De A à Z: Uma História Poética da Brincadeira do Boi-de-mamão na Ilha.. (Ed. Bernúncia, 2012)

Denilson Antônio Artista plástico, pai, curador, pesquisador e arte educador.

Participou da exposição coletiva Quimera em 2010, da publicação Conjurados e como artista curador na exposição Regenerarte em 2011. Exposição Intervenções no atelier Árvore da Felicidade em 2012. Entre suas principais curadorias está a Exposição Fanáticos da I Mostra de Arte Contemporânea, da qual é o idealizador, na Fundação Hassis. Apaixonado pelo folclore, ministra oficina de máscaras, trabalha na construção e na restauração das alegorias do grupo de Boi-de-Mamão em Canasvieiras e na construção dos bonecos do Berbigão do Boca, festa que abre o carnaval local. É tido por todos como a "alma do boi", pois além do trabalho de confecção e arte, dança no boi de pano, na Maricota, Bernunça e ensina a dança aos participantes.

Essa relação de amor com o folguedo, faz sua produção artística apoderar-se do tema.

Marcoliva É professor, pai, músico, cantor e compositor. Na música tem sua obra registrada no Dicionário da Música Popular Brasileira, de Ricardo Cravo Albin. Gravou três álbuns em parceria com Tatiana Cobbett: Parceiros em 2001, Bendita Companhia em 2008 e Sonora Parceria Música Súbita em 2012, registrados pela Editora Nossa Música - RJ. Com Marli Silveira, pela Editora Edunisc RS, publica o livro Dupla Poesia no ano de 2010. Em 2011, publica o Pasquim o ABC do Boi-deMamão, em parceria com Denilson Antônio, lançado no 7º. Salão Nacional de Poesia Belô Poético - MG. Atualmente é gestor cultural da OCA Carijó Espaço de Arte, em Florianópolis.

alcunha- (árabe al-kunia, sobrenome) s. f. Epíteto, geralmente fundado nalguma particularidade física ou moral do indivíduo ao qual ele se atribui. acudir- v. tr. e intr. 1. Prestar socorro ou auxílio. = AJUDAR, AUXILIAR, SOCORRER Cortejo- s. m. 1. Comitiva pomposa. 2. Séquito. 3. Acompanhamento. garboso- |ô| adj. Galhardo; elegante transpor |ô| - v. tr. 1. Passar além de ou por cima de. 2. Ultrapassar. urbe- s. f. , CIDADE geralmente caracterizada por um número elevado de habitantes. xereta |é| s. 2 g. 1. [Brasil] Bisbilhoteiro. 2. Importuno, novidadeiro. 3. Adulador. vis-à-vis - adv. 1. Defronte; em frente. mesura s. f. 1. Reverência (cumprimentando), cortesia. vis-à-vis - adv. 1. Defronte; em frente.

Guia- s. f. 1. Correia para dirigir o cavalo no picadeiro.

2. Cada uma das correias com que o cocheiro maneja o freio dos cavalos de tiro.

Potrilho- s. m. Potro de menos de dois ou três anos.

1. Extraído do Livro Ribeirão da Ilha - Vida e Retratos, de Nereu do Vale Pereira, Francisco do Vale Pereira e Waldemar Joaquim da Silva Neto.

De A à Z Uma história Poética da Brincadeira do Boi-de-mamão na Ilha de Santa Catarina

Marcoliva Denilson Antônio elar é amar Z o boi-de-mamão segue sua trajetória resistindo a força do tempo e ressignificando sua existência.

A cultura popular manter-se-á vívida através dos tempos reinventando histórias, permeando e ligando vidas e gerações.

De A à Z Uma história Poética da Brincadeira do Boi-de-mamão na Ilha de Santa Catarina Florianópolis Edital 2012

Marcoliva, Denilson Antonio, 2012 Desta edição, Bernúncia Editora e Livraria Ltda.

Texto: Marcoliva Desenhos: Denílson Antonio Capa e projeto grafico: Denílson Antonio Impressão e acabamento: "Gráfica Agnus: A impressão que conquista”

ereta, seu Diulindo queria saber do filho de Maria.

X Contaram-lhe que nasceu na mesma hora que a bernuncinha.

- É uma criança linda, seu Diulindo. Nasceu sadia e perfeita não nasceu com cara de boi.

E o boizinho do Mateu?

Tá no pasto, tá brincando tá dançando, tá no pasto, tá brincando O boi está vivo O boi-de-mamão está vivo Vivo, na chamada da cantoria, na alegria da gente no cortêjo que segue pela rua na solidariedade, no partilhar do fruto do trabalho no amor ao próximo, à arte à natureza e aos animais isso é boi-de-mamão.

Depois de toda a confusão desfeita a festa ganha alegria vem toda a fauna local animada pela cantoria Pirilampo voa no céu e feito uma estrela anuncia que o amor existirá, enquanto houver luar e poesia.Maricota e Valdemar anunciam que vão se casar não importa se ela é alta e ele baixinho feito um anãozinho é mais um motivo pra comemorar.

Entra na roda a bernunça, que chamam de bicho bravo dizem que é o bicho-papão, mas ela gosta de criança.

Ela é um bicho de papo furado, você entra dentro dela e já sai do outro lado.

'A bernunça nunca mordeu ninguém, como pode ela morder, se ela dente não tem? ' (1) A bernunça também é amorosa ela é brava de brincadeirinha e como gosta de criança, eis a prova está nascendo a bernuncinha.

Bernúncia: Animal fantástico do folclore catarinense, personagem na dança do boide-mamão, vivificado por dois ou mais indivíduos sob uma armação de madeira coberta por um pano colorido e munida de uma cabeçorra com uma grande mandíbula móvel por onde se “engolem” pessoas.

Segundo Cascudo, proveniente de abrenuntìo “renuncio (ao diabo)”, termo de esconjuro, donde também as formas abernunça, abernúncia, abrenunza, bermunça, bernunça, ber-nunza, brenunça, brenúncia e brenunza.

Fonte: Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa grifo nosso

VIs-à-vis, devagar o boi levanta, no meio da roda armada

não sabia o que acontecera enquanto estava desmaiado, assustado e ainda pensando que corria risco de vida pinoteia e avança pra cima dos convidados.

Mateus chama o cavaleiro pra botar o boi no laço ele vem a galope com o cavalinho e entra na roda formada cumprimenta o dono da casa e também os convidados e o laço voa no céu meia-lua adentro meia-lua afora e estrelas do sul ponteiam e marcam sua trajetória.

"Tá no laço da guia, tá no laço da Maria."

O boi é retirado da roda e dá-se conta que não corre mais risco de vida volta pra roda com o vaqueiro, manso como um potrilho.

Apresentação

nindo as mãos U Maria olhou ao céu e agradeceu já não estava mais com vontade de comer coração de boi aquele desejo desapareceu agora ela só queria ser feliz.

No ano de 2006 nasceu o Boi-de-Cá, grupo de Boi-de-Mamão.

A partir de pesquisa exploratória e bibliográfica sobre o folclore catarinense, o projeto realizou oficinas de dança, cantoria e arte, construindo manualmente os bichos que fazem parte da brincadeira, na Escola Básica Municipal Osmar Cunha.

De lá pra cá, todos os anos o grupo reencontra-se na comunidade de Canasvieiras e sai às ruas de forma espontânea e divertida.

Esta vivência enriquecedora é que gerou este trabalho.

A história do Boi-de-Mamão contada em poesia é uma pequena invencionice que originou-se das brincadeiras anuais que foram reincorporadas aos costumes desta comunidade, de relatos e de escritos sobre o tema que espalha-se por todo o litoral catarinense.

Este livro apresenta de forma simples e poética, este instante fugaz, da vida de homens e de suas sociedades através da cultura.

Marcoliva e Denilson Antônio

Dedicado aos meus filhos Marcos Vinícius e Stella e à todas as crianças, jovens e adultos que participam das brincadeiras do Boi-de-Mamão.

Marcoliva

Agradeço ao Marcoliva pela parceria e ao artista plástico Allan Cardoso, que me apresentou a cultura local e me inseriu na arte de confecção de bonecos.

Dedico aos meus filhos Raul e Jairo, também a minha mãe Maria, e ao meu pai Luiz, batalhadores que sempre estiveram ao meu lado.

Denilson Antonio

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo...

Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer Porque eu sou do tamanho do que vejo E não do tamanho de minha altura...

Fernando Pessoa

remorso deu em Mateu. É nessa hora que o homem chora.

Tamanho Não sabia se acudia o vaqueiro, não sabia se corria até o boi, só gritava desesperado: - Chama o doutor! Chama o doutor!

Havia um doutor ali, como se estivesse de plantão, trouxe até sua maleta, jaleco e injeção, mas o caso era complicado e carecia intervenção. Já rondava o malhado um urubu, certo que o boi morrera, vinha pinicar-lhe o rabo. Mateu chamou o cachorro pra enxotar o trombudo, bicho feio e carniceiro, enquanto o povo gritava: - salta fora do terreiro! E ele se foi, aos gritos dos convidados.

Estava ali a Sinhá Chica e se houvesse necessidade, poderia benzer o boi, mas nem precisou. O Doutor, que também era curandeiro, benzeu o bicho. A benzedura resolveu, um galinho de alecrim foi só o que ele precisou e o boi deu sinal de vida, ressuscitou, num pulo o vaqueiro levantou e Maria ficou aliviada do susto que deu em todos que ali estavam.

De A à Z Uma história Poética da Brincadeira do Boi-de-mamão na Ilha de Santa Catarina

Sem hesitar, o vaqueiro quis pegar o boi a unha

o boi gingou pra um lado, conhecia-o por alcunha e o boi que a pouco era aclamado, sentiu-se encurralado agora fora chamado para cumprir a sua sina: morrer na ponta da faca Mas num impulso pela vida o bicho pensou que não avançou contra o vaqueiro e numa galhada o derrubou mas caiu pro outro lado o coração cobiçado havia parado decerto não suportou.

vou lhes contar Ao gora que é Boi-de-Mamão que é parte da cultura a mais pura tradição aqui em Santa Catarina isso é uma celebração.

B

oi-de-Mamão mexe com a gente por dentro e por fora entrar dentro do boi é encarnar a alma do bicho é ser meio touro meio gente.

apidamente Mateu R inconformado, olhou pro lado viu o amigo vaqueiro e pediu-lhe, contrariado que trouxesse o boi pois seu filho não podia nascer como Maria Havia lhe alertado.

C ada personagem ali representado ganha vida na alma dos artistas a elegância do cavaleiro rodando com o cavalinho a cabrinha mesureica vem chegando de mansinho até o urubu é lindo pinicando o boizinho afugentado pelo cachorro vai saindo em revoada pouco a pouco entra na roda toda alegre a bicharada.

Q ue surpresa ele teve

quando Maria exclamou: - Eu quero que tu me atendas e não vás comprar na venda porque meu desejo, compreendas é o coração daquele boi.

O dedo em riste indicava o boi que Mateu amava e ela em voz alta exclamava: - Se não atendes meu desejo nosso filho vai nascer com cara de boi.

Pensando em atender

seu pedido no ato Mateu trouxe um bocado que sobrara do churrasco

Dcaiiaavoa noite o arrebol se esvai O lusco-fusco transfigura homem e animal transforma pano em couro pau em osso ... escultura em movimento.

nde estava Maria, o povo queria saber, e ela veio sem Odemora, ficou no meio da gente e disse que estava meio envergonhada ao ver tanto bicho, tanta gentarada e que não sabia porque estava cismada quando descobriu que a cisma, danada, era desejo de comer coração de boi.

Nota: A presente alegoria do desejo da mulher grávida de comer o coração do boi é a inclusão ocasional de uma lenda do Bumba Meu Boi do Maranhão. Ela, pois, não faz parte da originalidade do Boi de Mamão Catarinense. (NVP).

inguÊm arredava da festa N e cada vez chegava mais gente a folia estava animada e no terreiro a bicharada misturada com aquela montoeira de gente e o boi de Mateu era o centro das atençþes dançava bonito e animado deixando todo mundo contente.

ateu fez uma festa Mconvidou a freguesia queria contar pro povo sobre o estado de Maria

Estrada a fora

o cortejo segue na rua cinzenta o barro virou asfalto a areia virou cimento

Veio o Chico da Venda, veio gente doutras bandas, lá da Praia de Ponta das Canas, o Antonho Diulindo e o Dedé da Maroca, o Alan Cardoso do morro do Tico-tico, o Aldo do Estreito, a Denise Richard da Cachoeira.

Veio o Marréba ali de Jurerê, o Índio e a Zete do Sambaqui, o Nado lá da Barra da Lagoa, que trouxe com ele o fio do finado Zé Agostinho, o Valdir, 'pra mode' cantar pra nós.

Também veio Sinha Chica, benzedeira afamada, lá da Lagoa da Conceição.

Veio um punhado de gente de todo o canto, do Sertão do Peri ao Morro do Rapa, até dona Maricota e seu Valdemar, pra festejar a notícia da gravidez de Maria.

Fi g u r a s pendem-se Logo adespôs do casório

Maria já pegou cria assim se falava na roça nas bandas donde viviam.

sobre as janelas sob o olhar dos bichos.

Garbosos

transpõem carros e a urbe leva um choque.

ao pé do altar Jurara amar e respeitar na saúde e na doença na riqueza e na pobreza e nunca deixar faltar alimento sobre a mesa

omodava I n cmuita gente o jeito que ele vivia mas era feliz e atencioso com sua amada Maria.

istória de Mateu, marido de Maria H casados na Igreja São Francisco de Paula de Canasvieiras Mateu amava a família e os animais, tinha um boizinho malhado dançador por demais única herança que recebera de seu pai com o bicho era só alegria então ele só vivia com ele a vadiar.