Guia da Exposição: 50 Livros "A Bem da Nação", autorizados, cortados ou proibidos

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A Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes promove uma mostra de livros de autores nacionais e estrangeiros dos mais diversos assuntos editados e publicados em Portugal durante o Estado Novo.

Algumas destas obras foram impressas clandestinamente, enviadas em remessas encriptadas, que circulavam debaixo do balcão ou que se encontravam dissimuladas entre outras publicações nas prateleiras de editoras ou livrarias. Textos que passaram pelo crivo censório devorados por este instrumento de manipulação de comportamentos e ideias, a censura, que atuou durante os anos de vigência do Estado Novo fazendo com que muitos autores vissem os seus livros suspensos, cortados, mutilados ou proibidos sob a apreciação, muitas vezes subjetiva do seu leitor, o censor zeloso1

Os exemplares que aqui se apresentam são, na sua maioria, primeiras edições autorizadas, com cortes, ou que foram proibidas pela censura. Livros que fazem parte do acervo documental da Biblioteca Municipal de Torres Novas, adquiridos ou doados, conforme atestam os livros de inventário. Em exposição estão também algumas obras que integram os espólios literários de ilustres torrejanos e acervos bibliográficos de associações, que se encontram à guarda da Biblioteca.

Uma biblioteca encerra em si inúmeras histórias dispersas nas estantes das suas salas de leitura e dos seus depósitos. Porém, só uma biblioteca preservada e organizada consegue devolver os livros aos seus leitores, permitindo uma fácil recuperação da informação e utilização do conhecimento. O Catálogo Bibliográfico da Biblioteca Municipal de Torres Novas é o reflexo tangível e organizado de um trabalho realizado nos bastidores. Os espólios que integram o catálogo enriquecem a biblioteca e ampliam a oferta aos utilizadores. Facilitam a leitura, estudos ou pesquisas em diversas áreas. Mas são também uma base sólida para a organização de exposições em que se destacam personalidades, movimentos culturais ou períodos históricos, testemunhos para memória futura, proporcionando assim renovadas oportunidades de aprendizagem. Os livros, que agora devolvemos ao público instruídos pelos relatórios que permitem conhecer as razões porque foram censurados, constituem mais um contributo para o conhecimento sobre um regime repressor e mais um passo para que a História não se repita:

«Mas é preciso, sempre, denunciar o que ela foi e representou. Não se pode esquecer. Para que nunca se repita. Nunca mais se repita a censura e tudo o que simbolizou.»2

[

José Carlos Vasconcelos]

Recebam as nossas boas-vindas a este espaço de liberdade!

1 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 200.

2 Ibid., 488.

1

I. A censura ao livro

Breve enquadramento jurídico-político

«Politicamente só existe o que o público sabe que existe»

[Salazar, 26 de outubro de 1933, discurso proferido na inauguração do Secretariado de Propaganda Nacional]

Mesmo antes da vigência do Estado Novo, ainda em período de Ditadura Militar, a imprensa começa por sentir o peso da censura prévia com o Decreto n.º 12 008, de 29 de julho de 1926. A chamada Lei da Imprensa visava todas as publicações periódicas, folhas volantes, folhetos ou cartazes que tratassem somente de assuntos políticos e sociais. Mais tarde, em 1927, com o Decreto n.º 13725 de 27 de maio, estabelece-se a Lei da Propriedade Científica e Artística, que instituía que a todos era lícito publicar pela imprensa (…) qualquer trabalho literário ou artístico independentemente da censura prévia (…) salvo nos casos excetuados em disposição legal expressa, por motivos de ordem pública.

É com a Constituição de 1933 e com o Decreto n.º 22469 de 11 de abril de 1933, que tinha como finalidade impedir a perversão da opinião pública e defendê-la de fatores que colocassem em causa a ordem moral e social, que a censura prévia é instituída legalmente e aplicada a publicações periódicas, folhas volantes, folhetos ou cartazes e outras publicações que apenas versassem assuntos de caráter político ou social. Ora, se a censura prévia era unicamente aplicada a publicações e livros que tratassem de questões políticas ou sociais, a lei deixava espaço para que editores e livreiros continuassem a publicar e a vender obras que, pelo seu título ou conteúdo, não fossem devidamente explícitas do assunto que verdadeiramente abordavam. Decorrente deste facto, a censura intervinha a posteriori fazendo com que qualquer obra pudesse ser apreendida depois de editada ou publicada, através de rusgas efetuadas pela polícia política a qualquer local onde se vendiam livros ou, inclusivamente, através de denúncias. A propósito é particularmente esclarecedor o relatório da censura assinado e datado pelo Major A. Rogado sobre o livro Aristocratas, de Maria Archer, informando que «este livro foi presente a censura em virtude de um requerimento assinado por uma irmã da autora mencionando que este retratava cenas familiares, “deturpadamente”, principalmente da mãe sob um prisma falso e ofensivo3».

Como o campo de ação da censura na modalidade da dissolução dos costumes era muito restrito, até à reforma de 1936, a circulação e a edição de publicações nacionais e estrangeiras ditas de propaganda política e social contrária ao Estado Novo eram cada vez mais vigiadas. A confirmar esta situação estão alguns relatórios e circulares que eram emitidos a pedido do próprio Presidente do Conselho, estipulando, entre outros princípios, que todos os livreiros remetessem, obrigatoriamente, à Direcção-Geral uma declaração relativa a cada uma das publicações nacionais ou estrangeiras que pudessem ser consideradas leituras imorais ou

3 Cf. Relatório (Ephemera, n.º 2885).

3
Relatório: Ephemera, n.º2885

submetessem à censura prévia originais ou traduções de publicações que pretendessem editar.

A partir de 1936 e nos anos seguintes, a legislação, as circulares e as diretrizes que iam sendo redigidas referentes à atuação da censura, sobretudo no que respeita ao jornalismo, sofreram consecutivos ajustes, cada vez mais rigorosos, consequência do contexto político-social, nacional e internacional. O Decreto n.º 26589 de 14 de maio de 1936, justificado pela necessidade de existirem razões de ordem económica, política ou administrativa, regulava a fundação de quaisquer publicações sujeitas ao regime de censura, bem como a publicação dos anúncios dos serviços públicos e das empresas concessionárias e proibia a entrada em Portugal, a distribuição e venda de jornais, revistas e quaisquer outras publicações estrangeiras que contivessem matéria cuja divulgação não era permitida em Portugal.

Em 1944 a censura tornou-se legalmente num órgão de formação e propaganda política, ficando os serviços integrados no Secretariado Nacional de Informação e Cultura Popular e na dependência direta da Presidência do Conselho. Apoiada pela PIDE, pela GNR, PSP, correios, alfândegas e Governos Civis que controlavam ativamente a divisão e o avanço político da oposição, até 1958 a censura desempenhou um papel preponderante.

De 1958 a 1968 a atuação da censura foi cada vez mais rigorosa, tendo em conta a fragilidade do regime, devido à crescente agitação e contestação política que se fazia sentir no país resultado da eclosão das guerras coloniais, das lutas operárias e da crescente contestação estudantil. Neste âmbito, as diversas circulares, ordens de serviço e novas diretrizes que iam sendo geradas pela Direcção dos Serviços de Censura tornavam cada vez maior a eficácia deste serviço, particularmente na aplicação da censura prévia que «suspendia, mutilava ou cortava as notícias e os documentos da oposição, segundo o critério político mais favorável ao governo4».

A designada “Primavera Marcelista”, período histórico que se inicia com os primeiros tempos da governação de Marcelo Caetano, a partir de 1968, levou alguns a acreditar que a anacrónica atuação da censura iria ser progressivamente suavizada, desde logo porque após dois meses da sua ascensão ao cargo de Presidente do Conselho, Caetano retirou os Serviços de Censura da esfera de influência direta do Chefe de Governo. O relaxamento de alguns instrumentos de controle permitiu, desde 1968, o fomento da edição política com a publicação de vários livros de caráter oposicionista e vinculados a um pensamento revolucionário. Sob este impulso, grande parte da literatura marxista e socialista publicada em Portugal foi editada durante a governação de Marcelo Caetano, dando esperança a alguns editores que começavam então a publicar livros mais abertamente, obras que refletiam problemas sociais tentando alargar o debate político-social em Portugal.

4 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 23.

4

Maio e a crise da civilização burguesa / António José Saraiva.Póvoa de Varzim : Europa-América, cop. 19703

Relatório: Ephemera, n.º 8863

5

Relatório: Ephemera, n.º 6650 e 7595

Neste período, a edição tem um papel de intervenção cada mais forte junto de grupos estudantis e de extrema esquerda, cooperativas culturais, setores católicos oposicionistas e organizações sindicais, apresentando um caminho de novas ideias e ganhando destaque na denúncia da opressão e na luta contra a ditadura, contra a política colonial e contra a imposição de um padrão moral e de bons costumes. Esta conjuntura fazia com que o gesto de «levar um livro político no bolso de um casaco a uma reunião ou para beber um copo, fosse entendido como um ato político5».

Muitas são as editoras que neste contexto de abertura, vinculadas ou não a grupos políticos, tiveram como leitmotiv a atuação política de oposição e contestação, ainda que pelo testemunho de alguns editores esta primavera tivesse sido incerta por ser a época mais perigosa, uma vez que os livros não eram tão apreendidos como antes, mas as consequências eram muito mais graves e mais intimidantes, como interrogatórios dolorosos e a instauração de processos judiciais graves.

Deve-se a este boom editorial de publicações, que colocavam em causa a ordem e os bons costumes, a intensificação da máquina censória.

Em boa verdade, continuaram absolutamente idênticos os princípios básicos e as regras de conduta fixados pelo novo Presidente quanto aos procedimentos dos Serviços de Censura, dando a ideia de continuidade das boas velhas práticas do Estado Novo. Marcelo Caetano afirmava, aliás, que «após quarenta e três anos de existência, a população portuguesa e a geração de jornalistas e escritores que nasceram durante o sistema censório já se encontravam habituados ao regime de censura6». As alterações acabaram por se revestir de um carácter, sobretudo, formal, permanecendo na mesma as estruturas da polícia política e as da censura, apenas com mudanças de nomenclatura: a PIDE passou a chamar-se Direcção-Geral de Segurança e a Censura Prévia ficou a designar-se Exame Prévio.

5 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 450.

6 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 462.

6

Sobre as expetativas goradas quanto à abertura marcelista, no que diz respeito à flexibilidade da atuação da censura, o escritor Urbano Tavares Rodrigues testemunhou, a esse propósito: «não há dúvida de que o salazarismo, com Salazar ou com Marcelo Caetano, foi um regime odioso como odiosa foi a censura7».

A censura termina, felizmente, com a primeira claridade da manhã, a alvorada do dia «inicial inteiro e limpo8», o dia 25 de Abril de 1974. A liberdade de expressão e comunicação são consagradas com a Constituição aprovada em 2 de Abril de 1976:

ARTIGO 37.º (Liberdade de expressão e informação)

1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de se informar, sem impedimentos nem discriminações.

2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.

Ataque às instalações da Censura, sexta-feira, 26 de abril de 1974. Fotografia de Mário Varela Gomes in Portugal Biblioteca Nacional (2022), ob. cit.

7 Ibid., 331.

8 Andresen Sophia de Mello Breyner (2015). O nome das coisas. Lisboa: Assírio & Alvim, 195.

7

II. criterios de censura ao livro

«Dicotomizando, silenciando, distorcendo, a censura impunha o seu perfil de escritor e redigia uma versão apócrifa da literatura portuguesa.»
9

- Leiria, 1952

BMGPL: 24000456

1952 - Processo disciplinar à Tipografia Leiriense Limitada por composição e impressão do livro Bernardino Machado

Relatório: IAN-TT-DSC/26/15

9 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 234.

Bernardino Machado / Vasco da Gama Fernandes .

Diante de obras em que as suas palavras deixassem transparecer desígnios que corroessem os fundamentos políticos, os valores morais e os princípios filosóficos do regime, os relatórios dos censores tentavam sonegar os escritores com os seus pareceres. Juízos como «livro imoral e pornográfico», «subversivos», «índole esquerdista», «francamente amoral», «conveniência ou inconveniência de ser permitido circular», «ofensiva cerrada do autor contra a sociedade estabelecida», «ideias cripto-comunistas», «propaganda anti-alemã», «ideias contra o catolicismo», «contra os bons costumes», «uma obra má», «estilo realista», «propaganda fascista aconselhada», «grande paladino das liberdades dos países africanos» faziam parte do repositório da retórica dos censores.10 Não havendo censura prévia, os livros eram suprimidos da leitura através da sua destruição (as obras a eliminar faziam parte de listagens específicas), da intimação e prisão dos seus escritores. Era evidente que a par da atuação da censura havia um circuito clandestino de livros que circulavam secretamente, que vinham do estrangeiro ou que eram impressos clandestinamente. A polícia política apreendia-os nas tipografias, nas editoras, nas livrarias, nas casas particulares ou através da sua circulação por via postal. No caso da apreensão de livros, o depoimento de Francisco Lyon de Castro, fundador da editora Europa-América, exemplifica de forma paradigmática a atuação da censura: «Pouco tempo depois do meu regresso a Portugal, a sede da Europa-América foi assaltada pela polícia política, a PIDE, que apreendeu 73 000 livros. (…) Na mesma altura foram igualmente proibidos 23 livros por mim editados11». O editor Luís Alves Dias, da Livraria Ler, explica como fazia para vender livros e fugir às perseguições da Direcção Geral de Segurança, já durante a primavera incerta anunciada por Marcelo Caetano: «Fazíamos 5000 exemplares e a tipografia passava a fatura de 1500, ficando com 3500 para vender pela porta do cavalo. Dos 1500 faturados 700 ou 800 eram apreendidos e os restantes já tinham sido vendidos, porque as apreensões vinham três ou quatro dias depois12». Em 1952 é instaurado um «processo disciplinar à Tipografia Leiriense Limitada, por composição e impressão do livro intitulado Bernardino Machado, da autoria de Vasco da Gama Fernandes, sem censura prévia13» e, em 1953, a papelaria Emílio Braga, sediada em Lisboa, foi «punida por expor gravuras coloridas indecentes pelo excesso de nudismo14».

10 Cf. juízos que constam nos diversos relatórios consultados provenientes da Ephemera e IANTT.

11 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 535.

12 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 74.

13 Cf. Relatório (IAN-TT-DSC/26/15).

14 Cf. Relatório (IAN-TT-DSC/26/13).

1953Papelaria Emílio Braga, sediada em Lisboa, punida por expor gravuras coloridas indecentes pelo excesso de nudismo. Relatório: IAN-TT-DSC/26/13

9

Pelos assuntos tratados ou pelo seu conteúdo, a leitura impunha-se aos censores para um exame que determinava se podiam ou não ser objeto de transação, distribuição ou circulação, fundamentado pelo parecer «Autorizado», «Proibido» ou «Autorizado com cortes», tendo como pano de fundo os seguintes critérios: de natureza política e ideológica

Eram proibidos livros ou excertos de livros (que acabariam por ser cortados) que transparecessem críticas ao Presidente do Conselho, a Marcelo Caetano ou outras figuras proeminentes do regime. Eram ainda interditas à leitura obras de pendor republicano, assim como eram inquietações para os censores as lutas de classes, os movimentos e manifestações operárias, a exposição de ideias e teorias políticas, como o anarquismo, o socialismo e o marxismo-leninismo, fazendo com que qualquer título que incluísse a palavra russo ou soviético fosse prontamente proibido.

Ficavam, de igual modo, proibidas palavras como «russificada», «proletariado», «revolução», «oposição», «República», «manifestação», «greves», «sindicalismo» e as expressões «revolução proletária», «de aspecto comunizante», «luta de classes», «anti-militarista», «cripto-comunista» ou «regime republicano».15

Entre tantos relatórios que revelam que estes princípios eram determinantes para a apreciação das obras de carácter literário, em 26/03/1970, o leitor censor José Brandão de Mello, a propósito da edição brasileira da obra Marxismo soviético: uma análise crítica, da autoria do filósofo alemão Herbert Marcuse, sugere a «proibição da obra política-revolucionária do conhecido revolucionário político16». Como tantas outras, a edição desta obra foi proibida e nunca foi editada em Portugal. Os princípios políticos e ideológicos do regime estão patentes nos pareceres dos censores. O relatório relativo à obra Quando os lobos uivam, de Aquilino Ribeiro, é manifestamente evidente no que respeita a esta aplicação dos valores do regime quando se refere, por exemplo, que o autor «intitula este livro de romance, mas com mais propriedade

15 Cf. os diversos relatórios consultados.

16 Cf. Relatório (IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8722).

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8722

10

deveria chamar-lhe romance panfletário, porque todo ele foi arquitetado para fazer um odioso ataque à atual situação política17». As decisões superiores ao despacho quanto a esta obra, que já tinha sido editada em 1958, foram no sentido de não autorizar a reedição, de não serem permitidas críticas em imprensa e de se apreender os poucos exemplares que, possivelmente, existissem. Mais tarde, sob novo despacho superior, em 1969, o livro foi mesmo proibido.

Assumindo-se como antiliberal, antidemocrático, antiparlamentar, conservador, o Estado Novo impunha-se à nação como opositor de vozes dissidentes apologistas do partidarismo e da democracia liberal, permanecendo os comunistas como adversários principais de um regime totalitário. Diferentes grupos oposicionistas ligados a movimentos mais radicais, como o anarquismo, estiveram também sob a mira repressiva da ditadura com enormes dificuldades em atuar na clandestinidade.18 Muitos escritores que manifestavam um pensamento filosófico/ideológico ligado a estes movimentos (comunistas, anarquistas, anarco-sindicalistas, socialistas libertários…) foram presos ou torturados.

É o caso do torrejano Faustino Bretes, destacado militante das causas operárias ligadas ao anarco-sindicalismo, sindicalista, político, escritor, poeta, jornalista e investigador, fundou a União dos Trabalhadores de Torres Novas, em 1920, e o Sindicato Metalúrgico da Construção Civil, em 1924. Escreveu vários textos de natureza diversa e, graças à sua atividade política, foi preso e perseguido. Nas diversas listas de livros proibidos no

17 Cf. Relatório (Ephemera, nº 6282).

18 Cf. Fontes Carlos (2022). O anarquismos em Portugal (1796-2013). Disponível em: https://colectivolibertarioevora.files.wordpress.com/2022/11/anarquismoemportugal.pdf. Acesso em: out. 2024

11
Relatório: Ephemera, n.º 6282

Por uma democracia anticapitalista / Mário Sottomayor Cardia .

Lisboa : Seara Nova, 1973 .BMGPL: DP 17172

regime fascista consta apenas um título proibido da autoria de Faustino Bretes: Ideias do integralismo19. No entanto, encontra-se digitalizado pelo Arquivo Nacional da Torre do Tombo, no fundo relativo à Direcção dos Serviços de Censura, um relatório proibindo a circulação de um outro livro da autoria deste torrejano: A Igreja e a Escravatura, obra editada em 1932.

Portanto, as editoras políticas, ligadas ou não ao Partido Comunista Português (PCP), eram em maior número do que as casas editoriais que não tinham vínculos políticos. Na verdade, para algumas destas editoras, muitas das suas publicações eram concebidas propositada e primordialmente como um instrumento político, permitindo que as «ideias atingissem, por meio desse suporte material concreto, um certo público e se tornassem elementos ativos em processos de atuação e participação social e política20». Exemplo desta atuação foi a editora Seara Nova, considerada como um dos «instrumentos mais contumazes no campo de oposição democrático ao regime de Salazar e uma das editoras mais atingida pela censura21». Por uma democracia anticapitalista, de Mário Sottomayor Cardia, figura cimeira do pensamento e ação política da Esquerda em Portugal, foi um dos títulos editados pela Seara Nova, em 1973, e proibido durante o regime fascista.

São muitos os relatórios da censura referentes ao período entre 1968 e 1974, relatórios que dizem respeito à edição de livros de carácter político, de obras apreendidas pela PIDE, de edições nacionais ou para tradução, demonstrando que com Marcelo Caetano se dá início a um «movimento editorial que acompanhou a rearticulação de setores oposicionistas ligados ao campo estudantil e a grupos oposicionistas22». Neste âmbito, é de salientar alguns relatórios datados desse período:

Idéas do integralismo / Faustino Bretes .Lisboa : Casa dos Graficos, 1932 . -

BMGPL: DP 39158 –Espólio Faustino Bretes

19 Livros proibidos nos anos da ditadura de 1933 a 1974 publicado por José Brandão; Livros proibidos que constam na obra citada de Cândido de Azevedo; Livros proibidos no Regime Fascista publicado pela Comissão do Livro Negro sobre o Regime Fascista; Livros Portugueses Proibidos no Regime Fascista: Bibliografia por Maria Luísa Alvim.

20 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 50.

21 Ibid., 121

22 Ibid., 36

12

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8739

− O comunismo actual, de Waldeck Rochet. Relatório datado de 23/02/1970:

«Trata-se de uma obra de pura propaganda comunista, pela exaltação da doutrina (…) Parece-me, pois, não haver a menor dúvida em que seja de proibir a sua circulação.»

− Cuba est-il socialiste?, de René Dumont. Relatório datado de 2/04/1970, sobre a edição francesa Éditions du Seuil – Paris:

«Este livro é escrito por um marxista (…) que esteve em Cuba a convite de Fidel (…) Confessase bem impressionado com as experiências socialistas realizadas no Chile e em especial no Perú e Colômbia. Livro para proibir (…).»

Outras editoras como a D. Quixote, a Presença, a Afrodite ou a Delfos não estavam vinculadas a grupos políticos, mas a sua linha editorial foi marcada por temas consonantes com uma política de oposição e contestação. Exemplo disso é a coleção Cadernos D. Quixote, editada a partir de 1967, que trazia a público temas da atualidade, geralmente polémicos e provocativos. Um acontecimento relevante associado aos primeiros anos da editora foi a sessão de poesia e de autógrafos do poeta russo Ievgueni Ievtuchenko, reforçando a ideia de ser uma editora com «grande atrevimento político23».

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8742

13
O comunismo actual / Waldeck Rochet ; trad. A. Moscoso Freitas . - Lisboa : Delfos, s.d. . - BMGPL: DP 60827
23 Ibid., 342.

. -

BMGPL: DP 12466

Assim, todas estas editoras tiveram um papel importante na oposição ao regime. Num ambiente de crescente agitação e questionamento que se promovia e se fazia sentir no campo cultural, passaram a ter algum destaque na realidade do país, na denúncia de crimes, arbitrariedades e violências cometidas pela ditadura de Salazar e nos tempos de Caetano. José Sousa Ribeiro, da Editora Afrontamento, referia, a este propósito, que «publicar coisas que não eram controladas era extremamente apelativo, era um desafio. A importância do nosso trabalho foi fazer com que certas coisas se tornassem públicas, que abandonassem a clandestinidade a que estariam reservadas24».

de natureza moral e sexual

Na década de 60, o livro As três sereias, de Irving Wallace, foi alvo de um parecer controverso em que o leitor censor Capitão José Brandão intenta que se «trata de uma obra, pelo conjunto de descrições obscenas e sexuais, à margem da moral: isto é amoral e imoral25». Sob esta apreciação, e a bem da moral, o Estado Novo retalhava obras ou retirava-as do mercado glorificando-se como defensor dos bons costumes, tornando tabus o amor e o sexo e condenando valores considerados desviantes para ambos os sexos.

As três sereias / Irving Wallace . - Lisboa : Portugália, 1965 .BMGPL: SL 11777

24 Ibid., 255.

25 Cf. Relatório (IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8775).

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8775

14
Autobiografia prematura / Ievgueni Ievtuchenko ; trad. Egito Gonçalves .Lisboa : Dom Quixote, 1967

Relatório: AN-TT-SNI-DSC-35-6-8707

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8708

Durante este período, os direitos das mulheres portuguesas foram abafados, circunscritos, diminuídos a par de uma Constituição (1933) que anunciava que o marido era o chefe da família e que detinha a autoridade enquanto a mulher devia desempenhar o papel de mãe, consagrando-se ao lar e à educação dos filhos, a fim de torná-los cidadãos fortes, saudáveis e patriotas, sendo essas as principais competências e obrigações das mulheres.26 A família era idealizada pelo Estado Novo, como tradicional e patriarcal, entendida como o centro nevrálgico de uma sociedade conservadora reprimida por conceitos morais consagrados pela tradição e pela tríade Deus, Pátria e Família. Retenha-se, a este propósito, o relatório de 1970, do leitor censor Dr. Simões Gonçalves, autorizando o livro O mito da masculinidade, de Hendrik M. Ruitenbeek, por «tratar e descrever a posição do homem em relação à sociedade, à família e ao sexo27» e observe-se também o relatório do livro Preconceitos e verdades sobre o sexo, de Frank S. Caprio, em que ficamos a conhecer a impressão pessoal do Coronel Abílio Joaquim Patinho sobre esta edição: «proibir e retirar do mercado por insinuar práticas e costumes contra os quais se devia ter o dever moral de lutar28». Instaurando o Estado Novo a família como uma das suas bases principais e um lugar fundamental nos discursos dominantes marcados por «um movimento de padronização dos preceitos rígidos de uma moral burguesa que atinge a sexualidade29», não é de estranhar que em alguns relatórios de livros censurados seja evidente a repressão aos modelos não-heteronormativos numa época em que a homossexualidade era considerada como antissocial e imoral.

26 Cf. Cova Anne (1997). O salazarismo e as mulheres. Disponível em: file:///C:/Users/helena.ferreira/ Downloads/Dialnet-OSalazarismoEAsMulheres-2656445%20(3).pdf. Acesso em: nov. 2023

27 Cf. Relatório (IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8707).

28 Cf. Relatório (IAN-TT-SNI-DSC-35-6-8708).

29 Cf. Louro Raquel Afonso (2018). Homossexualidade e resistência durante a Ditadura Portuguesa. Dissertação de Mestrado. Disponível em: https://run.unl.pt/bitstream/10362/54183/1/Disserta%c3%a7%c3%a3o_ RaquelAfonsoLouro_MATC.pdf. Acesso em: dez. 2023

15

Veja-se, a título de exemplo, o relatório sobre o livro Escândalo, de Dallas Mayo: «Trata-se de uma novela em que se revela a mais baixa imoralidade. Adultério, homossexualismo, promiscuidade de três na mesma cama (…). Este livro, deve, evidentemente, ser proibido de circular no país30».

Neste universo de censores puritanos, imbuídos de preceitos morais, a Editora Afrodite e o seu ousado e provocador editor Fernando Ribeiro de Mello destacaram-se neste Portugal cinzento, com edições de carácter erótico, claramente com a intenção de chocar e causar polémica. Exemplo disso foi a Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, de Natália Correia, lançada em vésperas do Natal de 1965, prontamente proibida pela censura dado o seu «carácter pornográfico acentuado pelo facto de conter poesias editadas outrora em livros clandestinos considerados apócrifos por muitos estudiosos31.»

Paralelamente, editavam-se e, sobretudo, reeditavam-se obras que se enquadravam na linha editorial conservadora, aplaudida pelo regime, em que as motivações eram a decência, a moralidade pública, a educação da mulher para as suas funções tradicionais, a crítica aos avanços feministas que vinham surgindo ecleticamente. São exemplos autores como Paulo Combes e Emília de Sousa Costa.

Os avanços feministas faziam-se sentir cada vez mais em obras empenhadas em denunciar a condição oprimida da mulher, em realçar a sua emancipação social e sexual e a importância da educação sexual na sua vida. Um dos livros que mais polémica causou foi Novas cartas portuguesas, de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa. Nesta obra as autoras «tratavam em cartas, ensaios, poemas e fragmentos das vidas das mulheres marcadas por condicionalismos de vária ordem, maltratadas, enclausuradas, dependentes, casadas à força, enganadas, exploradas. Não é de estranhar que, em menos de 24 horas, o livro tenha sido retirado do mercado e imediatamente proibido, no dia 26 de maio de 1972: Algumas das passagens são francamente chocantes por imorais (…) constituindo uma ofensa aos costumes e à moral vigente no País. No fim do documento, o censor completa: Concluindo: Sou do parecer que se proíba a circulação no País do livro em referência, enviando-se o mesmo à Polícia Judiciária para efeitos de instrução do processo crime32».

30 Cf Relatório (IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7527).

31 CF. Relatório: Ephemera, nº 7677.

32 Cf. Marková B. C. Tereza (2020). Novas Cartas Portuguesas: censura literária durante o Estado Novo em Portugal. Dissertação de Mestrado. Disponível em: https://theses.cz/id/7dn1n6/Tereza_Markova_DiplomovaPrace_2020.pdf. Acesso em: dez. 2023

16
Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7527

Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica: dos cancioneiros medievais à atualidade / seleção, prefácio e notas de Natália Correia .Lisboa : Ponto de fuga, 2019 .

BMGPL: SL 71287

O livro da espôsa / Paulo Combes ; José Agostinho . - Porto : Educação Nacional, 1934 .BMGPL: DP 04014

Relatório: Ephemera, nº 9462

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Relatório: Ephemera, nº 7677

de natureza social

Os princípios éticos, morais e políticos da trilogia Deus, Pátria e Família eram os eixos principais do regime, encarregando-se a censura de filtrar quem os pusesse em causa. Precisamente porque revelavam as deficiências da estrutura social do regime, a pobreza, as duras condições de vida do povo trabalhador, as desigualdades sociais, que abordassem questões económicas e evidenciassem a difícil vida quotidiana do operariado, dos trabalhadores do campo, a luta de classes e o sindicalismo, as edições neorrealistas eram também alvo deste filtro da censura.

O ataque cerrado que foi feito à literatura neorrealista é motivado pelo facto de os autores neorrealistas e as suas obras estarem profundamente comprometidas com a sociedade que retratam. São alvo de censura, sobretudo, as obras de ficção em prosa ou poesia, de caráter crítico ou sociopolítico e os autores que se alinhavam com um programa estético, literário e político, que expunha a pobreza, o analfabetismo, as condições sociais dos trabalhadores ou a exploração laboral, num país, onde, segundo António Barreto, «eram mais elevadas as taxas de analfabetismo e de mortalidade infantil (…) O mais baixo rendimento por habitante. A maior população agrícola e a menor taxa de industrialização. A menor produtividade por trabalhador e o menor número de pessoas abrangidas pelos sistemas de segurança social33». Muitos foram os escritores neorrealistas amordaçados pela natureza dos assuntos que tratavam nos seus livros e pelo cariz de crítica social das suas narrativas. Escritores como Manuel da Fonseca, Orlando Gonçalves ou Soeiro Pereira Gomes, que trouxeram para o plano literário camadas sociais que eram ignoradas e desfavorecidas, foram vítimas da repressão e da censura. Dando palavra àqueles que não tinham lugar na história, os textos neorrealistas representam um testemunho das condições sociais, um posicionamento político pela defesa constante de ideias humanistas, de liberdade, de combate a todas as opressões. As obras neorrealistas inseriam-se num movimento de intervenção social, que, ao expor a realidade das condições laborais e da vida de carência do povo português, despertava nos leitores censores argumentos que levavam ao corte de excertos para que não fosse posta em evidência a miséria e a dureza da vida dos trabalhadores:

• Cerromaior, de Manuel da Fonseca, relatório de 22 de outubro de 1942: «(…) apresenta ao leitor factos concretos que revelam profundas deficiências da estrutura social, entre nós. A vida dura e miserável do trabalhador rural alentejano, a carência ao mesmo de assistência social (…) são neste romance postas em evidência (…)» Despacho do censor Cap. Silva Dias, autorizando a publicação do livro, mas com cortes

33 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 42.

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Relatório que consta do livro da Ed. fac-similada da coleção Biblioteca da Censura

• Tormenta, de Orlando Gonçalves, relatório de 15 de dezembro de 1948: «(…) sobressaindo em todos os capítulos o ódio aos patrões, a quem chamam os donos dos empregados (…) Enfim, todo este livro reflete e insinua o ódio que o povo deve votar aos ricos, propondo a luta pela libertação do povo oprimido e escravizado.»

Tormenta / Manuel da Fonseca .Ed. fac-similada de Lisboa: Vida Mundial, 1948 . BMGPL: SL 74407

Relatório que consta do livro da Ed. fac-similada da coleção Biblioteca da Censura.

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• Esteiros, de Soeiro Pereira Gomes, relatório de 20 de junho de 1966: «É um romance regionalista de análise crítica da vida miserável das populações ribeirinhas do rio Tejo (…) fazendo realçar a injustiça, a exploração da miséria, resultado das desigualdades sociais (…)»

Relatório que consta do livro da Ed. fac-similada da coleção Biblioteca da Censura

No campo da poesia do neorrealismo português houve especialmente uma coleção verberada pela garra censória, o Cancioneiro Geral, com cerca de 20 volumes publicados pelo Centro Bibliográfico Limitada, a partir de 1950. «Num só dia a PIDE apreendeu 11 volumes, dos quais proibiu seis, sendo a tipografia Ideal punida34» com processo disciplinar por impressão de livros referentes aquela editora. Foi o caso do livro Esta terra que é nossa, de Antunes da Silva, que inicialmente foi proibido, mas posteriormente autorizado.

Tipografia Ideal punida com processo disciplinar por impressão de livros referentes aquela editora.

Relatório: IAN-TT-DSC-26/11

34 Portugal Biblioteca Nacional (2022). Obras proibidas e censuradas no Estado Novo: biblioteca dos serviços de censura e “obras proibidas” na Biblioteca Nacional. Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal, 42.

Relatório: Ephemera, nº 5281

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de natureza religiosa

O comportamento da hierarquia eclesiástica, durante o período do Estado Novo, foi de uma longa coabitação com o regime ditatorial de Salazar e de Marcelo Caetano. Muitos católicos e militantes católicos, além de se reverem ideologicamente no programa doutrinário e económico, eram também personalidades relevantes desse mesmo regime.

Assim, a Igreja Católica portuguesa absteve-se de criticar a vigência do Estado Novo, conservando uma atitude colaborante e permitindo criar uma relação com o Estado Português relativa à manutenção e à defesa desta Igreja e à expansão e proteção do Catolicismo em Portugal e nas províncias ultramarinas.35

Portanto, não era de estranhar que os «coronéis não admitissem diálogos entre Karl Marx e Jesus Cristo36» e que a lógica da censura procurasse fortalecer o fenómeno religioso como «elemento estabilizador da sociedade e a adesão da generalidade das consciências aos princípios de uma única religião e aos ditames de uma única moral37.» Ora, nos relatórios dos livros censurados, encontram-se pareceres censórios a autorizar obras para tradução ou lusófonas «aliançadas na doutrina católica professada no Pontifício da Universidade Católica do Rio de Janeiro» (Juventude, sexo e moral de Gerald Kelly), apresentadas como obras católicas (União em Deus por amor dos homens de Manuel da Silva) ou ainda vistas «à luz da doutrina cristã como cooperantes na resolução de problemas de descristianização das massas operárias» (La dechristianisation des masses proletarieennes. Editione Casternan).

Relatório:

Relatório:

35 Cf. Martins Manuel Gonçalves (2000). O Estado Novo e a Igreja Católica em Portugal (1933-1974). Coimbra, Faculdade de Economia da Universidade. Disponível em: https://aps.pt/wp-content/uploads/2017/08/ DPR462e076ebe701_1.pdf. Acesso em: dez. de 2023

36 Príncipe César (2016). Os segredos da censura. Porto: Afrontamento, 21

37 Cf. Martins Manuel Gonçalves (2000). O Estado Novo e a Igreja Católica em Portugal (19331974). Coimbra, Faculdade de Economia da Universidade. Disponível em: https://aps.pt/wp-content/ uploads/2017/08/DPR462e076ebe701_1.pdf. Acesso em: dez. de 2023

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IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4677 IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4346

Assim, editoras de direita apresentam-se neste contexto como apoiantes do Estado Novo, da política colonial, do ultranacionalismo e do tradicionalismo católico, editando e reeditando obras de autores monárquicos, ultranacionalistas, integralistas, antiliberais e antimaçónicos. Autores como António Sardinha – político, historiador, poeta português e uma das mais singulares e polémicas figuras do complexo campo da direita portuguesa da primeira metade do século XX, viu algumas das suas obras reeditadas pela editora Restauração, que «defendia os valores da monarquia e a sua restauração em Portugal, ao mesmo tempo que tinha uma política de colaboração aberta com o Salazarismo e de apoio à politica colonial do regime38».

No entanto, na década de 60, sobretudo nos anos finais, assiste-se a um incremento do número de católicos que se afastam do regime. Alguns segmentos intelectuais, de alguma forma ligados à Igreja, procuraram distanciar-se do suporte ao regime posicionando-se politicamente no campo das oposições. À relativa tranquilidade dentro do seio da Igreja e à sua subordinação aos objetivos políticos e ideológicos do regime, opõe-se um movimento de católicos progressistas com um discurso adaptado às circunstâncias do momento social e político que se vivia, sobretudo nos finais daquela década, alinhado a questões prementes como o autoritarismo da Igreja e a sua subordinação ao poder, a justiça social e os direitos cívicos, a guerra colonial e a possibilidade de libertação dos povos colonizados.39 Esta consciência católica de intervenção favorecia a colaboração entre setores cristãos, cristãos socialistas e comunistas em torno de movimentos sociais de oposição que, nas palavras de Guilherme d’ Oliveira Martins, se traduziam num clima propício à edição de livros que tinham de ser mesmo publicados por existirem jovens voluntariosos com ideias transformadoras ligadas «às temáticas emergentes no domínio das novas abordagens doutrinárias quanto às dimensões cívicas e pastorais da igreja40». Alinham-se neste paradigma algumas editoras ligadas à oposição católica e aos católicos progressistas, como é o caso da Moraes Editora e da Ulmeiro, especializadas em catálogos com títulos mais «abertos a questões e debates mais amplos em que o pensamento cristão aparecia como substrato das análises e propostas41».

Ao principio era o verbo / António Sardinha .Lisboa : Gama, 1940 . BMGPL: DP 02999

38 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 368.

39 Medeiros Nuno (2010). Edição e editores: o mundo do livro em Portugal 1940-1970. Lisboa: ICS-Imprensa de Ciências Sociais, 228.

40 Maués Flamarion (2019). Livros que tomam partido: edição e revolução em Portugal. Lisboa: Parsifal, 70. 41Ibid., 316.

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Os títulos da Moraes pretendiam «enfrentar a mentalidade dominante doutrinal e social no seio das comunidades católicas portuguesas, nas quais se buscava introduzir um clima de discussão livre42». Deste ponto de vista, muitos dos livros editados foram alvo da máquina censória e de apreensão por parte da PIDE. É o caso dos livros das coleções

Temas e Problemas, com 11 títulos atingidos pela censura, o Tempo e o modo, com seis títulos, e o Círculo do Humanismo Cristão, com quatro títulos proibidos.

A Ulmeiro surgiu inicialmente como livraria e distribuidora, marcada por encontros e debates com nomes que se opunham à ditadura, como Mário Viegas, Carlos Paredes e Francisco Fanhais. A Ulmeiro publicou, durante o Estado Novo, a coleção Cadernos Peninsulares: «Pelas atividades culturais, pelos livros que passaram a editar e pela matriz política próxima dos católicos progressistas, a Ulmeiro sofreu pressões, apreensões e perseguições43».

O mistério humano da sexualidade / Marc Oraison ; trad. M. Rodrigues

Martins . - Lisboa : Moraes, 1967 .BMGPL: DP  12338

(Temas e Problemas)

42 Ibid., 317.

43 Ibid., 318.

Poesia, liberdade livre / António Ramos Rosa . - Lisboa : Moraes, 1962 .BMGPL: DP 10555

(O Tempo e o Modo)

País possível / Ruy Belo . - Lisboa : Assírio & Alvim, 1973 . - BMGPL: DP 0517

(Cadernos penínsulares, Nova série, literatura; 4)

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III. livros expostos

As obras expostas são testemunho da coerção exercida à liberdade política, intelectual e social. Deliberações políticas impostas por um aparelho opressor, controladas por uma polícia de vigilância e colocadas em prática por leitores censores, «carcereiros da ideia e déspotas do pensamento alheio44», ao serviço de uma Direcção de Censura, traduzem esta coleção numa coletânea de livros imorais, amorais, pornográficos, ímpios, subversivos e revolucionários.

A censura encontrava-se a cargo de comissões resultantes de nomeação governamental, subordinadas ao Gabinete do Ministro do Interior, por intermédio da Comissão de Censura de Lisboa. Esta Comissão teve como sucessoras: ainda em 1933, a Direcção Geral dos Serviços de Censura, e, em 1935, a Direcção dos Serviços de Censura.

Com o alargamento das suas competências em 1936, no que respeita à distribuição e venda de publicações nacionais e estrangeiras, a Direcção dos Serviços superintendia os núcleos regionais de Lisboa, Porto e Coimbra, dos quais, por sua vez, dependiam as 29 delegações espalhadas por todo o país. Em 1940, foi criado, na Presidência do Conselho de Ministros, o Gabinete de Coordenação dos Serviços de Propaganda e Informação, presidido pelo próprio Presidente do Conselho. Este gabinete integrava os responsáveis por esta Direcção, mantida sob a tutela do Ministério do Interior até 1944, data a partir da qual o Secretariado Nacional de Informação passou a concentrar, também, as suas funções. Em 1972, esta Direcção foi transformada numa Direcção Geral da Informação e a “censura” recebeu a designação de “exame prévio”.45

A par destas alterações de integração dos serviços de censura dentro das sucessivas reorganizações da Presidência do Conselho de Ministros, também o aparelho da censura vai conhecer flutuações ao longo das décadas de vigência do Estado Novo, sobretudo ao nível do quadro de pessoal que, na década de 40, começa a aumentar com a entrada de um número cada vez maior de oficiais, situação que se prolongará pelas décadas seguintes. A censura salazarista ficou caraterizada por ser constituída, até finais de 60, por oficiais do exército que tinham chegado ao fim da carreira, totalmente analfabetos. A partir dessa data dão entrada também civis, que culminam como leitores especializados, já no período marcelista, sobretudo nos anos 70, sendo na sua maioria licenciados.46 Ainda que, ao longo dos anos, a organização da censura aos livros fosse sofrendo revisões alicerçadas em relatórios redigidos pelos diversos diretores do serviço e em normas e procedimentos organizativos, é particularmente determinante a circular de 21 de fevereiro de 1934 que estipulava que cada livraria, posto de venda ou de distribuição de livros deveria remeter a censura por intermédio das delegações do respetivo distrito, uma «declaração em papel de 25 linhas, devidamente autenticada, relativa a cada uma das publicações,

44 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 70.

45 Cf. Tremoceiro, Paulo (2014). O(s) Arquivo(s) do SNI: censura e propaganda no Estado Novo. Disponível em: https://antt.dglab.gov.pt/wp-content/uploads/sites/17/2022/01/12-SNI.pdf. Acesso em nov. 2023

46 Cf. Gomes, Joaquim Cardoso (2017). Os censores do 25 de abril: o pessoal político da censura à imprensa. Lisboa: FSCH-UNL. Disponível em: https://fabricadesites.fcsh.unl.pt/polocicdigital/wp-content/uploads/ sites/8/2017/03/rmj23jc.pdf. Acesso em: nov. 2023

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nacionais ou estrangeiras, que corriam o risco de ser consideradas de prejuízo público, onde devia constar a proveniência, o número de exemplares, as principais menções de responsabilidade e o destino para venda ou distribuição. A partir destes pormenores a Direcção indicava quais as publicações a apresentar a fim de serem submetidas a censura prévia, ficando as restantes para venda quando o respetivo estabelecimento julgasse, pelo conhecimento da obra, que esta não continha matéria inconveniente, ficando sujeitas à apreciação posterior para efeitos de despacho definitivo47».

Os despachos provisórios eram notificados sob formulário: Requisitado ou Dispensado para censura. As publicações dispensadas podiam ser enviadas para censura prévia, se assim os estabelecimentos entendessem. Os definitivos eram notificados sob despacho “Autorizado” ou “Proibido”. Estas normas deveriam ser aplicadas a obras lusófonas e a traduções que os editores pretendessem editar, fazendo com que muitas publicações de autores estrangeiros, proibidas por despacho, nunca tivessem sido editadas em Portugal ou, somente, editadas no pós-25 de Abril.

Os inúmeros relatórios percorridos revelam que as tarefas grotescas dos censores passavam pela leitura das obras que tinham proveniência diversa, revelando a rede tentacular de instituições envolvidas na ação quotidiana dos censores: requisitadas ou apresentadas para leitura/censura, adquiridas, enviadas por autores, editores ou delatores, remetidas pela PIDE. Pelas Alfândegas, pelos Correios de Portugal, pela Direcção Geral de Informação, pela Presidência do Conselho, pelas Secretarias de Estado, pela Direcção Geral de Segurança, pelo Ministério do Ultramar, pelas Comissões e Delegações de Censura.

Lidos os textos, os leitores censores redigiam uma apreciação às obras, fundamentando se deveriam ser proibidas, autorizadas ou autorizadas com cortes. A decisão final era sempre do diretor dos Serviços de Censura, decidindo ou não em conformidade. Muitas vezes, as obras eram proibidas e mais tarde, sob revisão de leitura, vinham a ser autorizadas ou vice-versa.

De 1934 a 1974, há registo de que a censura oficial produziu mais de dez mil relatórios de leitura sobre livros de autores portugueses, lusófonos e estrangeiros, em edição original ou para tradução, que entravam e circulavam em território nacional. Muitos destes relatórios fazem parte do Arquivo da Direcção dos Serviços de Censura, recolhido pela Biblioteca Nacional, em 1975, mais tarde incorporados na Torre do Tombo, e no Arquivo Ephemera.

A partir da pesquisa nestes arquivos, foi possível selecionar os 50 livros expostos nas vitrines e cuja descrição consta neste guia que inclui também os relatórios de leitura de cada uma das obras selecionadas. A leitura dos relatórios permite compreender as inquietações, as motivações e os moldes em que foram executadas as proibições, os cortes e as autorizações.

47 Azevedo Cândido de (1999). A censura de Salazar e Marcelo Caetano: imprensa, teatro, cinema, televisão, radiofusão, livro. Lisboa: Caminho, 496.

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Circulares dos Correios e Telecomunicações de Portugal sobre livros proibidos de circular in Príncipe César (2016), ob.cit.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-2-6630 (Livro com Proveniência: Presidência do Conselho)

Relatório: Ephemera, nº7682 (Proibido em 26/01/1966 e posteriormente autorizado)

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livros censurados: proibidos

Literatura portuguesa

BARRENO, Maria Isabel, 1939-2016

Novas cartas portuguesas / Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa . - Lisboa : Cor, 1972 . - 389 p.

Cartas

Cota: BAR 821.134.3-6 14265

Entrada na BMGPL maio de 1972

Obra censurada: Obra editada em abril de 1972 pela Estúdios Cor, sob a Direcção literária de Natália Correia. Contestando o poder e a ordem patriarcal e denunciando a condição das mulheres, e também a guerra colonial e o sistema judicial, o livro foi proibido pela censura, que o catalogou como imoral e pornográfico. As três autoras e o editor, Romeu de Melo, foram acusados e levados a tribunal.

Despacho: Proibido em 26/05/1972. Carta dirigida ao Diretor Geral de Informação. Relatório nº 9462, Ephemera.

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FONSECA, Tomás da, 1877-1968

Águas novas : peça em 4 actos / Tomás da Fonseca . - Lisboa : ed. do Autor, 1950 .199 p.

Teatro

Cota: FON 821.134.3-2 31127

(Espólio Faustino Bretes. Exemplar autografado pelo autor)

Obra censurada: Proveniência: PIDE - Comissão do Porto. Da análise do censor: «Peça teatral com o objectivo de rebaixar a Igreja e a Religião Católica, contrastando com a exaltação do ensino livre. Sou de parecer que a sua circulação deve ser proibida».

Despacho: Proibido em 14/2/1951

Relatório nº 4509, Ephemera.

HELDER, Herberto, 1930-2015

Apresentação do rosto / Herberto Helder .Lisboa : Ulisseia, 1968 . - 217 p Poesia

Cota: HEL 821.134.3-1 12728

Entrada na BMGPL: janeiro de 1969

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor Joaquim Palhares: «Autobiografia do autor que é de índole esquerdista (…) Nestas condições entendo que é de propor a proibição de circular no país para este livro». A maior parte da edição, cerca de 1500 exemplares, foi apreendida e destruída. A obra foi reeditada apenas em 2020.

Despacho: Proibido em 22/7/1968

Relatório nº 8243, Ephemera.

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REDOL, Alves, 1911-1969

Gaibéus / Alves Redol . - 2ª ed . - Lisboa : Livraria Portugália, [1941] . - 325 p.

Romance

Cota: DP 821.134.3-31 02748

Entrada na BMGPL: 1942

Obra censurada: A leitura do relatório, datado de 1940, à 1.ª edição de 1939 deixa-nos face a um enigma intrigante. A 1 de junho de 1949, foi acrescentado ao documento, à mão e a vermelho, a autorização para uma 2.ª edição do livro, quando afinal este é reeditado logo em 1941 com capa de Antero Ferreira.

Despacho: Em 15/02/1940: o subscritor “adjunto”, o leitor censor, reconhece-lhe «incontestável valor», mas inusitadamente, não sugere a sua proibição. Proibido em 26/04/1940. Autorizado em 01/06/1949 uma 2.ª edição. Relatório n.º 1214, Ephemera.

RIBEIRO, Afonso, 1911-1993

Escada de serviço / Afonso Ribeiro . – 2.º ed . - [s.l.] : Afonso Ribeiro, 1957 . - 471 p.

Romance

Cota: RIB 821.134.3-31 22306

Entrada na BMGPL: novembro de 1982

Obra censurada: Proveniência: requisitado para censura. A 1.ª edição, de 1948, foi autorizada, mas, tratando-se de uma trilogia, foi proferido que a tipografia deveria ser avisada que os outros dois volumes deveriam ser submetidos à apreciação da censura. Em 1948 foi proibida a reedição, não tendo o autor sido avisado. Em 1957, o autor faz uma 2.ª edição que foi proibida.

Despacho: Proibido em 09/05/1960. Relatório n.º 3149, Ephemera.

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RIBEIRO, Aquilino, 1885-1963

Quando os lobos uivam / Aquilino Ribeiro .Lisboa : Bertrand, [1958] . - 411 p.

Romance

Cota: DP 821.134.3-31 08608

Entrada na BMGPL: janeiro de 1961

Obra censurada: Proveniência: Requisitado. A análise do leitor José Martins Nazaré em 4/02/1959 proibia novas edições. Despacho superior do Diretor da Censura, em 7/02/1959, a não autorizar a reedição, não permitir críticas na imprensa e apreender os poucos exemplares que restavam.

Despacho: Proibido em 4/02/1959. Relatório n.º 6282, Ephemera.

RODRIGUES, Urbano Tavares, 1923-2013

Imitação da felicidade / Urbano Tavares Rodrigues . - Lisboa : Bertrand, [1966] . - 210 p.

ROMANCE

Cota: ROD 821.134.3-31 11976

Entrada na BMGPL: fevereiro de 1966

Obra censurada: Proveniência: adquirido. Da análise do censor à primeira edição (1966) com a nota «proibido por ordem de S. Excia o sub-secretário de Estado da Pres. do Conselho e colocado fora do mercado, pelas razões que se podem ler no relatório: livro dissolvente, derrotista e corrosivo do espírito militar».

Despacho: Proibido em 21/09/1966 Relatório n.º 7876, Ephemera.

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RODRIGUES, Urbano Tavares, 1923-2013

Nus e suplicantes / Urbano Tavares Rodrigues . - Amadora : Bertrand, 1960 . - 147 p.

NOVELA

Cota: ROD 821.134.3-32 09613

Entrada na BMGPL janeiro de 1961

Obra censurada: Proveniência: requisitado para censura. A primeira edição de uma das obras mais lidas do autor que foi proibida de circular pela censura, já após a obra se encontrar em distribuição nas livrarias. O censor, capitão Pereira de Mello, propunha a supressão dos vários «palavrões, obscenidades e realismos crús». Livro proibido pela censura, embora tenha suscitado pareceres diferentes entre os censores.

Despacho: Proibido em 23/01/1968. Relatório n.º 9462, Ephemera.

SARAIVA, António José, 1917-1993

História da literatura portuguesa / António José Saraiva . – 2.ª ed . - Lisboa : Europa-América, 1950 . - 153 p.

LITERATURA PORTUGUESA

Cota: DP 82 05167

Entrada na BMGPL: janeiro, 1950

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor leitor C. Costa Guerra de Oliveira à 7.ª edição, datado de 20/12/1965: «não decide sobre a proibição da obra, uma vez que a obra já vai na 7.ª edição». Em 26/01/1966 o despacho é de proibir. Em 2/05/1967, há novo despacho do Diretor da Direcção dos Serviços de Censura com a anulação do despacho exarado anteriormente.

Despacho: Proibido em 26/01/1966 e posteriormente autorizado. Relatório n.º 7682, Ephemera.

33

SILVA, Antunes da, 1921-1997

Esta terra que é nossa / Antunes da Silva .Lisboa : Centro Bibliográfico, 1952 . - 43 p.

Poesia

Cota: SIL 821.134.3-1 67306 (Espólio António Borga. Exemplar autografado pelo autor)

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Embora o Major José de Sousa Chaves tenha autorizado a circulação da obra, esta foi proibida superiormente. Depois de nova leitura, foi autorizada: «Remeto o livro. Em sede de reunião o livro foi autorizado com os serviços que constam do respetivo processo».

Despacho: Proibido em 21/01/1955 e autorizado em 14/03/1955. Relatório n.º 5281, Ephemera.

SILVA, Antunes da, 1921-1997

Terra do nosso pão / Antunes da Silva . - Lisboa : Portugália, 1964 . - 338 p.

Romance

Cota: SIL 821.134.3-31 67323 (Espólio António Borga)

Obra censurada: Proveniência: Requisitado. Parecer censório, datado de março de 1965, pelo Capitão José Brandão Pereira de Mello, proibindo a sua reedição, uma vez que este já se encontrava a circular, deixando ao critério «de quem de direito o despacho». O Coronel Rodrigo de Freitas, sob nova leitura datada de 6/05/1965, determina a proibição do reclame à obra ou quaisquer críticas, não permitindo a sua reedição.

Despacho: Proibido em 6/05/1965

Relatório de 20 de abril de 1965, Ephemera.

34

VENTURA, Mário, 1936-2006

Alentejo desencantado : (narrativas e reportagens) / Mário Ventura . - Lisboa : Ulisseia, [1969] . - 280 p.

Crónicas

Cota: VEN 821.134.3-94 44369

Entrada na BMGPL: 23/06/2008

Obra censurada: Proveniência: Secretaria de Estado. Obra com três despachos. Da análise do censor em 12-1-1970: «Proibição rigorosa com ordem de apreensão». A 30-04-1970 – Pedido à Direcção dos Serviços de Censura para fundamentar devidamente a ordem de apreensão e para ser feita uma segunda leitura. Da análise do censor de 11-05-1970: «considera contraproducente proibir ou mandar apreender, uma vez que a edição já se encontrava praticamente toda vendida, pois apareceu no tempo das eleições». No entanto, concluía que «não seria mau avisar a editora que no caso de ser feita uma 2.ª edição, o livro seria apreendido».

Despacho: Proibido em 12/1/1970. Relatório: Ephemera, n.º 8791.

VILHENA, José, 1927-2015

História universal da pulhice humana : os Judeus / J. Vilhena . - Lisboa : ed. do Autor, [s.d.] . - 148 p.

HUMOR

Cota: VIL 821.134.3-7 60846

Obra censurada: Proveniência: Adquirido. Relatório datado de 27/09/1965 à primeira obra de um projeto planeado pelo autor para vários volumes. Da análise do censor em 17/07/1965 ao 3º volume Os Judeus: «Irreverente, anti-religioso, imoral, indecente (…) ideias critpo-comunistas.»

Despacho: Proibido em 17/07/1965

Relatório n.º 6650 e 7595, Ephemera.

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Literatura africana de expressão Portuguesa

FILIPE, Daniel, 1925-1964

Pátria, lugar de exílio / Daniel Filipe .Lisboa : Presença, [s.d] .

Poesia

Cota: FIL 821.134.3-1 72092 (Espólio Vassalo Rosa)

Obra censurada: Proveniência: D.G.S. No relatório de leitura do livro do escritor Cabo-Verdiano, o censor afirma que se trata de uma coletânea de poemas do género revolucionário e que pretende ser um grito contra a opressão que se vive no país.

Despacho:. Proibido a 30/03/1972. Relatório n.º 9387, Ephemera.

MARKY, Sum

Vila flogá / Sum Marky . - Fundão : Jornal do Fundão, 1963 . - 294 p.

Romance

Cota: MAR 821.134.3(669.95)-31 14921

Entrada na BMGPL: março de 1973

Obra censurada: Proveniência: P.I.D.E. A apreciação do leitor Major José de Sousa Chaves: trata-se de um livro que «incita à revolta dos indígenas em S. Tomé (…) sempre com o mau tratamento infligido aos nativos pelos brancos, autoridades e particulares».

Despacho: Proibido em 24/08/1963.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7369.

36

SOROMENHO, Castro, 1910-1968

Terra morta / Castro Soromenho . - Lisboa : Arcádia, 1961 . - 267 p.

Romance

Cota: DP 821.134.3-31 10082

Entrada na BMGPL: dezembro de 1961

Obra censurada: Proveniência: P.I.D.E. Foi primeiramente editado no Brasil em 1949 a que se seguiu uma edição francesa em 1956 e, quase duas décadas, foi editado em Portugal. O relatório do leitor Major José de Sousa à obra é anterior à edição portuguesa e descreve claramente a mensagem que o autor pretende deixar de opressão da vida africana e de relato da vida miserável dos colonos. A sua apreciação refere ainda a vida ociosa e viciosa dos funcionários e o abuso e despotismo exercido sobre os negros.

Despacho: Proibido em 18/04/1945

Relatório n.º 2805, Ephemera. Autores ou edição Brasileira

AMADO, Jorge, 1912-2001

Os pastores da noite / Jorge Amado . - Lisboa : Europa-América, 1964 . - 364 p.

Lit. Brasileira - Romance

Cota: AMA 821.134.3(81)-31 11761

Entrada na BMGPL: março 1965

Obra censurada: Da análise do censor leitor Nuno Múrias: «Para Jorge Amado a Humanidade estará ao nível de uma casa de prostituição: Estado, família, religião tudo cai perante a sua pena venenosa (…) um livro desorientado, contra a moral e o bem comum».

Despacho:. Proibido em 06/07/1965.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7607.

37

AMADO, Jorge, 1912-2001

São Jorge dos Ilhéus / Jorge Amado . - São Paulo : Livraria Martins Editora, 1944 . - 363 p.

Lit. Brasileira - Romance

Cota: AMA 821.134.3(81) 13188

Entrada na BMGPL: março 1970

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do Major David dos Santos: «obra de um escritor categorizado comunista e que explora as desigualdades sociais com vista ao triunfo dos comunistas».

Despacho: Proibido em 26/11/1951. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4661.

ROSSUMANNO, Victor, 1922-2010

A escravidão social da mulher / Victor Rossumanno . - Lisboa : Livraria Internacional, [1925] . - 113 p.

Sociologia

Cota: ROS 316 31061

Entrada na BMGPL: abril de 1966

Obra censurada: Esta obra apresenta-se ao leitor censor como inconveniente, perante capítulos que tratam da fisionomia da mulher, da libertação e igualdade dos direitos da mulher perante os homens e da apologia do divórcio.

Despacho:. Proibido em 18/04/1945.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-3-633.

38

Literatura estrangeira

ATON, Alan, 1903-1988

Chora, terra bem amada! / Alan Paton ; trad. A. dos Santos Matias . - Lisboa : Europa-América, 1958 . - 410, [2] p.

Lit. sul-africana – romance

Cota: PAT 821.111(680)-31 17899

Entrada na BMGPL: fevereiro de 1978

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor Major José de Sousa Santos: «Perante a natureza anticolonial que caracteriza a obra, julgo que esta não possa ser autorizada a circular no país».

Despacho:. Proibido em 20/11/1964. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7525.

BROWN, Fredric, 1906-1972

Feira=crime / Frederic Brown ; trad. Roberto Graça . - Amadora : Ibis, 1963 . - 209 p.

Literatura americana - romance policial

Cota: BRO 821.111(73)-312.4 00871 (Biblioteca Universidade Sénior Dr. Canais Rocha da ARPE)

Obra censurada: Proveniência: P.I.D.E. Requisitado. Da análise do Capitão José Brandão de Mello: «Mais um volume da colecção Ângulo Negro (…) Também este é uma sequência de cenas mais ou menos lúbricas. Julgo de proibir, por deseducativo e imora».

Despacho: Proibido em 16/11/1963. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7406.

39

CALDWELL, Erskine, 1903-1987

O dedo de Deus / Erskine Caldwell ; trad. de Felicianio Cerqueira . - Lisboa : Portugália, [s. d.] . - 241 p.

Literatura americana – romance

Cota: CAL 821.111(73)-31 33973

Entrada na BMGPL: 30/07/1999

Obra censurada: Proveniência: Presidência do Conselho. Da análise do leitor Major José de Sousa Chaves: «História de uma prostituta (…) Tudo quanto sucede, na sua vida de aviltamento, é atribuído a uma determinação divina: “Aqui, anda dedo de Deus”. Esta frase (…) ridiculariza a intervenção divina, constituindo uma ofensiva contra a religião católica».

Despacho:. Proibido em 04/08/1960.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-2-6620.

CALDWELL, Erskine, 1903-1987

A jeira de Deus / Erskine Caldwell ; trad. Silvano Ferreira . - Lisboa : Ulisseia, 1959 . - 226 p.

Literatura americana – romance

Cota: CAL 821.111(73)-31 09017

Entrada na BMGPL: abril 1965

Obra censurada: Proveniência: Presidência do Conselho. Da análise do leitor Major José de Sousa Chaves: «História de uma família de desequilibrados morais e sexuais. Por tanta imoralidade, entendo que não deve ser autorizada a circular no país».

Despacho:. Proibido em 17/08/1960.

Relatório: IAN-TT -SNI-DSC-35-2-6633.

40

CHOLOKOV, Mikail, 1905-1984

Contos do don / Mikail Cholokov ; trad. Jorge Feio . - Lisboa : Arcádia, 1965 . - 381 p.

Lit. russa – contos

Cota: SL 821.1/9-34 11767

Entrada na BMGPL: abril 1965

Obra censurada: Proveniência: requisitado. Da análise do leitor José de Sousa Chaves: «como o autor é comunista as conclusões resultam sempre de propaganda mais ou menos directa das ideias comunistas. Nestas condições, deve ser proibido de circular no país».

Despacho: Proibido em 29/03/1965. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7543.

COLETTE, 1873-1954

Chéri / Colette ; trad. José Saramago . - Lisboa : Cor, 1960 . - 217 p.

Lit. Francesa – romance

Cota: COL 821.133.1-31 09563

Entrada na BMGPL: dezembro de 1960

Obra censurada: Por ser considerada um romance com bastante pornografia, uma obra-prima de «imoralidade e desvergonha cheia de cenas episódicas de marcada imoralidade e sexualismo» não é de surpreender que esta obra tenha associada 4 despachos, ainda que num deles, o de 1965, o Major José de Sousa Chaves proponha o cancelamento da proibição uma vez que se trata de uma escritora consagrada pelo governo francês. Os despachos são referentes à edição francesa, em 1950, à edição portuguesa com tradução de José Saramago em 1964 e 1965, e em 1969, sob nova apresentação para revisão de leitura, o Chefe de serviço José Brandão Pereira de Melo mantém «inexoravelmente a proibição».

Despacho: Proibido em 24/11/1950, 06/05/1965, 10/07/1964 e 19/04/1969.

Relatórios: IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4484 e IAN-TT-SNI-DSC-35-7-8567.

41

CONRAD, Joseph, 1857-1924

Alma russa / Joseph Conrad ; trad. Moura Bras . - Porto : Civilização, 1945 . - 349 p.

Lit. inglesa – romance

Cota: CON 821.111-31 04394

Entrada na BMGPL: dezembro de 1943

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor Major Rogado: «É um livro de propaganda revolucionária passado ainda no tempo dos Czares. Julgo que deve ser proibido porque este e muitos outros livros que pejam o nosso mercado têm o fim inconvenientíssimo de alimentarem a mística russa».

Despacho:. Proibido a 03/04/1947. Em 1948, uma nota manuscrita refere: «Tendo em atenção o requerimento do editor de 14/01/1948 foi levantada a proibição.»

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-4-3013.

MACDONALD, John D., 1916-1986

Onde esta Janice? / John D. MacDonald ; trad. Alberto Miguel . - Amadora : Ibis, 1962 . - 195 p.

Literatura Americana - romance policial

Cota: MAC 821.111(73)-312.4 00878

(Biblioteca Universidade Sénior Dr. Canais Rocha da ARPE)

Obra censurada: Proveniência: Requisitado. Da análise do censor Capitão José Brandão de Mello: «A despeito de algumas expressões livres (…) não lhe encontro matéria que justifique a sua proibição». Ainda assim, o despacho manuscrito proíbe a sua circulação.

Despacho:. Proibido a 26/08/1963.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-7-7373.

42

MCCULLERS, Carson, 1917-1967

Coração solitário caçador / Carson McCullers ; trad. José Rodrigues Miguéis . - Lisboa : Cor, 1958 . - 386 p.

Literatura americana – romance

Cota: MCC 821.111(73)-31 08706

Entrada na BMGPL: março 1959

Obra censurada: Proveniência: Requisitado. Da análise do censor leitor Major José Sousa Dias: «Mais um livro de propaganda comunista (…) que faz apologia da mística comunista». Como o livro já se encontra à venda, deixa que a decisão de proibição seja superior. O despacho superior manuscrito é mesmo de proibir a sua circulação.

Despacho:. Proibido a 21/02/1962. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-2-6998.

PATTI, Ercole, 1903-1976

Um amor em Roma / Ercole Patti ; trad. Manuel de Seabra . - Lisboa : Ulisseia, 1960 . - 193 p.

Literatura Italiana – romance

Cota: PAT 821.131.1-31 09258

Entrada na BMGPL: março de 1960

Obra censurada: Proveniência: Presidência do Conselho. Da análise do censor leitor Major José Sousa Chaves: «Trata-se de um romance de índole imoralista (…) A traição da mulher excita-o e serve de incentivo ao erotismo».

Despacho:. Proibido a 01/08/1960. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-2-6630.

43

WRIGHT, Richard, 1908-1960

Os filhos do pai Tomás / Richard Wright ; trad. de Manuel de Seabra .

- Lisboa : Arcádia, 1958

Literatura americana – romance

Cota: DP 821.111(73)-31 08559

Entrada na BMGPL: outubro de 1958

Obra censurada: Proveniência: Requisitado para censura. Da análise do censor leitor Capitão José Brandão P. de Mello: «Esta tradução portuguesa da obra apaixonada de um afro-americano, uma vez difundida entre nós (nomeadamente nas nossas províncias ultramarinas africanas) ameaça a nossa integridade nacional. Julgo, pois, que seja um livro a proibir inexoravelmente».

Despacho: Proibido a 06/08/1960

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-2-6636.

Outros assuntos

BRETES, Faustino, 1902-1986

A igreja e a escravatura/ Faustino Bretes .Covilhã : Tip. Casa do Povo, 1932 . – 35 p.

Política

Obra cedida para exposição pela Biblioteca Nacional de Portugal.

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor leitor Tenente António Afonso Raposo: «Livro repugnante e mau».

Despacho:. Proibido a 29/04/1952.

Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4702

44

CARAÇA, Bento de Jesus, 1901-1948

A cultura integral do individuo: problema central do nosso tempo / Bento de Jesus Caraça . - Lisboa : Mocidade Livre, 1933 . - 43 p.

Educação

Cota: CAR 37 02258

Entrada na BMGPL: 1942

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do Sub-Diretor Capitão José da Silva Dias: «De aspecto comunisante. Deve ser proibido nas Bibliotecas operárias».

Despacho: Proibido em 14/02/1951. Relatório nº 4549, Ephemera.

COELHO, Mário Brochado

Em defesa de Joaquim Pinto de Andrade / Mário Brochado Coelho . - Porto : Afrontamento, 1971 . - 163 p.

Direito

Cota: COE 34 20422

Entrada na BMGPL: dezembro de 1980

Obra censurada: Proveniência: Depósito Legal. Da análise do censor Capitão Brandão de Mello a 30/10/1971: «Traduz um ataque político atrabiliário e que me parece de acção perniciosa se continuar a circular livremente». Vários ofícios emitidos pela D.G.S. ao Diretor dos Serviços de Censura a pedir informações sobre a obra, vêm confirmar a sua circulação por despacho superior em 28/12/1971.

Despacho: Proibido em 30/10/1971. Autorizado a 28/12/1971. Despachos da Direcção dos Serviços de Censura relativos ao livro de Joaquim Pinto de Andrade, Ephemera.

45

CONFERÊNCIA “ A PAZ E A VIDA”

Duas conferências em defesa da paz / coord. Maria Lamas, Teixeira de Pascoais .

- Ed. fac-similada de: [s.l.] : Associação

Feminina Portuguesa para a Paz, 1950

. - Lisboa : A Bela e o Monstro : Rapsódia

Final : Público, cop. 2023 . - 54 p.

Conferências

Cota: POR 061 74421

Entrada na BMGPL: 27/09/2023

Obra censurada: Da análise do censor: «Pacifista»

Despacho: Proibido em 09/01/1954

Relatório que consta do livro da Ed. fac-similada da Coleção Biblioteca da Censura.

SÁ, Vitor de, 1921-2004

Regressar para quê? / Victor de Sá . - Lisboa : Dom Quixote, 1970 . - 155 p. 18 cm

. - (Diálogo; 9)

Sociologia

Cota: SA 316.7 13238

Entrada na BMGPL: abril de 1970

Obra censurada: Proveniência: adquirido. Da análise do Ten. Cor. António M. Paranhos Teixeira: «deve ser proibida e interdita a sua venda ao público, por razões de inconveniência política». A 11/05/1970, novo parecer de um outro censor que confirmou a decisão anterior.

Despacho: Proibido em 06/04/1970 e a 17/05/1970. Relatório n.º 8738, Ephemera.

46

SOARES, Mário, 1924-2017

Escritos políticos / Mário Soares . - Lisboa : Edição do autor, 1969 . - 242 p.

Política – Portugal

Cota: SOA 32 1085 (Espólio Centro Humberto Delgado)

Obra censurada: Proveniência: PIDE. Da análise do censor Cap. José Brandão Pereira de Mello: «obra de puro ataque político mal-intencionado e inoportuníssimo, parece-me preferível proibir a sua circulação».

Despacho: Proibido em 06/10/1969. Relatório n.º 8590, Ephemera.

47

livros censurados: cortados

Literatura portuguesa

ARCHER, Maria, 1899-1981

A primeira vítima do diabo / Maria Archer .Lisboa : Sit, 1954 . - 240 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: DP 821.134.3-31 06817

Entrada na BMGPL: outubro de 1954

Obra censurada: Proveniência: Requisitado para censura. Da análise do Capitão leitor Jorge da Silva Carvalho «A autora procura, em quase toda a obra, focar a fragilidade da situação da mulher, na sociedade para concluir que só a sua independência económica pode garantir a sua dignidade». Decorrente, propõe a eliminação de um conto e aponta alguns trechos demasiado vivos e sugestivos. Como o livro já se encontrava à venda e em 2.ª edição, não propõe a proibição.

FERNANDES, Vasco da Gama, 1908-1991

Jornal : 1948-1953 / Vasco da Gama Fernandes . - Leiria : ed. do Autor, 1954 . - 307 p.

Literatura portuguesa – Memórias

Cota: FER 821.134.3-94 31139

Entrada na BMGPL: 16/04/1991

Obra censurada: Proveniência: Presente para censura. Da análise do Capitão leitor Jorge da Silva «Parece-me de maior conveniência a revisão superior dos cortes apontados porquanto julgo que possa ter ainda pecado por excesso cortando demasiado a um autor suscetível de apresentar reclamação».

Despacho: Autorizado com cortes em 23/06/1954. Relatório: Despachos da Direcção dos serviços da Censura relativos a livros de Vasco da Gama Fernandes, Ephemera.

Despacho: Autorizado com cortes em 15/02/1965. Relatório: Despachos da Direcção dos serviços da Censura relativos a livros de Maria Archer, Ephemera.

49

FONSECA, Manuel da, 1911-1993

Cerromaior / Manuel da Fonseca . - Lisboa : Inquérito, 1943 . - 302 p.

Literatura portuguesa – romance

Cota: FON 821.134.3-31 67332 (Espólio António Borga)

Obra censurada: Da análise do Cap. Silva Dias: «o livro não deve ser autorizado, tal como é apresentado. As passagens mais contundentes, eu deixo-as assinaladas (…)»

Despacho: Autorizado com cortes em 22/11/1943. Relatório n.º 2429, Ephemera.

LAGOEIRO, Joaquim, 1918-2011

Os fraldas / Joaquim Lagoeiro . - Lisboa : Guimarães & Cª Editores, [1947] . - 286 p.

Literatura portuguesa – romance

Cota: SL 821.134.3-31 12593

Entrada na BMGPL: agosto de 1968

Obra censurada: Proveniência: Presente para censura. Da análise do Cap. Borges Ferreira: «este livro não é profundamente mau. O autor poderá refundir o livro (…)»

Despacho: Autorizado com cortes em 13/06/1950. Relatório: IAN-TT-SNI-DSC-35-5-4348

50

SANTARENO, Bernardo

Romances do mar / Bernardo Santareno . - Santarém : Tipografia Escolar, 1955 .105 p.

Literatura portuguesa – Poesia

Cota: SL 821.134.3-31 12593 (Espólio Faustino Bretes)

Obra censurada: Proveniência: Presente para leitura. Da análise do Leitor Major José de Sousa Chaves: «Versos maus, doentios, irreligiosos (…) numa palavra, deseducativos». O despacho manuscrito acrescenta «Poderá ser publicado desde que seja suprimido a poesia Romance do pescador velho».

Despacho: Autorizado com cortes em 31/10/1955.

Relatório n.º 5496, Ephemera.

51

livros censurados: autorizados

Literatura portuguesa

ARCHER, Maria, 1899-1981

Aristocratas / Maria Archer . - 3ª ed . - Lisboa : Aviz, 1945 . - 437 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: DP 821.134.3-31 06660

Entrada na BMGPL: maio de 1954

Obra censurada: Da análise do Major A. Rogado: «Este livro foi presente a censura em virtude dum requerimento assinado por uma irmã da autora, a qual protesta pelo facto do livro descrever deturpadamente, segundo a requerente, cenas da vida da família, apresentando os pais, e principalmente a mãe, sob um prisma falso e ofensivo». Não obstante, o leitor regista que não encontra matéria para a intervenção da censura.

Despacho: Autorizado em 26/02/1946. Relatório n.º 2885, Ephemera.

BELO, Ruy, 1933-1978

Homem de palavra(s) / Ruy Belo . - Lisboa : Dom Quixote, 1970 . - 139, [5] p.

Literatura Portuguesa – Poesia

Cota: BEL 821.134.3-1 13193

Entrada na BMGPL: março de 1970

Obra censurada: Livro com dois despachos. Referente ao primeiro despacho: «Apesar de se tratar de um poeta de esquerda e candidato a deputado pela oposição (Lisboa) não vejo inconveniente na circulação deste livro de versos».

Despacho: Autorizado em 03/02/1970 e em 16/05/1970. Relatório: Despachos da Direcção dos serviços da Censura relativos a livros de Ruy Belo, Ephemera.

53

FARIA, Almeida, 1943-

A paixão / Almeida Faria . - Lisboa : Portugália, 1965 . - 177 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: SL 821.134.3-31 12007

Entrada na BMGPL: abril de 1966

Obra censurada: Da análise do leitor Estevão Martins: «Embora o livro que agora se aprecia tenha algumas passagens com ressaibos revolucionários, no seu conjunto não apresenta motivos que possam aconselhar o impedimento da sua circulação».

Despacho: Autorizado em 16/03/1967. Despachos da Direcção dos serviços da Censura relativos a livros de Almeida Faria, Ephemera.

GOMES, Soeiro Pereira, 1909-1949

Esteiros / Soeiro Pereira Gomes .Lisboa : Sirius, 1941 . - 297 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: GOM 821.134.3-31 67242 (Espólio António Borga)

Obra censurada: Da análise do leitor Francisco Salgado: «Da leitura deste romance regional não se vislumbra qualquer significado de ordem moral, a ponto de algumas criticas feitas à 1.ª edição: ser um romance tendencioso, de intenção social. O que parece ser confirmado pelas traduções atualmente existentes: russo, polaco, checo (…) Julgo por isso que este livro deveria ter sido proibido quando apareceu, mas agora deve ser ignorado, pois que a sua proibição só servia à sua propoganda».

Despacho: Autorizado em 20/06/1966. Ephemera, n.º 7801.

54

GRAÇA, Júlio, 1923-2006

Buza / Júlio Graça ; Manuel Ribeiro de Pavia . - Lisboa : Sociedade de Expansão Cultural, 1954 . - 174 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: DP 821.134.3-31 06659

Entrada na BMGPL: maio de 1954

Obra censurada: Da análise do Major Leitor Gaspar Carneiro: «O autor, neste romance, destaca a vida dura dos empregados fabris não especializados e ainda o seu baixo vencimento; a inimizade dos operários para com os patrões. A 1.ª conclusão é devido à má preparação do pessoal – em geral analfabeto e a 2.ª devese em parte aos patrões, pela pouca assistência dada ao seu pessoal. Politicamente o livro é inofensivo. Moralmente não é mau. Há apenas a salientar algumas cenas amorosas».

Despacho: Autorizado em 05/07/1954

Relatório n.º 5192, Ephemera.

NAMORA, Fernando, 1919-1989

Minas de San Francisco / Fernando Namora .Coimbra : Coimbra Editora, 1946 . - 336 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: DP 821.134.3-31 06255

Entrada na BMGPL: abril de 1953

Obra censurada: Da análise do leitor Luis Figueiredo: «O autor no decorrer da sua obra, não perde oportunidade para pôr em evidência as diferenças de cotação social entre patrões e operários. Em todo o caso, como a obra foi editada em 1946 sou do parecer que a sua circulação deve continuar a ser permitida».

Despacho: Autorizado em 22/08/1957. Despachos da Direcção dos serviços da Censura relativos a livros de Fernando Namora, Ephemera.

55

PIRES, José Cardoso, 1925-1998

O hóspede de Job : romance / José Cardoso

Pires . - Lisboa : Arcádia, [1963] . - 253 p.

Literatura portuguesa – Romance

Cota: DP 821.134.3-31 11154

Entrada na BMGPL: fevereiro de 1964

Obra censurada: Da análise do leitor Cap. José Brandão Pereira de Mello que deixa ao critério superior a decisão de proibir este «especimem típico de literatura de ficção (…) não fugindo o seu autor ao uso da palavra que acentue uma situação real». O despacho superior é de autorizar a obra a circular, desde que «fosse vedada a publicidade e as referências na imprensa».

Despacho: Autorizado em 07/04/1964. Ephemera, n.º 7444.

Literatura estrangeira

FITZGERALD, F. Scott, 1896-1940

Este lado do paraíso / F. Scott Fitzgerald ; trad. de Alfredo Amorim . - Lisboa : Portugália, 1966 . - 368 p.

Literatura Americana – Romance

Cota: FIT 821.111(73)-31 12116

Entrada na BMGPL: setembro de 1966

Obra censurada: Proveniência: Direcção Geral de Segurança. Apesar da capa do livro ter como ilustração um busto desnudado, motivo de censura, a análise do Capitão José Brandão de Mello é de autorizar a sua circulação: «sem qualquer nota assinalável de imoralidade, sexualismo ou pornografia que justifiquem a proibição do romance». Não obstante, o leitor regista que não encontra matéria para a intervenção da censura.

Despacho: Autorizado em 15/02/1969.

Relatório: IAN-TT – SNI-DSC-35-6-8776

56

Outros assuntos

PEREIRA, Eduardo de Sousa

Pátria nossa / Eduardo de Sousa Pereira .Lisboa : ed. do Autor, 1964 . - 335 p.

Portugal - História

Cota: DP 94(469) 19788

Entrada na BMGPL: 1980

Obra censurada: Proveniência: Apresentado. Original datilografado apresentado pelo autor. O Major Leitor de Sousa Chaves autoriza o exemplar a circular, «porque se trata de um esplêndido repositório de ideias sobre o país, sempre apresentado de forma laudatório para o governo e nação».

Despacho: Autorizado em 30/09/1963. Relatório: IAN-TT–PT-SNI-DSC-35-7-7385.

Nota: Algumas capas dos exemplares expostos não são as originais. Foram substituídas por encadernação revestida com pasta em cartão e coberta de tecido, optando-se por associar à descrição dos livros, submetidos a esta alteração, a folha do rosto do exemplar.

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Conclusões

Os 50 livros expostos não traduzem o número de obras existentes no fundo documental da Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes, cuja circulação esteve proibida durante o período do Estado Novo. Seria necessário um levantamento mais exaustivo para inventariar todas as restantes. A seleção dos 50 livros apresentados teve como critério a obrigatória existência dos relatórios que dão a conhecer as razões pelas quais foram censurados.

Os elementos de descrição bibliográfica (data de edição e data de registo na biblioteca) e a data do despacho do relatório da censura de algumas das obras proibidas expostas permitem evidenciar o modo como as publicações nacionais e estrangeiras, consideradas subversivas, continuavam a circular. Esta situação revelava que a censura ao livro, ao contrário da dos periódicos, operou também num sistema de pós impressão e publicação, ficando, assim, as obras à disposição do conhecimento público. Excetuam-se desta conclusão as obras com número de registo superior a 15.653, correspondentes a datas de edição pós-25 de Abril e a exemplares que foram doados ou que fazem parte de alguns dos espólios.

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Lucinda Catarino (desde maio de 1962) e Suzete Carreira (desde janeiro de 1964) eram, à época, trabalhadoras da Papelaria Livraria Delta, antecessora da atual Livraria Gil Paes, com morada na Rua Miguel Bombarda n.º 115. Pela mão de José Sousa Ferreira e Maria Adelaide dos Santos, este estabelecimento tornou-se num espaço emblemático no intercâmbio de livros durante os anos de ditadura na então vila de Torres Novas. Tendo sido um importante foco cultural para a resistência torrejana, com vários livros proibidos à disposição, muitas são as histórias trazidas à atualidade pelo testemunho de Lucinda e Suzete. Uma das coisas que recordam é a recorrência com que passavam pela livraria os agentes da PIDE, que vinham munidos de listas de obras proibidas e que deviam ser imediatamente apreendidas. Estas “novidades literárias”, como lhes chamava Lucinda, eram trazidas de Lisboa pelo dono do estabelecimento ou enviadas por algumas editoras e não podiam sequer estar à vista ou à venda, ficando na maioria das vezes escondidas, por detrás do balcão ou no armazém, para os clientes que as pediam discretamente. Garantem que a livraria era, de facto, um polo onde convergiam pessoas que se opunham às regras restritas de Salazar e de quem queria comprar livros proibidos à socapa. Com regularidade passavam por ali torrejanos como António Mário Lopes dos Santos, Augusto Guimarães Amora, Carlos Trincão Marques, Faustino Bretes, José Alberto Marques, José Emílio da Silva, José Ribeiro, João José Lopes (também conhecido pela alcunha de João Hespanhol) ou ainda alunos internos do Colégio Andrade Corvo ou de Santa Maria. À livraria também rumava, religiosamente, o funcionário da Biblioteca Municipal de Torres Novas, Jaime do Rosário, que adquiria as tais novidades literárias para o acervo municipal: «Tínhamos muitos bons clientes e a Câmara era muito boa cliente», garante Lucinda muitas vezes ao longo da conversa.

Naturalmente, que este estabelecimento se tornou num alvo permanente para os que se opunham à livre difusão de ideias e da informação que os livros transportavam. Ainda assim, mencionam, em tom de brincadeira, que conseguiram enganar muitos inspetores nos anos anteriores a Marcelo Caetano, caricaturados pelas suas palavras como maltra-

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Suzete Carreira e Lucinda Catarino

pilhos e quase analfabetos. Com Marcelo Caetano e com a DGS, afirmam que a situação se altera com inspetores mais aprimorados e irreconhecíveis, talvez a fazer jus ao Despacho do Ministro do Interior, de 3 de novembro de 1972, que determinava a organização de brigadas especializadas para as visitas às livrarias que se revestiam de particular delicadeza e necessitavam de muita sensibilidade, ponderação e segurança.

Contam que estas apreensões resultavam num prejuízo enorme para o estabelecimento, ainda que os inspetores assegurassem que a Sociedade de Escritores Portugueses ressarciria o dinheiro referente aos livros confiscados, o que nunca se verificou.

Entre diversas rusgas à livraria que confiscavam livros proibidos e outras obras que não chegavam a ser proibidas pela censura, ainda assim, Suzete refere que muitos foram os concursos de montras ganhos com decoração alusiva a autores portugueses, como foi o caso da montra dedicada a Aquilino Ribeiro por ocasião da sua morte.

A repressão exercida sobre os escritores desafetos ao regime salazarista é também referido por Lucinda e Suzete, aquando da entrega do Grande Prémio de Novela atribuído ao escritor Luandino Vieira, pela sua obra  Luuanda. Por essa altura, juntamente com o livro apreendido foram também apreendidas todas as obras de escritores que de alguma forma estiveram relacionados com a entrega do prémio, como Aquilino Ribeiro ou Jacinto Prado Coelho.

Lucinda abandona o trabalho na livraria, em 1970, para acompanhar o marido em missão na Guiné como paraquedista. Conclui a conversa afirmando que algumas circunstâncias não foram fáceis: «Éramos umas miúdas». Ainda assim, assevera com muita franqueza e com um genuíno sorriso que a livraria foi um local onde foi muito feliz. Suzete adquire o espaço mais tarde, mantendo, aos dias de hoje, orgulhosamente as portas abertas, resistindo agora de outra forma a pressões de um tempo diferente do outro que, como referiu diversas vezes, «eram outros tempos com muita vida e muita gente.»

[Testemunho recolhido a 5 de fevereiro de 2024]

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Decorrente das obras expostas que integram o catálogo da Biblioteca Municipal, dos respetivos relatórios e de toda a informação obtida pelas diversas fontes consultadas, poderá aferir-se as seguintes considerações:

• As obras proibidas continuavam a circular e a chegar ao conhecimento público ainda que apenas uma minoria da população, com expressão nas elites portuguesas, tivesse o privilégio de aceder a essas edições: «Em 1970, 25% da população portuguesa era analfabeta Dos restantes que sabiam ler e escrever, seria apenas esta minoria que tinha acesso às publicações48»;

• Muitas publicações lusófonas proibidas nunca foram reeditadas ou apenas o foram no pós 25 de Abril;

• Algumas obras censuradas em língua original para tradução e edição portuguesa nunca foram editadas até à data;

• Em relação a obras censuradas com despacho referente a cortes, desconhece-se o modo como foram publicadas as edições subsequentes, se contêm ou não as passagens expurgadas pela censura.

Reflexões a partir da construção de uma narrativa política em que a censura foi o «húmus de uma cultura política discricionária, arbitrária e autoritária49», adversa a uma cultura democrática na esfera do livro e do conhecimento.

Que o que temos hoje como «expressão e extensão do 25 de Abril50» seja viver em igualdade e em liberdade e que a todas as pessoas seja possível o acesso, a fruição do conhecimento e a participação em democracia em prol de uma cultura democrática.

As sombras de uma azinheira Lúcio Álvaro Laborinho, ob. cit.

48 Portugal Biblioteca Nacional (2022). Obras proibidas e censuradas no Estado Novo: biblioteca dos serviços de censura e “obras proibidas” na Biblioteca Nacional. Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal, 56.

49 Barros Júlia Leitão de (2023).  Censura: a construção de uma arma política do Estado Novo. Lisboa: Tinta-da-China, 236.

50 Lúcio Álvaro Laborinho (2023). As sombras de uma azinheira. Lisboa: Quetzal, 236.

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