Vozes da modernidade: A lírica de Adoniran Barbosa como ponto de encontro do samba e da crônica

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3.1.1. A inserção dos sambas no ambiente urbano – os exemplos do Rio de Janeiro e de São Paulo Já foi apontado neste trabalho que ao tratar-se da multiplicidade de fazeres que são conhecidos pelo nome de samba, pluraliza-se esse termo para passar uma ideia próxima do eles constituem. Em outras palavras, que se refira aqui a os sambas, pois se tratam de variadas atividades musicais e lúdicas que se organizaram sobre diversos territórios e que possuem entre si diferenças e semelhanças. Dos aspectos em comum, porém, se tratando desses formatos que apareceram anteriores ao novo samba urbano, chama a atenção que a manipulação rítmica que os caracteriza como música popular provenha de uma base comum. Se a síncope faz-se presente em toda a música americana que possui algum tipo de enraizamento africano, uma variante peculiar dessa síncope tem-se feito presente nos sambas tradicionais por todo o Brasil. Trata-se do tresillo: identificado primeiramente por musicólogos cubanos em respeito a uma abordagem da música popular feita em seu país que, ao ir além da métrica ocidental, pretende em sua definição ter uma noção mais exata da estrutura do que vem a ser essas músicas. Trata-se de um ciclo de oito pulsações, ou 3+3+213. (...) Como este ritmo comporta três articulações, os cubanos chamam-no de tresillio (...). Mas o tresillo aparece nas músicas de muitos outros pontos nas Américas onde houve importação de escravos, inclusive, é claro, no Brasil. 13

Sandroni em seu trabalho etnomusicológico também levanta o questionamento de que o samba é diminuído em sua complexidade rítmica pelos padrões métricos ocidentais. Busca então alternativas como a proposta por Simha Arom em seu estudo sobre a música africana, que nessas peculiaridades rítmicas se aproxima da brasileira. Ele (Simha Arom) percebeu a existência, na música africana, de um importante grupo de fórmulas rítmicas em que a mistura de grupos binários e ternários (as nossas semínimas e semínimas pontuadas) dava sempre origem a períodos rítmicos pares: por exemplo: a série 3+3+2 (ou seja, duas semínimas pontuadas + semínima) configura um período de oito unidades; a série 3+2+3+2+2 configura um período de 12 unidades, e assim em diante. Mas qualquer tentativa de dividir esses estes períodos pares em dois, respeitando a sua estruturação interna, levava a duas partes necessariamente desiguais, estas ímpares. Assim, neste tipo de lógica rítmica, o período de oito não pode ser dividido em 4+4, mas somente em 3+5 (ou 3+[3+2]); ou o período de 12 não pode ser dividido na metade exata (6+6), mas apenas em quase metades (5+6 ou [3+2} +[3+2+2]). Arom chamou esse fenômeno de “imparidade rítmica” (SANDRONI, 2012, p. 26-27)


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