A mudança do eixo da produção mundial - OpCP08

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Opiniões

CELULOSE, PAPEL jun-ago 2007 & FLORESTA

Opiniões sobre a mudança da produção mundial

jun-ago 2007

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OpiniĂľes

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OpiniĂľes jun-ago 2007

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Índice

Opiniões

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A mudança do eixo da produção mundial de celulose e papel do hemisfério norte para o sul do planeta 05, José Luiz Stape Editorial de Abertura da Edição A expansão florestal no hemisfério sul

29, Carlos Marx R. Carneiro Oficial Florestal Principal FAO/ONU

06, Yeda Rorato Crusius Governadora do Estado do Rio Grande do Sul

32, José Vicente Ferraz Diretor Técnico da Agra FNP Pesquisas

08, Osmar Elias Zogbi Diretor da EAZ Participações

33, Ivan Tomaselli Diretor de Desenvolvimento da STCP

10, Nelson Barboza Leite Gerente do Programa Nacional de Florestas do MMA

34, João Cordeiro Vice-President da Pöyry Consulting - Finlandy

12, João Fernando Borges Diretor de Desenvolvimento da Stora Enso Latin America

36, Antonio Tadeu Giacomet Diretor Comercial da Braspine Madeiras

14, Vanderlei Madruga Diretor Geral da Bahia Pulp

37, Nestor de Castro Neto Presidente da Voith Paper

16, Máximo Pacheco Presidente da International Paper

40, Carlos Alberto Farinha e Silva Vice-Presidente da Jaako Pöyry Tecnologia

18, José Paulo Unterpertinger Gerente de Operações da Forestal Oriental do Uruguai

41, Fábio Luis Brun Diretor da ArborGen

20, Jorge Ivan Correa Diretor Corporativo da Florestal Masisa - Chile

44, Alfredo Kingo Oyama Homma Pesquisador da Embrapa

22, Amantino Ramos de Freitas Presidente da SBS

45, Francides Gomes da Silva Júnior Professor da Esalq-USP

24, Germano Aguiar Vieira e Jedaias Salum AMS

46, María Cristina Area Professora da Universidad Nacional de Misiones - Argentina

26, Fernando Raga Castellanos Vice-Presidente da Corporación Chilena de la Madera

48, Antonio Rioyei Higa Professor da Universidade Federal do Paraná

28, Alberto Mori Presidente da ABTCP

49, Gladys Mogollón Professora da Universidad de los Andes, Venezuela

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Editorial

Opiniões jun-ago 2007

José Luiz Stape

Professor do Departamento de Ciências Florestais da Esalq-USP A expansão florestal no hemisfério sul

A expansão florestal no hemisfério Sul está cada vez mais apoiada nos conhecimentos científicos sobre os “ecossistemas” de plantações florestais e suas interrelações ambientais e sociais Foi-se o tempo em que “expansão florestal” significava apenas o plantio de mais árvores num projeto, fazenda ou área. Hoje, o termo invoca uma série de premissas associadas à produtividade florestal, num primeiro momento, mas se seguindo, imediatamente, os aspectos da sustentabilidade econômica, ecológica e social do empreendimento, dentro das especificidades de cada região. A produtividade continua a ser o principal norteador de localização dos distritos florestais, porque possibilita a produção da matéria-prima madeira, componente principal do produto final celulose, com garantia de suprimento e baixos custos de produção, em função das economias de escala, em nível de talhão (alta produção por hectare) e em nível de região (grande quantidade de hectares manejados conjuntamente). Vários países do hemisfério Sul, como Brasil, Chile, Uruguai, Argentina, África do Sul, Congo, Indonésia e Nova Zelândia, dentre outros, possuem regiões edafoclimáticas aptas, ou mesmo ideais, para o desenvolvimento de espécies florestais com alta produtividade. Dentre estas, destacam-se aquelas dos gêneros Eucalyptus e Pinus, tanto nas regiões tropicais (E.grandis, E.urophylla, E.pellita, P.caribaea) como nas subtropicais (E.grandis, E.saligna, E.globulus, E.dunnii, P. taeda, P.elliottii, P.radiata).

No caso brasileiro, um amplo estudo da produtividade das florestas de Eucalyptus do setor papeleiro, através das Parcelas Gêmeas de Inventário (www.ipef.br/ppgi), mostrou um valor de 42 m³/ha/ano, e identificou que, através de melhores práticas de manejo, esta produtividade pode subir ainda para 55 m³/ha/ ano. Este valor médio geral do setor é de 3 a 6 vezes superior às produtividades médias no hemisfério Norte, onde predominam as áreas de clima temperado e subtropical. No entanto, a produtividade per si não é mais o único fator a ser analisado numa decisão estratégica de grandes empreendimentos, sendo de alta relevância, na sociedade atual, o know-how e o embasamento científico dos manejos adotados, de forma que na sociedade local e internacional haja transparência das práticas de manejo e seus controles, bem como das interrelações sociais. Assim, as amplas áreas de florestas plantadas passam a ter status de um “ecossis-tema”, requerendo seu profundo conhecimento científico, não só da produção de madeira, mas também do uso dos recursos naturais que necessita ou influencia, como água (quantidade e qualidade), solo (conservação e nutrição), luz e biodiversidade (no contexto da paisagem). Novamente, vários países do hemisfério sul mostram-se adequadamente desenvolvidos nestes quesitos socioambientais, como é o caso do Brasil, África do Sul e Nova Zelândia, por exemplo. Pesquisas, que até duas décadas atrás só se realizavam no hemisfério Norte, em países desenvolvidos, hoje são amplamente difundidas e utilizadas no setor florestal do hemisfério Sul, destacando-se as pesquisas genéticas de melhoramento, hibridação e genômica (Genolyptus www.embrapa.br), nutrição e manejo florestal (www. ipef.br/ptsm, www.sif.org.br/nutree), ecofisiologia florestal (Produtividade Potencial do Eucalyptus e do Pinus, www.ipef.br/bepp e www.ipef.br/ pppib), proteção florestal (www. ipef.br/protef, www.ufv.br/dfp) e seqüestro de Carbono (www.ipef. br/euc-flux, www.floresta.ufpr.br/ fupef), dentre outras.

Assim, explica-se o porquê da realização de eventos mundiais sobre Florestas Plantadas no hemisfério Sul, como o Congresso Florestal Mundial na Austrália, em 2005, e os próximos Simpósios sobre Produtividade e Sustentabilidade de Florestas Plantadas, em Outubro de 2007, na África do Sul, e em Novembro de 2008, no Brasil. Tal gama de conhecimentos, associada a práticas operacionais de conservação de solo e água, vêm possibilitando a crescente certi-ficação das plantações florestais nos países do hemisfério Sul, atestando a idoneidade e compromisso dos empreendimentos com as regiões em que atuam. Além disso, há de se destacar que uma crescente parcela das florestas plantadas no hemisfério Sul está sendo realizada junto a pequenos e médios proprietários rurais, aumentando ainda mais as opiniões e interesses, acerca dos temas florestais. A estes novos silvicultores, faz-se necessário o rápido repasse não só dos ganhos técnicos das florestas plantadas, mas também da consciência ambiental que com ela evoluiu, para que o produtor não seja apenas um plantador de árvores, mas, além disto, um gestor do seu ambiente rural. Finalmente, não queremos deixar aqui a falsa idéia de que as relações entre os empreendimentos florestais e as suas regiões de influência estejam totalmente equacionadas, mas sim de que há competência científica cada vez maior para que os pontos de divergência sejam tecnicamente apresentados e debatidos por toda a sociedade, levando-se em consideração as particularidades locais. A capacidade do hemisfério sul, com seus mais de vinte milhões de hectares de florestas plantadas, em atrair novos investimentos, aumenta a nossa responsabilidade (profissionais, produtores, investidores, legisladores, órgãos governamentais, educadores e cientistas), em saber localizar e gerir tais plantios, para atender esta complexa sociedade local-regional-global, em relação aos bens que demanda hoje, sem se descuidar dos bens que possa vir a demandar no futuro.

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Opiniões

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Visão Estratégica Yeda Rorato Crusius

Yeda Crusius

Governadora do Estado do Rio Grande do Sul Investimentos na base florestal ajudam o desenvolvimento

As cadeias produtivas de base florestal, destacando-se papel e celulose, têm sido fontes de boas notícias para os brasileiros, desde o final dos anos 80, quando passaram a crescer, em maior velocidade, os investimentos setoriais no Hemisfério Sul. Encerrou-se, assim, o longo ciclo virtualmente monopolístico dos empreendimentos localizados no Hemisfério Norte e que tivera início na Revolução Industrial, em meados do século XIX. São numerosas as razões que provocaram essa mudança, mas algumas das mais importantes são as seguintes: a) produção de matéria-prima em volume e prazos adequados; b) áreas disponíveis para a expansão do plantio de florestas; c) mão-de-obra adequada; d) enorme potencial de crescimento no consumo de produtos industriais da base florestal. Esse movimento estratégico estimulou a implantação de um parque produtivo de celulose e papel no Brasil, que se abastece exclusivamente em florestas plantadas. Por isso, segundo a Bracelpa, em 2005, as florestas plantadas de eucalipto e pinus superavam 5,2 milhões de hectares (3,4 milhões de hectares de eucalipto). E é bem provável que, em 2007, as florestas plantadas no Brasil ultrapassem os 6,2 milhões de hectares, com possibilidades de continuar crescendo, nos próximos anos. E a necessidade de matéria-prima também cresce. Em 2005, o país produziu 10,3 milhões de toneladas de celulose e 8,6 milhões de toneladas de papel. Em 2007, é bem possível que a produção de celulose alcance 12 milhões de toneladas e que a produção de papel venha a ser maior que 9 milhões de toneladas.

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Quer dizer: o Brasil conta com uma floresta que assegura crescente crédito de carbono; ganha novas florestas nativas e garante supervisão de enormes reservas naturais com as respectivas faunas, sob a responsabilidade da indústria do setor; gasta cada vez menos com a importação de celulose e papel (embora ainda despenda mais de US$ 1 bilhão/ano); e obtém uma receita de mais de US$ 4 bilhões/ano, com a venda de papel e celulose para o exterior. O Rio Grande do Sul pretende participar ativamente desse processo expansionista e, por isso, centenas de empresas e milhares de cidadãos gaúchos estão se integrando aos negócios da base florestal. As florestas plantadas do estado, que ocupavam menos de 300 mil hectares em 2003, podem ultrapassar o patamar de 700 mil hectares até 2010. E as próprias empresas florestadoras devem plantar, nesse mesmo período, adicionalmente, perto de 300 mil hectares de florestas nativas e perenes, devolvendo ao ambiente natural parte do que a exploração predadora do passado fulminou. Ademais, estão previstos investimentos industriais de empresas locais e de novos investidores para a produção de celulose e papel, MDF e aglomerados, cavacos e tanino (a partir da acácia) e de madeira para móveis e construção civil, de mais de US$ 6 bilhões, nos próximos anos, o que resultará na criação de mais de 50 mil empregos diretos e indiretos, sem contar a integração da floresta com agricultura e pecuária, que representará oportunidade de vida melhor para muitos pequenos produtores rurais. E mais: as novas florestas gerarão crédito de carbono suficiente para neutralizar a emissão de toda a população estadual - mais de dez milhões de habitantes, atendendo até mesmo os mais exigentes defensores do meio ambiente. Finalmente, é preciso destacar que essa indústria que, de forma crescente, está transferindo investimentos para o Brasil, sabe muito bem o que está fazendo. De fato, a despeito de todo o crescimento produtivo dos últimos

anos, o consumo aparente de papel no Brasil é de apenas 41,4 kg por habitante por ano, abaixo da Argentina e Chile (50,5 kg e 68,3 kg, respectivamente), por exemplo, e verdadeiramente ínfimo diante do consumo dos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Japão, Alemanha e Canadá (300,6 kg; 246,8 kg; 232,7 kg; e 225,3 kg, respectivamente). Ou seja, trata-se de um mercado praticamente incipiente. Naturalmente, o governo do estado vê com muito bons olhos a vinda de investidores desse setor, especialmente na região da Metade do Sul. Mas, estará atento para que a produção industrial de celulose e papel não prejudique o meio ambiente e a qualidade de vida de nosso povo. É de se esperar, assim, que os empresários que estão realizando grandes investimentos para a expansão produtiva estejam imbuídos da responsabilidade social e ambiental necessárias para investir os recursos, a fim de que as plantas industriais utilizem sempre equipamentos antipo-luição, que estejam dentro do mais rigoroso estado da arte, em termos mundiais. Os mesmos cuidados precisam ser dedicados às florestas plantadas para corte, e também às nativas, para assegurar a sobrevivência da fauna e da flora regionais. A palavra adequada para o desenvolvimento das cadeias produtivas de base florestal é sustentabilidade. E como definiu o relatório Brundtland, documento fundamental para a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento (CNUAD), realizada no Rio de Janeiro, em 1992, “o desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades”. E isso exige, por parte das empresas, não apenas a adoção das melhores técnicas, mas, também, a realização de periódicas e rotineiras avaliações, divulgadas com responsabilidade e transparência, a respeito dos possíveis efeitos de seus projetos sobre os seres humanos, animais, plantas, recursos hídricos e o ar que todos respiram.


OpiniĂľes jun-ago 2007

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Visão Estratégica

Opiniões

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Osmar Elias Zogbi

Diretor da EAZ Participações

Osmar Zogbi

Brasil: destino preferencial para o setor de celulose e papel A globalização vem transformando a realidade do planeta, em diversas esferas. No âmbito empresarial, seu traço distintivo é a busca incessante por redução de custos, conjugada com a melhoria da qualidade e, logicamente, da produtividade. Buscar oportunidades globais tornou-se uma questão de sobrevivência. E já não basta uma economia baseada apenas em baixo custo. É preciso mostrar competitividade, seja nos produtos, seja no ambiente de negócios. Diversos segmentos da indústria vêm crescendo em produtividade e ampliando suas margens de lucro, na medida em que descobrem vantagens competitivas em países que não os de origem e nos quais podem atuar, mediante suas filiais e parcerias. É assim que grandes corporações passaram a atuar num cenário de gestão, em nível global. No setor florestal, mais especificamente na indústria de celulose e papel, não é diferente. Nos últimos anos, assistimos o movimento de grandes fusões e ampliações de empresas, para crescerem de forma coordenada e atenderem aos apelos mundiais pela preservação ambiental. Isso inclui a preocupação com a origem do insumo básico do setor, ou seja, as florestas plantadas para fins industriais.

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Torna-se elemento imprescindível para as empresas, a localização de suas áreas florestais em regiões em que seja possível seu cultivo, aliado à preservação ambiental, e ainda ajudando a proteger recursos naturais não renováveis e proporcionando oportunidades de emprego e de geração de renda. Nesse contexto, o Brasil é o destino onde o custo de produção de florestas para fins industriais apresenta-se como dos mais atraentes. Descobriu-se no país um conjunto de vantagens competitivas, representadas por condições climáticas que favorecem o rápido crescimento das espécies cultivadas para esse fim, além do esforço permanente no desenvolvimento de modernas técnicas silvi-culturais e de manejo florestal. Essa soma de vantagens tornou o país um destino preferencial na mira dos grandes produtores de celulose, além de oferecer às empresas brasileiras condições de penetração no mercado global. Os investimentos realizados pela indústria brasileira de celulose e papel tornaram o país o maior produtor mundial de celulose de fibra curta de mercado. Desde 1990, a produção nacional passou de 1,4 para 7,7 milhões de toneladas/ano, superando, nesse tipo de celulose, a produção dos Estados Unidos. Tomando por base os indicadores da produção mundial de celulose de mercado, entre 1990 e 2005, é possível acompanhar a crescente participação do produto brasileiro. Em 1990, a América Latina foi responsável pela produção de 1,3 milhão de toneladas desse tipo de celulose, representando uma participação de 11,8% no mercado mundial. Do total latino-americano, o Brasil participou com 72%. Passados 15 anos, a produção latino-americana de celulose de mercado atingiu 6,8 milhões de toneladas, representando 30,1% da oferta mundial, dos quais a produção brasileira contribuiu com 89%. E, para 2011, a projeção para a América Latina é de 47% do mercado mundial. Outro dado que reforça a posição de destaque na performance florestal brasileira está ligado à produtividade das espécies plantadas. No caso da celulose de fibra curta de mercado,

seu insumo básico é a madeira de eucalipto, oriunda exclusivamente de florestas plantadas, em áreas anteriormente degradadas. Pois, no Brasil, cuja área cultivada com a espécie totaliza 1,6 milhão de hectares, a produtividade média registrou um crescimento de 34,5%, no período entre 1990 e 2005, atingindo um rendimento médio de 39 m³/hectare/ano. Some-se a isso, a preocupação do setor em garantir a sustentabilidade de seus processos. A indústria brasileira de celulose e papel possui a maior área de florestas certificadas entre os setores de base florestal no país, com cerca de 1,5 milhão de hectares. A certificação assegura a procedência legal, social e ambientalmente adequada da matéria-prima florestal, de acordo com as normas internacionais. Vale ainda lembrar que esse cultivo é um importante aliado na luta contra o aquecimento global, pois as florestas também ajudam no seqüestro de carbono. Além disso, as empresas do setor são responsáveis pela recuperação e preservação de 2,6 milhões de hectares de recursos florestais, que abrangem a totalidade das áreas de preservação permanente e de reserva legal, excedendo o exigido pela legislação ambiental brasileira. A conjugação desses fatores, mais os resultados consistentes que o setor tem apresentado, ano após ano, na balança comercial brasileira, e o respeito que seus produtos conquistaram no mercado internacional, reafirmam a vocação brasileira para assumir a liderança no segmento florestal. O setor de celulose e papel já se encontra reconhecido como altamente competitivo no cenário global. Resta, ao país e ao governo brasileiro, entender esse processo, acompanhar as conquistas efetuadas e capitalizar a oportunidade representada pelos novos investimentos produtivos, que aqui desejam se instalar. Trata-se também de proporcionar os recursos necessários em infra-estrutura e de promover a desoneração tributária sobre a atividade produtiva, de modo que o país possa aproveitar integralmente e no longo prazo os benefícios gerados por uma atividade que agrega um indiscutível diferencial: a preservação ambiental.


OpiniĂľes

Paulo H

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Opiniões

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Visão Estratégica

Nelson Barboza Leite

Nelson Barboza

Gerente do Programa Nacional de Florestas do Ministério do Meio Ambiente Brasil: uma potência florestal emergente As mudanças que estão se processando no cenário florestal brasileiro poderão refletir diretamente num rearranjo do mercado internacional de produtos florestais. Embora com uma participação ainda insignificante, menos de 4%, num mercado mundial de mais de US$ 800 bilhões/ano, os sinais de novos tempos mostram-se bastante alentadores. Lideramos a produção de celulose de fibras curtas, originadas dos plantios de eucalipto e detemos a melhor tecnologia na formação de florestas plantadas. Estamos crescendo contínua e progressivamente no mercado moveleiro, MDF, aglomerados e outros derivados, principalmente com pinus e, progressivamente, com eucalipto. Temos a maior e mais rica floresta tropical do mundo. E já estão sendo tomadas as decisões estratégicas e inéditas para que a sociedade brasileira possa se beneficiar dessa riqueza natural, até então, à margem de qualquer processo de desenvolvimento. E não param por aí os sinais de bons ventos: as nossas vantagens comparativas e competitivas de florestas plantadas estão se acentuando. Nossas florestas produzem em 7 anos, o que nossos concorrentes produzem em 50 e, nos últimos anos, duplicamos nossos programas de plantio. Saímos de 320.000 ha/ano em 2003, para 630.000 ha em 2006 e ainda temos um grande estoque de áreas em condições de aproveitamento. Essa produção de madeira, com qualidade e custos competitivos, poderá alavancar um extraordinário aumento na capacidade produtiva industrial. Diversos trabalhos técnicos e experientes profissionais afirmam, categoricamente, que nenhum país do mundo tem condições de produzir tanta matéria-prima em prazo tão curto como o Brasil. E ainda mais, temos condições de produzir madeira sem competir em áreas com a produção de alimentos, sem destruir florestas nativas e de acordo com os rigorosos sistemas de certificação. Temos mão-de-obra preparada, com tecnologia e empresas de comprovada capacidade empreendedora.

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Dados setoriais mostram que só o aproveitamento de parte das áreas improdutivas dos pequenos produtores existentes no entorno das indústrias já instaladas, se usadas, através de programas de fomento florestal, produziria o suficiente para duplicar a capacidade das indústrias brasileiras. E o importante é que essa parceria já está sendo incorporada às políticas de expansão florestal das principais empresas. E tudo feito de forma sustentável, sem nenhuma agressão ao meio ambiente e perfeitamente integrado às demandas sociais. Temos também uma diversidade enorme de espécies nativas, com alto potencial de crescimento a ser explorado. Espera-se que, em prazo bem curto, tenhamos conhecimentos silviculturais suficientes, que permitam o uso dessas espécies nativas em grandes empreendimentos. Em síntese, a atividade silvicultural brasileira é imbatível e poderá tornar o Brasil um dos principais líderes no mercado internacional de produtos florestais. Essas vantagens tornaram-se conhecidas e indiscutíveis pelo mundo inteiro, e têm despertado interesse cada vez maior em indústrias e investidores internacionais. Essa tendência tem sido percebida, nos últimos anos, em função do aumento significativo de investidores nacionais e internacionais procurando formar e adquirir ativos florestais. São sinais concretos de que a silvicultura brasileira está caminhando para um novo patamar de crescimento. Esse crescimento extraordinário na capacidade de produção de madeira, indubitavelmente, deverá ser acompanhado de conseqüente aumento de novas

plantas industriais, deslocando o eixo da produção internacional de celulose e de outros produtos florestais para o hemisfério sul, focado no Brasil. Alia-se a essa conjuntura florestal favorável, o avanço tecnológico alcançado nos processos industriais das várias cadeias produtivas e a disposição do Governo Brasileiro em investir em infra-estrutura, estradas, ferrovias, portos, enfim, na logística indispensável para manter o nível de compe-titividade da indústria brasileira. No entanto, para que esse contexto promissor transforme-se em realidade consolidada, algumas medidas governamentais tornam-se imprescindíveis, como: a definição de regras claras para expansão do programa florestal a longo prazo; criação de pólos florestais e investimentos assegurados para desenvolvimento de infra-estrutura; linhas de financiamentos compatíveis com a atividade florestal e industrial; harmonização das legislações federal e estaduais e políticas públicas que demonstrem a


Opiniões jun-ago 2007

confiança e a credibilidade governamental, para que sejam garantidas a segurança e a estabilidade institucional dos programas e investimentos, a médio e longo prazos. São premissas que precisam ser discutidas, resolvidas e aplicadas, para que se evite o surgimento de casuísmos desagradáveis, que podem por em risco todas as projeções de crescimento. Surpresas amedrontam investidores e, em certas ocasiões, podem limitar programas em desenvolvimento. Sem garantia de plena estabilidade ninguém investe. A silvicultura brasileira soma experiência suficiente para se resguardar de surpresas de toda ordem: técnica, social, ambiental ou jurídica. A consolidação do processo de crescimento e desenvolvimento setorial permitirá que o Brasil incorpore as grandes oportunidades que estão surgindo continuamente, tanto através de investidores nacionais, quanto de internacionais.

E o passo fundamental na direção dessa promoção é o reconhecimento das dificuldades e dos questio-namentos ainda existentes e mal resolvidos. Há muitas interpretações equivocadas pela desvalorização dos conhecimentos científicos, por encaminhamentos ineficazes e não raramente com difusão e divisão de esforços. Há necessidade urgente de se uniformizar a linguagem dos erros e dos acertos, para que os esforços setoriais sejam alinhados na construção de bases sólidas para o novo crescimento, que interessa a toda sociedade. Temos que admitir que muita coisa está acontecendo. Tivemos mudanças importantíssimas, mas é preciso acelerar o processo de crescimento, diante das oportunidades e da enorme necessidade que o país tem de se desenvolver, de gerar empregos e de se apresentar realmente como novo e efetivo ator no mercado internacional de produtos florestais.

O Brasil conseguiu integrar as condições naturais, conhecimentos científicos e capacidade empreendedora, o que resultou num potencial de crescimento altamente competitivo. O mundo inteiro já percebeu que o Brasil representa senão a única, mas a melhor opção para investimentos em ativos florestais. Todas as nossas vantagens comparativas são reconhecidas como altamente competitivas pelos nossos concorrentes e a rentabilidade das aplicações florestais alcançadas no Brasil remuneram de forma satisfatória os investimentos. Essa procura por oportunidades seguras de investimentos de médio e longo prazos poderá proporcionar inúmeras vantagens ao Brasil e torná-lo um grande pólo de produção florestal, em escala internacional, na medida em que saibamos – governo e iniciativa privada – nos preparar com políticas e regulamentações bem definidas e estabilidade institucional inquestionável.

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Opiniões

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Visão dos Produtores João Fernando Borges

Diretor de Desenvolvimento da Stora Enso Latin America Division

João Fernando Borges

Tendências e mudanças na indústria de celulose e papel

A indústria de celulose e papel é expressiva na economia de vários países, contribuindo para o desenvolvimento da sociedade, quer pela atividade econômica que sua cadeia de produção gera, quer pelos seus produtos, que são importantes para o desenvolvimento e bem-estar da sociedade. Fabricar papel é uma indústria muito antiga: começou há cerca de dois mil anos na China. Da China, avançou lentamente para a Europa, através do Uzbequistão, Bagdá, Egito, Marrocos e depois Espanha e sul da França. Chegou na Alemanha no século XIII e na Inglaterra no século XV. A primeira fábrica nos Estados Unidos foi construída em 1690, na Pensilvânia. No Brasil, tem-se registro de que a primeira fábrica foi construída em 1809, no Rio de Janeiro. Na fabricação de papel, foram usadas várias fontes de fibras: árvores de diferentes espécies, linho e algodão. A abundância de recursos florestais no hemisfério norte, principalmente as florestas de coníferas (pinheiros), fez com que as grandes empresas produtoras de papel tenham se estabelecido nos países escandinavos, Estados Unidos e Canadá. Os países industrializados, que também estão concentrados no hemisfério norte, têm sido, pela sua pujança econômica, os grandes mercados para os produtores de papel. Essa distribuição geográfica da indústria e mercado de celulose e papel, dominante nos últimos 100 anos, no entanto, começa a mudar. O rápido crescimento da China e da Índia, os custos crescen-

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tes da madeira na Europa, o acesso aos recursos florestais da Rússia, os custos cada vez mais competitivos na produção de fibras na América do Sul e a questão energética são os fatores determinantes para o futuro desenvolvimento da indústria mundial de celulose e papel. Os custos de madeira na Europa têm subido significativamente nos últimos anos. O preço da madeira de Pinus para polpa na Finlândia em 2001 era de cerca de US$ 22 por metro cúbico, em 2006 esse valor atingiu US$ 33/m3. O metro cúbico de eucalipto para celulose em Portugal, há 5 anos, era vendido a US$ 50 (madeira exportada, preço CIF na Espanha) e no final de 2006 estava a US$ 70. No Brasil, o custo médio de madeira de eucalipto para celulose está entre US$ 25 e US$ 30 por m3 (madeira colocada na fábrica). Ainda que os preços mais elevados de madeira sejam verificados na Europa, os aumentos dos preços de madeira para celulose, madeira serrada e demais produtos, têm ocorrido, de maneira geral, em todos os países. Na Europa, esse aumento tem decorrido basicamente da elevada demanda de madeira serrada para atender o mercado chinês – a Suécia e Finlândia são importantes exportadores de madeira serrada – e da incerta disponibilidade de madeira para atender às indústrias florestais da Europa Central e países escandinavos. A Rússia, que tem sido um fornecedor importante de madeira para esses países e para a China, vem implemen-tando uma política restritiva às exportações da madeira em toras, com aumentos expressivos no imposto de exportação, que passará de 20% (Jan2007) para 80% (Jan-2009). Outra pressão importante para o aumento dos preços de madeira é a intensa competição que vem ocorrendo, por exemplo, na Suécia e Europa Central, com o setor de biocombus-tíveis. O uso da madeira como matéria-prima para o etanol tem sido intensamente estudado e é certo que o etanol celulósico será importante como combustível de fontes reno-váveis. A possibilidade de integrar a indústria de celulose tradicional a novas oportunidades que se abrem no setor de geração de energia, no entanto,

pode se transformar numa excepcional oportunidade para a indústria florestal e em especial para os países do hemisfério sul, que tem como fonte de fibra, plantações florestais de rápido crescimento. Além de novas oportunidades de negócio, há outros fatores que beneficiam a indústria florestal: há uma demanda crescente de produtos e energia produzidos com respeito ao meio ambiente, a indústria apresenta um balanço neutro em relação às emissões e seqüestro de carbono e conta com uma logística adequada para os fluxos de matéria-prima. Nesse contexto, a América do Sul continuará a ter uma considerável vantagem no custo de produção de celulose, em relação às demais regiões produtoras, em especial na celulose de fibra curta. O aumento do consumo de papel na Ásia – principalmente na China e Índia – manterá a tendência de que esse continente torne-se um grande importador de fibra para a produção de papel. O Brasil pode tornar-se um dos líderes da indústria florestal mundial e, para isso, conta com o interesse de tradicionais grupos mundiais investirem no país, além de já contar com empresas nacionais competitivas. É provável que, para o fortalecimento do setor, ocorram fusões e aquisições; reestruturação produtiva por parte dos grupos que operam no país, isto é, foco em setores mais específicos, como celulose de mercado, papéis de imprimir ou embalagens; e ampliação das bases florestais, com crescente participação de produtores florestais independentes. A capacidade de investir, gerir recursos e inovação tecnológica, tem sido demonstrada pela indústria florestal. Resta aos países da América do Sul – o Brasil entre eles – criar um ambiente favorável para a indústria florestal desenvolver-se de forma sustentável, com regras claras para o setor operar e infra-estrutura adequada. A indústria florestal pode contribuir de maneira expressiva para que muitas regiões dos países em desenvolvimento melhorem os seus indicadores de qualidade de vida.


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Visão dos Produtores

Vanderlei Madruga

Diretor Geral da Bahia Pulp

Vanderlei Madruga

O mercado brasileiro no cenário mundial de celulose O Brasil possui, atualmente, 477 milhões de hectares de florestas naturais. Trata-se da segunda maior área florestal do planeta. Deste total, 2,6 milhões de hectares são recuperados e preservados pelas empresas de celulose e papel, excedendo o disposto pela legislação ambiental brasileira, o que demonstra a preocupação do setor com o meio ambiente. Cada vez mais, as empresas estão ampliando suas bases florestais, mantendo áreas de preservação permanente (mata nativa) e de reserva legal, manejadas de forma integrada, para garantir a sustentabilidade ambiental e econômica dos negócios. Quanto maior a disponibilidade de madeira para as empresas produzirem celulose, melhor o desenvolvimento da região onde a companhia está alocada. O mercado de celulose no Brasil demonstrou grande desenvoltura em um curto espaço de tempo, em comparação com o restante do cenário mundial. Em 2006, de acordo com dados do governo federal, as exportações atingiram a marca de US$ 8,6 bilhões, com o uso de apenas 10 milhões de hectares de florestas (incluindo plantações e áreas de manejo florestal). Para 2007, a meta é aumentar as negociações em mais de 8%, com base nos resultados de 2006. Os principais mercados para exportação da celulose brasileira foram a Europa, com 49%, Ásia, 30% e América do Norte, 19%. No segmento de papel, os principais mercados foram: América Latina, com 55% da exportação, seguida por Europa, América do Norte, Ásia e África. Esses números ilustram bem o bom momento que a indústria de celulose brasileira passa. O mesmo ocorre em outros países do hemisfério sul. Além do clima e do solo serem mais propícios ao cultivo de eucaliptos do que no hemisfério norte, a excelência da tecnologia aplicada garante sucesso aos procedimentos e é reconhecida internacionalmente. Abaixo do Equador, há também uma grande área que pode ser aproveitada para o plantio. Outra grande diferença é que, no hemisfério sul, o eucalipto demora sete anos para atingir a fase adulta, pronta para o corte, enquanto que, no hemisfério norte, isso não ocorre em menos de 40 anos. Todas as características citadas foram decisivas para

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impulsionar um forte movimento de transferência das fábricas responsáveis pela produção de celulose do hemisfério norte, para o sul. Essa migração teve um crescimento acentuado nos últimos quatro anos. O Brasil tem grande destaque, devido à sua competitividade no cenário mundial. Um estudo divulgado por institutos internacionais apontou que nosso país avançou uma posição na produção de celulose em 2006, chegando à sexta posição. O Brasil é o maior produtor e principal exportador de celulose de eucalipto no mundo. Desde 1990, a produção brasileira de celulose de fibra curta de mercado passou de 1,4 para 7,7 milhões de toneladas por ano, superando a produção dos Estados Unidos. A indústria brasileira de celulose produziu, em 2006, mais de 11 milhões de toneladas, o que representou um aumento de 7,6% em comparação com o ano anterior. Para 2007, a expectativa para o segmento de celulose é de crescimento de 5,5% na produção. No setor florestal brasileiro existem, atualmente, 220 empresas localizadas em 450 municípios e 16 estados. Destas, 35 empresas são exportadores da matéria-prima. O setor de celulose e papel emprega mais de 100 mil pessoas e tem uma participação de 1,2% no PIB, Produto Interno Bruto. A base florestal do setor é de quase dois milhões hectares de florestas de eucaliptos e pinus. Neles, são aplicadas as mais modernas tecnologias para aprimorar os métodos e, assim, aumentar a qualidade do produto final. A celulose cria possibilidades para o surgimento de novos tipos de produto, como a celulose solúvel. Essa matéria-prima é usada para a produção de visco-se, filamentos para carros e aeronaves, têxteis, alimentos, produtos farmacêuticos e químicos, cosméticos, acetato e outros.

A celulose solúvel, produzida na América Latina, com exclusividade pela Bahia Pulp, localizada em Camaçari, na Bahia, atualmente tem como principal destino os produtores de viscose. A empresa já conquistou mercados exigentes, como os da Alemanha, Áustria, Inglaterra e EUA. Cerca de 75% do volume fabricado é exportado. A novidade da Bahia Pulp para 2008 será uma celulose solúvel, com um nível maior de pureza, que será usada na indústria alimentícia (capa da salsicha, espessante de sorvete), filtro de cigarros, indústria farmacêutica (cápsula de remédios), filme de LCD para computadores e até em pneus de avião e de alta performance para carros. Com esse material, será possível entrar em mercados tradicionalmente conservadores, como Estados Unidos, Alemanha, Japão, China, Inglaterra e França. Produtores de celulose estão aproveitando o momento favorável para expandir a produção no mercado brasileiro, como é o caso da Bahia Pulp, que está investindo US$ 400 milhões de dólares na ampliação da fábrica de celulose. O valor está inserido no programa de investimento do setor, que prevê, entre 2003 e 2012, a injeção de US$ 14,4 bilhões nesse mercado. Já nos primeiros três anos de programa, foram investidos US$ 3,5 bilhões e a previsão é que neste ano sejam mais US$ 3 bilhões. A tendência é que o Brasil suba no ranking mundial de celulose nos próximos anos. Se depender do empenho e da visão dos profissionais do setor, esse objetivo será alcançado antes do previsto.


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Visão dos Produtores

Máximo Pacheco

Presidente da International Paper do Brasil

Máximo Pacheco

A transformação da IP no Brasil A indústria de papel e celulose, no mundo, é um dos negócios que exige maior capital intensivo, necessitando de grandes aportes financeiros e eficientes aplicações dos investimentos. Um bom exemplo disso é a construção de uma nova fábrica de celulose, com tecnologia state-of-the-art, que exige investimentos acima de US$ 1,2 bilhão. Nos últimos 15 anos, principalmente nos Estados Unidos e Europa Ocidental, esta indústria não conseguiu gerar aos seus acionistas um retorno equivalente ao custo de capital, devido a uma combinação de queda nos preços, resultado de um dese-quilíbrio entre oferta e demanda, e aumento de custos de produção, tais como, energia, químicos e transportes, gerando um retorno médio sobre o capital empregado de 4%. Adicionalmente, a indústria de papel e celulose é grande financiadora de capital de giro, principalmente em face da longa cadeia de distribuição. Desde 2000, a principal estratégia global para reverter tal cenário tem sido buscar a consolidação do setor, por meio de aquisições, fusões e joint ventures, sendo que até o terceiro trimestre de 2006 foram formalizados 374 acordos, envolvendo mais de US$ 180 bilhões. Porém, a maioria dos produtores não conseguiu reverter o quadro de baixa rentabilidade, nota-damente devido a não realização das sinergias esperadas e ao alto valor pago, no caso das aquisições. Desta forma, com o objetivo de buscar o crescimento da rentabilidade de forma efetiva e sustentável, os grandes produtores mundiais têm migrado a estratégia de seus negócios de uma plataforma diversificada de produtos florestais para uma plataforma focada em negócios competitivos. Neste sentido, tem se notado que os grandes produtores mundiais estão tomando algumas ações que incluem: 1) a redução da capacidade de produção em mercados estagnados ou retraídos, onde os custos de produção têm se mostrado muito altos. A IP nos Estados Unidos, por exemplo,

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entre os anos de 2000 e 2007, retirou do sistema produtivo cerca de 1,7 milhão de toneladas de papel branco não revestido; e 2) a realização de investimentos em regiões que apresentam vantagens competitivas e em mercados com amplo potencial de crescimento, destacando-se aí as economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia e China - BRIC. Atualmente, o Brasil é considerado o maior produtor mundial de celulose branqueada de fibra curta - BHKP, e tem atraído investimentos de grandes produtores. A principal vantagem observada é o baixo custo para o cultivo de eucaliptos, em conseqüência da ótima adaptação da espécie ao clima e solo brasileiros. Além disto, o país possui tecnologia inovadora nesta área, resultado do desenvolvimento de clones de mudas de eucalipto com alto rendimento e baixa taxa de lignina, bem como excelência opera-cional e de gestão. No que se refere aos consumidores da celulose brasileira, destacam-se os mercados europeu, norte-americano e

chinês, sendo este último o que apresenta a maior taxa de crescimento e será, dentro de poucos anos, com certeza, o principal alvo das exportações brasileiras. Quanto ao mercado de papel, em especial, o papel branco não revestido - foco dos negócios da International Paper - o Brasil ainda é visto, notada-mente, como um fornecedor para a América Latina (excluindo o México). O mercado latino-americano tem crescido a taxas consideráveis, principalmente por seu consumo per capita ser muito inferior àquele observado nos países desenvolvidos. Dentre os principais fatores relacionados a tal crescimento estão o fortalecimento e a estabilidade econômica, aliados ao aumento do nível de renda da população, melhora do nível de alfabetização e ampliação das vendas de computadores. Tomando em consideração o contexto acima exposto, a International Paper, desde junho de 2005, executa um plano de transformação global, que altera significativamente a estratégia da companhia, não somente no Brasil, mas no mundo todo. Referido plano tem como principal pilar a concentração das atividades da companhia em duas áreas específicas, a produção e venda de papel branco não revestido e embalagens.


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Desta forma, a IP decidiu e está executando, mundialmente, um processo de venda dos ativos não pertinentes a este seu novo core business. Os recursos gerados com a venda dos ativos têm como destino a redução de nossa dívida, com a melhora de nosso balanço contábil, maior retorno ao acionista, por intermédio de um programa de recompra de ações e, finalmente, novos investimentos nas atividades de papel branco não revestido e de embalagens, em países que possam alavancar a rentabilidade da empresa, de forma sustentável.

No Brasil, já foram concluídas as vendas de nossos ativos no Paraná (unidade de papéis revestidos, serraria e base florestal) e no Amapá (unidade de cavacos de madeira e base florestal). Paralelamente, adotamos uma estratégia específica de crescimento nas nossas duas áreas de concentração, o que permitirá retornos financeiros maiores que nosso custo de capital. Neste sentido, em fevereiro de 2007, formalizamos o acordo de permuta de ativos com a VCP, pelo qual recebemos a unidade de papel de

Luiz Antônio, considerada benchmarking na produção de papel no mundo, e entregamos o projeto de uma planta de celulose no município de Três Lagoas, estado do MS, que deverá entrar em operação no primeiro trimestre de 2009, juntamente com todas as licenças am-bientais e base florestal respectiva. Adicionalmente, o Conselho Diretivo da International Paper aprovou a construção de uma nova fábrica de papel em Três Lagoas, a qual será a primeira a ser construída no país após 17 anos e cuja máquina terá capacidade de 200 mil ton/ano, devendo entrar em operação no primeiro trimestre de 2009. Com isso, a International Paper no Brasil deixará de ser uma empresa com capacidade de produção de 440 mil toneladas anuais de papel branco não revestido em 2006, para se tornar uma empresa de 1 milhão de toneladas no primeiro trimestre de 2009.

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Visão dos Produtores

José Paulo Unterpertinger

Gerente de Operações da FOSA - Forestal Oriental do Uruguai

José Paulo Unterpertinger

A mudança do eixo da produção mundial: a visão no Uruguai A globalização da economia tem causado vários efeitos na disposição geográfica de certas atividades e, sem dúvida, o setor florestal é um dos que mais sofreram mudanças. O incremento da economia mundial, com a conseqüente maior demanda de produtos, tem feito com que a procura por matéria-prima seja feita nas regiões de maior crescimento e maior disponibilidade de recursos para a geração das fibras, a menores custos produtivos. Por isso, grandes companhias enxergam o hemisfério sul como um interessante potencial de desenvolvimento florestal, onde encontram a maioria dos recursos necessários: as condições climáticas, recursos humanos, disposição dos governos para investir em infra-estrutura, apesar de alguns problemas como instabilidade jurídica e política na América do Sul. Tudo isso também se fez possível pela grande disponibilidade de terras e preço acessível, o que permitiu a construção de grandes fábricas de celulose, de mais de um milhão de toneladas por ano. Após a criação da lei florestal no Uruguai, a área plantada no país passou de 40.000 hectares para mais de 750.000 hectares, em 17 anos, e a superfície estimada pelo governo, de solos de aptidão ou prioridade florestal, é de aproximadamente 3,5 milhões de hectares. Como no Uruguai existem muitos proprietários de pequenas áreas, que variam de 50 a 300 hectares, nossa empresa está fomentando a plantação de eucalipto dentro dessas propriedades, nas frações de campo que sejam declaradas de prioridade florestal. Com isso, estamos diversificando os meios de produção dos pequenos agricultores e garantindo a compra da madeira no futuro. As empresas da Europa e da América do Norte também estão buscando alternativas mais rápidas de produção de madeira, com a utilização de espécies de rápido crescimento, como o Eucaliptos, que se colhe dos 7 aos 9 anos em nossas condições e o Pinus tropical, entre 15 e 20 anos, quando comparadas com os 60 a 80 anos que necessitam para que cresçam as suas florestas.

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Outro motivo para que as empresas invistam no hemisfério sul é que hoje também se desenvolveu a consciência e o respeito pelo meio ambiente, com a quase obrigatoriedade de se certificar as florestas, para se ter acesso a certos mercados, e isso resulta em projetos que visam o desenvolvimento sustentável, do ponto de vista econômico, social e ambiental, o que para grandes companhias é muito importante, em relação à imagem que passam aos clientes e aos consumidores de seus produtos. No Uruguai, junto com o aumento das áreas plantadas, também houve um aumento das áreas de florestas nativas, devido a áreas de preservação criadas e protegidas pelas empresas florestais. Também se vê a redução de pressão de corte sobre florestas nativas, devido à maior disponibilidade de madeira utilizada como lenha e à produção de energia. De 1988 a 2003, essas áreas passaram de 670.000 a 810.000 hectares. Aqui também existe a velha discussão sobre o eucalipto e a utilização da água, mas, desde o princípio, foram contratados, de outros países, experts no assunto que, junto com professores da Universidade da República, estão monitorando não só a quantidade, como a qualidade da água nas áreas plantadas e adjacentes. A presença dessas empresas no Uruguai vem fazendo com que haja uma mudança na economia e na distribuição da população no meio rural, já que a agricultura e a pecuária tradicionais davam muito pouco postos de trabalho, 3 e 2 respectivamente para cada 1.000 hectares, quando o reflorestamento ocupa, em média, 19,3 pessoas, de forma permanente para cada 1.000 hectares. Isso fez com que o governo criasse, em 1988, uma lei florestal, dando incentivos a quem quisesse investir no país. Hoje, já existem, aproximadamente, 750 mil hectares de florestas,

sendo que 70% são plantações de eucaliptus e 30% de pinus. Falando em números, o Uruguai tem 77,4% da área ocupada com pecuária e somente 4,1% com florestas plantadas, sendo que a pecuária é responsável por 35% do VBPA (valor bruto da produção agropecuária) e as florestas, por 7,4%. Em 2005, as exportações da pecuária uruguaia foram de US$ 730 milhões, e dos produtos florestais, de US$ 176 milhões, o que dá, por hectare, uma contribuição de US$ 53 e US$ 246, respectivamente. Hoje também há na Europa uma grande demanda por madeira para energia, o que levou algumas empresas do hemisfério norte a comprarem madeira em toras aqui no sul, para poderem manter suas fábricas funcionando, o que elevou os preços da madeira em nossa região, fazendo com que o negócio ficasse ainda mais atrativo. Com os preços do petróleo atuais e o valor energético da madeira (1 metro cúbico de madeira de E. grandis equivalendo, em energia, a 1 barril de petróleo), podemos ver a produção de energia como uma potencial competidora por matéria-prima, num futuro próximo, com o setor de celulose e papel. Também contribui para a mudança para o hemisfério sul, a taxação imposta pela Rússia, de 20 Euros por metro cúbico, a toda madeira bruta exportada, para forçar a indústria a se instalar no país. Hoje, no Uruguai, há uma grande competição por áreas declaradas aptas, ou, como chamamos, de prioridade florestal, por seus baixos índices de produtividade agrícola e pecuária, com os plantadores de soja, já que esse cultivo não necessita de terras férteis para produzir. Isso fez com que os preços da terra aumentassem bastante nos últimos dois anos, mas, mesmo assim, ainda segue sendo um bom negócio plantar florestas.


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Visão dos Produtores

Jorge Ivan Correa

Diretor Corporativo Florestal da Masisa - Chile

Jorge Correa

O que está acontecendo com as plantações das florestas da América Latina Não há dúvida de que a situação, cada vez mais restritiva, relacionada com as questões ambientais, com temas de legislação, como das medidas regulatórias dos desmata-mentos ilegais, foi mudando o eixo do negócio florestal das florestas naturais, para florestas implantadas pelo homem, que, por suas características próprias, foram, em grande parte e para muitos usos, bons substitutos para as madeiras provenientes das florestas nativas. Hoje, as plantações florestais ocupam 5% da superfície das florestas no mundo, mas representam 35% da oferta mundial, em volume, para usos industriais. Este fato teve dois grandes efeitos. Primeiro, a adequação da tecnologia para dar uso às florestas que geram madeira de menor diâmetro e menor idade (rotações), em função do desenvolvimento de produtos pela engenharia, que recons-tituem características da madeira, necessárias para os diferentes usos, de variada natureza, como painéis colados lateralmente (Edge Glue Panels), emendas Finger Joint, aglomerados e chapas de partículas orientadas (Particle Board e OSB), placas de fibras de madeira recons-tituídas e chapas duras (MDF, Hardboard), compensados (Ply-wood), madeiras laminadas e madeiras micro laminadas (LVL). O segundo efeito foi sobre o tipo de manuseio de florestas com espécies de rápido crescimento, que tiveram no mercado e na indústria seus principais impulsores, agregando valor e rentabilidade às plantações florestais, lastreados na resposta da ciência e no manuseio florestal com a diversificação de espécies de produtos da árvore, adequando a qualidade e o tamanho da madeira colocada à disposição da indústria, processadora primária, secundária e de remanufatura. O processo, consolidadamente sustentado no que diz respeito à valorização e aos interesses dos investidores, deve-se, sem dúvi-

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da, às características naturais da região, quanto à disponibilidade de terras, em extensões adequadas à escala do negócio, a uma muito boa produtividade dos solos, boas condições relacionados com as diretrizes que governam o negócio, em especial, para o cultivo de espécies de rápido crescimento, tanto relativo a espécies de fibra longa (gênero pinus), como de fibra curta (gênero eucaliptos). Não somente as características mencionadas são excepcionais nesta área do mundo. A América Latina tem como atrativos para os investidores ativos com boa rentabilidade, baixa volatilidade e baixo risco; recursos renováveis que geram retornos por um longo período de tempo e que se encontram, em geral, negativamente correlacionados com as outras importantes classes de ativos, que constituem o portfólio para este tipo de investidores e, adicionalmente, têm alta correlação positiva em relação à inflação. A evolução, no que se refere ao conceito da maximização da produção de toneladas de fibra, por unidade de superfície, por outro lado, foi dando lugar ao conceito de maximização de valor, para o volume estocado, por unidade de superfície. Sem dúvida, o processo anterior foi acompanhado e é o que lhe dá sentido. Ocorreu um aperfeiçoamento dos mercados locais e internacionais, com incorporações de tecnologias cada vez mais modernas para o uso integral dos produtos provenientes das árvores. Importantes crescimentos foram observados na indústria da celulose e do papel,

bem como na produção da indústria da serraria, na remanufatura, de compensados, de chapas de partículas, painéis de fibra, portas, janelas, móveis e várias outras indústrias de diferentes processos produtivos. Alcançando um melhor aproveitamento integral da árvore e dos subprodutos destes processos, como a serragem, as lascas, a casca, etc. Isso veio agregar valor em toda a cadeia produtiva e resultou no desenvolvimento de negócios locais, satisfazendo as necessidades de mercados internacionais, no que se refere aos padrões produtivos, à qualidade e à certificação dos produtos. O crescimento da demanda internacional, bem como a melhoria das economias da América do Sul nos últimos anos, provocaram


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uma adequação dos países nas questões regulatórias e legais, assentando os fundamentos da sustentabilidade do negócio florestal como uma atividade econômica de longo prazo de maturação, que requer a estabilidade de uma sólida legislação, para que se promova um seguro desenvolvimento florestal. São exemplos deste fato, num passado recente, o Chile, o Brasil, o Uruguai, a Argentina, e agora passam pelo mesmo processo, a Colômbia, o Peru, o Paraguai, dentre outros países. Entretanto, ainda há muito o que fazer e a ser melhorado nesta questão. Por outro lado, o crescimento da demanda colocou em evidência um desequilíbrio da existência de fibras e seu eventual estoque, versus uma demanda crescente pela instalação e anúncio de novos projetos, envolvendo megas investimentos, com características cada vez mais evidentes de diversificação na produção. Isto destaca a necessidade de se dispor de superfícies de plantações maiores em um curto prazo, em relação à maturação dos mesmos e poder

assegurar as disponibilidades de fibra em seus diferentes estados, para esta crescente demanda. Isto é muito animador para os que investem na criação de florestas produtivas. Como elemento adicional à conjuntura, está se instalando no mercado a possibilidade ou necessidade do uso alternativo da fibra ou das plantações para a cogeração de energia elétrica e a produção de biocombustíveis. Isto gera uma pressão adicional sobre a demanda da fibra vegetal. Outra questão é a real possibilidade de mitigação do efeito estufa, gerando para as empresas um balanço positivo entre o seqüestro de carbono e a emissão de poluentes. Isto cria uma real agregação de valor às plantações, contribuindo para a rentabilidade do negócio. Este cenário é realmente promissor para florestas plantadas com espécies de rápido crescimento, mas temos como desafio, para o futuro, dar equilíbrio a este negócio, com os conceitos de triplo resultado, para que seja validado pela sociedade. Neste sentido, deveremos ser visio-

nários e repensar o que realizamos até hoje, que embora bem-sucedido, começa a mostrar algumas necessidades que requerem atenção. Por requerer grandes extensões de terras, devemos refletir se esta atividade está afetando ou poderá vir a afetar o equilíbrio do sistema. Devemos investir constantemente em estudos e investigação, que permitam assegurar baixo impacto e equilíbrio ao ambiente, com a manutenção da biodiversidade, a regu-lação do ciclo hídrico, a diversificação de espécies, o cuidado com o solo, a variabilidade da paisagem, bem como dos efeitos e impactos que se tem sobre a população das comunidades dos arredores e das regiões locais. Concluindo, os investidores em plantações de florestas, que serão bem-sucedidos no futuro, são os que forem, ao mesmo tempo, capazes de administrar e executar, em equilíbrio, as principais diretrizes do negócio, permitindo manter a rentabilidade, de acordo com o investimento realizado e a sustentabilidade social e ambiental do projeto.

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Visão das Entidades

Amantino Ramos de Freitas

Amantino de Freitas

Presidente da SBS - Sociedade Brasileira de Silvicultura Transformando vantagens comparativas em vantagens competitivas Ficou célebre, no início da década de 60, o relatório de Walter Link, geólogo norte-americano, contratado pela Petrobras, que afirmava que as bacias sedimentares brasileiras não possuíam acumulações petrolíferas significativas, que possibilitassem exploração econômica. Em 1973, quando ocorreu o primeiro choque do petróleo, havia extração no Recôncavo Baiano, mas as importações respondiam por cerca de 80% do consumo nacional. Hoje, somos auto-suficientes, com extração de 1,8 milhão de barris por dia, e a tecnologia nacional de pesquisa de petróleo em águas profundas é das mais avançadas do mundo. Para atingirmos esse ponto, foram necessários altos investimentos, muito trabalho e criatividade dos engenheiros e geólogos. No caso da produção de celulose a partir do eucalipto, ocorreu algo parecido. Até a II Guerra Mundial, as empresas que aqui fabricavam papel utilizavam, basicamente, celulose produzida a partir do pinho do Paraná ou importada do hemisfério norte. Como no caso do petróleo, era voz corrente que o eucalipto não podia ser usado como matéria-prima para obtenção de celulose. A partir de 1946, a Cia. Melhoramentos de São Paulo iniciou um programa de pesquisa, visando obter celulose de eucalipto para substituir parte da importada. Contudo, somente em 1957, a equipe liderada por Max Feffer, conseguiu a produção industrial de papel com 100% de celulose de eucalipto. Hoje, o Brasil é líder mundial da produção de celulose branqueada de fibra curta, tendo atingido, em 2006, a marca de 11,1 milhões de toneladas, aproximadamente 9% da produção mundial. Essa posição de liderança também foi conquistada com muito esforço, trabalho árduo e inovação, por parte dos empresários e profissionais florestais. Vocação Florestal: Não há como negar a vocação do Brasil para a atividade florestal – 57 % do território é coberto por formações florestais. Além de ser o primeiro na produção e exportação de celulose branqueada de fibra curta, somos o maior exportador de compensados de pinus, o segundo produtor de resina, o segundo exportador de tanino de acácia, o terceiro de madeira serrada e o terceiro de compensado de madeira tropical. A participação das florestas plantadas está aumentando ano a ano, embora a área plantada - 5,7 milhões de ha, represente apenas 0,7% do território nacional. Em 2005, a madeira oriunda de reflorestamento foi responsável por 65% na economia florestal brasileira.

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Como o Brasil possui mais de 90 % de seu território na região tropical, é de se esperar que a produtividade das culturas agrícolas em geral, e do reflorestamento em particular, seja maior do que nos climas temperados. Contudo, a disponibilidade de terras adequadas e clima favorável, por si só não garante uma economia florestal forte. Outros países, com vantagens semelhantes as do Brasil, não contaram com o arrojo, conhecimento, dedicação e criatividade dos empresários e técnicos brasileiros, que “fizeram acontecer” o sucesso da indústria de base florestal, sobretudo da indústria de celulose e papel. Esse sucesso não passou despercebido dos grandes grupos internacionais, vários dos quais transferiram suas bases de produção para nosso país ou se associaram a grupos nacionais. Cerca de 12 bilhões de dólares foram investidos nos últimos dez anos na área de celulose e papel. As decisões para esses investimentos, certamente, foram tomadas anteriormente à atual fase de baixa inflação interna, grande liquidez de capitais internacionais e acentuada queda na classificação de risco do país. Esse novo quadro estimulará maiores investimentos no setor. Nas últimas décadas, houve uma tendência dos países desenvolvidos em deslocar para os países em desenvolvimento indústrias tidas como poluidoras, como a de celulose e a siderúrgica. O menor custo das matérias-primas e a proximidade com suas fontes de suprimento, aliados à incorporação de avanços tecnológicos nas novas instalações industriais, tornaram essas indústrias mais competitivas que a dos países de origem, que passaram a importar os produtos acabados ou semi-acabados. Muitos destes países passaram de exportadores a importadores, enquanto o inverso ocorreu com os países em desenvolvimento. Por exemplo, desde 2001, os EUA, tradicionalmente superavitário neste segmento, importam mais produtos florestais do que exportam. A produção de celulose nesse país passou de 66 milhões de ton em 1995, para 55 milhões em 2005 (-15%), a despeito do crescimento da população e da renda per capita. No mesmo período, a produção na região da América Latina e Caribe aumentou de 10 para 15 milhões de ton (+50%), a da Ásia de 19 para 25 milhões de ton (+32%), a da Europa de 42 para 49 milhões de ton (+17%) e a do Japão sofreu um ligeiro decréscimo de 11,2 para 10,7 milhões de toneladas por ano.

Nuvens negras no horizonte: O êxito dos empreendimentos florestais no Brasil é conhecido internacionalmente. Em artigo publicado no ano passado, pela revista alemã Markt und Trends – Pellets Norbert Walter, o economista chefe do Deutsche Bank, recomendou enfaticamente investimentos em plantio de árvores no Brasil. Em artigo publicado no dia 16/05/2007, pela Gazeta Mercantil, Robert Barnden, líder global de papel e celulose da Pricewaterhouse-coopers, declarou que quem quiser investir nesse setor terá que vir ao Brasil. Segundo ele, em 2006, o retorno para cada Real investido foi de 13%, três pontos percentuais acima do ano anterior, enquanto no resto do mundo esse retorno não chega a 6%. Contudo, algumas nuvens negras pairam no horizonte. Uma delas é o descompasso verificado na infra-estrutura de energia e transportes, inclusive portos, em relação às reais necessidades de desenvolvimento do país. Outra é a permanente ameaça de alguns movimentos declarados como sociais, que se opõem violentamente às monoculturas, sobretudo do eucalipto, e ao ingresso de capitais estrangeiros no agronegócio. Espera-se que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), proposto pelo governo federal, venha minorar os problemas de infra-estrutura e que o poder público tenha capacidade de conter a ação destes movimentos, dentro da legalidade. Do contrário, será muito difícil que as vantagens comparativas do setor florestal brasileiro continuem evoluindo para vantagens competitivas, gerando riquezas e melhorando a qualidade de vida da nossa população.


OpiniĂľes jun-ago 2007

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Opiniões

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Visão das Entidades

Germano Aguiar Vieira & Jedaias Jorge Salum

Presidente da Associação Mineira de Silvicultura e Especialista de Mercado de Celulose, respectivamente

Germano & Jedaias

A mudança da produção do Norte para o Sul do planeta De 1990 a 2007, a capacidade de produção de celulose química de mercado cresceu pouco mais de 20 milhões de toneladas, sendo que mais da metade deste incremento veio da América do Sul. Quando falamos em “celulose de mercado”, de forma simplificada, estamos nos referindo à celulose que é vendida aos fabricantes de papel. Há um volume de celulose que é consumida diretamente em fábricas integradas de celulose e papel, que está fora do conceito de celulose de mercado. A América do Norte e Europa, tradicionalmente os grandes centros produtores de celulose, perderam significativa fatia na sua participação do mercado global. A América do Norte perdeu 22% e a Europa Ocidental perdeu 5%, neste período. Por outro lado, a América Latina saltou de 8 para 24% e continuará crescendo até 2011, quando terá uma participação de 30% da capacidade mundial, levando em consideração todos os projetos que entrarão em operação até lá. O gráfico Capacidade de Produção de Celulose de Mercado compara a capacidade de produção de celulose de mercado das diversas regiões do mundo, nos anos de 1990 e 2007. Além do aumento dos números absolutos, como mostrado acima, há ainda, uma aceleração do ritmo de crescimento, que, entre outros fatores, é motivada pelos avanços tecnológicos e pela maior produtividade das florestas plantadas. Há 30 anos, a capacidade de produção de uma nova fábrica de celulose era de 300 mil toneladas por ano. Hoje, com a evolução das tecnologias de cozimento da madeira, das caldeiras de recuperação e dos demais equipamentos de uma unidade industrial,

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não se fala em fábricas novas com capacidade abaixo de 1 milhão de toneladas anuais. O investimento necessário para produzir cada tonelada de celulose cai, sensivelmente, com o aumento do tamanho da nova planta, sendo inviável pensar em fábricas com baixas capacidades. Isto significa, naturalmente, que os degraus de crescimento da oferta são muito maiores hoje, do que eram no passado, o que se percebe claramente no gráfico Evolução da Capacidade Instalada, onde mostramos a evolução histórica da capacidade das principais regiões produtoras e a previsão de crescimento até 2011. Por outro lado, o rendimento das florestas plantadas tem crescido a cada ciclo de colheita, em função dos programas de melhoramento genético, desenvolvidos pelas empresas. Com rendimentos mais elevados, a necessidade de áreas de plantio é menor, o que, por sua vez, reduz a distância média de transporte da madeira até as fábricas, com a conseqüente otimização dos custos de transporte, viabilizando a construção das modernas e grandes unidades de produção. A América Latina cresce em ritmo muito mais acelerado que as outras regiões, se igualando à capacidade da

Europa Ocidental neste ano e superando a capacidade da América do Norte, em 2011. A América Latina está se transformando em grande produtora de celulose de mercado. Tendo um baixo consumo próprio, a

maior parte da sua produção é exportada para outras regiões. Apesar dos custos envolvidos com o transporte da celulose aos mercados consumidores, a capacidade de produção da América Latina, e em particular do Brasil, continuará crescendo a passos largos, tal a nossa competitividade no setor do agronegócio. O gráfico Consumo de Celulose de Mercado no Mundo, mostra a distribuição da demanda da celulose de mercado nas principais regiões, no ano de 2006. No caso da Europa, o maior mercado consumidor, e da China, o que mais cresce, não há espaço para grandes aumentos na produção de celulose, para fazer frente ao crescimento do consumo de papéis dos diversos tipos, o que demandará, cada vez mais, maiores volumes de celulose de mercado, que fatalmente terão que ser produzidos em outras regiões.


Opiniões jun-ago 2007

Uma confluência de fatores positivos favorece o rápido crescimento da produção de celulose em países do hemisfério sul, que, sem dúvida, abocanharão a maior parte deste crescimento. O Brasil, com sua forte vocação para produtos de base florestal, em especial, das plantações de madeira para obtenção de celulose, não perderá esta oportunidade, com um crescimento projetado de mais de 40% na sua capacidade instalada, um incremento de quase 3 milhões de toneladas de celulose branqueada de eucalipto, até 2011. Dentre as vantagens do Brasil, quando comparadas com países do hemisfério norte, destacamos: 1. Intensidade luminosa, solos e clima favoráveis; 2. Grande quantidade de terras já desmatadas e com utilização precária; 3. Conhecimento silvicultural de elevado nível técnico, desenvolvido nos últimos 50 anos; 4. Excelente base genética de eucalipto e pinus, possibilitando formação de florestas de altíssima produtividade. 5. Existência de mais de 30 escolas

com formação especializada em Engenharia Florestal, onde já graduaram mais de 12.000 profissionais. 6. Presença da cultura de euca-lipto e pinus em 12 estados da federação e mais de 1.000 municípios, permitindo inúmeras combinações de material genético, bem como tipos de solos e clima. O Brasil tem uma das maiores extensões florestais do mundo, com mais de 540 milhões de hectares, que representam 64% do seu território. Desse total, apenas 1% refere-se a florestas plantadas, 5,2 milhões de hectares, e ocupa uma posição de destaque nas certificações de plantações, através do sistema FSC (selo verde), acumulando mais de 2,5 milhões de hectares de área certificada, representando mais de 30% de plantações certificadas no mundo. Desses fatos, já tiramos uma grande lição da natureza e da organização dos empreendimentos brasileiros nessa área, onde estão presentes, de forma equilibrada, conceitos econômicos, ambientais e sociais, em todas as suas atividades, que são auditadas de maneira transparente para a sociedade brasileira e mundial. Além disso, o setor de base florestal brasileiro, plantando apenas 0,62% do território, gera mais de 10% dos empregos da PEA, População Economicamente Ativa, recolhendo quase R$ 10 bilhões em tributos e exportando mais de US$ 7 bilhões.

Desde a década de 70, quando os mecanismos de incentivos financeiros viabilizaram os plantios de eucalipto e pinus em todo país, o Brasil consolidou sua vocação de produtor de florestas de rápido crescimento, garantindo o fornecimento de madeira para o setor industrial, tornando-se, assim, uma alternativa para a pressão sobre as florestas nativas, principalmente a Amazônia. Ainda podemos informar que existe grande quantidade de área improdutiva, sem cobertura vegetal natural, já desmatada para outras atividades, como agricultura ou pecuária, nas quais poderemos cultivar árvores com conseqüente aumento da produção de madeira, para atendimento dos mercados de celulose, energia e madeira sólida. Nos últimos 30 anos, a atividade florestal brasileira teve uma evolução tecnológica não superada por nenhum país do mundo, haja vista o incremento da produtividade florestal de 10 para 35 metros cúbicos de madeira por hectare por ano, obtido como média de diversas regiões do país e com registros de até 65 metros cúbicos por hectare por ano, em regiões localizadas no litoral do extremo sul da Bahia. No caso específico de produção de celulose, pode-se dizer que, para uma fábrica padrão de 1 milhão de toneladas/ano necessitaríamos de uma base florestal de 100 mil hectares plantados com eucalipto, quantidade de terra extremamente pequena do território nacional para suprir mais de 11% do consumo norte-americano de celulose de mercado. Desta forma, o Brasil com certeza, detém todas as características ambientais para se tornar a “OPEP da madeira” para celulose, energia e outros usos.

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Visão das Entidades Fernando Raga Castellanos

Fernando Raga

Vice Presidente da CORMA - Corporación Chilena de la Madera Inversão do Norte e plantações florestais: grandes oportunidades para o Sul

Os prognósticos de crescimento da produção de polpa de mercado indicam que esta se incrementaria entre 1990 e 2009 em 71%, uns 24 milhões de toneladas/ano, segundo o Pulp and Paper Products Council de 2005. E quase 70% deste crescimento registra-se no Hemisfério Sul, com projetos tão importantes como os de Veracel, Votorantim e Suzano, no Brasil, as fábricas de Botnia e Ence no Uruguai, e três grandes fábricas no Chile, duas da Arauco e uma da CMPC. Atrás deste deslocamento das inversões em polpa, está algo que cada vez se vê mais claramente como a resposta ecoeficiente e sustentável às crescentes demandas de produtos florestais do mundo: as plantações florestais. Estas apresentam um grande atrativo às empresas de celulose, porque permitem gerar os altos volumes de fornecimento que requerem, para aproveitar suas economias de escala, em superfícies de terra relativamente pequenas, com custos muito competitivos e facilmente mensuráveis, logística relativamente mais simples e impactos ambientais controlados. Os países do Hemisfério Sul, especialmente os da América do Sul, mostraram ter aptidões sobressalentes para o desenvolvimento de plantações de rápido crescimento: excelentes rendimentos, baixos custos e abundante disponibilidade de terras, econômica e ambientalmente aptas. Merece comentário o que as plantações dos países do Sul estão fazendo em contribuição ao equilíbrio ambiental do planeta.

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Quando a população do planeta chegar a seu equilíbrio em 9 bilhões, para logo começar a descender, provavelmente consumirá 4,8 bilhões de m3/ano. Isto poderia abastecer, em sua totalidade, uma superfície de plantações que representa apenas 6,5% da superfície atual de florestas do mundo. As plantações permitem gerar, de forma muito ecoeficiente, os altos volumes de madeira que o homem requer, evitando que estes sejam obtidos, pressionando as florestas nativas, de modo que permitam fazer coexistir altos níveis de conservação e de produção. Ao prover produtos de madeira de baixo custo, evita-se também a substituição por outros materiais, maiores consumidores de energia, mais poluentes e/ou não reno-váveis. Além disso, devemos agregar o benéfico efeito que têm as plantações em crescimento, no combate ao aquecimento global, ao postergar as emissões ou capturar carbono indefinidamente (caso de novas massas florestais de plantações colhidas em rotação perpétua), a taxas muito superiores à média das florestas. Este desenvolvimento das plantações não tem sentido sem seu aproveitamento industrial. Este último é o que permite definitivamente absorver as demandas do mundo, libertando de pressões outras florestas ambientalmente mais valiosas e gerando produtos de baixos custos, que permitam melhorar as condições de vida dos consumidores, uma vez que geram uma contribuição socioeconômica em nossos países, melhorando também os níveis de vida de nossa gente, através do emprego e dos efeitos econômicos indiretos. Neste sentido, a convergência das vantagens silvícolas de nossos países do Sul - que não apenas são naturais, mas também envolvem muita tecnologia - com os investimentos das empresas do hemisfério Norte, podem constituir uma aliança virtuosa, tanto para os investidores, quanto para nós e também para o meio ambiente do planeta. Assim, temos a oportunidade de transformar o setor florestal em um eixo chave do desenvolvimento para nossos países, sobre bases renováveis. Mas, para que isto se concretize e

aproveitemos as oportunidades, devemos, de nossa parte, cuidar de alguns aspectos muito importantes: • Ter normas ambientais adequadas, comparáveis com as dos países desenvolvidos e cuidar para que os projetos as cumpram rigorosamente, pois não queremos atrair investidores por “dumping ambiental”. Estas regras devem ser baseadas tecnicamente e claras, pois se são difusas dão espaço à geração de conflitos, que se traduzem em riscos e custos para os investidores. • Cultivar o “clima para empreender”: Atitude das autoridades receptivas ao investimento; regras tributárias estáveis e incentivadoras; segurança jurídica; políticas econômicas estáveis e consistentes no tempo; e cumprimento dos compromissos institucionais, aspecto chave na construção de confianças. • Avaliar os projetos de forma balanceada e com visão de futuro. Não esqueçamos que a definição de sustentabilidade tem três eixos: ambiental, social e econômico, e se não criamos benefício socioeco-nômico, não estamos sendo sustentáveis. • Considerar tanto o custo ambiental das decisões produtivas, quanto o custo socioeconômico das decisões ambientais. Os objetivos ambientais podem realizar-se plenamente por diversos caminhos de distinto custo, e nossa obrigação social é não empobrecer sem necessidade a sociedade, por não otimizar a relação custo/ benefício das decisões. • Informar, com equilibrio e objetividade, ao público, para que saiba valorizar e acolher o desenvolvimento sustentável, e não cair em visões “ideologizadas” de um ou outro extremo. Com certeza, há visões que têm este processo de deslocamento do investimento do norte com desconfiança, apreensão ou hostilidade. Isto é respeitável e pode ser compreensível. Sempre podemos ver o copo meio cheio ou meio vazio, mas para aproveitarmos as oportunidades que nos são apresentadas para que desenvolvamos sustentavelmente nossos países e combatamos a pobreza, é melhor vê-lo meio cheio e fazer bem as coisas para enchê-lo todo.


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Opiniões

jun-ago 2007

Visão das Entidades

Alberto Mori

Presidente da ABTCP - Associação Brasileira Técnica de Celulose e Papel

Alberto Mori

O cenário da celulose não se aplica ao papel Há tempos que especialistas em estudos sobre tendência de mercados – produtor e consumidor – vêm sinalizando certos movimentos de migração de centros industriais de commodities para determinados pólos do planeta. Nada mais coerente, quando se fala de negócios globais frente à antecipação do futuro das mudanças empresariais, rumo à consolidação de alguns blocos de negócios. Esta movimentação, ainda sem muitas rotas completamente definidas na geografia do planeta, começa a indicar alguns endereços, onde deverão se instalar futuramente os chamados – fornecedores globais. No caso da produção mundial de celulose, tudo indica que realmente o hemisfério sul do planeta deverá ser o grande centro de produção da commodity. Mas, o mesmo cenário não se aplica totalmente ao papel. Para analisar o destino futuro de cada produção, é preciso considerar como parâmetro, sob o ponto de vista da produção mundial da celulose, a questão do custo da madeira. Quanto ao papel, em seus diversos segmentos, outros aspectos são determinantes para viabilizar a decisão do investimento. As mudanças de centros produtivos, pelo que se observa, ocorrem com base em certas vantagens comparativas, como a área disponível para plantio, recursos naturais, principalmente água e o clima de cada região – favorecendo ou dificultando o cultivo de florestas, como o eucalipto, para celulose de fibra curta, e o pinus, para celulose de fibra longa. Considerando o hemisfério sul do planeta como ponto focal de produção mundial da celulose, os destaques na América do Sul ficam com o Brasil, Chile, Uruguai, enquanto na Ásia, a Indonésia está em evidência, entre outros. Nestes países, novos grandes players têm emergido no setor de celulose, assim como em outros segmentos de produtos de base florestal. Os investimentos vêm sendo efetivados na compra de áreas, tanto

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para plantio de diferentes espécies, quanto para instalação de novas plantas industriais, modernização e ampliação de unidades preexistentes. Olhando para o Brasil, em especial, onde a ABTCP concentra, em maior intensidade, sua atuação setorial, voltada à formação profissional e à difusão do conhecimento tecnológico, as vantagens naturais são inquestionáveis para o cultivo, principalmente, do eucalipto e também do pinus. Como conseqüência das pesquisas avançadas sobre Engenharia Genética, técnicas de plantio, desenvolvimento clonal e tecnológico, os ganhos vêm se mostrando muito significativos no país, em termos de produtividade da madeira. As inovações neste sentido, obtidas na última década, elevaram a produtividade da madeira ao dobro, indicando ainda que mais novidades serão conhecidas no futuro deste processo de desenvolvimento. Haja vista as pesquisas apresentadas recentemente durante o 3º ICEP - 3º Colóquio Internacional sobre Celulose de Eucalipto - realizado de 4 a 7 de março de 2007, pela Universidade Federal de Viçosa, com apoio da ABTCP. O evento contou com a participação de cientistas do Brasil e estrangeiros, advindos de países, como Alemanha, Argentina, Áustria, Canadá, Chile, Estados Unidos, Finlândia, México, Portugal, Suécia e Uruguai. Somado a essas conquistas tecnológicas, e a outros ganhos obtidos na cadeia de produção como um todo, o custo de produção da celulose no hemisfério sul tornou-se mais baixo do que a média mundial de preços, praticados no hemisfério norte. Contudo, quando entramos no âmbito de produção mundial de papel, deparamo-nos com a seguinte questão, atualmente em voga: será que a vantagem maior está em fabricar o produto próximo do centro de

produção da matéria-prima ou será melhor instalar as plantas de papel próximas do mercado consumidor? Esta pergunta refere-se ao papel, em todos os seus segmentos. No caso dos papéis tissue e embalagem, em que o índice de reciclagem atinge patamares superiores a 50%, a instalação de unidades industriais tem se confirmado na direção dos centros de consumo e distribuição dos produtos, bem como de coleta de aparas. No caso dos papéis especiais, cada caso é um caso a ser analisado. Porém, a competitividade neste segmento define-se por quem possui a melhor tecnologia, tamanho de mercado e escala de produção. Já faz anos que o próprio BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – alertava para a perda de competitividade do Brasil no papel, devido à falta de grandes investimentos em novas máquinas. Este fato não influenciou o desenvolvimento da produção de celulose do país, em nível mundial, tanto que o Brasil é um dos principais players, tendo passado da 7ª, para a 6ª posição no ranking de produtores internacionais da commodity. Em contrapartida, o cenário do papel no hemisfério norte, em especial, na China, tem se apresentado de forma bem mais positiva. »»»


Opiniões jun-ago 2007

Carlos Marx R. Carneiro

Oficial Florestal Principal da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação A mudança do eixo da produção mundial

Carlos Carneiro

Outro exemplo é a Escandinávia, onde novas máquinas de papel têm substituído equipamentos mais antigos, como forma de ganhar competitividade. Em outros países da Europa, a situação é semelhante, em termos de modernização de equipamentos, em substituição a máquinas mais antigas. Muitas vezes são trocadas três máquinas de papel ultrapassadas tecnologicamente, por apenas uma máquina muito mais potente e tecnologicamente avançada. Neste cenário, um dos principais destaques do continente europeu é a Finlândia, que exporta 95% de toda sua produção de papel e opera com alta tecnologia de automação, em suas plantas industriais. Como todas as oportunidades sempre nos trazem novos desafios, essa tendência de mudança da produção mundial de celulose e papel do hemisfério norte para o sul não foge à regra. Todas as vantagens favoráveis apontadas neste artigo começam a se deparar com alguns obstáculos, como a maior consciência ambiental da sociedade dos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, entre outras questões. Contudo, a ABTCP tem direcionado seus esforços para a busca de soluções e antecipação de tendências de impactos do desenvolvimento, nos diversos segmentos de papel. O objetivo é oferecer suporte técnico ao setor, para superar os desafios futuros nas linhas de produção de celulose e papel, mantendo a competitividade. Um dos principais estudos – ainda a ser lançado no setor de celulose e papel pela ABTCP – é a coletânea de publicações especializadas sobre tendências da evolução da produção do papel em todos os segmentos. Esta é uma das respostas positivas da entidade técnica, para contribuir proativamente com o desenvolvimento da nossa indústria, na conquista de seu melhor desempenho, nos próximos anos. Afinal, como dizem alguns sábios da gestão, a maior diferença entre o sucesso e o fracasso dos resultados não reside no que possa acontecer às empresas, mas em como os gestores lidam com cada obstáculo do caminho, em direção ao desempenho das organizações.

Muito se tem falado, nos últimos anos, sobre as vantagens competitivas e comparativas do setor florestal da América do Sul, em especial do Brasil e do Chile. Na realidade, isso se materializou com a consolidação de pólos de desenvolvimento florestal nesses países, o que aumentou a competitividade do setor florestal. Mas, recentemente, observamos um crescimento exponencial do setor florestal de países outrora “observadores”, como o Uruguai, que de 30 mil hectares de plantações florestais, há cerca de 15 anos, hoje possui 800 mil hectares. Isso sem falar na Argentina, com mais de 1 milhão de hectares de plantações florestais, ou mesmo o Chile com seus 2,6 milhões de hectares. Observamos que o crescimento desses pólos não foi acompanhado, em alguns países, por um crescimento proporcional da infra-estrutura necessária, como portos para escoamento da produção, estradas e facilidades de energia elétrica, porém esse é um assunto que não vamos abordar nesse espaço que dispomos.

Por outro lado, as mudanças tecnológicas e os meios de comunicação e cibernética, assim como uma maior consciência ambiental, foram forças impulsoras, que se desenvolveram de forma significativa em nossa região e possibilitam, atualmente, como nos países do hemisfério norte, maior interatividade entre os diferentes atores do setor. Igualmente, não vamos voltar a descrever as nossas vantagens comparativas em clima, solos e tecnologia, já que essa é uma realidade que todos conhecemos e que tem sido discutida à exaustão pelos nossos expertos florestais. E não é por acaso que tantas companhias florestais têm deslocado os seus eixos de produção do hemisfério norte para o hemisfério sul. Vejam, por exemplo, o mesmo caso Uruguaio que mencionei anterior-mente, que está implantando fábricas de papel e celulose, oriundas da Espanha, Finlândia, Suécia, e existe interesse de outros países, como a Itália ou mesmo os Estados Unidos. O eixo de produção e exportação do

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Opiniões

Carlos Carneiro

jun-ago 2007

Uruguai está desviando-se, dramaticamente, da agricultura e pecuária, para o setor florestal. Também não é por acaso que as exportações de produtos florestais de países como o Brasil e o Chile quase que duplicaram nos últimos anos. Esses países desenvolveram a capacidade de produzir produtos florestais com alto valor agregado, como papel, celulose e seus derivados, móveis, etc., a preços internacionalmente muito competitivos. E essa tendência continuará nos próximos anos. Inclusive, com a diversificação da matriz energética de países como Brasil e as inversões em outras fontes de energia, a competitividade do setor tenderá a crescer de forma expo-nencial. Analisando-se as tendências e perspectivas do setor florestal da América Latina e Caribe e suas principais forças impulsoras, verifica-se, claramente, que os próximos anos serão de crescimento da produção, consumo e exportação para a maioria dos produtos florestais, embora isto não se processe de forma uniforme em todos os países. Este fato fica claro quando analisamos as cifras da inversão estrangeira em nossa região, que passou dos 6,5 bilhões de dólares em 1994, para mais de 100 bilhões de dólares em 2006. Os benefícios comerciais derivados das vantagens comparativas (mais consumo, a menor preço) em geral, os acordos comerciais bilaterais e multilaterais, reforçam a credibilidade dos inversores nas reformas econômicas e o compromisso dos países, a favor do livre comércio. Reverter agora essas reformas seria muito “perigoso” para os países, já que poderiam vir represálias comerciais, com perda das preferências adquiridas. Por tudo isso, é seguro que os países façam todos os esforços, no sentido de incrementar e manter o livre comércio regional e internacional, o que, por outro lado, aumentará o fluxo de inversões nacionais e estrangeiras, destinadas a comprar florestas nativas para produção e proteção sustentável e implantar novas plantações florestais para fins industriais, em especial papel e celulose. Sobre este último ponto, prevê-se, até o ano 2020, que a área atual de plantações, em torno aos 12 milhões

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Visão das Entidades de hectares, poderia chegar aos 20 milhões, se o Brasil seguir com o seu ritmo atual de plantações, o que representará um crescimento superior aos 42%, concentrados especialmente nos países do cone sul, aumentando a produção, dos 303 milhões de metros cúbicos em 2003, para mais de 500 milhões de metros cúbicos em 2020, ou seja, um crescimento de mais de 75% no período. E essas áreas de plantações atenderão, basicamente, às necessidades de ampliações e novos projetos industriais de grandes empresas de papel e celulose, e de outros produtos à base de madeira. Na realidade, o potencial biofísico para plantações florestais na região situa-se em torno aos 70 milhões de hectares. As atuais políticas macroeconômicas favorecem o estabelecimento de plantações para produção, porém, será necessário que se examine bem a possibilidade de fomento cada vez maior da participação de grupos economicamente menos favorecidos, assim como novos esquemas de privati-zação. Por tudo isso, e com o aumento da demanda mundial por produtos florestais, verifica-se uma contínua necessidade do incremento do nível de produção, devido, não só ao crescimento econômico, como demográfico de muitos países. O crescimento de algumas grandes economias, como a China e a Índia, terá um efeito importante na demanda mundial. Isso sem considerar que o mesmo Brasil é o quinto país mais populoso do planeta e o terceiro entre as economias emergentes, com um grande e potencial mercado doméstico. Se considerarmos os fatores internos importantes, que são as vantagens comparativas e competitivas do Brasil, observamos a razão do deslocamento do eixo de produção do hemisfério norte para o nosso. E no caso do Brasil, esperam-se inversões superiores aos 15 bilhões de dólares, nos próximos 7 a 10 anos, só no setor de papel e celulose. Nesse caso, será de se esperar operações de fusões e aquisições, assim como a entrada de novos operadores externos no mercado regional. Estas ações deverão consolidar ainda mais a posição dos produtores, aumentando suas cotas de mercado e suas economias de escala.

As razões mencionadas explicam a razão dos interesses das indústrias de papel e celulose de emigrarem do hemisfério norte, para o hemisfério sul (especialmente América Latina e Ásia) e, sinteticamente, podem ser resumidas nos seguintes fatores: a) disponibilidade de terras, a relativo baixo custo; b) estabilidade econômica e política dos países; c) políticas governamentais de incentivos à instalação de indústrias estrangeiras; d) disponibilidade de mão-de-obra qualificada e de baixo custo comparativo; e) clima e solos de boa qualidade, com incremento médio anual muito alto; f) disponibilidade de tecnologia de ponta e excelentes profissionais; g) Energia e custos de transportes, comparativamente mais baratos. Contudo, muitos fatores devem ser analisados e nesses se encontram os ambientais. Sabemos que com as pressões ambientais, que existem especialmente nos países “desenvolvidos”, está cada vez mais caro a implantação e manutenção de grandes complexos industriais de papel e celulose. Aliado ao custo da terra, custo de transporte e mão-de-obra, custo ambiental, e baixo incremento médio anual das plantações florestais, será cada vez mais difícil competir em um mercado em expansão e, portanto, será de se esperar que o “êxodo” aumente. Claro que toca aos países do hemisfério sul analisar criteriosamente até que ponto técnica-política-social e ambientalmente será, determinado investimento, comparativamente interessante para o país. Como sabemos, nem tudo o que reluz é ouro, e as coisas não ocorrem por acaso.


OpiniĂľes jun-ago 2007

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Terras

Opiniões

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José Vicente Ferraz

Diretor Técnico da Agra FNP Pesquisas

Vicente Ferraz

O Setor Florestal e as Terras

O setor florestal brasileiro demonstra uma enorme pujança, fruto da sua indiscutível competitividade, em nível internacional. O setor, segundo estimativas de mais alta confiabilidade, deve crescer, nos próximos anos, a uma taxa de pelo menos 6% ao ano. Grande parte desta força competitiva sustenta-se na capacidade diferenciada de se produzir, no Brasil, matéria-prima em florestas plantadas, a baixo custo, fruto de uma alta produtividade, proporcionada por elevado nível tecnológico de produção e condições naturais favoráveis, além de baixo custo e alta disponibilidade de mão-de-obra e de terras. É preciso notar que o custo da terra é um importante fator de com-petitividade, à medida em que o capital nela investido precisa ser remunerado pela atividade nela desenvolvida, o que, por sua vez, gera a necessidade de um desempenho econômico mínimo. A existência de grandes extensões de terras, perfeitamente utilizáveis para atividades florestais, não aproveitadas ou subaproveitadas, já representa vantagem comparativa relevante, pois viabiliza a necessária expansão das florestas plantadas. Estimativas conservadoras indicam que existem, no país, cerca de 100 milhões de hectares de terras de qualidade aceitável para atividades agropecuárias pouco exigentes, desde que corrigidas nos seus aspectos de fertilidade, com técnicas simples e relativamente pouco onerosas. Ressalte-se que desta estimativa já foram deduzidas as terras localizadas em ecossistemas frágeis como o Pantanal

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Mato-Grossense e a Floresta Amazônica, além de parques nacionais, reservas indígenas e as áreas que obrigatoriamente devem ser preservadas por força de lei, como proporção da área total de cada propriedade. Considere-se ainda que os preços das terras brasileiras, da mais alta qualidade e localizadas nas regiões mais desenvolvidas do país, são significativamente menores que os das terras de países do hemisfério norte, em especial. Mas, mais significativa é a existência, no país, de terras de qualidade razoável e perfeitamente aptas para o desenvolvimento de atividades florestais, de custo extremamente baixo, que simplesmente não existem em outras partes do mundo, exceto, possivelmente, em algumas partes do continente africano. É possível encontrar terras em estados brasileiros como Maranhão, Piauí e Pará, por exemplo, de bom potencial produtivo, por preços inferiores a R$ 250 por hectare, ou seja, cerca de US$ 125 por hectare. As terras mais baratas existentes em países do hemisfério norte, desde que com um mínimo potencial produtivo, não são encontradas por menos de 9 vezes este preço. É verdade que o impacto deste valor mais baixo das terras brasileiras é em parte reduzido pelo fato de que geralmente estas estão localizadas em regiões com grandes deficiências de infra-estrutura, mas, mesmo assim, a vantagem brasileira é muito considerável. Neste cenário, é fácil entender que com a menor necessidade de imobilização de capital em terras, o retorno da atividade tende a ser maior no Brasil que em outros países concorrentes do hemisfério norte, o que favorece a expansão acelerada da atividade florestal no país. Uma questão importante diz respeito à sustentabilidade desta vantagem comparativa, uma vez que parece evidente que a tendência dos preços das terras brasileiras é de elevação. A transformação do Brasil em potência nos agronegócios, acelerada mais recentemente pelo boom da bioenergia, induz à valorização das terras brasileiras, sendo isto inegável. Porém, a existência do já referido estoque de terras e as próprias condições macro-econômicas do país, levam a crer que este processo de valoriza-

ção tende a ser, no máximo, igual à valorização das terras que ocorrerá também nos países do hemisfério norte, mantendo-se, portanto, o atual diferencial. Depois do lançamento, pelos EUA, de um ambicioso programa de produção de etanol a partir do milho, muito se tem especulado sobre os seus efetivos efeitos - diretos e indiretos, sobre o agronegócio brasileiro em geral e sobre o preço das terras em particular. Parece claro que o Brasil será muito beneficiado, dadas as inquestionáveis vantagens comparativas que desfruta em diversos e importantes setores do agronegócio, no entanto, parece precipitado concluir que este desenvolvimento implicará em um movimento de alta nos preços das terras, generalizado e suficientemente grande para eliminar a vantagem comparativa das terras baratas. Explica-se, em primeiro lugar, o efeito da expansão dos cultivos para a produção de bioenergia ou para substituir a produção de países que utilizarão a sua produção com a mesma finalidade será relativamente restrito. Pois, deve-se ter em mente que a totalidade das culturas anuais e perenes do país, ocupa uma área de aproximadamente 60 milhões de hectares. Como se viu, existe um estoque de terras disponíveis maior que este, ou seja, a área cultivada poderia mais que dobrar, sem provocar um deslocamento significativo de outras culturas. Segundo, o efeito expansão dos cultivos no país será localizado, seja porque as condições edafo-climáticas de muitas regiões do país não são adequadas para o cultivo de lavouras mais exigentes (mas são utilizáveis para a implantação de florestas plantadas), seja porque não existe suporte logístico para a produção de alguns produtos mais sensíveis ao custo de transporte (notadamente canade-açúcar e seus subprodutos etanol e açúcar). Em conclusão, pode-se afirmar, com bom nível de segurança, que embora seja previsível uma elevação dos preços das terras no Brasil, esta não será, nem tão grande, nem tão generalizada, que venha a eliminar a grande vantagem comparativa que é representada pelo baixo valor relativo das terras brasileiras.


Projetos

Opiniões

Ivan Tomaselli

Diretor de Desenvolvimento da STCP

O mercado e o avanço dos países emergentes A produção e o comércio mundial de madeira e produtos de madeira têm sido dominados por um número relativamente pequeno de países. Ao longo das últimas décadas, cerca de 60% das exportações de produtos florestais teve como origem a América do Norte e a Europa. Este quadro, conforme estudos recentemente conduzidos pela STCP Engenharia de Projetos, está apresentando alterações. O processo de globalização, o crescimento da economia mundial dos últimos anos, e melhorias na logística, são fatores que têm colaborado para aumentar o comércio mundial de produtos de madeira, que hoje movimenta algo em torno de US$260 bilhões - quando incluído produtos de maior valor agregado. Se mantida a tendência dos últimos 20 anos, o comércio internacional de produtos florestais deverá atingir, em 2020, cerca de US$500 bilhões. Isto significa que os países e as empresas que quiserem se manter nos níveis atuais de participação no mercado internacional deverão dobrar as exportações, nos próximos 10 a 12 anos. Todo este processo de mudança tem criado novas oportunidades, especialmente para novos produtores.

Quando analisadas as tendências das exportações de produtos florestais, observa-se que os novos produtores têm aumentado a sua participação, ao longo dos últimos anos. A participação da China no mercado internacional, por exemplo, passou de 1,5% em 1990, para 7,2%, em 2005. A China já suplantou a Itália nas exportações de móveis, país que por várias décadas liderou este mercado. Outros países também ganharam parcelas significativas no comércio internacional de produtos florestais no período, incluindo o Brasil (de 1,3 para 3,2%), a Rússia (de 1,3 para 3,0%), e o Vietnã (de 0,1 para 0,6%). Como conseqüência, ao mesmo tempo em que os novos atores (países emergentes) ampliaram suas participações no mercado mundial, exportadores tradicionais as perderam. Exemplos são o Canadá, que teve sua participação reduzida de 15,2%, em 1990, para 13,8% em 2005, e a Finlândia, que reduziu de 8,1% para 5,0%, no mesmo período. O comércio mundial de produtos de madeira tem crescido a taxas muito superiores que a produção, e isto pode, pelo menos em parte, ser atribuído a mudanças na base de produção, resultante da busca de novas fontes de madeira e da realocação de unidades de produção. Esta tendência tem sido muito evidente no caso da produção de celulose, onde os investimentos estão sendo concentrados em novas fronteiras, com ênfase no hemisfério sul. Neste processo, entre os países que têm sido beneficiados estão o Brasil, o Uruguai, a Indonésia e o Chile. A mudança da base de produção tem sido impulsionada por vários fatores, no entanto, o mais relevante está associado com a alta produtividade das plantações florestais, localizadas nessas novas fronteiras. A experiência da STCP, em seleção de sites para novas fábricas de celulose, indica que num primeiro momento, devem ser considerados dois critérios básicos: a disponibilidade de madeira a menor custo e logística eficiente para atingir o mercado internacional. A produtividade das plantações florestais tem sido determinante nos avanços da celulose de eucalipto no mercado internacional. A partir de plantações de eucalipto é possível produzir madeira de qualidade ade-

quada e a custos menores que outras madeiras utilizadas na produção de fibra curta. Como resultado, a celulose de eucalipto, que em 1990 tinha uma participação no mercado internacional de aproximadamente 30%, tem agora 50% deste mercado. Projeções indicam que, em 2012, a celulose de eucalipto deverá deter mais de 60% do mercado mundial de fibra curta, e que a maior parcela estará sendo exportada por empresas instaladas no Brasil. As mudanças em curso são resultantes do fortalecimento de produtores localizados em países emergentes (mais competitivos), e também pela gradual transferência da produção de empresas tradicionais, para novas fronteiras. A transferência da base de produção vem ocorrendo tanto pela busca de novos mercados (em países emergentes), como também por ser uma forma de manter a competitividade no mercado internacional, onde a busca constante de redução de custos de produção tem sido a meta principal. Tudo indica que esta tendência deverá ser mantida ao longo dos próximos anos. Na realidade, os fatos demonstram que alguns produtores tradicionais deverão acelerar o processo de transferência da base de produção. Entre estes fatos encontrase a decisão da Rússia de aumentar a taxação sobre as exportações de toras, hoje estabelecida em 6,5%, e que crescerá, gradualmente, a partir de julho de 2007, atingindo, em janeiro de 2009, o percentual de 80%. A Rússia detém cerca de 20% dos estoques de madeira do mundo, e uma capacidade de produção sustentada de mais de 560 milhões de metros cúbicos por ano (atualmente produz 130 milhões). Hoje, o país exporta mais de 50 milhões de metros cúbicos de madeira na forma de toras (principalmente para a Finlândia, Japão e China) e, portanto, a decisão da taxação terá um grande impacto no mercado mundial. Produtores de celulose (e de outros produtos de madeira) dos países que hoje dependem de toras importadas da Rússia perderão competiti-vidade e, consequentemente, mercado. A conclusão é que, em princípio, esses países terão que optar entre transferir a sua produção para a Rússia, ou investir nas novas fronteiras do hemisfério sul, onde o Brasil, por suas características, é, no momento, o país que apresenta as melhores condições para atrair estes investimentos.

Ivan Tomaselli

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Consultoria

Opiniões

jun-ago 2007

João Cordeiro

João Cordeiro

Vice-Presidente da Pöyry Consulting - Finlândia Um processo de seleção natural e industrial Ao longo das ultimas três décadas, as transformações do mercado mundial e as mudanças do ambiente competitivo têm levado a uma profunda reestruturação da indústria mundial de base florestal. Ocorre um verdadeiro processo de seleção natural. Este fenômeno apresenta dois componentes principais. O primeiro, associado a distintas dinâmicas de mercado. Há um incremento acelerado do consumo dos principais produtos florestais nos países emergentes. Simultaneamente, percebe-se tendência à estabilização, saturação ou mesmo redução do consumo nas regiões tradicionais de demanda, como na América do Norte, no Japão e nos países mais desenvolvidos da Europa. O segundo componente acompanha a gradativa redução da rentabilidade financeira das empresas, com enfoque centrado nestes mercados maduros. A estabilização do consumo nestas regiões tem gerado sobre capacidade de produção e conseqüente redução do nível de preços. Verifica-se, também, que uma parte considerável dos ativos industriais, em certos países, encontra-se desatualizada tecnologicamente. Estas alterações fundamentais no ambiente de negócios provocam reações diversas na busca pelo aumento da competitividade. Entre elas, destacamos alguns exemplos de mudanças

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tecnológicas, estímulos políticos e o fenômeno da migração industrial. Mudanças tecnológicas: Observa-se que, uma grande parte das inovações propostas tem enfoque na otimização do uso da matéria-prima fibrosa. Por exemplo, as gramaturas baixas ganham espaço, pois reduzem a necessidade de fibras e promovem economias na cadeia logística. Ao mesmo tempo, a evolução tecnológica da produção de papel e o aumento da coleta, impulsionam o consumo de fibras recicladas – cerca de 48% da produção mundial de papel hoje é baseada nestas fibras. Também o víeis tecnológico promove o uso de fibras curtas, provindas das plantações de rápido crescimento, as quais se consolidam como as grandes fontes de fibra virgem de alta qualidade e homogeneidade. Estima-se que mais de 20% do consumo mundial de madeira para fins industriais, em 2020, virá destas plantações florestais (atualmente 14%). Estímulos políticos: Diversas iniciativas políticas, muitas delas encabeçadas pela União Européia, promovem o uso energético dos recursos naturais renováveis. Esta atitude político-ambiental tem despertado interesse dos agentes econômicos pelo uso da biomassa de origem florestal (e agrícola). Por exemplo, legislação específica promovendo a geração de eletricidade provinda de biomassa, como na Espanha e em Portugal, altera a competitividade da produção de celulose nestas regiões – produzir celulose passa a ser um negócio literalmente energético. Ainda neste contexto, encontra-se o tema dos biocom-bustíveis. São lançados grandes metas e ambiciosos programas de pesquisa, envolvendo iniciativas governamentais e empresariais. A tecnologia de produção das chamadas biorefinarias provavelmente ainda não assegura amplos retornos financeiros, porém, os compromissos políticos visam mudanças estruturais no médio prazo, incentivando o produtor rural e a indústria. Ainda neste tema político e cultural, os consumidores tornam-se mais exigentes quanto às credenciais ambientais dos produtos de base florestal. Basta observar a rápida evolução da importância dos selos verdes e das

diversas demandas sociais, associadas a grandes projetos de investimento, para constatar que a competitividade da indústria está hoje intimamente relacionada à sustentabilidade – e principalmente ao sucesso do tom do diálogo entre a indústria e a sociedade. Migração Industrial: O fenômeno da migração industrial está diretamente relacionado ao crescimento do mercado Asiático - leia-se China, e ao acesso às matérias-primas florestais competitivas - leia-se Brasil e plantações de rápido crescimento. Assim, o capital e, conseqüentemente, a indústria migram para estas regiões, na busca por maiores retornos. Isto comprova claramente as projeções da consultoria estratégica e industrial da Pöyry: até o ano 2020, mais da metade do consumo e da produção mundial de papel deverá ocorrer nas economias emergentes. Ao mesmo tempo, a celulose provinda de plantações de alto rendimento, principalmente as de eucalipto, ganhará espaço. Países como o Brasil beneficiamse em várias perspectivas. Sendo o mercado regional relativamente pequeno e a competitividade da produção de fibras alta, a indústria ainda é essencialmente exportadora. Outra realidade importante diz respeito ao acesso a mais avançada tecnologia de plantações florestais do planeta, criada, desenvolvida e aperfeiçoada no Brasil. A competitividade florestal e agrícola do Brasil é evidente. A continuidade destas vantagens comparativas, porém, está na agenda dos investidores. Fazendo um breve paralelo histórico entre o sucesso comercial e tecnológico de algumas culturas agrícolas (soja, cana-de-açúcar) e florestais (eucalipto, pinus), percebese que a rentabilidade do negócio está ligada, essencialmente, ao acesso à terra, à tecnologia genética e à competitividade logística e estrutural. No futuro, veremos se intensificar a concorrência provinda de plantações florestais em outras regiões – nota-se hoje interesse crescente por investimentos na África ou até mesmo em algumas regiões da própria China. Também no Brasil, as culturas (agrícola ou florestal) e os países que vierem a oferecer maiores retornos ao capital (e previsibilidade de riscos) atrairão a atenção dos investidores. Em 1864, o filosofo inglês Herbert Spencer promoveu o princípio da “sobrevivência do mais apto” – a globalização da indústria de base florestal parece seguir regras semelhantes ao processo de seleção natural.


OpiniĂľes jun-ago 2007

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Mercado

Opiniões

jun-ago 2007

Antonio Tadeu Giacomet

Diretor Comercial da Braspine Madeiras

Tadeu Giacomet

Mercado Internacional de Madeiras O Mercado Internacional de Madeiras está passando por transformações importantes na maioria dos segmentos e na maioria dos mercados, provocadas por diversos fatores, como ambiental, tributário, cambial, vespa da madeira, tempestades, retração do consumo em mercados importantes, etc... Por um lado, temos uma dramática retração no consumo de produtos de madeira no maior mercado mundial, o norte-americano, da ordem de 25 a 30%, provocada, principalmente, pelo forte ajuste pelo qual está passando o setor de construção civil daquele país. Esta situação não deverá ser revertida, senão em médio e longo prazo. O número de novas moradias, que era da ordem de 2,1 ou 2,2 milhões anuais, agora se situa ao redor de 1,5 milhão, provocando um brutal ajuste, num espaço de tempo relativamente curto. Como consequência desta grande retração do consumo, vivencia-mos nos últimos 12 meses um ajuste sem precedentes nos preços de todos os produtos de madeira naquele mercado. As reduções de preços chegaram a ultrapassar a casa dos 50% para alguns produtos, co-mo no caso do OSB. Os volumes comercializados foram também afetados, envolvendo não somente a produção doméstica, como também as oriundas de seus maiores fornecedores: o Canadá, Europa e América do Sul, envolvendo desde madeira serrada até os produtos mais elaborados, incluindo todos os tipos de painéis. Por outro lado, surpreendentemente, noutros mercados como Europa, Ásia e Oriente Médio, observa-se uma situação totalmente diversa do que ocorre no mercado norte-americano.

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A Europa, depois de décadas de baixo crescimento econômico, e o Japão, que desde 1997 estava com sua economia estagnada, agora, estão vivendo uma situação de maior crescimento econômico, com consequente crescimento da demanda de produtos de origem florestal. Do ponto de vista de suprimento, observam-se regiões com excedentes de volumes de toras disponíveis para industrialização, como ocorre na Europa Central e Sul da Suécia, provocados por fortes tempestades que destruíram milhares de hectares de florestas, provocando uma oferta adicional de milhões de metros cúbicos naqueles mercados. O mesmo acontece na Costa Oeste do Canadá, porém provocado por infestação de vespa da madeira. Paradoxalmente, noutras regiões acontece o oposto, como é o caso dos países nórdicos, principalmente Finlândia, Rússia, Países Bálticos, onde há uma forte redução de oferta de toras. Essas regiões já vinham enfrentando, há cerca de 18 meses, uma limitação na disponibilidade de toras. Ultimamente, esta situação se agravou ainda mais, devido às condições climáticas

do último inverno (brando e curto), que não permitiram um nível de extração compatível com a necessidade de consumo das indústrias locais, provocando, inclusive, o fechamento de serrarias e laminadoras de grandes empresas naqueles países. Há um outro fato novo que pode provocar uma grande alteração nos mercados de produtos florestais. Recentemente, a Rússia, que exporta mais de 50 milhões m3/ano, anunciou um cronograma de aumento dos impostos de exportação de toras, que prevê aumentos importantes em julho próximo e em fevereiro de 2008, com ápice em janeiro de 2009. Se esse Imposto de Exportação for realmente implementado, vai gerar grandes transtornos, principalmente a China, Japão e Finlândia, provocando condições favoráveis, no curto prazo, para outros fornecedores não tradicionais, como o Brasil. Em médio e longo prazo a situação pode se reverter, pois isso se supõe que seja o objetivo da Rússia: industrializar mais sua matéria-prima, tornando mais onerosa a exportação de suas toras. Com relação a madeiras tropicais, também está havendo uma redução da produção, provocada, principalmente, por limitação de novas licenças de corte, tanto no Sudeste Asiático, como noutras regiões, tais como, Brasil e África, com conseqüente aumento nos preços dessas espécies. A produção de madeiras nativas no Brasil vem decrescendo anualmente e deve assim continuar, principalmente por motivos ambientais. O mesmo deverá acontecer com a produção de madeiras reflorestadas, envolvendo tanto a madeira serrada como compensada. A exceção fica por conta da produção de painéis reconstituídos, principalmente MDF, que deve duplicar a produção nacional nos próximos dois anos. No mais, continuamos a ver as mesmas situações antagônicas de sempre em nosso país, desta vez com um controle cada vez maior nas

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Equipamentos

jun-ago 2007

Nestor de Castro Neto

Presidente da Voith Paper

Matéria-prima é a maior responsável pelo crescimento do eixo sul

Nas últimas décadas, o aumento da importância do hemisfério sul na produção de papel e celulose alterou drasticamente o cenário competitivo mundial do setor. Para podermos analisar o atual cenário mundial de produção de papel e celulose, faz-se necessário repensar e compreender as mudanças pelas quais o setor passou. Desde o início da história da fabricação de papel, as grandes mudanças em seu processo de produção foram impulsionadas por pressões de consumo, ora suportadas pelo surgimento de inovações e novas tecnologias de produção, ora pela utilização de novas matérias-primas. No final do século XVIII, encontramos a revolucionária mudança no processo de fabricação de papel, concretizada pelo nascimento das máquinas de papel. Nesse momento, a produção deixava de ser uma atividade artesanal, para se transformar em um processo industrial e contínuo de produção.

Em meados do século XIX, já existiam especulações e estudos sobre a utilização das fibras de madeira, em substituição às fibras até então utilizadas como matéria-prima para a fabricação de papel, provenientes de farrapos de tecidos. A idéia mostrava-se promissora, mas ine-xistiam processos industriais que permitissem o desfibramento da madeira em larga escala, necessário para sua utilização comercial. Nas últimas décadas desse século, nasceu a Voith e, com ela, o primeiro refinador/desfibrador contínuo para madeira. A utilização da nova matéria-prima permitiu que o mercado papeleiro ganhasse escala, crescesse e se consolidasse. Durante décadas, as fibras celulósicas provenientes das madeiras dos países do hemisfério norte reinaram absolutas. Eram longas, proporcionavam boa resistência e boa aparência ao papel. A situação mudou com o início da II Guerra Mundial. Os fornecedores europeus, canadenses e americanos de fibras reduziram ou paralisaram suas produções. Os mercados consumidores, como a América Latina, ficaram desabastecidos. Apesar de já existirem produtores locais, a demanda era maior que a oferta. A pressão pela busca de soluções impulsionou alguns empreendedores a agir. Surgiram os reflorestamentos e o investimento na cultura de novas espécies, como o eucalipto. Apesar da boa adaptação

Nestor de Castro Neto

licenças de corte na região norte do país, por motivos ambientais. Paradoxalmente, assistimos a uma imposição de maiores dificuldades para o plantio de florestas no sul do país, notadamente no Rio Grande do Sul, onde já se fala na criação de um ”deserto verde” para o plantio de eucaliptus, ora em andamento naquele estado, sem contar na constante afronta de invasores do MST, movimento anárquico que, infeliz-mente, conta com proteção e am-paro governamental. Já é hora de nossas autoridades pararem de nadar contra a correnteza. Exatamente quando tudo nos indica que o hemisfério sul está prestes a ter um papel cada vez maior no setor florestal mundial, é que se deve oferecer menos burocracia e mais segurança aos investidores deste setor que, por natureza, é de maturação a longo prazo. Finalizando, aqui vai um desabafo de um exportador “desamparado e desesperançado”. Além de todos os problemas e riscos inerentes do negócio, acima mencionados, os exportadores brasileiros estão sendo dizimados, um de cada vez, em conseqüência da maior barbaridade que já aconteceu neste país, nos últimos 500 anos. Trata-se da manutenção das atuais taxas de juros, em patamares exor-bitantes pelo Banco Central brasileiro, exatamente num momento em que existe uma abundância de liquidez financeira no mundo todo, o que provoca um fluxo cambial especulativo, sem precedentes, de recursos externos, que busca e consegue um rendimento 100% superior ao obtido noutros países decentes e organizados. Provocando, com isto, uma valorização astronômica de nossa moeda. E, o mais impressionante é que não se vê nenhuma efetiva e firme manifestação de nossas entidades de Classe, Federações e Confe-derações das Indústrias e do Comércio, como se tudo estivesse dentro da normalidade. Não podemos perder de vista que depois da bancarrota dos exportadores, virão os importados, muito mais baratos, que levarão nossos empregos para o outro lado do mundo, como já está acontecendo em diversos setores produtivos.

Opiniões

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Opiniões

Nestor de Castro Neto

jun-ago 2007

ao clima da América Latina e da alta produtividade alcançada, que pode chegar a 60 metros cúbicos por hectare por ano, contra apenas 7 metros cúbicos por hectare por ano das madeiras produzidas no hemisfério norte, a fibra curta dificultava sua utilização para a produção de vários tipos de papel, considerando as tecnologias de produção existentes naquela época. De certa forma, isto fez com que o desenvolvimento da aceitação da utilização da fibra fosse lento. Após a Segunda Guerra, os produtores brasileiros passaram a utilizar a fibra em larga escala para produção, principalmente, de papel tissue e de escrever e imprimir. De fato, somente no final da década de 70, o mercado mundial começou a dar maior aceitação da fibra para a produção de papéis, começando pelos papéis tissue, em substituição dos papéis de fibras longas. A fibra curta (Eucalipto) proporciona uma maciez incomparável, aliada ao fato da maioria das fábricas de papel tissue comprarem a fibra de qualquer maneira (dificilmente são plantas integradas), sua substituição foi mais fácil. Mas, sua utilização na fabricação de papéis gráficos e cartão demorou mais a se consolidar. A resistência à tração mais baixa, porém com qualidade superficial extraordinária, desenhava caminhos promissores para a difusão de sua utilização em outros mercados. A Voith, presente no Brasil há mais de 40 anos, aliou-se aos esforços dos produtores locais, desenvolvendo e adaptando equipamentos e tecnologias, que permitiram a utilização destas fibras em máquinas de maior escala e produtividade. Os resultados foram bons, os papéis gráficos de fibra de eucalipto passaram a ser exportados e, tanto sua formação, quanto sua qualidade superficial, encantaram o mundo. Fabricantes do mundo todo passaram a adicionar porcentagens significativas dessa fibra na composição de seus papéis gráficos e também na camada superficial de cartões, onde as condições de qualidade

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Equipamentos de impressão são imprescindíveis. Mudavam, assim, os padrões para qualidade de formação e de printabilidade dos papéis gráficos e cartões. Lentamente, a fibra de eucalipto aumentava o nível de exigência dos consumidores finais. O consumo e a procura cresceram. O Brasil, por já contar com florestas prontas e clima favorável, e principalmente por ter desenvolvido as tecnologias e técnicos de alta qualidade, atraiu investimentos para novas fábricas de celulose de eucalipto, para atender à demanda mundial, dividida quase que igualmente entre papel tissue e papel gráfico e, em menor escala, para os cartões. A Voith Paper esteve também presente neste processo, fornecendo máquinas e equipamentos de tecnologia atualizada, para permitir o aproveitamento de nosso potencial. Nas últimas décadas, fatores sociais, culturais e políticos alteraram novamente o cenário mundial. A estabilidade no consumo de papéis e a preocupação com o meio ambiente limitaram a quantidade de novas instalações para a produção de papel e incentivaram o fechamento de unidades produtoras de celulose na Europa. No mercado da América do Norte, a baixa rentabilidade da produção de celulose e papel e do mercado financeiro, direcionado a segmentos de consumo, no qual o retorno do investimento é mais rápido, gerou uma falta de investimentos em setores de indústria de base, tais como aço, mineração, papel e celulose, etc. Esta defasagem tecnológica e a competição com países de maior produtividade, como o Brasil, estagnou o mercado e provocou o fechamento de várias fábricas. Na China, o crescimento acelerado da economia acarretou o crescimento do consumo de papel. A Voith Paper tem fornecido e instalado grandes máquinas nesse mercado, mas a falta de matéria -prima é conhecida e inevitável. Nesse cenário, era evidente que a importância dos fornecedores de celulose do hemisfério sul cresceria fortemente e isso não demorou a ocorrer.

Países como o Brasil, Chile, África do Sul e, mais recentemente, o Uruguai, instalaram ou estão instalando as maiores plantas de celulose do mundo. Havia também a possibilidade de o país se tornar grande exportador de papel. Vários estudos foram feitos para a instalação de novas máquinas, principalmente para a produção de papéis de escrever e imprimir no Brasil, voltadas para a exportação. Apesar da alta competitividade em custo e de pessoal das indústrias brasileiras de celulose e papel, e da tecnologia disponibilizada pelos fabricantes de máquinas e equipamentos, todos os estudos esbarraram no custo de logística para exportação de papel gráfico. A desvantagem trazida pelo custo na logística mostrou-se brutal: toda a vantagem competitiva conquistada, com real esforço e investimento, na viabilização dos custos de nossa indústria de papel seria consumida pelos US$ 150 necessários para transportar 1 tonelada de papel gráfico brasileiro para a Europa. Apesar de todo seu potencial natural, é mais rentável ao Brasil exportar celulose, cujo custo de logística de transporte para uma tonelada, do Brasil para a Europa, é de US$ 50. Ficamos quase 20 anos sem investir na instalação de novas máquinas para produzir papel no Brasil, pois os projetos, um a um, foram sendo engavetados. No último ano, ocorreu uma pequena mudança. Recentemente, nasceram novos projetos, em que a competitividade brasileira na matéria-prima fez-se presente, como é o caso do papel cartão, e outro para papéis de escrever e imprimir, para atender à demanda local na América do Sul. Claramente, novas instalações para produção de papel terão maior viabilidade, principalmente, para atenderem ao mercado local, onde a desvantagem da logística passa a ser uma vantagem. O futuro do desenvolvimento e o fortalecimento das empresas produtoras de papel passarão pelo crescimento do mercado interno. Infelizmente, o Brasil, até o momento, não tem acompanhado o mercado mundial.


OpiniĂľes jun-ago 2007

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Opiniões

jun-ago 2007

Tecnologia Carlos Alberto Farinha e Silva

Vice-Presidente de Desenvolvimento da Jaakko Pöyry Tecnologia

Carlos Farinha

Vou-me embora para Pasárgada, lá sou amigo do rei...

As Pasárgadas da indústria de celulose e papel situam-se no hemisfério sul. Porém, em muitos casos, a realidade encontrada pelas empresas que, acossadas pela falta de competitividade doméstica, buscam o sul e o sol, não é tão fácil e agradável. No sul, está o Sudeste Asiático, estão a América do Sul e partes da África e da Oceania. Também se encontram, em boa parte dos destinos, normas governamentais confusas e burocráticas, competidores representados por empresas domésticas altamente competitivas, ambientadas e em expansão agressiva, e, por último, as terras e os sites disponíveis, que não são assim tão fáceis de achar e desenvolver. A afirmação de que o eixo de produção de celulose e papel esteja se deslocando do hemisfério norte para o hemisfério sul, tem de ser entendida dentro das suas limitações e condicionantes.

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Na vida real o crescimento da produção de papel tende a se concentrar perto dos mercados consumidores em crescimento, e a produção incremental de celulose desloca-se para onde as condições são favoráveis ao desenvolvimento de fontes competitivas de fibra. De fato, a maioria avassaladora do crescimento da produção de papel está concentrada na Ásia, principalmente na China, que não esqueçamos, situa-se no hemisfério norte. A exportação maciça de papéis viabiliza-se, principalmente, para as qualidades onde a otimização da estrutura dos custos de produção obriga a fabricação integrada com celulose ou pasta celulósica, e acontece em unidades de elevada capacidade de produção e economia de escala. Por outro lado, é natural a busca por condições competitivas de produção de fibra. A pressão imposta pela rentabilidade, num ambiente globa-lizado, força nas empresas a busca pela emulação dos melhores de seus pares. Estes exemplos de rentabilidade, em se tratando da produção de commodities, como celulose para mercado, ou papéis de produção integrada e de alto volume, tais como papéis brancos não revestidos ou kraftliner, atingem a sua excelência nas unidades modernas de grande economia de escala, baseadas em fibra proveniente de plantações de alto rendimento. O gráfico ao lado representa os custos de produção de celulose de fibra curta branqueada para mercado e a produção cumulativa anual no mundo. No hemisfério norte, as árvores crescem mais lentamente,

porém este é apenas um dos fatores na formação do custo elevado da madeira, que têm levado a sucessivos encerramentos de unidades produtivas, principalmente na América do Norte. Os ativos florestais têm sido, muitas vezes, considerados como mais rentáveis, quando destinados a fins imobiliários ou voltados para o lazer. Este fato, aliado às pressões ambientais e à estagnação do consumo, conduziu à premente necessidade de reestruturação da indústria norte-americana. A busca de maior rentabilidade tem, muitas vezes, conduzido à alienação dos ativos florestais e à transferência dos meios de produção de fibras para outras regiões do mundo, inclusive as situadas ao sul e ao sol. Porém, estas regiões estão muito longe de serem homogêneas. Algumas delas apresentam problemas que dificultam, na prática, a realização do seu potencial no desenvolvimento de fontes de fibra de elevada qualidade e de custo baixo. Vejamos alguns exemplos: As macro-regiões do sul e norte da África apresentam um elevado déficit hídrico. Quase todo o resto do continente apresenta graves problemas sociais, de infra-estrutura e de instabilidade política. Para as bandas da Oceania, berço do eucalipto, encontramos a Austrália, com dificuldades recorrentes de aprovação ambiental dos seus projetos. A área disponível é enorme, porém, grande parte dela com clima de-sértico e muito do restante abrigando ecossistemas delicados e protegidos. A grande fonte de fibra do hemisfério norte situa-se na Rússia. São, principalmente, florestas naturais, localizadas ao norte, com crescimento lento, e a maioria de fibra longa. O volume potencial de corte é imenso, porém a operacionalização é difícil. Não existe no país uma legislação que assegure a posse da terra, ou mesmo que garanta a manutenção das concessões ou os direitos de corte. A infra-estrutura é precária, exigindo investimentos vultosos, inclusive na

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Biotecnologia

jun-ago 2007

Fábio Luis Brun

Diretor da ArborGen Tecnologia Florestal Biotecnologia e produção florestal: oportunidade e desafio no hemisfério sul A demanda mundial por produtos de base florestal está, como muitas vezes previsto, aumentando de forma sólida e constante. O recurso necessário para atender essa demanda poderá advir de forma sustentável, apenas pelo intermédio do uso de florestas plantadas, com o objetivo específico de prover madeira para fins industriais. A aptidão para produção florestal do hemisfério sul, especialmente demonstrado em países como Brasil, Chile, Uruguai e Argentina, vem se confirmando e representando uma oportunidade clara de progresso econômico, social e ambiental, assim como um desafio técnico e regulatório. Há anos, o Brasil é reconhecido como referência em silvicultura e produtividade florestal, mas ainda ocupa uma posição relativamente tímida, quando comparado, como exemplo, aos grandes países produtores de papel e celulose. Essa realidade é produto de uma ampla série de fatores econômicos, políticos e sociais. No entanto, esse comportamento quase coadjuvante do Brasil no mercado internacional vem sendo efetivamente transformado

pelo interesse em garantir ao país uma posição de destaque, mais atuante e influente. A prova dessa afirmação é dada pelos investimentos mais recentes, feitos e anunciados por grandes

empresas do setor. Esses investimentos tornam-se possíveis, em função da expectativa da disponibilidade do recurso básico florestal para produção industrial: alta performance silvicultural, madeira com alto grau de homogeneidade, qualidade físicas e químicas predeterminadas e custo/preço competitivo. É seguro afirmar que as florestas que garantem a combinação de todas estas características são hoje produzidas em larga escala e com grande eficiência no hemisfério sul do planeta e, especificamente, em países latino-americanos, como Brasil, Chile, Uruguai e Argentina. Dentre estes, o Brasil claramente destaca-se em função de seus expressivos progra-

Fábio Brun

logística de exportação. A tecnologia florestal encontra-se ultrapassada e, nas últimas décadas, não foram implementados na região investimentos greenfield significativos. O sudeste asiático tem como sua grande força motora a Indonésia, possuidora de grandes e modernas instalações fabris, mas com um enorme problema de abastecimento de matéria-prima homogênea e de qualidade. As unidades existentes ainda dependem, em boa parte, do suprimento de madeira proveniente de florestas nativas tropicais, em regime de concessões, assim como toda questão ambiental que isso acarreta. Não obstante, a tecnologia florestal, inclusive o desenvolvimento genético de espécies adequadas às condições edafo-climáticas, está longe de atingir o nível brasileiro. Examinando a América do Sul, vemos que o grande ator neste cenário é o Brasil. O resto da região tem bom potencial, mas uma análise rápida mostra que o país com melhor tradição florestal e industrial, o Chile, tem limitações de área disponível. O Uruguai está no início da sua carreira como produtor, mas já conta com uma história atribulada, em relação ao seu primeiro projeto de porte. Grande parte dos vizinhos restantes atravessa um período de turbulência política, que desencoraja iniciativas de maior envergadura. No Brasil, a indústria controla a maioria do seu suprimento de fibras. A área florestal conta com uma longa história de sucesso no desenvolvimento de espécies melhor adaptadas e mais produtivas. Grandes unidades industriais foram implementadas recentemente, ou estão em fase de implementação. O capital humano existe e é competente. Não esqueçamos, porém, as ameaças reais e latentes de movimentos anárquicos que contestam a propriedade privada da terra para usos “capitalistas”, a competição por espaço promovida pelo complexo carvoeirosiderúrgico e pela grande euforia etílica na produção de biocombustível. Esperamos ainda que o esforço para melhoria da logística de exportação venha a se concretizar. As Pasárgadas de fato não existem, pelo menos, não em termos fáceis.

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mas de plantio, como também por deter praticamente todos os recordes mundiais de produtividade florestal, como detalhado no quadro ilustrativo. Os recordes são devidos, em parte, a características dominantes de relevo, solo e clima, especialmente favoráveis à produção florestal, mas também, e principalmente, à aplicação do desenvolvimento tecnológico, derivado de pesquisas produzidas por empresas, universidades e instituições públicas de pesquisa, além da introdução e rápida adaptação de tecnologias desenvolvidas em outros países.

Esse claro diferencial competitivo pode ser agora realçado de forma significativa, com o advento de produtos originários da biotecnologia, como árvores-elite melhoradas, com características de alto valor, introduzidas via transformação genética. O advento do uso em ampla escala da biotecnologia em culturas agrícolas é comprovação irrefutável de uma promessa que se converteu efetivamente em realidade. O consistente incremento de mais de 10% ao ano na área plantada, com culturas geneticamente modificadas em todo o mundo, é a prova cabal de que essa ferramenta tem seus benefícios devidamente comprovados. É seguro afirmar que benefícios semelhantes

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Biotecnologia podem também ser obtidos a partir do uso dessa tecnologia em espécies florestais. Empresas de biotecnologia, como a ArborGen, estão, atualmente, testando e estarão fornecendo ao mercado produtos que contêm características tecnológicas melhoradas ou mesmo não encontradas nas espécies florestais mais co-mumente plantadas na região. Preliminarmente, os produtos a serem disponibilizados no mais curto prazo serão aqueles relacionados com aumento de eficiência no processo industrial, para produção de celulose. Através de modificações feitas no componente “lignina” da madeira, pode-se aumentar o rendimento industrial. Ao mesmo tempo em que se reduz o consumo de madeira por unidade de celulose produzida, incrementa-se o volume total produzido, reduz-se o consumo de químicos no processo e se otimiza o uso e a geração de energia na fábrica. Potencialmente, há a possibilidade de se observar resultados positivos também com branqueamento e qualidade final da celulose. Dessa forma, esses primeiros produtos apresentam vantagens industriais e ambientais bastante relevantes. Outros produtos em desenvolvimento envolvem características, tais como tolerância a estresses am-bientais (frio e seca, por exemplo), redução da rotação e outras características de qualidade de madeira, como densidade e características morfológicas de fibras. Também há a vantagem adicional de se combinar mais de uma ca-

racterística em um mesmo produto, os chamados por stacked traits, nos quais, por exemplo, crescimento volumétrico e rendimento em celulose estariam associados. Muito embora o advento do uso desses produtos possa equiparar as condições de produção de alguns países da América do Sul, notadamente Argentina, Uruguai e Chile, é interessante observar que, em função das características da produção silvicul-tural Brasileira – altamente tecnificada – há uma oportunidade para que o Brasil se beneficie de forma mais ágil, principalmente no que se refere ao uso de biotecnologia aplicada ao eucalipto. Outra distinção dá-se pelo fato de o Brasil ter, recentemente, endossado uma política formal de biotecnologia, como ferramenta de progresso nacional, o que pode caracterizar uma certa vantagem no médio prazo. É importante observar que os mesmos mecanismos e instrumentos tecnológicos que podem habilitar a produção florestal no hemisfério sul a alcançar novos recordes de produtividade e eficiência industrial, bem como manter a condição atual de liderança no setor, começam, entretanto, a serem testados e disponibilizados para espécies florestais, em países com características climáticas menos favoráveis e ciclos de produção tradicionalmente mais longos. A eficiência de instituições regulatórias precisas e confiáveis irá, eventualmente, ditar quais países usufruirão mais rapidamente dos benefícios gerados. O ritmo de experimentação e eventual adoção dessa tecnologia terá papel importante na determinação e estabelecimento das vantagens competitivas e da consolidação da posição ou mudanças nos futuros líderes do setor e da realização plena do potencial produtivo florestal do hemisfério sul.


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Visão Científica Alfredo Kingo Oyama Homma

Alfredo Homma

Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental Amazônia: Manejo ou Reflorestamento?

Há ainda uma longa distância para atingirmos o desmatamento zero, desenvolvermos uma nova agricultura, recuperarmos as áreas que não deveriam ter sido desmatadas e realizarmos um intensivo reflorestamento com finalidade econômica. Segundo a National Academy of Sciences (2006), o mundo consome, atualmente, 67% de madeira proveniente de florestas nativas, que tende a decrescer para 50% (2025) e 25% (2050). Dessa forma, algumas políticas recentes podem estar na contramão da história, ao proporem concessões florestais, quando vários países desenvolvidos e em desenvolvimento estão efetuando reflorestamento em grande escala. O obscurantismo e o culto ao atraso de muitas propostas ambientais, como a ênfase na criação de mega-reservas extrativistas, na concepção de que todo produto florestal não-madeireiro é sustentável, apresenta grandes limitações. Essa insustenta-bilidade econômica vai conseguir, na lógica da extração madeireira, drenar contingentes populacionais de outros locais e transformá-los em territórios políticos, trazendo conseqüências desastrosas no longo prazo. Nesse sentido, muitas Unidades de Conservação, tal qual a linha Maginot, construída pelos franceses para conter as tropas de Hitler, durante a II Guerra Mundial, podem-se revelar ineficazes. A baixa lucratividade dos produtos ditos não-madeireiros fizeram com que muitos produtores optassem pela agricultura, criando reservas extrativistas, sem extrativismo e com grandes desmatamentos.

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A unificação das duas Alemanhas, ocorrida em 1990, depois da queda do muro de Berlim, em 09/11/1989, implicou para a Alemanha Ocidental num aumento de um terço de área, um quarto de população e um sexto de PIB. Mas, para igualar as duas economias, como no princípio dos vasos comunicantes, o governo de Helmut Kohl (1982-1998) criou o imposto da solidariedade, que arrecadou mais de US$ 1 trilhão em uma década, valor que foi revertido para a fusão das duas Alemanhas. As empresas da Alemanha Oriental apresentavam baixa produtividade e eram obsoletas e havia um estrago ambiental que os alemães orientais haviam camuflado. Adequar as empresas aos padrões ambientais da Alemanha Ocidental também causou gastos muito maiores do que se imaginava. É nesse sentido que a perspectiva sobre a Amazônia e o Nordeste deve ser observada na sua inserção com a economia nacional, procurando equilibrá-las com as regiões mais desenvolvidas do país. A prioridade que tem sido colocada não acompanha a magnitude do desafio e da propaganda que se fazem dela, tanto do governo, das empresas privadas e dos organismos internacionais. A insegurança e a perda de controle do governo pelas ações de ONGs, com ramificações externas, que têm como alvo as indústrias de papel e celulose, etanol, transgênicos e soja, obras de infra-estrutura, invasões de propriedades produtivas, contra o livre comércio, a globalização, constituem riscos que assustam qualquer investidor. É de memória bem recente a destruição do laboratório da Aracruz e da invasão irresponsável da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, colocando em risco toda a sociedade. O vácuo do Estado, a insegurança pública e a perda de credibilidade nas instituições públicas colocam a sociedade refém do medo, da impunidade e facilita o controle pelas políticas externas. Há necessidade de se reverter esse quadro, para garantir a segurança de empreendimentos florestais, que exigem uma visão de longo prazo. O grande estoque de madeira sempre tem levado à negligência e ao atraso na busca de soluções poupadoras, no uso desse recurso natural.

Se o nosso comportamento for de utilizar as florestas nativas enquanto for possível, estamos adiando a busca desse equilíbrio desejado. Isso vem ocorrendo na Amazônia, com as guseiras, com as madeireiras, com a agricultura familiar, com os fazendeiros, sempre na crença da inesgotabi-lidade. Enquanto isso, os produtores que plantaram mogno ainda estão impossibilitados de efetuar desbastes, para proceder ao raleamento e de efetuar a comercialização da madeira. É necessário que mais produtores procedam ao plantio, para criar força de pressão, que possa reverter essa medida, tanto em nível interno, como externo. Toda política pública para a Amazônia deve estar voltada para a utilização parcial de mais de 71 milhões de hectares (2006), que já foram desmatados e que constituem a Segunda Natureza. Esta área é três vezes a do Paraná ou mais do que a soma do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Contudo, o PIB da Amazônia Legal é inferior ao do Rio Grande do Sul ou apenas 1,5 vez, ao do Paraná. Isso mostra o potencial agrícola e de reengenharia ambiental que poderia ser obtido transformando em uma Terceira Natureza, com a aplicação correta de práticas agrícolas e de atividades mais adequadas, que muitos produtores já vêm fazendo. A floresta original é a Primeira Natureza. Esta utilização fica neutralizada se for mantida a contínua formação de berçários de áreas desmatadas. Reflorestar exige escala, que não pode ficar no plantio isolado de um hectare de espécie florestal de muitos pequenos produtores. Se cortar, acabou o reflorestamento ou se transformam em meros mecanismos de transferência de fundos públicos, de forma ineficaz. O reflorestamento na Amazônia não deve ser entendido somente para a produção de madeira, em atendimento às guseiras e ao mercado de madeira e celulose. Ele deve abranger a produção de matérias-primas, oriundas de plantas perenes para biocombustível, fruticultura, látex, recuperação de ecossistemas destruídos e como compensação ambiental. O desenvolvimento sustentável é impossível, mas o desenvolvimento mais sustentável é possível.


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Professor de Tecnologia de Celulose e Papel da Esalq-USP

Mudança do eixo da produção mundial de celulose e papel: A análise do assunto requer critério e prudência. O assunto “mudança do eixo da produção mundial de celulose e papel, do hemisfério norte para o hemisfério sul do planeta” pode, em uma primeira análise, ser considerado como simples e até mesmo óbvio, especialmente se contaminado por uma visão ufanista, relacionada ao sucesso da produção de polpa celulósica de eucalipto no Brasil. No entanto, o tema é bastante complexo e envolve não apenas aspectos de custo de matéria-prima, mão-de-obra, tecnologia industrial, mas também aspectos macro-econômicos e fortes impactos sociais, principalmente no hemisfério norte, podendo, em muitos casos, representar desemprego e desencadear políticas públicas protecionistas, como é comum em outros setores da economia mundial. Por estes motivos, a análise do tema deve ser bastante criteriosa, de forma a se evitar um mero exercício de futurologia. O setor de celulose e papel tem mostrado, nos últimos anos, alguns fortes indicativos de mudança no seu perfil, com a consolidação de novos players no mercado global e de um aumento da participação dos países do hemisfério sul na produção mundial de polpa celulósica. Neste ponto, deve-se fazer uma separação clara no que diz respeito à produção de polpa celulósica e produção de papel.

Com relação à produção de polpa celulósica, apesar do forte crescimento da produção no hemisfério sul, a taxas significativamente mais altas que no hemisfério norte, as estatísticas mostram que aproximadamente ¾ da produção mundial de polpa celulósica está localizada no hemisfério norte; no que diz respeito à produção de papel, esta diferença é ainda maior, com cerca de 85% da produção de papel, localizada nos países do hemisfério norte, que são também os principais consumidores. Os números apresentados mostram que a “mudança no eixo da produção mundial de celulose e papel” deverá se dar de forma gradual e com maior ênfase na produção de polpa celulósica. Os aspectos sociais envolvidos são indicativos de que a mudança de eixo dar-se-á muito mais pelo aumento da produção de polpa celulósica nos países do hemisfério sul, do que pela redução da mesma nos países do hemisfério norte. No que diz respeito à produção de papel, essa mudança de “eixo” ainda não está sinalizada. A importância dos países do hemisfério sul na produção mundial de polpa celulósica tem como principal fundamentação o baixo custo de produção de madeira. Fatores edafoclimáticos favoráveis ao desenvolvimento de florestas plantadas, associados a uma tecnologia florestal moderna, onde se consideram componentes genômicos, ecofisiológicos, manejo florestal, entre outros, têm levado a significativos aumentos de produção florestal, com a conseqüente redução dos custos de produção, em especial para algumas espécies do gênero Eucalyptus, que, por sua vez, são matéria-prima para produção de polpa celulósica de fibra curta. Com relação à produção de polpa celulósica de eucalipto, o Brasil ocupa posição de destaque e dados recentes mostram que, em breve, o Brasil deverá ser o país com menor custo de produção de madeira de folhosas, ultrapassando a Indonésia. Ainda no tocante à produção de polpa celulósica, o mercado mundial pode ser divido, de forma simplista, em polpas de fibra longa e polpas de fibra

curta, originárias, respectivamente, de madeira de espécies de coníferas e de espécies de folhosas. O crescimento da produção de polpa celulósica no hemisfério sul está baseado na produção de polpa de fibra curta, oriunda, principalmente, de madeiras de espécies dos gêneros Eucalyptus e Acacia. No entanto, o mercado mundial de polpa celulósica demanda, não apenas polpa de fibra curta, mas também polpas de fibra longa, que são utilizadas, principalmente, para produção de papéis de elevada resistência, destinados a embalagens e neste segmento, as polpas de fibra curta apresentam aplicação restrita. Os países do hemisfério sul, à exceção do Chile, por focarem, principalmente, a produção de polpa celulósica de fibra curta, perdem grandes oportunidades no mercado de polpa celulósica de fibra longa. A título de exemplificação, a produtividade florestal média de espécies do gênero Pinus, plantados no Brasil, destinados à produção de polpa celulósica, é, em média, de 25m3/ha/ano, ou seja, 2,5 vezes superior à produtividade florestal média nos Estados Unidos (10 m3/ ha/ano), e cerca de 6 vezes superior à da Suécia (4 m3/ha/ano). Estes números deixam claro o enorme potencial não aproveitado por alguns países do hemisfério sul, em especial o Brasil, que, pela sua amplitude territorial, poderia ser um importante produtor mundial de polpa celulósica de fibra longa. Os dados referidos indicam ainda que a importância dos países do hemisfério sul no mercado mundial de polpa celulósica efetivamente se consolidará quando similar importância for dada à produção de polpa de fibra longa, como é dada à produção de polpa de fibra curta. Entre os países produtores de polpa celulósica do hemisfério sul, destaque deve ser dado ao Chile, que atualmente apresenta o menor custo mundial de produção de madeira de fibra longa, o que beneficia não apenas o setor de celulose e papel, mas também outros setores da economia relacionados à utilização de produtos florestais, como madeira serrada, painéis à base de madeira e movelaria. Sem dúvida alguma, o sucesso da polpa celulósica de eucalipto é um marco no desenvolvimento tecnológico do setor mundial de celulose e papel, porém, por si só, não pode ser considerado como o fator fundamental de uma futura “mudança do eixo da produção mundial de celulose e papel, do hemisfério norte para o hemisfério sul do planeta”.

Francides Gomes

Francides Gomes da Silva Júnior

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Visão Científica

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María Cristina Area

Professora da Universidad Nacional de Misiones, Argentina

María Cristina Area

Mudança do eixo da produção mundial: Estratégia econômica ou ecológica? Segundo dados da FAO, a produção de polpas de celulose é, no momento, predominante nos países do hemisfério norte. Em 2005, os Estados Unidos foram o principal produtor de polpas, papéis e cartões, a partir da madeira (capacidade instalada de 60.458.000 toneladas), seguido pelo Canadá (27.937.000 t), Japão (15.658.000 t), Finlândia (14.570.000 t) e Suécia (12.752.000 t). Na América Latina, o principal produtor é o Brasil (10.546.000 t), seguido pelo Chile (3.995.000 t) e Argentina (952.000 t). Entre as principais propostas dos grupos ambientalistas sobre a migração das fábricas de polpa e papel para nossos países constam as restrições sobre o desmatamento das florestas e as maiores exigências sobre o controle da contaminação nos países desenvolvidos. Algumas das críticas são válidas e outras se baseiam em informações obsoletas ou limitadas. A indústria de polpas de celulose e as florestas: Quem esteve em países de clima frio reconhece facilmente a vantagem competitiva que possuem nossos países, em relação ao crescimento florestal. Por questões climáticas, a velocidade de crescimento de nossas árvores, em volume de madeira, é perto de quatro vezes maior que nos países nórdicos. Por outro lado, em países como Canadá, Suécia e Finlândia, a indústria de fabricação de polpas para papel apóia-se sobre as florestas nativas, enquanto que em nossos países, baseia-se nas plantações florestais. O tema a discutir é se é nocivo ampliar a superfície florestada, mediante florestas implantadas. As plantações administradas e utilizadas segundo princípios ambientalmente sustentáveis não chocam com considerações ecológicas, mas asseguram sua produtividade constante e sua conservação. Isto significa um aproveitamento sustentável, ou seja, um uso equilibrado do ecossistema florestal, sem produzir danos à produtividade do solo, nem à biodiversidade. Sobretudo, o importante é lograr o equilíbrio entre as florestas naturais e as implantadas. Todas as florestas apresentam benefícios ambientais múltiplos, como a atenuação dos problemas

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da mudança climática. As árvores seqüestram carbono da atmosfera e liberam oxigênio. Esse carbono fica armazenado na madeira e se mantém de modo permanente, se a mesma não for transformada. Somente a parte que se queima devolve à atmosfera o carbono previamente seqüestrado. As plantações florestais também permitem recuperar solos degradados ou erosionados. A indústria de polpas de celulose e o controle da contaminação: As restrições ambientais dos países desenvolvidos surgiram em princípios da década de 1990, como resposta às pressões sociais e governamentais para diminuição da contaminação produzida pelas fábricas. Alguns exemplos das normativas existentes são citados na continuação. Nos Estados Unidos da América, a U.S. Environmental Protection Agency (US EPA), promulgou em 1998, a “Pulp and Paper Cluster Rule”, para proteger a saúde humana e ambiental, reduzindo as emissões tóxicas na atmosfera e na água, coordenando as regulamentações de descargas à água e ao ar. Em dezembro do ano de 2001, uma Comissão Européia (Integrated Pollution Prevention and Control, IPPC) emitiu um documento de referência, em que se estabelecem as Melhores Técnicas Disponíveis para a Indústria de Polpa e Papel (Best Available Techniques in the Pulp and Paper Industry, BAT). Neste documento, encontram-se os aspectos ambientais mais relevantes da fabricação de polpa e papel, a partir de distintos recursos fibrosos, em diferentes tipos de fábricas. As BAT indicam, entre outras coisas, a adequação prática de um processo ou operação particular, para limitar as descargas. O Convênio de Estocolmo sobre Contaminantes Orgânicos Persistentes (Persistent Organic Pollutants, POPS) surgiu em 2001 e foi assinado posteriormente por 151 países (desenvolvidos e em desenvolvimento). Estabeleceu

que as dioxinas e furanos (Os furanos são moléculas semelhantes às dioxinas) formam-se e liberam-se de forma não intencionada, a partir de processos térmicos, que compreendem matéria orgânica e cloro, como resultado de uma combustão incompleta ou de reações químicas. As partes assinantes comprometeram-se a adotar medidas para reduzir as liberações totais derivadas de fontes antropógenas, de cada um dos produtos químicos incluídos, com a meta de seguir reduzindo-as ao mínimo e, nos casos em que seja viável, eliminá-las definitivamente. Os países da América Latina, por sua vez, experimentaram um giro gradual em direção a uma produção industrial mais limpa, o que corresponde a uma conseqüência esperada do desenvolvimento econômico. Contudo, se faz necessário fortalecer as instituições e gerar sólidas legislações e regulamentos ambientais, além de assegurar sua posterior fiscalização. Ainda que a legislação na região, em termos gerais, seja boa, a capacidade de aplicação é, em geral, débil. Conclusões: Por tais afirmações, a eleição de nossos países para a instalação das fábricas de polpa e papel tem fundamentos econômicos, tais como a abundância de recursos naturais e o crescimento florestal. Pois bem, isto nos prejudica? Depende… A execução de uma estratégia de desenvolvimento sustentável deve pôr marco em uma legislação adequada, que inclua monitoramentos e controles apropriados dos meios receptores, e organismos capazes de fazê-la cumprir com eficácia. A habilidade política de nossa classe dirigente enfrenta o desafio de converter estas inversões, em uma vantagem econômica ambientalmente sustentável.


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Visão Científica Antonio Rioyei Higa

Antonio Higa

Professor de Melhoramento Florestal da Universidade Federal do Paraná How to beat the Brazilians

“How to beat the Brazilians”, foi reportagem de capa da revista do Instituto de Pesquisa Florestal da Suécia (Skogforsk News 1, 2006), que apresenta um resumo do ocorrido na Conferência sobre Pesquisa e Desenvolvimento Florestal realizada naquele país. “O Brasil produz celulose de alta qualidade, originada de plantações com eucaliptos geneticamente melhorados ..., colhidos aos sete anos de idade ... e madeira para serraria de boa qualidade, aos doze anos.” disse o diretor do Instituto. Ele complemen-tou ...“até agora, conseguimos e vamos continuar conseguindo bons resultados, reduzindo os custos de colheita ... mas precisamos fazer mais que reduzir os custos, precisamos aumentar a produtividade e adicionar valores à madeira, explorando de forma criativa as propriedades da madeira”... Isso significa que a produtividade das plantações florestais brasileiras está incomodando os competidores internacionais. Isso pode ser facilmente entendido, analisando-se o gráficos ao lado. (Anuário ABRAF, 2007) Na prática, tem-se observado transferências de indústrias não só da Europa, como dos Estados Unidos, para o Brasil. Esse interesse deve-se à existência de uma combinação de vantagens para estabelecimento de plantações florestais, tais como localização na região tropical, onde as condições de clima e solo são favoráveis para o crescimento das árvores, e disponibilidade de terras, com boas características topográficas. Mas, nem sempre a situação foi assim. A produtividade das plantações florestais no Brasil aumentou significativamente nesses últimos 30

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anos, graças às pesquisas desenvolvidas nas áreas de silvicultura, com especial destaque para o melhoramento genético, conforme já é reconhecido internacionalmente. Somente nesses últimos 16 anos, a produtividade média das plantações de eucaliptos aumentou de 26 m3/ha/ano (1990), para os atuais 41 m3/ha/ano. Para o pinus no sul do Brasil, observou-se, no período, um aumento de 25 para 30 m3/ha/ano. Produtividades de talhões comerciais superiores a 60 m3/ano para eucaliptos e 50 m3/ano para pinus, na idade de corte, já são relatados por algumas empresas florestais. Mas, várias perguntas freqüentemente passam pelas cabeças de todos os envolvidos, como: Até quanto poderemos aumentar essa produtividade florestal por área plantada? As plantações florestais brasileiras deverão continuar priorizando a produção de biomassa, apostando que o desenvolvimento tecnológico no setor industrial irá contornar as limitações da qualidade da madeira produzida? Plantações florestais com altas produtividades são sustentáveis, sob o ponto de vista socioecológico? Bem, estudos mostram a possibilidade de produtividades superiores a 60 t de matéria seca, por ha ao ano. E, é claro que aumentar mais a produtividade ainda interessa ao produtor brasileiro. Mas, parece que o produtor tem observado que o preço de um metro cúbico da madeira pode ser multiplicado significativamente, dependendo de sua finalidade, que é determinada pela qualidade da madeira.

Assim como na Suécia e demais países no mundo, os novos investimentos em melhoramento florestal, que envolvem o melhoramento genético e o melhoramento das técnicas silviculturais, deverão priorizar a qualidade da madeira no Brasil. Mas, até quanto melhorar a qualidade da madeira? Sabemos que com os ciclos cada vez mais curtos de cortes adotados no Brasil para as plantações de pinus e eucaliptos, estamos produzindo apenas madeira juvenil, que apresenta qualidades inferiores, quando comparada com a madeira adulta. Nesse caso, podemos melhorar a qualidade da madeira, genética ou silviculturalmente, até certos limites. Como os suecos, a criatividade e o desenvolvimento tecnológico industrial deverão contribuir ainda mais para contornar as limitações da qualidade da madeira produzida. Hoje, a madeira engenheirada, como as vigas coladas e painéis, substitue com muitas vantagens as peças de madeira sólida. Por outro lado, devemos considerar que, diferentemente da Europa, a tendência observada no Brasil é de adotarmos o modelo de produção de madeira, baseado no conceito de florestas segregadas, distribuídas de forma a atender a legislação e a paisagem. Basicamente, isto significa que cada propriedade deve ser dividida em “zonas de uso”, com áreas bem definidas para produção (plantações) e para proteção (APPs e Reservas Legais). As áreas destinadas ao estabelecimento de plantações serão constituídas de talhões homogêneos, com genótipos selecionados para maior crescimento e melhor qualidade da madeira. Mas, quais seriam as implicações socioecológicas desse modelo?


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Gladys Margarita Mogollón Briceño

Chefe do Laboratório Nacional de Produtos Florestais da Universidad de Los Andes, Venezuela Transferência da produção de celulose e papel para o hemisfério sul: Entre o céu e o inferno? Nos últimos anos, o mercado mundial de madeira e celulose vem expandindo-se aceleradamente. Isso levou os países do norte, especialmente os da América do Norte (EUA e Canadá) e da Europa, como Finlândia, Suécia, Espanha e Portugal, entre outros, a dirigirem suas vistas para desenvolver suas indústrias em direção aos países do sul, especialmente, os da América do Sul, como Brasil, Argentina, Uruguai e Chile. Levaram em conta o fato da produção nessas regiões oferecer mais vantagens comparativas, em relação ao hemisfério norte, em virtude desses países apresentarem uma infra-estrutura de vias, portos, telecomunicações, mas, sobretudo, água abundante e condições favoráveis de terreno, além dos grandes espaços disponíveis, o rápido crescimento das árvores e a mãode-obra barata. Mas, por outro lado, também no hemisfério norte apresentam-se grandes limitações, devido às poderosas e duras exigências das agências de controle do meio ambiente, assim como a escassez de terrenos aptos ou disponíveis para o estabelecimento de plantações que alimentem a indústria de produção de polpa. Junto a isso, a situação de estagnação econômica, que se deu até muito poucos anos, em algumas regiões da América do Sul, fez com que se visse a implementação dessas plantas, como uma oportunidade para sair de tal estagnação, levando-se em conta que estas se converteriam em geradoras de “progresso” nas zonas on-de estão assentadas, uma vez que constituem fontes de emprego e de desenvolvimento econômico.

O que fez com que a idéia da constituição ou formação dessas plantas nos países da América do Sul tenha sido aceita com beneplácito pela maioria dos habitantes longínquos às zonas nas quais se veio implantando tais plantas e, em outros casos, tenha propiciado uma enorme disputa entre Argentina e Uruguai, pela instalação, neste último, de duas plantas de celulose. Com efeito, o Uruguai, que possui plantas de celulose e papel de mediano tamanho, conta, a partir de 2007, com a gigantesca Botnia de Finlândia, que investirá US$ 1,2 bilhão para elaborar até 1 milhão de toneladas de pasta de celulose anualmente, com previsões de exportações para a China, a Europa e os Estados Unidos. A segunda planta é da empresa espanhola Ence,

Gladys Mogollón

Toda monocultura, seja de espécies florestais, agrícolas ou pastagens, pode aumentar a extração seletiva de nutriente, menor retenção de água no solo e sazonalidade de trabalho. Garantir que as nossas plantações florestais sejam, também, sustentáveis sob o ponto de vista socioecológico é, assim, o grande desafio do setor. Sob este aspecto, é importante considerar que, talvez, a ampliação da oferta de madeira na região centro-sul do país dependa de um novo modelo de desenvolvimento do setor florestal, baseado na incorporação das pequenas propriedades rurais na cadeia produtiva da madeira. Atualmente, apenas 16% da madeira consumida pelas empresas florestais associadas a ABRAF são produzidas por terceiros, incluindo os programas de fomento. Por ser uma atividade relativamente nova, de maneira geral, os proprietários rurais não tiveram oportunidades de ter qualquer formação técnica, relacionada com o cultivo de espécies florestais de rápido crescimento. Acesso ao material genético melhorado é outra dificuldade normalmente observada. Assim, é importante estabelecer políticas públicas mais efetivas, em nível de pequenas e médias propriedades rurais, disponibilizando material genético melhorado e ampliando a assistência técnica, por instituições oficiais e privadas de extensão florestal, estabelecidas por parcerias entre o governo e as indústrias florestais. Isso possibilitaria criar mais trabalho no campo, diminuir os impactos que grandes maciços florestais provocam na paisagem e melhorar o reconhecimento do papel das plantações florestais altamente produtivas, pela sociedade em geral. Propostas nesse sentido, como o Projeto de Lei nº 1546/03, que cria o Fundo Nacional de Apoio às Florestas Plantadas, aprovada pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, no dia 30/05/2007, devem ser apoiadas fortemente pelo setor. Essa proposta prevê: a expansão da área de plantações florestais em áreas degradadas, com espécies de rápido crescimento, destinadas à produção de madeira; incentivos para os produtores que promoverem a restauração de áreas florestais com espécies nativas da região; submete os projetos de reflorestamento ao licen-ciamento ambiental; e determina que as plantações florestais sejam enquadradas como atividade agrícola.

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Opiniões

Gladys Mogollón

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que investirá 600 milhões de dólares para produzir 500.000 toneladas e, eventualmente, chegar às 600.000 toneladas de celulose. As duas estão situadas na cidade de Fray Bentos, a 300 quilômetros a oeste sobre o rio Uruguai, divisa com a Argentina, em frente à província de Entre Rios, de onde partiram os mais fortes protestos contra estas empresas, que incluíram bloqueios de pontes, afetando não só o tráfico comercial, mas o de pessoas e veículos. Contudo, a partir deste ano e apesar dessas disputas, tudo parece indicar que o Uruguai será competidor nas exportações de celulose. Por todo o exposto, não paira dúvidas de que a indústria de produção de celulose e de papel constitua uma extraordinária fonte de riqueza e desenvolvimento econômico. Por exemplo, durante o ano de 2006, os despachos mundiais de celulose incrementaram-se em 1,75 milhão de toneladas. Deste total, 55% teve como destino o mercado da Ásia, sendo a China o principal país de destino, ao receber a metade desta porcentagem. Os preços internacionais da celulose exibiram, durante o ano de 2006, uma trajetória sustentada pelo aumento de preço, tendendo a se estabilizar perto do final do ano, em particular no mercado de fibra curta, ante a expectativa do ingresso no mercado de novas plantas e ampliações de capacidade, principalmente no Chile e no Brasil. Os preços internacionais da celulose fibra longa (pinho) apontaram, no mês de dezembro de 2006, um aumento de US$ 130 (+ 22%), sobre o preço observado em dezembro do ano anterior. Este importante aumento, como já afirmamos, sustentou-se num aumento da demanda por este tipo de celulose.

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Visão Científica Por outro lado, os preços internacionais da celulose fibra curta (eucalipto) acumularam, até o final daquele ano, um aumento de US$ 80 (+ 14%), em relação a dezembro de 2005, pela mesma razão. Para se ter uma idéia da imensa importância da exploração deste item, para a economia de alguns países da América do Sul, teria que se dizer que a Argentina, o Brasil e o Chile, que são os principais países produtores, exportaram, em 2005, quase US$ 3,5 bilhões em pasta de celulose. Segundo a Câmara de Comércio Uruguaia-Argentina, por ordem de produtores-exportadores, essa cifra separa-se da seguinte maneira: • Brasil: US$ 2.033.620.779 • Chile: US$ 1.204.619.557 • Argentina: US$ 158.812.874 Como se pode ver, são cifras que, para qualquer país do mundo, constituíriam uma grande contribuição para sua economia e desenvolvimento. Pois bem, apesar da grande contribuição que outorga a produção e exportação da pasta de celulose na geração de empregos e na saúde econômica destes países, dentro de suas regiões, não deixou de haver mur-muradores que não concordam que estas plantas produtoras de celulose continuem sendo implantadas em seus territórios. Por exemplo, e a propósito das duas fábricas mencionadas a se instalarem no Uruguai, tanto os habitantes desse país, como os da Argentina - com maior ênfase neste último, participaram de grandes protestos, em virtude de que são da idéia de que a instalação de ambas as fábricas trarão, como conseqüência, a contaminação do leito do rio binacional. Um deles foi o escritor Eduardo Galeano, quem, a propósito de uma mobilização que se realizou contra a instalação dessas duas grandes fábricas de celulose na beira do rio Uruguai, disse estas palavras à multidão, que assistia a mesma: “Há decisões que se tomam em 15 minutos, mas que têm conseqüências durante séculos”. E mais tarde agregou, desta vez se dirigindo às autoridades governamentais: “Antes de tomar uma decisão que nos parece grave e que pode implicar no envenenamento do rio e na redução do pouco

húmus que nos resta na terra, isto que vai apodrecer as águas e secar as terras, que é a experiência triste que deixaram as fábricas de celulose no Chile e na Argentina. Antes de tomar uma decisão… pensem muito no que vão fazer” Outra das razões que alegam aqueles que se opõem à instalação destas fábricas na América do Sul é a de que a monocultura florestal expulsa a população rural, já que ocupa o último lugar na geração de empregos, ou seja, apenas quatro trabalhadores para cada mil hectares. Enquanto seis postos de trabalho são gerados na pecuária, oito da cultura do arroz e, no extremo oposto, 133 trabalhadores para cada mil hectares da horticultura, 165 da vinicultura e 211 da avicultura. Além do que, assinalam que o avanço dos cultivos florestais impede os trabalhadores rurais de continuarem cultivando suas terras, porque ressecam o solo, fazendo as fontes de água desaparecerem, tornando as terras inaptas para a agricultura. Por outro lado, afirmam que os trabalhadores florestais são mal pagos e trabalham em condições de quase escravidão. Também declaram que a monocultura de eucaliptos - principal árvore para a produção de celulose, veio deslocando o cultivo de outros itens, para eles mais importantes, como, por exemplo, os cereais, como trigo, cevada, linho e girassol. Os centros de pesquisas do mundo e da região, desenvolveram, nos últimos anos, tecnologias que permitem a produção de polpa, com padrões “mais amigáveis” com o meio ambiente, isto, contudo, em alguns casos, não é entendido pelos grupos que se opõem à mudança norte-sul. Como se pode ver, existe uma luta de conflitos que, na minha opinião, deve ser dirimida da melhor maneira possível, com a implementação de reuniões entre todas as partes afetadas, que possibilitem a unificação de critérios. O ideal seria que as empresas e os segmentos governamentais, que promovem a instalação destas fábricas produtoras de celulose, reúnam-se com os movimentos ambientalistas e com os segmentos governamentais encarregados da proteção e conservação do ambiente, em honra à produção de pasta de celulose nos países do sul, para que esta produção gerem os menores impactos possíveis ao ambiente e à sociedade, em seu conjunto, e que, no final das contas, haja a maior quantidade de beneficiados, tanto de um lado, como do outro.


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