CARA CARAMBA CARA CARAÔ - HQ da RD

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TÁ TUDO INTERLIGADO

No princípio era a luz. E a vontade. E muita fumaça no ar. E quem diria, que uma década e pouco depois, estaríamos assim hoje: produzindo histórias em quadrinhos, ao som de música popular nordestina e com essa pulsão de vida. Porque sim, o movimento das pessoas que usam drogas mobiliza e faz acontecer. Lança uma nova forma de olhar, constrói pautas acerca de demandas urgentes da sociedade. Diante do modelo imposto de guerra, de genocídio da população negra, indígena e empobrecida do Brasil, o que nos alimenta é a construção e ampliação do viver. Deixamos ecoando em todos os lados: estamos vivas, estamos vivos! Durante esse tempo todo pautamos e viemos a público trazer nossas contribuições e olhares. Aprendendo, errando e acertando. Mas sempre querendo fazer mais e melhor, junto em coletivo, com princípios de solidariedade, escuta e afeto. Entendemos, desde sempre, que não há caminho simples para mudança e para construção do mundo que desejamos: onde as desigualdades possam ser diluídas por oportunidades e igualdade, por informação de qualidade e por uma educação de acessibilidade. Hoje, quando é para falar em organização de pessoas que usam drogas, o mundo poderá falar nas Marchas da Maconha em todo planeta. No Brasil, terão que registrar o I Encontro Nacional de Coletivos e Ativistas Antiproibicionistas. Quem for falar, terá em todo imaginário e afetação a resistência das mulheres feministas antiproibicionistas, que construíram a


Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas, e que também mobiliza a América Latina. Deve se falar sobre a construção da Escola Livre de Redução de Danos e da primeira casa de redução de danos do carnaval de Olinda, bem como sobre o edital emergencial da Escola, no primeiro ano da pandemia do Covid, que gerou muito material e abriu o caminho para a chegada da HQ Cara, Caramba, Cara, Caraô, materializações que estão presentes aqui também, a partir de sua leitura. Em todo lugar, precisarão falar dos espaços para educação entre pares, como o THCine, nosso cineclube andante que circulou em muitos bairros, cidades e comunidades em todo Estado de Pernambuco. Terá às imagens, sons e sensações de todos os Festivais de Cultura Cannábica produzidos e construídos pelas pessoas estigmatizadas e criminalizadas por usar substâncias que chamamos de drogas. No fazer político e na construção da história, estaremos todas nós, usuárias, conectadas pela resistência, pela leitura histórica de nossos papéis sociais e na busca do bem viver, no direito à voz, na visibilidade de nossos corpos e na oportunidade do desenvolvimento, social, psicológico e espiritual. Nossas lutas, elas nunca estiveram desconectadas. Elas foram fragmentadas por um sistema que insiste em nos separar. Por lógicas estruturantes que ousamos mudar, a partir da sabedoria popular, da educação para autonomia e para a liberdade de ser e existir. Somos continuidade da construção de PAULO FREIRE e insistiremos no nosso povo. Pautamos uma mudança no discurso e na forma de fazer política a partir do lugar que tentaram nos roubar e aniquilar. Construímos a resistência por entender que nenhum olhar externo nos define, além de nós mesmas.


Nossa ação direta consiste em levar informação por todos os lados, bombardeando com idéias e fragmentos de futuros possíveis. Com a presença contínua de todos os lados necessários à construção do saber, do viver e do ser. Somos o futuro que construímos hoje e estamos aqui construindo imaginários possíveis, realidades com vitalidade e ação com criatividade e nada irá nos parar. Que venham mais e novos olhares, das pessoas que usam drogas em todo mundo.

PRISCILLA GADELHA MOREIRA é Psicóloga, Supervisora Clínica, CBT em Análise Bioenergética, Redutora de Danos e atua nas Marcha da Maconha Recife Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas Escola Livre de Redução de Danos Libertas Comunidade


CARA CARAMBA CARA CARAÔ, a história em quadrinhos.

A fagulha inicial para esta produção que agora acessas foi de investigar a resposta por trás de uma pergunta. Adianto logo que é forte a certeza de que a gente não conseguiu. Mas a gente se divertiu online (e se cansou de meet e retomou as conversas entre um surto e outro) e abraçou o processo. A pergunta sendo: O que mudou no mundo com a pandemia do coronavírus e as medidas de isolamento social tomadas a partir de 2020? Nos últimos anos, a humanidade viu surgir novas formas de lidar com suas necessidades básicas: trabalhos, estudos, compras, tempo livre, sexo, consumo de drogas... tudo precisou se ajustar a uma nova realidade. Os relatórios estatísticos a respeito dessas mudanças começam agora a ser publicados com mais frequência, cada um que faça suas análises e cruze os dados. Mas quem foram as pessoas que responderam essas pesquisas? A gente conhece pelo menos quatro (ou seis, eu diria) das figuras que estão representadas nos gráficos de “como ficou o consumo de substâncias psicoativas durante a pandemia”. Eles ficaram de cara ( = sem drogas) no começo disso tudo, como todo mundo, mas trataram de dar seus pulos ( = conseguir o que queriam). A partir da instiga proposta pelo Edital Emergencial de Produçao Artística da Escola Livre de Redução de Danos, baseada no Recife, o roteirista Neco Tabosa e o desenhista Raul Souza começaram a registrar conversas com amigos e amigas de diferentes realidades econômicas e partes do planeta a maioria localizada no Nordeste do Brasil mesmo.


Por duas semanas em 2020, uma produtora de cinema que trabalha vendendo canábis legal no Canadá, um surfista aposentado em Olinda, uma filha de santo que mora na periferia de Recife e o ator que interpreta Jesus na Paixão de Cristo do interior da Bahia se encontraram, ainda que virtualmente para trocar ideias sobre suas novas práticas e rituais. Daí Raul desenhou por sei lá quantos meses. O edital da Lei Aldir Blanc deu um gás (e uma cobrada) e fez Raul desenhar ainda mais ainda. Nesse meio tempo, o livro até ganhou um mascote, Ícaro Lumes, que aparece no colo da mamãe Anny Stone numa DM de Inxta. És fera, Charlie! Café no caneco, cervejas no copo, crises de ansiedade, choros no chuveiro e vários beques na mente depois, a saga é finalmente concluída. Isso tudo para dizer que a gente releu agora todo o material pra essa publicação – um aninho depois do primeiro texto pro primeiro quadrinho - e até se confundiu sobre quem deu qual ideia. Ah, parte do processo foi sendo postado à medida que era feito, dá pra surfar na linha do tempo acessando o @hqcaracaramba. Esperamos que você curta - e compartilhe também - essa versão livro eletrônico. Pra ver uma versão impressa acho que vai ser preciso ir até a sede da Escola Livre, porque ficou meio grande essa parada, vamo ver. E agora é oficial: com um filho que cada autor tem a essa altura ((( e mais esse livro ))) só ficamos devendo as árvores plantadas.

Neco & Raul























































*COMO NA FUNÇÃO PROFISSIONAL “BARTENDER” – QUEM ATENDE, QUEM SERVE NO BAR – “BUD” É FLOR, BELOTA DE MACONHA – DAÍ, EM TRADUÇÃO PRA LÁ DE LIVRE: PROFISSIONAL QUE SERVE AS BELOTA









































































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