Poesia, Filosofia, Novelas & Sarau D´Amor

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A educadora quis aproveitar o momento de alegria do fidalgo para esclarecer um pormenor... Excelência, espero não importunar, mas preciso saber o nome de família da menina, pois, também o pároco precisa de lavrar documento... Luiz António de Souza Botelho e Mourão franziu o semblante, olhou-a de alto a baixo e a fez tremer. Súbito, ele mirou uma imagem de Nª Sª dos Prazeres que estava numa mesinha ao lado da sua mesa de despachos. Olhe, minha cara, não sabemos da família de Sebastianna, apenas que é uma menina brasileira que desejei ajudar a crescer. Peça ao padre lá de Itapecerica que a trate como Sebastianna... dos Prazeres. É um nome lindo, excelência!, celebrou ela bebericando o último gole. E o nome Sebastianna veio de onde?, quis saber. Ah, minha cara, de Sebastião José, o nobre Marquês de Pombal, meu amigo e chefe do governo de Sua Majestade, escutou. Enquanto isso, leu numa folha avulsa sobre a escrivaninha a criação de uma Academia dos Felizes, o que a animou a mais uma pergunta: Vamos ter festa de eruditos, Excelência?... Ele deu uma espiada no papel e disse: Os nossos eruditos e até os das línguas nativas precisam de espaço, devem congregar civilidade, dar exemplos, e até eu preciso disso para reafirmar a autoridade!... Momentos depois, escutou Sua Excelência ordenar: Levem a senhora professora até Itapecerica, agora! *

O certo é que Sebastianna quer saber mais e mais, a sua sede de conhecimentos não tem fim. Mas uma questão está no ar: Gostei muito de ser dos Prazeres, Sebastianna dos Prazeres. E foi o padre que descobriu o meu nome? A educadora não sabe se tem permissão, mas decide dizer a verdade: Minha menina, o Senhor Governador é devoto de Nª Sª dos Prazeres, e como ele também não sabe nada da tua família resolveu chamar-te Sebastianna dos Prazeres. Eh, porque é um milagre estares aqui comigo e tendo a proteção de um fidalgo que é amigo d´el-rey... Sim, senhora, e eu vou rezar todos os dias para a Senhora dos Prazeres!, diz a menina com a determinação que lhe é peculiar e que tanto agrada à educadora. Mais dia menos dia, um ano depois eis que o jovem oficial do Senhor Governador ressurge na casa-escola ao romper da manhã: Venho buscar a senhora educadora e a menina Sebastianna, que vão passar uns dias com o Senhor Governador..., anuncia, e avisa: Não se preocupem, comprarão lá na capital o que precisarem! Ao saber que em um ano deveria de estar diante do fidalgo amigo d´El-Rey, a menina entusiasmou-se aplicando-se ainda mais nos estudos, principalmente na música. Nem mesmo durante a bagunça política provocada por nativos e nobres da terra, os colonos mais velhos, em ato contra a governança, bagunça itapecericana logo aquietada pelo alferes de plantão, louvado publicamente por Sua Excelência, a menina deixou de buscar mais saberes. Uma mente brilhante!, exclamava Esperança. A desordem no terreiro do bairro deixou medo no padre, senhora, e será que esta guerra vai continuar e deixar nós sem comida?, questionou. Um tanto apalermada, boca escancarada de espanto, os olhos a buscar uma invisível bengala para se segurar, a educadora parou na saleta de visitas, onde também tinha a sua biblioteca e que Sebastianna elegera como seu local predileto. Ela pensa como menina-mulher e é só uma menina que acaba de ser alfabetizada..., observou ela. O padre fizera a visita semanal para orar com meninas diante da imagem de Nª Sª dos Prazeres e pediu paz para a ordem pública ainda a bagunça ecoava nos terreiros próximos ao espigão de Itapecerica. E aquele paz e civilidade que trazem a comida e o bem-estar ficou na memória da menina como uma manifestação do medo que o religioso sentia no momento. Ai, fica em paz Sebastianna, tu tens é que estudar, estudar, estudar e rezar, e só!, retornou a educadora do seu espanto. E era o que ela fazia. Por isso, quando viu o oficial de Sua Excelência descer da charrete, sacudir a poeira, e se aproximar da porta, Sebastianna sentiu-se pronta para enfrentar o mundo maravilhoso da Capital dos paulistas.

Parte QUATRO A capital da Capitania restaurada pelo fidalgo da Casa de Mateus nada tem a ver com a velha villa de sam paolo dos campi de piratinin erguida pelos jesuítas no espigão do planalto. As choupanas deram lugar a

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