Mesa Posta - Largo da Estação

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no largo das Palmeiras


Viver a Cidade Virgínia Fróis

Fazer nossa a Cidade Viver será deslizar no tempo, nas referências que as paisagens produzem em nós, ficções, imaginações. No acto de percorrer os lugares estabelecem-se conexões entre o real e as nossas memórias. Sentir o irregular das pedras que os nossos pés tacteiam com cuidado. Sobrepostas as pedras e os passos, o tempo e as vidas já vividas. Parar muitas vezes e olhar, um espelho que nos devolve a densidade de existir, o aqui agora. Ver. Como é que a cidade move o nosso pensamento e propõe um trânsito do visível para o invisível? O filosofo José Gil, falava a propósito do Livro do desassossego de Bernardo Soares (um outro) de uma névoa sobre as paisagens que nos permitem ver para além do real, como a nossa imagem num espelho nos permite aceder ao duplo que existe em nós. Uma emoção breve, um pulo para o virtual. Por um momento breve o passado e o futuro agora. Emoções... um ver para além de. Por um momento uma visão interior. Pensamos com visões? * (*) A partir da frase final O artista pensa com visões, proferida por José Gil Colóquio “O dia Triunfal de Fernando Pessoa” FCG, Março 2014


“(...) é a zona histórica, tem menos genté, n’é? Muita gente vai para outros bairros novos. Mas eu gosto muito desta zona. Como zona histórica, gosto!”

(à conversa com)

Mestre Salgueiro, de sapateiro a ervanário no Largo das Palmeiras Nídia Fernandes e Filipa Falcão

(O Mestre está pronto para a entrevista - camisa branca engomada e jornal na mão - recebe-nos contente e cordial em sua casa, na Rua da Torre da Machada,.) “Eu vim aqui para esta zona quando tinha 27 anos. Já lá vão tantos anos... Aí à sessenta e tal anos que eu vivo nesta zona.Tomei uma amizade aqui a este lugar que nem vocês fazem ideia! Estabeleci-me ali com uma oficina de

sapateiro. Ali em baixo. Ali estive, ali estive com aquela casinha. Mesmo ao fundo do largo das palmeiras, por aqui do lado direito. O meu pai falou ali com uma senhoria. E de tal maneira foi, que os meus senhorios já morreram três e eu ainda tinha aquela casinha por minha conta. Só há seis meses a despejei. Nã me fazia falta. Eu tinha aquilo como sapataria, depois mais tarde como uma venda de


produtos naturais, como uma ervanária, ali estabelecida ao público. Mas depois fechei aquilo. Fechei porque tinha de ir às plantas, tinha de prepará-las, não podia estar ali para atender os clientes. Olha, comecei a atendê-los aqui (em casa) e fechei a ervanária. Morando ainda nos campos, vim para Montemor aprender a sapateiro quando tinha 14 anos. Mas só aos 17 mudei para Montemor com os meus pais. Já mesmo com 17 anos o meu mestre sapateiro era músico, levou-me para a música! Aos 20 anos primeiro tocava clarinete. Na banda, não era de cor! Depois ao 35 anos abandonei a musica, revoltado contra a situação vigente nesse tempo, era nos tempos duros do governo do Salazar. Eu trabalhava dia e noite como sapateiro, para ajudar a criar os meus irmãos mais novinhos. E era toma, toma, toma até de madrugada. À luz de um candeeiro a petróleo eu ali ‘tava. E assim passei os meus tempos aqui neste Largo das Palmeiras. Fui sapateiro até aos 55 anos.

Pratiquei tudo. Eu sempre fui muito activo! Eu queria tudo! E em tudo não estava bem ser estar lá em cima. Em frente da sapataria também havia uma taberna. As tabernas, a maioria era aqui na zona. Era petiscos, sardinhas fritas, era vinhos e era jogos, era de tudo. Cartas, dominó, jogava-se ao chito, ou chinquilho. Era daquelas balas que não tinham serventia que faziam de chinquilho, e a gente com uma malha: toma, toma, toma. Até nisso eu era campeão! Pois eu aqui neste período, aqui neste largo, tenho umas histórias que nunca mais tinham fim. Esta sempre foi uma zona muito histórica. A história maior que este largo tem foi quando nas invasões francesas. Sabem onde é ali a fotografia do Chapa? O povo correu ali em massa. Os franceses invadiram. O povo coitadinho... a maioria das armas era facas e machados. Foram dizimados, pois. Enfrentaram aqui os franceses durante esses períodos. O Alentejo foi sempre uma provincia agrícola, a principal do país, Montemor não fugia à regra e era um dos centros onde a agricultura mais

estava desenvolvida no sentido de verão. De verão, os trabalhadores rurais não chegavam para as ceifas. Como não chegavam, os patrões disputavam-nos com jornas... um dava X o outro dizia “Olha se queres vir para mim eu dou mais”. Juntavam-se centenas largas de trabalhadores, parecia uma feira. E durante anos juntou-se aqui tanta gente, tanta gente, durante o tempo das ceifas. Mas esses homenzinhos de inverno, coitadinhos! Era fome, fome! Tenho isso tudo escrito, para não se perder. Em poesia. Poesia mas é que rima, eu sou muito exigente para comigo mesmo. Ainda quando eu morava no campo, aqui este Largo das Palmeiras era um encanto! Só visto! O Largo, estas ruazinhas próximas e este largo aqui. Era uma coisa linda, linda. Mercados de peixe, hortaliças e tudo era aqui nesta zonazinha. Os talhos da carne era aqui também, neste largozinho ali em baixo. Era a zona mais povoada de Montemor. Aqueles bairros novos não existiam. Nem muitas casas novas aí à volta. O povo era aqui que se vinha abastecer. Era nabos, era melancia de verão, era tudo aqui. Todos os dias havia um ou outro (vendedor), mas era ao sábado que vinham os fazendeiros de Montemor, que cultivavam os nabos, as couves. Então, a gaiatagem combinava-se, incluindo eu. Não haviam gaiatos gordos, passávamos

todos dificuldades. O terreno era assim (inclinado).Havia ali melancias à venda. Enquanto o homem virava as costas para atender o freguês, um gaiato dava um chuto numa melancia, ela rolava, o outro lá a apanhava (risos). O que aquela malta pensava... (voltando ao ofício de sapateiro) Na houve aqui em Montemor que fizesse calçado assim como eu. Eu fazia sapato para noiva! Ela via pelo

catálogo, escolhia, e eu fazia aquilo tudo, à mão! Fazia botas para montar a cavalo. Mas eu fiz sofrer tanta gente. Dizia que tinha calçado pronto hoje, e na tinha. A freguesia era muita. Ali na minha sapataria, sabe porque é que eu faltava mais? O freguês vinha e tirava a medida para um par de botas d’hoje a quinze dias, eu dizia que sim. Entretanto aparecia-me um homenzinho do campo, que só tinha um par de botas, que descalçava ao sábado à noite, para ir trabalhar segunda-feira, e dizia “Ó Salgueiro, vê lá se me arranjas estes. Se pões aqui umas tomas, umas biqueiras, um pequeno concerto nestas minhas botas até


amanhã, porque eu não tenho mais nenhumas”. Eu nunca dizia que não a ninguém. Socorria os aflitos. Pois chegavam aqueles com dinheiro... faltava. Mas eu cheguei a pontos o rendimento não chegava, e quando tinha 55 anos,

como conhecia a arte de ervanário desde miúdo, pensei cá para comigo: olha, vou arranjar plantas medicinais e vou vender pacotes de chá, de feira em feira aos sábados e domingos, e de semana fico aqui na sapataria. E assim fiz. Mas depois lá fora dava mais do que a sapataria, fechei aquilo. Foi tudo à vida. Depois comecei a fazer todos os mercados e feiras do Alentejo, a vender pacotes de chá, e ao mesmo tempo levava folhetoszinhos com poesias feitas por mim, que as pessoas muito adoravam! Eu sempre tive um gosto grande pela agricultura. Até hoje ainda não perdi

esse gosto, que ainda semeio aqui atrás nos quintais. Ainda semeio, ainda faço aqui para eu comer pois! Aqui neste largo... aqui neste largo. E não tenho ideia de mudar para outro lado. E agora no fim da vida, muito menos. Eu vejo este largo com muita atenção e muita esperança no futuro. Porque aqui este largozinho tem futuro, quanto a mim. Porque as pessoas, principalmente aquelas novas, não ligam mais além àqueles bairros novos, que nada têm para ver. Aquele largo é o baluarte aqui da zona velha, aqui o Largo das Palmeiras! Por aqui passaram muitas cenas que hoje não tenho na memória, mas tenho isso tudo escrito em poesia. Nem vocês fazem ideia, histórias, mas histórias grandes!”

texto adaptado de entrevista ao Mestre Salgueiro, 30 de Outubro de 2014

“Fez sábado oito dias, é que houve qualquer coisa aqui de S. Domingos, e andaram aqui. Por acaso, olha, vim ver! Gostei de ver aquilo. (...) Pessoas que andam na Universidade Sénior. E uma vizinha minha é que disse “Vai ver ali ao Largo!” e eu vim ver, e gostei! Eram os professores a dizerem umas palestras. Coisas que eles disseram, que eu no meu tempo não me lembro nada disso, que isto era o Largo n’a sei de quanto.”

Memórias Curtas 33

Vitor Guita

Janeiro numa das nossas digressões pelo centro histórico da cidade, a certa altura abrandámos o passo e parámos para contemplar, mais uma vez, a antiga Praça da Hortaliça. No tempo da realeza, muito provavelmente devido às touradas que ali tiveram lugar, o largo chamava-se Terreiro do Corro. Depois, os republicanos rebaptizaram o espaço, que passou a ter o nome de Praça Dr. Miguel Bombarda. A maioria dos montemorenses insiste em chamar-lhe Largo das Palmeiras. Há hábitos que dificilmente se desenraízam da alma das gentes.

Movidos, talvez, pela paixão do teatro, sempre que olhamos para o recinto imenso, imaginamos um enorme anfiteatro ao ar livre, uma espécie de theatron dos gregos. Outras vezes, concebemos um palco majestoso, que nem sequer precisa de cenário de fundo. A tela já lá está, naturalmente bela. As palmeiras, essas, substituem, quase na perfeição, as bambolinas e as pernas de flanela


com que se vestem os espaços cénicos. Entretanto, alguém que passou entre nós e as palmeiras chamou-nos a atenção para o velho urinol que esteve ali de plantão, anos a fio. No seu lugar, existe agora um moderno contentor de lixo. Bem vistas as coisas, vai tudo dar ao mesmo! Quando éramos miúdos, o urinol de metal cinzento fazia lembrar um quiosque de venda de bilhetes, revistas e jornais, semelhante àqueles que víamos nas grandes avenidas de Lisboa. Outras vezes, aquela guarita, meio corroída, aparentava ser um posto de sentinela avançado, na defesa do castelo. Fantasias de gaiatos! Afastámo-nos mais um pouco. De tanto recuar, ficámos encostados à porta da Carmina Catita, a mais antiga residente da Praça. Entrámos para conversar. A Carmina, que ainda ajudou a mãe Natália na venda de fruta e hortaliça, falou-nos dos tabuleiros de madeira, alinhados debaixo das palmeiras, sobre os quais se amontoavam os produtos frescos das hortas e pomares. Depois de nos garantir que a sua actual moradia foi, em tempos, um

movimentado café, a nossa anfitriã fez um retrato à lá minuta do que foi, há umas décadas, a antiga Praça. Ali mesmo ao lado ficavam o stand e a bomba de gasolina do Jaime Ernesto dos Reis, o mesmo que patrocinava a tradicional Queima do Judas. Jaime Reis e Hermes Portela engendravam ainda emissões de rádio, que se ouviam em todo o largo, mas também na Pedrista e nas poucas casas que tinham telefonia. Continuámos a rodar o nosso olhar pela velha Praça. Encravada no canto, situava-se a casa do Gabriel da Azinheirinha, que dava para a antiga Rua da Mancebia, onde se guardavam animais e carroças. Do outro lado, junto à esquina, havia o talho e o Café do Isidoro dos Santos, a casa do Ferrinho, a sapataria do Luís Lopes Canas, sempre cheia de aprendizes… Falámos ainda da oficina de latoeiro/ funileiro, que pertencia ao Joaquim M. Nogueira, e de outros estabelecimentos comerciais. A Praça era, sem dúvida, um dos grandes “Shopping Centers” de Montemor.



Sugeriram-me que recuperasse da memória, para contar aos mais novos ou relembrar aos mais esquecidos, uma sigla: P R E C (Processo Revolucionário em Curso) Vitalina Sofio

Esta evocação obriga a sorrir, e acende um brilhozinho nos olhos. Com Abril, os militares do MFA derrubaram o regime fascista e devolveram a liberdade ao povo. Liberdade para homens e mulheres presos por terem ousado lutar e organizar a luta contra o regime opressor; Liberdade para andar na rua, para reunir, para falar, para se exprimir pela arte, para escrever, para ter opinião, para defender o direito a ter direitos;

O fim da guerra colonial, o fim do medo de partir ou ver partir um filho, um companheiro ou amigo para matar, morrer ou ficar estropiado, numa guerra sem sentido; Foi uma explosão de alegria e libertação de energias acumuladas. Toda a esperança foi legítima, todos os sonhos realizáveis; E logo foi tempo de construir, de organizar forças, saberes e vontades, de aprender a viver em liberdade, em democracia.

Elegeram-se em plenários de população, comissões administrativas para gerir Câmaras, Juntas e Casas do Povo; Organizaram-se Comissões de Moradores, de Bases de Saúde, de Mulheres - fez-se alfabetização e animação cultural, construíram-se postos médicos, lavadouros, estradas - puseram-se a produzir empresas e terras abandonadas; Resistiu-se no local de trabalho, na rua e nos quartéis contra inúmeras tentativas, de diversos tipos, que foram acontecendo (entre Setembro de 74 e Novembro de 75) para travar o processo revolucionário; As leis deram cumprimento ao que se ia construindo na vida e passou a haver direito a voto para todos maiores de 18 anos, salário mínimo, direito a férias, direito à educação e à saúde e elegeu-se a Assembleia Constituinte, nacionalizaram-se terras, bancos e grandes empresas, No Alentejo e no concelho de Montemor-o-Novo, iniciou-se a Reforma Agrária, que havia de aumentar a produção, acabar com o desemprego e melhorar a vida em geral ; O PREC terminou com o contra golpe de 25 de Novembro de 75 ,a partir do qual o sentido da Revolução foi

travado, mas sendo ainda aprovada a Constituição em 2 de Abril de 76, que consagrava e ainda preserva no essencial os direitos de Abril. Na Praça Miguel Bombarda ( Largo das Palmeiras ) decorriam nas décadas de 40 e 50 do séc.XX, praças de jorna , onde os capatazes dos proprietários rurais, escolhiam os trabalhadores, a quem iam dar trabalho na semana seguinte, de entre os que aí se juntavam, procurando esse trabalho. O salário era decidido pelos patrões, que o concertavam entre si. Há relatos de várias lutas por trabalho e/ou melhor salário iniciadas a partir destas praças de jorna e terminadas com repressão violenta e algumas com vitórias. Durante o PREC, a Praça Miguel Bombarda e as ruas e outros largos da vila, estiveram vezes sem conta cheios de gente, que reivindicava direitos , festejava conquistas ou denunciava atropelos à Revolução; Nesse tempo, a mesa esteve posta, com o que havia, nas casas, nas cooperativas, nas comissões, para todos os que vieram até Montemor para ajudar na construção da Revolução ou para verem, como era construir um sonho. Encontramo-nos, à volta da mesa, no dia 15 de Novembro de 2014.


“Isto aqui é um pouco movimentado, ‘tamos na zona histórica, n’é? Passa aqui tod’a gente.” “E até já mora além pouca gente. Eu moro nesta rua aqui acima, e morávamos vinte e tais pessoas, e agora não sei se sete se oito pessoas. Umas morreram e outras vão embora, para outras casas n’é?” “Este espaço lembrame dos tempos em que eu era miúdo, com as palmeiras antigas que aí estavam ainda meio curtas. Depois morreram infelizmente, hoje estão substituídas por outras. Mas lembrome sempre deste largo com alguma saudade, como um dos sítios onde eu brinquei com os meus amigos de criança, por aqui... à fisga, aos pardais, tudo brincámos por aqui.”

janela a falar, a discutir.” “Havia mais gente, havia mais trabalho. Agora as pessoas ‘tão a abalar todas, para fora. Só ficam cá é os velhotes e as velhotas.” “Houve uma altura em que havia várias casas fechadas, (…) muitas casas que estavam degradadas. Neste momento as casas estão a ser restauradas e habitadas novamente. Já se nota que existem mais habitantes aqui, a cidade está a renascer um bocadinho aqui deste lado. O facto também daquela rua que dá acesso lá acima ao castelo ter sido toda arranjada, que está espectacular na minha opinião, também traz mais turistas. Volta e meia aparecem por aqui. E acho que é uma pena não haver mais comércio aqui deste lado, para dinamizar a cidade.”

“Á noite durante o verão os meus “A minha casa já foi utilizada para vizinhos, e eu às vezes também, fazer um teatro. O palco estava ali, trazem as cadeiras pr’aqui para as lérias e para essas coisas.” as pessoas estavam ali, e a janela foi utilizada, para fazer, por “No que vivo no dia-a-dia, gosto muito disto” exemplo, um casal num quarto à


“Então, quando foram esses ranchos, fizeram aqui umas barraquinhas, e vendiam utensílios. Depois aqui, assim, era o palco dos ranchos. Por acaso, gostei! Mas isso já foi p’raí há três anos, ou que é. Acho que é de dois em dois anos, mas este ano não vieram. ‘Ver se para o ano vêm. Olhe, foi o que eu adorei, e encheu-se aqui o largo de muita gente de todo o lado.”

A M.I.F. no Largo das Palmeiras Rancho Folclórico Fazendeiros de Montemor-o-Novo

No ano de 2001 teve inicio a 1ª M.I.F. (Mostra Internacional de Folclore), realizada no Parque de Exposições e Feiras com organização do Rancho Folclórico Fazendeiros de Montemoro-Novo e Câmara Municipal de Montemor-o-Novo. Após algumas edições da M.I.F. neste local sentimos a necessidade de trazer este evento para o centro da Cidade, para um espaço histórico, posto isto, e após analisarmos vários espaços na Cidade, concluímos que a Praça Dr. Miguel Bombarda, mais conhecida por Largo das Palmeiras, seria o local ideal para a realização desta Mostra, visto que a sua inclinação seria como um anfiteatro natural. Nos anos em que realizámos a M.I.F. no Largo das Palmeiras inúmeros

Países se fizeram representar, como por exemplo: México, Taiwan, Sérvia, Rep. Checa, Venezuela, Costa Rica, Espanha, França, Polónia entre outros. Podemos assim dizer que este Largo já acolheu gente dos quatro cantos do Mundo. No entanto, com a M.I.F. a crescer de ano para ano e a atingir aproximadamente as 3500 pessoas em cada noite do evento, em 2013 surgiu a ideia de nos deslocarmos para a Praça de Touros, pois teria melhores condições, tanto para a organização, como para o público que poderá assim assistir a este evento mais comodamente. Foram momentos inesquecíveis que passámos neste Largo e esperamos voltar em breve com outras actividades.



CORRO

( Terreiro do )

Jorge Fonseca

- Antiga designação da actual Praça Dr. Bombarda. Nos séculos XVI e XVII era chamada Corro dos Touros, topónimo que tem origem no facto de aí se correrem touros nas festas mais importantes, como o Corpo de Deus. Nessas ocasiões o terreiro era rodeado de bastidas, paredes de madeira que fechavam o recinto em que as corridas se realizavam (1). Em 1624 Duarte Dias tinha “umas casas (...) no arrabalde desta vila no terreiro do Corro onde correm os touros” (2). Em 1718 o juiz e vereadores da vila contrataram com o Mestre pedreiro Manuel Pires “ a reedificação das casas das varandas da Câmara sitas no terreiro do Corro desta vila, por estarem demolidas (...) fazendo três janelas rasgadas de sacada para delas o Senado da Câmara poder ver os touros, havendo-os e mais festas que no dito terreiro se fizerem, fazendo

outrossim uma ou duas casas em cima do vão do touril sobre o arco que tem de permeio para as casas do padre Francisco Pereira da Silva, ficando o vão de baixo livre para nele se meterem os touros, havendo-os.” (3) En 1858 a Câmara determinou a realização, no Corro, do mercado de fruta e hortaliza, tendo para isso mandado terraplenar e arborizar o recinto.(4) Este topónimo foi substituído por Praça Dr. Bombarda em 11 de Outubro de 1910.(5) (1) AHMMN, 2 K 10, f. 53 v. – 1616; Idem, A 1 D 32 - 1672; Idem, A 1 D 33 -1673; Idem, A 1 D 35 - 1676; Idem, A 1 B 77 - 10.12.1718 (2) Idem, 4 K 5, f. 112 – 13.3.1624 (3) Idem, 15 K 2, f. 130 – 31.12.1718 (4 ) Idem, A1 B159, f. 81, 110, 143 v. e 181. (5) Idem, A 1 B 179, f.5

in Toponímia e Urbanismo de Montemor-oNovo (séculos XV – XIX), FONSECA Jorge, ALMANSOR Revista de Cultura, n 14, 2000 p 35, Câmara Municipal de Montemor-o-Novo


Jorge Fonseca

O largo actualmente designado Dr. Bombarda – home-

nagem do município, em Outubro de 1910, ao grande psiquiatra e republicano morto nas vísperas da implantação do novo regime (1) – chamou-se durante vários séculos e até àquela data Terreiro do Corro. Assim aparece já denominado nos séculos XV e XVI (2). No século XVII é quase sempre chamado Corro dos Touros, perdendo nos séculos seguintes esta última particularização. Sabe-se que nele se realizavam, pelo menos do século XV ao século XVII, as corridas de touros promovidas pela Câmara, nomeadamente durante a festa Corpus Christi. Esta celebração, comemorada por todo o país, constituía, na vila, das mais importantes do ano. Segundo parece, os touros usados nas corridas eram guardados num touril que ficava por baixo da casa das varandas, que a Câmara tinha no cimo do largo. Desta casa assistiam as autoridades aos espectáculos. Em 1718 foi arrematada a reconstrução desse edifício, por estar arruinado, ao pedreiro Manuel Pires, que se obrigou a fazer “tres ianellas rasgadas de

sacada para dellas o Senado da Camara poder ver os touros, e mais festas da Camara que no dito tereiro se fizecem (…) fazendo outrosim também huma ou duas cazas en sima do vão do touril sobre o arco que tem de premeio pera a banda das cazas do Padre Francisco Pereira, ficando o vão de bacho livre pera nelle se poderem recolher touros avendo os”. O arrematante ficava a dispôr da posse do edifício e a Câmara da serventia dele na ocasião das festas. Mas no caso de a mesma vir a fazer “cadea e cazas da camara no terreiro dos alimos (o local onde hoje se situam os paços do concelho), e que no tal terreiro se corrão os touros e se façam as mais festas da Camara”, a casa ficaria livre para o arrematante, com a obrigação de um foro anual de um tostão, pago pela Páscoa (3). Banha de Andrade revelou alguns dados com bastante interesse sobre as corridas de touros em Montemor nos séculos XV e XVI (4). Os documentos que refere sobre o uso de touros em pontas são muito curiosos. Por determinação régia não era autorizado correrem-se touros naquela região: “per hordenançam de nossos Regnos he que quaeesquer touros que quiserem correr em corro, que lhes cortem os cornos”. Mas a Câmara, em 1455, pedia em cortes que não fosse obrigada a cumprir essa determinação, a exemplo do que sucedia com Elvas e


Estremoz, e a resposta do rei foi favorável: “A esto responderemos que nos praz que os possaees correr sem lhes cortardes as dictas pontas, sem embargo de qualquer ordenaçam sobrello em contrairo fecta” (5). No artigo nº XII desta série vimos também que foram corridos touros na passagem pela vila da infanta D. Maria, em 1543. O texto aí transcrito não refere o local. Teria sido no Corro? É bem possível. Dentro da cerca da vila, actual “castelo”, é pouco provável, por falta de espaço. O terreiro maior devia ser o “do Pelourinho”, junto à Câmara, que teria reduzidas dimensões. A arte tauromáquica sofreu no século XVI alguns obstáculos. O papa Pio V proibiu, em 1567, que se corressem touros em festas religiosas, por considerar tais actividades “crueis e torpes espectáculos de demónios e não de homens (…) alheios da piedade e da caridade cristã”, apelando aos monarcas para as não permitirem e proibindo os clérigos de a elas assistirem. No entanto, em 1582 Filipe II consegue um breve pontifício permitindo as corridas desde que não fossem em dias de festas religiosas e não implicassem perigo de vida (6). Pelo interesse que poderá ter para se conhecerem as corridas de touros em Montemor há 300 anos, vou alinhar alguns dados que reuni em documentos municipais do século XVII, todos

referentes à festa do Corpo de Deus e de corridas realizadas no terreiro do Corro. Em 1648 correram-se seis touros. A Câmara notificou previamente os indivíduos que, obrigatoriamente, os forneceram à sua custa: os mercadores que abasteciam a vila de “pão de mar” (cereais importados) dariam dois touros, o conjunto dos estalajadeiros da vila e seu termo, um touro, e os outros, três outros indivíduos, que habitualmente eram os rendeiros da Câmara, ou seja, os arrematantes das multas da mesma. Os touros destinavam-se a serem corridos “de copos” (7). Havia um touro, normalmente comprado pela Câmara, destinado a ser morto e repartido pelos pobres. Em 1631 há referência ao “touro que a camara comprou pella festa do corpo de deos e se coreo e matou e deu aos pobres na forma costumada”, o qual fora trazido do termo de Coruche “com suas vacas” por um Leonardo Martins, vaqueiro (8). Em 1672 o Corro era cercado com um “tapigo” de madeira e as ruas que lhe davam acesso obstruídas “com carretas”. Vários indivíduos se encarregavam de “lançar os touros fora” do touril e de os recolher novamente. Veio um toureiro de Benavente, gastaram-se “duas duzias de garrochas de farpa para sortes”, houve charamelas e matou-se também um touro que depois foi esfolado e

distribuído pelos pobres, vendendo a Câmara o respectivo couro (9). Na maior parte dos anos continua a haver referência apenas a um toureiro (10) . Em 1674 a Câmara custeou “três jogos de touros”, o toureiro voltou a vir de Benavente, acrescentando-se uma despesa de 400 reis “do chumbo para o espantalho” (11). Em 1676 além do toureiro houve também “huns mossos que fizerão huas sortes” (12), mas no ano seguinte, havia já dois toureiros, o de Benavente e “outro toureiro mulato de Estremoz que veio a merce”, aos quais se deram “os ferrois de farpa com que toureião os toureiros”.

Na casa chamada das varandas armava-se neste tempo uma “varanda e dossel” (14) e dela a Câmara assistia à festa. (1) – O Dr. Miguel Bombarda, célebre médico e director do Hospital de Rilhafoles, foi morto por um doente mental a 3 de Outubro de 1910. (2) – A.H.M.M.N. – Livro de Vereações de 1503, 1504-A 1 B 3; A. A. Banha de Andrade, Festas e feiras em Montemoro-Novo, ed. Grupo dos Amigos de Montemor-o-Novo, Lisboa 1984. (3) - A.H.M.M.N. – Fundo Notarial, 15 K 2, f. 130. (4) - A. A. Banha de Andrade, Obra citada, p. 46-55. (5) – A.N.T.T., Odiana, Liv. 3, f. 130 v., citado na obra atrás referida. (6) – A. A. Banha de Andrade, Obra citada, p 55. (7) – A.H.M.M.N. – Livro da Ementa de 1645-A 1 B 26. (8) – A.H.M.M.N.

Artigo publicado na Folha de Montemor, coluna Passeio pela História da Cidade


Corre, corre Jaquim! nuno Cacilhas

Sentei-me num banco do Largo das Palmeiras. Era tarde e não estava ninguém na rua. Apenas a luz que permanecia acesa numa janela podia assegurar-me de que não estava completamente sozinho. Sobre as pernas tinha umas folhas de papel, sentia o frio da noite congelar-me os ossos da mão descoberta e mal segurava a caneta entre os dedos. A solidão durou pouco tempo. Uma manada de touros veio a correr desenfreadamente na minha direcção. Nesse preciso momento, um homem sentou-se junto a mim no banco. Começou por dizer que o seu nome era Jaquim do Touro. Depois explicou que não era bem ele que estava ali sentado comigo e disse que eu deveria espreitar com atenção para o meio dos touros e que seria aí que eu o iria encontrar. Vi-o, juro que o vi. Pedi-lhe que me contasse a sua história. - Se os mortos são sempre boa gente, os da quinta geração são de todas a melhor estirpe. É preciso recuarmos ao tempo do avô do avô do avô do avô do seu avô para nos situarmos no contexto em que esta história teve lugar. Não sei porque raio se insiste em chamar a este local o Largo das Palmeiras. Terreiro do Corro, é como é conhecido neste meu tempo. A razão porque estou ali no meio dos touros é uma longa história que farei curta, sem me perder em grandes descrições e sem palavreado mui raro, como me sugeriu. O meu nome já o sabe, assim me chamam porque sou Jaquim e porque fui eu quem criou o maior touro que aqui se encontra. Aquele ali, o Maior. Poderia pensar que a vaca sua mãe havia morrido de alguma doença, mas que fique claro que fui eu que a matei por ordens do patrão. E às suas ordens cozinhei-a num espeto bem grande e

servi-a para o banquete de aniversário da pequena Mariazinha. A filha do patrão fazia apenas dez anos e eu não tinha mais que treze nessa altura. O aniversário era mais uma festa dos pais do que da filha pois, excepto ela, eu era a única criança que ali se encontrava. Talvez por isso, nesse dia, os nossos olhos só descansavam quando se encontravam. E tanto nos fitámos que o patrão mandou o meu pai repreender-me severamente, repreendendo também a sua filha. Passaram oito anos e apenas olhares cada vez mais intensos trocávamos, nem um simples bom dia nos era permitido. O Maior foi crescendo ouvindo os lamentos do meu pobre coração. Contei-lhe que um dia iria precisar da sua ajuda para conquistar a Mariazinha e dei-lhe todos os pormenores, repetia-lhos incessantemente para que não se esquecesse de nenhum quando chegasse esse dia. É hoje o dia. Nenhum homem ou touro irá fazer-me parar enquanto eu correr ao lado do Maior. Quando os touros se encostarem à sua janela, vou conseguir finalmente entregar a carta dos meus votos à Mariazinha. Tão entusiasmado e confiante estava que consegui entregar-lha em mãos, depois de subir à varanda nas costas do Maior, conforme planeado. Já na varanda, reparei que o Maior, cumprida a sua parte do plano, seguiu para longe de mim. A Mariazinha recusou receber a carta, a razão para tal ainda desconheço, e o patrão pôs-se aos gritos. Cornos por cornos, atirei-me da varanda e a queda foi tão grande que parti uma perna. Ali estava eu à mercê dos touros que já me juravam pela pele. Começaram a aproximar-se, ainda houve quem me quisesse salvar mas o patrão gritou da varanda que me deixassem ali ficar. Já sentia o hálito dos bois entrar-me pelas narinas e percebi que o meu fim chegava tão rápido quanto eles. Mas o Maior regressou e afastou-os um a um, impedindo que maior desgraça ocorresse. Descontente com o desenrolar da história, o patrão mandou que me prendessem. Dois militares tentaram aproximar-se para cumprir as respectivas ordens, mas não o suficiente para o conseguir. O Maior não me abandonava e, com zelo, montava a guarda. Todos os outros touros já tinham sido encaminhados para o Rossio menos o Maior. Bem que lhe espetavam pontas afiadas no dorso, o sangue escorria-lhe a fio, eu sentia a sua dor mais do que a da minha própria perna, mas ele permanecia imóvel a meu lado. O patrão ordenou então que me levantasse e que encaminhasse o touro para a Praça do Rossio, dizendo que me perdoaria todo aquele atrevimento. Eu sabia que se me levantasse levaria comigo o Maior para morte certa, mas da morte já


não o conseguiria salvar. Na altura, era isso que se fazia com os touros, agora, no seu futuro, não sei, talvez ainda me conte. Eu era culpado. Fui eu que coloquei o Maior em perigo com o meu imaturo plano inicial. Perante a morte, refazemos a percepção da vida. Eu sabia que agora pouco ou nada poderia fazer, nada remediaria a situação em que nos encontrávamos. Era enorme a dor que sentia quando espetavam uma e outra vez as lâminas afiadas no dorso negro daquele que me protegia. Eu apenas queria que tudo terminasse depressa. Levantei-me sobre uma perna, apoiei-me nos cornos do meu amigo e caminhámos juntos. Ouviam-se vozes, gritos, uns choravam outros riam. Deixei de ouvir as pessoas. Éramos dois a percorrer o mesmo caminho. Para mim, não haviam mais razões para continuar a viver entre os homens. Temia que nem a Mariazinha fosse a Mariazinha para quem eu escrevera a maldita carta. Entrámos no Rossio lado a lado, e decidi colocar-me entre o Maior e qualquer homem que viesse de capa e de espada na mão. Ele chegou e eu lancei-me com toda a minha raiva para cima dele. Sujei-lhe a roupa brilhante com o sangue do Maior e ordenei-lhe que se afastasse. Mas o grande toureiro ignorou os meus apelos e começou a tourear-me como se fosse eu a besta. O Maior investia contra a capa vermelha e errava sempre o alvo, eu consegui dar-lhe dois murros bem assentes no focinho, mas a perna traiu-me e caí. O cobarde aproveitou a ocasião, colocou a capa no meu nariz e espetou a ponta da espada nas minhas costas, matando-me de morte lenta e dolorosa. O espectáculo foi sem espectáculo. O público não gostou. Naquele momento, pude sentir a compaixão da multidão. Já ninguém aplaudia, apenas apupos e assobios ecoavam enquanto a Praça se ia esvaziando, tal como o sangue do meu corpo. Tentei erguer-me para ver melhor quem era a pessoa que vinha na minha direcção. Era a Mariazinha. Corria velozmente, gritava algo que eu mal conseguia entender mas creio que me perguntava pela carta, quando o Maior investiu. Deitou-a ao chão e cravou várias vezes os cornos agudos na tenra carne. Vi a vida esvair-se-lhe nos olhos quanto nos fitávamos uma última vez. E depois ouvi alguém gritar – corre, corre Jaquim!...

Montemor-o-Novo, Outubro, 2014


“Esta zona é considerada uma aldeia. Ou seja, tudo se conhece, tudo se trata por “vizinhos”, ajudamo-nos uns aos outros. Da zona de Montemor, para aquele lado é cidade, para aqui é aldeia. Pelo menos é isso que as pessoas me transmitem. A forma como se convive, faz-me lembrar uma aldeia. Do outro lado é realmente diferente. As pessoas têm menos à vontade, retraem-se mais. Do outro lado da cidade onde já a população é mais jovem, não é tão envelhecida como aqui deste lado. Cada um faz a sua vida sem dar muita satisfação, sem convívio. Aqui não, aqui é diferente.”


“Eu morei aqui mesmo ao para criar os nossos filhos lado. Casei há trinta e três n’é? Mas era um sítio onde anos, fui morar aqui na rua não me importava de voltar, da Torre da Machada. Vivi aí porque sinto grande saudade durante seis anos, depois tive desta zona. Esta zona é um filhos, tínhamos uma casa bocado nostálgica, tem um que ‘tava eu e a minha bocado daquilo que eu esposa, (...) num espaço entendo que deve ser a vertente de qualidade que a extremamente mínimo. Também se mudámos para a vida urbana deve ter antes dos grandes centros.“ parte mais nova, para ter melhor comodidade, pronto,


A mesa Receitas de Outono

por Feliciano Varela, Clube Desportivo dos Caçadores de Montemor-o-Novo

Ensopado de Borrego + carne de borrego em pedaços + alho + cebola + louro + sopas de pão Colocar todos os ingredientes em cru a refogar em azeite, incluindo a carne, e deixar cozinhar e apurar. Servir com sopas de pão alentejano.

Migas de Espargos + pão alentejano duro + espargos + caldo/gordura da carne de porco temperada (carne de alguidar) Colocar o pão de molho em água quente, com o caldo da carne temperada. Cozer os espargos, juntar à marinada e levar ao lume, mexendo e virando as migas até ficarem sequinhas/prontas. Acompanha a carne de alguidar.

Pézinhos de Coentrada

+ pés de porco + cebola + alho + coentros + ovos batidos + sopas de pão Refogar a cebola e o alho em azeite e juntar os pézinhos. Quando estão cozidos os pezinhos juntar os ovos batidos, e no final os coentros picados. Servir com sopas de pão alentejano.

Receitas gentilmente cedidas pelo senhor Feliciano Varela, do Clube Desportivo de Caçadores de Montemoo-Novo, reservando os segredos próprios de cada receita da sua cozinha. Para conhecer esses temperos, terá de os ir provar aos “Caçadores”. Casa cheia de 3a a Domingo!

A mezinha : Licor de Poejo

in “Ervas, Usos e Saberes, Plantas Medicinais no Alentejo e outros Produtos Naturais” José Salgueiro

Além de condimento, muito usado em caldeiradas de peixe de rio e outros cozinhados, usa-se também na bebida com o mesmo nome (licor de poejo) e na medicina popular, como nas seguintes doenças: constipações, gripes, tosses e bronquites, doenças de fígado e nas afecções do tipo histérico. Forma de usar: 30 g de planta seca para 1 l de água. Levanta levemente fervura e fica de infusão 10 min. Toma-se 3 vezes ao dia, principalmente ao deitar, doce com mel. Como bebida apreciada em festas e banquetes, decerto que já toda a gente a deve ter provado. Foi aqui em Montemor-oNovo, onde nasceu e morreu de velho um senhor de nome Santana, o inventor desta famosa bebida, que tem apenas o nome de poejo. Outros o quiseram imitar, mas não conseguiram, devido ao paladar que tanta diferença fazia. Hoje a destilaria, embora com mais de cem anos de existência, ainda funciona, mas já muito moderadamente. Até esta data,

são os seus donos os únicos detentores do segredo desta tão famosa e deliciosa bebida, embora existam outras com diferentes origens, como se pode ler nas embalagens de garrafas expostas em qualquer casa da especialidade, bares, cafés, etc. Por curiosidade vou-lhe aqui expor e ensinar uma receita para esta deliciosa bebida, que era de minha saudosa mãe: coloca-se num frasco de vidro dos grandes, que habitualmente se usam para o mel, e que possa levar 1,5 kg de mel, 4 dl de boa aguardente, 2 dl só de álcool, mais a quantidade necessária de poejos secos cortados em muito pequenos pedacinhos, até ficarem cobertos, não ultrapassando o nível do líquido. Fica assim tudo muito bem fechado, durante 25 a 30 dias. Depois, deita-se num tacho grande e mistura-se 1 l de boa água e 1 kg de açúcar e vai ao lume a ferver, até ficar em “ponto de cabelo”. De vez em quando, é mexido. Depois, tira-se do lume e volta-se a tapar o tacho para ficar de infusão até estar frio ou quase. A seguir, é coado ou filtrado e coloca-se numa garrafa bem fechada com rolha de cortiça e fica pronto.


Mesa Posta, nº 3, Novembro 2014 1ª edição ¤ 200 exemplares ¤ ¤ edição e recolha de conteúdos Oficinas do Convento ¤ ¤ ¤ ¤ edição gráfica Miguel Rocha ¤ ¤ ¤ ¤ neste número colaboraram: Tiago Fróis ¤ Nélia Martins ¤ Jorge Fonseca ¤ Nídia Fernandes ¤ ¤ Jorge Gonçalves ¤ Nuno Cacilhas Vitalina Sofio ¤ Vitor Guita ¤ ¤ ¤ Rui Cacilhas ¤ Filipa Falcão ¤ Rancho Folclórico Fazendeiros de Montemor ¤ ¤ Clube Desportivo de Caçadores de Montemor-o-Novo ¤ José Salgueiro ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ 2014 - Município de Montemor-oNovo e Oficinas do Convento ¤ ¤ impressão Oficina de Impressão - Oficinas do Convento e CMMN ¤ Oficinas do Convento - associação cultural de arte e comunicação Carreira de S. Francisco, Convento de S. Francisco7050-160Montemor-o-Novo ¤ oc@oficinasdoconvento.com ¤ ¤ www.oficinasdoconvento.com ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ vi ve r a c i d a d e . o f i c i n a sd o c o n ve n to . c o m ¤ ¤

“Mais festas, que isto é um largo bonito! Fazer umas festinhas! Olhe, eu gosto tanto! E bailes e isso, gosto muito! Mas pronto, n’a fazem, pois porque n’há verbas, eu não sei.” “Ainda sou do meio antigo. Eu gosto muito de ranchos e bailaricos!”


Mesa Posta

Nas zonas rurais de

Montemor-o-Novo, quando chegava o Carnaval, as pessoas punham a mesa. Em cada casa enchia-se uma com comida e bebida, e durante dias, por vezes a semana inteira, a porta aberta recebia os visitantes. As pessoas andavam de aglomerado em aglomerado, de monte em monte, visitando amigos e familiares, encontrando outras pessoas, sempre em volta da mesa posta, de enchidos, doces, pratos tradicionais, vinhos e licores locais. Os acordeões e as gaitas acompanhavam as danças, as conversas, os reencontros e os caminhos. Era a altura de dar tempo para visitar e descontrair, com o inverno no fim a primavera abria porta. Com as transformações que o mundo rural sofreu, com a perda de população e alterações nas actividades agrícolas, este hábito foi caindo em desuso, e hoje em dia já não se faz. Sendo uma prática em relação à qual há bastantes memórias, e havendo um grande carinho daqueles que viveram as mesas postas, vamos procurar novos significados e contextos para o dar, oferecer a mesa e celebrar.


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