Revista nº. 57 • Ano 8 • Novembro/2022 Sarau Luciene Carvalho 2 edição do sarau aconteceu em Chapada dos Guimarães. Pag. 22 Mato Grosso lume 8 18 32 38 44 54 DOENÇAS CONTAGIOSAS AO ALCANCE DE TODOS SANTOS RECEBE “CARGA” DE NOIVAS JAPONESAS EM 1959 PEABIRÚ, O CAMINHO INCA PERDIDO NO TEMPO CEL IPORAN, O HERÓI ESQUECIDO A MÚSICA HALLELUJAH, DE LEONARDO COHEN AMERICANIDADE - AUGUSTO DOS ANJOS
VISTA AÉREA DOS PAREDÕES E DO PORTÃO DO INFERNO EM CHAPADA DOS GUIMARÃES. FOTO: MÁRIO FRIEDLÄNDER
Desde o surgimento da revista im pressa no Brasil em 1812, essa mídia tradicional sofreu diversas
o surgimento da revista impres sa no Brasil em 1812, essa mí dia tradicional sofreu diversas transformações ao longo do tem po. Com o advento da internet, as mudan ças foram ainda mais drásticas: surgiu uma necessidade de se acessar as notí cias de forma imediata, fazendo com que as revistas que permaneciam somente no meio impresso ficassem para trás. Para se adaptar aos moldes dos dias atuais, os veículos procuraram se reinventar ao criar setores para publicar conteúdo na inter net, assim expandindo a marca para atin gir mais pessoas. Questionados, alguns jornalistas se pronunciaram sobre esse assunto. Marcos Coronato, editor execu tivo da revista Época, relatou a preocupa ção do veículo em fazer com que as ma térias do site tenham o maior “ciclo de vida” possível, exaltando a figura do editor que proporciona um olhar mais experiente e pode tornar a publicação mais interes sante para dessa forma atrair mais leito res. Na revista Veja a situação é bem pa recida. Daniel Bergamasco, editor online, revelou que há alguns anos o veículo in vestiu na plataforma online, e isso permi tiu algumas mudanças na redação: inter câmbio entre editores e união dos jornalis tas, deixaram de existir papéis definidos. Daniel acredita que a versão online ainda não conseguiu se igualar a edição impres
sa quando se trata de impacto, na medi da em que as revistas causam um efeito nostálgico e forte ao se abrir, por exem plo, uma foto que ocupa uma página in teira. É algo que captura a atenção do lei tor de uma maneira que os sites não con seguem fazer. A revista impressa é desen volvida considerando que o leitor terá um tempo maior dedicado ao texto, desta for ma a produção de conteúdo é mais apro fundada. Entretanto, as chamadas “pau tas quentes” podem não resistir até o fi nal de semana (quando a revista é veicu lada), valorizando a necessidade do site. Giovana Romani, editora sênior da revis ta Glamour, acredita na exclusividade da revista impressa, já que existe uma cura doria limitada para a veiculação. A princi pal diferença apontada por Giovana está na questão do título, o online exige “sujei to, predicado, ação e informação relevan te”, em contrapartida a revista é mais flui da. Para mim não ocorrerá o fim da revis ta impressa, mas sim uma depuração da quilo que temos em nosso mercado, tanto no Estado, quanto no país afora. Os edi tores e jornalistas migrarão, em sua maio ria, para sites. Ficarão os que tem propos ta editorial que atinja os objetivos do lei tor, especialmente daquele mais exigente e que busca qualidade. Estamos buscan do encontrar o caminho certo para nossa LUME MATO GROSSO.
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CARTA DO EDITOR
MatoGrosso
GROSSO
JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA Editor Geral
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Mato Grosso
PESCUMA MORAIS Diretor de Expansão e de Projetos Especiais
ELEONOR CRISTINA FERREIRA Diretora Comercial
JOÃO CARLOS VICENTE FERREIRA Editor Geral MARIA RITA UEMURA Jornalista Responsável
JOÃO GUILHERME O. V. FERREIRA Revisão
ÁLEX VICENTE, AMÉRICO CORRÊA, ANA CAROLINA H. BRAGANÇA, ANDRÉIA KRUGER, ANNA MARIA RIBEIRO, BENEDITO PEDRO DORILEO, BRUNO HENRIQUE BRITO LOPES, CARLOS FERREIRA, CECÍLIA KAWALL, DIEGO DA SILVA BARROS, EDUARDO MAHON, ELIETH GRIPP, ENIEL GOCHETTE, EVELYN RIBEIRO, FELIPE DE ALBUQUERQUE, FRANCISCO E. DE BRITO JR., JOSANE SALLES, JUDI OLLI, JULIANA RODRIGUES, LIANE CARVALHO OLEQUES, LUCIENE CARVALHO, LUIZ CARLOS NEMETZ, MARIA CLARA BENGEMER, MILTON PEREIRA DE PINHO - GUAPO, RAFAEL LIRA, RAFAEL M. ALMEIDA, ROSE DOMINGUES, RUTH ALBERNAZ, THAYS OLIVEIRA SILVA, VALÉRIA CARVALHO, WLADIMIR TADEU BAPTISTA SOARES, YAN CARLOS NOGUEIRA Colaboradores ANDREY ROMEU, ANTÔNIO CARLOS FERREIRA (BANAVITA), CECÍLIA KAWALL,
CHICO VALDINEI, EDUARDO ANDRADE, HEITOR MAGNO, HENRIQUE SANTIAN, JOSÉ MEDEIROS, CORRÊA, JÚLIO ROCHA, LAÉRCIO MIRANDA, LUIS ALVES, LUIS GOMES, RAI REIS, MAIKE BUENO, MARCOS BERGAMASCO, MARCOS LOPES, MÁRIO FRIEDLANDER, MOISÉS INÁCIO DE SOUZA, SAMUEL MELIN Fotos
OS ARTIGOS ASSINADOS SÃO DE RESPONSABILIDADE DE SEUS AUTORES.
LUME - MATO GROSSO é uma publicação mensal da EDITORA MEMÓRIA BRASILEIRA Distribuição Exclusiva no Brasil
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ROSELI MENDES CARNAÍBA Projeto Gráfico/Diagramação
LUCIENE CARVALHO FOTO: KAREN MALAGOLI Capa
lume MatoGrosso EXPEDIENTE
6 lume MatoGrosso SUMÁRIO 14. SOCIEDADE 50. LITERATURA 12. PARA QUANDO VOCÊ FOR
7 lume MatoGrosso 54. LITERATURA 66. ÚLTIMA PÁGINA 60. LITERATURA 58. RETRATO EM PRETO E BRANCO
Doenças Contagiosas ao Alcance de Todos
Conversamos com o médico e escritor Ivens Cuiabano Scaff sobre doenças contagiosas, lobby da indústria farmacêutica e literatura
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SAÚDE
O SENHOR É MÉDICO E LECIONA INFECTOLOGIA EM UMA UNIVERSIDADE DE MATO GROSSO. COMO SE DEU O INTERESSE POR ESSA ÁREA DA CIÊNCIA QUE ABORDA DOENÇAS INFECIOSAS E PARASITÁRIAS?
» No meu tempo de facul dade, formei-me na Uni versidade Federal do Rio de Janeiro, a matéria rela cionada a infectologia se chamava Medicina Tropi cal e era focada em saúde pública, doenças endêmi cas como Esquistossomo se e Doença de Chagas e não havíamos experimen tado os avanços na área de estatística, epidemiolo gia e informática e no co nhecimento sobre os anti
bióticos. Meus interesses na época eram Clinica Mé dica, Gastroenterologia e Endoscopia digestiva. Ao retornar a Cuiabá em 1976 os hospitais estavam re pletos de casos de malá ria vindos do norte de Mato Grosso, fui então me apro ximando da área da infec tologia. Com o início da epidemia da AIDs na déca da de 1980, o atendimen to no setor público aos pa cientes HIV-soropositivos com o acompanhamento de alunos passou a ser mi nha principal atividade.
O SENHOR ACREDITA QUE APARELHOS DE GINÁSTICA TODOS SUADOS TRANSMITEM DOENÇAS? E CORRIMÃO, MAÇANETA,
BARRAS DE SEGURANÇA DE ÔNIBUS, UTILIZADAS POR PASSAGEIROS? É PARANÓIA OU EXISTE FUNDAMENTO NESSE TEMOR?
» Não é paranóia. As mãos podem auxiliar na transmis são tanto de doenças que se transmitem por contato como por via aérea. Assim a Influenza (gripe clássica) como a H1N1 transmitidas por aerossóis também são veiculadas por contato com mãos contaminadas. Afec ções intestinais sejam por ví rus(rotavirus) como por bac térias(salmonelas) ou por mãos contaminadas por to xinas(toxinas estafilocóci cas). As mãos também são importantíssimas na veicula ção de bactérias (ás vezes multi-resistentes aos antibió
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FOTOS: DIVULGAÇÃO
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» ticos) nas infecções hos pitalares. Entre as doenças sexualmente transmissíveis a sífilis na sua forma secun dária(cutânea) e mesmo o HPV podem, mesmo que ra ramente, ser veiculadas pe las mãos. Lavar as mãos fre quentemente com sabão comum (não existe vanta gem em que seja anti-bacte riano) e/ou usar o álcool em gel podem fazer a diferença.
QUAIS SÃO AS MAIORES INCIDÊNCIAS DE DOENÇAS CONTAGIOSAS EM MATO GROSSO? QUAL É A PORTA DE ENTRADA PARA ESSE TIPO DE CONTÁGIO?
» A tuberculose pulmonar que apresenta transmissão aérea e é bastante relacio nada a baixa condição so cioeconômica e ambientes
insalubres sejam favelas ou presídios. A vacina BCG e o descobrimento e tratamento precoce dos casos é a for ma de enfrentamento.A han seníase também é um pro blema importante em nos so estado. O contágio se dá pela convivência íntima e continua com os pacientes e o tratamento precoce é uma grande arma no combate a essa moléstia tanto indivi dualmente como para bar rar a disseminação. As viro ses Dengue, ZiKa e H1N1 tem recentemente assolado o nosso estado. Já a Leptos pirose, A Doença de Chagas e a Esquistossomose não tem entre nós a importância que tem em outras regiões do país.Continuam sendo diagnosticados novos casos de infecção pelo HIV ape
sar de a informação sobre os modos de contágios es tar em todas as mídias. En tre as viroses emergentes já foram identificados casos em Mato Grosso de Hanta viroses que são transmitidos através da urina de roedores (que vivem nas plantações muito próximas das residên cias) e que podem causar febre hemorrágica com aco metimento pulmonar e renal.
EXISTEM PROGRAMAS E/ OU POLÍTICAS PÚBLICAS DE GOVERNO QUE VISEM INIBIR EPIDEMIAS? CASO AFIRMATIVO, QUAIS SÃO?
» Temos vacinação em rede pública para hepati teB, H1N1 e gripe clássi ca. Os bancos de sangue fazem triagem dos doado res para HIV, hepatites Be
SAÚDE
O MÉDICO E ESCRITOR IVENS SCAFF (AO CENTRO) DURANTE POSSE NA AML
C, Sífílis (que vem aumen tando entre nós).Penso que temos falhado quanto a palestras nas escolas.
O SENHOR É A FAVOR OU CONTRA A LIBERAÇÃO DA FOSFOETANOLA-MINA, DESENVOLVIDA POR PESQUISADORES
médio para a cura definitiva da infecção pelo HIV. Quan to a Fosfoetanolamina os pesquisadores não cumpri ram as etapas e estudos re centes mostram que ela fa lhou mesmo na fase I.
ros da indústria farmacêuti ca. Por outro a ingenuidade e desejo de acreditar em so luções mágicas frente a pro blemas de difícil solução que todos temos. Dos dois lados a ganância,a dos donos da indústria e dos espertos.
DA USP?
Uma substância passa por quatro fases antes de ser liberada como medica mento indicado para com bater uma doença. Fase I: testagem em laboratório para avaliar a ação da res posta in vitro, fase II: apli cação da substância em pequenos grupos que não possuem a enfermida de com o objetivo de ava liar efeitos adversos, fase III: aplicação da substân cia em pequenos grupos de pacientes que apresentam a doença para aferir se os resultados in vitro se repe tem in vivo, Fase III a aplica ção da substância em gru pos maiores de pessoas em vários países. Só após estes estudos mulicentri cos a substância é liberada para uso. Mesmo assim a Talidomida foi liberada e em seguida proibida após se constatar que ela causava má formação nos fetos. Por outro lado o ácido Valpróico que tem o nome comercial de Depakeneseria capaz de eliminar o vírus HIV in vitro (fase I), já é usado em mi lhares de pacientes com disritmia cerebral sem gran des efeitos adversos (fase II), aguarda-se a fase III e a IV para ser usado como re
»
O SENHOR ACREDITA QUE A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA FORMOU, AO LONGO DO SÉCULO PASSADO UM CARTEL DE LOBISTAS QUE SE INFILTROU EM TODOS OS SETORES DE NOSSA SOCIEDADE E CONTRUIU UM LABIRINTO DE MANIPULAÇÃO, ENGANO E CONTROLE , VISANDO TÃO SOMENTE GANHAR DINHEIRO COM AS DOENÇAS EM CURSO?
» Penso que uma descober ta de importância envolveria tantos pesquisadores que este segredo logo seria re velado, seria comprado por empresas concorrentes.
QUAL É A OPINIÃO DO SENHOR SOBRE O FATO DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA, QUE FAZ MAIS DE UM TRILHÃO DE DÓLARES POR ANO COM A VENDA DE DROGAS PARA AS DOENÇAS ATUAIS, EM OBSTRUIR, SUPRIMIR E DESACREDITAR INFORMAÇÕES SOBRE A ERRADICAÇÃO DE DOENÇAS POR MEIOS NATURAIS? A CURA OU ERRADICAÇÃO DE UMA DOENÇA PODERIA LEVAR AO COLAPSO O MERCADO DESSA INDÚSTRIA?
» Por um lado temos os imensos interesses financei
O SENHOR É UM ESCRITOR CONSAGRADO EM MATO GROSSO E NO BRASIL, ACREDITA QUE A LITERATURA PODE CONTRIBUIR PARA MELHORAR A VIDA E A SAÚDE DAS PESSOAS? PORQUE?
» As doenças muitas ve zes foram temas da litera tura. A peste que acome teu o exército grego como castigo de Apolo na Ilía da de Homero. A hidra de sete cabeças dos pântanos de Lerna como alegoria da malária. A relação de cuida dor e doente no A morte de Ivan Ilich. O sanatório de tu berculosos da A montanha Mágica de Tomas Mann. De novo a tuberculose em A dama das caméliase Flo radas na Serra.A meticulo sa descrição de uma enxa queca em Médico de Ho mens e de Almas, biografia de Lucas, médico e evan gelista.A fantástica descri ção de um ataque de sezão em Sarapalha de Guima rães Rosa,Os estudos de Susan Sontag e Elizabeth Kobler-Ross.Mas acho que o principal papel da literatu ra, além do prazer de se es crever e ler, é possibilitar o desenvolvimento do pensa mento crítico... e criativo.
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PARA QUANDO VOCE FOR
CECÍLIA KAWALL
Mora em Chapada dos Guimarães, é guia de ecoturismo e de aventura, empresária, fotógrafa e escreve para Lume MT.
Caverna Aroe Jari
TEXTO E FOTOS CECÍLIA KAWALL
“B
ora” dar uma volta por aqui novamente? Eu sei que muita gente tem aflição de fazer o passeio da Caverna Aroe Jari porque não gosta de fi car no escuro... mas posso garantir que desta vez você pode ir tranquilo, esta é a maior caverna de arenito do Brasil. Ela tem 1.500 metros de extensão e os salões tem muitos metros de altura e largura. Em nenhum momento do passeio você tem que se abaixar ou espremer dentro dela!
E se quiser ficar só nas partes de fora as trilhas te oferecem tantas opções de cores e formações rochosas que é possí vel se deliciar no entorno mesmo. Tem cerrado, matas e ve redas incríveis com todo seu esplendor e riqueza. Uma ou tra coisa muito legal é que não é só uma caverna não, hoje tem quatro cavernas abertas para visitação: Aroe Jari que é a maior e principal, a gruta da Lagoa Azul, a caverna Kio go Brado e a Pobe Jari. Todas elas são na mesma área ,mas cada uma delas tem características muito diferentes entre si. Reserve um dia inteiro, vá sem pressa, aproveite todo per curso fazendo uma caminhada sem dificuldades ou opte pelo trator que passa por um mirante lindo de onde avista mos toda planície pantaneira, a cidade de Cuiabá ao longe e até o Ninho da Águia. De toda forma não deixe de visitar!
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SOCIEDADE
A Prostituição Feminina e o Capitalismo
Durante toda a his tória da humani dade, as civiliza ções partilharam de uma determinada cul tura. Tal cultura se mani festou na arte e até mesmo nas relações sociais entre
POR YAN CARLOS NOGUEIRA*
os povos. É nesse contexto que afirmamos que a pros tituição esteve presente em muitas dessas tradições. Na Roma e na Grécia ela era fortemente ligada à mitologia, fazendo parte da vida cotidiana em so
ciedade. Bom, trataremos o assunto de forma mais genérica, discorrendo so bre a prostituição feminina, uma vez que ela é a mais comum e a mais difundida nas sociedades desde os tempos antigos.
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Você deve se questionar: a partir de que momento a prostituição toma as formas que ela tem atualmente, se há tantos anos ela era parte de uma determinada tradi ção, cultura e mitologia? É no seio do processo de for mação do Estado burguês da sociedade capitalista que encontramos nossa resposta. Com o advento das revoluções burguesas ocorridas no século XVIII, as desigualdades se agra varam. Era, desde o surgi mento do patriarcado, res ponsabilidade da mulher cuidar dos filhos e do lar doméstico. Entretanto, o
capitalismo do século XIX encontrou no patriarcado as bases materiais para a opressão da mulher na sociedade de classes. O surgimento da Questão So cial na Europa Ocidental se tornou um importante fator para entender os vínculos gerados entre os homens e as mulheres.
A consequência desas trosa da exploração do ca pital sobre a mulher resultou na maçante discrepância de salário e oportunidades em relação ao homem operá rio. O abandono de diversas mulheres na sociedade de classes ocasionou na situa
ção de miséria levando-as a prostituição dentro das ci dades europeias. Fica claro, para nós, que este problema não é algo natural em que a mulher escolhe por simples e espontânea vontade, mas é um caminho que se pensa quando a renda e a oportu nidade não se fazem mais presentes em suas vidas, ou, quando influenciadas por algum objetivo material imposto pela sociedade de classes, isto é, um benefício. É, de acordo com o que foi posto, que entende mos o malefício do caráter opressor do capitalismo. Com este fato, é certo di zer que a prostituição não é aceitável para uma nova or dem de um novo projeto de sociedade que penso, em meu particular, ser o comu nismo. Para elucidar nossa compreensão recorremos a mulher membro do parti do bolchevique e militante durante a Revolução Russa de 1917: Alexandra Kol lontai. Segundo a teórica marxista: “A moral hipócrita da sociedade burguesa en coraja a prostituição pela estrutura de sua economia exploradora, enquanto ao mesmo tempo cobre im piedosamente de desprezo qualquer menina ou mulher que é forçada a tomar este caminho” (discurso para a terceira conferência de toda Rússia de líderes dos Departamentos Regionais das Mulheres, 1921).
Neste sentido, dialogan do sobre a prostituição femi nina, que devemos nos per
SOCIEDADE
ALEXANDRA KOLLONTAI
guntar: É a prostituição um trabalho?O que é a prostitui ção? E mais, é possível elimi nar este mal dentro do status quo vigente de economia?
Para nós, comunistas revolucionários, a prosti tuição não pode ser vista como profissão. A ativida de funciona pelas regras máximas do neoliberalismo econômico, onde o merca do se regulamenta através da oferta, da demanda e da procura, neste caso, o mer cado da venda de corpos.
Além disso, há ainda um importante fator para com batermos a atividade. Se gundo Kollontai, o homem que busca os serviços se xuais da mulher, que se en contra nesta condição, não a vê como um ser humano que tem direitos e necessi dades, mas coloca-a como depende de seu dinheiro e de sua situação privilegiada economicamente. Esta rela ção mercantilizada fortalece a desigualdade entre ho mem e mulher, colocando
esta última em situação de violência física e psicoló gica, bem como certifica a ideia do corpo da mulher como propriedade privada.
A base para o comunis mo, além da abolição da propriedade privada dos meios de produção, é a união entre os trabalhado res. O sentimento de cole tividade deve imperar entre nós. A prostituta é alguém que se afasta do trabalho coletivo por ser excluída do processo de trabalho nos modos de produção capitalista. Esse processo, no capitalismo, não visa a igualdade de salários e de condições entre os gêne ros, ele exclui a participa ção política da mulher e dificulta seu acesso.
A emancipação total da mulher não virá via um siste ma que jamais vai visar sua necessidade de trabalhar como os homens. O capi talismo pode até provocar melhorias, mas jamais a libertação total da mulher.
Isso porque o sistema eco nômico em que vivemos foi planejado desde o princí pio para que a mulher seja submissa, nas esferas do mésticas ou do mercado de trabalho. Devemos lutar por uma sociedade igualitária, justa, onde todos estejam envolvidos para a coletivida de das riquezas produzidas.
Para nós, a moral bur guesa, a família tradicional conservadora, a desigual dade entre os gêneros e a prostituição devem ser su mariamente eliminadas! Só assim caminharemos para a solidariedade, a justiça e a equidade social entre os trabalhadores.
(*) Estudante do curso de Serviço Social da UFMT, comunista convicto, lei tor impulsivo, militante do movimento LGBT. Divide seus estudos entre eco nomia política do trabalho e as relações de gênero e sexualidade nas socieda des de classes.
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Santos Recebe
“Carga” de Noivas Japonesas em 1959
POR SERGIO WILLIANS DOS REIS (*)
Porto de Santos, quinta-feira, 23 de abril de 1959. O dia mal tinha ama nhecido e o cais do porto santista já estava apinha do de gente. Dezenas de famílias estavam próximas ao armazém de bagagens aguardando a atracação do “América Maru”, que vinha de uma longa viagem, de 53 dias, desde Yokohama, na Terra do Sol Nascente. À bordo do navio nipônico vinha uma “carga” espe cial, que chamou a atenção do inspetor da Alfândega quando este, ainda no lar go da barra, questionou o comandante a respeito do que estava sendo trazido ao Brasil. “Hanayome”, dissera o comandante exibindo um sorriso malicioso. O brasilei ro conhecia o equivalente ja ponês para vários nomes de cargas, mas aquele lhe era novidade. É que “hanayo me” significa “noivas”, e en tre os trezentos e cinquenta passageiros da embarca ção, vieram doze jovens “ca sadas por procuração” em sua terra natal justamente com jovens japoneses que aqui haviam desembarcado
três anos para conhecer de perto as possibilidades de trabalho na agricultura ou em diferentes ocupações no comércio ou na indústria. Chegados como imigran tes, os moços haviam sido incorporados à Cooperati va Agrícola de Cotia e nela encontraram condições de trabalho e ganho que os au torizavam assumir, entre ou tras coisas, o compromisso sério do casamento. Desta forma, logo que o “América Maru” atracou e amarrou-se ao cais, lá grimas escorriam dos dois lados, dos olhos dos que estavam em terra e dos que vinham a bordo do navio. A notícia do desembarque inusitado logo percorreu o cais e despertou a curiosi dade dos brasileiros. Muitos aventaram e até apostaram que testemunhariam a de cepção dos homens nipôni cos em terra, ao verem suas esposas, acreditando que o casamento fora às cegas. Ledo engano. Os rapazes, que estavam muito bem vestidos, sapatos lustrosos e cabelos alinhados, já co nheciam suas mulheres e elas também os conheciam.
Assim, após o cumpri mento de todo o protocolo de desembarque, às 11 horas, deu-se finalmente o encontro dos namorados. Mas quem imagina que eles correram um na direção do outro e ficaram rodopiando de maneira efusiva, imagi nou errado. Não houve bei jos, nem “chuva de arroz”, nem alianças, nem ao me nos apertos de mão. O que houve foi apenas um cum primento respeitoso de um aceno de mão e reverência.
Porém, eles estavam no Brasil, onde algumas novas regrinhas poderiam ser in corporadas. Assim, à moda ocidental, as recém-casa das brindaram com taças de champanhe o encontro com os maridos e algumas autoridades que foram até Santos recebê-las, como o cônsul-geral do Japão, sr. Uyeno, o sr. Kiyomi Ohira, di retor-gerente da Cooperativa Agrícola de Cotia, o sr. Otávio Teixeira Mendes Sobrinho, diretor do Departamento de Imigração e Colonização no Estado de São Paulo, e o sr. Gilberto de Carvalho Pimen tel, chefe da Inspetoria de Imigração em Santos.
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MEMÓRIA
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ESTUDANTE DO CIENTÍFICO
» Entre os jovens que aguardavam ansiosamente na beira do Cais de Santos estava o lavrador Sadatsu gu Tamura, de 27 anos. Ele aguardava com expecta tiva a chegada de sua es posa Mitsuko Tamura, de 25 anos. Ambos haviam sido colegas de estudos em Saitama-ken. Concluí do o curso equivalente ao científico no Brasil, Tamura partiu para estudar mecâni ca. Mas, não tendo melho res oportunidades no Ja pão, resolveu ir para Brasil, na qualidade de imigrante, para trabalhar em São José dos Campos numa fazen da da Cooperativa Agríco la de Cotia. Quando alcan çou condições de unir-se em matrimônio com sua amada, enviou procuração para o casamento para po der trazer a sua Mitsuko. Tamura já tinha preparado tudo: móveis, casa e todos os pertences. Perguntando se ia casar no religioso, de clarou: “Nós casaremos só no civil. Se o patrão quiser casaremos no religioso”.
Ao seu lado estava Hi deo Isezaki, de 24 anos, de Morro Grande, proximi dades de Cotia. Falante, desconfiado, “arrastando” o português, estava à es pera da sua esposa Shi noe, de 23 anos. Ambos nasceram em Kotchi-Ken e sempre trabalharam na la voura. Suas famílias eram conhecidas e estavam cer tas de que haveria felicida de na união dos dois.
A VEDETA DO PORTO
» Entre as doze moças, havia uma que se des tacava. Usando um cha péu elegante, ela cha mou a atenção dos repór teres que cobriam aque le fato inusitado. A moça era Yumiko Nibino. Muito sorridente, ela empunha va uma máquina fotográfi ca e parecia ser a mais fe liz de todas. Ao contrário de suas colegas, ela che gou a correr para encon trar-se com o marido, Kat suhiko Nibino, de 25 anos, lavrador do sítio Nishimo to, em São Roque. Yumiko tinha 21 anos, era filha de
lavradores e conheceu Ni bino em Kin-Ken. Por sua alegria, Yumiko foi apelida da pelos fotógrafos e cine grafistas como a vedeta do Porto de Santos. Era, sem sombra de dúvida, o par mais fotogênico do dia.
CASAIS EM FESTA
» Após deixarem a área do porto, os noivos e os con vidados foram para o Hotel Ushio, que ficava na Rua Braz Cubas, onde estava instalada a sede do Atlanta Futebol Clube. Alí, no terra ço do prédio, se reuniram os casais: Hideo e Shinoe, Katsuke e Mitiko, Shigue
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mitsu e Mitsuko, Shunzu ke e Moyo, Kazuyoshi e Et suko, Miyoko e Fugio, Eiki ti e Junko, Ktsuji e Satoyo, Itio e Mariko e Katsuniko e Yumiko. Durante o almoço oferecido pela Colônia Ja ponesa de Santos, com di reito a comidas típicas do Japão, como makizushi (folhas de algas marinhas com arroz enrolado, peixe em conserva, ovos); kom bu (algas marinhas); ca marão gigante; saladas à moda nipônica e sashimi (peixe cru em fatias), ini ciou-se uma série de dis
cursos, como os do côn sul Uyeno, do sr. Teixeira Mendes Sobrinho, do DIC e do sr. Kiyomi Ohira, dire tor-gerente da Cooperativa Agrícola de Cotia.
Depois do almoço as esposas recém-chegadas ao Brasil foram levadas a conhecer a cidade de San tos e à tardinha rumaram para São Paulo, de onde seguiram para os sítios onde seus maridos já es tavam alocados. Nove fi caram em terras paulistas, dois foram para o Paraná e um para o Rio de Janeiro.
(*) Sergio Willians dos Reis é jornalista, escritor e pesquisador, é presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santos e diretor cultural da Sociedade Humanitária dos Empregados do Comércio. Também é membro correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.
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REPORTAGEM ESPECIAL
Casa di Rose Recebe Nova Edição do Sarau Luciene Carvalho
Evento multicultural teve declamação de poesias, apresentações musicais e palco aberto FOTOS KAREN MALAGOLI
Após o sucesso da primeira edição, nes te mês de novembro, Chapada dos Guimarães recebeu o 2º Sarau Luciene Carvalho, em evento que reuniu poesia, música e performance, homenageando a primeira mulher preta e periférica a entrar na Academia Ma to-grossense de Letras. A programação aconteceu no Centro Cultural Casa di Rose.
O Sarau Luciene Carvalho tem uma apresen tação principal que mescla as poesias da artista homenageada com músicas interpretadas por Rita Cássia e Matheus Farias. Nesta edição, hou ve também participação especial do grupo Sor risos, Alegrias e Quintais, composto por Juliane Grisólia, Augusto Krebs e Thiago Costa. após. Na sequência das apresentações o microfone ficou aberto para quem quisesse apresentar sua arte.
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RITA CÁSSIA E MATHEUS FARIAS
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GRUPO SORRISOS, ALEGRIAS E QUINTAIS
A gastronomia contou com produtores locais, como os caldinhos da Dona Dirce, as massas artesanais da Casarin Massas de Casa, os pães integrais e de mel da Dwari e os antepastastos do Chef espa nhol Salomom Morales.
O evento foi organizado pela Assem bleia Social (Coordenadoria de Integra ção, Cidadania e Cultura da Assembleia Legislativa de Mato Grosso) e visa ampliar o acesso da plateia às expressões artís ticas do Estado, bem como incentivar a produção cultural mato-grossense. Propor um sarau que carrega o nome de Luciene Carvalho é valorizar uma artista regional com intensa produção na Literatura, Dra maturgia, entre outras expressões.
“A primeira edição foi um sucesso, de liciosa, no quintal da própria Luciene, to dos nós nos sentimos abraçados. E todo
o evento foi pura poesia, pelas declama ções, pelo repertório musical, pelas inter venções e por nosso público atento. Foi de arrepiar. A nova edição recebeu toda a energia da Chapada dos Guimarães”, convida a coordenadora da Assembleia Social, Daniella Paula Oliveira.
Luciene Carvalho estava ansiosa para a chegada da segunda edição. “A gente viveu tempos assombrosos, a gente atra vessou pandemia, então, as celebrações do que seja respiro, do que seja beleza, do que seja arte importam muito para mim”, comenta a poeta.
Sarau é atividade milenar que agrega reunião, troca de experiências e muita arte. Alguns estudiosos apontam que a origem da palavra venha do francês soirée (reunião noturna), do latim serotinus (pela tarde) ou do galego serao (anoitecer).
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CHEF SALOMON MORALES
FERNANDO E NATÁLIA CASARIN
REPORTAGEM ESPECIAL
A HOMENAGEADA
Luciene Carvalho é poeta nascida em Corumbá (MS), mas veio para Cuiabá em 1974. A escritora tem 14 livros publica dos, a maioria de poesias. Foi eleita e empossada na Academia Mato-grossen se de Letras em 2015, cerimônia com grande participação de jovens negros das artes de rua.
A multiartista é também diretora de Tea tro, formada pela MT Escola de Teatro (Une mat, campus Cuiabá), é personagem de uma cinebiografia da cineasta Juliana Cur vo (Luciene, MT, 2020, 73 minutos), gravou um CD de poesia declamada dialogando com o rap, tem algumas publicações, expe rimentou parcerias de artes visuais, inspirou espetáculos de dança e de teatro, é tema de pesquisas acadêmicas, entre outros re gistros artísticos ou acadêmicos.
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A IDEALIZADORA DO SARAU LUCIENE CARVALHO, DANIELLA PAULA DE OLIVEIRA.
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REPORTAGEM ESPECIAL
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SOBRE A CASA DI ROSE
A Casa di Rose iniciou suas atividades em 2015 hospedan do turistas do mundo inteiro e ao mesmo tempo, com a parceria de artistas regionais, foram realizadas apresentações de música, cinema, teatro, poesia e dança, além de workshop de fotografia e estêncil.
Na inauguração do espaço es tiveram presentes os artistas: Dani Tamara (artes plásticas), Ander son Moura (escultura), Henrique Santian (fotografia), Aruã Callil (fotografia), Cris Chaves e Marina (música), Cecília Kawall (dança), Nina Casarin (poesia), Micheli Sierra e Lótus Reuben (teatro).
Em 2016, a fotógrafa de Flo rianópolis, Lilian Barbon, mi nistrou workshop de light pain ting. Também foi comemorado o primeiro aniversário da Casa di Rose com apresentações de teatro com Micheli Sierra, cinema com João Manteufel e exposição de artes visuais com Henrique Santian (Fotografia), Anderson Moura (escultura), Lilian Barbon (Fotografia), Aruã Callil (fotogra fia), e Dani Tamara (artes plás ticas), além de shows musicais com Karola Nunes e a banda do Rafael Souza e Henrique Romio.
Em 2017, Babu78 realizou ofi cina de estêncil com jovens da cidade.
Em 2018 foi realizado o Con curso Literário “Linhas do Ama nhã” para os alunos da rede pú blica de ensino de Chapada dos Guimarães.
Em 2021, graças a Lei Aldir Blanc realizou a exposição de ar tes visuais “Artistas do Cerrado”, com obras dos artistas: Alena Maggi, Anderson Moura, Ange la Godinho, Dani Tamara, Fabrí
cia Campello, Henrique Santian, Keila Silveira, Lucileicka David, Mário Friedlander, Micheli Sierra, Rai Reis, Renato Campello, Ruth Albernaz e Sandra Vissoto. No mesmo ano recebeu as expo sições “Eu Frida, Todas Frida” com Meg Marinho; “Gratidão” com Renato Campello; “Entre laços” com Angela Godinho e Fabrícia Campello; “Despertar” com Patricia Violin; “Deusas do Cerrado” com Anna Lua e Julia na Queiroz. No mesmo ano rea lizou o “Festival Primavera Cultu ral” com apresentação circence da Malacriada de Artes e show musical com Paulo Monarco. Na ocasião, a chef de cozinha Luciana Leite criou e executou um prato criado especialmente para o evento. Ainda em 2021, em parceria com a Malacriada de artes promoveu o “Quintal de Férias”, uma colônia de férias com atividades arte-educativas.
Em 2022, com o apoio da Prefeitura Municipal de Chapada dos Guimarães, participa do 35o Festival de Inverno com as mos tras “Cores do Cerrado” e “Tons Diversos”. A primeira com obras dos artistas Rai Reis, Alena Mag gi, Anderson Moura, Dani Tama ra, Clovis Irigaray, Luis Segadas e Renato Campello. “Tons Diver sos” teve curadoria de Carolina Marcório com obras dos artistas: Sol Ferreira, Tamii, Fred Gusta vos, Viviane Vilela, Nhantumbo Space e Paty Wolff.
Além da galeria de artes vi suais, o centro cultural também possui atividades semanais de Yôga, kunk fu, tai chi chuan, dança e capoeira.
Mais informações acesse: www.casadirose.com.br
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Peabirú
Caminho inca perdido no tempo
DA REDAÇÃO
Milenar, o “Cami nho do Peabiru”, foi uma estrada Inca que tinha inicio nos Andes peruanos e se estendia ate o Oceano
Atlântico, mais precisamente ligando as cidades de Cus co no Peru ao litoral do esta do de São Paulo. Com cer ca de três mil quilômetros, esse caminho percorria os
territórios de Bolívia e Para guai, além do Brasil e Peru. Outras ramificações do ca minho levavam até aos esta dos do sul do país chegan do ao Rio Grande do Sul.
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HISTÓRIA
O termo “Peabiru” vem do tupi, através da junção dos termos “pe” (caminho) e “abiru” (gramado amas sado). No entanto, distintas definições nos são apresen tadas: “Caminho forrado”; “Caminho antigo de ida e volta”; “Caminho pisado”; “Caminho sem ervas”; “Ca minho que leva ao céu”, en tre outras. Este caminho é citado pela primeira vez no livro “História da Conquista do Paraguai, rio Prata e Tu cu-mã”, escrito por Pedro Lozano, padre jesuíta nasci do em 1697. Outras referên cias importantes estrutura das em outras obras, são a “Revista Comentário” nº 49 (1971), do historiador Her nani Donato e o livro “Peabi ru – Os Incas no Brasil”, de Luiz Galdino (1999). Segundo referências, o caminho possuía oito pal mos de largura ou cerca de 1,3 metros, sendo o ponto de partida a região de São Vicente (SP). Provavelmente seguia-se ao longo do vale do rio Tietê até a região de
Itu e Sorocaba. Depois se guia em direção sul do es tado, dividindo-se em duas ramificações: uma à es querda e outra à direita.
ROTAS ALTERNATIVAS
Infelizmente, a intensa ocupação humana destruiu o “Peabiru”, hoje restam pouquíssimos vestígios. Os mais importantes deles, até o momento, localizam-se no município paranaense de Pi tanga. Ainda não é possível saber a rota exata do Cami nho, mas, é possível traçar um roteiro aproximado.
O tronco paulista, que co meçava em São Vicente e Cananéia, seguia a direção do rio Tietê – município de Itu – rio Paranapanema – rio Ita raré – nascente do rio Ribei ra do Iguape. Entrando no estado do Paraná, percorria os atuais municípios de Dou tor Ulisses, Cerro Azul, Cas tro, Tibagi, Reserva, Cândido de Abreu, Pitanga, Palmital, Guaraniaçu, Corbélia, Nova Aurora, Tupãssi, Assis Cha teubriand, Palotina e Guaíra.
O tronco principal ca tarinense, iniciava-se, pro vavelmente, no Massiam bu (Palhoça), seguindo por Florianópolis, litoral norte – rio Itapocu, depois pas sava pelos municípios de Guaramirim, São Bento e Mafra. Entrava no Paraná e passava pelos atuais muni cípios de Rio Negro, Cam po do Tenente, Lapa, Porto Amazonas, Palmeira e Cas tro, trecho usado depois pe los tropeiros que povoaram todo o sul brasileiro.
O “Peabiru” deixava o es tado do Paraná por Guaíra. Havia outra passagem por Foz do Iguaçu, que foi usada por Alvarez Nunes Cabeza de Vaca em 1542. Depois o caminho era rumo ao norte, até a serra de Santa Luzia, perto de Corumbá/MS. Em Puerto Suarez penetrava na Bolívia. Passava por Cocha bamba, Sucre e Potosí. Nes ses locais existiam caminhos incas com várias opções para alcançar o Pacífico, as mais próximas eram Tacna, Montegua e Arequipa.
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A CONSTRUÇÃO DO PEABIRU
Os estudiosos ainda não sabem quem abriu o “Cami nho do Peabiru”. Há três hi póteses principais:
» 1) “Caminho da Terra Sem Mal” – A primeira hipótese supõe que o “Peabiru” tenha sido aberto pelos guarani ou por povos anteriores – talvez os itararé. Originária do Pa raguai, a tribo teria se des locado para o litoral sul do Brasil entre os anos 1000 e 1300. O “Peabiru” teria sido aberto nessa migração, cujo objetivo era a procura de um paraíso, a Terra Sem Mal.
mamento’ (semelhança da macaná, borduna guarani com a maqana incaica), de nominação de fauna e flora: ‘sara’ (espiga, em guara ni; milho em quêchua), ‘cui’ (animal roedor, nos dois idiomas), ‘jaguar’ (felino, nos dois idiomas), ‘mandio ca’ e ‘ioca’ / iuca, suri (ema, nos dois idiomas).
» 3) “Caminho de São Tomé” – Segundo essa ver são, o “Peabiru” teria sido aberto por São Tomé, após tolo de Cristo. Segundo Sérgio Buarque de Holan
da, a devoção suscitada pela descoberta deste Ca minho de Tomé na Améri ca no século 16 foi tal, que quase desbancou o de San tiago de Compostela: “Pou co faltaria em verdade que não apenas na Índia, mas em todo o mundo colonial português, essa devoção tomasse um pouco o lugar que na metrópole e na Es panha em geral… “tivera o culto bélico de outro com panheiro e discípulo de Je sus, cujo corpo se julgava sepultado em Composte
»
2) “Caminho dos Incas” –Supõe a construção da tri lha como uma iniciativa inca ou pré inca. Neste caso, o Peabiru seria uma via aber ta para a prospecção de ter ritórios do Atlântico, visando o comércio com povos indí genas pré-colombianos do Paraguai, MS, PR, SP e SC. Primeiro uma estrada de co mércio. Depois quem sabe, uma estrada de penetra ção definitiva das podero sas civilizações andinas no Atlântico sul. Como via de mão dupla, o “Peabiru” per mitiu a chegada dos gua ranis aos Andes. Mesmo sem relações duradouras, as idas e vindas de guara ni e inca pelo Caminho dei xaram vestígios de uma cer ta influência cultural na ‘as tronomia’ (leitura e uso de manchas da Via Láctea), ‘estatística’ (semelhança do ainhé, cordão de cipó gua rani com o quipu dos incas), ‘música’ (flauta de pã), ‘ar
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HISTÓRIA
PAY SUMÉ
VESTÍGIO DE CIVILIZAÇÕES ANTIGAS, ENCONTRADO NA TRILHA
la”. A passagem de Tomé pelo Novo Mundo foi men cionada por índios, padres, autoridades e colonos eu ropeus no século 16. A ver são corrente é que um ho mem branco, barbudo, teria chegado ao litoral brasileiro “andando sobre as águas”. Foi chamado de Sumé. Em sua peregrinação, teria ido ao Paraguai, abrindo o Ca minho. Ali foi visto e chama do de Pay Sumé. Saindo do Paraguai, a misteriosa figu ra teria continuado até os Andes. Os pré incas o cha maram de Kuniraya. Mais tarde, recebeu dos incas o nome de Viracocha. Após um período no Peru, ele te ria ido embora, também “andando sobre as águas”.
INTERLIGANDO POVOS E CULTURAS
O Caminho do Peabiru tem toda uma parte ligada à cultura indígena. Um as pecto interessante é que ele também pode ser relaciona do com a astronomia indí gena. Observando o mapa do “Peabiru” percebemos que ele inclui, na verda de, diversos caminhos. Va mos nos ater a um só, que foi percorrido pelo pioneiro Aleixo Garcia. Este se inicia em Florianópolis, no ocea no Atlântico e vai até Poto si na Bolívia, pegando de pois as estradas dos Incas e indo terminar no oceano Pacífico. Ou seja, é um ca minho transcontinental pré -colombiano. O Caminho
do Aleixo – talvez o mais im portante de todos – não é na direção norte-sul e nem leste-oeste, mas sim “incli nado”. Ele vai aproximada mente de sudeste para no roeste. Ao notar essa incli nação a primeira pergunta que se coloca é a seguinte: por que os primeiros índios escolheram essa direção ao abrir a trilha? E como eles se orientaram para percor rer esse caminho? É espan toso constatar que os gua rani de Florianópolis fala ram para o navegador Alei xo Garcia que conheciam Potosí nos Andes. Que sa biam com o ir e como vol tar. Isso tudo a pé, em 1524, mais de 2000 quilômetros em linha reta – naturalmen
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DO PEABIRU
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HISTÓRIA
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LÁCTEA
TRILHA PEABIRÚ
te seguiam os acidentes na turais, rios e tudo o mais –mas a direção inicial-final era sudeste-noroeste.
Ao olhar para o céu, em condições propícias, vemos a Via Láctea, que é chama da pelos guarani de Cami nho da Anta (Tapirapé), ou Morada dos Deuses.
È natural supor que o ca minho da Terra Sem Mal, para eles era aquele cami nho que estava lá em cima, no céu. Que é o Caminho dos Deuses, dos espíritos, é a própria Via Láctea.
Não são só os nossos índios ancestrais que viam assim. Pesquisando na História notamos que egíp cios, os gregos, os india nos, todos viam a Via Lác tea como um caminho. Os
antigos nos falavam que havia um tesouro no fim e outro no começo do arco-í ris. E a gente vivia sonhan do em encontrar o come ço e o fim dele. Fazendo uma comparação, os ín dios brasileiros e também os peruanos, queriam sa ber onde começava ou ter minava o arco-íris celeste, ou seja, a Via Láctea. Seguindo a Via Lác tea, por terra, viam que o fim do Caminho ia dar no mar, no oceano Atlânti co. E a Terra Sem Mal fica va ali, ou lá, em algum lu gar. Por isso é que os nos sos povos ancestrais fo ram à direção do mar. Por isso é que na maioria dos mitos indígenas, o profeta, o Sumé, vem do mar. Por
que ele vem daquela ponta da Via Láctea à qual o índio não tem acesso.
Muito bem, pensa o ín dio, mas e do lado contrário do Caminho da Anta, o que existe? O índio não sabe. Então ele vai procurando na terra, seguindo a Via Lác tea. E acaba chegando no outro lado, que também não tem fim, chega num ou tro mar, o oceano Pacífico.
Então a idéia básica é essa. O Caminho que nos sos povos ancestrais percor reram é aquele da Via Lác tea, quando está mais alta no céu. E que é também, aproximadamente o cami nho que liga as posições do nascer-do-sol no verão com o pôr-do-sol no inverno. Ou, sudeste - noroeste
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MEMÓRIA
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UBIRATÃ NASCENTES ALVES é membro da AML - cadeira nº 1. ubirata100@gmail.com
Cel. Iporan
O herói esquecido
POR UBIRATAN NASCENTES ALVES
Era homem de ex traordinária bravu ra, perspicácia e natural inteligên cia que o levou a superar armadilhas da traiçoeira guerra e os poderosos ini
migos alemães em diver sas de suas ações, salvan do a vida de seus irmãos de farda, gente humilde dos trópicos sulistas em uma frígida Europa. Não permitiu Deus que morres
se antes de voltar ao seu Torrão e apesar de esque cido por muitos, obteve re conhecimento através me dalhas do Exército Ameri cano do Norte, bem como da Inglaterra.
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MEMÓRIA
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O menino Iporan Nu nes de Oliveira veio a este mundo em 20 de dezem bro 1917, em Cuiabá, foi o terceiro filho do casal Joa quim Pinto de Oliveira e Theonila Nunes de Oliveira, residiam em frente a Paró quia São Gonçalo no Porto, ao lado do 1º Batalhão PM Daniel de Queiroz. Pos suía uma ancestralidade di ferenciada remontando ao Brigadeiro do Exército Por tuguês, Jerônimo Joaquim Nunes, o qual chegou a es tas terras no ano de 1805, e mais tarde em 1828 as sumiu pelo partido Fede ralista no Império, o cargo de Governador da Provín cia de Mato Grosso.
A vida estudantil teve iní cio na Escola Pública “Se nador Azeredo”, que fun cionava no prédio onde foi até pouco a Casa do Arte são, o ginásio e secundá rio cursou no Liceu Cuiaba no. Apesar de obter suces so em concurso para agen te na Delegacia Fiscal, pre fere se transferir para a Ca pital Federal, o Rio de Ja neiro, objetivando preparo aos exames da Escola Mi litar de Realengo.
Estando capacitado, lo gra ingressar na almejada Academia do Exército Bra sileiro em abril de 1940, declarado Aspirante a Ofi cial em 8 de janeiro 1944, em plena 2ª Guerra Mun dial. Consciente da estru tura organizacional da fu tura Divisão de Infantaria Expedicionária na guerra, foi voluntário para servir no
11º Regimento de Infanta ria, em São João Del Rei/ MG, direcionando-se a um dos segmentos que certa mente integraria a Divisão que ia partir aos combates na Europa. Iporan retorna à Vila Militar, no Rio de Ja neiro, em março de 1944, para iniciar uma cansati va e longa rotina de prepa ro físico da tropa que an tecedeu ao embarque, fi nalmente o 11º Regimento embarca para a Itália em 22 de setembro, parte do 2º Escalão da Força Expe dicionária Brasileira. Re cordando, comandava a FEB o Ministro da Guerra de Getúlio Vargas, Gal. Eu rico Gaspar Dutra. Desembarcam na Itá lia em 11 de outubro 1944, sendo submetidos ao pe ríodo de adaptação e ao novo armamento, antes de irem para o front em novem bro, iniciava o inverno. Apa recem os entraves iniciais, a comunicação de tropas falando idiomas díspares, costumes, material bélico diferenciado utilizando tec nologias desconhecidas, não bastassem esses fato res, havia o relevo e o clima rigoroso, que não foram su ficientes para conter o ím peto de nossa tropa.
Iporan, agora 2º Tenen te, exercendo o comando de um pelotão da 2ª Com panhia, obtém o primeiro arrojado resultado, mos trando destemor em 12 de dezembro, durante o ata que a Monte Castelo, for temente guarnecido pelo
inimigo, seu pelotão con quistou o vilarejo de Fal fare. O monte com altura de 977 m, era coberto de neve escorregadia, atingiu nesse inverno – 20º C, fi cando a 60 Km de Bolo nha, necessário ser toma do para permitir o avanço dos Aliados ao norte, as bem armadas tropas ale mães, usavam a metra lhadora MG42 que dispa rava 1200 tiros/minuto. As investidas foram ardua mente rechaçadas, a pri meira sofrida pelo exército americano que repassou a missão às tropas brasilei ras, no total quatro tentati vas entre 24 de novembro de 1944 até 21 de feverei ro de 1945, quando foram vencidas as tropas inimi gas por nossos heróis pra cinhas. Sofremos também perdas, como no povoa do de Abetaia, os alemães deixaram nossos soldados se achegarem e os metra lharam, dos corpos petrifi cados no gelo, anéis e re lógios foram subtraídos. Superado os aguerri dos combates de La Ser ra nos dias 23 e 24 de fe vereiro 1945, onde os pra cinhas sobrepujaram o for te inimigo, Ten. Iporan se gue a outro desafio Cas telnuovo. Provavelmente a vitória mais rápida des sa guerra, nossas tropas iniciam o cerco da cidade bem cedo no dia 5 de mar ço 1945, esperavam as tro pas americanas darem or dem e desfechar o ataque. O 1º Batalhão do 11º Re
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gimento de Infantaria, logo dominou Precaria, enquan to o 2º Batalhão desse RI, apesar dos fogos, em mo vimento que lhe custou 22 baixas, alcançou o terreno a Sudeste. O Comandan te Aliado, General Willis D. Crittenberger, exortando ao ataque o Batalhão do Major Gross, às 6 da tarde, com ajuda considerável da arti lharia, estava em poder da FEB Castelnuovo !
A tomada de Monte se, em 14 de abril, impoz o lema da FEB, “A Cobra Fu mou”… Haviamos recebi do o encargo de conquis tar esta urbe, era o último baluarte alemão nos Apeni nos, assim ficariam abertas as portas do Vale do Pó na
quele setor. A investida ini ciou às 9h do dia 14, com dois pelotões da 2ª Com panhia no ataque, um de les era exatamente o do bravo Ten. Iporan. A pa trulha, fortemente arma da, com 21 homens, sen do três especialistas em minas, partiu de seu pos to de combate em Bicco chi, de início alcançou logo Montaurigula sem encon trar resistência. Domina ram essa estratégica ele vação e prosseguiu através da encosta sul, rumo ge ral leste-oeste. Após atingir a metade da elevação, em forma de uma colina alon gada, encontrou um cam po de traiçoeiras minas an tipessoal, o próprio escla
recedor da patrulha havia entrado alguns passos no campo, quando felizmente puderam notá-las, algumas estavam expostas. Entrou em ação a equipe caça-mi nas, retirando ao fim o total de 82, salvando assim mui tas vidas e talvez a própria missão. Ao chegar perto ao topo das elevações de Montese, o pelotão perde ra ligação com o regimen to, rádio não funcionava, os cabos foram rompidos com os tiros da artilharia, segui ram isolados.
O Ten. Iporan adentran do com seu pelotão em Montese, toma de início a torre local, onde fez vá rios prisioneiros, e mante ve posição de resistência
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FAMÍLIA DE IPORAN, JÁ CASADO COM ALTAYR DE LIMA BASTOS DE OLIVEIRA
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contra os alemães, con tribuindo em larga escala para a vitória da FEB nesta batalha. Esta foi a primei ra tropa brasileira a rom per o dispositivo defensi vo e adentrar na fortifica da defesa dos alemães, momento em que as de mais unidades engajadas na batalha sofriam perdas consideráveis em razão da obstinada resistência. De monstrou nosso herói, co ragem, decisão, vontade, senso de cumprimento do dever e iniciativa.
Após o longo comba te, onde se conquistou o chão palmo a palmo, foi conseguido, no final do dia, dominar as resistên cias inimigas, fazendo-as retrair após sofrerem mais baixas. Caindo a noite de
abril 14, dominadas as en costas sudoeste da cida de e quebrada a capaci dade defensiva da infanta ria alemã, que, desnortea da, abandonou suas po sições, deixando no cam po de luta alguns mortos e oito prisioneiros. Enquan to em nosso lado, houve só um morto e três feridos. Os irresignados germanos na noite de 14 para 15 de abril, não obstante Monte se encontrar-se sob domí nio das tropas brasileiras, abrigava ainda um eleva do número de soldados inimigos, fato que não im pediu a artilharia germana de efetuar sobre essas ter ras, naquela noite, cerca de 2.800 tiros. Na manhã do dia 15, ainda embaixo de maciço fogo da artilha
ria alemã, a tropa brasileira ultimou a limpeza da urbe. Essa batalha ficará mar cada para sempre na me mória dos nossos solda dos, pelas lições de bra vura e competência ope racional dos “pracinhas”. A bela conquista repercu tiu favoravelmente nos al tos escalões e mereceu dos generais americanos os mais efusivos elogios. “Na jornada de ontem, só os brasileiros mereceram as minhas irrestritas con gratulações; com o brilho de seu feito e seu espíri to ofensivo, a Divisão Bra sileira está em condições de ensinar às outras como se conquista uma cidade”. Gen Crittenberger - Cmt IV Corpo de Exército. Destaque para um mo
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MEMÓRIA
O PELOTÃO DO TENENTE IPORAN, ANTES DO ATAQUE A MONTESE
mento marcante da FEB, a rendição em uma única ocasião, de quase 20 mil soldados de Hitler e Mus solini, a maioria da 148ª Divisão de Infantaria do Führer, entre 29 e 30 de abril, quase igual o total de nosso contingente em ter ra e ar, 25.834 indivíduos.
A nossa Força em sua ar rancada final, ainda che gou na cidade de Turim, depois em 2 de maio de 1945, na cidade de Susa, onde fez junção com as tropas francesas, esta na fronteira franco-italiana. Hitler cometendo suicídio em 30 de abril, a capitula ção logo ocorreu, na cida de de Reims – França, em 07 de maio 1945, e finaliza o conflito iniciado em 1939 que ceifou cerca de 85 mi lhões de vidas.
Por sua bravura e senso de heroísmo o Tenente Ipo ran foi condecorado: » Pelos EUA, o General Charles Gerhalt, lhe agra
ciou a “Silver Star Medal”, entregue no 16° BC, em Cuiabá, em 15.07.1946.
» Pelo Reino Unido, o Mal. de Campo Sir Harold Ale xander lhe conferiu o títu lo de “Member of the Or der of the British Empire”, no Palácio Guanabara, em 15.06.1948.
Por esses feitos e por ir repreensível conduta mili tar o Ten. Iporan recebeu mais láureas:
» Cruz de Combate de 1ª e de 2ª Classe;
» Medalha de Campanha; » Medalha de Guerra;
» Ordem do Mérito Militar, Grau de Oficial, e » Medalha Mal. Mascare nhas de Moraes Finda a 2ª Guerra Mun dial, o herói cuiabano se gue abnegado nas fileiras do Exército Brasileiro, retor nando para sua terra natal, casou-se com a Sra. Altayr de Lima Bastos de Olivei ra, em 30 de dezembro de 1948, surgindo desta feliz
união 4 filhos e diversos ne tos. Ele serviu ainda no 3° RI ; 5° RI; Escola de Aper feiçoamento de Oficiais; e no Estado Maior do Exér cito no período de 1960 até 1964, na Comissão de Promoçõens do Exér cito, indo enfim para a re serva no posto de Coronel. Várzea Grande cedeu seu nome correto à uma rua, em Cuiabá outra, mas gra fada R. Capitão Iporã. Per deu, como inevitável, a der radeira batalha para morte ocorrida no dia 03 de de zembro 2011, em Niterói/ RJ, faleceu de causas na turais, o veterano da FEB, Coronel Iporan Nunes de Oliviera. Em sua despedida o 21° Grupo de Artilharia de Campanha prestou-lhe as justas e devidas honras mi litares, ocorrido no Crema tório do Cemitério Parque da Colina - Pendotiba, nes sa mesma urbe.
“Feliz a Nação que não esquece dos seus Heróis”
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Significado da música Hallelujah, de Leonard Cohen
POR CAMILA FERNANDES
Certamente você já ouviu uma das versões dessa música em um ca samento por aí. O famosa “ale luia” do refrão é figurinha carimba da nas celebrações matrimoniais.
Agora, se você não é uma pessoa que frequenta casamentos, pode ser que conheça Hallelujah como “a música do filme do Shrek”. As duas opções são válidas, não estamos aqui para julgar ninguém.
O fato é que Hallelujah se tornou um verdadeiro clássico. A música foi regravada diversas vezes e ganhou versões em diferentes idiomas.
Mas, mesmo com toda a popularidade, os mistérios sobre o verdadeiro significado da letra nunca deixaram de pairar sobre a canção de Leonard Cohen.
As apostas vão de música religiosa à canção deprimente e melancólica, e você vai perceber que as duas fazem sentido.
Que tal tentar entender com a gente o
verdadeiro significado de Hallelujah, do Leonard Cohen? Ela é mais uma daquelas músicas que têm significados surpreendentes.
A versão de Hallelujah, que vamos analisar é uma das que foram gravadas pelo compositor, Leonard Cohen, que ele cantava em seus últimos shows. Existe outra versão que ficou muito famosa, que é a do Jeff Buckley.
Apesar de serem, em essência, a mesma música, as duas têm letras um pouco diferentes. Isso porque Leonard Cohen escreveu páginas e mais páginas com possíveis estrofes para a música. Ele usou quatro na primeira versão, depois foi alterando e intercalando outras.
Já quando Jeff Buckley regravou, Cohen entregou a ele os manuscritos da música para que ele escolhesse as estrofes que usaria. É por isso que as versões de Hallelujah podem ter interpretações diferentes. Com isso esclarecido, é hora de começar a análise!
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ANÁLISE DA LETRA DE HALLELUJAH, DE LEONARD COHEN:
I’ve heard there was a secret chord (Eu ouvi dizer que havia um acorde secreto) That David played and it pleased the lord (Que Davi tocava e agradava ao Senhor) But you don’t really care for music, do you? (Mas você não liga muito para música, não é?)
Logo na primeira estrofe, a música já traz uma das várias referências bíblicas que veremos ao longo da letra. Os dois primeiros versos falam sobre Davi, personagem bíblico ao qual é atribuída a autoria do livro de Salmos — pequenos cânticos e poemas de louvor.
De acordo com a música, havia uma nota secreta nos salmos de Davi que agra dava a Deus. No terceiro verso, no entanto, ele questiona o interlocutor sobre seu real interesse pela música. Aqui ainda não fica claro a quem o compositor está se referin do, mas pode ser que seja ao próprio Deus.
It goes like this: the fourth, the fifth (É assim: a quarta, a quinta)
The minor fall, the major lift (A menor cai, a maior ascende)
The baffled king composing Hallelujah (O rei perplexo compondo Aleluia)
Como se assumindo que o interlocutor de fato não entende de música, a composição começa a explicar o que acontece na canção. A quarta, a quinta, a menor e a maior são as quatro notas que compõem a melodia de Hallelujah, inclusive no refrão; Você já deve ter notado que todas as estrofes da música terminam com Hallelujah, e é claro que isso não é coincidência. Pode se tratar de uma referência ao fim dos Salmos, em que se cantava o aleluia, assim como também pode ser uma menção irônica ao ensinamento bíblico de que se deve sempre louvar e dar graças a Deus, não importa qual seja a situação.
Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah
Hallelujah ou Aleluia vem do hebraico Halləluya. A primeira parte, Hallelu, pode ser traduzida como louvai ou elogiai. Já a segunda parte, Jah ou Yah, é uma abreviação para Yahweh, que significa Deus. Hallelujah, portanto, é comumente traduzida como louvado seja Deus.
Your faith was strong, but you needed proof (Sua fé era forte, mas você precisava de provas)
You saw her bathing on the roof (Você a viu se banhando no telhado) Her beauty and the moonlight overthrew you (A beleza dela e o luar arruinaram você)
O primeiro verso da segunda estrofe pode ser uma referência à história de Tomé, o discípulo que precisou tocar a mão de Jesus para acreditar que ele havia ressuscitado.
Em seguida, a letra volta a falar de Davi, mas em outro contexto. Os dois versos se referem à passagem em que ele vê uma mulher se banhando no telhado, se encanta pela beleza dela e se deixa levar pelo desejo. Ao contrário da primeira estrofe, em que Davi agradava a Deus, aqui ele desagrada.
She tied you to a kitchen chair (Ela te amarrou à cadeira da cozinha) She broke your throne and she cut your hair (Ela destruiu seu trono e cortou seu cabelo) And from your lips she drew the Hallelujah (E dos seus lábios ela tirou o Aleluia)
Em seguida, temos uma referência a Sansão e Dalila. A história diz que Sansão tinha uma força anormal, que ele havia recebido de Deus para proteger seu povo. No entanto, Deus havia dito a ele que nunca deveria cortar os cabelos, porque eles eram a fonte dessa força.
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ARTIGO
Acontece que Sansão também se deixa levar pela beleza de uma mulher, Dalila. Ela o trai, e ele perde a força. Mais uma vez, temos o Hallelujah no final, só que agora em um tom de súplica, de quem pede perdão por ter errado.
Hallelujah, hallelujah allelujah, hallelujah Now, maybe there’s a god above (Agora, talvez haja um deus acima)
As for me, all I ever learned from love (Quanto a mim, tudo o que eu aprendi sobre o amor) Is how to shoot at someone who outdrew you (É como atirar em alguém que sacou a arma primeiro)
De louvor, na primeira estrofe, e traição na segunda, passamos para a descrença e o ceticismo. A letra traz a ideia do amor como autodefesa, dizendo que o que aprendeu sobre amar é que na verdade se trata de uma vigilância constante para se proteger dos outros.
But it’s not a cry that you hear tonight (Mas não é um choro que você ouve esta noite)
It’s not some pilgrim who claims to have seen the light, no (Não é um peregrino que alega ter visto a luz, não)
It’s a cold and it’s a very broken Hallelujah (É um Aleluia frio e muito sofrido)
No entanto, apesar da traição e das decepções, a terceira estrofe também nos diz que a intenção da música não é se lamentar. Trata-se, ainda, de uma espécie de agradecimento — mesmo que seja frio e sofrido.
Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah Oh, people, I’ve been here before (Ah, pessoal, eu já estive aqui antes) I know this room and I’ve walked this floor (Eu conheço este quarto e já pisei este chão)
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A Dúvida De Tomé CARAVAGGIO
You see, I used to live alone before I knew you (Veja, eu costumava viver sozinho antes de te conhecer)
No começo da estrofe, a letra fala sobre “já ter estado aqui antes”. Essa é uma expressão muito usada no inglês pra falar não só sobre estar em lugar específico, físico, mas sobre já ter vivido determinada situação.
Portanto, pode ser que Leonard Cohen esteja dizendo que já passou por isso antes, que não é a primeira vez que lida com a situação descrita na música.
No terceiro verso, ele se refere diretamente a um interlocutor. Pode ser a pessoa amada, se interpretarmos como uma canção romântica sobre traição, mas também pode ser Deus, se entendermos a letra como uma oração que contesta a divindade por tê-lo deixado desamparado.
And I’ve seen your flag on the Marble Arch (E eu vi sua bandeira no Arco de Mármore)
But listen love, love is not some kind of victory march, no (Mas escute, amor, o amor não é como uma marcha de vitória, não) It’s a cold and it’s a very lonely Hallelujah (É um Aleluia frio e muito solitário)
O Marble Arch é um dos monumentos mais visitados de Londres. Ele foi desenhado em 1827 para o Hall de Honra do Palácio de Buckingham e em 1855 foi transferido para o local atual, perto do Hyde Park.
Que bandeira é essa a qual a letra se refere? Bom, o arco tem desenhos de anjos, guerreiros e um rosto no centro, que lembram muito a arte sacra.
Nos dois últimos versos, a letra volta a falar sobre como o amor não é aquilo que imaginamos. O amor não é um canto de vitória, mas apenas um suspiro.
Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah There was a time you let me know (Houve um tempo em que você me deixava saber) What’s really going on below (Tudo o que realmente acontecia) But now, now you never even show it to me, do you? (Mas agora você nunca me mostra isso, não é?)
Aqui o cantor dá a entender que se sente desinformado sobre algo ou alguém, ou que o interlocutor não tem sido totalmente sincero.
I remember when I moved in you (Eu me lembro de quando entrei em você) And the holy dove, she was moving too (E a pomba sagrada entrou também) And every single breath that we drew was Hallelujah (E cada suspiro que dávamos era um Aleluia)
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ARTIGO
Sansão e Dalila PETER PAUL RUBENS
Essa é a parte mais polêmica da música. Isso porque existem várias suspeitas de que ela se refere a uma relação sexual — teoria que ganhou ainda mais força depois de Jeff Buckley afirmou que o aleluia era um suspiro de prazer.
Pra quem prefere dar uma interpretação mais leve, os versos podem ser uma referência nostálgica ao coração, ao amor, e até mesmo à religião e à fé.
Hallelujah, hallelujah Hallelujah, hallelujah
I’ve done my best, I know it wasn’t much (Eu fiz o meu melhor, eu sei que não foi muito)
I couldn’t feel, so I learned to touch (Eu não podia sentir, então eu aprendi a tocar) I’ve told the truth, I didn’t come here to fool you (Eu disse a verdade, eu não vim aqui para te enganar)
A última estrofe é a confissão final, onde o compositor/personagem assume que ele também errou. Mas que, acima de tudo, fez o melhor que podia e foi sincero.
And even though it all went wrong (E mesmo que tudo tenha dado errado) I’ll stand right here, before the Lord of Song (Eu estarei aqui, diante do Senhor da Música) With nothing, nothing on my tongue but Hallelujah (Com nada, nada em meus lábios além de Aleluia)
Nesse ponto da música nós já conseguimos entender o que é esse “tudo” que deu errado: a traição, o fracasso de um relacionamento, ou, seguindo pela linha religiosa, o fracasso da fé.
Ainda assim, o compositor nos diz que jamais deixará de entoar seu aleluia diante do Senhor da Música. Pode ser uma nova referência a Davi ou mesmo à divindade.
11 DE NOVEMBRO DE 2016
» Morreu aos 82 anos, o músico e poeta Leo nard Cohen, segundo informou a gravado ra Sony Music Canadá em uma publicação em seu Facebook. A causa da morte não foi informada e a morte ocorreu dia 10 à noite.
“Com profunda dor, nós informamos que o lendário poeta, escritor e artista Leonard Cohen faleceu. Perdemos um dos mais vene rados e prolíficos visionários da música. Um memorial ocorrerá em Los Angeles. A família pede privacidade durante esse período de luto”, postou a gravadora.
Nascido em Westmount, Quebec, Cana dá, em 21 de setembro de 1934, Cohen havia lançado seu último álbum You Want it Darker no dia 21 de outubro deste ano. Considerado um dos maiores artistas do século 20, o cana dense aprendeu a tocar guitarra ainda jovem e formou o grupo de música folk Buckskin Boys. No entanto, sua carreira começou com a literatura. Lançou o romance The Favorite Game (1963), o livro de poesias Flowers for Hitler, de 1964, e mais um romance Beautiful Losers (1966). Porém, o pouco sucesso das obras à época fez com que ele fosse para Nova York, onde conheceu a cantora Judy Collins. Com músicas no disco da artista, ele estreou no mundo musical em 1967, com a obra-prima Songs of Leonard Cohen - com os clássicos Suzanne e So long, Marianne. Cohen inspirou uma geração de talentosos músicos, incluindo Dylan, e continuou a com pilar prêmios e sucessos. Um das maiores canções de sua carreira é Hallelujah, do ál bum Various Positions, 1985, que é reprodu zida em diferentes versões até os dias atuais.
Entre os anos de 1990 e 1996, Cohen ficou afastado da música, mas voltou após descobrir que havia sido roubado financei ramente por seu agente Kelley Lynch.
No Canadá, Cohen recebeu o título da Ordem do Canadá em 2003, antes de ser introduzido no Songwriters Hall da fama ca nadenses em 2006. Ele também recebeu o Prêmio Espírito Montreal Jazz Festival e o prê mio do Governador Geral do Canadá para a poesia. Finalmente, ele foi introduzido no Hall da Fama do rock’n’roll em março de 2008.
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Livros Inacabados de Grandes Escritores
Eis um fato interessante: quase todo escritor tem uma obra inacabada. Embora esses autores tenham ra zões convincentes o bastante para deixar uma obra inacabada, a morte do es critor é, geralmente, o motivo mais comum de interrupção. Abaixo uma lista de seis li vros inacabados de grandes escritores e os motivos que os impediram de finalizá-las.
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JAMES JOYCE
JOHN STEINBECK
EVELYN WAUGH
GUSTAVE FLAUBERT
O autor de Madame de Bovary, escri tor Gustave Flaubert estava tão obcecado por este livro que afirmou ter lido 1.500 li vros em preparação para escrever Bouvard e Pécuchet, que, esperava ele, seria sua obra-prima. Flaubert trabalhou incessante mente neste livro até sua morte, tendo feito apenas uma pausa de um ano entre 187576 para escrever três contos. O livro narra a história de dois amigos que largam o em prego e partem em busca de conhecimento no campo, mas falham em sua jornada inte lectual. O livro foi publicado em 1880, mas, devido à morte de Flaubert, termina antes da conclusão da história. De acordo com manuscritos deixados pelo autor, o provável fim se daria com os amigos sendo expulsos pelos mo radores da aldeia e retor nando ao antigo emprego.
Escrito durante os 37 dias em que Sade esteve preso na Bastilha, 120 dias de Sodoma foi concebido em um estreito papel de um rolo de 12 metros. Após a queda da Bastilha, Sade foi transferido para um asilo para loucos, mas antes, por temer que a obra se perdes se para sempre, escondeu -a. A obra foi encontrada ainda intacta e publicada em 1904. No to tal, apenas a primeira parte está escrita de talhadamente, as três partes restantes es tão escritas em forma de notas.
Stephen Hero serviu de modelo para Por trait of the Artist as a Young Man (Retrato do artista quando jovem), livro que Joyce ten tou queimar durante uma discussão com sua mulher, Nora. Stephen Hero somente veio ser publicado três anos após a mor te de Joyce. Embora tenha abandonado a obra, Joyce sempre julgou-a mais pessoal e autobiográfica que Retrato. O escritor se dedicou ao livro durante seus anos na Uni versidade de Dublin, entre 1901 e 1906. Publicado em 1976, As leis do rei Arthur e de seus nobres cavaleiros, de Steinbeck,
é uma releitura de Le Morte d’Arthur, escri to por Sir Thomas Malory, um dos primeiros livros que Steinbeck leu quando criança. O livro utiliza a obra de Malory como ponto de partida, mas em seguida assume um viés psicológico. Steinbeck chegou a afirmar que este livro seria seu maior feito. Porém, o autor morreu antes de concluir a obra.
O livro inacabado de Warthon, Os buca neiros foi publicado em 1938, mas após 50 anos de sua publicação foi concluído por Marion Mainwaring, uma estudiosa de War thon, que utilizou as anotações deixadas pela escritora para completar a obra. A his tória narra o casamento de cinco garotas norte-americanas com ingleses.
Único livro dessa peque na lista que nunca chegou a ser publicado, O templo de sapé foi a primeira ten tativa de Waugh na literatu ra, e sua falha o deixou des norteado. Waugh começou a escrever o livro em 1924, durante a universidade. A obra, altamente autobio gráfica, é baseada em ex periências vividas pelo au tor em Oxford, com temas como loucura e magia ne gra. O que deu errado? Em 1925, Waugh entregou o manuscrito a um amigo chamado Harold Action, que criticou duramente a obra. “Era uma loucura, uma piada totalmente sem va lor. Eu disse isso com uma franqueza bru tal”, revelou posteriormente Action. A crítica deixou Waugh tão angustiado que ele quei mou o manuscrito, foi para a praia e come çou a nadar mar a dentro. Em sua biografia, Waugh escreveu “Eu tinha a intenção de me afogar? Certamente isso passou pela minha cabeça”. Mas, após algum tempo na água, Waugh foi atacado por uma água viva e vol tou para a areia. Em seguida, Waugh pas sou um tempo afastado da ficção, mas es crevendo The Balance (O equilíbrio), conto que possivelmente teve muitos elementos de The Temple incorporados.
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LITERATURA Americanidade A Busca Pelo Intercâmbio Cultural Entre
Da
AUGUSTO DOS ANJOS
Os Povos
América Do Sul:
Augusto dos Anjos
Poeta brasileiro
POR DILVA FRAZÃO
Augusto dos Anjos nasceu no enge nho “Pau d’Arco”, na Paraíba, no dia 22 de abril de 1884. Filho de Alexan dre Rodrigues dos Anjos e de Cór dula de Carvalho Rodrigues dos Anjos. Re cebeu do pai, formado em Direito, as primei ras instruções. No ano de 1900, ingressou no Liceu Paraibano e compõe nessa época, seu primeiro soneto, “Saudade”.
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Dado à sua genialidade, Augusto dos Anjos é considerado um dos poetas mais críticos de sua época. Foi identificado como o mais importante poeta do pré-mo dernismo, embora revele em sua poesia, raízes do simbolismo, retratando o gosto pela morte, a angústia e o uso de metá foras. Declarou-se “Cantor da poesia de tudo que é morto”. O domínio técnico em sua poesia, comprovaria também a tradi ção parnasiana. Durante muito tempo foi ignorado pela crítica, que julgou seu voca bulário mórbido e vulgar. Sua obra poéti ca, está resumida em um único livro “EU”, publicado em 1912, e reeditado com o nome “Eu e Outros Poemas”.
O poeta Augusto dos Anjos estudou, por influência de seu pai, na Faculdade de Direito do Recife entre os anos de 1903 e 1907. Formado em Direito, retornou para João Pessoa, capital da Paraíba, onde passou a lecionar Literatura Brasileira, em aulas particulares.
Em 1908, Augusto dos Anjos foi nomea do para o cargo de professor do Liceu Pa raibano, mas em 1910, foi afastado do car go por desentendimentos com o governa dor. Nesse mesmo ano casa-se com Ester
Fialho e muda-se para o Rio de Janeiro, de pois que sua família vendeu o engenho Pau d’Arco. Em 1911 foi nomeado professor de Geografia, no Colégio Pedro II.
Durante sua vida, publicou vários poe mas em jornais e periódicos. A publica ção do livro “EU”, causou espanto nos críticos da época, diante de um vocabu lário grotesco e sua obsessão pela mor te: “podridão da carne, cadáveres fétidos e vermes famintos”. Como também por sua retórica delirante, por vezes criativa, por vezes absurda, como neste trecho do poema “Psicologia de um Vencido”: “Eu, filho do carbono e do amoníaco,/ Mons tro da escuridão e rutilância,/ Sofro, des de a epigênese da infância,/ A influência má dos signos do zodíaco”.
Em 1914, Augusto dos Anjos foi nomea do Diretor do Grupo Escolar Ribeiro Jun queira, em Leopoldina, Minas Gerais, para onde se mudou. Nesse mesmo ano, de pois de uma longa gripe, foi acometido de uma pneumonia.
Augusto de Carvalho Rodrigues dos An jos faleceu em Leopoldina, Minas Gerais, no dia 12 de novembro de 1914, com ape nas 30 anos de idade.
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AMERICANIDADE
À MESA Augusto dos Anjos
Cedo à sofreguidão do estômago. É a hora De comer. Coisa hedionda! Corro. E agora, Antegozando a ensangüentada presa, Rodeado pelas moscas repugnantes, Para comer meus próprios semelhantes Eis-me sentado à mesa!
Como porções de carne morta... Ai! Como Os que, como eu, têm carne, com este assomo Que a espécie humana em comer carne tem!... Como! E pois que a Razão me não reprime, Possa a terra vingar-se do meu crime Comendo-me também.
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58 lume MatoGrosso RETRATO EM PRETO E BRANCO
Pablo Neruda
Um homem de grandes paixões
Neftali Reyes Basualto nasceu em 12 de julho de 1904, na cidade de Parral, no sul do Chile, mas aos 17 anos adotou o nome de Pablo Neruda em uma tentativa de escon der de seu pai o ofício que o apaixonava, sem que até hoje exista certeza sobre o que inspirou o pseudônimo. Desde jovem seu grande talento ganhou reconhecimen to internacional e, em outubro de 1971, re cebeu o Prêmio Nobel de Literatura.
Poeta apaixonado, Pablo Neruda pro vou os prazeres da vida, amou as mulhe res e se comprometeu com o socialismo no Chile. O escritor morreu 12 dias após o golpe militar de Augusto Pinochet, há mais de 40 anos, e até hoje a justiça inves tiga se ele teria sido assassinado por con ta de sua amizade com Salvador Allende.
A obra de Neruda se caracteriza por sua universalidade, incorporada em obras como “Residência na terra”, “Canto Ge ral”, “Odes Elementares” e “Confesso que vivi” , ou ainda nos versos dedicados à dança, alegria, ao livro, ao mar, ao tem po, à tristeza ou ao vinho, ou com poemas como “As alturas de Machu Picchu”, com o qual introduziu a história sul-americana.
A literatura de Neruda transcendeu as fronteiras graças a suas obras mais român ticas: “Vinte Poemas de Amor e uma Can ção Desesperada” e “Versos do Capitão”.
Apesar de ter sido considerado um ho mem fisicamente pouco atraente, tímido e inseguro, Neruda se casou três vezes e teve pelo menos seis amantes furtivas, que o ins piraram a criar os famosos poemas de amor.
“Um poeta deve estar sempre apaixo nado, até o último minuto de sua vida”, confessou à jornalista Maria Esther Gillio, em uma entrevista em 1970.
Em 1930, ele se casou em Batavia (atual Jacarta) com a holandesa Maria Antonieta
Hagenaar, sua primeira esposa, com quem teve uma filha, Malva Marina, que morreu aos oito anos de idade vítima da hidrocefalia.
Mesmo casado, apaixonou-se pela ar tista plástica argentina Delia del Carril, 20 anos mais velha, que teve forte influência sobre o poeta, tornando-se uma espécie de “mãe intelectual” durante os 20 anos de convivência.
Casado com Delia, viveu no México, onde começou um caso secreto com a soprano chilena Matilde Urrutia, que veio a ser sua terceira esposa, com quem pas sou seus últimos dias na casa de Isla Ne gra, onde estão os túmulos de ambos.
No final, sua vida foi atormentada por um relacionamento que manteve com a sobri nha de Matilde, Alicia Urrutia.
Pablo Neruda teve uma participação ativa no Partido Comunista e em 1945 tor nou-se senador pelas províncias do nor te de Tarapacá e Antofagasta, quando co nheceu o socialista Salvador Allende.
Em 1948, Neruda foi exilado pelo presi dente Gabriel González Videla, que o acu sou de injúria e também tornou ilegal o Partido Comunista. O poeta teve que fugir secretamente para a Argentina em um ca valo, e depois para a Europa.
Em 1970, de volta ao Chile, Neruda foi apresentado como pré-candidato à pre sidência pelos comunistas, mas decidiu recusar a indicação para apoiar Allende, que se tornou presidente em 1971 e o no meou embaixador na França.
Neruda, que retornou ao Chile em 1972, foi um firme defensor do governo socialis ta e um forte opositor do golpe de Estado de Augusto Pinochet.
O poeta também teve uma extensa car reira diplomática e foi cônsul em Yangum (Birmânia, atual Mianmar), Cingapura, Mé xico e Espanha.
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LITERATURA
Americanidade A Busca Pelo Intercâmbio
Cultural Entre Os Povos Da América Do Sul: Mário Vargas Llosa
Referência
na literatura da América do Sul
Mario Vargas Llosa nasceu em 28 de março de 1936, em Arequi pa, no sul do Peru. Seus pais eram Ernesto Vargas Maldona do (aviador) e Dora Llosa Ureta.
Com a publicação da novela A cidade e os cachorros (1963), Vargas Llosa foi consa grado como uma das figuras fundamentais do “boom” da literatura hispano-americana dos anos 1960. Como outros membros do mesmo grupo, seu trabalho rompeu com os canais da narrativa tradicional, assumindo as inovações da narrativa estrangeira e ado tando técnicas como o monólogo interior, a
pluralidade de pontos de vista ou a fragmen tação cronológica, geralmente colocados ao serviço de um realismo grosseiro.
Por outro lado, o romancista peruano também deve importantes contribuições críticas e profundas reflexões sobre a arte da escrita, como a sua teoria sobre “de mônios internos”, que tenta explicar a es crita como um ato de expulsão, por parte do criador, da elementos de consciência capazes de incubar distúrbios que apenas o ato de escrever pode exorcizar. O Prê mio Nobel de Literatura em 2010, coroou uma carreira exemplar.
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BIOGRAFIA
Mario Vargas Llosa passou sua infância entre Cochabamba (Bolívia) e as cidades peruanas de Piura e Lima. O divórcio e a posterior reconciliação de seus pais resul taram em mudanças freqüentes de ende reço e escola; entre quatorze e dezesseis anos ele era um estagiário na Academia Mi litar Leoncio Prado, cena de sua novela La ciudad y los perros. Com dezesseis anos de idade, começou sua carreira literária e jor nalística com a estréia do drama La huida del Inca (1952), um pouco de sucesso.
Pouco depois de entrar na Universidade de São Marcos em Lima, onde estudou li teratura. Ele realizou vários trabalhos para viver sem abandonar seus estudos: de um editor de notícias em uma estação de rá dio para um registrador no Cemitério Ge ral de Lima. Em 1955, um escândalo cau sado pela sua tia Julia Urquidi (um episó dio inspirado pela novela tia Julia e o escri ba) agravou ainda mais sua situação, ten do que recorrer a alguns amigos para aliviar sua situação doméstica angustiante.
Na capital peruana, fundou Cuadernos de Composição (1956-1957), juntamente com Luis Loayza e Abelardo Oquendo, e depois a Revista de Literatura (1958-1959),
estabelecendo-se nessas publicações como portador padrão de um grupo que reagiu contra a narrativa social e documen talista da época. No final dos anos1950, ele finalmente conseguiu viajar e se instalar na Europa, onde começou a trabalhar na Ra dio Televisión Francesa e foi professor do Queen Mary College, em Londres.
Publicou seu primeiro trabalho, Los bos ses (1959), com apenas vinte e três anos, e com a novela La ciudad y los perros (1963) ganhou reputação entre os escritores que na época estavam criando o iminente boom lite rário ibero-americano. Vargas Llosa acabaria aparecendo entre os autores essenciais des se fenômeno editorial, e foi colocado para a sua relevância na linha de frente, juntamen te com os narradores da estatura do colom biano Gabriel Garcia Márquez, os mexicanos Juan Rulfo e Carlos Fuentes, os argentinos Jorge Luis Borges, Julio Cortázar e Ernesto Sábato e o uruguaio Mario Benedetti.
O sucesso deste romance e o elogio que levou à sua carreira literária permiti ram que ele deixasse um estágio precário e boêmio. No antigo continente, Vargas Llosa estabeleceu sua residência primeiro em Pa ris e depois em Londres (1967), de onde se mudou para Washington e Porto Rico.
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ALTO, DA ESQUERDA PARA A DIREITA: 01 - MARIO VARGAS LLOSA, 02 - GABRIEL GARCIA MARQUES; 03 - JULIO CORTAZAR - 04- CARLOS FUENTEZ.
AO
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Em 1977 foi nomeado membro da Academia peruana de Língua e professor da cadeira Simon Bolivar em Cambridge.
No campo político, sua ideologia sofreu ao longo dos anos mutações profundas. A rejeição visceral de todas as ditaduras e a abordagem da democracia cristã caracterizaram sua juventude; Na década de 1960, ele passou de um apoio explícito à Revolução Cubana para um distanciamento progressivo do comunismo e uma ruptura definitiva com o governo de Fidel Castro (1971) seguindo o chamado Caso Padilla.
Ele acabou se tornando um forte defensor do liberalismo, mas sem renunciar aos avanços sociais alcançados pelo progressismo, e nos anos 1980 ele se envolveu ativamente na política de seu país. O promotor do partido Frente Democrático, cujo programa combinou o neoliberalismo com os interesses da oligarquia peruana tradicional, Mario Vargas Llosa apareceu como chefe da lista nas eleições peruanas de 1990, em que foi derrotado por Alberto Fujimori.
Ele decidiu então se mudar para a Europa e dedicar-se completamente à literatura; Publicou artigos de opinião em jornais como El País , La Nación , Le Monde , Ca-
retas , The New York Times e El Nacional . Em 1993, obteve a nacionalidade espanhola, e um ano depois foi nomeado membro da Royal Spanish Academy. Mario Vargas Llosa foi distinguido, entre muitos outros prêmios, com os prêmios Príncipe das Astúrias das Letras (1986), Cervantes (1994) e Nobel Literature (2010). O reconhecimento máximo das letras universais veio em reconhecimento “a sua cartografia de estruturas de poder e suas imagens de resistência, revolta e derrota individual”.
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O TRABALHO
NARRATIVO
DE VARGAS LLOSA
Sua produção narrativa começou em 1959 com as histórias dos patrões e alcançou a ressonância internacional com o romance A cidade e os cães (1963, Prêmio Biblioteca Breve de 1962), reflexão e denúncia da organização paramilitar Leoncio Prado School, onde o autor completou seus estudos secundários. A atmosfera fechada e opressiva daquela escola militar em Lima parece encapsular toda a violência e a corrupção no mundo atual; Os “cães” do título são os alunos do primeiro ano, submetidos a crueldade por parte dos anciãos.
Deixando de lado seus problemas sociais e éticos, o romance mostra uma maturidade surpreendente pelo caráter ambíguo e mutável dos personagens, pela descrição precisa dos ambientes urbanos, pelo seu enredo sinuoso e pelo tratamento hábil do tempo narrativo. Longe de atenuar, o experimentalismo e a superposição de tempos, personagens e ações intensificam seu realismo brutal e chocante e o retrato de uma violência explícita ou subjacente.
Como narrador, Vargas Llosa amadureceu precocemente: A cidade e os cães (1963) é o primeiro romance peruano completamente “moderno” em recursos expressivos. The Green House (1966), The Puppies (1967) e Conversation in The Cathedral (1969) o ungiram como um dos protagonistas do “boom” da novela hispano-americana dos anos sessenta e como o mais caracteristicamente neorrealista do grupo, com um virtuosismo técnico de enorme influência internacional.
Seus romances posteriores, exceto o mais ambicioso de todos, A Guerra do Fim do Mundo (1981, um retrato afiado da heterogeneidade sociocultural da América Latina), abandonou o design de “romances totais” que até então o obcecavam e optaram pela reelaboração (irônica ou transgressiva) de formas ou gêneros subliterários ou extraliterários, apresentando com grande frequência uma reflexão sobre os limites da realidade e da ficção que recria aspectos da literatura de fantasia e do experimentalismo nar-
rativo sem cair completamente neles: farsa, em Pantaleón e os visitantes (1973); o melodrama, na tia Julia e o escritor (1977); ficção política antecipada, em Historia de Mayta (1984); A história do crime e do mistério, em Quem matou Palomino Molero? (1986) e Lituma nos Andes (1993); a narrativa erótica, em Elogio de la madrastra (1988) e Los cuadernos de don Rigoberto (1997); e política, em La fiesta del chivo (2000).
Não há dúvida de que a narrativa ocupa o lugar central de sua produção abundante. Sua habilidade técnica magistral, sua capacidade de tornar cada um deles um mundo sólido capaz de auto-sustentabilidade e o fato de conceder uma autonomia total ao trabalho narrativo são suas virtudes fundamentais. Em todos os seus livros, incluindo aqueles que gostam de Pantaleón e os visitantes ou La tía Julia e o escritor, podem ser considerados menores, a forma adquire o maior grau de importância.
Na tradição do romance dos ditadores, Vargas Llosa também publicaria um trabalho ambicioso e total, La fiesta del chivo (2000), no qual reconstrói com domínio absoluto a ditadura de Rafael Leonidas Trujillo, na República Dominicana. Seis anos depois, ele deu à impressão Travesuras de la niña mala (2006), uma história entre o cômico e o trágico em que o amor se mostra o dono de mil rostos. O herói discreto (2013) é, por enquanto, o romance mais recente dele.
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Manoel de Barros
ILUSTRAÇÃO FERNANDO ROMEIRO
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foto: rai reis