SODRÉ, Paulo Roberto. Poemas desconcertantes. Vitória: Estação Capixaba / Cândida, 2017.

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Poemas travestidos

Bastidores Contorna os olhos; realça as pálpebras; o rouge cobre o pelo, e o rosto brota, alfenim com perfume de vasta gardênia. A noite alteia, e acordam os pardos gatos. A lingerie encardida, a peruca, os cílios. Os brincos em frufru; os anéis ofegam de vidrilhos. A noite vai alta, sibilam as sombras pardas. A penteadeira o observa generosamente e lhe entrega aos poucos um nome que atenua seus anseios: Angela. A noite altaneira; arranham-se gatos sombrios. Um gesto se cria entre um sim e uma dúvida. Cintilam os brocados, e a alegria chega, bijuteria sob o mau humor do tempo.

Tomada Primeira: os vidros Adoro o brilho das pedras lilases nos aros, nas placas, nas tranças das tiaras faiscantes. Adoro as faíscas de purpurina nos batons, nos vestidos, nas écharpes, nas calcinhas com detalhes de rubi. Brilham, faíscam, reluzem, douram, iluminam. Adoro as joias que sopram esquecimento.

Poemas desconcertantes

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