Observatório Paranal

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Balneário Camboriú, 2 de julho de 2011

Especial

Observatório Astronômico Paranal Um monumento à genialidade humana Por Ike Gevaerd Fotos Ike Gevaerd

O deserto com o observatório Paranal ao fundo no canto esquerdo. A foi tirada do observatório inglês Vista.

Divulgação ESO

Imagens das Nebulosas Helix e Carina obtidas usando o Wide Field Imager a partir dos observatórios do ESO (European Southern Observatory).

Procurando Outros Mundos 14 de junho, 9 da manhã, San Pedro de Atacama, norte do Chile, me preparo para viajar pouco mais de 300 km pelo deserto em direção ao litoral, ao Cerro Paranal, onde está localizado o maior observatório do planeta. Após atravessar o deserto, passando por Calama e Antofogasta, chego no horário marcado, 14 horas, ao portão de controle do complexo astronômico. Bem recebido, e já sendo esperado por Laura Ventura, do Departamento de Educação e Difusão do ESO, sinto uma forte vibração de estar num lugar onde se procura planetas fora do nosso Sistema Solar e se existe vida em outros locais do Universo.

Estrada que leva ao observatório.

ESO (European Southern Observatory) A organização Observatório Europeu do Sul, possui as melhores instalações em nosso planeta para o desenvolvimento de observações, pesquisa e estudos sobre o Universo. Com sua sede administrativa e técnico científica localizada perto de Munique, na Alemanha, e um escritório central em Santiago, no Chile, ela opera três observatórios no Deserto de Atacama. O La Silla, a 600 km ao norte de Santiago, o ALMA, em construção perto de San Pedro de Atacama e o Paranal. ESO é uma organização financiada por países europeus (Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Itália, Holanda, Portugal, Reino Unido, República

Tcheca, Suécia e Suíça) e desde dezembro do ano passado, o Brasil. A organização emprega cerca de 700 pessoas em seus observatórios e centrais administrativas e técnico científicas.


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A Residência Hotel ESO integrada na paisagem Depois das apresentações, Laura me encaminhou para a Residência Paranal, um hotel onde são hospedados os astrônomos, cientistas, engenheiros, técnicos, enfim as pessoas que operam o complexo astronômico e os visitantes convidados, como este escriba. Trata-se de um oásis plantado e escondido no meio do deserto inóspito e extremamente seco, projetado pelo escritório de arquitetura alemão Auer+Weber+Architekten, e construído em 2003. Quando se chega, avista-se apenas uma cúpula de policarbonato perdida no meio da areia, mas ao descermos uma rampa, entramos em um ambiente climatizado e nos deparamos com um jardim tropical e uma piscina. A temperatura dentro da residência gira em torno de 20 graus e a umidade do ar fica em 35%, no exterior de dia, calor de um deserto e à noite um frio quase que polar. O jardim, formado por palmeiras e outras plantas tropicais, está localizado abaixo da cúpula de 35 metros de diâmetro, que é automaticamente vedada de noite para que a luz não interfira nos

Fotos Ike Gevaerd

Fachada externa combinando com o deserto.

trabalhos desenvolvidos no observatório. Fui encaminhado a um dos 120 apartamentos que compõe o hotel, que é equipado também de uma cantina, restaurante 24 horas, sala de música, biblioteca, galeria de fotografia e um fitness center, que proporcionam conforto e tranqüilidade aos seus hóspedes. É praticamente impossível a prática de qualquer atividade de lazer fora do edifício de quatro andares de cor minimalista e integrado a paisagem desértica, que serviu de cenário em 2008 para locações do filme de James Bond, 007 – Quantum of

Solace. Devidamente instalado fui para o restaurante, quando me foram repassadas as normas de segurança a ser acatadas no complexo durante a minha visita. No entorno da residência hotel, existem: um acampamento de modernos containeres que serve de alojamento para os contratados prestadores de serviços gerais, um ginásio de esportes, central de produção de energia, ambulatório, enfim o todo necessário para proporcionar conforto e qualidade de vida aos que habitam o complexo.

Jardim tropical no meio do deserto.

Observatório Paranal e seus VLTs (Very Large Telescope) Laura Ventura

Antu, Kueyen, Melipal e Yepun, os quatro VLTs

Os quatro telescópios auxiliares dos VLTs.

Instalado no topo do Cerro Paranal, a 2600 metros de altitude, é formado por um conjunto de quatro telescópios VLT – Very Large Telescope, os mais potentes da astronomia neste início de século. Eles são conhecidos por

Antu, Kueyen, Melipal e Yepun, que significam respectivamente, Sol, Lua, Cruzeiro do Sul e Venus na língua Mapuche, um povo nativo chileno. O VLT1 Antum entrou em funcionamento em 1999.

Nossa visita ao observatório começou pelo local onde estão instalados os VLTs, que são edifícios compactos, climatizados e que se movem de forma sincronizada com os telescópios. A primeira impressão que temos ao observar o conjunto de telescópios é o de que estamos dando início a uma viagem interplanetária, tal a paisagem monumental formada. Passada a primeira emoção, Laura continua a dar as explicações de como tudo funciona, tendo como cenário um final de tarde com o nascer da lua cheia. Cada VLT tem um espelho principal com 8,2 metros de diâmetro e mais quatro telescópios auxiliares com espelhos de 1,8 metros.

Viva a resolução.

Ike Gevaerd se preparando para entrar no Kueyen, o VLT 2.

A precisão dos telescópios VLT é 25 vezes maior que a dos seus auxiliares. Os VLTs tanto podem ser utilizados individualmente, em conjunto ou em grupo de dois ou três, que captam imagens processadas num gigantesco interferômetro. Estas imagens correspondem a observar objetos quatro bilhões de vezes com mais precisão que a olho nu. Para que possamos ter uma idéia, um VLT é capaz de proporcionar a observação distinta de dois faróis de carro na Lua. Depois sou conduzido ao interior do VLT 2, o Kueyen, onde observei os movimentos dos telescópios se preparando para mais uma investigação. Sem fazer praticamente nenhum

ruído, toneladas de equipamentos se movem acompanhando a abertura da cúpula que possibilitará a observação de outras galáxias. O resultado destas investigações proporciona a média de uma publicação científica por dia. Seguimos então para o interior do Observatório onde estão localizadas as estações de trabalho dos astrônomos, engenheiros, operadores, pesquisadores enfim, vamos ao local de trabalho dos que operam aquele monumento, a genialidade humana. Viva a Resolução, assim está escrito num cartaz com a foto do Che Guevara, colado na porta da primeira estação de trabalho que avisto.


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Especial

Dimitri Gadotti – Um Astronomo Brasileiro no Maior Observatório do Planeta Terra Fotos Ike Gevaerd

Dimitri Gadotti, em sua estação de trabalho.

Filho de catarinenses, o pai Moacir Gadotti é de Rodeio e a família da sua mãe, Clara Orzechowski, é de Massaranduba. Paulistano de 38 anos, Dimitri se formou em Física na USP, onde também fez mestrado em astronomia, foi para o Observatório de Marselha na França onde ficou um ano, e depois para o Instituto Max Planck de Astrofísica na Alemanha.

Hoje faz parte do pequeno e seleto quadro de astronautas que trabalha no observatório, que fica a 12 km do litoral norte do Chile, é funcionário contratado por quatro anos, passíveis de renovação. Trabalha 80 noites por ano no observatório, o que dá uma média entre 7 e 10 noites por mês, começa a trabalhar às 18 horas até às 7 da manhã do outro dia. Está

entusiasmado com a entrada do Brasil para o grupo de países membros do ESO, o Ministério de Ciência e Tecnologia assinou o contrato formal de adesão em dezembro do ano passado e aguarda apenas a confirmação do nosso parlamento. É o primeiro país não europeu a fazer parte da organização. Esta é primeira vez que Dimitri

concede uma entrevista a um órgão de imprensa em sua estação de trabalho no Observatório Paranal, antes apenas a CNN o entrevistou no escritório central em Santiago, onde mora e trabalha nos outros dias em que não está no Cerro Paranal. Gadotti, um pesquisador das galáxias do Universo, orienta também estudantes de doutorado e, a partir da sua estação de trabalho em Paranal, recebe projetos de astrônomos selecionados por um comitê do ESO. Recebido o projeto aponta o telescópio para a estrela ou planeta definido, verifica se está alinhado e então prepara o instrumento para receber as informações provenientes de bilhões de anos luz. Alinhado o telescópio envia as observações ao operador que trabalha ao seu lado que observa se os procedimentos estão corretos. Chega-se ao resultado pretendido, ajustam-se as informações e estas são encaminhadas ao astrônomo pesquisador em seu local de trabalho, neste caso na França, pois é uma pesquisa de um astrônomo francês, que estuda a morte de uma estrela, semelhante ao nosso Sol, e com

isto ele continua suas investigações. A utilização de cada segundo em um dos quatro telescópios custa $1 euro. Para Gadotti, a astronomia brasileira já está bem desenvolvida, mas pode melhorar. Tem que haver um apoio maior do governo brasileiro no sentido de promover parcerias entre as universidades e a indústria e considera arcaico o processo de seleção das universidades brasileiras para a contratação de profissionais da área. Considera que no Brasil as questões ligadas à astronomia estão centralizadas em São Paulo, e isto deveria mudar, com investimentos em outras áreas do País. 80 noites por ano fora de casa e longe da namorada não interferem no orgulho e felicidade que transmite, quando fala sobre estar trabalhando no ESO. Dimitri torce para que o nosso parlamento aprove a entrada do Brasil neste seleto grupo que se dedica a viajar entre estrelas e planetas para conhecer e compreender cada vez mais o Universo que nos cerca.

Aprender a escutar o silêncio Ao sair do interior do Observatório, deparamos com uma lua cheia estrategicamente posicionada entre os telescópios, finalizando com chave de ouro a visita. Percorremos a estrada que nos levaria até o hotel com os faróis do carro apagados, para não interferir no trabalho dos astrônomos. Após o jantar, fui caminhar sob a luz das estrelas e da lua, no meio do deserto, pois ali é o melhor lugar para aprender a escutar o silêncio, como me disse Laura.

Laura Ventura, a astronôma que nos apresentou o observatório.


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