Qual o futuro de nossas praças?

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Balneário Camboriú, 29 de janeiro de 2011

Especial

Qual o futuro de nossas praças?

A

Por Daniele Sisnandes

s praças, espaços de convivência, democráticos e uns dos poucos locais livres de edificações podem estar com os dias contados em Balneário Camboriú. Se os projetos desenvolvidos pela administração municipal saírem mesmo do papel, três das maiores e mais significativas praças de Balneário Camboriú mudarão muito e muito em breve.

Poucas são as crianças que brincam no parquinho montado na Praça Higino João Pio. Menos ainda são os aposentados que aproveitam a Praça da Bíblia para um jogo de dados. Abandonadas, as principais praças da cidade tornaram-se cenários de descaso e falta de manutenção do poder público municipal. Instaladas em áreas privilegiadas da cidade, a Praça Almirante Tamandaré, Higino Pio e

a Praça da Bíblia estão na mira dos processos licitatórios e das retroescavadeiras. No afã de construir projetos caros (digase de passagem), a prefeitura esquece do papel central que as praças desempenham (ou deveriam desempenhar): o da convivência da comunidade. Faltam projetos de incentivo à arte, à música, à troca de boas experiências. Falta a cultura de ter ali, um reino de cultura, com palcos para artis-

tas da terra, que só buscam um degrau para mostrar seu talento.

Exemplos Para encontrar modelos de sucesso não é preciso gastar muita gasolina. Em Itapema, a Praça da Paz consegue reunir centenas de moradores e turistas em eventos diversos, não só na temporada. É tudo gratuito, ao alcance de qualquer um, com arquibancadas

e espaço, muito espaço livre. Camboriú construiu um palco coberto e banheiros públicos com apenas R$ 72 mil, preservando cada figueira da sua praça centenária. Hoje é área nobre para novas e antigas gerações de artistas, perfeito para conversas de fim de tarde, cercado de barzinhos, lanchonetes e com a presença quase que constante da Polícia Militar. Já Itajaí, promove regularmente eventos na praça da Avenida Beira Rio, como campeonatos esportivos e até cedendo o espaço para terceiros realizarem shows gratuitos. Nada de fórmulas estapafúrdias, até porque simplicidade é a base para que

esse equipamento cumpra seu papel social de integrar.

Futuro O secretário de Planejamento, Auri Pavoni, garante que a prefeitura está atenta à questão das praças e que existem projetos de revitalização para as principais delas: Tamandaré, Bíblia e Higino Pio. Além disso, a intenção é construir uma nova praça, com mais de dois mil metros quadrados, com quadra poliesportiva, entre o Posto Shell e Rua 10. “Existe um projeto de construir mais de 15 academias adaptadas em praças da cidade”, afirmou. Fotos Daniele Sisnandes

Prefeitura já cogita alternativas à construção na Tamandaré A Praça Almirante Tamandaré é hoje o principal espaço para realização de atrações culturais gratuitas a céu aberto em Balneário Camboriú. Ao longo dos anos passou por mudanças, que a transformaram em ícone da cidade. Mas talvez, em um futuro muito próximo, o espaço dê lugar a um arrojado projeto arquitetônico, que já causou bastante polêmica, desde que foi anunciado pelo prefeito, Edson Renato Dias. O projeto prevê uma espécie de shopping, com investimento de cerca de R$ 10 milhões. O prédio teria três pavimentos, com cobertura que abrangeria toda a praça, além de dois restaurantes, chafariz de águas dançantes, espaço para artista solo e no terceiro piso, um auditório com vista para o

mar com capacidade para até 300 pessoas. Segundo o secretário de Planejamento, Auri Pavoni, depois da repercussão, o município resolveu aguardar para definir que tipo de mudança será feita no local. “Estamos trabalhando com três idéias, mas ainda não temos nada definido, apenas que alguma interferência será feita naquela praça”, salientou Pavoni. O secretário admitiu que o projeto inicial é polêmico e que causou as mais variadas opiniões, contudo, garantiu que assim que a prefeitura definir o modelo de construção, fará uma consulta à população. “Ainda não sabemos como isso vai acontecer, mas poderemos consultar de algum modo a comunidade para saber a opinião e até sugestões deles para o espaço”, afirmou.

Reprodução


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Praça Tamandaré precisa de Comerciantes e movimento, eventos e nfraestrutura moradores reclamam de medo e descaso Fotos Daniele Sisnandes

Para conseguir opiniões sobre mudanças na Praça Almirante Tamandaré, nada melhor que reunir sugestões de pessoas que convivem dia-a-dia acerca do local. Um desses exemplos é o comerciante João Carlos de Oliveira Toureiro, dono de uma banca de milho há 25 anos instalada em frente à praça. João conta como os comerciantes da região sentem bem o reflexo positivo de eventos. “Desde que tiraram o chapelão, ninguém fez mais nada nesta praça. Os primeiros dias em que o Papai Noel gigante foi colocado foi uma maravilha, porque o movimento cresceu. Só que depois de um tempo, as coisas ficam normais. Os turistas que vêm Reprodução

para cá querem festa, porque praia é música, diversão, alegria. Agora chegam aqui e não pode nada, sem falar de alguns moradores que vivem reclamando do barulho. Não queremos que atrapalhe e vá até tarde, mas um sonzinho até 22h não faz mal a ninguém, bem pelo contrário”, declarou João. João que ganha a vida atendendo turistas dá um show de criatividade quando o assunto é incrementar equipamentos para aumentar o fluxo de visitantes na cidade. “Nós ficamos com vergonha de mandar mulheres procurarem os quiosques para usar o banheiro, porque sabemos que é difícil manter aqueles locais limpos. Se querem cobrar pelo

serviço tudo bem, e eu acho que está certo cobrar, mas o turista não quer pagar para usar um banheiro sujo. Nós ouvimos reclamações sobre isso o dia todo. Fora que não existe lugares para os turistas lavarem os pés, nem padronização no espaço entre um quiosque e outro”, comentou. Para o proprietário de uma lanchonete instalada ao lado da Tamandaré, Álvaro Vargas, a idéia de construir um centro de vivências na praça parece positiva, porém ele faz algumas reservas. “A prefeitura precisa pensar nas coisas básicas, como instalar banheiros para os turistas. No Reveillon vi até uma mulher urinar no meio da rua, em pleno centro da cidade, porque nem banheiro químico tinha. Cansamos de dar informações aos turistas, porque não instalam um Posto de Informações aqui na praça?”, indagou Álvaro. Já para o dono de uma loja de roupas, Marcus Saraiva, o que o local precisa é de mais atenção dos agentes de trânsito. “Ficamos sentados aqui meia hora e vemos cenas assustadoras de falta de consciência tanto de pedestres como de motoristas”, opinou.

Centro das atenções desde a década de 70 A Praça Almirante Tamandaré foi criada em 1969 pela Lei 113. Seu nome também foi definido no mesmo ano, sob a administração do prefeito Álvaro Antônio da Silva e pela influência do período militar, recebeu o nome do Marquês de Tamandaré, membro do Conselho Naval Superior e

ministro do Supremo Tribunal Militar. Em 1974, a administração do prefeito Gilberto Américo Meirinho recebeu de uma construtora chamada Âncora, mais terras para a construção da Tamandaré. Em troca, a incorporadora ficou cinco anos sem pagamento de impostos.

Projeto é revitalizar Praça da Bíblia Reprodução

O projeto reservado para a Praça da Bíblia transforma totalmente o largo e abandonado espaço atual em um local de muita interação. O secretário de Planejamento, Auri Pavoni, explicou que a intenção é lançar a licitação da revitalização nos próximos dias. Se tudo ocorrer dentro do esperado, as obras iniciam ainda em 2011.

“Vamos reformular toda a praça. Trocaremos o paver do calçamento por outro tipo de piso e vamos reaproveitar o paver em calçamentos no bairro São Judas Tadeu. A idéia é incrementar a arborização do local e construir um coreto”, listou Pavoni. Também foi prevista a construção de uma academia para

terceira idade, bancas fechadas para os artesãos que hoje trabalham na vizinha praça Higino Pio. Agora a prefeitura estuda a possibilidade de reservar um espaço para os integrantes do projeto Economia Solidária, da Secretaria de Desenvolvimento e Inclusão Social. “Propomos a construção de uma espécie de oca, um local onde os índios pudessem vender suas mercadorias, mas não conseguimos entrar em um acordo. Na verdade eles não querem ficar nas praças”, revelou. A obra está orçada, conforme o secretário de Planejamento, em R$ 1,1 milhão.

Entre os moradores e estabelecimentos comerciais das redondezas da Praça da Bíblia, as reclamações se multiplicam e por motivos diversos. Para a podóloga Lisa Morais, falta consciência dos moradores e segurança por parte das autoridades. “Temos que fechar o salão mais cedo por medo de assaltos ou algo assim. Além disso, a higiene da praça deixa muito a desejar. Tem locais de concentração de água, que estão há dois meses do mesmo jeito e ninguém faz nada. E a dengue? Além disso, o local se tornou banheiro para cachorros”, disse Lisa. Para ela, o policiamento poderia ser mais efetivo naquela região, porque ao entardecer, o local fica forrado de pedintes e “cuidadores de carro”. “A praça tem policiamento só de vez em quando e eles só passam com a viatura. Não param, não ficam aqui durante o dia. É um espaço muito mal aproveitado. Por

que não trazem os vendedores de produtos orgânicos, que estão aglomerados naquela feira da Rua 200?”, questionou. Já a moradora Elaine Vieira alerta para o potencial da Praça da Bíblia para a realização de eventos. “Um espaço tão bom e não tem nada, raramente vemos algum evento, fora que é um local sem árvores, feio”, comentou. O proprietário da Corretora Maxim e vizinho da Praça, Orli Roque, lamenta do tratamento que é dado ao local. “À noite a bagunça corre solta nesta praça, em algumas noites nem acender as luzes eles acendem. Precisamos de mais policiamento, porque os moradores estão com medo até de entrar com os carros na garagem. Aqui no prédio já entraram umas três vezes, subiram até a caixa d’água para fazer arruaça e quebraram vidros de uma loja que dá de frente com a praça”, enfatizou o empresário.


18 Especial Idéia é tornar a Higino Pio na Praça da Família Balneário Camboriú, 29 de janeiro de 2011

Fotos Daniele Sisnandes

A Praça Higino João Pio, criada em 1976, pela Lei 358, ainda é uma das poucas, senão a única, praça arborizada do centro de Balneário Cambo-

riú. Localizada na Avenida Alvin Bauer, entre Avenida Atlântica e Brasil, o local recebeu a sombra dos prédios como vizinha, barzinhos, uma

vida noturna agitada e hoje, padece pela marginalidade constante. Em temporadas anteriores, a Higino Pio foi palco de

shows e apresentações culturais, mostra de dança teatro, mas no verão 2010/2011 não recebeu nenhuma atenção da Fundação Cultural. A reportagem entrou em contato com a Fundação, para questionar o presidente Eduardo Meneguelli sobre a falta de atrações e desatenção aos artesãos que ali atuam, mas o responsável estava de férias. Para o secretário de Planejamento, Auri Pavoni, a intenção é tornar a Higino Pio a praça da família. “Queremos instalar brinquedos bons para que as famílias possam levar suas crianças e animais sem medo. Trocaremos o piso por uma espécie de revestimento emborrachado, semelhante ao usado em shoppings centers”, adiantou.

O Planejamento também procura viabilizar um cicloparque e local para que as pessoas possam deixar suas bicicletas. “Isso não existe atualmente no centro da cidade”, pontuou. A idéia do estacionamento subterrâneo ainda não foi descartada, mas a pasta estuda a possibilidade de construir pavimentos para aliviar a falta de vagas no centro da cidade. Uma necessidade de extrema urgência com estacionamentos na redondeza da Praça Higino Pio cobrando R$ 8 por hora de carros de passeio e R$ 10 de camionetes. Sobre a segurança do local, o secretário garantiu que o problema será resolvido assim que os guardas municipais assumirem o monitoramento dos espaços públicos.

Comerciantes indignados por falta de segurança

Para moradores e empresários, a Praça Higino Pio não passa de um local de concentração de marginais, reflexo de uma insegurança crescente e da falta de investimento em tecnologia para monitorar os espaços. Essa praça é uma vergonha, até porque se trata de um espaço de classe alta da cidade. Na temporada, a prefeitura melhora a atenção a ela, mas

e no inverno? Você enjoa de ligar para a polícia, mas ninguém vem. Andarilhos e até mulheres usam essa praça e as bancas dos artesãos como banheiro e cama. Já presenciamos várias cenas de sexo explícito de pessoas aqui nessas barracas”, conta a proprietária de um estabelecimento na praça, que preferiu não se identificar. Ela relatou à reportagem que

já presenciou muitas pessoas, inclusive de ‘boas famílias’, usando bebida e drogas nas tendas dos artesãos. Além disso, ela reclama da falta de apoio da prefeitura. “No nordeste é muito comum ver barzinhos em praças. Eles colocam mesas por todo o espaço, contratam músicos e aquilo acaba sendo um atrativo a mais para a cidade e um lucro extra para quem investe em negócios em Balneário Cam-

boriú”, contou a empresária, que está na cidade há apenas três anos. Seu marido também reclama e conta que clientes já deixaram o local ao entardecer, por causa do surgimento de andarilhos. “Se aqui fosse instalado um posto como existe na Tamandaré isso não aconteceria”, garantiu. Para a bioquímica Lisiane Cegatto, o abandono da

Higino Pio se reflete na qualidade de vida de sua filha, já que este é o único local onde existe um parquinho, onde a menina poderia brincar. “É uma pena que esteja desse jeito. A praça até é bem conservada, mas o parquinho é limitado, poderiam colocar mais brinquedos ou melhorar a limpeza, já que sempre tem bitucas de cigarro e tampas de garrafa na areia”, declarou.


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