha firme para a professora e responde: – Mas professora, este é meu avô que está no céu! 1