Memórias Ocultas do Bairro da Pólvora - Centro de Arqueologia e Memorial Chaguinhas

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MEMÓRIAS OCULTAS DO BAIRRO DA PÓLVORA CENTRO DE ARQUEOLOGIA E MEMORIAL CHAGUINHAS



FIAM FAAM CENTRO UNIVERSITÁRIO

IGOR GABRIEL SOUZA CAROLLO

MEMÓRIAS OCULTAS DO BAIRRO DA PÓLVORA - MEMORIAL E CENTRO DE ARQUEOLOGIA CHAGUINHAS

São Paulo 2019



FIAM FAAM CENTRO UNIVERSITÁRIO

IGOR GABRIEL SOUZA CAROLLO MEMÓRIAS OCULTAS DO BAIRRO DA PÓLVORA - MEMORIAL E CENTRO DE ARQUEOLOGIA CHAGUINHAS

Trabalho Final de Graduação apresentado à banca examinadora da FIAM-FAAM Centro Universitário, como exigência parcial para a obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo, sob a orientação dos Professores Dalva Thomaz e Valdir Arruda.


Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

CAROLLO, Igor Gabriel Souza Memórias Ocultas do Bairro da Pólvora - Centro de Arqueologia e Memorial Chaguinhas, Liberdade / Igor Gabriel Souza Carollo São Paulo, 2019, 88 páginas. Notas: 1. Cemitério dos Aflitos 2. Liberdade 3. Memória 4. Arqueologia


IGOR GABRIEL SOUZA CAROLLO MEMÓRIAS OCULTAS DO BAIRRO DA PÓLVORA - MEMORIAL E CENTRO DE ARQUEOLOGIA CHAGUINHAS Liberdade

Trabalho Final de graduação ao curso de Arquitetura e Urbanismo, sob a orientação dos Professores Dalva Thomaz e Valdir Arruda. Deferido e aprovado em ___ de ________ de 2019, pela banca examinadora constituída pelos professores:

Dra. Dalva Thomaz FIAM FAAM / Orientador

FIAM FAAM/Convidado interno

São Paulo 2019

Convidado externo



Dedicatória A Deise, minha mãe, que com todo amor e paciência me incentivou e ensinou desde os meus primeiros passos, abraçando meus sonhos e objetivos como se fossem seus. A minha Avó Diva e Tia Elizabeth, mulheres fortes que moram comigo e me dão toda a força para prosseguir em minha caminhada. Ao Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) por toda a oportunidade de novas visões e aprendizados. A todos que lutam diariamente para que sua ancestralidade e memória não sejam apagados. Aos sepultados e esquecidos no Cemitério dos Aflitos. Que este trabalho seja um manifesto à memória e uma fagulha de luta contra o sucessivo apagamento e redesenho da história.



Agradecimentos Agradeço a Deus, aos Orixás e meus guias e mentores espirituais por sempre me ampararem nos momentos de fraqueza, me dando força para completar mais esta etapa. Agradeço a minha família que não mediu esforços para me motivar e fez-se presente em todos os meus processos de construção acadêmica Aos meus Professores por todo o conhecimento compartilhado, amizade, carinho e respeito. Agradeço aos meus amigos do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), por todas as trocas de conhecimento, carinho e cumplicidade. Expresso a minha gratidão a Arquiteta e amiga Lia Mayumi, mestra e mentora que tanto me ensinou durante meu estágio no Departamento do Patrimônio Histórico (DPH). A minha orientadora Dalva Thomaz, amiga e brilhante mentora que abriu novas oportunidades para o meu crescimento profissional, social e ético, com todo o cuidado me ensinando e fortalecendo os meus primeiros passos da carreira acadêmica e profissional . Este trabalho não existiria sem o seu enorme apoio. Ao meu orientador e Arquiteto Valdir Arruda, amigo e conselheiro que tanto me ensinou e acolheu. Agradeço também aos meus colegas de classe, por toda a união, compreensão e ajuda em todos os processos durante estes 5 anos. Aos que fizeram parte do meu grupo, do início ao fim deste ciclo; Laís Bragante, Letícia Carvalho, Italo Fontanive e Mariana Azevedo. Ao meu amigo Pablo Cruz que há 13 anos está ao meu lado me amparando em todas as adversidades da vida. Agradeço a Juliana Furlanetto, mulher forte, guerreira e grande fonte de inspiração, símbolo de resistência. Agradeço a minha Avó Diva, fonte de inspiração, amor, afeto e luta há 82 anos em minha família. A Arquiteta Raquel Schenkman, que norteou a escolha do tema a ser analisado por este trabalho.



Não dá para falar em consciência humana enquanto pessoas negras não tiverem direitos iguais e sequer forem tratadas como humanas. Djamila Ribeiro



SUMÁRIO 1.1. 1.1. 1.2. 1.3. 1.3.1. 1.3.2. 1.3.3. 2.1. 2.1.2 2.2. 3.1. 3.1.1. 3.1.2. 3.1.3. 3.1.4. 3.1.5. 3.1.6. 4.1. 5.1.

INTRODUÇÃO_______________________________________________________________________________19 LIBERDADE-JAPÃO_______________________________________________________________21 Contextualização_____________________________________________________________________21 Resoluções de Tombamento________________________________________________________________27 Análise Urbana________________________________________________________________________30 Região___________________________________________________________________________33 Análise do Terreno________________________________________________________________35 Índices Urbanísticos________________________________________________________________35 Partido Arquitetônico________________________________________________________________37 Programa Arquitetônico__________________________________________________________________41 Características Construtivas___________________________________________________________43 Plano de Restauro Capela dos Aflitos___________________________________________________44 Dados do Edifício___________________________________________________________________44 Processo Administrativo 2010-0.249.852-9__________________________________________46 Relatório Fotográfico________________________________________________________________48 Memorial Descritivo________________________________________________________________55 Peças Gráficas Capela dos Aflitos______________________________________________________58 Mapa de Danos_______________________________________________________________________60 Projeto – Centro de Arqueologia e Memorial Chaguinhas______________________________61 eferencias Bibliográficas___________________________________________________________88


LISTA DE ABREVIAÇÕES


IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. CONDEPHAAT – Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico. CONPRESP – Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo. DPH – Departamento do Patrimônio Histórico. CASP – Centro de Arqueologia de São Paulo. ZC- Zona de Centralidade.


INTRODUÇÃO


O Projeto Memórias Ocultas do Bairro da Pólvora consiste na proposição de um MuseuManifesto como lugar destinado ao resgate de memórias que passaram por sobreposição e apagamentos históricos, um espaço de apropriação e convívio que tem por mote a pesquisa arqueológica enquanto reconhecimento da multiplicidade das memórias paulistanas. O trabalho é fruto do meu estágio no Departamento do Patrimônio Histórico, o qual possibilitou inúmeras reflexões sobre as memórias paulistanas e situações de sobreposições e apagamentos históricos. A monografia está estruturada em dois capítulos. O Capítulo I trata da contextualização do tema mediante a sua importância no contexto da história, da cidade e do bairro. Contempla, portanto, primordialmente a análise histórica e urbana do entorno imediato justificando a escolha deste local para o projeto. O Capítulo II contextualiza o projeto na sua localização, justificando as escolhas que o norteiam em sua forma volumétrica, e também as diretrizes de restauro da Capela dos Aflitos. Essa análise é complementada com informações referentes a materialidade do projeto. As pranchas gráficas do projeto finalizam o trabalho, enquanto representação de uma resposta às condicionantes analisadas.

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LIBERDADE JAPÃO

Ilustração por Marilia Marz


Apesar de em sua história o bairro da liberdade ter tido como cerne originador os processos escravagistas e higienistas da sociedade no Século XVIII32 , atualmente configura-se com motivos de uma cultura imigrante oriental introduzida a partir da metade do século XX, sobrepondo a camada da centelha originária da história do Bairro da Pólvora. O frequente apagamento das memórias exalta uma política de embranquecimento e exclusão de um viés perverso da sociedade. Isto pode ser observado ao longo da linha do tempo em lugares como o cemitério dos recém-chegados no Rio de Janeiro próximo à Praça XV, o quilombo do Saracura no Bixiga em São Paulo, o Cemitério dos Aflitos e mesmo o mote inicial do Cemitério público da Consolação. Destes quase todos passaram por posteriores loteamentos, consequentemente sobrepondo camadas fundamentais que remontam uma história não tão distante e intrínseca aos processos sociais e urbanísticos da cidade33.

O polígono que corresponde ao antigo Cemitério dos Aflitos, formado pelas ruas Galvão Bueno, Estudantes, Glória e Avenida Radial Leste, encontra-se verticalizado, ocultando um fragmento importante da memória paulistana. Portanto o ato político de reviver estas memórias se torna possível por meio do reconhecimento dos sítios arqueológicos e levantamentos a respeito do eixo Glória-Lavapés.

32 MATRANGOLO, Breno Henrique Selmine. Formas de bem morrer em São Paulo: transformações nos costumes fúnebres e a construção do cemitério da Consolação (1801-1858). 2013. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. 33 LIMA, Alessandro Luis Lopes de. Uma arqueologia dos territórios negros: contas e miçangas no triângulo histórico de São Paulo (sécs. XIX-XX). 2019. Dissertação (Mestrado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. doi:10.11606/D.71.2019.tde-12082019-112621. Acesso em: 2019-11-23.

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É deste contexto que surge a proposta de um edifício memorial e manifesto situado no lote onde foram feitas descobertas arqueológicas em outubro de 201834. Nove corpos sepultados no antigo Cemitério foram encontrados e atualmente estão em análise pelo escritório de arqueologia “A Lasca”35.

O projeto que estamos chamando de Memórias Ocultas do Bairro da Pólvora, Centro de Arqueologia e Memorial Chaguinhas tem como objetivo fazer aflorar as camadas históricas correspondentes ao processo escravagista da cidade e a pena de morte em 1775 (data de abertura do Cemitério dos Aflitos), onde eram sepultadas pessoas escravizadas, pobres e marginalizados perante a sociedade, como também recém enforcados na proximidade do mesmo, Largo da Forca; atual Praça da Liberdade. Os sepultamentos ocorriam no espaço que atualmente corresponde pelas Ruas da Glória, Estudantes, Galvão Bueno e pela Avenida Radial Leste36. A escolha do nome Memorial e Centro de Arqueologia "Chaguinhas" deve-se ao santo popular da Liberdade, altamento cultuado na Capela Nossa Senhora dos Aflitos. Conta-se que em 1821, ele e outro militar rebeleram-se contra o comando do batalhão motivado pela desigulade de salários e tratamentos entre soldados Brasileiros e Portugueses. Após a rebelião ser reprimida Chaguinhas assumiu a culpa livrando os demais companheiros da forca. No dia de sua execução, a corda que deveria tirar a vida do soldado rompeu tres vezes. A multidão intepretou como intervenção divina e começou a clamar por Liberdade, ato que deu origem ao nome do bairro37. Após os clamores Chaguinhas teria sido espancado até a morte pelo carrasco. Diante da significancia afetiva do personagem, e a necessidade de faces representativas diante do apagamento deste trecho da Memória Paulistana a escolha justifica-se.

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Notícia publicada no portal do IPHAN. Disponível em < http://portal.iphan.gov.br/noticias/detalhes/4925/escavacao-arqueologi-

ca-traz-a-tona-primeiro-cemiterio-publico-da-capital-paulista>. 35

Escritório de Arqueologia responsável pela pesquisa nos nove corpos encontrados no Sítio Arqueológico do Cemitério dos Aflitos.

36 BUENO, Francisco de Assis Vieira. “A Cidade de São Paulo: recordações evocadas da memória, notas históricas”, In MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.). Vida Cotidiana em São Paulo no século XIX: memórias, depoimentos, evocações. São Paulo: Ateliê, 1999, p. 168. 37 Relato publicado pela Arquidiocese de São Paulo, região Episcopal da Sé. Disponível em <http://www.arquisp.org.br/regiaose/paroquias/mosteiros-igrejas-historicas-oratorios-da-regiao-se/igreja-santa-cruz-das-almas-dos-enforcados>.


Sabe-se que o sepultamento de cadáveres no Século XVIII era realizado dentro de igrejas, porém somente a classe mais abastada possuía tal privilégio, enquanto os pobres, indigentes e escravos não gozavam de nenhum ou muito pouco rito de passagem. Para tentar solucionar a ausência de locais para o sepultamento da camada marginalizada da sociedade foi encomendada a construção do Cemitério dos Aflitos, afastado do tecido urbano, no caminho que levava a Santos. O polígono do Cemitério dos Aflitos, o primeiro cemitério público da cidade, começou a funcionar efetivamente em 1774. Nos limites de seu lote foi erigida em 27 de junho 1779 uma Capela em taipa de pilão, a fim de servir aos Aflitos que estavam próximos de um enforcamento38. Segundo o advogado Francisco Assis Vieira Bueno, o sepultamento de cadáveres dito indesejáveis para a sociedade da época eram realizados sem qualquer tipo de cortejo ou preparo. A situação do Cemitério também era tida como precária: “Para o enterramento da arraia miúda só havia um cemitério de pobre e humilde aparência, no fim da rua da Glória, que geralmente chamavam rua do cemitério. Dentro das taipas nuas, que o fechavam, crescia o ervaçal, havendo num dos lados um pequeno campanário, com um pequeno sino. Ficava ele embaixo do morro da Forca, vulgo três Paus [...] O pequeno sino desse humilde campanário soava tristemente, quando lá em cima na Forca era cortado o baraço em que balouçava o cadáver de uma vítima do bárbaro suplício, e dali mesmo partia uma padiola para trazer o cadáver para ser enterrado.”39

Entre 1836 e 1837, ocorreram 153 enterros no Cemitério dos Aflitos, segundo registros da Cúria Metropolitana de São Paulo40.

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MATRANGOLO, Breno Henrique Selmine. Formas de bem morrer em São Paulo: transformações nos costumes fúnebres e a construção

do cemitério da Consolação (1801-1858). 2013. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. doi:10.11606/D.8.2013.tde-18112013-130205. Acesso em: 2019-11-23. 39 BUENO, Francisco de Assis Vieira. “A Cidade de São Paulo: recordações evocadas da memória, notas históricas”, In MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.). Vida Cotidiana em São Paulo no século XIX: memórias, depoimentos, evocações. São Paulo: Ateliê, 1999, p. 168. 40

Arquivo da Cúria Metropolitana. Livro de Óbitos da Sé, 1836-1837

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Com a abertura do Cemitério da Consolação em 1858, foram proibidos os sepultamentos no Cemitério dos Aflitos, como também o ato no interior das igrejas católicas. Em 1885, o cemitério encontrava-se em ruínas, oficiado pela Câmara Municipal para que reconstruísse os muros caídos. O então Bispo D. Lino Deodato Rodrigues de Carvalho resolveu, ao contrário, lotear toda a área. Os terrenos foram vendidos, e o dinheiro proveniente da transação teve como destino as obras que se realizavam na Sé Catedral. Do parcelamento do antigo Cemitério ficou preservada a Capela dos Aflitos41. Após o encerramento das atividades deste Cemitério, os corpos não foram transferidos para o Cemitério da Consolação, a quadra passou por loteamentos que culminaram na situação atual de verticalização e sobreposição de memórias. Em dezembro de 2018, no terreno o qual motiva este trabalho, foram encontradas nove ossadas após a demolição de um edifício comercial42. O IPHAN assim decretou assim sítio arqueológico e foram iniciados os processos de escavação.

Figura 1 – Terreno tapumado após escavações arqueológicas realizadas pelo escritório de Arqueologia “A Lasca”, sob supervisão do CASP (Centro de Arqueologia de São Paulo), DPH, e as esferas patrimoniais da União, Município e Estado de São Paulo, Março/2019. – Registro por Igor Carollo em Marco/201943.

41 Levantamento histórico realizado pelo Estúdio Sarasá no processo administrativo 2010-0.249.825-9 protocolado junto ao DPH/ CONPRESP. 42 Notícia publicada no portal do IPHAN. Disponível em < http://portal.iphan.gov.br/noticias/detalhes/4925/escavacao-arqueologica-traz-a-tona-primeiro-cemiterio-publico-da-capital-paulista>. 43

Neste período eu estava estagiário do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), onde pude acompanhar de perto este processo.


Figura 2 – Alvará de obras emergências, número de processo pertinente as esferas patrimoniais da União, Município e Estado de São Paulo. – Registro por Igor Carollo em Março/2019.

Figura 3 – Situação do lote com a Capela dos Aflitos ao fundo. – Registro por Igor Carollo em Março/2019.

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No cenário atual, a Capela dos Afl itos se encontra sufocada pela verticalização limítrofe ao lote que a corresponde. Inúmeras patologias afl oraram por suas paredes remanescentes d e t a ip a e p o r t o d a s a s inserções posteriores ao período de construção que foram introduzidas ao longo do tempo, como alvenaria em tijolo e concreto armado.

Figura 4 – Vista da Capela dos Aflitos a partir do Beco dos Aflitos. - Registro por Igor Carollo em Março/2019.


A Capela Nossa Senhora dos Aflitos é tombada pelas seguintes esferas patrimoniais: CONDEPHAAT - Res. SC SN/1978, publicada em Diário Oficial em 25/10/1978, Livro do Tombo, inscrição nº128, p 24, em 18/07/1979 CONPRESP - Resolução 05/CONPRESP/1991 TEO (Tombamento ex-officio44) publicada em Diário Oficial em 10/04/1991, P. 11. - Resolução 25/CONPRESP/2018 – Eixo Glória-Lavapés

O eixo arqueológico do Glória-Lavapés faz parte de uma pesquisa realizada pelo Departamento de Patrimônio Histórico (DPH)45, e foi tombado pela Resolução 25/CONPRESP/2018, onde define-se: “Artigo 5º - Visando à preservação do patrimônio arqueológico relacionado ao Caminho Histórico Glória – Lavapés, extensão da colina central da cidade, foram definidas ÁREAS DE INTERESSE ARQUEOLÓGICO, conforme estabelecido no ANEXO II desta resolução. Parágrafo Primeiro – Qualquer intervenção nessas áreas, incluindo a escavação ou instalação de qualquer tipo de equipamento e mobiliário urbano, deve ser submetido à prévia aprovação do DPH/ CONPRESP e à análise e manifestação do Centro de Arqueologia. Parágrafo Segundo – Fica obrigatória a contração de serviço de Acompanhamento Arqueológico pelo Poder Público e suas empresas concessionárias em intervenções que afetem o subsolo em todas as áreas definidas no ANEXO II. Parágrafo Terceiro – Fica obrigatória a contratação de serviço de Acompanhamento Arqueológico em lotes que venham a ser construídas edificações com mais de 10 metros de altura ou três pavimentos, nas áreas definidas no ANEXO II.”46 44 Tombamento feito a partir dos estudos elaborados pelo Condephaat e/ou IPHAN, adotando-se as mesmas diretrizes, ou seja, indicam imóveis já tombados anteriormente pelo Estado ou pela União. 45

Pesquisa elaborada pela Arquiteta Raquel Schenkman, Arqueóloga Paula Nishida e Historiador Paulo Eduardo David Malavazi.

46 Resolução publicada em Diário Oficial e disponível no site do CONPRESP <https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/ cultura/conpresp/legislacao/resolucoes/index.php?p=1137>

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Pesquisa realizada pela Arqueóloga Paula Nishida (CASP)47, Arquiteta Raquel Schenkman e Historiador Paulo Malavazi que norteou e definiu as definições da Resolução 25/CONPRESP/2018, a respeito do tombamento do eixo Glória-Lavapés e identificação dos perímetros de interesse Arqueológico.

Figura 5 – Áreas de interesse Arqueológico, perímetro azul engloba o polígono do cemitério dos Aflitos. Fonte: Departamento do Patrimônio histórico (2019). 47

Atual Coordenadora do Centro de Arqueologia de São Paulo durante a elaboração deste trabalho.


Figura 6 - Croqui Beco dos Aitos - Desenho por Maria Brenda Luna

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1.3 ANÁLISE URBANA

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A proposta engloba a desapropriação de um lote localizado no Beco dos Aflitos, paralelamente ao terreno de implantação do Memorial e Centro de Arqueologia. A escolha da desapropriação deste lote foi pautada em discussões com o Historiador Abílio Ferreira, militante a favor de um memorial aos sepultados e esquecidos no Cemitério dos Aflitos, qual foi aberto debate sobre a possibilidade real de desapropriação junto a Secretaria de Cultura. Tal desapropriação justificase pela necessidade da implantação de um espaço de manifestação religiosa ecumênica e o viés de “desenclausurar” a Capela dos Aflitos conforme citado anteriormente neste trabalho.

Figura 7 – Imagem aérea da quadra do Cemitério dos Aflitos, a qual está evidenciada pelo tracejado vermelho. O terreno de intervenção do Memorial e Centro de Arqueologia e Capela dos Afl itos em azul, e amarelo para a proposta de desapropriação que engloba o a praça cívica e religiosa. Imagem produzida por Igor Carollo.


Ao analisar o mapa ao lado, é possível notar a predominância de usos Comerciais na região. O uso do solo foi sendo alterando de residencial para comercial com o passar do tempo. Os fl uxos intensos de transeuntes demandam uma pedestrianização de alguns trechos do viário atual.

Figura 8 – Mapa de uso do solo da região do Distrito da Sé. Produzido por Igor Carollo.

33 Figura 9 – Mapa de uso do solo da região do Distrito da Sé. Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.


Figura 10 – Visão a partir do Beco dos Aflitos – Imagem produzida por Igor Carollo.


O terreno está localizado paralelamente a Rua Galvão Bueno e Rua dos Aflitos, altura do nº 63, no Bairro da Liberdade. Encontra-se a uma quadra do metrô liberdade e na cota acima da Avenida Radial-Leste. Atualmente o terreno encontra-se tapumado aguardando construção. O terreno foi escolhido por se tratar de um local com uma forte ligação ao passado escravocrata de São Paulo, e ter sido palco de uma recente descoberta arqueológica, estando localizado no polígono que compete ao antigo Cemitério dos Aflitos, desativado em 1885.

Área do lote Memorial e Centro de Arqueologia Chaguinhas: 443,35m² Área do lote proposta para desapropriação: 316,37m² Área total de intervenção: 759,72m² CA: 6 (Sujeito a Lei 12.345 de 6 de junho de 1997 / Artigo IV) Zoneamento: Zona de Centralidade

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Figura 11 – Representação Isométrica da volumetria final do Projeto. – Imagem produzida por Igor Carollo.


Figura 12 – Representação de situação sem escala, fruição viária em vermelho, Capela dos Aflitos em preto. O partido do projeto tem como premissa o

aproveitamento do subsolo, do nível térreo e de um bloco superior garantindo a completa visualização da Capela dos Aflitos a partir da Rua Galvão Bueno. No subsolo o programa desenvolvese em um Museu dos itens arqueológicos da Cidade de São Paulo e acervo técnico a fim de garantir a salvaguarda e educação patrimonial, no térreo uma praça memorial realiza a conexão entre a Rua Galvão Bueno e o Beco dos Afl itos e no bloco superior acontecem as áreas de pesquisa, administração, educativo e café com mirante.

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Figura 13 – Visualização da Capela dos Aflitos a partir da Rua Galvão Bueno. Ossários nas empenas laterais para receber os corpos do Cemitério dos Aflitos encontrados nas escavaçções Arqueológicas em Outubro de 2018 – Imagem produzida por Igor Carollo.


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O programa de necessidades do edifício nasce a partir do viés arqueológico, educativo e de resgate das Memórias Paulistanas. A partir deste estudo a proposta do Centro de Arqueologia e Memorial Chaguinhas desenvolve-se em um edifício d 8 pavimentos, onde 62% do programa encontra-se no subsolo abaixo da cota da Rua Galvão Bueno.

A partir do programa e a elaboração do organograma de fluxos e setorizações, somado às condicionantes do terreno, surgiu a necessidade um edifício anexo de serviços para suprir as demandas técnicas do edifício principal. Figura 14 – Quadro de Áreas.


Figura 15 – Organograma do programa arquitetônico.

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Figura 16 – 1º Subsolo evidenciando o vigamento em estrutura metálica. – Imagem produzida por Igor Carollo.


A concepção estrutural é composta por vigas metálicas sobre neoprene em consoles e pilares de concreto armado, moduladas em vãos consecutivos de 5m. Diante da fragilidade da estrutura da Capela dos Aflitos em taipa de pilão, a solução encontrada para o subsolo foi o método de parede diafragma com Clam Sheel e Hidrofresa, método que consiste em 2 equipamentos distintos que escavam o solo e sugam o material, evitando o uso de estacas por percussão que poderiam abalar significamente a frágil estrutura da Capela.

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Plano de ações necessárias ao restauro e conservação do imóvel, baseado no Plano de Manutenções elaborado pelo DPH e disponibilizado pelo CONPRESP32. Contendo memorial descritivo, ações sistemáticas e medidas de restauro para o resgate da autenticidade.

Trata-se de um no final do Século XVIII. Ao longo do tempo a por sofrendo sucessivas como o concreto armado e

edifício situado no Beco dos Aflitos, 70. Erigido em taipa de pilão volumetria original da Capela foi severamente modificada, passando adições de materiais posteriores aos maciços de taipa erigidos, alvenaria estrutural.

Figura 17 – Croqui da situação atual da Capela dos Aflitos. Desenho produzido por Maria Brenda Luna.

32 Material de livre consulta disponível em <https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/roteiro_basico_para_elaboracao_de_ programa_e_plano_de_manutencao_1557858483.pdf>.


Figura 18 – Croqui ilustrativo de sua situação no Século XVIII. – Desenho produzido por Maria Brenda Luna.

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Em pesquisa no Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) na data de 28/03/2019 encontrei o Processo Administrativo 2010-0.249.825-9, o qual trata de um projeto de restauro, elaborado por Estúdio Sarasá e Instituto Actos. projeto que propõe o restauro de forma a trazer de volta as características da fachada a partir de uma fotografia sem datação ou autoria(Fig.21,pg.20), desconsiderando as diversas camadas históricas que compõe a fachada atual da Capela dos Aflitos. A partir deste projeto, proponho a consolidação da fachada atual da Capela dos Aflitos, bem como o seu restauro anexado a esta monografia.

Figura 19 – Situação atual, elaborada pelo Estúdio Sarasá, obtida via Lei de acesso a informação nº 12.527 Fonte: De pa r t am ent o d o Pat ri mô n i o Histórico (DPH).


Figura 20 – Situação proposta pelo Estúdio Sarasá, obtida via lei de acesso a informação nº 12.527 Fonte: Departamento do Patrimônio Histórico (DPH).

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Na década de 90, a Capela passou por um incêndio em seu altar, destruindo completamente os adornos com motivos barrocos existentes em seu interior. O processo de restauro após o incêndio nunca aconteceu, portanto, as peças danificadas continuam expostas ao culto religioso.

Figura 21– Peças danificadas após incêndio na década de 90. Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.


Figura 22 – Fachada frontal – Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.

A fachada frontal apresenta diversas patologias, entre elas: perda de ornamentação de frisos, criptoflorescência, desprendimento do revestimento, eflorescência, crosta negra, trincas e fissuras.

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Figura 23 – Peças em madeira danificadas por umidade e agentes biológicos.


Figura 24 – Pichações, sujedidades, trincas, fissuras e adições em argamassa cimentícia , da qual apresenta severo desprendimento. – Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.

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Figura 25 – Elementos espúrios impedem a completa visualização da fachada. – Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.


Figura 26 – Altar mor altamente danificado, com perda de ornamentação e adições em gesso junto a madeira. – Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.

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Figura 27 – Infraestrutura elétrica prejudicada, facilitando a ocorrência de um sinistro de incêndio. – Registro por Igor Carollo em 26/03/2019.


Memorial descritivo parte deste trabalho, contém ações necessárias ao restauro da Capela dos Aflitos, baseadas nos estudos de Lia Mayumi arquiteta do DPH, material do Processo Administrativo 2010-0.249.825-9, e minhas experiências como estagiário do Departamento do Patrimônio Histórico(DPH). Prospecções • Realização de prospecções pictóricas para determinar as cores originais e a possível presença de pinturas decorativas. • Realização de prospecção da situação estrutural das paredes por meio da remoção completa do revestimento, a fim de levantar vestígios e intervenções passadas de acréscimos ao maciço de taipa de pilão original Estrutura • No caso de acréscimos que tenham perdido total aderência e estejam incompatíveis aos fatores de dilatação e retração dos maciços de taipa, será efetuado a sua completa remoção e posterior preenchimento com soluções em solo cimento. Compatíveis aos fatores de dilatação e retração do maciço original, a fim de evitar desprendimentos, trincas e fissuras. • Estudo estrutural diante da necessidade de implantação de vigas baldrames e alicerces em concreto armado, devido a possível instabilidade da estrutura.

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Alvenarias • Recomposição do revestimento das paredes em seu aspecto e textura poderão ser obtidos através de massa de adequado traço de cal, cimento e saibro em substituição à areia, o que aumentará a plasticidade da massa.33 Piso • Remoção total da intervenção existente com a presença de uma equipe de Arqueologia afim de realizar todos os estudos e prospecções, posteriormente refazer em solo-cimento. Pintura • Após o levamento pictórico a parede deverá receber uma camada de cal virgem hidratado in loco. Fachada • Recomposição dos frisos e molduras danificados em argamassa solo-cimento com saibro em substituição a areia, garantindo maior plasticidade. • Pintura a base de cal virgem, hidratado in loco, pigmentação definida por prospecções. • O gradil de ferro e o toldo plástico presente na fachada frontal e testada do lote deverão ser completamente removidos. • Remoção da calçada em concreto presente na testada da edificação e colocação de pedras no formato poliédrico no contorno externo dos maciços em taipa de pilão presente na fachada, a fim de eliminar a erosão da taipa. 33 A partir do relato da Arquiteta Lia Mayumi em seu livro Taipa, Canela Preta e Concreto, a respeito das medidas de restauro tomadas na casa do Caximbi.


Mezanino • O barroteamento do mezanino deverá ser substituído por madeira nobre ou semelhante ao existente em caso de deficiência estrutural. • Tratamento de toda a madeira contra o ataque de agentes xilófagos. Cobertura • Remoção das telhas, higienização e posterior reinstalação. • Substituição das peças estruturais que apresentarem deficiência. • Tratamento de toda a madeira da cobertura contra o ataque de agentes xilófagos. Sino • O suporte em madeira deverá ser retirado, higienizado e tratado contra o ataque de agentes xilófagos. • O sino deverá passar por um processo de higienização e restauro de superfícies danificadas e corroídas.

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Figura 28 – Administração e curadoria, 1º Pavimento - Desenho por Igor Carollo.


Figura 29 – Café e Mirante, 3º Pavimento - Desenho por Igor Carollo.


Figura 30 – Corte Esquemático Desenho por Igor Carollo.


Figura 31 – Fachada Leste - Desenho por Igor Carollo.


Figura 32 – Fachada Oeste - Desenho por Igor Carollo.


Figura 33 –

Vista a partir do Beco

dos

Aflitos - Desenho por Igor Carollo.



Figura 34– Espaço expositivo, 1º Subsuolo - Desenho por Igor Carollo.


Figura 35 – Praça Memorial, conexão com Rua Galvão Bueno e Beco dos Aflitos - Desenho por Igor Carollo.

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Acervo do Arquivo Histórico Municipal da Cidade de São Paulo. BUENO, Francisco de Assis Vieira. “A Cidade de São Paulo: recordações evocadas da memória, notas históricas”, In MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.). Vida Cotidiana em São Paulo no século XIX: memórias, depoimentos, evocações. São Paulo: Ateliê, 1999

CAMARGO, Monsenhor Paulo Florêncio da Silveira. A Igreja de São Paulo.São Paulo: Cúria Metropolitana, 1953, volumes VI e VII. MATRANGOLO, Breno Henrique Selmine. Formas de bem morrer em São Paulo: transformações nos costumes fúnebres e a construção do cemitério da Consolação (1801-1858). 2013. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. doi:10.11606/D.8.2013.tde-18112013-130205. Acesso em: 2019-11-12.

MAYUMI, Lia. Taipa, canela preta e concreto: um estudo sobre a restauração de casas bandeiristas em São Paulo. 2006. Tese (Doutorado em Estruturas Ambientais Urbanas) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. doi:10.11606/T.16.2006. tde-05052010-105239. Acesso em: 2019-11-12. PREFEITURA DE SÃO PAULO. DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO (DPH-CONPRESP). Disponível em <https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/conpresp/>. Processo Administrativo 2010-0.249.825-9/CONPRESP.

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