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As primeiras agremiações carnavalescas surgem no Rio de Janeiro em meados do século XIX, e o carnaval carioca, que até então tinha como prática principal o entrudo 44, tradição herdada de Portugal, inicia um processo de elaboração de novas práticas em torno das celebrações carnavalescas em locais públicos. Deslocando assim, progressivamente, e não sem conflitos, o foco da mobilização em locais públicos, em direção a uma festa baseada em desfiles, e com uma práxis sonora que lhe é intrínseca. Assim, no final do século XIX, o carnaval carioca já possui uma organização própria, e é possível perceber a ocupação de espaços públicos e privados, bem como a existência de um mercado de produtos em torno do carnaval, com anúncios de artigos para a festa como fantasias confetes e serpentinas. Como destacado por Stallybrass e White (1986) em sua análise sobre as relações políticas e poéticas da transgressão e do carnavalesco, já nesta fase do carnaval carioca temos os conceitos sociais de “alto” e “baixo”, como uma polarização central nos discursos e políticas sobre a festa. Sendo possível perceber diferentes níveis dentro destas categorias, poderiam ser opostos, o carnaval privado ao carnaval público, o entrudo ao desfile organizado, as grandes sociedades às pequenas sociedades. Observando a edição do Jornal do Brasil (JB) do dia 23 de fevereiro de 1895, é possível perceber que a relação entre o carnaval público e privado tende para os espaços privados, havendo alguns anúncios de bailes, mas não de desfiles. Segundo as notícias publicadas naquele dia, haveria bailes nos salões de seis clubes, dentre os quais se encontram os três grandes clubes mais importantes para o carnaval deste período, o Tenentes do Diabo, Fenianos, e Democráticos. Neste mesmo dia há outra notícia informando quais são os 43 grupos que obtiveram licença da policia para desfilar durante o carnaval, e dentre estes, o único dos três grandes clubes a licenciar desfile foi o Fenianos (S/N, 23 fev. 1895)45. Ao comparar a edição do dia 23 com outra, publicada no dia 27, é possível perceber um primeiro ponto que deve ser destacado sobre o carnaval carioca, que é a relação entre o oficial e permitido, e o que realmente acontece durante o carnaval. Apesar do Clube dos Democráticos não constar entre os grupos licenciados, seu desfile é descrito na primeira página do jornal, logo após o desfile dos Fenianos (DEMOCRATICOS, 27 fev. 1985, p.1) 46.
44 Para uma descrição de como era esta prática, ver o artigo publicado no JB (CARNAVAL, 27 jun. 1892, p.3) disponível no Anexo B. 45 Ver Anexo C. 46 Ver anexo D