Manuel Loureiro presidente da Fagricoop, Cooperativa Agrícola e dos Produtores de Leite de Famalicão
“Os produtores de Famalicão estão a viver com muitas dificuldades” Os produtores de leite têm vivido dias difíceis. Mesmo desesperantes. E os famalicenses não são exceção. Tudo por causa do fim do sistema de quotas na produção leiteira, o embargo da União Soviética aos produtos europeus, uma crise generalizada na Europa, a diminuição do consumo e o preço pago pelo leite. Em entrevista ao OPINIÃO ESPECIAL, Manuel Loureiro, presidente da Cooperativa Agrícola e dos Produtores de Leite de Vila Nova de Famalicão, FAGRICOOP, fala das dificuldades vividas pelos agricultores famalicenses.
Sofia Abreu Silva OPINÃO PÚBLICA: As últimas notícias têm dado conta do desespero e falência dos produtores de leite como consequência do fim das quotas na produção leiteira. Como está a atual situação? MANUEL LOUREIRO: O fim das quotas leiteiras foi o maior desastre que eu conheci e o maior erro que se cometeu a nível europeu. À exceção de dois ou três países, todos os outros estão a pagar a fatura das quotas terem terminado. Os produtores de Famalicão estão, como os outros a nível nacional, a viver com muitas dificuldades. Aqueles que estão no grupo Agros, ainda estão a receber um preço razoável pelo leite que produzem, mas há outras empresas em que é um desastre total, que pagam menos de 26 cêntimos, abaixo do preço de custo. Tem sido extremamente complicado. E qual é a situação no concelho de Famalicão? Todos os dias fecham vacarias aqui no concelho. Isto está a atingir uma dimensão que quando se pensar em inverter a situação ficará muito caro ao Estado. Depois vão começar a dar subsídios à toa e surgirão as típicas situações em que em vez de haver investimento, haverá
equivale à totalidade da nossa produção nacional. Portanto, os outros países sobem uma pequena percentagem e sufocamnos completamente. Sem que ninguém faça nada há vários anos, nos outros países, em que há excedentes, os governos subsidiam essa produção e os produtores enviam o leite para cá muito barato e nós não temos para quem o mandar, porque não somos subsidiados. Até mesmo nos Açores estão a subir, terrivelmente, à produção, 10 a 12% ao ano, porque o Governo Regional subsidia a produção e o leite é enviado para cá. Temos, urgentemente, de arranjar soluções.
esbanjamento. Os agricultores trabalham todos os dias até ao prejuízo, porque ficam na esperança de que tudo vai mudar. Mas, alguns agricultores tiveram mesmo de fechar, porque a situação deixou de ser sustentável. Se continuarmos assim, não haverá leite e temos de ir buscálo a outros lados. O Governo vai abrir os olhos para esta problemática muito tarde. Será possível reverter esta situação? O Secretário de Estado manifestou a intenção de colocar rótulos com a origem... Os governantes não precisam de dizer nada, nem de fazer política sobre o assunto. Basta irem a Espanha e copiarem o que se fez lá. É muito simples. Espanha exige que todos os produtos tenham a denominação de origem. Na maior rede de supermercados de Espanha, a Mercadona, encontra 80 a 90 % de produtos nacionais. Foi o próprio Estado que negociou com a Mercadona para que eles comprem os produtos espanhóis. Assim, produtos de denominação estrangeira entram em pouca quantidade, porque existe, de facto, uma lei e fiscalização. Caberia ao Estado proteger o que é nosso? Nos últimos anos o Estado só quer os cidadãos para pagar impostos, mas eu acredito que um dia o Estado vai fazer o que lhe compete, que é defender os interesses dos seus concidadãos. O que se passa neste momento com o leite, de uma maneira muito nacional e patriótica, era fácil de ajudar a inverter. Como é que o Estado poderia ajudar? O problema é o leite importado. Nós, à partida, se formos com um camião de leite para Espanha rotulado como português, teremos lá problemas, mas eles podem entrar no nosso país como quiserem com o seu produto. Nem o próprio Estado compra leite português para as es-
colas, porque naquilo que deveria ser sério não é, e naquilo que poderia fazer para ajudar as empresas do país quer ser muito sério. O Estado diz-nos que o volume de negócios da compra de leite exige um concurso internacional, mas depois acaba por comprar leite com soro à Bélgica e Irlanda e é isso que dão às crianças. A nossa legislação não permite sequer que se faça um leite como aquele que o Estado compra a outros países. A nossa lei não permite, mas o Estado compra esse produto ao estrangeiro. Se fizéssemos esse produto também ganhávamos os concursos, porque o preço baixava drasticamente. Ou seja, um produto que seria para deitar fora é colocado num pacote de leite e é comprado pelo Estado.
A questão do “dumping”, ou seja vender abaixo do preço de custo dos produtos, continua a ser uma questão atual. Não há fiscalização? Se calhar a fiscalização anda pelos pequenos espaços. Nos hipermercados não, porque o dumping tem outros nomes, como promoções e descontos. Na minha opinião, era através das redes de supermercados que poderíamos controlar um bocado os preços. Aqui as coisas deviam ser concertadas ao mais alto nível, com o Estado a As regras não são as mesmas… sensibilizar as grandes superfíNão, claramente. Em vez de um cies para aquilo que se passa no concurso internacional, podería- setor. mos dividir a compra do leite por distritos ou por concelhos, o que Mas, os portugueses não estão a ajudaria o setor. O Estado tem a beber leite português? obrigação de ajudar quem tra- No nosso grupo, Lactogal e balha, pois nos últimos anos só Agros, temos marcas que contiajudou o sistema bancário e pa- nuam a vender porque são margou a agricultores do sul para cas consagradas. O grande pronão trabalharem. blema é que têm uma concorrência muito forte das Mas esta situação de dificulda- marcas brancas, em que o condes na agricultura é europeia… sumidor não sabe o que está lá Para suster esta situação, vamos dentro, porque o leite é importer de criar um modelo, não digo tando. Os portugueses para cono mesmo, mas um que seja se- sumir produtos de qualidade melhante ao das quotas. En- tem de escolher marcas portuquanto não se criar um modelo guesas, como a Agros e outras. que sirva como nivelador da pro- Tem de ser leite produzido em dução, esta situação nunca irá Portugal com denominação PT. funcionar. A Alemanha aumentou 6% à sua produção e se a »»»»»continua França aumentar apenas 5%