CASTRO, A. A. Axé music: mitos, verdades e world music. Per Musi, Belo Horizonte, n.22, 2010, p.203-217.
Axé music: mitos, verdades e world music
Armando Alexandre Castro (UFBA, Salvador, BA) armandocastro@ufba.br
Resumo: O artigo discute a Axé music, oferecendo elementos na tentativa de desconstrução de três mitos nela evidenciados: monocultura, baixa qualidade técnica e sua decadência. A metodologia utilizada privilegia a análise de conteúdo, tendo como meios de verificação e coleta de dados entrevistas semi-estruturadas com músicos, técnicos, produtores e empresários musicais de Salvador, além de pesquisa documental relacionada ao campo musical baiano atual. Palavras-chave: Axé music; música popular brasileira; produção musical; world music.
Axé Music: myths, truths and world music Abstract: The article discusses Axé music providing elements in an attempt to deconstruc three myths related to it: monoculture, low technical quality and its decadence. The method used focuses on content analysis, departing from verification of data collected through semi- structured interviews with musicians, technical staff, producers and music business executives from Salvador (Brazil), along with documental research related to the musical scene of Bahia today. Keywords: Axé music; Brazilian popular music; musical production; world music.
1. Introdução
Em El Milagro de Candeal (2004), o diretor espanhol Fernando Trueba, centrando sua argumentação em essencializações acerca da musicalidade, da cultura e religiosidade da Bahia, apresenta o encontro entre o pianista cubano Bebo Valdez e Carlinhos Brown. Ainda nas primeiras cenas, Bebo Valdez confidencia ao músico, compositor e pesquisador baiano Mateus Aleluia – Grupo Tincoãs, Cachoeira, Bahia -, o conselho ofertado a ele, em 1947, por uma Yalorixá - também cubana -, caso prosseguisse em sua investigação musical e antropológica motivada por questionamentos identitários: conhecer a cidade de Salvador, Bahia. À beira mar, o diálogo entre os músicos é precedido de inúmeras outras cenas que apontam indícios e entrelaces dos aspectos religiosos, culturais e musicais baianos inscritos ao longo do tempo e história, como que atendendo às expectativas de parcela considerável de estrangeiros e suas imagens/impressões de uma Bahia mítica e paradisíaca plasmada nestes aspectos. A película segue. Do simpático taxista, ele recebe um sonoPER MUSI – Revista Acadêmica de Música – n.22, 239 p., jul. - dez., 2010
ro e entusiasmado “(...) Então seja bem vindo à Bahia. Terra da Felicidade!”. Em seguida, surge a imagem da estátua de Vinícius de Moraes instalada em Itapuã. Após o desembarque no Pelourinho, a ida a uma das Igrejas Católicas deste, onde presencia um ensaio musical de Mateus Aleluia e integrantes do Grupo Musical Gêge Nagô1. Na cena seguinte, eis que surge Carlinhos Brown e o Grupo Zárabe, numa espécie de aquecimento pelas ruas e becos do Candeal Pequeno, como num ensaio a céu aberto do que aconteceria mais adiante na apresentação e aparição destes numa das festas mais tradicionais de Salvador: a festa de Yemanjá. As imagens apresentam alguns elementos emblemáticos da marca Bahia no mundo globalizado: música, performances, criatividade, diversidade, onde tradição e modernidade dialogam, não raro, sem maiores incidentes. Por outro lado, revela as estratégicas arquiteturas de veiculação e inscrição de elementos simbólicos a marcas territoriais distintivas, como no caso Bahia, a partir da seleção de elementos Recebido em: 14/10/2009 - Aprovado em: 20/03/2010
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